TESE BIOCARVÃO NA MITIGAÇÃO DA TOXICIDADE DE METAIS PESADOS EM SOLOS DE ÁREA DE MINERAÇÃO ALINE PEREGRINA PUGA Campinas, SP 2015 INSTITUTO AGRONÔMICO CURSO DE PÓS-GRADUAÇÃO EM AGRICULTURA TROPICAL E SUBTROPICAL BIOCARVÃO NA MITIGAÇÃO DA TOXICIDADE DE METAIS PESADOS EM SOLOS DE ÁREA DE MINERAÇÃO ALINE PEREGRINA PUGA Orientadora: Cleide Aparecida de Abreu Tese submetida como requisito parcial para obtenção do grau de Doutor em Agricultura Tropical e Subtropical, Área de concentração em Gestão de Recursos Agroambientais Campinas, SP Julho 2015 Tudo aquilo que sonha e espera de melhor está ao alcance de suas mãos, aguardando o seu pronto restabelecimento e amadurecimento espiritual. Tudo o que se deseja é possível de se obter, mas se faz preciso acreditar, pensar firmemente no melhor, para depois recebê-lo. Crie as oportunidades para conseguir o que deseja. Faça um esforço. O que Deus lhe destinou por mérito só compete a você fazer por merecer realmente. Valdemir R. Barbosa À minha família (meus pais Márcio e Isabel, meus irmãos Bruno e Felipe, e ao meu marido Fausto) dedico a vocês o fruto desta minha jornada. Obrigada pelo apoio incondicional e por me fazer um ser humano melhor e feliz. AGRADECIMENTO A Deus, que não nos faz desistir nos momentos mais difíceis. Ao Instituto Agronômico de Campinas (IAC), por todo apoio e estrutura. Ao Programa de Pós-Graduação em Agricultura Tropical e Subtropical (Gestão de Recursos Agroambientais) do IAC por ter me aceitado como discente. À Coordenadoria de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) e à Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP), pela concessão da bolsa de doutorado e da bolsa para o estágio no exterior. À minha orientadora Dra. Cleide Aparecida de Abreu, pela oportunidade, apoio, conhecimento científico e paciência durante toda essa jornada. Agradeço também ao Dr. Leônidas Carrijo Azevedo Melo pela oportunidade e sugestões durante todo o período, e por sua atuação mesmo não oficial como co-orientador. Ao Prof. Dr. Luiz Roberto Guimarães Guilherme (UFLA) e toda sua equipe (Ênio, Guilherme, Regla, Cláudia, Douglas) pela oportunidade e auxílio na coleta de material para estudo. Ao meu orientador do exterior Dr. Luke Beesley pela ótima receptividade, amizade e por me dar excelentes oportunidades de vida e de trabalho. Aos membros da banca de qualificação Dr. Otávio Antônio de Camargo, Dr. Márcio Koiti Chiba e Dr. Ronaldo Severiano Berton, e, membros da banca de defesa Dr. Aline Reneé Coscione, Dr. Cristiano Alberto de Andrade, Dr. Marcio Roberto Soares e Dr. Guilherme Lopes, pelas valiosas contribuições. Aos meus pais (Márcio e Isabel), meus maiores exemplos de vida, por todo amor, incentivo, apoio e por acreditarem em mim. Devo tudo a vocês. Aos meus irmãos (Bruno e Felipe), por todo amor e diversão. Ao meu marido Fausto, por seu amor, paciência e apoio incondicional. Aos meus queridos amigos da Pós-Graduação: Acácio, Hélio, Johnny, Késia, Rafael, Renan e Vitor. Agradeço também a amizade da Thais e Zaqueu. Agradeço especialmente a Bárbara, Paula e Priscila, que fizeram esta jornada mais leve e engraçada. Às amigas Ana Paula, Suéllen, Estela, Carol, Mariana e Silce, que sempre me dão palavras de incentivo. À minha querida Estefanía Pérez por dividir o seu lar comigo e me tratar como família, quando eu estava longe da minha. Agradeço a minha querida Inma de Juan pela amizade e deliciosos pratos. Aos funcionários do Centro de Solos e Recursos Ambientais, em especial, Dona Anita, Zé Luís, Sr. Luís, Douglas, Janete e Luciana. A todos aqueles que, mesmo não mencionados, contribuíram para minha formação. Muito obrigada! BIOGRAFIA ALINE PEREGRINA PUGA - nascida em São José do Rio Preto em 27 de março de 1985, filha de Márcio Luís Puga e Isabel Peregrina Pereira Puga. Em dezembro de 2008 graduou-se em Engenharia Agronômica na Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), Câmpus de Araras, SP, sendo bolsista de iniciação científica por dois anos pela Pró-Reitoria de Pós-Graduação e Pesquisa da UFSCar. Em março de 2009 iniciou o Mestrado em Agronomia (Ciência do Solo) na Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” (UNESP), Câmpus de