Terapia Cognitivo-Comportamental no Transtorno Bipolar Fábio Riva (1), Sabrina Zancanella (2), Olga Iracema Canova (3), Janaina Mariuzzi (4), Cristina Pilla Della Méa (5) (1) Acadêmico do X nível da Escola de Psicologia da Faculdade Meridional, IMED, Brasil. E-mail: [email protected] (2) Acadêmica do X nível da Escola de Psicologia da Faculdade Meridional, IMED, Brasil. E-mail: [email protected] (3) Acadêmica do X nível da Escola de Psicologia da Faculdade Meridional, IMED, Brasil. E-mail: [email protected] (4) Acadêmica do X nível da Escola de Psicologia da Faculdade Meridional, IMED, Brasil. E-mail: [email protected] (5) Psicóloga. Especialista em Psicoterapia Cognitivo-Comportamental (UNISINOS) e Especialista em Psicologia Clínica (IMED). Professora Escola de Psicologia da IMED, Passo Fundo, RS. E-mail: [email protected] Terapia Cognitivo-Comportamental no Transtorno Bipolar Resumo: O transtorno bipolar tem como principais características clínicas a presença oscilações de humor, entre episódios maníacos ou hipomaníacos e episódios depressivos, trazendo significativos prejuízos aos pacientes e seus familiares. É uma patologia que não tem cura, mas que se tratada adequadamente, o paciente pode ficar estabilizado. O tratamento dessa patologia envolve farmacoterapia e psicoterapia. Uma das abordagens indicadas é a terapia cognitivacomportamental (TCC). O presente estudo tem como objetivo descrever os principais assuntos relacionados à TCC para pacientes com diagnóstico de transtorno bipolar. Trata-se de uma revisão bibliográfica que buscou artigos e livros referentes ao tema do ano de 1979 a 2014. Conclui-se que a TCC para o transtorno bipolar é mais longa do que para o tratamento para depressão, sendo dividida em três momentos. As sessões iniciais onde a psicoeducação sobre o transtorno é o elemento principal, sendo importante a participação da família. Nas sessões intermediárias, o foco se dá na reestruturação cognitiva e na solução de problemas. Nas sessões finais, é realizada a prevenção da recaída. Por fim, a TCC é um modelo de tratamento que atua no controle dos sintomas do transtorno, moderando oscilações de humor e mudando comportamentos, diminuindo recaídas e melhorando o funcionamento de cada indivíduo em seu meio social. Palavras-chave: transtorno bipolar; terapia cognitiva-comportamental; revisão. Abstract: Bipolar disorder has as main clinical characteristics the presence of mood swings, between manic or hypomanic episodes and depressive episodes, bringing significant damages to the patients and their families. It is a disease that has no cure, but if treated properly, the patient can be stabilized. The treatment of this pathology involves pharmacotherapy and psychotherapy. One of the indicated approaches is the cognitive-behavioral therapy (CBT). The present study aims to describe the main issues related to CBT for patients with diagnose of bipolar disorder. This is a literature review that searched articles and books related to the topic, between years 1979-2014. It is concluded that CBT for bipolar disorder is longer than for treatment for depression, being divided into three parts. The initial sessions where the psychoeducation about the disorder is the main element, with important family participation. In the intermediate sessions, the focus is given on the cognitive restructuring and problem solving. In the final sessions, relapse prevention is performed. Finally, CBT is a treatment model that operates in controlling symptoms of the disorder, moderating mood swings and changing behaviors, reducing relapses and improving the functioning of each individual in his social environment. Keywords: bipolar disorder; cognitive-behavioral therapy; review. 