Marchini, Elsie Quintaes. “Uma grande oportunidade para as pequenas empresas” São Paulo: Valor Econômico, 30 de janeiro de 2004. JEL: L. Uma grande oportunidade para as pequenas empresas Elsie Quintaes Marchini Nossa talentosa indústria têxtil brasileira tem conquistado grandes avanços nos últimos anos. Segundo setor que mais emprega no país, depois da construção civil, esse segmento envolve 30 mil empresas formais que geram 1,5 milhão de empregos diretos e só em 2002 exportaram US$ 1,185 bilhão. Em paralelo a isso, a moda brasileira tem merecido destaque na mídia internacional. A brasilidade está criando um diferencial para o produto "made in Brazil" por meio de empresas como M. Officer, Cia. Marítima, Consórcio Flor Brasil e Patachou. Essa marca nacional tem sido valorizada também com o trabalho de estilistas como Lino Villaventura, Walter Rodrigues, Ronaldo Fraga, André Lima e Fause Haten. Entretanto, a confecção brasileira não se encontra apta para atender a uma exportação expressiva, meta presente do governo brasileiro. Esse setor, que ocupa em sua maioria mão-de-obra feminina, é composto por um grande número de pequenas e microempresas. De acordo com dados do Instituto de Estudos e Marketing Industrial (IEMI) de 2002, existem 17,2 mil empresas diretamente envolvidas nas atividades de fabricação de roupas e similares. Se considerarmos as informais, a projeção salta para 50 mil empresas. Não é de se admirar que, embora o mercado mundial de vestuário seja de US$ 195 bilhões, a participação brasileira é de apenas 0,14%. Isso se deve a problemas sérios que emperram a competitividade brasileira, como a precária infra-estrutura de transporte, o sistema tributário burocrático e custos de capital elevados. Os danos se somam à desorganizada estrutura de produção, à falta de planejamento na gestão do negócio, ineficiência na comercialização e logística, além da inexistência de design diferenciado do produto. Como se vê, são muitos nós que precisam ser desatados. Em 2005, a indústria têxtil e de confecção enfrentará um mundo livre de quotas. Com condições de igualdade e atratividade, o Brasil precisará investir na criação de uma moda diferenciada, na capacitação de recursos humanos, no desenvolvimento de coleções próprias, maquinário e nos processos de produção, com tecnologias avançadas. Se o comércio de vestuário cresce numa razão de 9% ao ano, o Brasil poderá exportar muito mais do que já exporta quando o sistema de quotas sucumbir e decisões internas destravarem os bloqueios que dificultam a competitividade do setor de confecções. Acreditamos que há uma formula - não mágica, mas possível - de construir uma relação sustentável que permita ao setor conquistar novos espaços na economia globalizada. Chamada "abordagem territorial", esta fórmula é uma nova forma de pensar um espaço físico onde empresas, pertencendo a uma região com identidade própria, podem ser capazes de construir um caminho diferente daquele perseguido individualmente por cada uma delas. Esta é a saída para os empreendedores atuarem conjuntamente, cooperando para competir. Por meio de ações associativas e de uma rede de atores que promovam governança integrada, inovação tecnológica e aprendizado contínuo, empresas de um território podem obter benefícios que, isoladamente, são impossíveis de serem conquistados. Muitas possibilidades podem ser criadas por meio de compras conjuntas, que garantem maior quantidade, menor preço, maior poder de negociação e eficiência na entrega. Outras chances podem ser encontradas, como a especialização dentro da cadeia e certificação territorial. Não há como uma pequena empresa de confecção sobreviver isolada. Ela deve construir uma rede de parcerias com outras empresas do mesmo território e lançar mão da cultura local, utilizando os seus símbolos culturais para o desenvolvimento de produtos, embalagens e ações de propaganda e marketing. A base do seu sucesso deve ser o território e suas riquezas. Isso já foi testado na Itália, onde as pequenas empresas impulsionam a economia com eficiência, cooperando umas com as outras, utilizando tecnologias avançadas e valorizando aquilo que fazem de melhor: design diferenciado, cooperação empresarial e ações de marketing eficazes. Na região italiana da Lombardia, aprendemos que o talento desenvolvido dos distritos industriais conquista o mundo, seja com móveis, roupas, arquitetura ou outros produtos. Se culturalmente não aprendemos ainda que cooperar pode ser a saída para sermos competitivos, o exemplo italiano nos mostra que no mundo só há lugar para quem sabe onde quer ir e como chegar lá. Como há forte presença de pequenos negócios ao longo da cadeia da moda, em especial de confecções, é fundamental que as instituições brasileiras apóiem estas empresas. É necessário fomentar desenvolvimento territorial, governança local, capacidade inovativa local e aumentar a competitividade sustentável. Com isso, é possível valorizar as identidades territoriais e preservar o meio ambiente. No Agreste Pernambucano, onde o Sebrae está tendo um papel atuante, existem mais de 12.000 empresas de confecção. Diversas instituições se uniram com os empresários para desenvolver o território e promover o desenvolvimento sustentável. Em função desta mobilização, estão sendo realizadas inúmeras ações, entre elas o Instituto da Moda. É o Brasil que está trabalhando para construir um país melhor. Apostar na abordagem de Arranjos Produtivos Locais significa estimular a sociedade a investir na cultura da cooperação em benefício da competitividade conjunta, do crescimento e da estabilidade econômica. Juntando esforços e construindo redes de distribuição, as pequenas empresas poderão competir neste mundo livre de quotas, criando uma "Moda" com identidade que rompe fronteiras.