Jaboticabal, SP, sendo bolsista da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) por seis meses e até o final do curso da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP). Durante esse período, realizou um ano de estágio docência na mesma Universidade, e em fevereiro de 2011 obteve o título de Mestre em Agronomia (Ciência do Solo). Em julho de 2011 iniciou o Doutorado em Agricultura Tropical e Subtropical (Gestão de Recursos Agroambientais) no Instituto Agronômico de Campinas (IAC), Campinas, SP, sendo bolsista da CAPES por seis meses e, até o final do curso, da FAPESP. Em 2013 realizou um ano de estágio docência na Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP) e de abril a setembro de 2014 realizou estágio de pesquisa no exterior no The James Hutton Institute em Aberdeen (Escócia), sendo bolsista da FAPESP durante todo o período. Realizou diversas atividades como organização de simpósio, participação de cursos e congressos, tanto no Brasil como no exterior. Foi autora e co-autora de doze artigos em periódicos científicos, um livro, dois capítulos de livro e mais de vinte resumos em congressos. Foi membro de uma banca de trabalho de conclusão de curso. SUMÁRIO RESUMO ....................................................................................................................... xi ABSTRACT .................................................................................................................. xii 1 INTRODUÇÃO .......................................................................................................... 01 2 REVISÃO DE LITERATURA .................................................................................. 03 2.1 Contaminação ambiental por metais pesados .......................................................... 03 2.2 Mobilidade e especiação de cádmio, chumbo e zinco no solo ................................ 04 2.3 Cádmio, chumbo e zinco na planta .......................................................................... 07 2.4 Revegetação em áreas mineradas..............................................................................08 2.5 Biocarvão ................................................................................................................. 09 2.6 Mitigação de metais pesados por biocarvão .............................................................11 3 CAPÍTULO I: Aplicação de biocarvão em solos contaminados e fitodisponibilidade de cádmio, chumbo e zinco ............................................................................................14 3.1 Introdução ................................................................................................................16 3.2 Material e Métodos ..................................................................................................17 3.3 Resultados e Discussão ............................................................................................26 3.4 Conclusão ................................................................................................................53 4 CAPÍTULO II: Lixiviação e extração sequencial de metais pesados em solos de mineração que receberam aplicação de biocarvão ..........................................................55 4.1 Introdução ................................................................................................................57 4.2 Material e Métodos ..................................................................................................58 4.3 Resultados e Discussão ............................................................................................65 4.4 Conclusão ................................................................................................................87 5 CONSIDERAÇÕES FINAIS ......................................................................................89 6 REFERÊNCIAS ..........................................................................................................90 BIOCARVÃO NA MITIGAÇÃO DA TOXICIDADE DE METAIS PESADOS EM SOLOS DE ÁREA DE MINERAÇÃO RESUMO Metais pesados em solos podem ocorrer de forma natural ou podem ter sua concentração aumentada