Enfoques ecossistêmicos em saúde: perspectivas para sua

Propaganda
Organização Pan-Americana da Saúde
Série Saúde Ambiental 2
ISBN 978-85-87943-95-8
9 788587 943958
Enfoques ecossistêmicos em saúde:
perspectivas para sua adoção no
Brasil e países da América Latina
Organização Pan-Americana da Saúde
Organização Mundial da Saúde
Ministério da Saúde
Secretaria de Vigilância em Saúde
Fundação Oswaldo Cruz
Enfoques ecossistêmicos em saúde – Perspectivas para
sua adoção no Brasil e em países da América Latina
Série Saúde Ambiental 2
Brasília
2009
2009 © Organização Pan-Americana da Saúde – OPAS / Ministério da Saúde.
Todos os direitos reservados. É permitida a reprodução total ou parcial desta obra, desde que seja citada a fonte e não seja para
venda ou qualquer fim comercial.
Tiragem: 1ª edição – 2009 – 1.000 exemplares
Série Saúde Ambiental 2
Elaboração, distribuição e informações:
Organização Pan-Americana da Saúde – OPAS/OMS
Setor de Embaixadas Norte, Lote 19
CEP: 70800-400 – Brasília-DF – Brasil
Fundação Oswaldo Cruz
Instituto Leônidas e Maria Deane – Fiocruz Amazônia
Rua Terezina, 476, Adrianópolis
Manaus – AM. CEP: 69.057-070
Internet: http://www.amazonia.fiocruz.br/
Escola Nacional de Saúde Pública Sérgio Arouca
Avenida Leopoldo Bulhões, 1480, Manguinhos
Rio de Janeiro – RJ, CEP: 21041-210
Internet: http: //www.ensp.fiocruz.br
Organizador
Carlos Machado de Freitas – Escola Nacional de Saúde Pública – Fiocruz
Colaboração
Antonio Levino – Instituto Leônidas e Maria Deane – Fiocruz Amazônia
Brani Rozemberg – Escola Nacional de Saúde Pública – Fiocruz
Carlos Corvalán OPS/OMS – Representação Brasil
Carlos Machado de Freitas – Escola Nacional de Saúde Pública – Fiocruz
Daniel Forsin Buss – Instituto Oswaldo Cruz – Fiocruz
Jean Remy Daveé Guimarães – Instituto de Biofísica – UFRJ
Josino Costa Moreira – Escola Nacional de Saúde Pública – Fiocruz
Leandro Luiz Giatti – Instituto Leônidas e Maria Deane – Fiocruz Amazônia
Marcelo Firpo de Souza Porto – Escola Nacional de Saúde Pública – Fiocruz
Marcus Vinícius Polignano – Faculdade de Medicina – UFMG
Marisa Soares – Instituto Oswaldo Cruz – Fiocruz
Paulo Chagastelles Sabroza – Escola Nacional de Saúde Pública – Fiocruz
Sergio Luiz Bessa Luz – Instituto Leônidas e Maria Deane – Fiocruz Amazônia
Revisão
Mara Lucia C. Oliveira – Representação da OPAS/OMS no Brasil
Caroline Habe – Representação da OPAS/OMS no Brasil
Capa, Projeto Gráfico e Diagramação
All Type Assessoria Editorial Ltda
Impresso no Brasil/Printed in Brazil
Ficha catalográfica elaborada pelo Centro de Documentação da
Organização Pan-Americana da Saúde – Representação do Brasil
Organização Pan-Americana da Saúde.
Enfoques ecossistêmicos em saúde – perspectivas para sua adoção no Brasil e países da América
Latina. / Organização Pan-Americana da Saúde. – Brasília: Organização Pan-Americana da Saúde, 2009.
44 p: il.
ISBN 978-85-87943-95-8
1. Ecossistema - Brasil. 2. Saúde Pública - Brasil. I. Organização Pan-Americana da Saúde. II. Título.
NLM: QH 541.15.E265
Sumário
5
Apresentação
7
Introdução
11
As duas grandes vertentes dos enfoques ecossistêmicos
19
Enfoques ecossistêmicos e saúde pública –
um breve panorama para o Brasil
21
Enfoques ecossistêmicos nas revistas de
saúde pública da América Latina
29
Enfoques ecossistêmicos em saúde – resumo das
apresentações do workshop de Manaus
39
Perspectivas para adoção dos enfoques ecossistêmicos em saúde
41
Referências
Enfoques ecossistêmicos em saúde – Perspectivas para sua adoção no Brasil e em países da América Latina
3
Enfoques ecossistêmicos em saúde –Perspectivas para
sua adoção no Brasil e em países da América Latina1
Siglas
AES
ASE
AM
Bird
C
CAP
CETAM
DDT
EEP
ENSP
FMI
FUNASA
GTA
Hg
IDRC
ILMD
MEA
MeHg
N
ODM
OMC
OMS
OPAS/OMS
PB
PCB
PLUPH
PNUMA
PR
PSF
SARS
SCIELO
Se
SIG
SOHO
SP
SUS
UFMG
UFPA
UFRJ
USP
UQAM
VPSRA
Abordagem Ecossistêmica em Saúde
Abordagem da Saúde de Ecossistemas
Amazonas
Banco Internacional para a Reconstrução e o Desenvolvimento
Símbolo químico do Carbono
Comunidade Ampliada de Pares
Centro de Ensino Tecnológico do Amazonas
Dicloro-Difenil-Tricloroetano
Escola de Engenharia de Piracicaba
Escola Nacional de Saúde Pública
Fundo Monetário Internacional
Fundação Nacional de Saúde
Grupo Técnico de Apoio
Simbolo quimico do mercúrio
International Development Research Centre
Instituto Leônidas e Maria Deane da Fiocruz Amazônia
Milleniun Ecosystem Assessment
Cloreto de metil mercúrio
Símbolo químico do nitrogênio
Objetivos de Desenvolvimento do Milênio
Organização Mundial do Comércio
Organização Mundial da Saúde
Organização Pan-Americana de Saúde/Organização Mundial da Saúde
Símbolo químico do chumbo
Policloretos de Bifenilo
Poor Land Use - Poor Health
Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente
Paraná
Programa de Saúde da Família
Severe Acute Respiratory Syndrome
A Scientific Electronic Library Online
Símbolo químico do selênio
Sistema de Informação Geográfica
Self Organizing Holarquic Open
São Paulo
Sistema Único de Saúde
Universidade Federal de Minas Gerais
Universidade Federal do Pará
Universidade Federal do Rio de Janeiro
Universidade de São Paulo
Université du Québec à Montreal
Vice-Presidência de Serviços de Referência e Ambiente
1 Texto elaborado para o Workshop Abordagem Ecossistêmica em Saúde, realizado nos dias 18 e 19 de novembro de 2008 no Instituto Leônidas e Maria Deane
da Fundação Oswaldo Cruz (ILMD – FIOCRUZ), na cidade de Manaus em parceria com a Organização Pan-Americana da Saúde/Organização Mundial da Saúde
(OPS/OMS) Representação Brasil.
Apresentação
A Representação da Organizaçăo Pan-Americana de Saúde (OPAS/OMS) no Brasil, em parceria com o Ministério da Saúde, por meio do Instituto Leônidas e Maria Deane da Fiocruz Amazônia (ILMD/FIOCRUZ/MS)
apresenta o segundo volume da série de publicações sobre Saúde Ambiental com o título “Enfoques ecossistêmicos em saúde – perspectivas para sua adoção no Brasil e em países da América Latina”, produzido como
subsídio aos debates realizados no workshop sobre “Abordagem Ecossistêmica em Saúde” realizado em Manaus
nos dias 18 e 19 de novembro de 2008.
O workshop, realizado pelo ILMD/FIOCRUZ/MS em parceria com a OPAS/OMS, contou com a participação
representantes de 15 instituições federais, estaduais e locais, atuantes nas áreas de saúde e meio ambiente da
região Amazônica e de estudiosos e pesquisadores dos temas de saúde e enfoques ecossistêmicos.
A Avaliação Ecossistêmica do Milênio foi desenvolvida entre 2001 e 2005, para compreender melhor as consequências de mudanças nos ecossistemas sobre o bem-estar humano e para estabelecer a base científica das
ações necessárias à melhoria, à conservação e ao uso sustentável dos ecossistemas e suas contribuições para o
bem-estar humano. O enfoque ecossistêmico faz a conexão da gestão ambiental com a compreensão holística
da saúde humana, considerando os fatores sociais, econômicos e culturais inerentes a um ecossistema
O objetivo do evento foi conhecer melhor a proposta de avaliação ecossistêmica e sensibilizar os profissionais
que atuam na área de saúde para a sua aplicação visando conhecer como as mudanças nos serviços dos ecossistemas influem no bem-estar humano.
Espera-se, com esta edição, contribuir, no Brasil e em outros países da região, com os gestores e trabalhadores
das áreas de saúde e ambiente, bem como representantes da sociedade interessados na questão e para que se
busque uma atuação mais efetiva de todos voltada para a proteção da saúde.
Diego Victoria
Representante da OPAS/OMS no Brasil
Roberto Sena Rocha
Diretor do Instituto Leônidas e
Maria Deane da Fiocruz Amazônia
Enfoques ecossistêmicos em saúde – Perspectivas para sua adoção no Brasil e em países da América Latina
5
Fonte: www.fmc.am.gov.br/floresta amazonica1.jpg
Vista áerea floresta Amazônica
Introdução
Segundo uma síntese preparada pela OMS dos resultados da Avaliação Ecossistêmica do Milênio1,
impulsionada pelas Nações Unidas com o propósito
de conhecer e avaliar as consequências das relações
existentes entre meio ambiente e bem-estar humano,
a questão que se procurou responder foi “por que os
ecossistemas são importantes para a saúde humana”,
estando a resposta associada ao fato de constituírem os sistemas de suporte, as diversas formas de
vida, incluindo a espécie humana (Corvalan, Hales,
­McMichael, 2005). Esse esforço resulta da constatação de que os serviços de ecossistemas são indispensáveis para o bem-estar e a saúde dos humanos em
qualquer lugar, envolvendo complexas relações causais entre mudanças ambientais e saúde humana, que
são indiretas e envolvem diferentes escalas espaciais
e temporais, sendo dependentes de inúmeras forças
de mudanças (OPS, 2005).
Podemos considerar que o documento citado constitui um grande esforço de uma trajetória que, particularmente na passagem do século XX para o XXI,
procura cada vez mais compreender e solucionar os
problemas resultantes das ações humanas nas mudanças na estrutura e funcionamento dos ecossistemas.
Este esforço em um momento que se constata que a
partir da segunda metade do século XX, se por um
lado as ações humanas sobre os ecossistemas propiciaram benefícios para o bem-estar e a saúde, por outro
vem resultando em custos crescentes, com degradação
de 60% dos serviços dos ecossistemas, exacerbação da
pobreza e crescentes inequidades sociais e ambientais. É neste contexto que os enfoques ecossistêmicos
em saúde vêm ganhando proeminência nos países da
América Latina, constituindo um potencial para os
modos de compreensão e busca de soluções na saúde
pública e, por conseguinte, exigindo uma análise crítica de suas limitações.
Feola e Bazzani (2002), do Escritório Regional para
América Latina e Caribe (situado no Uruguai) do
Centro Internacional de Investigações para o Desen-
1
O documento “Ecossistemas e Saúde Humana: alguns resultados da Avaliação Ecossistêmica” é uma síntese elaborada pela Organização Mundial da
Saúde (OMS) e traduzida para o português pela Representação da OPAS/
OMS no Brasil,
Ecossistemas e Saúde Humana: alguns
resultados da Avaliação Ecossistêmica do
Milênio1
A Avaliação Ecossistêmica do Milênio foi desenvolvida
entre 2001 e 2005, para avaliar as consequências de
mudanças nos ecossistemas sobre o bem-estar humano
e para estabelecer também a base científica das ações
necessárias à melhoria, à conservação e ao uso sustentável dos ecossistemas e suas contri­buições para o bemestar humano.
A avaliação baseia-se nas vinculações entre os ecossistemas e o bem-estar humano, em particular os serviços
dos ecossistemas, ou seja, os benefícios que as pessoas
obtêm dos ecossistemas. Esses incluem o provimento
de “serviços” como o abastecimento de água e alimentos; a madeira e a fibra; serviços que afetam o clima,
as inundações, a seca, as doenças, os resíduos e a qualidade da água; serviços culturais, que proporcionam
benefícios recreativos, estéticos e espirituais; e serviços
de apoio, como aquele dado à formação de solos, a
fotossíntese e o ciclo nutricional. A espécie humana, enquanto se adapta às mu­danças ambientais por meio da
cultura e da tecnologia, depende, em última instância,
plenamente do fluxo de serviços dos ecossistemas.
A Avaliação Ecossistêmica do Milênio trata de avaliar como as mudanças nos serviços dos ecossistemas
influem no bem-estar humano. Supõe-se que o bemestar humano tem constituintes múltiplos. Eles incluem
a saúde, considerada como sentir-se bem e ter um ambiente físico circundante saudável, o ar limpo e o acesso
à água limpa; o material mínimo para uma vida boa, as
formas de vida seguras e adequadas, alimentos suficientes a todo momento, a moradia, o vestuário, e o acesso
a produtos; as relações sociais, incluindo a coesão social, respeito mútuo e capacidade de ajuda a outros,
especialmente às crianças; a segurança, o acesso seguro
aos recursos naturais e a outros recursos, a segurança
pessoal, e a vigilân­cia dos desastres naturais ou provocados pelo ser humano; por fim, a liberdade de escolha
e de ação, incluindo a oportunidade de alcançar o que
um indivíduo valoriza como ser e fazer.
1 O processo de Avaliação Ecossistêmica do Milênio, impulsionado
pelas Nações Unidas, é um grande esforço da comunidade científica para conhecer e avaliar as consequências das relações existentes
entre meio ambiente e bem-estar humano, o qual gerou grandes informes, que podem ser acessados no endereço http://www.maweb.
org/en/index.aspx.
Fonte: “Ecosistemas y bienestar humano: Síntesis de la salud Un
informe de la Evaluación de los Ecosistemas del Milenio (EM)”
(Corvalan et al, OMS 2005)
Enfoques ecossistêmicos em saúde – Perspectivas para sua adoção no Brasil e em países da América Latina
7
Por que os ecossistemas são importantes para a saúde humana?
Fundamentalmente, os ecossistemas constituem sistemas de apoio à vida do planeta – para as espécies humanas e para
todas as outras formas de vida. A necessidade biológica do ser humano de ter alimento, água, ar puro, abrigo e uma
condição climática relativamente constante é básica e inalterável.
Os serviços dos ecossistemas são indispensáveis para o bem-estar de todas as pessoas, em todos os lugares do mundo.
As relações de causa e efeito entre as mudanças ambientais e a saúde humana são complexas, por serem frequentemente
indiretas, deslocadas no espaço e no tempo, e dependentes de várias forças modificadoras.
Figura: Relação entre os serviços dos ecossistemas e seus
impactos no bem-estar humano, com ênfase na saúde
Fonte: “Ecosistemas y bienestar humano: Síntesis de la salud Un informe de la Evaluación de los Ecosistemas del Milenio (EM)” (Corvalan et al,
OMS 2005)
volvimento (Canadá), iniciam as reflexões finais da
publicação “Desafios y Estrategias para la Implementación de um Enfoque Ecosistémico para la Salud Humana em los países em Desarrollo: reflexiones a propósito de las consultas regionales realizadas” com um
enunciado que chama a atenção para os desafios que
se colocam para este tipo de abordagem:
8
O enfoque ecossistêmico para a saúde humana
(ecosaúde) apresenta muitos desafios, pois atravessa as fronteiras tradicionais da investigação. De
fato, constitui-se em um novo enfoque que conecta
a gestão ambiental integrada com uma compreensão holística da saúde humana, considerando os
importantes fatores sociais, econômicos e culturais
Enfoques ecossistêmicos em saúde – Perspectivas para sua adoção no Brasil e em países da América Latina
inerentes a um ecossistema. (Feola & Bazzani,
2002:67)
Da citação do texto de Feola e Bazzani (2002), podemos inferir que o enfoque ecossistêmico em saúde
representa, como abordagem integrada, importantes
possibilidades de aplicação nos países da América Latina e também desafios no que se refere às possibilidades de trabalho integrado para o diagnóstico e gestão
dos problemas ambientais e de saúde. Tomando por
base este texto, assim como outros que vêm procurando abordar estes enfoques nos seus aspectos teóricos e
conceituais, como também práticos e de investigação,
tanto no Brasil (Possas, 2001; Minayo, 2002; Freitas,
2007) como em outros países (WRI, 2000), principalmente Canadá (Waltner-Toews, 2004; Lebel, 2003),
consideramos que os mesmos envolvem pelo menos
três pressupostos:
1)para ser integrado, envolvem a reunião de informações diversas, que possibilitem demonstrar as interfaces entre bens e serviços dos vários ecossistemas
que devem ser equilibradas com as metas ambientais, políticas, sociais e econômicas;
2)para resultar em propostas de gestão ambiental integrada, envolvem a formulação de políticas públicas amplas e instituições mais efetivas para implementar as mesmas;
3)para ser mais holístico na compreensão dos problemas e resultar em gestão ambiental mais efetiva,
devem envolver a participação do público na gestão
dos ecossistemas, particularmente as comunidades
locais.