1. INTRODUÇÃO O transtorno bipolar (TB) consiste em uma doença psiquiátrica bastante comum que produz um grande impacto não só em termos das variáveis da doença, mas também em outros importantes domínios, como o funcionamento psicossocial, a qualidade de vida e a situação socioeconômica do paciente que recebe esse diagnóstico. A característica predominante neste transtorno envolve a presença de oscilações de humor, entre episódios de mania ou hipomania e episódios depressivos. Um episódio maníaco traz como principais sintomas, por pelo menos uma semana: humor distintamente elevado, expansivo ou irritável, autoestima inflada, agitação psicomotora, sensação de bem-estar e energia intensos (SADOCK; SADOCK, 2007). Os pacientes, durante esse episódio, costumam ficar mais excitados e com o pensamento acelerado, comportando-se de modo inconveniente e demonstrando pouca tolerância à frustração. É comum a esses pacientes apresentarem um aumento da libido, uma perda da necessidade de dormir, além de gastos com dinheiro mais elevados do que o normal. A fuga de ideias, as alucinações e os delírios de grandeza também podem estar presentes, especialmente no caso de episódios maníacos (SAFFI; ABREU; NETO, 2011). O episódio hipomaníaco engloba os sintomas maníacos de forma mais branda, visto que os mesmos não são severos o suficiente para produzir psicose. O episódio depressivo tem como características: humor deprimido, melancólico, “para baixo”, acompanhado de desânimo, falta de energia, diminuição da libido, alterações no apetite e no sono, agitação ou retardo psicomotor, sentimentos de inutilidade ou culpa, ideias recorrentes sobre morte / tentativas de suicídio (DELL’AGLIO JÚNIOR et al., 2007; SADOCK; SADOCK, 2007; AMERICAN PSYCHIATRIC ASSOCIATION, APA, 2014). Pesquisas atuais apontam a existência de diversos modelos de tratamentos psicoterápicos para o transtorno bipolar, de forma a abordar as variadas formas de atenção à saúde, em seus aspectos bio-psico-socio-culturais. Caso contrário, a abordagem utilizada estará sujeito ao fracasso (MATTA et al., 2010; LOLICH et al., 2012; MENEZES; SOUZA, 2012). Uma das intervenções psicossociais que mais contam com validade empírica para o transtorno bipolar é a terapia cognitivo-comportamental (TCC) (GONÇALVES; SANTIN; KAPCZINSKI, 2008; CORDIOLI, 2009; SAFFI; SAVOIA; NETO, 2008; LOLICH et al., 2012). O presente estudo tem como objetivo descrever os principais aspectos da TCC para pacientes com diagnóstico de transtorno bipolar. 2. MÉTODO Trata-se de uma revisão bibliográfica que consultou artigos e livros sobre essa temática no período de 1979 à 2014, pela busca de palavras-chave, como: “transtorno bipolar”, “terapia cognitiva-comportamental” e “revisão”. 3. A TERAPIA BIPOLAR COGNITIVA-COMPORTAMENTAL PARA O TRANSTORNO Por conta de sua severidade e cronicidade, frequentemente, o transtorno bipolar não pode ser facilmente detectado, tornando-se, muitas vezes, tratado de forma inadequada inclusive por muitos anos após a emergência dos sintomas. O diagnóstico desse distúrbio pode ser feito a partir de dois critérios mais difundidos que são os definidos pelo Manual Diagnóstico e Estatístico dos Transtornos Mentais - DSM-5 (APA, 2014) e pela Classificação Internacional das Doenças - CID10 (ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DA SAÚDE, OMS, 1993). O DSM-5 divide a nosologia do psicopatologia em transtorno bipolar do tipo I (preenche critérios para um episódio maníaco que pode ter sido antecedido por episódios hipomaníacos ou depressivos maiores) e transtorno bipolar do tipo II (preenche critérios de um episódio maníaco atual ou anterior juntamente com critérios para um episódio depressivo maior atual ou anterior). Logo, a CID-10 refere que trata-se de uma doença caracterizada por dois ou mais episódios, nos quais o humor e o nível de atividade do sujeito encontram-se profundamente perturbados, sendo que este distúrbio consiste em uma elevação do humor e