por atividades antrópicas, como a mineração. É de extrema importância conhecer o comportamento dos metais pesados em solos contaminados, devido à sua toxicidade e permanência na cadeia trófica. Uma das formas para prevenir o movimento dos metais no solo é o uso de materiais amenizantes capazes de reter esses elementos, como o biocarvão (BC). Objetivou-se com esse estudo avaliar a aplicação de BC em solos com metais pesados (Cd, Pb, Zn) oriundos de área de mineração, bem como verificar o efeito no crescimento de duas espécies de plantas, além de avaliar o efeito do pH e da aplicação deste material na lixiviação e no fracionamento químico de Cd, Pb e Zn. O experimento foi conduzido em casa de vegetação empregando-se dois solos provenientes de área de mineração, os quais receberam aplicação de BC produzido a 700ºC por pirólise lenta a partir da palha de cana-de-açúcar. Nos dois primeiros experimentos foram aplicadas as seguintes doses de BC: 1,5%; 3% e 5% (m/m) e as plantas testadas foram feijão de porco e mucuna preta. A solução do solo de cada vaso foi coletada para avaliar os efeitos do BC na solubilidade de Cd, Pb e Zn, enquanto o solo foi analisado quanto a concentração disponível de Cd, Pb e Zn. Em outro experimento foram utilizadas cinco colunas de lixiviação para cada solo, com três repetições: solo com pH original; solo com pH original + 3% de BC; solo acidificado (pH ≅ 4,5); solo acidificado + 3% de BC e solo com pH original + aplicação de CaCO3. Os teores de Cd, Pb e Zn, bem como os valores de pH foram quantificados nos lixiviados. Após as lixiviações foram realizadas as análises de extração sequencial destes elementos remanescentes no solo determinando-se as seguintes frações: móvel, trocável, ligado a óxido de Mn, ligado a matéria orgânica (MO), ligado a óxido de Fe e residual. De maneira geral, o BC diminuiu a concentração disponível de Cd, Pb e Zn nos solos e a de Zn da solução do solo, e, ainda, reduziu a absorção de Cd, Pb e Zn pelas plantas. O feijão de porco absorveu maiores teores de Cd e Pb comparado a mucuna preta. No experimento de lixiviação, a aplicação de biocarvão, na presença de acidificação do solo promoveu menor disponibilidade de Cd, Zn e Pb na maioria das lixiviações realizadas nos dois solos oriundos da área de mineração. A aplicação de biocarvão não interferiu na mobilidade vertical dos metais pesados (Cd, Zn e Pb) nos solos em pH ao redor de 6,0. Na distribuição dos metais pesados nas frações, o Cd apresentou-se, principalmente, na fração móvel e trocável, o Pb ligado aos óxidos de Mn e a M.O. e o Zn associado à fração residual. O Cd foi o metal que apresentou a maior mobilidade nos solos e o Pb a menor. Os resultados obtidos neste estudo indicam que a aplicação de BC pode ser utilizada como ferramenta na remediação dos solos, reduzindo as concentrações disponíveis de metais potencialmente tóxicos para as plantas. Palavras-chave: Cd, Pb, Zn, imobilização, remediação, palha de cana-de-açúcar xi BIOCHAR IN THE MITIGATION OF TOXICITY HEAVY METALS IN SOILS FROM MINING AREA ABSTRACT Heavy metals in soil may occur naturally or may be increased by human activities, such as mining. It is extremely important to know the behavior of heavy metals in contaminated soils and its possible leaching due to its toxicity and permanence in the food chain. One way to prevent the movement of metals in soils is the use of amendments capable of retaining these elements in the soil, as biochar (BC). Therefore, the aim of this study was to evaluate BC application in contaminated soils with heavy metals and their effect on growth of two plant species (jack bean and Mucuna aterrima), and to evaluate the pH effect and the BC effect in the leaching of Cd, Pb, and Zn, and the fractionation of these metals. The study was conducted in a greenhouse using two soils from the mining area that has received the BC application, produced by slow pyrolysis at 700 °C from sugarcane straw. In the first experiment it was applied the following BC doses: 1.5%; 3.0% and 5% (w/w), testing the plants species jack bean and Mucuna aterrima plants. The soil solution of each pot was collected to evaluate the BC effects in the