Com base nestes três pressupostos, organizamos este
texto para fornecer subsídios para a reflexão sobre
as perspectivas de adoção desses enfoques no Brasil,
em especial, e na América Latina, de modo geral. Na
primeira parte, descrevemos e comparamos as duas
vertentes que se encontram na base do debate teórico e metodológico sobre os enfoques ecossistêmicos: (a) Abordagem de Saúde de Ecossistemas (ASE);
(b) Abordagem Ecossistêmica em Saúde (AES). Na
segunda parte, realizamos uma breve análise da produção científica brasileira, tendo como base artigos,
livros e capítulos livros. Na terceira parte, analisamos a produção científica tendo como base artigos
publicados em revistas de saúde pública da América Latina. Na quarta parte, apresentamos o resumo
dos trabalhos apresentados no workshop Abordagem
Ecossistêmica em Saúde, realizado nos dias 18 e 19 de
novembro de 2008 no Instituto Leônidas e Maria Deane – Fiocruz Amazônia, Manaus. Na última parte,
a partir destes elementos e subsídios, fazemos breve
balanço dos enfoques ecossistêmicos no Brasil e na
América Latina.
Foto: All type Assessoria Editorial
Vitória Régia
Fonte: www.fmc.am.gov.br
As duas grandes vertentes
dos enfoques ecossistêmicos
De acordo com Freitas e col. (2007), podemos identificar na atualidade duas grandes vertentes que estão
na base dos estudos que adotam um enfoque ecossistêmico. Uma valoriza fortemente o desenvolvimento
de modos de mensuração que permitam identificar
sinais e sintomas de como as mudanças nos ecossistemas podem afetar a saúde dos mesmos e, por conseguinte, apresentam o potencial presente ou futuro de
afetar a saúde humana (Rapport, 1998a; Jorgensen e
col., 2005; Aron & Patz, 2001). A outra valoriza fortemente o desenvolvimento de abordagens contextuali-
zadas e participativas para compreensão e busca de soluções acerca de mudanças nos ecossistemas de determinados lugares (aldeias, vilarejos, pequenas cidades,
por exemplo) e suas consequências sobre a saúde das
comunidades locais (Kay e col., 1999; Waltner-Toews,
2004; Lebel, 2003). A primeira privilegia a construção
de informações científicas que subsidiem a tomada de
decisão. A segunda privilegia a construção coletiva
de informações, de modo que os atores locais possam
participar de modo mais qualificado das demandas ou
mesmo das tomadas de decisões.
Têm ocorrido mudanças nos ecossistemas? E quais são as implicações para a saúde humana?
A estrutura e o funcionamento dos ecossistemas do mun­do
foram mais rapidamente modificados na segunda metade
do século 20 do que em qualquer outro período da história da humanidade. Os seres humanos estão alterando
de forma fundamental – e, de certo modo, irreversível – a
diversidade da vida na terra em um grau significativo de
irreversibilidade. No geral, e para a maioria dos países, as
mudanças causadas aos ecossistemas do mundo, em décadas recentes, propiciaram benefícios substanciais para o
bem-estar humano e para o desenvolvimento.
Muitas das alterações mais significativas nos ecos­sistemas foram essenciais para satisfazer as necessidades crescentes de
alimento e água; essas alterações ajudaram a reduzir a proporção de pessoas desnutridas e a melhorar a saúde humana.
Entretanto, tais ganhos foram obtidos a custos crescentes na
forma de degradação de diversos serviços dos ecossistemas,
aumento do risco de alterações não-lineares e de larga magnitude em ecossistemas e exacerbação da pobreza para um
certo número de pessoas, contribuindo para o crescimento
das iniquidades e disparidades entre grupos de pessoas.
Existem grandes desigualdades no acesso aos serviços dos
ecossistemas. Entre os países e dentro de cada um deles, a
pob­reza é um determinante básico de subnutrição e doenças causa­das pela falha no saneamento básico (abastecimento de água, esgotamento sanitário, limpeza urbana e
drenagem) e outros serviços públicos. Muitas pessoas e locais afetados de forma nociva por mudanças nos ecossistemas e declínio nos serviços dos ecossistemas são altamente
vulneráveis e mal equipados para enfrentar as perdas ainda
mais profundas de serviços dos ecossistemas. As mudanças
promovidas pelo homem nos ecossistemas e em serviços
dos ecossistemas dão forma tanto às ameaças às quais as
pessoas e locais são expostos como à vulnerabilidade dessas
pessoas e locais a tais ameaças. Entre os grupos altamente
vulneráveis estão aqueles cujas necessidades de serviços dos
ecossistemas já excederam a disponibilidade desses serviços, tais como pessoas carentes do fornecimento adequado
de água limpa e habitantes de áreas com produção agrícola
em declínio (incluindo uma série de regiões da África).
As regiões que enfrentam os maiores desafios para alcançar
os Objetivos de Desenvolvimento do Milênio (ODM) coincidem em grande parte com as regiões que enfrentam os
maiores problemas relacionados ao suprimento ecologica­
mente sustentável de serviços dos ecossistemas. Muitas destas regiões incluem grandes áreas de terras secas, nas quais
uma combinação de população em crescimento e degradação do solo está aumentando a vulnerabilidade das pessoas
tanto às mudanças econômicas como ambientais.
A vulnerabilidade foi também aumentada pelo cresci­mento
de populações em ecossistemas sob riscos de desastres tais
como inundações e secas. As populações estão crescendo em
áreas de baixada à beira-mar e em ecossistemas de terras
secas. Em parte como consequência do crescimento dessas populações vulneráveis, o número de desastres naturais
(inundações, secas, terremotos, etc.) que requerem assistência internacional quadruplicou nas últimas quatro décadas.
A redução da saúde e do bem-estar humano tende a au­
mentar a dependência imediata dos serviços dos ecossistemas, e a pressão adicional resultante pode prejudicar a
capacidade desses ecossistemas de prover tais serviços.
À medida que o bem-estar diminui, as opções disponíveis para que as pessoas regulem o seu uso dos recursos
naturais em níveis sustentáveis também diminuem. Isso,
por sua vez, faz aumentar a pressão sobre os serviços dos
ecossistemas, e pode criar uma espiral descendente de pobreza crescente e degradação ainda maior desses serviços
de ecossistema.
Fonte: “Ecosistemas y bienestar humano: Síntesis de la salud Un informe de la Evaluación de los Ecosistemas del Milenio (EM)” (Corvalan et al,
OMS 2005)
Enfoques ecossistêmicos em saúde – Perspectivas para sua adoção no Brasil e em países da América Latina
11
Abordagem da Saúde
de Ecossistemas (ASE)
A ASE busca ser uma ciência integrativa, procurando
ir além das fronteiras do estresse ecológico, um campo
voltado estritamente para os aspectos biofísicos dos
problemas ambientais. Procura integrar ciências naturais (dimensão biofísica), sociais (dimensão socioeconômica) e da saúde (dimensão da saúde humana),
utilizando como recurso a metáfora do ecossistema
como um paciente, que implica:
1)diagnosticar as disfunções dos ecossistemas, por
meio do monitoramento de sinais e indicadores,
com o objetivo de identificar riscos de deterioração, distinguindo os ecossistemas “saudáveis”
(desejáveis) daqueles considerados “patológicos”
(indesejáveis);
2)oferecer opções para mudanças de estado dos ecossistemas, focalizando a estratégias preventivas a
fim de reduzir custos de intervenções pós-danos,
assim como perdas de oportunidades econômicas,
de riscos à saúde humana e de rupturas sociais por
conta da degradação ambiental ocorrida (Rapport,
1998b; Rapport, 1998c).
Inundação Amazônia 2009.
Foto: Ana Fischer, SVS/MS.
Como uma ciência integradora, a ASE busca superar
os limites das abordagens dominantes econômicas
(centrada nos preços de mercados que refletem a escassez atual de recursos naturais e não considerando
as consequências para gerações futuras), ecológicas
(tendência a deixar a sociedade e atividades econômicas de lado, sendo ambas vistas como forças “exter12
Investiação ambiental.
Foto: Leandro Giatti.
nas”) e das engenharias (busca de soluções pontuais
baseadas em estratégias de comando e controle).
A integração proposta pela ASE se faz através da análise de diferentes dimensões e atributos. Em relação
às dimensões são consideradas quatro grandes estratégias de análise. Na dimensão biofísica são avaliadas
as estruturas e funções dos ecossistemas, investigando fatores associados aos ciclos de nutrientes, fluxos
de energias, diversidade, dominância de espécies
biológicas, ciclos e sequestro de substâncias tóxicas
e a diversidade de habitats. Na dimensão socioeconômica, os aspectos econômicos e sociais são tratados
de forma conjunta, enfatizando as diferenças na capacidade produtiva dos ecossistemas, assim como a
atribuição de diferentes valores para o meio ambiente pelas populações, que repercutem diretamente nas
políticas econômicas dos países, independentemente
do estágio de desenvolvimento em que se encontrem. Na dimensão saúde humana é estabelecido o
nexo causal entre doenças e riscos à saúde humana
e o desequilíbrio do estado de saúde dos ecossistemas, independentemente de serem doenças infectocontagiosas ou crônico-degenerativas. E, por último,
no que consideram dimensão espaço-temporal, são
abordadas as diferentes respostas dos ecossistemas
às variadas formas de estresse, sejam uni ou multicausais, ao produzirem mudanças de efeito cumulativo e/ou sinérgico afetando a viabilidade do sistema. Por exemplo, sinais de disfunções observados
em componentes isolados em escala local em uma
análise tradicional e reducionista podem acabar por
considerar o ecossistema em questão como saudável.
Entretanto, padrões complexos inerentes às respostas dos ecossistemas sob estresse podem significar,
em larga escala espacial e temporal, disfunções que
tornam o mesmo ecossistema não saudável (exemplo
das atividades agrícolas no nível local que podem se
Enfoques ecossistêmicos em saúde – Perspectivas para sua adoção no Brasil e em países da América Latina
transformar em impactos para todo o sistema agropecuário) (Rapport, 1998b; Rapport, 1998c).
Em relação aos atributos, a ASE sugere oito critérios/
indicadores para a saúde de ecossistemas aplicáveis
na integração das dimensões explicitadas. Os três
primeiros critérios/indicadores (vigor, resiliência e
organização) são caracterizados por sua origem predominantemente biológica e permitem avaliar estrutura e funções dos ecossistemas, sendo considerados
os componentes primários da saúde de ecossistemas.
Os demais critérios/indicadores representam a capacidade de gestão, planejamento e sustentabilidade
das medidas de mitigação e de compensação tomadas
pela sociedade frente a situações de danos ambientais
(Rapport, 1998b; Rapport, 1998c). Os oito atributos
são descritos no Quadro 1.
O emprego da metáfora do paciente na ASE constitui
requisito fundamental para o sucesso dessa aborda-
gem, funcionando como uma poderosa ferramenta de
comunicação com o público em geral. Sua importância
reside na possibilidade de ampliação da noção de saúde
individual e/ou coletiva para a compreensão e avaliação
da saúde dos ecossistemas, assim como, a dependência da saúde individual à saúde do ecossistema em que
esteja inserida. Essa nova percepção da saúde acarreta
tanto no exercício de integração das ciências naturais
e sociais, como traz à tona discussões que objetivam
a melhor compreensão da complexidade associada ao
comportamento dos ecossistemas sob as diversas pressões que nele incidem (Rapport, 1998a).
A ASE entendida como uma proposta de integração
de ciências une duas perspectivas distintas: (a) uma
“científica” com a finalidade principal de elucidar
como um determinado ecossistema funciona, analisando possíveis padrões desejáveis (saudáveis) dos
ecossistemas mediante o uso de indicadores quantitativos multidisciplinares; (b) uma “valorativa” em que
Quadro 1: Atributos da Abordagem da Saúde de Ecossistemas
Nome do critério/indicador
Definição do critério/indicador
Vigor
Energia ou atividade de um ecossistema. Embora o estresse dos ecossistemas esteja
associado com menor vigor em termos de produtividade e potência/rendimento, isto
não significa que quanto mais alta a potência/rendimento, mais saudável será o ecossistema, pois esta pode depender de subsídios externos.
Resiliência
Capacidade de um sistema enfrentar o estresse e retornar ao estado anterior, quando
o estresse diminui ou termina.
Organização
Inter-relação entre os diferentes elementos bióticos e abióticos de cada ecossistema.
Ecossistemas sob estresse demonstram redução da riqueza de espécies, poucas relações simbióticas e mais espécies oportunistas entre seus elementos.
Manutenção dos Serviços dos Ecos- Critério para avaliação da saúde de ecossistemas. Refere-se às funções que beneficiam
sistemas
as comunidades humanas, tais como provisão (alimentos, água potável, recursos genéticos, etc.), regulação (do clima, dos ciclos das águas, etc.), suporte (formação dos
solos e ciclos de nutrientes) e culturais (lazer e turismo, valor espiritual e religioso).
Opções de Gestão
Ecossistemas saudáveis oferecem maior diversidade de potenciais de usos, tais como
colheitas/safras de recursos renováveis, recreação e provisão de água para consumo
humano. Ecossistemas sob estresse não oferecem muitas opções de uso ou não conseguem manter/suportar tais opções por longos períodos.
Subsídios Reduzidos
Ecossistemas saudáveis não requerem um aumento de subsídios para manter sua produtividade. Na agricultura, o trabalho e o uso de agrotóxicos e combustíveis fósseis
são insumos adicionais. Subsídios também ocorrem na forma de incentivos econômicos que encorajam a exploração de recursos naturais, sem que a produção obtida
internalize os custos ambientais e de saúde. Geralmente, esses custos tendem a ser
repassados para a sociedade e não para os empreendimentos que degradam.
Danos aos Sistemas Vizinhos
Ecossistemas podem prosperar a expensas de outros. Ocorre quando os resíduos ou
contaminantes de uma determinada região são transportados para além de suas fronteiras, ocasionando danos em ecossistemas não geradores dos mesmos.
Efeitos Sobre a Saúde Humana
A saúde humana pode ser uma medida sinóptica da saúde do ecossistema. Ecossistemas saudáveis são caracterizados pela sua capacidade de sustentar populações
humanas saudáveis.
Fonte: Adaptado de Rapport, 1998b
Enfoques ecossistêmicos em saúde – Perspectivas para sua adoção no Brasil e em países da América Latina
13
Como os ecossistemas podem mudar no
futuro? E quais seriam as implicações dessas
mudanças para a saúde humana?
Em todos os quatro cenários da Avaliação Ecossistêmica, as projeções de mudanças indicam o crescimento significa­tivo no consumo dos serviços dos ecossistemas, uma perda contínua da biodiversidade e uma
degradação progressiva de alguns serviços dos ecossistemas.
•Durante os próximos 50 anos, as projeções indicam
que a demanda por alimentos deve crescer entre 70 e
80 por cento, e a demanda por água entre 30 e 85 por
cento. Em países em desenvolvimento a captação de
água deve aumentar significativamente.
•A segurança alimentar não será alcançada, de acordo
com os cenários da Avaliação Ecossistêmica, até o ano
de 2050, e será difícil erradicar a subnutrição infantil,
apesar do aumento no suprimento de alimentos e de
dietas mais diversificadas.
•Uma severa deterioração dos serviços provenientes dos
recursos de água doce (tais como habitat aquático;
produção de pescado; abastecimento de água para
domicílios, indústrias e agricultura) é encontrada nos
cenários afetados por problemas ambientais. Menos
severa, mas também digna de nota, é a deterioração
prevista nos cenários que são mais proativos em relação aos problemas ambientais.
•Prevê-se que perdas de habitats e outras mudanças nos
ecossistemas levem a um declínio na diversidade de espécies nativas locais até o ano de 2050.
Nos cenários mais promissores relacionados à saúde,
o número de crianças subnutridas é reduzido, e o
peso de doenças epidêmicas tais como HIV/Aids, malária e tubercu­lose também diminui. Uma melhoria no
desenvolvimento e na distribuição de vacinas poderia
permitir às populações lidar melhor com a próxima
pandemia de influenza, ao mesmo tempo em que o
impacto de doenças novas, como a SARS, deve ser
também limitado por medidas de saúde pública bem
coordenadas.
Em um dos cenários menos promissores, as condições
sociais e de saúde de países ricos e pobres divergiriam,
e uma espiral negativa de pobreza, saúde em declínio
e ecossiste­mas degradados poderia se desenvolver. As
mudanças nos ecossistemas podem ocorrer em escala de tal magnitude que adviriam efeitos catastróficos
sobre os processos econômicos, sociais e políticos dos
quais depende a boa saúde humana. Por exemplo, a
disseminação da insegurança com relação aos alimentos, após mudanças climáticas intensas, falência das
instituições e degradação progressiva do solo poderiam agravar as desigualdades e levar a conflitos generalizados.
Fonte: “Ecosistemas y bienestar humano: Síntesis de la salud Un
informe de la Evaluación de los Ecosistemas del Milenio (EM)”
(Corvalan et al, OMS 2005)
14
consideram-se valores, interesses e direitos sociais,
que subsidiados pelo monitoramento de indicadores,
permitiria a avaliação de saúde ecossistêmica para os
possíveis cenários futuros do comportamento atual
(Rapport, 1998b; Rapport, 1998c).