um aumento da energia e da atividade (hipomania ou mania), ou, de um rebaixamento do humor e de redução da energia e da atividade (depressão). Pacientes que sofrem somente de episódios repetidos de hipomania ou mania são classificados como bipolares, o que inclui doença maníaco-depressiva, psicose maníaco-depressiva e reação maníaco-depressiva. A prevalência na população geral do transtorno bipolar tipo I é de aproximadamente 0,6% e do tipo II cerca de 0,3% (APA, 2014). Não há diferença significativa na prevalência entre homens e mulheres no tipo I, mas essa patologia é frequente em indivíduos solteiros ou separados (LIMA et al., 2005; KERR-CORRÊA; TORRESAN, 2010). Os sintomas desse transtorno começam a se manifestar no final da adolescência e começo da idade adulta (MAGALHÃES; PINHEIRO, 2010). Enquanto alguns raros indivíduos podem experimentar somente um único episódio de depressão e mania em suas vidas, mais de 95% das pessoas com transtorno bipolar apresentam episódios recorrentes de depressão e mania ao longo de toda sua vida, e, aproximadamente 25% dos pacientes fazem tentativas de suicídio em alguma etapa do seu desenvolvimento. Destes pacientes, cerca de 11% são levados a óbito em função da tentativa de suicídio (APA, 2014). Alem disso, os pacientes que se encontram em tratamento psicoterápico e farmacológico podem manifestar um reaparecimento dos sintomas em 50-70%, em um ano (MIKLOWITZ, 2010). A etiologia do transtorno bipolar é considerada multifatorial, ou seja, advém de alterações biológicas, influenciada por fatores ambientais e sociais, cuja expressão é ordem psicológica. Os fatores genéticos são bastante relevantes nos quadros bipolares, mais do que em qualquer outro transtorno psiquiátrico (MAGALHÃES; PINHEIRO, 2010). Quanto aos estressores ambientais ou biológicos, Beck (1979) relata dois tipos de personalidade: o sociotrópico, que valoriza as relações interpessoais com ênfase em ser amado e aceito pelos outros, estando este mais propício a desenvolver depressão quando percebe uma perda na interação social; e, o tipo autônomo, que faz alto investimento em independência pessoal, conquistas e liberdade de escolhas, mas suscetível de deprimir numa situação de perda de independência pessoal, controle ou mobilidade. A utilização de uma abordagem correta com esses pacientes é essencial para que o tratamento se inicie o quanto antes, no intuito de obter um alívio mais rápido dos sintomas (NERY-FERNANDES; MIRANDA-SCIPPA, 2013). O tratamento para o transtorno bipolar é realizado com fármacos, normalmente com estabilizadores de humor, sendo o lítio seu principal representante, além dos anticonvulsivantes, antipsicóticos, antidepressivos e neurolépticos. Além da farmacoterapia, indica-se a realização da psicoterapia, dentre elas, a terapia cognitivacomportamental (TCC) (GONÇALVES; SANTIN; KAPCZINSKI, 2008; CORDIOLI, 2009; SAFFI; SAVOIA; NETO, 2009; LOLICHET et al., 2012). A TCC surgiu a partir dos estudos de Aaron Beck na década de 1960, cujas formulações, inicialmente, voltavam-se para o tratamento de transtornos como a depressão e a ansiedade. Em seguida, com a ajuda de seus colaboradores, expandiu-se a aplicabilidade da TCC para outros quadros clínicos, como os transtornos alimentares, a bipolaridade, a esquizofrenia, os transtornos de personalidade, o abuso de substâncias e a dor crônica (WRIGHT; BASCO; THASE, 2008; BECK, 2013). Deste modo, Beck pressupôs dois conceitos essenciais ao modelo cognitivo da depressão: o esquema disfuncional e a tríade cognitiva. Os esquemas referem-se a estruturas cognitivas que acomodam o comportamento e a experiência que, por sua vez, possuem crenças e regras que exibem os conteúdos dos esquemas e determinam o conteúdo dos pensamentos. Já a tríade cognitiva refere-se a três padrões cognitivos, os quais induzem negativamente o paciente