Cd, Pb and Zn solubility, while the soil was analyzed for the available contents of Cd, Pb and Zn. In another experiment it was used five column leaching for each soil: soil with original pH; soil with original pH + 3% of BC; acidified soil (pH ≅ 4.5); acidified soil + 3% of BC and soil with original pH + CaCO3 application. The Cd, Pb, and Zn as well the pH were measured in the leachate. After leaching, the sequential extraction of these elements was carried out determining the following soil fractions: mobile, exchangeable, bound to Mn oxide, bound to OM, bound to Fe oxide and residual fraction. In general, the BC decreased the available concentration of Cd, Pb, and Zn, and decreased Zn in the soil solution, and further reduced the uptake of Cd, Pb, and Zn by plants. The jack bean take up higher levels of Cd and Pb. In the leaching experiment it was observed that the BC. The biochar application combined with soil acidification promoted lower availability of Cd, Zn and Pb in most leaching performed in both soils derived from the mining area. The application of biochar did not affect the vertical mobility of heavy metals (Cd, Pb, and Zn) in soils derived from mining area in pH around 6.0. In the distribution of heavy metals in fractions Cd presented in the mobile and exchangeable fraction, Pb associated with manganese oxide and OM and Zn to the residual fraction. The Cd was the metal with the highest mobility in soils and Pb the lowest. The results of this study indicate that the BC application can be used as a tool in the remediation of soil, reducing the potentially toxic metal concentrations for plants. Key words: Cd, Pb, Zn, immobilization, remediation, sugarcane straw xii 1. INTRODUÇÃO A concentração de metais pesados no solo, tais como cádmio, chumbo, níquel, zinco, entre outros, tem aumentado devido à intensificação das atividades industriais e da urbanização. Segundo levantamento da Cetesb (2013a), de 4.771 áreas contaminadas do Estado de São Paulo, 16% estavam contaminadas com metais pesados e as demais com solventes aromáticos, combustíveis líquidos, hidrocarbonetos aromáticos policíclicos, solventes halogenados, entre outros. A preocupação ambiental em relação às áreas contaminadas por elementos-traço é agravada quando estes entram na cadeia alimentar. Quando absorvidos em elevadas concentrações, os metais podem causar efeitos tóxicos em organismos vegetais e animais, incluindo os seres humanos. Desse modo, em avaliação de risco específica de um local, a mensuração da disponibilidade dos metais no solo é crucial, além da medida da concentração total ou semi-total. Com o conhecimento do teor disponível, pode-se inferir sobre a rota de transferência do elemento do solo para a planta. Adicionalmente há que se destacar a importância da presença dos metais pesados na água para consumo humano. De acordo a Organização Mundial de Saúde (WHO, 2011), o nível de ingestão tolerável na água potável é de 3 µg L-1 para cádmio e 10 µg L-1 para chumbo. Esses elementos podem ser lixiviados dos solos até atingir águas subterrâneas, ampliando a probabilidade de adentrar na cadeia trófica em teor acima dos toleráveis. Desta forma, os metais em solução podem ser facilmente absorvidos pelos vegetais, que se tornam a principal via de exposição humana. Além disso, nas áreas contaminadas por metais, a disponibilidade desses elementos pode causar toxidez e inibir o crescimento vegetal, deixando a área desprotegida. Uma das formas de evitar essa movimentação de metais é a aplicação de materiais adsorventes capazes de retê-los no solo, evitando assim sua possível movimentação, e/ou absorção pelas plantas. Dentre os adsorventes, o biocarvão (BC), material resultante da queima incompleta (com ausência total ou parcial de oxigênio) de biomassa rica em carbono, pode ser uma alternativa viável para mitigar áreas contaminadas com metais pesados. Essa mitigação pode ocorrer pela presença de grupos funcionais com grandes moléculas orgânicas no BC, que faz com que os metais se liguem a ele. Ademais, a adição de BC, que normalmente é alcalino, em solos ácidos, é capaz de proporcionar aumento no pH do solo e diminuição na mobilidade dos