Workshop Plantas Medicinais e Fitoterapêuticas nos Trópicos. IICT /CCCM, 29, 30 e 31 de Outubro de 2008 Identificação botânica de Maytenus senegalensis folha como fármaco vegetal ____________________________________________________________________________________________________ IDENTIFICAÇÃO BOTÂNICA DE MAYTENUS SENEGALENSIS FOLHA COMO FÁRMACO VEGETAL Serrano R., Gomes E.T e Silva O. iMed.UL, Faculdade de Farmácia, Universidade de Lisboa, Av. Prof. Gama Pinto,1649-019 Lisboa [email protected] Resumo Maytenus senegalensis (Lam.) Exell é um arbusto ou árvore das regiões tropicais e subtropicais com utilização na medicina tradicional africana, pertencente à família Celastraceae. Esta família engloba espécies com significativa utilização em doenças gástricas, respiratórias e inflamatórias, tendo sido também referida a sua actividade anti-séptica e anti-tumoral. Neste estudo identificamos os caracteres botânicos necessários para a diagnose desta planta como droga vegetal medicinal. A metodologia utilizada integra a análise macroscópica e microscópica das folhas secas, fragmentadas e pulverizadas, através de microscopia óptica e electrónica de varrimento. Os resultados obtidos permitem estabelecer critérios botânicos essenciais para a identificação de M. senegalensis folha e são susceptíveis de serem incluídos em monografia para controlo de qualidade do fármaco. Palavras-Chave: Caracterização botânica; Droga vegetal; Maytenus senegalensis; Planta medicinal. INTRODUÇÃO Maytenus senegalensis (Lam.) Exell é uma espécie da Família Celastraceae, que tem como sinonímia Gymnosporia senegalensis (Lam.) Loes., Celastrus senegalensis Lam., Catha senegalensis (Lam.) G. Don. É um arbusto ou árvore, com até 15 m de altura, glabro com espinhos axilares até 7 cm de comprimento e ramos jovens quase desprovidos de linhas em relevo, glaucos, mais ou menos comprimidos. As flores são dióicas, aromáticas, com 2-6 mm de diâmetro, providas de 5 sépalas oblongo-lanceoladas; 5 pétalas, elípticas ou oblanceoladas e 5 estames menores que as pétalas. O fruto é uma cápsula globosóide, de 2-6 mm de comprimento, avermelhada, lisa, quase sempre 2locular. As sementes 1-2, castanho-avermelhadas escuras, são lustrosas, com arilo. A folha é alterna ou fasciculada, peciolada, glauca e coriácea, com pecíolo até 2 cm de comprimento, limbo ovado, oblongo ou elíptico, até 13x6cm e margem densa serrilhada (KOKWARO 1976). Espécie de vasta utilização na medicina tradicional africana, M. senegalensis é conhecida em Moçambique por: XILANGUA, na região de Maputo; CHICHANGA, CHICHANGUA, XIXANGUA, XIHLANGUA, CHIXANGUA, CHICHANGUA, CHILHAUNGUA, na região de Gaza; NHAQUITOFOROFO, na região de Inhambane; MUTULUCA, na região de Manica; e por 1 Workshop Plantas Medicinais e Fitoterapêuticas nos Trópicos. IICT /CCCM, 29, 30 e 31 de Outubro de 2008 Identificação botânica de Maytenus senegalensis folha como fármaco vegetal ____________________________________________________________________________________________________ SUCAMENO, na região de Tete, sendo utilizada por via interna e externa, como anti- inflamatório, anti-tumoral, no tratamento de chagas, debilidade, desinterias, doenças sexualmente transmissíveis, dores de dentes, epilepsia, mordeduras de cobra, tosse e tuberculose, úlceras e como vermífugo (JANSEN & MENDES 1991). Os constituintes químicos identificados nesta parte da planta incluem alcalóides (estaquidrina, efedrina e nor-efedrina), alcanos e alcanóis, terpenos e esteróides (monoterpenos – terpineol, geraniol e linalol; triterpenos - pristimerina, ácido maitenóico; esteróides - betulina, β-amirina e β-sitosterol) e compostos fenólicos (ácido vanílico, ácido ferúlico, antocianinas, leucoantocianinas, heterósidos dos flavonóis quempferol e quercetina e taninos condensados) (DA SILVA 2008). São vários os estudos de actividade biológica realizados in vitro e/ou in vivo com extractos das folhas de M. senegalensis e/ou constituintes obtidos a partir destes, tendo já sido demonstrada, entre outras, actividade