Abordagem Ecossistêmica
em Saúde (AES)
A proposta apresentada pela AES envolve três aspectos fundamentais: a teoria dos sistemas complexos, a
hierarquia entre diferentes agrupamentos (hólons) e
a dinâmica dos ecossistemas frente às diferentes escalas (espaciais e temporais) e aspectos que devem
ser utilizados para seu estudo e compreensão. A AES
parte da premissa que as manifestações de doença
e de saúde ocorrem em contextos socioecológicos
complexos, caracterizando os ecossistemas como sistemas holárquicos abertos auto-organizáveis (SOHO
– self organizing holarquic open). Essa abordagem
busca determinar elos entre a saúde humana e as atividades ou eventos que perturbam o estado e a função ecossistêmica (Waltner-Toews, 2001 e 2004; Kay
e col., 1999).
O arcabouço teórico-metodológico desenvolvido na
AES foi delineado em função da complexidade inerente aos sistemas spcioecológicos que envolvem um
conjunto de agrupamentos hierárquicos em múltiplas
escalas (espaciais e temporais) que tendem a se organizar em círculos de retro-alimentação sociais e ecológicos. O que se objetiva ao analisar esta complexidade
é identificar pontos críticos de instabilidade que, por
vezes, podem resultar na emergência espontânea de
novas estruturas e formas de organização que conduzem a mudanças abruptas dos sistemas e podem resultar desde pequenas alterações até tragédias ambientais
envolvendo o surgimento de pragas ou epidemias
(Waltner-Toews, 2001 e 2004; Kay e col., 1999).
Nessa visão, as incertezas são inerentes aos sistemas
socioecológicos e conduzem a uma abordagem direcionada principalmente para os problemas ecossistêmicos e de saúde locais e regionais. Baseia-se no
pluralismo metodológico e incorpora fortemente os
princípios da participação social, de modo que, embora a metodologia proposta possua algumas diretrizes
básicas, a construção da abordagem de investigação e
análise dos ecossistemas, bem como a proposição de
estratégias de gestão e políticas públicas, concentra-se
nos processos de aprendizagem social e colaborativa
Enfoques ecossistêmicos em saúde – Perspectivas para sua adoção no Brasil e em países da América Latina
entre especialistas e atores sociais locais (Waltner-Toews, 2004; Kay e col., 1999).
vida, preocupações e perspectivas futuras (WaltnerToews, 2004; Lebel, 2003).
A participação e os processos de aprendizagem social e colaborativa podem conduzir a um tipo de
gestão adaptativa, que surge como uma alternativa
e ao mesmo tempo como um complemento à gestão
antecipatória tradicional. Na gestão adaptativa, as
diferenças entre como o futuro realmente se revela
e como foi antecipado que ele se revelaria, são vistas
como oportunidades de aprendizagem. O enfoque
adaptativo da AES presume que as decisões em torno das questões ambientais envolvem o mapeamento
da visão de como os territórios ou os ambientes devem co-evoluir como uma entidade auto-organizada.
Esse caminho também permite identificar quais são
os atores e interesses sociais em jogo, histórias de
Embora, assim como a ASE, a AES considere também
atributos/indicadores que permitam identificar se um
ecossistema se encontra saudável ou não, sua metodologia se encontra centrada no processo, estabelecido
em quatro etapas articuladas, conforme pode se verificar na Figura 1. Nas etapas descritas abaixo, são
considerados dois aspectos fundamentais: 1) as fronteiras de um ecossistema e/ou problema ambiental são
constituídas através da negociação entre os diferentes
atores sociais envolvidos; 2) os papéis e as responsabilidades dos diferentes atores sociais são definidos a
cada passo. Esses dois aspectos exigem daqueles que
se dedicam a esta abordagem a definição de regras claras de negociação, modos de envolver nos momentos
Figura 1: Diagrama das Etapas da Abordagem Ecossistêmica em Saúde
Apresentando a situação:
o ponto de partida
Análise de:
Apresentando questões:
queixas e/ou pesquisas/
agendas
Questões:
Ecológicas,
Sociais e
de Saúde
A história dada:
ecológica, física,
social, econômica,
governança, etc.
Diferentes atores,
equipe de pesquisa,
e outros interessados
Tomadores de
decisões, políticos
e outros com
poder de decisão
Ações e aprendizado colaborativo:
Monitorando e avaliando
indicadores: está se
tornando melhor
Implementação:
mudança a visão
em ações
As pessoas e suas histórias:
Múltiplas estórias sociais e ecológicas,
quadros e descrições do sistema
Descrições e narrativas do sistema:
desenvolvendo uma compreensão sistêmica:
Desenho de uma
abordagem adaptativa
para implementação
da nova visão e do
aprendizado colaborativo
Busca de soluções:
diálogos transversais,
negociando trad-offs,
criando visões, narrativa
futura coletiva
Análise do sistema:
Qualitativa: quadros, modelos conceituais,
diagramas do sistema, diferentes perspectivas
através das escalas
Quantitativa: simulações, SIGs,
modelos matemáticos
Síntese do sistema:
Qualitativa: narrativas, estórias possíveis,
trad-offs, oportunidades e constrangimentos
Quantitativa: cenários, trad-offs, custos
e benefícios
Fonte: adaptado de Waltner-Towes e col., 2002
Enfoques ecossistêmicos em saúde – Perspectivas para sua adoção no Brasil e em países da América Latina
15
apropriados os diferentes atores com interesses conflituosos, modos de resolver os conflitos e estratégias
para manter a participação dos atores até o fim do
processo (Waltner-Toews, 2004; Lebel, 2003).
A primeira etapa do processo consiste em definir a situação/problema (articulando uma agenda sobre problemas que devem ser compreendidos e resolvidos) envolvendo a comunidade local, e a partir daí, desenvolver
uma narrativa sobre as mudanças-chave, tendências e
padrões, presentes e passadas, percebidas e identificadas pela comunidade e pesquisadores. Essa etapa, que
não é exaustiva e oferece um rico contexto, fornece uma
base que permite compreender como um determinado sistema socioecológico chegou ao presente estado
(Waltner-Toews, 2001 e 2004; Kay e col., 1999).
A segunda etapa envolve a análise de três componentes:
1) os diferentes atores sociais e interesses envolvidos;
2) as questões socioecológicas; 3) as estratégias de políticas públicas e governança. A análise dos diferentes
atores sociais e interesses não só procura identificar
quem pode e deve tomar parte nas diferentes etapas
de pesquisa e de gestão do problema, mas também as
diferentes “versões” da realidade, representando a pluralidade de perspectivas de uma variedade de grupos.
Essa análise fornece elementos para incorporar e recon-
Reunião comunidade
Fonte: www.manuelzao.ufmg.br
ciliar os diferentes atores sociais e interesses na agenda
de pesquisa e gestão. A análise das questões socioecológicas ocorre a partir de técnicas participativas que
envolvem os diferentes atores e permite identificar problemas e oportunidades de gestão dos mesmos. Através
desta análise identificam-se tanto as variáveis endógenas e exógenas de cada questão e suas interações com
outras questões, como também os elementos-chave que
os atores locais consideram importante na descrição do
sistema e que representarão elementos para mudanças
ou manutenção do status quo. A análise de políticas
públicas e governança devem permitir descrever um
contexto mais amplo e as estruturas relevantes para as
mesmas que constranjam ou facilitem a capacidade local de lidar com os problemas. Fornece elementos para
identificar, em um contexto mais amplo, o necessário a
ser transformado para facilitar a busca de metas sustentáveis pelas sociedades locais (Waltner-Toews, 2001 e
2004; Kay e col., 1999).
O resultado das duas etapas é uma série de narrativas,
quadros e descrições de como o sistema socioecológico está e também uma visão do que deve mudar na
situação atual. Estas narrativas, nas suas várias formas,
servem de base para um processo mais formal de desenvolvimento de uma compreensão sistêmica da situação (Waltner-Toews, 2004; Kay e col., 1999).
Que ações são necessárias para tratar
as consequências das mudanças nos
ecossistemas em relação à saúde humana?
Há duas formas de se evitar doenças e danos causados
pela ruptura dos ecossistemas. Uma delas é prevenir, limi­
tar ou gerenciar os danos ambientais; a outra é promover
qualquer alteração que seja necessária para proteger os
indivíduos e as populações contra as consequências das
mudanças nos ecossistemas. Dois aspectos precisam ser
considerados a fim de se entender os potenciais impactos
negativos sobre a saúde das mudanças nos ecossistemas:
a vulnerabilidade atual (e provavelmente também futura)
das populações e suas futuras capacidades de adaptação.
Esses dois aspectos estão intimamente relacionados. As
forças que colocam as populações em risco (tais como
a pobreza e altas cargas de doenças) em muitos casos
também reduzem a capacidade dessas populações de
prepararem-se para o futuro.
Fonte: “Ecosistemas y bienestar humano: Síntesis de la salud Un
informe de la Evaluación de los Ecosistemas del Milenio (EM)”
(Corvalan et al, OMS 2005)
A terceira etapa é de desenvolvimento de uma compreensão sistêmica das descrições e narrativas do sistema
socioecológico. Envolve dois componentes, a análise
quantitativa e qualitativa do sistema e a síntese das
descrições do sistema, que permitem compreender
como as várias narrativas interagem com cada uma
para criar o que reconhecemos como sistema. A análise do sistema consiste essencialmente na construção
de um modelo conceitual que descreve espacialmente
e temporalmente quais são os elementos-chave da situação e como estes se encontram interconectados e
inter-relacionados, identificando os importantes processos que conformaram a mesma. Esta análise pode
iniciar de modo qualitativo e por vezes simples, fornecendo importantes insights e sugestões para ações e,
quando dados e informações estão disponíveis, inclui
análises quantitativas chegando a envolver modelos
estatísticos, simulações e análises espaciais. A síntese
das descrições do sistema objetiva reconstruir um modelo do sistema como um todo e analisá-lo em termos
de saúde e sustentabilidade, identificando quais são os
pontos-chave de interseção entre os vários submodelos e as narrativas futuras (cenários) que constituem
a base da elaboração de hipóteses sobre os prováveis
resultados de intervenções particulares. Esses modelos e narrativas futuras tornam-se a base das políticas
públicas que sejam capazes de considerar as múltiplas
perspectivas e metas envolvidas e possibilitar aos tomadores de decisões definirem um leque de opções de
gestão factíveis e balancear as inter-relações entre os
aspectos sociais, econômicos e ecológicos (WaltnerToews, 2001 e 2004; Kay e col., 1999).
Com a descrição e compreensão do sistema socioecológico em mãos, inicia-se a quarta etapa, que consiste
nos seguintes componentes: 1) trabalhar com os diferentes atores relacionados ao ecossistema para encontrar caminhos que permitam negociar elementos
que se intercambiam; 2) projetar abordagem adaptativa para implementar um aprendizado colaborativo;
3) implementar mudanças; 4) monitorar e avaliar as
mudanças, de modo que se possa aprender com elas.
O objetivo dessa etapa é colocar em ação um processo adaptativo e colaborativo de aprendizagem para a
sustentabilidade do ecossistema e da saúde (WaltnerToews, 2001 e 2004; Kay e col., 1999).
Ao mesmo tempo em que se ampara nas correntes
compreensões sobre sistemas complexos, AES se pretende participativa e prática, tanto no modo como formalmente analisamos e sintetizamos a compreensão
de sistemas multidimensionais, como nos aspectos
referentes às intervenções e monitoramento das mesmas, bem como os ajustes necessários.
Como podem ser priorizadas as ações que
tratam das consequências para a saúde
humana das mudanças nos ecossistemas?
A priorização das ações que tratam das consequências
para a saúde humana das mudanças nos ecossistemas
deve refletir as prioridades e os valores de todos aqueles que são afetados pelas ações propostas. As decisões
finais sobre a priorização, portanto, devem ser tomadas
ou pelos próprios indivíduos ou por seus representantes
políticos legítimos, e baseadas nesses valores. Avaliações científicas podem funda­mentar esse processo de
tomada de decisão. As avaliações da carga de doenças,
conduzidas no contexto de uma Avaliação de Impacto na Saúde, são apropriadas para a agregação desses
impactos, os quais surgem por meio de uma série de
mecanismos. Tais avaliações podem, potencialmente,
ajudar no estabelecimento de prioridades e tomada de
decisões no contexto de mudanças em ecossistemas.
Entretanto, devem ser consideradas apenas como um
dos componentes da evidência, já que não podem responder totalmente pela com­plexidade das causas, pelas
escalas de longo prazo e pela irreversibilidade potencial.
Essas propriedades importantes precisam ser incluídas
nas considerações finais sobre qualquer resposta a mudanças ecológicas.
Fonte: “Ecosistemas y bienestar humano: Síntesis de la salud Un
informe de la Evaluación de los Ecosistemas del Milenio (EM)”
(Corvalan et al, OMS 2005)
Enfoques ecossistêmicos em saúde – Perspectivas para sua adoção no Brasil e em países da América Latina
17
Foto: All type Assessoria Editorial
Enfoques ecossistêmicos e
saúde pública – um breve
panorama para o Brasil
No Brasil, em livros ou capítulos, ou mesmo em revistas, encontramos textos que vêm tratando dos enfoques ecossistêmicos em saúde desde pelo menos
2001.
Possas (2001), no artigo Social ecosystem health: confronting the complexity and emergence of infectious diseases, trata da complexidade de transição epidemiológica e aponta que esta deve envolver simultaneamente
os aspectos sociais e ecológicos na compreensão da
emergência e reemergência de doenças infecciosas.
Para a autora, analisadas em uma perspectiva que integre o social e o ecológico, as doenças emergentes e
reemergentes vêm colocando uma série de desafios
para a saúde pública nos níveis nacional e global. A
autora argumenta que as abordagens tradicionais e
isoladas são insuficientes para enfrentar a complexidade dos problemas, exigindo-se uma abordagem
transdisciplinar, denominada de “ecossistema social e
saúde”, a qual deve incorporar distintas perspectivas
em um referencial teórico abrangente.
Minayo (2002), no início do capítulo “Enfoque ecossistêmico de saúde e qualidade de vida” do livro Saúde e
Ambiente Sustentável: estreitando nós, considera o “enfoque ecossistêmico de saúde como uma das possibilidades de construção teórico-prática das relações entre
saúde e ambiente nos níveis microssociais, dialeticamente articulados a uma visão ampliada de ambos os
componentes” (Minayo, 2002:173). Nesse texto, a autora chama a atenção para muitas das possibilidades desse enfoque, que, além de integrado, prevê ampla participação social na análise dos problemas ambientais
e na busca de soluções a eles relacionadas. Entretanto,
ela considera que, para um enfoque que se pretende
integrado, existem ainda desafios metodológicos e de
caráter operativo, que devem ser trabalhados para a viabilização de respostas aos problemas teóricos centrais
Projeto Caruso. Foto: Jean Remy.
Freitas (2005), no capítulo de livro publicado “As
Ciências Sociais e o Enfoque Ecossistêmico em
Saúde”, publicado no livro organizado por Minayo
e Coimbra Críticas e Atuantes – Ciências Sociais e
Humanas em Saúde na América Latina realiza uma
reflexão sobre os desafios das Ciências Sociais nas
questões relacionadas à saúde ambiental, tendo
como base o enfoque ecossistêmico de saúde. Procura problematizá-lo e refletir sobre suas interfaces
com as ciências sociais a partir da perspectiva de
integrar uma compreensão que envolva os aspectos
biofísicos com os sociais, mas que isto não resulte
em um empobrecimento das teorias sociais sobre
os problemas ambientais, como vem ocorrendo na
atualidade e na maioria dos estudos que adotam enfoques ecossistêmicos em saúde.
Criadouro de mosquitos
Foto: Maria Pia Quiroga. Acervo OPAS/OMS
do mesmo. Entre esses desafios cita, como exemplos,
diagnósticos e análises sociológicas e antropológicas
dos problemas em questão, incluindo fatores históricos,
econômicos, culturais, sociais, de exercício do poder, da
atividade produtiva e reprodutiva.
Augusto, Carneiro e Martins (2005) organizaram um
livro intitulado “Abordagem Ecossistêmica em Saúde
– Ensaios Para o Controle de Dengue”, que tem um
capítulo específico, de autoria de Abrahão (Abrahão,
2005: 137-145), dedicado ao tema do livro e intitulado “Dengue, abordagem ecossistêmica”. Para o autor,
as epidemias de dengue constituiriam muito mais a
evidência da crise ambiental e social do que qualquer
outra coisa. Essa forma de compreensão exigiria uma
abordagem ecossistêmica em substituição ao modelo
químico dependente, de modo a se respeitar os sistemas ambientais de suporte a vida através de projetos
interdisciplinares, trans-setoriais e a ação ativa, inteligente e contínua das redes participativas e sociais
sobre os condicionantes socioambientais.
20
Gomez e Minayo (2006) procuram situar historicamente as abordagens da saúde para os problemas de saúde
ambiental desde o século XVIII, para apontar as propostas de mudanças no paradigma da área da saúde que
são ressaltadas no Modelo Lalonde (Canadá) e na Carta
de Otawa. A partir daí, apresentam a abordagem ecossistêmica que vem sendo desenvolvida principalmente
no Canadá e que possuem, dentre suas vantagens, compreender os problemas de modo contextualizado e em
sua complexidade; envolver os diversos atores sociais,
“empoderando” sujeitos a partir da participação social e
adotar perspectivas inter e transdisciplinares. Os autores destacam que não existe um paradigma estabelecido como método científico para esse enfoque, de modo
que pode-se considerar que é muito mais um modelo
e uma metáfora que envolve todos os envolvidos como
construtores do ­mesmo.
Por fim, Freitas e col. (2007) realiza uma revisão dos
artigos científicos publicados em revistas de saúde
pública da América Latina. Considerando os detalhes dos resultados, que nos trazem mais elementos
para reflexão, tratamos dos mesmos no próximo
item.