a encarar a si mesmo, seu futuro e suas experiências (WAINER; PERGHER; PICCOLOTO, 2003; BECK, 2013). A tríade cognitiva da depressão é composta por uma visão negativa de si – percebem-se como inferiores, inadequados, incapazes ou indesejados; visão negativa do futuro – consideram ter recursos insuficientes para modificar o futuro (desesperança); visão negativa do mundo e dos outros (seu ambiente) – percebem o ambiente como hostil e com obstáculos (WAINER; PERGHER; PICCOLOTO, 2003; KNAPP, 2004; POWELL et al., 2008; MOURA; SOUSA, 2009; SAFFI; ABREU; NETO, 2011). Essa modalidade de terapia preceitua que o comportamento e as emoções são influenciados diretamente pela interpretação que os indivíduos têm das situações. Sendo assim, a TCC busca identificar e modificar pensamentos disfuncionais que os pacientes apresentam. Para a terapia atingir seus objetivos, o indivíduo precisa aprender a identificar e avaliar seus pensamentos disfuncionais, modificando-os por crenças mais realistas (BECK, 2013; OLIVEIRA; SILVA; SZUPSZYNSKI, 2011). Trabalha-se com três níveis de cognição de ordem disfuncional: pensamentos automáticos (PA), pressupostos subjacentes e crenças nucleares. Os pensamentos automáticos são cognições que passam rapidamente por nossas mentes quando estamos em meio a situações ou relembrando acontecimentos. São as cognições mais superficiais da consciência e por esse motivo, geralmente, são as primeiras a serem identificadas e trabalhadas no tratamento. Os pressupostos subjacentes referem-se às regras, normas e atitudes que adotados e que orientam a nosso modo de agir. Já as crenças nucleares condizem com nossas ideias mais enraizadas a respeito de nós mesmos, dos outros e do mundo (KNAPP, 2004; BECK, 2013). A TCC está aprimorada em uma formulação em desenvolvimento contínuo dos problemas dos pacientes e em uma conceituação individual de cada paciente em termos cognitivos; requer uma aliança terapêutica sólida; reforça a colaboração e a participação ativa através do questionamento socrático; é orientada para os objetivos; enfatiza o presente; é educativa, tem como objetivo ensinar o seu paciente a ser o seu próprio terapeuta; enfatiza a prevenção a recaída; visa ser limitada no tempo; tem sessões estruturadas; utiliza-se de uma variedade de técnicas para mudar o pensamento, o humor e o comportamento (BECK, 2013). Seu elemento fundamental é a conceitualização cognitiva, pois é o mapa do paciente que permite a compreensão de como este se estruturou para sobreviver e como se protegeu de suas crenças negativas e do ambiente no qual se desenvolveu (PEREIRA; RANGÉ, 2011; SAYAGO; DORNELES, 2011). A TCC para o transtorno bipolar pode ser realizada de forma grupal ou individual (MATTA et al., 2010). É uma psicoterapia de duração extensa, cujos objetivos do tratamento são: educar o paciente e seus familiares assim como as pessoas que convivem com o paciente, seu tratamento e as dificuldades associadas à doença; ajudar o paciente a desenvolver um papel mais ativo no tratamento; ensinar técnicas de monitoração de ocorrência, gravidade e curso dos sintomas; oferecer atividades não farmacológicas para lidar com os pensamentos, emoções e comportamentos problemáticos; auxiliar a controlar sintomas leves; ajudar a encarar fatores de estresse que podem acelerar episódios de mania e depressão; prevenir a recorrência de episódios de humor; instigar a aceitação do diagnóstico; enfraquecer trauma e estigma associados; ensinar habilidades para lidar com problemas, sintomas e dificuldades (JURUENA, 2008; GONÇALVES; SANTIN; KAPCZINSKI, 2009; SAFFI; ABREU; LOTUFO NETO, 2011). O tipo de abordagem dentro da TCC vai depender de como o paciente está no início da terapia. Normalmente, o paciente que está na fase maníaca sente-se muito bem, acredita que não precisa se tratar e pode não aceitar tentativas de