metais catiônicos dos solos, devido à redução da concorrência entre íons H+ e íons metálicos nos sítios de troca ou 1 na superfície do BC, amenizando, assim, sua contaminação e, consequentemente, os efeitos deletérios às plantas. Vale também destacar que no Brasil há grande disponibilidade de materiais com potencial (bagaços, cascas, caroços, palhas, etc) para produção de BC, por exemplo, palha gerada no sistema de colheita de cana de açúcar sem queima. Essa palha pode ser uma fonte de matéria-prima, visto que pelo processo de pirólise pode-se obter energia e o BC como subproduto para ser aplicado em solos. O aparecimento de sintomas de toxicidade de metais em plantas é mais comum quando elas são cultivadas em solos altamente contaminados, sendo esses caracterizados pelas alterações anatômicas, como o espessamento da parede celular, o colapso das células do floema, necrose dos tecidos e modificações da atividade enzimática. Em algumas situações, as plantas apresentam concentrações elevadas de metais, sem, contudo, manifestar sintomas visuais de toxicidade, como é o caso das espécies acumuladoras. Estudos relacionados com cádmio (Cd), chumbo (Pb) e zinco (Zn) em solos contaminados, envolvendo as suas movimentações no solo e para a planta são essenciais para caracterizar o ambiente contaminado, fornecendo informações sobre contaminante, matriz e biota. Assim, estudos com esses princípios podem proporcionar informações e ferramentas para a mitigação de áreas contaminadas, além de contribuir com estudos de avaliação de riscos ecotoxicológicos, bem como as populações vizinhas a estes locais. Diante desse contexto, o presente trabalho foi conduzido objetivando-se avaliar: a) o efeito da aplicação de biocarvão em solos contaminados com metais pesados, oriundos de área de mineração, na disponibilidade de Cd, Pb e Zn no solo e sua absorção por plantas de feijão de porco e mucuna preta; b) o efeito do pH e da aplicação de biocarvão na lixiviação de Cd, Pb e Zn e na concentração desses metais em diferentes frações do solo. 2 2. REVISÃO DE LITERATURA 2.1. Contaminação ambiental por metais pesados Metal pesado é um termo adotado para um grupo de metais e metalóides que estão associados com poluição e toxidez, incluindo neste termo alguns elementos que, em baixa concentração, são essenciais aos organismos vivos (AMARAL SOBRINHO et al., 2009). Esses elementos, tais como cádmio (Cd), chumbo (Pb), níquel (Ni), zinco (Zn), entre outros, em geral, estão naturalmente presentes nos solos em baixas concentrações por consequência dos processos pedogenéticos ao longo do tempo (ALLOWAY, 1995) e da atividade vulcânica (PAZ-FERREIRO et al., 2014). Entretanto, com a intensificação das atividades industriais e da urbanização, o risco de contaminação dos solos pelos metais pesados tem aumentado (ANDRADE et al., 2009). Os metais tendem a se acumular no ambiente, representando assim, risco potencial de contaminação ao longo do tempo (OLIVEIRA et al., 2010). A contaminação do solo por esses elementos é uma preocupação mundial devido a alta toxicidade, persistência em longo prazo e a incorporação subsequente dos metais na cadeia trófica, o que pode levar a efeitos prejudiciais ao ambiente e à saúde humana (VENEGAS et al., 2015). Os metais pesados podem ser adicionados ao solo por meio da aplicação de lodo de esgoto, adubação fosfatada (HOODA; ALLOWAY, 1998), fundição, mineração, uso de pesticidas, fertilizantes e lamas (PAZ-FERREIRO et al., 2014), além de outros resíduos provenientes de indústrias e urbanos. A mineração e o processamento e uso de metais têm causado contaminação ambiental diversa e difusa, com altas concentrações de vários metais, como Cd, Cu, Pb e Zn. No solo os metais podem ser absorvidos pelas plantas ou lixiviados, contaminando as águas subterrâneas (PIERANGELI et al., 2005). Vale ressaltar que somente os elementos solúveis, presentes na solução do solo, estão disponíveis. De acordo com Kabata-Pendias (2011), o transporte de elementos-traço dissolvidos pode ocorrer através da solução do solo (difusão) e também com a solução do solo em movimento (fluxo de massa, lixiviação). A lixiviação é um processo pelo qual os contaminantes contidos na solução do solo são movidos para camadas mais profundas ou para águas subterrâneas pela infiltração de água (CAPPUYNS; SWENNEN; 2008). A absorção e translocação de metais são fatores importantes para avaliar os riscos potenciais do crescimento de plantas em locais contaminados (FELLET et al., 2014). 