Porém, antes de passar para o próximo item, é importante destacar dois aspectos. O primeiro é que há uma
nítida tendência de vinculação dos enfoques ecossistêmicas em saúde adotados nos textos citados com a
perspectiva proposta pela AES. O segundo é que há
uma predominância de trabalhos de caráter teórico e
conceitual, havendo uma carência de textos que resultem de trabalhos empíricos.
Enfoques ecossistêmicos em saúde – Perspectivas para sua adoção no Brasil e em países da América Latina
Enfoques ecossistêmicos
nas revistas de saúde
pública da América Latina
Nesse item, damos continuidade à análise realizada
por Freitas (2007) sobre estudos que tivessem as palavras ecohealth, ecosystem ou ecossistema ou como
termos do assunto, realizados por pesquisadores da
América Latina ou sobre seus países, publicados nas
revistas latino-americanas de saúde pública disponíveis no Scielo (http://wwww.scielosp.org). Um refinamento deste levantamento foi realizado em dois
suplementos especiais dos Cadernos de Saúde Pública
sobre abordagens ecossistêmicas em saúde, sendo os
volumes 17 (An ecosystem approach in human health: communicable and emerging diseases, 2001) e 25
(Ecosystem approaches to controlling vector-borne diseases: dengue and chagas disease, 2009), já que, principalmente neste último volume, alguns artigos, ainda
que adotando essas abordagens, não tinham no título,
resumo ou palavras-chave nenhuma dos descritores
utilizados para busca. Esse levantamento realizado do
modo mais amplo possível e não se limitando somente ao resumo, título ou palavras-chave, pois focou no
assunto, nos revela um quadro, ainda que não exaustivo, importante para refletirmos sobre os potenciais,
limites e desafios desses enfoques em nossos países.
Foram identificados 45 artigos cobrindo um período entre 2000 e 2009, publicados principalmente nos
Cadernos de Saúde Pública (N=36), vindo em seguida
a Revista de Saúde Pública (N=5) e Ciência & Saúde
Coletiva (N=2) e um em outras duas revistas (Revista
de Salud Publica e Revista Cubana de Salud Publica).
Cerca de um quarto dos artigos (N=11) tratou o ecossistema como um lugar que foi modificado e tornouse propício às doenças com a presença dos vetores e
dos agentes patogênicos, 10 eram estudos epidemiológicos em que o ecossistema é uma variável ambiental
(do total de estudos, apenas 2 tratavam de agentes químicos, no caso mercúrio), 6 tinham como referência
o enfoque da ecologia de vetores; 2 faziam a interface
entre a ecologia de vetores e o ecossistema como lugar
modificado; 2 eram estudos de avaliação de programas
ou de conhecimento da população adotando questionários combinados com dados quantitativos sobre o
ambiente e os problemas de saúde. Por fim, 14 artigos
Foto: All type Assessoria Editorial
adotavam enfoques ecossistêmicos que, em maior ou
menor grau, tinham como pressupostos combinar:
(1) reunião de informações diversas, que possibilitem
demonstrar as interfaces entre bens e serviços dos
vários ecossistemas que devem ser equilibradas com
as metas ambientais, políticas, sociais e econômicas;
(2) formulação de políticas públicas amplas e instituições mais efetivas para implementar as mesmas; (3)
participação do público na gestão dos ecossistemas,
particularmente as comunidades locais.
Dos 14 artigos que adotaram enfoques ecossistêmicos,
um quarto (N=5 foram de caráter teórico-conceitual,
sendo 2 por pesquisadoros de instituições brasileiras
(Possas, 2001; Freitas, 2007) e 3 por pesquisadores de
instituições do Canadá (Nielsen, 2001; Waltner-Toews, 2001; Boischio e col., 2009). Os outros artigos que
envolveram trabalho de campo estavam distribuídos
geograficamente do seguinte modo: 7 publicados por
pesquisadores de instituições da América Latina, tais
como Peru (Murray & Sánchez-Choy, 2001), Colômbia (Carrasquilla, 2001; Rojas, 2001), Paraguai (Rojasde-Arias, 2001), Argentina (Sosa-Estani e col., 2001),
Equador (Breilh, 2007), Cuba (Díaz e col., 2009); 1
publicado por pesquisador de instituições da Suécia
(Follér, 2001). O último, embora publicado em uma
revista de saúde pública da América Latina não era de
Enfoques ecossistêmicos em saúde – Perspectivas para sua adoção no Brasil e em países da América Latina
21
International Development Research Centre (IDRC)
do Canadá, seja para as pesquisas, seja para a publicação de seus resultados em dois suplementos especiais
dos Cadernos de Saúde Pública. Se por um lado indica
um claro estímulo do IDRC à pesquisas adotando este
enfoque, também revela uma certa dependência desta
agência financiadora.
Reunindo informações diversas
Comunidade andina.
Foto: All type Assessoria Editorial
pesquisadores do continente ou sobre países do mesmo, envolvendo a cooperação entre pesquisadores do
Quênia, Suíça e Itália (Baumgärtner e col., 2001).
Os dados acerca do levantamento nas revistas científicas específicas de saúde pública na América Latina revelam que a palavra ecohealth, ecosystem e ecossistema
só recentemente vem sendo incorporada (os artigos
mais antigos datam de 2000) e que na maioria dos artigos o ecossistema não é tratado de forma sistêmica,
mas como uma variável ou lugar do vetor (ecologia
de vetores), do hospedeiro, do agente patogênico, da
doença e da intervenção. Podemos afirmar que ainda é pequena a produção científica expressa na forma
de artigos que tratem de considerar a interface ecossistemas e saúde humana, sendo ainda restrita a que
integra esta interface por meio do desenvolvimento de
enfoques ecossistêmicos em saúde. Chama a atenção o
caso brasileiro, já que ao mesmo tempo que concentra
grande parte da produção científica em suas revistas,
com dois números especiais sobre o tema, é também
o país que carece da publicação de estudos de campo
que tenham adotado esse enfoque.
Assim, podemos constatar que embora os enfoques
ecossistêmicos para a saúde humana venham cada vez
mais ocupando espaço na agenda de pesquisas orientadas para a solução de problemas de saúde ambiental,
ainda há poucos trabalhos desenvolvidos e resultados
de pesquisas de campo. Sobre isto chama a atenção
que cerca de um terço dos artigos identificados utilizando este enfoque (5 em 14) sejam de caráter teóricoconceitual, o que pode significar que nos encontramos
ainda em uma fase de formulação e divulgação desses enfoques e não de uma elaboração resultante do
acúmulo de trabalhos envolvendo pesquisas de campo. Chama também a atenção que dos 14 artigos, 12
tenham envolvido diretamente o financiamento do
22
A maioria dos artigos envolveu a reunião de informações diversas, que podem ser classificadas em dois
grandes grupos.
O primeiro grupo trata das principais variáveis que foram tratadas nos mesmos. Nesse grupo, encontramos
em primeiro lugar as variáveis ambientais, ecológicas
ou relacionadas ao ecossistema, tratando-as como:
fontes de recursos naturais; paisagem modificada que
desregula a relação dos humanos com o ecossistema
e favorece as doenças; como resultado das interações
entre os diversos aspectos que regulam os ecossistemas
e propiciam ou não o surgimento de doenças, como
chuvas, umidade, temperatura, aquecimento global,
El Nino, La Nina, etc. Além destes foram encontradas
também as econômicas, sociais e culturais, além das
doenças como indicador do contexto do ecossistema,
bem como sobre os impactos para a redução de doenças após intervenções que envolviam desde aspectos
culturais e sociais, até as relacionadas ao contexto do
ecossistema.
Foto: Maria Pia Quiroga. Acervo OPAS/OMS
Enfoques ecossistêmicos em saúde – Perspectivas para sua adoção no Brasil e em países da América Latina
O segundo grupo trata das principais escalas que foram tratadas nos mesmos. No nível mais próximo dos
indivíduos, encontramos abordagens que trataram da
familiar/doméstica/residencial. A partir daí, as escalas
consideradas trataram da vizinhança, da aldeia, da comunidade, da paisagem, do município, da região, do
país e mesmo da escala global (principalmente para
mudanças climáticas).
Em relação às escalas é importante observar que tanto a ASE como a AES tratam das trabalhadas nos artigos. Entretanto, o enfoque da AES, privilegia muito
mais a interface entre os níveis doméstico/residencial e vizinhança/aldeia/comunidade/paisagem, de
modo que, ainda que se refiram as outras escalas, as
locais predominam. Porém, como observado no Millenium Ecosystem Assessment (MEA, 2005), uma
avaliação completa das interações entre os humanos
e ecossistemas requer uma abordagem multi-escala,
de modo a permitir que a análise das forças exógenas a um dado local ou região permitam avaliar o
impacto diferencial das mudanças nos ecossistemas
sobre o bem-estar humano e a saúde, e apontar para
respostas diferenciadas e combinadas nas diferentes
escalas. Assim, o fato de os estudos analisados centrarem-se na escala local, embora importante, surge
como ainda limitado para a busca de soluções dos
problemas.
Nos artigos, dos oito atributos considerados na ASE,
apenas os efeitos sobre a saúde humana foram efetivamente considerados, tendo sido doenças específicas,
como doença de Chagas, malária, leishmaniose e dengue o ponto de partida da maioria dos estudos. Em menor grau a manutenção dos serviços dos ecossistemas,
atributo que vem emergindo como um critério chave
para avaliação da saúde de ecossistemas, foi considerado, assim mesmo de forma bastante limitada.
Serviços de ecossistemas é um atributo que se refere
às funções que beneficiam as comunidades humanas, tais como suporte (formação dos solos e ciclos de
nutrientes, produção primária), provisão (alimentos,
água potável; combustíveis, fibras, compostos bioquímicos, recursos genéticos), regulação (clima, ciclos de
águas e purificação da mesma, doenças, enchentes,
secas, e degradação dos solos) e culturais (recreação
e turismo, valor espiritual e religioso, educacionais,
herança cultural e sensação de lugar). Vem sendo considerado em programas como o MEA e incorporado
pela Organização Pan-Americana da Saúde e Orga-
Foto: Maria Pia Quiroga. Acervo OPAS/OMS
nização Mundial da Saúde (OPS, 2005) em atributos
chaves para a consideração dos aspectos de saúde e de
bem-estar humano.
De acordo com o documento Ecossistemas e Saúde
Humana: alguns resultados da Avaliação Ecossistêmica
do Milênio:
A Avaliação Ecossistêmica do Milênio trata de avaliar como as mudanças nos serviços dos ecossistemas
influem no bem-estar humano. Supõe-se que o bemestar humano tem constituintes múltiplos. Eles incluem a saúde, considerada como sentir-se bem e ter
um ambiente físico circundante saudável, o ar limpo
e o acesso à água limpa; o material mínimo para uma
vida boa, as formas de vida seguras e adequadas,
alimentos suficientes a todo momento, a moradia, o
vestuário, e o acesso a produtos; as relações sociais,
incluindo a coesão social, respeito mútuo e capacidade de ajuda a outros, especialmente às crianças;
a segurança, o acesso seguro aos recursos naturais e
a outros recursos, a segurança pessoal, e a vigilân­cia
dos desastres naturais ou provocados pelo ser humano; por fim, a liberdade de escolha e de ação, incluindo a oportunidade de alcançar o que um indivíduo
valoriza como ser e fazer.
Tendo como referência os documentos do MEA
(2005) e da OPS (2005), podemos concluir que a relação saúde, bem estar e serviços de ecossistemas é
bastante complexa e exige a reunião de informações
diversas sobre os ecossistemas e os aspectos sociais,
econômicos e culturais nos quais os humanos se inserem.
Dos 7 artigos que envolveram trabalho de campo
de pesquisadores de instituições da América Latina
(Murray & Sánchez-Choy, 2001; Carrasquilla, 2001;
Enfoques ecossistêmicos em saúde – Perspectivas para sua adoção no Brasil e em países da América Latina
23
Rojas, 2001; Rojas-de-Arias, 2001; Sosa-Estani e col.,
2001; Breilh, 2007 e Díaz e col., 2009), foram capazes
de reunir um conjunto de informações bastante diversas e, ainda que de modo bastante geral, demonstraram as interfaces entre bens e serviços dos vários ecossistemas e suas interfaces com aspectos econômicos,
sociais e culturais. É importante observar que, embora
esses aspectos não sejam exclusivos da AES, sua própria abordagem favorece que sejam tratados de modo
mais contextual. O maior limitante destes artigos se
refere exatamente ao fato de, apesar de citarem outros
níveis de escalas ou dimensões ecológicas, não as terem trabalhado de modo articulado com os outros,
centrando-se nos locais. Apenas 2 artigos buscaram
estabelecer relação dos problemas locais com a dinâmica global (Murray e Sanchez, 2001; Breilh, 2007).
De qualquer modo, para que se possa avançar na reunião de informações diversas e construir indicadores
numa abordagem ecossistêmica, Freitas e col. (2007)
argumentam que existem ainda barreiras para serem
superadas nos países da América Latina, tanto em relação a quantidade de dados disponíveis, como também a sua qualidade, que acabam por limitar o potencial de reunião de informações diversas, um dos pressupostos de abordagens integradas como os enfoques
ecossistêmicos. Estas barreiras são:
1)a pouca tradição e restrita disponibilidade de dados
ambientais e de ecossistemas, comparado com dados sociais ou econômicos (Jannuzzi, 2004; IBGE,
2008);
2)dados e medições idealmente específicos para um
ecossistema em questão, apresentam limitações
para serem extrapolados para outras escalas (bioregiões, ecodistritos) e não costumam ser facilmente
enquadrados nos limites políticos-administrativos
de municípios ou estados. (Niemeijer, 2002);
3)a fragilidade institucional (ausência ou precariedade dos recursos humanos, técnicos e financeiros necessários) que tem como consequência tanto a inexistência ou mesmo descontinuidade dos
programas de monitoramento dos ecossistemas,
como a baixa qualidade de muitos dos dados disponíveis.
Além destas barreiras, existe ainda uma questão geral que é a dificuldade de determinação de valores ou
estados de saúde de ecossistemas que sejam tomados
como referência, já que muitas vezes envolve julga24
Foto: Maria Pia Quiroga. Acervo OPAS/OMS
mentos subjetivos sobre o que deve ser considerado
“normal” ou “aceitável”.
Formulando mudanças nas
instituições e nas políticas
O segundo pressuposto considera que um enfoque
ecossistêmico necessariamente envolve a formulação
de políticas públicas amplas e instituições mais efetivas para a implementação das mesmas. A idéia básica é que conhecido o problema através da reunião de
informações diversas, este conhecimento deve estar
conectado com o que fazer acerca do mesmo. Isto envolve formular um conjunto de políticas ou medidas
– intervenções legais, econômicas, financeiras, institucionais e sociais – que reduzam ou eliminem os
impactos diretos e indiretos sobre os ecossistemas e
que direta e indiretamente afetam a saúde e o bem estar humano (Freitas e col., 2007). Esta idéia básica se
encontra presente nas duas vertentes abordadas neste
texto, a ASE e a AES
Dos 7 artigos analisados, 3 centraram-se no diagnóstico dos problemas ambientais, não propondo mudanças institucionais ou mesmo formulando políticas pú-
Enfoques ecossistêmicos em saúde – Perspectivas para sua adoção no Brasil e em países da América Latina
blicas voltadas para a prevenção e controle do problema. Os outros 3 artigos conectaram diagnóstico com
propostas de mudanças institucionais e formulação de
políticas públicas, sendo que quase todos centraramse na escala residencial/comunidade, indo no máximo
até a escala municipal. Mesmo artigos que incluíram a
escala global (Murray e Sanchez, 2001; Breilh, 2007),
não avançaram em proposições sobre a necessidade
Quais são as implicações sobre políticas de
ação das ameaças que as mudanças nos
ecossistemas apresentam à saúde humana?
Medidas para garantir que a sustentabilidade ecológica
proteja os serviços dos ecossistemas, e portanto venha a
beneficiar a saúde humana a longo prazo.
Quando uma população é afetada por doenças relacio­
nadas à pobreza e à falta do “direito fundamental” – direi­
to de acesso cultural ou socialmente determinado a recur­
sos es­senciais como abrigo, alimento ou água limpa –, o
provimento desses recursos deve ser a prioridade máxima
da política de saúde pública.
Onde danos à saúde são causados, direta ou indireta­
mente, pelo consumo excessivo de serviços dos ecossiste­
mas (tais como alimentos e energia), reduções substanciais
no consumo trariam benefícios importantes para a saúde,
reduzindo simultaneamente a pressão sobre os sistemas de
sustentabilidade humana.
Populações crescentes e economias crescentes estão associa­
das a um maior consumo. Isso aumenta certos riscos à saú­
de, tais como excessos alimentares e inatividade física, assim
como aumentam as pressões globais sobre os ecossistemas.
• A implementação de melhores sistemas e práticas de trans­
porte pode levar à redução de lesões, ao aumento da ativida­
de física nas populações sedentárias e conse­quentemente à
redução da obesidade e das doenças cardiovasculares, bem
como reduções na poluição do ar em uma localidade e emis­
são de gases causadores do efeito estufa.
•A integração de políticas nacionais de agricultura e se­
gurança alimentar com os objetivos econômicos, sociais
e ambientais de desenvolvimento sustentável poderia ser
alcançada, em parte, ao se assegurar que os custos am­
bientais e sociais de produção e consumo sejam mais
fielmente refletidos no preço dos alimentos e da água. A
redução do consumo reduzido de produtos animais em
países ricos resultaria em benefícios para a saúde huma­
na e para os ecossistemas.