abordagem. Já quando está na fase depressiva, apresenta ideias negativas com relação ao tratamento, sendo difícil aderir nesse período a uma psicoterapia. Porém, se o paciente buscar a TCC na fase aguda da doença, a intervenção deve ser direcionada à adesão a medicação, ao fortalecimento da aliança terapêutica e deve-se iniciar a intervenção direcionada para a família. Para a fase de estabilização, é necessária a psicoeducação e a introdução de técnicas cognitivas e comportamentais, no intuito de efetuar a manutenção do ritmo circadiano e da vida social. Na fase de manutenção torna-se possível fazer uso técnicas mais complexas da TCC (GONÇALVES; SANTIN; KAPCZINSKI, 2009). Nas sessões iniciais, deve ser realizada a construção da aliança terapêutica, a educação sobre o modelo cognitivo; a psicoeducação sobre o transtorno; a avaliação sobre o uso da medicação e sintomas e a organização de um “plano de emergência”, caso o paciente desestabilize (JURUENA, 2008). Um dos primeiros recursos utilizados na TCC consiste na educação sobre o transtorno do qual o paciente é acometido. Essa educação é feita por meio de material informativo ao paciente e seus familiares, procurando elucidar os sintomas, causas e tratamento. A falta de sucesso no tratamento de pessoas com transtorno bipolar, em uma percentagem, deve-se a ausência de comprometimento com o uso da medicação. Por isso, orientar sobre essa doença dizendo o que é, quais os sintomas, quais os tratamentos existentes, bem como a importância de tomar regularmente a medicação para estabilizar a patologia clínica maximiza a aceitação ao tratamento. Minimizar o tratamento medicamentoso faz aumentar consideravelmente as recaídas. Também o uso de medicação contribui para a modificação e o desenvolvimento da patologia, melhorando o funcionamento social e ocupacional do paciente (LOTUFO NETO et al., 2001; DELL’AGLIO JÚNIOR et al., 2007; RANGÉ; SOUZA, 2008; MATTA et al., 2010; LOLICH et al., 2012). Um estudo realizado com pacientes japoneses revelou que a falta de adesão ao tratamento está relacionada com crenças pessoais no que se refere à patologia, a falta de valorização da relação com o médico, aos efeitos que a medicação poderá provocar e a falta de entendimento da necessidade desta. Portanto, é necessário que o paciente não somente receba a informação sobre a sua patologia e a forma de tratá-la, mas deve-se considerar as suas crenças disfuncionais, pois estas podem interferir negativamente na compreensão da informação recebida e atrapalhar no tratamento e na aquisição de um resultado satisfatório (PELLEGRINELLI; ROSO; MORENO, 2010). Ainda, torna-se fundamental psicoeducar as famílias que com um membro com esse diagnóstico. Essa intervenção consiste em fornecer subsídios para que os familiares desenvolvam recursos de comunicação entre os membros que diminuam a possibilidade de conflitos, adquirindo conhecimento sobre a doença do paciente, de forma a auxiliar na prevenção de sintomas depressivos e/ou maníacos (LOLICH et al., 2012). Orientar a família desde o início, reforçando que ela pode ajudar muito em manter estável o quadro; reforçar a importância de tomar o medicamento diariamente e sugerir alternativas para reduzir efeitos dos mesmos são consideradas atitudes fundamentais. Esses esclarecimentos auxiliam a diminuir o preconceito que massacra os pacientes com TB e seus familiares (PELLEGRINELLI; ROSO; MORENO, 2010). O monitoramento dos sintomas é uma ferramenta importante no início do tratamento, pois ajuda o paciente e o terapeuta a conhecerem como são as oscilações de humor, podendo prever precocemente novos episódios da doença. O humor pode ser monitorado através de gráficos, de afetivogramas (paciente registra seu humor diariamente, percebendo as alterações), podendo ser realizado durante a sessão ou como tarefa de casa (JURUENA, 