3 No período de 2010 a 2012, o monitoramento das águas subterrâneas pela Cetesb registrou não conformidades em relação aos padrões de potabilidade para as substâncias nitrato (NO3-), fluoreto (Fl-), alumínio (Al3+), arsênio (As3+, As5+), bário (Ba), chumbo (Pb2+), crômio (Cr6+), ferro (Fe2+, Fe3+), manganês (Mn2+) e sódio (Na+), além de parâmetros microbiológicos. Também foi observado zinco em concentrações superiores aos valores orientadores de intervenção ou investigação estabelecidos, respectivamente, em nível estadual e nacional (CETESB, 2013b). Assim, o estudo de áreas contaminadas e possíveis soluções de manejo são essenciais para que antigas áreas sejam remediadas e para evitar que novas áreas com os mesmos problemas surjam, não só no Estado de São Paulo, como em outras regiões do Brasil. 2.2. Mobilidade e fracionamento de cádmio, chumbo e zinco no solo As propriedades do solo e a composição da solução do solo determinam o equilíbrio dinâmico entre o metal em solução e a fase sólida do solo (BOLAN et al., 2014). A distribuição dos metais entre os componentes do solo depende das suas características, dos metais envolvidos e do tipo e da idade da contaminação (HAMMER; KELLER, 2002). Dos metais produzidos por atividades antrópicas, Cd e Pb são considerados os mais prejudiciais para a saúde humana (BIAN et al., 2014), devido às suas toxicidades, além de arsênio (As), cromo (Cr) e mercúrio (Hg) (JARUP, 2003). Os metais pesados no solo encontram-se nas seguintes formas químicas: solúvel – espécies mais móveis e potencialmente disponíveis; trocável – retidas por forças eletrostáticas aos colóides do solo; adsorvidos especificamente – retidos fortemente em sítios específicos na superfície de óxidos de Fe, Al e Mn, na caulinita e por colóides orgânicos por ligações covalentes; oclusas em óxidos de Fe, Al e Mn – inicialmente o metal adsorvido é retido na forma trocável, podendo passar para formas covalentes com o tempo; retidas em material orgânico insolúvel – os cátions são quelatados no material orgânico; e precipitado – compostos pouco solúveis (carbonatos, sulfetos, fosfatos, hidróxidos) podem ser formados com os metais pesados (AMARAL SOBRINHO et al., 2009). A presença de cargas elétricas no solo está intimamente relacionada com as partículas coloidais, tanto orgânicas, quanto inorgânicas. As cargas permanentes estão sempre operantes e são intrínsecas às partículas minerais (principalmente argilas 4 silicatadas do tipo 2:1), e, as cargas variáveis, que são predominantes em solos de clima tropical (caulinita, óxidos de Fe e Al, compostos orgânicos) e dependem do pH do meio (ALLEONI et al., 2009). As interações que mais ocorrem entre os solutos e a fase sólida do solo são as eletrostáticas, as quais são dependentes da carga da superfície dos colóides. Os mecanismos de adsorção/dessorção e precipitação/dissolução são considerados os principais processos que controlam a concentração de espécies químicas na solução do solo (ALLEONI et al., 2009). Adsorção é definida como o acúmulo de uma substância ou material na interface entre uma espécie sólida e uma solução e é o processo químico mais importante no controle da biodisponibilidade e do comportamento de metais em solos (SPARKS, 2003). A adsorção de metais pesados pelo solo depende de vários fatores, tais como os teores de argila, de matéria orgânica, de óxidos de Fe, de Al e de Mn, o pH, a superfície específica e a constituição mineralógica do solo (ALLEONI et al., 2005). Na fração argila, os óxidos e os grupos funcionais da matéria orgânica são as superfícies reativas mais importantes. Há dois tipos principais de adsorção: a específica (esfera interna) e a não específica (esfera externa), sendo que na adsorção específica ocorrem ligações iônicas e covalentes (mais fortes) e na não específica ocorrem ligações elestrotáticas e os íons estão sempre