Políticas intersetoriais, que promovam o desenvolvimento
ecologicamente sustentável e direcionem forças motrizes
subja­centes, serão também essenciais. A Agenda 21 e a
de mudanças nas instituições que operam em escala
regional ou global (PNUMA, OMS, Bird, Banco Mundial, FMI, OMC, etc.) e cujas decisões afetam o nível
local, assim como intervenções para a reorientação
da política e economia global (que reconhecidamente
contribuem para aguçar a pobreza e gerar problemas
globais, como mudanças climáticas e a perda da biodiversidade).
Declaração do Rio sobre Meio Ambiente e Desenvolvimen­
to descrevem uma abordagem abrangente do desenvolvi­
mento ecologi­camente sustentável, que incorpora políticas
intersetoriais. As seguintes estratégias são de relevância
específica para a saúde humana:
•Estratégias de mitigação que reduzem e redirecionam
as alterações nos ecossistemas, melhorando simultanea­
mente a saúde humana.
•Estratégias de adaptação, a fim de reduzir os efeitos da
ruptura dos ecossistemas na saúde (tratando dos impac­
tos diretos, indiretos e de longo prazo na saúde humana).
•Ações integradas para a saúde, tais como a avaliação do
impacto dos principais projetos, políticas e programas de
desenvolvimento, bem como a análise dos indicadores es­
tatísticos para a saúde e o desenvolvimento susten­tável.
•Inclusão da saúde nos esforços de planejamento para
o desenvolvimento sustentável, tais como a Agenda 21,
em acordos ambientais e de comercialização multilate­
rais e em estratégias de redução da pobreza.
•Melhoria na colaboração intersetorial entre diferentes es­
feras de governos, instituições governamentais e ONGs.
•Iniciativas internacionais de desenvolvimento de capa­
cidades, que avaliem as ligações entre saúde e meio am­
biente, e usem o conhecimento adquirido para dar res­
postas mais efetivas às ameaças ambientais, em termos
de políticas de ação nacionais e regionais.
•Disseminação de conhecimento e boas práticas sobre
ganhos na saúde obtidos por meio de uma política de
ação intersetorial.
A degradação atualmente em curso dos serviços de ecossis­
temas é uma barreira significativa para o alcance dos Obje­
tivos de Desenvolvimento do Milênio. A utilização ecologi­
camente não-sustentável dos serviços dos ecossistemas ele­
va o potencial de mudanças ecológicas graves e irreversíveis.
As mudanças nos ecossistemas podem ocorrer em escala de
magnitude tal que produzam um efeito catastrófico sobre
os processos econômicos, sociais e políticos dos quais a es­
tabilidade social, o bem-estar humano e a boa saúde são
dependentes. Isso sugere que uma abordagem preventiva
com relação à proteção ambiental configura-se como a mais
apro­priada para proteger e melhorar a saúde. Incertezas ine­
vitáveis sobre o impacto das mudanças ambientais globais
na saúde pública não devem servir de desculpa para o adia­
mento na tomada de decisões sobre políticas de ação.
Fonte: “Ecosistemas y bienestar humano: Síntesis de la salud Un informe de la Evaluación de los Ecosistemas del Milenio (EM)” (Corvalan et al,
OMS 2005)
Enfoques ecossistêmicos em saúde – Perspectivas para sua adoção no Brasil e em países da América Latina
25
Envolvendo a participação
do público na gestão
Como já apontado, para os enfoques ecossistêmicos a
participação do público na gestão dos mesmos, particularmente as comunidades locais, é considerado um
elemento essencial. Na ASE, a participação do público,
embora seja considerada importante, não é desenvolvida como elemento integrante de sua metodologia. O
pesquisador é o principal formulador das hipóteses e
analista dos resultados. Na AES, ao contrário, a participação é considerada elemento integrante. O pesquisador procura envolver os diferentes atores na formulação
de hipóteses e análises dos resultados, tendo por base a
perspectiva de envolver processos de aprendizagem social e colaborativa entre especialistas e atores sociais locais que conduzam à gestão adaptativa dos problemas.
Dentre os 7 artigos publicados por pesquisadores de
instituições latino-americanas, a maioria envolveu a
participação direta do público ou da comunidade local na pesquisa. Em mais da metade, a participação
se deu predominantemente no momento do desenvolvimento de estratégias de prevenção pontuais e
locais, centradas na educação e com a participação
da comunidade ocorrendo durante a elaboração dos
materiais educativos e na produção e distribuição
das telas protetoras de mosquitos para a prevenção
da malária.
Serviços dos ecossistemas e saúde humana
ÁGUA DOCE
A água doce é um recurso essencial para a saúde humana; ela é utilizada para produzir alimentos, para se beber,
lavar, cozinhar e para a diluição e reciclagem de resíduos.
Globalmente, a quantidade de água disponível por pessoa
caiu de 16.800 m3/pessoa/ano, em 1950, para 6.800 m3/
pessoa/ano em 2000. Um terço da população mundial vive
em países que vivenciam preo­cupações, de moderadas a
altas, associadas à água, e essa fração está crescendo à
medida que cresce a demanda da população e a demanda
per capita por água. As principais consequências disso são
impactos negativos na produção de alimentos, na transmissão de doenças e no desenvolvimento econômico.
Mais de 1 bilhão de pessoas enfrentam carência no
abasteci­mento de água limpa e segura, enquanto 2,6 bilhões de pessoas não têm acesso a um saneamento básico
adequado. Isso tem provocado uma contaminação microbiológica generalizada da água potável. Doenças infecciosas associadas à qualidade da água tiram até 3,2 milhões
de vidas a cada ano, aproximadamente 6% das mortes em
26
Em outros 3 artigos deste universo (Murray e col.,
2001; Breilh, 2007; e Díaz e col., 2009) a participação
de membros da comunidade surge como inerente à
metodologia adotada, envolvendo membros das comunidades como atores ativos desde a coleta de informações. Nesse artigos, a ampla participação, desde as
etapas iniciais e que se encontra mais próxima da AES,
serviu de base para promover um amplo diálogo entre
os membros da comunidade e deu início ao processo
de construção de um ambiente no qual a comunidade
pode, nos estudos de Murray e col. (2001) e Díaz e col.
(2009), organizar e planejar um plano de ação para a
resolução futura dos problemas, sendo isso previsto
como etapa seguinte no estudo de Breilh (2007).
Assim, embora a participação do público seja crucial
na implementação dos enfoques ecossistêmicos, ela
ainda não é uma prática efetiva na maioria dos estudos,
que ainda tendem a considerar a participação limitada
a programas de educação para mudanças de hábitos e
atitudes. Além, disto devemos também considerar que
esta é bastante complexa por dois motivos. Primeiro
por envolver tanto uma grande diversidade e conflitos
de valores. Segundo, por ocorrer em contextos de pobreza e iniquidade social que caracterizam muitas localidades dos países da América Latina, onde questões de
sobrevivência muitas vezes se impõem sobre questões
referentes à melhoria da qualidade ambiental ou mesmo integridade dos ecossistemas (Freitas e col., 2007).
todo o mundo. A carga de doenças causadas pela falta de
água e por saneamento e higiene inadequados totaliza 1,7
milhão de mortes e a perda de mais de 54 milhões de anos
de vida saudável. Já é bem sabido que investimentos em
geração de água potável e em melhores condições saneamento têm relação direta com uma melhoria da saúde humana e da produtividade econômica. Cada pessoa precisa,
para consumo e higiene, de 20 a 50 litros de água por dia,
livres de contaminantes nocivos químicos ou microbiais.
Per­manecem desafios substanciais para o fornecimento
desse serviço básico a amplos segmentos da população
humana.
ALIMENTOS
Em países pobres, especialmente nas áreas rurais, a saúde das populações humanas é altamente dependente dos
serviços dos ecossistemas produtivos locais para a obtenção de alimento. A produção acumulada de alimentos é
atualmente suficiente para satisfazer as necessidades de
todos. Ainda assim, da população mundial atual de pouco
mais de 6 bilhões de pessoas, cerca de 800 milhões têm
deficiência alimentar de proteínas, enquanto um número
Enfoques ecossistêmicos em saúde – Perspectivas para sua adoção no Brasil e em países da América Latina
semelhante está superalimentado. Além disso, pelo menos
um bilhão de pessoas experimentam deficiência crônica
de micro­nutrientes. Em comunidades urbanas mais ricas,
a dependência humana dos ecossistemas para nutrição é
menos evidente, mas, em última análise, não menos fundamental.
O desequilíbrio nutricional entre ricos e pobres tem sido
im­pulsionado antes de mais nada por fatores sociais, embora fatores ecológicos possam desempenhar um papel de
importância cada vez maior no futuro. A produção de alimentos não acompanhou o crescimento populacional em
muitos países. A subnutrição está fortemente relacionada
com a pobreza, e nos países mais po­bres, cerca de um
quarto da carga de doenças está relacionada à desnutrição
infantil e materna. Em todo o mundo, a subnutrição é responsável por aproximadamente 10% da carga de doenças.
Nos países mais ricos, os riscos relacionados a dietas (principalmente sobrealimentação) em combinação com a falta
de atividade física são responsáveis por cerca de um quarto
da carga de doenças.
Apesar de causar o esgotamento dos recursos locais, os
ganhos no fornecimento total de alimentos (além de água,
madeira e outros serviços de abastecimento) têm sido frequentemente alcançados pela expansão da produção para
novas regiões. Hoje, essas opções já foram, em grande parte, exauridas. O fornecimento de alimento suficiente para
uma população prevista de 8 a 9 bilhões de pessoas exigirá
investimentos na diminuição da pobreza ou uma profunda
redistribuição de recursos. Há importantes permutas que
devem ser feitas, dentre diversas utilizações possíveis das
terras produtivas. Incluir considerações sobre a saúde da
população ao se pesar as escolhas disponíveis pode vir a
ter implicações importantes na formulação de políticas de
ação.
MADEIRA, FIBRAS, COMBUSTÍVEL
A geração de energia causa uma série de impactos à
saúde. A poluição do ar exterior (em ambiente aberto)
agrava as doenças de coração e de pulmão. A poluição do
ar interior (em ambiente fechado), proveniente da queima
de biocombustível em locais de aquecimento e cozimento
com pouca ventilação, causa uma quantidade significativa de doenças respiratórias entre adultos e crianças. Cerca
de 3% da carga global de doenças pode ser atribuída à
poluição do ar em am­bientes fechados causada por essa
fonte. Em áreas onde a demanda por madeira superou o
fornecimento local, e onde as pessoas não têm condições
de usar outras formas de geração de energia, há uma
vulnerabilidade crescente a doenças e desnutrição pelo
consumo de água contaminada por microorganismos,
pela exposição ao frio e pelo consumo de comida mal cozida. Mulheres e crianças po­bres em comunidades rurais
são frequentemente os mais afetados pela escassez de
lenha para combustível. Muitas pessoas precisam percorrer longas distâncias a pé, procurando e transportando
lenha (e, com frequência, água), tendo, portanto, menos
tempo e energia para as atividades de cultivo, preparação
de alimentos e frequência à escola. Por essas razões, suprimentos adequados de energia são fundamentais para
o desenvolvimento sustentável.
PRODUTOS BIOLÓGICOS
Bilhões de pessoas em todo o mundo dependem em parte ou totalmente de produtos coletados nos ecossistemas
para propósitos medicinais. Mesmo quando medicamentos
sintéticos (que frequente­mente provêm de fontes naturais)
estão disponíveis, a necessidade e a demanda por produtos
da natureza persiste. Alguns dos produtos farmacêuticos
mais conhecidos originados de fontes naturais incluem
analgésicos (por exemplo, aspirina), medicamentos para o
coração (digitálicos) e quinino.
MANEJO, PROCESSAMENTO E
DESINTOXICAÇÃO DE NUTRIENTES E RESÍDUOS
Qualquer redução nos níveis de nutrientes pode prejudicar a fertilidade do solo levando a uma redução na produção de alimentos, o que, por sua vez, afeta negativamente
o estado nutricional das famílias. Já está comprovado que
deficiências nas dietas (tanto de macro como de micronutrientes) prejudicam o crescimento físico e mental das
crianças. Portanto, isso pode prejudicar a subsistência de
agricultores, e também limitar as opções existentes para
os seus filhos. Os seres humanos também são colocados
em risco pela eutroficação (como na proliferação de algas)
e pela presença de produtos químicos inorgânicos e poluentes orgânicos persistentes nos alimentos e na água.
Isto pode ocorrer quando o acesso aos mananciais leva à
contaminação por causas naturais (como ocorreu com a
contaminação da água por arsênico em poços tu­bulares
em Bangladesh), ou onde as ações humanas resultam na liberação de substâncias químicas tóxicas no meio ambiente
(por exemplo, pelo uso de agrotóxicos). Substâncias químicas tóxicas podem causar uma série de efeitos adversos à
saúde, em vários sistemas de órgãos do corpo humano. Alguns produtos químicos presentes em efluentes industriais
ou utilizados como agrotóxicos, tais como PCBs, dioxinas
e DDT, podem atuar, em baixos níveis de exposição, como
“disruptores endócrinos” que interferem na fisiologia humana normal, debilitando a resistência a doenças e a reprodução humana.
CONTROLE DE DOENÇAS INFECCIOSAS
A magnitude e a direção da incidência alterada de doenças infecciosas devidas a mudanças nos ecossistemas
dependem dos ecossistemas específicos, do tipo de mudança no uso do solo, da dinâmica de transmissão específica da doença e da susceptibilidade das populações humanas. Fatores antropogêni­cos que influenciam em particular o risco de doenças infecciosas incluem: destruição
ou invasão do habitat natural, especialmente por meio
de desmatamento e construção de estradas; mudanças
na distribuição e disponibilidade de águas superficiais,
como, por exemplo, pela construção de represas, irrigação e desvio de cursos d’água; mudanças no uso de terras
agrícolas, incluindo a proliferação tanto de gado como
de plantações; depósito de poluentes químicos, incluindo
nutrientes, fertilizantes e agrotóxi­cos; urbanização desordenada ou expansão urbana exagerada; variabilidade e
mudança climática; migrações e viagens/comércio internacionais; e a introdução humana, intencional ou acidental, de agentes patogênicos.
Enfoques ecossistêmicos em saúde – Perspectivas para sua adoção no Brasil e em países da América Latina
27
SERVIÇOS CULTURAIS, ESPIRITUAIS E
RECREACIONAIS DOS ECOSSISTEMAS
Os serviços culturais podem ser menos tangíveis do que
serviços materiais, porém são altamente valorizados pelas
pessoas em todas as sociedades. As pessoas obtêm diversos benefícios não-materiais dos ecossistemas. Isto inclui
instalações recreativas e turismo, apre­ciação estética, inspiração, uma noção de lugar e valor educacional. Há práticas
tradicionais ligadas aos serviços dos ecossistemas que desempenham um papel importante no desenvolvimento do
capital social e na intensificação do bem-estar social.
REGULAÇÃO CLIMÁTICA
Cada um dos serviços ecológicos mencionados nas seções anteriores é sensível ao clima, e será, por esse motivo,
afetado por mu­danças climáticas antropogênicas. Embora
as mudanças climáticas possam ter alguns efeitos benéficos para a saúde humana, a maioria dos efeitos esperados
será provavelmente negativa. Efeitos diretos, tais como o
aumento da mortalidade em consequência de ondas de calor, são os mais prontamente previstos, mas é provável que
os efeitos indiretos causem impactos generalizados maiores. A saúde humana provavelmente sofrerá o impacto indireto de alterações induzidas pelo clima na distribuição de
ecossistemas produtivos e na disponibilidade de suprimentos de água, alimentos e energia. Essas mudanças, por sua
vez, irão afetar a propagação de doenças infecciosas, os estados nutricionais e os padrões de assentamento humano.
Foto: Maria Pia Quiroga. Acervo OPAS/OMS
Prevê-se que os eventos climáticos extremos aumentarão, in­cluindo inundações, tempestades e secas, além da
elevação do nível do mar, como resultado da mudança do
clima. Esses fenômenos têm efeitos locais e, às vezes, regionais, tanto diretamente, com mortes e lesões, quanto
indiretamente, pelo desequilíbrio econômico causado, danos à infra-estrutura e deslocamento de populações. Isso,
por sua vez, pode provocar aumento nos casos de doenças
transmissíveis como resultado de aglomerações, falta de
água limpa e de moradia, estados nutricionais pobres e
efeitos adversos à saúde mental.
Em todo o mundo, o número anual absoluto de pessoas mortas, feridas ou desabrigadas por causa de desastres naturais está crescendo. Uma forte razão para isso é a
crescente ocupação das costas e planícies aluviais expostas
a eventos extremos. Estudos de casos em escala local mostraram que a degradação ambiental reduziu a capacidade
dos ecossistemas de amortecerem condições climáticas extremas, como no caso da diminuição da capacidade dos
recifes de coral e mangues de estabilizar as linhas costeiras
e limitar os efeitos destrutivos de tempestades marítimas.
Em muitas áreas, as únicas terras disponíveis para as comunidades pobres têm poucas defesas naturais contra os
extremos climáticos.