2008). Isso também auxilia na diminuição das taxas de recaída, na cronicidade da doença e no risco de suicídio, evitando uma crise ou uma internação. Além disso, é necessário combinar com o paciente, quando ele estiver em crise, para quem o terapeuta recorre, quem é o médico e onde pretende se internar, se necessário. Também, são discutidas questões financeiras, tópicos sobre suicídio e o comportamento sexual promíscuo. Nas sessões intermediárias, a psicoeducação, a verificação do uso da medicação e o monitoramento do humor continuam sendo realizadas. Então, nessa fase do tratamento, inicia-se a reestruturação cognitiva, que pode ser efetuada com o uso de diferentes técnicas: identificação de pensamentos, de sentimentos e comportamentos, bem como a correção de distorções cognitivas através de registro de pensamentos disfuncionais (RPD) ou do ABC; do questionamento socrático; da flecha descendente e do diagrama de conceitualização cognitiva. Os pacientes com transtorno bipolar geralmente descrevem problemas psicossociais e interpessoais, fazendo-se necessário que o terapeuta lance mão do treinamento de habilidades sociais e da técnica de resolução de problemas para auxiliá-los (BECK et al., 1997; JURUENA, 2004; LEAHY, 2006; GONÇALVES; SANTIN; KAPCZINSKI, 2008; SAFFI; SAVOIA; LOTUFO NETO, 2009; BECK, 2013). Uma vez que os problemas e os objetivos vão sendo sanados, a terapia vai finalizando. É realizado um trabalho de prevenção a recaídas. O principal objetivo da prevenção é promover alterações na maneira como o paciente vive, tendo como finalidade a diminuição do risco em desenvolver novos episódios (GONÇALVES; SANTIN; KAPCZINSKI, 2008). Trata-se de checar e desafiar pensamentos automáticos residuais e comportamentos evitativos que ainda existam no final do processo terapêutico, fazendo com que o paciente venha a ser o seu próprio terapeuta. Em pacientes com transtorno bipolar, é importante ajudar a identificar sinais e sintomas prodrômicos de possíveis episódios de humor, desenvolver uma lista hierárquica de situações e comportamentos de alto risco, verifica-se como está a adesão a farmacoterapia, alertando sobre os comportamentos de risco, como a ingestão de álcool (RANGÉ, 2001; GONÇALVES; SANTIN; KAPCZINSKI, 2008). A psicoterapia do transtorno bipolar requer considerável flexibilidade no estilo e na técnica do terapeuta. A flexibilidade se faz necessária por causa das mudanças de humor, cognição e comportamento, assim como nas flutuações de dependência intrínsecas da doença (LOTUFO NETO et al., 2001; DELL’AGLIO JÚNIOR et al., 2007). Cabe destacar que os resultados da TCC se mostram positivos, porém não vislumbram a “cura” da psicopatologia, visto que o transtorno de humor bipolar possui uma natureza crônica e recorrente. Nesse sentido, seu objetivo consiste em possibilitar ações preventivas, tornando o paciente independente e ativo ao seu transtorno e tratamento (MATTA et al., 2010). 4. CONSIDERAÇÕES FINAIS Conclui-se que a TCC para o transtorno bipolar é mais longa do que para o tratamento da depressão, sendo dividida em três momentos. Nas sessões iniciais, a psicoeducação sobre o transtorno é o elemento principal, sendo importante a participação da família. Nas sessões intermediárias, o foco se dá na reestruturação cognitiva e na solução de problemas. Nas sessões finais, é realizada a prevenção da recaída. Por fim, a TCC é um modelo de tratamento que atua no controle dos sintomas do transtorno, moderando oscilações de humor e mudando comportamentos, diminuindo recaídas e melhorando o funcionamento de cada indivíduo em seu meio social. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS AMERICAN PSYCHIATRICASSOCIATION, APA. Manual diagnóstico e estatístico de transtornos mentais – DSM-5. 5. ed. Porto Alegre: Artmed, 2014. 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