hidratados (ERNANI, 2008). Dentre os fatores que afetam a retenção de elementos em solo, o pH e a matéria orgânica têm sido relacionados como os mais importantes (SALAM; HELMKE, 1998). A matéria orgânica possui grupos funcionais de superfícies que são sítios de adsorção (LINHARES et al., 2008), principalmente os fenólicos e os carboxílicos (AMARAL SOBRINHO et al., 2009), e, liga-se fortemente aos íons metálicos por meio da formação de complexos (ALLEONI et al., 2005). O pH e a matéria orgânica também exercem influência na própria especiação do metal e na sua disponibilidade (PIERANGELI et al., 2005). O Cd, o Pb e o Zn possuem alta mobilidade até pH 4,5; 3,5 e 4,0, respectivamente, e podem ser precipitados na forma de hidróxidos nos seguintes valores de pH: 8,0 a 9,5 para Cd; 7,2 a 8,7 para Pb e 5,2 a 8,3 para Zn (KABATA-PENDIAS, 2011). O Cd pode ser adsorvido pelo solo por meio de forças eletrostáticas simples ou pode estar intimamente associado a óxidos, a carbonatos e à matéria orgânica (ANDERSEN et al., 2002). Em estudo com metais pesados em solo contaminado, Domingues et al. (2009) constataram que em pH 7,5, o Cd encontrava-se retido nos 5 óxidos e na fração residual. Entretanto, com a acidificação houve transferência do Cd para frações mais disponíveis, como a solúvel e a trocável. Acima de pH 6,0 ocorre aumento do Cd inorgânico pela hidrólise e pela formação de pares iônicos com carbonato (DIAS et al., 2001). O comportamento químico do Pb em solos depende muito da quantidade de matéria orgânica. Geralmente, o Pb é sorvido mais fortemente do que outros metais como Cd, Zn, Cu e Ni (ALLOWAY, 2013) e a disponibilidade de Pb pode aumentar com a redução do pH do solo (KABATA-PENDIAS; MUKHERJEE, 2007). Dessa forma, a elevação do pH promove a formação de Pb precipitado como hidróxidos, carbonatos e fosfatos, bem como complexos insolúveis com matéria orgânica (NASCIMENTO et al., 2014). O Zn pode ser fortemente adsorvido aos solos, principalmente pela fração mineral (RAIJ, 2011). Nesse contexto, o pH do solo é o principal fator que determina a adsorção de Zn, visto estar relacionado com a constante de hidrólise dos íons metálicos (CASAGRANDE et al., 2008). O Zn pode ser também adsorvido como ZnOH, cuja concentração aumenta dez vezes para cada incremento de uma unidade de pH, pois, com o aumento do pH, íons de hidrogênio são liberados, o que favorece a adsorção desse elemento na superfície dos colóides (CASAGRANDE et al., 2004). Uma das formas de se avaliar a distribuição e o comportamento dos metais pesados nos diversos componentes do solo é a utilização de métodos de extração sequencial (LÃ et al., 2003), no qual são utilizados extratores com força de extração crescentes (TESSIER et al., 1979). Extração sequencial consiste em submeter uma matriz sólida a sucessivos ataques por reagentes com diferentes propriedades químicas (acidez, potencial redox, propriedades de complexação), com cada extrato representando uma fração do elemento (KOT; NAMIESNIK, 2000). Esta técnica pode ser utilizada para definir as frações solúveis do metal, sendo um possível indicador para o conhecimento da contaminação das águas subterrâneas por lixiviação de metais pesados (TESSIER et al., 1984). Contudo, essa ferramenta apresenta alguns problemas, como: baixa seletividade dos reagentes a determinada forma química, redistribuição e readsorção de metais em fases posteriores, além de variações nas condições experimentais da extração (tipo de reagente, concentração, pH, sequência da adição de reagentes, tempo e tipo de agitação, temperatura, relação solo: solução) (AMARAL SOBRINHO et al., 2009). 