Fonte: “Ecosistemas y bienestar humano: Síntesis de la salud Un
informe de la Evaluación de los Ecosistemas del Milenio (EM)”
(Corvalan et al, OMS 2005)
Foto: Maria Pia Quiroga. Acervo OPAS/OMS
Enfoques ecossistêmicos
em saúde – resumo
das apresentações do
workshop de Manaus
O workshop foi realizado, como parte do projeto
Abordagem ecossistêmica para o desenvolvimento de
indicadores e cenários de sustentabilidade ambiental
e de saúde na cidade de Manaus/AM – 20202. O evento foi coordenado pela Fiocruz e ENSP e contou com
apoio da Representação da OPAS/OMS Brasil.
projetos em desenvolvimento na Região Amazônica
ou projetos que adotaram abordagens alinhadas com
os enfoques ecossistêmicos em saúde, estando os resumos das mesmas imediatamente após a síntese das
apresentações da manhã do primeiro dia.
No primeiro dia, toda a parte da manhã foi dedicada à abertura e a três apresentações focando as grandes questões ambientais e de saúde que podem ser
enfrentadas a partir de enfoques ecossistêmicos em
saúde e os aspectos teóricos e conceituais sendo estas: Ecossistemas e saúde; Perspectivas para a abordagem ecossistêmica no Brasil; e Fundamentos teóricos
e metodológicos para a abordagem ecossistêmica. A
parte da tarde deste dia e da manhã do segundo dia
foi dedicada aos painéis com apresentação de alguns
Carlos Corvalan, OPAS/OMS
2 Este projeto é financiado no âmbito do edital “Cidades Saudáveis: Saúde,
Ambiente e Desenvolvimento”, pela Vice-Presidência de Ambiente, Atenção
e Promoção da Saúde da Fiocruz, Ministério da Saúde.
Ecossistemas e saúde
A apresentação demonstrou como várias doenças possuem alta atribuição ambiental resultando em uma carga
ambiental das doenças que possuem como “causas das
causas” mudanças ambientais globais (urbanização, uso
de energia, etc) que alteram os ecossistemas e seus serviços como provisão de água ou alimentos com qualidade
e regulação do clima global e regional. Essas mudanças,
combinadas com as desigualdades sociais e econômicas,
gerando iniquidades, resultam em uma carga ambiental
das doenças que afeta de modo desproporcional as populações mais pobres, principalmente as que vivem nos
países mais pobres.
Enfoques ecossistêmicos em saúde – Perspectivas para sua adoção no Brasil e em países da América Latina
29
ciais que influem sobre a saúde humana (diagnósticos);
2) reconhecimento dos fatores sociais, ambientais e
econômicos; 3) busca de convergência em torno de
respostas integradas aos problemas; 4) implementação
de pesquisas e intervenção (pesquisa-ação); 5) fortalecimento da articulação entre pesquisas e políticas públicas; 6) disseminação de experiências, intercâmbios
e “treinamentos”. Tendo como referência essas bases,
foi apresentado o Projeto do IDRC em parceria com
a VPSRA da Fiocruz (2005-07): International Training
Program on Ecosystem Approaches for Environmental
Pollution Assessment and Management.
Perspectivas para pesquisa em
Abordagem Ecossistêmica no Brasil
Josino Moreira, Fiocruz
Fundamentos teóricos e metodológicos
para a abordagem ecossistêmica
A apresentação iniciou observando o reducionismo
presente nas abordagens disciplinares que com sua
hierarquia clássica dos níveis de organização da natureza acabam por remover o objeto de estudo de seu
contexto, não abordando os sistemas complexos e suas
propriedades emergentes. Nesse quadro, a abordagem
ecossistêmica em saúde, baseada na gestão integrada
para a sustentabilidade e melhoria da saúde e bem-estar das comunidades, apresenta um grande potencial
de superar esse reducionismo. Isto porque procura
avaliar as interações sociais e ecológicas nas análises
dos determinantes da saúde, entendidos numa perspectiva sistêmica, como parte de um contexto socioecológico complexo dentro de escalas temporal e espacial, em resposta aos problemas de saúde. Foram destacados três elementos essenciais nessa abordagem:
A apresentação parte da hipótese fundamental desta
abordagem, que é a de que a saúde comunitária requer
a atuação sobre seus determinantes sociais, ecológicos
e econômicos através de uma gestão participativa do
ecossistema e baseada em um enfoque holístico da saúde. A missão de promover comunidades saudáveis, por
meio da gestão apropriada de seus ecossistemas, baseiase na investigação e fortalecimento de capacidades locais para produzir conhecimentos, com a finalidade de
compreender para atuar. Essa hipótese e missão teriam
como bases a ênfase na compreensão da estrutura dos
ecossistemas dos quais a população depende para sua
subsistência, já que considera que comunidades saudáveis encontram-se em ecossistemas saudáveis. Isto faz
com que esta abordagem proponha: 1) identificação
de um conjunto interativo de fatores ecológicos e so-
1)a produção do conhecimento transdisciplinar, e que
incorpora conhecimentos científicos e não científicos, envolvendo a colaboração entre pesquisadores
de diferentes disciplinas e os grupos acadêmicos e
não acadêmicos interessados nos problemas sob investigação;
2)o fato de tratar-se de abordagem orientada para
ação, de modo que os problemas a serem estudados
emergem através de consulta e interação entre os
envolvidos (acadêmicos e não acadêmicos) e suas
soluções são de uso social, práticas efetivas e sustentáveis;
3)é reflexiva envolvendo a proposta de operar em um
fluxo contínuo entre a geração de conhecimento e
suas aplicações em um processo que permite que
os grupos se dissolvam e que novos grupos sejam
formados durante o processo.
Favela – Rio de Janeiro.
Foto: Maria Pia Quiroga. Acervo OPAS/OMS
Brani Rosemberg, Fiocruz
30
Enfoques ecossistêmicos em saúde – Perspectivas para sua adoção no Brasil e em países da América Latina
Em seguida, apresentou um resumo da experiência da
Fiocruz na indução de projetos transdisciplinares em
saúde e ambiente. Concluiu observando a importância
da Região Amazônica e as perspectivas para pesquisa
em abordagens ecossistêmicas em saúde, considerando algumas características regionais, como: elevada
dinâmica das alterações (desmatamento, etc) e seus
efeitos sobre o clima e a biota; a diversidade sociocultural e biológica (plantas e animais); a importância hidrológica; a geração de energia: hidrelétricas e termoelétricas; a agricultura e pecuária (uso de fertilizantes
alteração dos ciclos normais de C, N, água, etc) e o uso
de agrotóxicos; importância mineralógica.
Mapeamento Integrado e participativo
das dinâmicas sócioambientais do
Assentamento de Rio Pardo
Sergio Luiz Bessa Luz (Instituto Leônidas e Maria Deane
da Fiocruz Amazônia)3
Este projeto tem ênfase na aplicação de estratégias da
Abordagem Ecossistêmica de Saúde para o estudo de
dois grupos de doenças: i) causadas por microorganismos transmitidos pela água e por alimentos (bactérias,
vírus e parasitos) e ii) arboviroses (vírus transmitidos
por vetores). A hipótese central é de que a transmissão
destes patógenos não é homogênea na comunidade:
distintas combinações de fatores sociais e ecológicos
configuram situações de risco diferencial. As análises
comparativas investigam as dinâmicas de circulação
de agentes patogênicos em diferentes unidades de
paisagem (floresta, roça, vila), em agrupamentos geográficos de moradias (ramais, estradas vizinhais) ou
em distintos grupos humanos (definidos em relação à
idade, gênero, atividades econômicas, formas de uso
da água etc.). O reconhecimento da complexidade do
sistema e incertezas inerentes requer estratégias transdisciplinares e participativas para a resolução dos
problemas ambientais e de saúde. O desenho básico
da pesquisa busca entender essas dinâmicas partindo
da observação de três situações-piloto distintas, escolhidas por ocuparem posições diferenciadas em um
gradiente sócio-ecológico: 1 – áreas com baixo grau
de antropização; 2 – áreas com moderado grau de antropização e 3 – áreas com alto grau de antropização.
3 Apresentação resultante do projeto “Mapeamento integrado e participativo das dinâmicas socioambientais do assentamento de Rio Pardo”, financiado pelo convênio IDRC/Fiocruz, tendo como participantes Daniel Buss
(IOC-Fiocruz) Ricardo Agum (CPqL&MD-Fiocruz), Fernando Abad-Franch
(CPqL&MD-Fiocruz) e Sérgio Luz (CPqL&MD-Fiocruz).
Enchentes localizadas da Amazônia.
Foto: Ana Fischer, SUS/MS
O local do trabalho foi área 1 descrita acima, no Assentamento rural de Rio Pardo, Presidente Figueiredo
(AM), distante 200 km de Manaus, com aproximadamente 160 casas e população de 700 pessoas, a opção
pela área se deu por fatores sociais, ecológicos e de
ordem estrutural e política - está localizada em uma
área de colonização recente e pouco modificada.
O objetivo geral foi implantar um processo participativo de mapeamento integrado das características e
dinâmicas sócio-ambientais e do perfil de incidência
de arboviroses e de doenças de veiculação hídrica em
uma área com baixo grau de antropização na Amazônia central. Os objetivos específicos eram:
1)estimular a construção coletiva da história sócioambiental da área;
2)realizar um levantamento das comunidades de vetores de arboviroses, determinando as taxas de infecção natural nos vetores mais abundantes;
3)realizar uma avaliação da qualidade das águas de
abastecimento e dos igarapés (incluindo um levantamento de agentes patogênicos bacterianos, virais
e parasitários), utilizando uma metodologia integrada e participativa;
4)definir o perfil de incidência de doenças diarréicas
agudas (de etiologia bacteriana, viral e parasitária)
e arboviroses (Alphavirus, Flavivirus e Bunyavirus)
e determinar os principais fatores ambientais e sociais moduladores do risco epidemiológico;
5)desenvolver, testar e aprimorar uma proposta metodológica integrada e participativa para aplicar nas
fases seguintes do projeto.
Dos cinco objetivos específicos, concluímos o primeiro com a construção do vídeo-documentário participativo VOZES DE RIO PARDO, no qual um grupo
de moradores construiu a narrativa da história do as-
Enfoques ecossistêmicos em saúde – Perspectivas para sua adoção no Brasil e em países da América Latina
31
Fonte: http://www.pbase.com/lucianoea/holambra_2006&page=8
sentamento utilizando o recurso do audiovisual. Os
objetivos 2, 3 e 4 podem ser considerados no conjunto
de medidas que foram discutidas com os Assentados,
uma vez que os pontos de captura de mosquitos, bem
como as amostras para a análise das águas foram levantados em oficinas e grupos focais que visavam a
discussão desses tópicos considerando a idade, gênero, atividades econômicas e local de moradia. As
análises de água e parasitoses foram discutidas com
a população, possibilitando a apropriação de nossas
informações por parte deles, mas como oportunidade
de conhecer o grupo estudado.
Podemos concluir que os primeiros estudos indicam
que a problemática local pode ser percebida com
maior nitidez quando a visão dos mesmos é considerada. O trabalho ganhou agilidade quanto à compreensão dos Assentados com o nosso trabalho, bem
como a visualização da possibilidade de resolução de
problemas locais por meio de parcerias. Consideramos que o trabalho se encontra em fase de implantação e que a melhoria nos canais de informação visa à
plena participação dos agentes locais.
Abordagem ecossistêmica em saúde:
uma perspectiva para o controle da
transmissão da esquissostomose
Marisa da Silveira Soares (Instituto Oswaldo Cruz –
Fiocruz)4
A esquistossomose é um problema de saúde pública
que persiste no Brasil, sobretudo pelas dificuldades no
controle da transmissão. Alimentando esse quadro,
4 Apresentação resultante do projeto com mesmo título, tendo como participantes Marisa da Silveira Soares, César L. P. A. Coelho da Silva, Magali G.
Muniz Barreto e Denise A. Borges, do Laboratório de Avaliação da Promoção da Saúde Ambiental (IOC – Fiocruz); Célia Maria Thomé do Departamento de Saúde (Holambra, SP); Rita Silva do Instituto Adolfo Lutz; Marcelo
F. de Souza Porto (CESTEH – ENSP – Fiocruz).
32
destacam-se fatores como: saneamento precário; vasta
distribuição dos hospedeiros intermediários, favorecida por barragens, irrigação etc.; disseminação do parasito devido a migrações e ao turismo; precariedade
sócio-ecológica das periferias urbanas; competição
com outras endemias por recursos escassos; problemas de diagnóstico e de adesão da população em situações de baixa endemicidade; desconsideração das
representações sociais para o controle; falhas na educação em saúde; pessimismo devido a experiências
prévias e a descrença no poder público; conflitos de
interesses e dificuldades de diálogo entre a população,
cientistas, gestores etc.
Atuando em variadas combinações, estes e outros
fatores costumam caracterizar situações complexas,
repletas de incertezas e conflitos, que dificultam a tomada de decisões para o controle da esquistossomose.
As recomendações correntes para esse enfrentamento,
ainda que norteadas pela idéia de múltiplas perspectivas e variados aspectos a considerar, se fundamentam
apenas no paradigma biomédico, que é insuficiente
para lidar com a complexidade dos processos saúdedoença. São raros os trabalhos científicos que assumem a perspectiva da complexidade.
Considerando que essa insuficiência do paradigma
biomédico contribui para a persistência da esquistossomose no Brasil, e repensando as alternativas de
modelos de compreensão e intervenção para o controle da transmissão dessa endemia, a “Abordagem
Ecossistêmica em Saúde” oferece uma perspectiva
promissora. Com esta percepção, foi realizado um estudo de caso na Estância Turística de Holambra (SP),
município da Grande Campinas, com cerca de oito
mil habitantes, que têm como principal atividade econômica o agronegócio, focado na floricultura. Essa escolha teve, dentre outros motivos, a presença de casos
autóctones, importados e, principalmente, duvidosos,
o grande número de imigrantes de áreas endêmicas,
a existência de dados oficiais que apontam 100% de
cobertura do PSF e do tratamento de esgotos, a virtual
presença de “vontade política” no município e no estado, além da ampla distribuição de moluscos hospedeiros intermediários do Schistosoma mansoni devido
à rede de coleções hídricas para atender ao agronegócio. Os estudos iniciais visaram à análise do contexto
em que a esquistossomose ocorre em Holambra e à
identificação de atores e condições para a formação de
uma Comunidade Ampliada de Pares (CAP) reunindo pesquisadores, técnicos, voluntários da população,
Enfoques ecossistêmicos em saúde – Perspectivas para sua adoção no Brasil e em países da América Latina
representantes de setores municipais e estaduais, de
setores da economia, da política, da Sociedade Civil
etc. Foram realizados pesquisa documental, observação direta, entrevistas, grupos focais, inquéritos sorológicos, epidemiológicos, malacológicos e parasitológicos e análises de água. Finalizada esta etapa, houve
Oficinas para analisar o caso e iniciar um processo de
avaliação da qualidade dos resultados pela CAP.
Os resultados mostraram grande potencial de exposição da população aos vetores da esquistossomose,
por fatores sanitários, ecológicos, sociais, econômicos,
culturais etc. Por outro lado, evidenciaram intensa
contaminação dos recursos hídricos por agrotóxicos,
o que constitui barreira à transmissão dessa endemia.
Convém destacar que tal poluição química representa
sérios riscos ao ambiente e à saúde humana. Outras
constatações relevantes foram:
1)desigualdade no acesso de diferentes grupos de trabalhadores ao SUS e ao controle da esquistossomose;
2)intensa rotatividade de trabalhadores e mobilidade
populacional, com percursos variados, que geralmente incluem áreas endêmicas e que envolvem
aspectos de difícil previsibilidade, inclusive relacionados ao modelo de desenvolvimento brasileiro;
3)dificuldade de incluir na CAP os interesses dos indivíduos sem acesso ou visibilidade para o SUS;
4)escassez de “capital social”;
5)dificuldade de formação de uma CAP em época de
eleições.
Abordagem ecossistêmica para o
desenvolvimento de indicadores e cenários
de sustentabilidade ambiental e de
saúde na cidade de Manaus/AM – 2020
Carlos Machado de Freitas (Escola Nacional de Saúde
Pública da Fiocruz)5
O projeto possui como antecedentes teóricos e metodológicos estudos de cenários realizados no setor
ambiental, mas ainda incipientes no setor saúde e
5 Apresentação resultante de projeto com mesmo nome, financiado pelo no
âmbito do edital “Cidades Saudáveis: Saúde, Ambiente e Desenvolvimento”, pela Vice-Presidência de Ambiente, Atenção e Promoção da Saúde da
Fiocruz, tendo como participantes Leandro Luiz Giatti, Antonio Levino da
Silva Neto, Marcilio Sandro Medeiros, Mírcia Betânia Costa e Silva e Maria
Bernadete Ribeiro Chagas do ILMD – Fiocruz; Carlos Machado de Freitas,
Marcelo Firpo de Souza Porto, Paulo Chagastelles Sabroza e André Sobral
da ENSP – Fiocruz.
tem como objetivo geral desenvolver uma abordagem
ecossistêmica para o desenvolvimento de indicadores
e cenários de sustentabilidade ambiental e de saúde
para o nível municipal. Como objetivos específicos:
1)oferecer subsídios para a construção de indicadores
de sustentabilidade ambiental e de saúde em perspectiva ecossistêmica que permitam identificar as
condições atuais e tendências a partir da reunião
de informações de base municipal e de fácil acesso
para pesquisadores e o público em geral;
2)oferecer subsídios para a construção de indicadores para o monitoramento das consequências para
o bem-estar humano das mudanças nos ecossistemas; também a partir da reunião de informações de
base municipal e de fácil acesso para pesquisadores
e o público em geral;
3)construir cenários considerando mudanças plausíveis nas forças motrizes primárias e secundárias
e identificar quais serão as consequências para os
ecossistemas, seus serviços e o bem estar humano
a partir da análise das condições e tendências, bem
como de entrevistas e grupos focais com atoreschave nos setores saúde e ambiente;
4)a partir da análise das condições, tendências e cenários elaborar proposições de respostas para a sustentabilidade ambiental e de saúde considerando
um conjunto de políticas ou medidas – intervenções legais, econômicas, financeiras, institucionais,
sociais ou cognitivas – que impactem o estado e o
funcionamento atual dos ecossistemas, envolvendo
um planejamento municipal que afete as forças motrizes indiretas, diretas e o bem-estar humano.