anti-inlamatória, anti-oxidante, antiulcerogénica, antinociceptiva, anticancerígena, antimutagénica e antimicrobiana contra Mycobacterium tuberculosis. (EL TAHIR et al. 1999; HUSSEIN et al. 1999; LALL et al. 1999) Tendo em conta a importância desta espécie na medicina tradicional africana e, tanto quanto é do nosso conhecimento, a ausência de critérios de qualidade que permitam a sua correcta utilização como planta medicinal passível de inclusão em chás medicinais e preparações à base de plantas, no presente trabalho complementam-se os resultados de um estudo farmacognóstico visando a identificação botânica da folha seca de Maytenus senegalensis (Lam.) Exell, inteira ou fragmentada enquanto fármaco vegetal (SERRANO et al. 2008). MATERIAIS E MÉTODOS Material vegetal Foram utilizados trinta exemplares de folha de Maytenus senegalensis (Lam.) Exell, colhidos e secos em Maputo (Moçambique) por O. Silva. A confirmação da identidade deste material foi efectuada por M. A. Diniz. Um exemplar voucher foi depositado no Herbário do Instituto de Investigação Científica Tropical (LISC) em Lisboa. Análise macroscópica 2 Workshop Plantas Medicinais e Fitoterapêuticas nos Trópicos. IICT /CCCM, 29, 30 e 31 de Outubro de 2008 Identificação botânica de Maytenus senegalensis folha como fármaco vegetal ____________________________________________________________________________________________________ As observações foram efectuadas com Lupa Olympus SZ61 acoplada a camera Olympus ColorView IIIu. A análise de imagem com o Software Cell D 2006 Olympus. Análise microscópica Esta análise foi efectuada em secções transversais, destacamentos de epidermes e droga vegetal pulverizada, sendo as observações efectuadas por recurso a microscopia óptica (MO) e a microscopia Electrónica de Varrimento (MEV) MO - Foi utilizado um microscópio Olympus CX40 acoplado a uma camera Olympus ColorView IIIu, sendo a análise de imagem efectuada através do programa informático Cell D 2006 da Olympus. MEV – Após fixação do material seco ao porta-objectos do microscópio e metalização deste com uma película de ouro num Polaron E 5350, as observações foram efectuadas num microscópio de varrimento JEOL JSM T220 a 15 kV. RESULTADOS Análise macroscópica Folha de comprimento 3–13(20) mm; limbo verde pálido, glauco, por vezes com nervura principal avermelhada, matizada, 2–11,6 × 0,4–5,7(6,3) cm, coriáceo ou subcoriáceo, com nervuras laterais e nervação reticulada; forma oblonga ou ovada a oblongo-lanceolada ou oblongo-elíptica ou subcircular, arredondada a obtusa ou apiculada no ápice, peciolada; margem ± densamente serrada, cuneada na base (Figura 1 A e 1B). 3 Workshop Plantas Medicinais e Fitoterapêuticas nos Trópicos. IICT /CCCM, 29, 30 e 31 de Outubro de 2008 Identificação botânica de Maytenus senegalensis folha como fármaco vegetal ____________________________________________________________________________________________________ Figura 1. Características macroscópicas A B A. Página superior; B. Página inferior Análise microscópica Corte transversal A nível da nervura principal (Figura 2A) as principais características observadas foram a bainha anficrival rodeada por anel descontínuo de esclerênquima e a presença de colênquima e drusas de oxalato de cálcio a nível do floema. A nível do limbo (Figura 2B) é possível a observação de células epidérmicas com cutícula lisa, subepiderme, parênquima em paliçada isobilateral contendo drusas de oxalato de cálcio e idioblastos de conteúdo fenólico. 4 Workshop Plantas Medicinais e Fitoterapêuticas nos Trópicos. IICT /CCCM, 29, 30 e 31 de Outubro de 2008 Identificação botânica de Maytenus senegalensis folha como fármaco vegetal ____________________________________________________________________________________________________ Figura 2. Corte transversal da folha (MO) A B Vista superior Ambas as epidermes mostraram ser constituídas por células poligonais de paredes sinuosas e estomas paracíticos, sendo o índice estomático da epiderme inferior de 7,76 e o da epiderme superior de 5,82. (Figura 3A e 3B). A análise por MEV (Figura 4) mostrou uma distribuição estomática aleatória