Monitoramento biológico e a participação
pública na gestão de bacias hidrográficas
Daniel Forsin Buss (Instituto Oswaldo Cruz da Fiocruz)6
O trabalho teve como objetivos a padronização de
métodos de biomonitoramento, a popularização da
ciência e o envolvimento público na gestão de recursos hídricos através de informações produzidas pelo
monitoramento biológico. Teve como bases a Lei
9.433/97, acerca da gestão descentralizada e estímulo à participação pública nos processos de gestão de
recursos hídricos, bem como o Decreto 2.519/98 em
6 Apresentação resultante do “Programa Agente das Águas – monitoramento
participativo de avaliação da qualidade ambiental de rios da Bacia Hidrográfica do Paraná 3” tendo como participantes do grupo de pesquisa Daniel F.
Buss, Caroline Cichoski, Michelli Ferronato e Simone F. Benassi, sendo executado pelo Laboratório de Avaliação e Promoção da Saúde Ambiental (IOC
– Fiocruz).
Enfoques ecossistêmicos em saúde – Perspectivas para sua adoção no Brasil e em países da América Latina
33
que o Brasil assume compromissos relacionados à
Convenção sobre Diversidade Biológica.
Para o monitoramento biológico deveriam ser desenvolvidos indicadores internacionalmente aceitos,
considerando os diferentes aspectos do manejo dos
recursos hídricos para os atores sociais, de forma que
seus resultados fossem compreendidos e relacionados
a outras áreas. Foi este princípio que norteou o desenvolvimento de técnicas de bioindicadores da qualidade da água de rios em Protocolos de Bioavaliação
Rápida.
Simultaneamente o projeto envolveu um programa
de monitoramento participativo, nascendo este de
diversas dificuldades: das comunidades em ter acesso às informações e à participação; do Poder Público
em ter instrumentos eficazes para avaliação ambiental; das instituições de pesquisa em se aproximar do
público ao qual suas pesquisas se destinam. A combinação resultou no desenvolvimento de um processo
de avaliação do nível taxonômico possível para identificação por voluntários, por meio de um curso para
alunos e professores, formando Agente das Águas nas
seguintes localidades: 1) RJ: Guapimirim, Paracambi,
Eng. Paulo de Frontin, Nova Friburgo, Rio de Janeiro;
2) ES: Domingos Martins, Santa Maria de Jetibá; 3)
PR: Comunidades do rio Xaxim e Sabiá (municípios
de Matelândia, Medianeira e Céu Azul); rio Toledo e
rio Lopeí (município de Toledo). Esse processo teve
como resultados a legitimação e formação de redes e
contribuiu para a resolução de problemas ambientais
em localidades onde estes foram detectados.
Projeto Caruso: Contaminação por
mercúrio na Amazônia Brasileira
Jean Remy Daveé Guimarães (Instituto de Biofísica da
Universidade Federal do Rio de Janeiro)7
O projeto teve início em 1994 e envolveu várias comunidades ao longo do Rio Tapajós, sendo na Fase 1 de
S. Luís do Tapajós a Santarém, na Fase 2 Brasília Legal
a Cametá, na Fase 3 S. Luís do Tapajós a Aveiro. Ao
longo do tempo este estudo de longo prazo se organizou do seguinte modo: 1) 1994 estudo preliminar de
determinação de características espaciais e temporais
do ecossistema; 2) 1994-1996 identificação da origem,
distribuição, transmissão, exposição humana e efeitos
à saúde; 3) 1998-2000 busca de soluções com a comunidade, sendo de curto prazo (práticas de consumo de
peixe); médio prazo (incorporação de Hg em peixes
– metilação); longo prazo (sistemas agroflorestais); 4)
2000 re-avaliação da exposição e saúde; 5) 2003-2005
regionalização do estudo a 13 comunidades sobre
300 km do rio Tapajós (Hg, alimentação, Hg e MeHg
em cadeias alimentares); 6) 2005-2008 Hg e visão,
Hg x funções cardiovasculares, Selênio como modulador do efeito do Hg; redes de comunicações sociais.
As intervenções envolveram: 1) oficinas de trabalho
na comunidade (mulheres, pescadores, agricultores,
autoridades locais) para discutir sobre os resultados;
2) campanha na escola e na vila: comer mais peixes que
não comem outros peixes, distribuição de cartazes com
os níveis de Hg das espécies locais; 3) trabalho com
um grupo de 30 mulheres da comunidade para analisar os hábitos alimentares e sua variação temporal;
esta atividade durou 12 meses e era coordenada pela
parteira da comunidade.
Após a intervenção, a avaliação da saúde da população constatou que em relação a motricidade houve
melhoria de 10% na destreza manual e no teste de movimento alternado (Teste Branches). Enquanto 64%
apresentavam movimentos desordenados em 1995,
em 2000 este percentuais foram reduzidos para 32%.
Entretanto, altos níveis de Hg continuam associados
Projeto Caruso. Foto: Jean Remy.
34
7 Apresentação resultante do Projeto Caruso 1994-2006, financiado pelo
International Development Research Centre (IDRC – Canadá), envolvendo
como instituições acadêmicas a Université du Québec à Montreal (UQAM),
Universidade Federal do Pará (UFPA) e Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), tendo como participantes coordenadores Marc Lucotte, Donna
Mergler, Robert Davidson, Jean RD Guimarães, Maria da Graça P. Sablayrolles, Marucia Amorim, Frederic Mertens, Johanne Saint Charles, Carlos Jose
S. Passos e Delaine Sampaio.
Enfoques ecossistêmicos em saúde – Perspectivas para sua adoção no Brasil e em países da América Latina
a disfunções visuais na população. Os próximos passos envolverão projetos com atores sociais locais para
gestão agroflorestal que minimize a erosão dos solos e a lixiviação de Hg, e também traga alternativas
economicamente viáveis ao corte e queima (projeto
PLUPH); inclusão e aprofudamento dos novos conhecimentos sobre o efeito do consumo de frutas e o
planejamento de práticas agrícolas e alimentares; avaliação acerca de Se x Hg, efeitos sobre a visão; efeitos
cardiovasculares; avaliação de Pb em sangue (casas de
farinha); biogeoquímica do Hg no ambiente e a cadeia
alimentar, relação entre Hg em solos e Hg em águas.
Apesar dos avanços, até o momento ainda há muito
que fazer para obter resultados conclusivos.
Projeto Manuelzão – Saúde, ambiente
e cidadania – Bacia do Rio das Velhas
Marcus Vinícius Polignano (Faculdade de Medicina –
UFMG)8
O Projeto MANUELZÃO/UFMG9 há 12 anos vem desenvolvendo um modelo de abordagem ecossistêmica
tendo a bacia hidrográfica do rio das Velhas (Minas
Gerais – Brasil) como a unidade de estudo. A bacia
é formada pelo conjunto de afluentes dispersos em
51 municípios que drenam as suas águas para a calha
principal. Nela habitam 4.800.000 pessoas e milhões
de outros seres da biodiversidade.
O Projeto Manuelzão foi idealizado por professores do
internato rural da Faculdade de Medicina da UFMG
em 1997, tendo como premissas: a saúde não é basicamente um problema médico, mas decorrência da
qualidade de vida e ambiente; o modelo “assistencial
de saúde” tem um compromisso muito maior com a
indústria da doença do que com a promoção de saúde;
a porta de entrada de um verdadeiro sistema de saúde
tem que ser a promoção de saúde – melhoria da qualidade de vida e ambiental; as ações antropocêntricas
vem provocando desequilíbrios ambientais e comprometendo a existência da biodiversidade, incluindo o
próprio ser humano; é necessário construir uma nova
relação homem/natureza centrada no biocentrismo
– condição básica para dar suporte à vida e à saúde
coletiva; a construção da relação saúde-ambiente per-
8 Apresentação resultante do Projeto MANUELZÃO, coordenado por Marcus
Vinícius Polignano, Apolo Heringer Lisboa e Thomaz da Mata Machado (Faculdade de Medicina – UFMG)
9 www.manuelzao.ufmg.br
Projeto Manuelzão. Rio das Velhas. Foto: Clarissa Dantas.
mite incorporar a visão sistêmica dentro da gestão das
políticas de saúde buscando a intersetorialidade e interdisciplinaridade.
A abordagem ecossistêmica em saúde apresenta novas
possibilidades para o entendimento e análise das questões ambientais e um novo enfoque para a noção de
saúde para além do paradigma biomédico. A vantagem
deste enfoque, base para a elaboração de modelos adaptativos em saúde e sustentabilidade, tem como premissa
que uma sociedade sustentável deve manter-se no contexto de um sistema ecológico maior do qual é parte.
Essa abordagem possibilita a percepção da relação
saúde/ambiente de uma forma mais sistêmica, daí o
foco do projeto MANUELZÃO na bacia do Rio das
Velhas, pois representa uma unidade socioambiental de diagnóstico, de planejamento, de organização,
de ação e de avaliação de resultados. A bacia permite
integrar natureza e história, ambiente e relações sociais, delimitando uma área e possibilitando que um
complexo sistema social seja referenciado na biodiversidade dos corpos d’água da bacia. Ao fazer este mo-
Rio das Velhas. Foto: Projeto Manuelzão.
Enfoques ecossistêmicos em saúde – Perspectivas para sua adoção no Brasil e em países da América Latina
35
vimento entende-se que o homem não pode ser destituído das suas relações socioambientais, e que o setor
“saúde” não pode destituir o homem das suas relações
culturais com a natureza. Coloca-se na ordem do dia
a discussão da integralidade da questão da saúde, entendida não com a visão assistencialista, mas dentro
da visão humanista e planetária. O homem é um ser
planetário que depende de relações ambientais complexas para viver e ter saúde, e ao mesmo tempo interfere no contexto socioambiental provocando impactos importantes para a sua própria vida e das demais
espécies existentes no planeta.
Segundo Lisboa10, “o eixo temático: ‘saúde, ambiente
e cidadania’, abre espaço para questionar o conceito
hegemônico de considerar saúde como um produto da
indústria e dos serviços de atenção aos doentes. Esta hegemonia ideológica da ‘indústria da doença’ está perpetuando um modelo social excludente, incompatível com
a saúde coletiva e associada com a alta lucratividade
dos setores mais mórbidos da economia. Saúde está correlacionada com a qualidade de vida, e qualidade de
vida com o ambiente e o caráter das relações sociais”.
Ainda segundo Lisboa “o paradigma antrópico de domínio da natureza ignorou duas questões: que a natureza associa o ser humano ao restante da fauna e flora;
e que as atuais relações sociais excluem a maioria dos
seres humanos das conquistas sociais e técnico-científicas, cassando suas cidadanias e o direito à saúde. Nes-
Saneamento em área indígena. Foto: Leandro Giatti.
10 Lisboa, A.H. Concepção do Projeto Manuelzão. In: Projeto MANUELZÃO/
UFMG. Conceitos para uma prática de saúde e cidadania. Belo Horizonte:
UFMG, 2001.
36
tas relações, o dinheiro é que confere cidadania. Este
paradigma entrou em confronto antagônico agudo com
o ambiente e a sociedade, ameaçando a vida da atual
e das futuras gerações. As doenças também são sinais
e sintomas de uma crise paradigmática. O estoque de
saúde nesta sociedade está muito abaixo do aceitável”
A saúde, como uma afirmação positiva e não simplesmente como a negação da doença, deve ser vista como
a expressão máxima da qualidade de vida e ambiente.
O paradigma da determinação socioambiental da saúde conduz a uma nova proposta de inscrever a saúde
como campo de conhecimento na ordem da interdisciplinaridade e, como prática social na ordem da intersetorialidade.
Um grande desafio de um projeto de abordagem ecossistêmica é definir um objetivo pontual comum, que
seja simples e ao mesmo tempo dê conta de responder a complexidade da abordagem. No caso do Projeto MANUELZÃO o objetivo definido foi a volta do
peixe ao rio. Este é o indicador biológico. A volta dos
peixes ao rio significa que: os esgotos estão sendo tratados; o lixo está tendo um destino adequado; as leis
de uso e ocupação do solo estão sendo obedecidas; as
cidades estão cuidando melhor da gestão das águas; as
pessoas estão mais sadias; a civilização terá se educado
melhor, e aprendido a ser mais solidária com o planeta
Terra e o futuro das novas gerações.
Para viabilizar os seus objetivos o projeto montou
uma equipe transdisciplinar que produz um conjunto
de ações, a saber: mobilização social com criação de
Núcleos MANUELZÃO envolvendo sociedade civil,
iniciativa privada e poder público; educação ambiental nas escolas e comunidades da bacia; pesquisas relacionadas ao biomonitoramento, saúde e ambiente e
outras; fomento às políticas públicas saudáveis; comunicação (edição de jornal, site, publicações científicas,
produção de mapas, cartilhas); expedições culturais
e científicas pelos rios; participação institucional nos
Comitês de bacia do rio das Velhas e no São Francisco;
ação cultural (Festivelhas).
Numa avaliação geral afirma-se que o projeto tem
contribuído para a discussão e implementação de políticas públicas no âmbito da bacia do rio das Velhas
no sentido de consolidar ambientes saudáveis e sustentáveis para o ser humano e a biodiversidade, revertendo o processo de degradação da bacia e interferindo na mentalidade civilizatória que o gerou.
Enfoques ecossistêmicos em saúde – Perspectivas para sua adoção no Brasil e em países da América Latina
Desenvolvimento de uma pesquisaação em comunidade indígena na
leitura da abordagem ecossistêmica
Leandro Luiz Giatti (Instituto Leônidas e Maria Deane
da Fiocruz Amazônia)11
A sede do Distrito de Iauaretê, com uma população
multi-étnica de 2.706 habitantes distribuídos em dez
vilas, é o segundo maior pólo de concentração humana no Município de São Gabriel da Cachoeira. Localiza-se a noroeste do Estado do Amazonas e destaca-se
em termos de urbanização em terra indígena, processo motivado por oferta de atenção à saúde, ensino e
emprego. O crescimento populacional, as práticas sanitárias dos indígenas e a precariedade em saneamento básico constituem um quadro peculiar e relevante
em saúde pública. Com foco em necessidades por melhorias sanitárias e em hábitos saudáveis, esta pesquisa
objetivou a construção de conhecimentos envolvendo
saber local e científico, bem como o envolvimento entre a população local e instâncias governamentais para
implementação de saneamento básico.
O método utilizado foi o da pesquisa-ação iniciado em
2005 com reuniões nas vilas componentes e aplicação de
atividades participativas para diagnóstico dos problemas
e proposição de soluções, para isso foram aplicados mapas falantes, painéis com fotos feitas pelos próprios indígenas, entrevistas, palestras e debates, envolvendo aproximadamente 300 pessoas12. Análises de água, de solo
e de parasitoses intestinais foram procedidas enquanto
estudo de condições sanitárias locais. A partir de 2007,
com base em um relatório síntese produzido, foi oferecido um curso de mobilização social para 30 moradores,
tendo como meta a apropriação dos produtos e articulação dos alunos com o processo de tomada de decisão.
Constatou-se que 89,2% das fontes de água disponíveis
estavam contaminadas, que ocorriam elevadas prevalências de parasitoses intestinais (69,3%) e que em 57%
11 Apresentação resultante do projeto “Pesquisa-ação no Distrito de Iauaretê
do Município de São Gabriel da Cachoeira: Proposta de melhorias sanitárias
e de hábitos”, financiado pela Fundação Nacional de Saúde e tendo como
participantes: Aristides Almeida Rocha (Faculdade de Saúde Pública – USP),
Maria Cecília Focesi Pelicioni (Faculdade de Saúde Pública – USP), Leandro
Luiz Giatti (CPqL&MD – Fiocruz); Leonardo Rios (Escola de Engenharia de
Piracicaba – EEP), Luciana Pranzetti Barreira (Faculdade de Saúde Pública
– USP), Luciane Viero Mutti (Centro de Ensino Tecnológico do Amazonas
– CETAM), Renata Ferraz de Toledo (Faculdade de Saúde Pública – USP),
Silvana Audrá Cutolo (Faculdade de Saúde Pública – USP), Geraldo Juncal
Junior (Grupo Técnico de Apoio – GTA).
12 Toledo RF, Pelicioni MCF, Giatti LL, Barreira LP, Cutolo AS, Mutti LV, Rocha AA,
Rios L. Comunidade indígena na Amazônia: metodologia da pesquisa-ação
em educação ambiental. O Mundo da Saúde 2006; 30(4): 559-569.
Comunidade indígena. Foto: Leandro Giatti.
de amostras de solo encontrava-se alguma forma parasitária – cistos, ovos ou larvas; além disso, também
foram localizados e caracterizados os depósitos irregulares de resíduos sólidos do local. Os resultados do estudo das condições sanitárias e de indicadores da saúde ambiental local foram discutidos com participação
comunitária e assim, promoveram meios para que os
moradores se apropriassem das informações. Apesar
de ser verificado o conhecimento sobre transmissão de
doenças como malária, diarréias e verminoses e sobre
a relação de causa e efeito de agravos no tocante à inexistência de saneamento, esses saberes eram re-significados na cultura indígena, prevalecendo sobre eles um
pano de fundo mítico13. Os instrumentos participativos
adotados permitiram envolver os habitantes locais e realizar intervenções educativas com o processo de discussão sobre os problemas sanitários locais.
Também foi registrada certa organização política e institucional e preocupação com a solução da problemática,
nesse contexto, a realização do curso para 30 moradores
locais, tornou acessível informação técnica passível de
subsidiar uma militância em favor do direito ao ambiente saudável. Durante a pesquisa, iniciou-se um processo
de coleta regular de lixo e ocorreu a participação dos indígenas em discussões sobre rede de abastecimento de
água em construção pelo poder público. Participantes do
projeto contribuíram em discussões locais do plano diretor municipal, com foco no saneamento básico.
O método de pesquisa-ação desenvolvido foi considerado compatível com premissas da abordagem ecossistêmica, e bastante adequado para o enfrentamento
da problemática local por se constituir com base em
um estudo interdisciplinar, possibilitando o envolvimento dos indígenas e posterior interlocução e envolvimento de esferas governamentais.
13 Giatti LL, Rocha AA, Toledo RF, Barreira LP, Rios L, Pelicioni MCF, Mutti LV,
Cutolo SA. Condições sanitárias e socioambientais em Iauaretê, área indígena em São Gabriel da Cachoeira/AM. Ciência & Saúde Coletiva 12 (6):
1387-99, 2007.
Enfoques ecossistêmicos em saúde – Perspectivas para sua adoção no Brasil e em países da América Latina
37
Foto: All type Assessoria Editorial
Perspectivas para
adoção dos enfoques
ecossistêmicos em saúde
O primeiro item deste texto descreve e compara as
duas vertentes que se encontram na base do debate
teórico e metodológico sobre os enfoques ecossistêmicos: (a) Abordagem de Saúde de Ecossistemas (ASE);
(b) Abordagem Ecossistêmica em Saúde (AES), com o
objetivo de melhor distinguir como os ecossistemas
vêm sendo tratados na sua interface com os problemas
de saúde. Ao realizar uma breve análise da produção
científica brasileira e da produção científica publicada nas revistas de saúde pública da América Latina,
constata-se que, até o momento, há uma tendência de
os enfoques baseados na AES serem mais dominantes;
ainda que a maioria apresente pouco desenvolvimento
no que se refere aos aspectos de formulação de estratégias de gestão e políticas públicas, sendo isso bem
mais acentuado quando se trata de envolver uma efetiva participação do público.
No segundo item, é realizada uma breve análise da
produção científica brasileira, ficando evidente tanto
a nítida tendência de vinculação das abordagens propostas com a AES, como também a predominância
de trabalhos de caráter teórico e conceitual. Nenhum
dos textos resultou diretamente de investigações de
campo, ainda que cada um dos autores tivesse experiências nesse tipo de trabalho, mesmo que não envolvessem diretamente estudos adotando enfoques
ecossistêmicos.
No terceiro item, a breve análise da produção científica tendo como base artigos publicados em revistas de
saúde pública da América Latina evidencia importantes aspectos relacionados aos três pressupostos básicos
dos enfoques ecossistêmicos em saúde. O primeiro é
que ainda há limitações nos estudos no que se refere
a reunião de informações diversas sobre as variáveis
(ecológicas, políticas, sociais, culturais, econômicas e
de saúde) e escalas (do local ao global) que possibilitem demonstrar de modo integrado as interfaces entre
os ecossistemas e a saúde humana. O segundo é que
propostas de gestão ambiental integrada, formulação
de políticas públicas amplas e instituições mais efetivas
para implementar as mesmas ainda não se encontram
incorporadas a totalidade dos estudos que adotam os
enfoques ecossistêmicos em saúde. O terceiro é que a
participação do público na gestão dos ecossistemas e
dos problemas de saúde, particularmente as comunidades locais, ainda que seja um pressuposto, ainda é
pouco desenvolvida, sendo raros os estudos em que
a participação ocorre do diagnóstico à formulação de
estratégias para a gestão dos problemas.
No quarto item, os resumos das apresentações nos
revelam uma diversidade e riqueza de trabalhos que
vem se aproximando ou mesmo adotando aspectos
teóricos e metodológicos dos enfoques ecossistêmicos, principalmente a AES. Também contribuem para
trazer à tona uma série de questões levantadas pelos
debatedores do primeiro (Marcelo Firpo de Souza
Porto) e segundo dias (Paulo Chagastelles Sabroza) e
que constituem desafios para os enfoques ecossistêmicos em saúde.
Um primeiro aspecto é a questão do tempo e da historicidade. A quase totalidade dos trabalhos tende à
congelar o tempo ao período de estudo, não tratando
dos processos de mudanças nos ecossistemas e seus
serviços, bem como do processo saúde-doença como
resultantes de um processo histórico, que se mantido
em seus aspectos estruturais, tenderá a perpetuar ou
mesmo agravar muitos dos problemas analisadas.
Um segundo aspecto é a questão do espaço e das escalas. Grande parte dos estudos são realizados em áreas
não-urbanas, não havendo conexão entre estas e as
áreas urbanas cuja “pegada ecológica” vai muito além
das mesmas. Além disto, é raro encontrar estudos que
conectem as mudanças que ocorrem no nível local nos
ecossistemas e seus serviços, bem como do processo
saúde-doença, com as mudanças ecológicas, sociais e
econômicas que ocorrem no nível global.
Estes dois primeiros aspectos levam a um terceiro, que
é a tendência da grande maioria do estudos adotando enfoques ecossistêmicos em saúde não tratarem
as questões relacionadas aos poderes políticos e eco-
Enfoques ecossistêmicos em saúde – Perspectivas para sua adoção no Brasil e em países da América Latina
39
nômicos que são exercidos sobre os territórios, bem
como os conflitos socioambientais oriundos dos mesmos. Predominam abordagens localistas que acabam
por não discutir os determinantes sociais presentes
nos modelos de desenvolvimento que desde o nível
global atingem o nível local, contribuindo para que
determinadas populações em territórios específicos
arquem com grande parte dos custos sociais, ecológicos e sanitários dos mesmos.
E, por fim, o terceiro aspecto se desdobra em um quarto, que se relaciona aos conflitos sociais em torno das
diferentes perspectivas e interesses. Cientistas, sociedade civil e gestores são atores que possuem diferentes
vivências, linguagens, formações, interesses e perspectivas, não sendo automático e nem livre de conflitos a adoção de enfoques que permitam os mesmos
trabalharem conjuntamente para reunir informações
diversas e gerar políticas públicas para a solução dos
problemas. O aprofundamento da compreensão dos
problemas de modo contextualizado e através de uma
comunidade ampliada de pares, que permita o engajamento com realidade local e revele as complexidades
e vulnerabilidades da mesma envolve sempre um pro-
Foto: Mara Oliveira. Acervo OPAS/OMS
cesso de negociação e, por conseguinte, de conflitos,
ainda muito pouco abordados na maioria dos estudos.
Um maior desenvolvimento e aplicação de enfoques
ecossistêmicos em saúde como uma abordagem integrada deve envolver os seguintes aspectos. Uma ampla
revisão dos estudos realizados a partir de pesquisas de
campo, de modo a permitir um desenvolvimento teórico, conceitual e metodológico que permita identificar as lacunas teóricas, conceituais e metodológicas
para uma formulação mais consistente dos enfoques
ecossistêmicos em saúde que vá além do somatório das
duas vertentes existentes (ASE e AES). Um contínuo e
monitorado investimento para pesquisas que adotem
efetivamente os três pressupostos dos enfoques ecossistêmicos em saúde (reunião de informações diversas, formulação de políticas públicas com mudanças
nas instituições e participação efetiva do público) em
diferentes escalas e com uma gama diversificada de
variáveis ecológicas, sociais, econômicas, culturais e
de saúde, permitindo que o desenvolvimento teórico,
conceitual e metodológico seja desenvolvido com base
no diálogo oriundo entre as tensões entre o empírico e
o teórico-conceitual-metodológico.
Referências
ABRAHÃO, CEC. Dengue, abordagem ecossistêmica. In: Augusto, LGS, Carneiro, RM, Martins, PH. Abordagem Ecossistêmica
em Saúde – Ensaios para o controle de dengue. Recife: Editora da UFPE., 2005. pp 137-145.
ARON JL, PATZ JA. Ecosystem change and public health – a global perspective. Baltimore: John Hopkins University Press. 2001.
BAUMGÄRTNER J, BIERI M, BUFFONI G, GILIOLI G, GOPALAN H, GREILING J, et al.. Human health improvement in
Sub-Saharan Africa through integrated management of arthropod transmitted diseases and natural resources. Cad Saúde Pública
2001; 17(Suplemento): 37-46.
BOISCHIO A, SÁNCHEZ A, OROSZ Z e col. Health and sustainable development: challenges and oportunities of ecosystem
approaches in the prevention and control of dengue and Chagas disease. Cadernos de Saúde Pública 2009; 25 (Suplemento 1):
S149-S154.
BREILH J. Nuevo modelo de acumulación y agroindustrial: las implicaciones ecológicas y epidemiológicas de la floricultura en
Ecuador. Ciencia & Saúde Coletiva 2007: 91-104.
CADERNOS DE SAÚDE PÚBLICA. Uma Abordagem Ecossistêmica à Saúde Humana: Doenças Transmissíveis e Emergentes
(suplemento especial). Cad Saúde Pública 2001: 17.
CADERNOS DE SAÚDE PÚBLICA. Enfoques ecosistémicos para el control de enfermedades transmitidas por vectores: dengue y
enfermedad de Chagas (suplemento especial). Cad Saúde Pública 2009: 25.
CARRASQUILLA G. An ecosystem approach to malaria control in an urban setting. Cad Saúde Pública 2001: 17(Suplemento):
171-79.
CORVALAN, HALES, McMICHAEL. Ecosystems and human well-being. WHO, 2005.
DÍAZ C, TORRES Y, CRUZ AM e col., Estrategia intersectorial y participative con enfoque de ecosalud para la prevención de la
transmisión de dengue en el nivel local. Cadernos de Saúde Pública 2009 (Suplemento 1): S59-S70.
FEOLA G, BAZZANI R, editores. Desafíos y estrategias para la implementación de un enfoque ecossistémico para la salud humana
en los países em desarollo – reflexiones a propósito de las consultas regionales. Montevideo: CIID. http://www.idrc.ca/lacro/docs/
conferencias/ecosalud.html , 2002
FOLLÉR M-L. Interactions between global processes and local health problems. A human ecology approach to health among
indigenous groups in the Amazon. Cad Saúde Pública 2001; 17(Suplemento): 115-126.
FREITAS CM, Oliveira SG, Schutz GE, Freitas MB, Camponovo MPG. Ecosystem approaches and health in Latin America. Cad
Saúde Pública 2007; 23: 283-296.
FREITAS CM. As Ciências Sociais e o Enfoque Ecossistêmico em Saúde. In: Minayo MCS e Coimbra Jr CEA. Críticas e Atuantes
– Ciências Sociais e Humanas em Saúde na América Latina. 2005. pp. 47-59.
GOMEZ, CM, MINAYO, MCS. Enfoque ecossistêmico de saúde: uma estratégia transdisciplinar. Inferfacehs – Revista de Gestão
Integrada em Saúde do Trabalho e do Meio Ambiente 2006; 1(1): 5 p.
JORGENSEN SE, XU F-L, SALAS F, MARQUES JC. Application of Indicators for Ecosystem Health Assessment. In Jorgensen SE,
Costanza R, Xu F-L, editors. Handbook of ecological indicators for assessment of ecosystem health. London: CRC Press. 2005.
KAY JJ, REGIER HA, BOYLE M, FRANCIS G. An ecosystem approach for sustaibaility: addressing the challenge of complexity.
Futures 1999; 31: 721-42.
LEBEL J. Health – an ecosystem approach. Ottawa: International Development Research Centre. 2003.
MILLENNIUM ECOSYSTEM ASSESSMENT. Ecosystems and Human Being – Synthesis. Washington: Island Press; 2005.
MINAYO MCS. Enfoque ecossistêmico de saúde e qualidade de vida. In: Minayo MCS e Miranda AC, organizadores. Saúde e
ambiente sustentável: estreitando nós. Rio de Janeiro: Editora Fiocruz; 2002. p 173-89.
MURRAY TP, SÁNCHEZ-CHOY J. Health, biodiversity, and natural resource use on the Amazon frontier: an ecosystem approach.
Cad Saúde Pública 2001; 17(Suplemento): 181-91.
NIELSEN NO. Ecosystem approaches to human health. Cad Saúde Pública 2001; 17(Suplemento): 69-75.
ORGANIZAÇÃO PAN-AMERICANA DA SAÚDE (OPAS). Ecossistemas e Saúde Humana: alguns resultados da Avaliação
Ecossistêmica do Milênio. Brasília: OPS/OMS, 2005.
Enfoques ecossistêmicos em saúde – Perspectivas para sua adoção no Brasil e em países da América Latina
41
POSSAS CA. Social ecosystem health: confronting the complexity and emergence of infectious diseases. Cad Saúde Pública 2001;
17: 31-41.
RAPPORT D. Defining ecosystem health. In: Rapport D, Costanza R, Epstein PR, Gaudet C, Levins R, editores. Ecosystem
Health. London: Blackwell Science. Inc.; 1998b. p. 18-33.
RAPPORT D. Dimensions of ecosystem health. In: Rapport D, Costanza R, Epstein Gaudet C, Levins R, editores. Ecosystem
Health. London: Blackwell Science. Inc.; 1998c. p. 34-40.
RAPPORT D. Need for a new paradigm. In: Rapport D, Costanza R, Epstein PR, Gaudet C, Levins R, editores. Ecosystem Health.
London: Blackwell Science. Inc.; 1998a. p. 3-17.
ROJAS CA. An Ecosystem approach to human health prevention of cutaneous leishmaniasis in Tumaco, Colombia. Cad Saúde
Pública 2001; 17(Suplemento): 193-200.
ROJAS-DE-ARIAS A. Chagas disease prevention through improved housing using an ecosystem approach to health. Cad Saúde
Pública 2001; 17(Suplemento): 89-97.
SOSA-ESTANI S, SALOMÓN OD, GÓMEZ AO, ESQUIVEL ML, SEGURA EL. Diferencias regionales y Síndrome Pulmonar por
Hantavirus (enfermedad emergente y tropical en Argentina). Cad Saúde Pública 2001; 17(Suplemento): 47-57.
WALTNER-TOEWS D. An ecosystem approach to health and its applications to tropical and emerging diseases. Cad Saúde Pública
2001: 17(Suplemento): 7-36.
WALTNER-TOEWS D. Ecosystem sustainability and health – a practical approach. Cambridge: Cambridge University Press.
2004
WALTNER-TOEWS, D., KAY, J., MURRAY, T.P. and NEUDOERFFER, C., Adaptive methdology for ecosystem sustainability and
health (AMESH). Network for Ecosystem Sustainability and Health. (http://www.fes.uwaterloo.ca/u/jjkay/pubs/amesh/) 28 p.
2002
WORLD RESOURCES INSTITUTE. World Resources 2000-2001 – People and ecosystems: the fraying web of life. Washington
DC: United Nations Development Programme, United Nations Environment Programme, World Bank, World Resources
Institute; 2000.
42
Enfoques ecossistêmicos em saúde – Perspectivas para sua adoção no Brasil e em países da América Latina
Participantes do workshop
Alexandre de Souza Vieira
Ana Felisa Hurtado Guerrero
Ana Paula de Souza
André Sobral
Antonio Levino da Silva Neto
Brani Rozenberg
Carlos Corvalán
Carlos Machado de Freitas
Cristiane Barbosa
Daniel Buss
Deuzilene Marques Salazar
Edila A. F. Moura
Érika Luciene Almeida Soares
Evelyne Marie Therese Mainbourg
Fabian Bezerra de Oliveira
Fernando Abad-Franch
Israel Brito de Souza
Jarine Rodrigues Reis
Jean Remy Daveé Guimarães
Josino Costa Moreira
Leandro Luiz Giatti
Marcelo Firpo Porto
Marcilio Sandro de Medeiros
Marcio Augusto R. Halla
Marco Aurélio Quintanilha
Margareth Monteiro
Maria Luiza Garnelo Pereira
Marisa Soares
Marlene Mineiro Pereira
Michele Alves
Mircia Betânia Costa e Silva
Patrícia de Góes Cruz
Paulo Chagastelles Sabroza
Reinaldo César Santos Zuardi
Renata Ferraz de Toledo
Ricardo Agum Ribeiro
Roberto Sena Rocha
Rodrigo Rego Barros Caruso
Virginia da Silva Almeida Martel
Impresso em Papel Reciclado
Enfoques ecossistêmicos em saúde – Perspectivas para sua adoção no Brasil e em países da América Latina
43
Organização Pan-Americana da Saúde
Série Saúde Ambiental 2
ISBN 978-85-87943-95-8
9 788587 943958
Enfoques ecossistêmicos em saúde:
perspectivas para sua adoção no
Brasil e países da América Latina
Download