em ambas as epidermes (Figura 4A e 4B) e o posicionamento característico destes em zonas epidérmicas deprimidas (Figura 4C a 4F). Figura 3. Epiderme, vista superior (MO) A B Barra = 100 μm Droga vegetal pulverizada O pó mostrou côr castanha-acinzentado. Ao microscópio (MO e MEV) apresentou os seguintes elementos: Fragmentos de epiderme formada por células poligonais e parede espessa; numerosos estomas tipo paracítico na epiderme inferior e superior; fragmentos do limbo, com cutícula lisa e espessa, 3 a 4 assentadas de células em paliçada; células de parênquima em paliçada cilíndricas e parênquima lacunoso escasso, composto por células 5 Workshop Plantas Medicinais e Fitoterapêuticas nos Trópicos. IICT /CCCM, 29, 30 e 31 de Outubro de 2008 Identificação botânica de Maytenus senegalensis folha como fármaco vegetal ____________________________________________________________________________________________________ de forma irregular; fragmentos de vasos anelados; drusas de oxalato de cálcio (com diâmetro médio de cerca de 25 µm) isoladas ou associadas a fragmentos de parênquima em paliçada. Figura 4. Epiderme, vista superior (MEV) A B B C D D E FF A, C e E – epiderme inferior; B, D e F – epiderme superior CONSIDERAÇÕES FINAIS No presente trabalho foi possível a identificação dos principais caracteres botânicos a ter em conta para correcta identificação da folha seca de Maytenus senegalensis (Lam.) Exell, inteira ou fragmentada enquanto droga/fármaco vegetal. Entre os caracteres observados e a considerar destaca-se a: organização isobilateral do parênquima, com parênquima em paliçada com cerca de 2-3 a 3-4 fiadas de células 6 Workshop Plantas Medicinais e Fitoterapêuticas nos Trópicos. IICT /CCCM, 29, 30 e 31 de Outubro de 2008 Identificação botânica de Maytenus senegalensis folha como fármaco vegetal ____________________________________________________________________________________________________ nas epidermes inferior e superior, respectivamente; existência de duas camadas subepidérmicas; presença de cristais de oxalato de cálcio sob a forma de drusas, isolados ou inseridos no parênquima em paliçada; epiderme uniestratificada com células poligonais com paredes sinuosas; cutícula das células epidermérmicas lisa; a presença de estomas paracíticos, mais frequentes na epiderme inferior. As características botânicas supramencionadas deverão ser incluídas, e a sua observação obrigatória, no protocolo de Identificação de qualquer monografia relativa aos critérios de qualidade de Maytenus senegalensis, folha, a fim de possibilitar a sua utilização como droga vegetal para fins medicinais. AGRADECIMENTOS Ao Dr. Telmo Nunes do Centro de Biologia Ambiental da Faculdade de Ciências, Universidade de Lisboa, pela assistência técnica na utilização do Microscópio Electrónico de Varrimento. REFERÊNCIAS DA SILVA, G. (2008), Caracterização química preliminar das folhas de duas espécies da família Celastraceae (Maytenus heterophylla e Maytenus senegalensis), Relatório da disciplina de Projecto II, Faculdade de Farmácia da Universidade de Lisboa, Ano lectivo 2007/2008. EL TAHIR, A. et al. (1999), Antiplasmodial activity of selected Sudanese medicinal plants with emphasis on Maytenus senegalensis (Lam.) Exell. Journal of Ethnopharmacology 64:227-233. HUSSEIN, G. et al. (1999), Inhibitory effects of Sudanese plant extracts on HIV-1 replication and HIV-1 protease Phytochemistry 50:689-694. JANSEN, P., MENDES, O. (1991), Plantas Medicinais – Seu Uso Tradicional em Moçambique, Tomo IV, Edição Gabinete de Estudos de Medicina Tradicional, Maputo: Imprensa do Partido, 28-54. KOKWARO, J. O. (1976), Medicinal Plants of East Africa. East African Literature Bureau. Nairobi. LALL, N. & MEYER, J. (1999), In vitro inhibition of drug-resistant and drug-sensitive strains of Mycobacterium tuberculosis by ethnobotanically selected South African plants Journal of Ethnopharmacology 66:347-354. SERRANO, R., GOMES, E.T. & SILVA, O. (2008), Botanical characterization of Maytenus senegalensis leaf an African medicinal plant. Planta Medica, 74: 240. 7