6 2.3. Cádmio, chumbo e zinco na planta As plantas diferem na sua habilidade em absorver, acumular e tolerar metais pesados. Metais pesados, como Cd e Pb, não possuem função conhecida nas plantas e são altamente tóxicos, devido à sua reatividade com átomos de S e N dos aminoácidos e proteínas (SANTOS et al., 2006). Os metais pesados interferem na absorção de nutrientes e/ou induzem perda de nutrientes por causar danos à membrana plasmática. Além disso, alterações nas proteínas devido à toxicidade podem também perturbar o metabolismo normal das plantas, causando até a morte das células (ANJANA et al., 2006). No xilema, os metais podem ser quelatados por ácidos orgânicos como histidina (KRAMER et al., 1996), nicotianamina, citrato, malato ou oxalato (SENDEN et al., 1995). Contudo, os efeitos deletérios ocasionados por esses elementos nas plantas são vários, incluindo alterações causadas principalmente nos cloroplastos e estômatos das plantas (VILHALVA, 2008), e alterações nas atividades enzimáticas (MELO et al., 2011; GRATÃO et al., 2008). As plantas expostas a forte estresse de metal apresentam sintomas visíveis, como clorose e crescimento atrofiado (HMID et al., 2015). Apesar de o Cd não ter função biológica conhecida nas plantas (PENCE et al., 2000), pode ser facilmente absorvido e transportado pelo xilema (LUX et al., 2011), por apresentar configuração eletrônica e estado de valência similar ao Zn (NAN et al., 2002). Nas plantas, os sintomas da toxicidade de Cd se manifestam como enrolamento foliar, nanismo e clorose (BENAVIDES et al., 2005; KAHLE, 1993). O Cd interfere na absorção, transporte e uso de água e de vários elementos (JELONEKA et al., 2011), bem como na abertura estomática e fotossíntese (BENAVIDES et al., 2005). Em geral, grandes quantidades de Cd diminuem a produção de raízes e parte aérea e causam alterações genéticas, bioquímicas e fisiológicas (REZVANI et al., 2011). Os efeitos nocivos de Pb incluem a interferência na absorção e translocação de íons, o crescimento retardado, mudança na atividade de várias enzimas, respiração e fotossíntese prejudicadas e variação nos níveis de proteínas e de NO3- dentro do sistema da planta (CHATTERJEE et al., 2004). A acumulação de Pb em diferentes partes da planta de beterraba afetou adversamente vários processos metabólicos, tais como a síntese de clorofila, proteínas, carboidratos e RNA (GREGER et al. 1991). Além disso, a absorção de Pb pode reduzir a absorção de micronutrientes pelas plantas, provocando desequilíbrio nutricional (SIKKA et al., 2010). 7 O Zn é um elemento essencial para as plantas e seres humanos, mas, em elevadas concentrações pode ser altamente tóxico. Por exemplo, concentrações entre 300 e 400 mg kg-1 podem ser tóxicas para as plantas (KABATA-PENDIAS, A.; MUKHERJEE, 2007) e uma dose entre 225 e 400 mg de Zn podem ser tóxicas aos seres humanos (FOSMIRE, 1990). Geralmente, o Zn é necessário em teores baixos e sua concentração média nos tecidos das plantas varia entre 15 a 30 mg kg-1 (TERZANO et al., 2008). Esse elemento participa do metabolismo das plantas como ativador enzimático e síntese de ácido indol acético (AIA), carboidratos, proteínas e formação dos ribossomos. A fitotoxicidade do Zn depende da espécie e do genótipo das plantas. Plantas sensíveis podem ter paralisação da fotossíntese quando absorvem teores superiores a 178 mg kg-1 de Zn (KABATA-PENDIAS; MUKHERJEE, 2007). Como relatado, as plantas podem servir como indicadores para avaliar a contaminação de solos, visto que respondem rapidamente aos efeitos tóxicos de poluentes. A sobrevivência de plântulas, o crescimento de raiz e parte aérea, a produção de biomassa e a atividade enzimática são os principais parâmetros medidos para avaliação da tolerância de metais em plantas (WALKER et al., 2001). Portanto, estudos com plantas são importantes para identificar o efeito de contaminantes em solos (LOUREIRO et al., 2006), podendo ser uma alternativa viável para a avaliação de ecotoxicidade, complementando outros testes. 2.4. Revegetação de áreas mineradas A recuperação de áreas degradadas pela mineração normalmente envolve atividades que têm o objetivo de restabelecer a vegetação (ALMEIDA; SANCHEZ, 2005). No Brasil, a desde 1989, todas as empresas de mineração foram obrigadas a apresentar ao órgão ambiental um Plano de Recuperação de Áreas Degradadas (PRAD), documento que preconiza a adoção de procedimentos para estabelecer ou restabelecer a cobertura vegetal nas áreas degradadas, prática conhecida como revegetação (ALMEIDA; SANCHEZ, 2005). A revegetação de solos contaminados é a chave para a sua estabilização e a presença de uma cobertura vegetal sobre o solo reduz o potencial de migração de contaminantes para os cursos de água (TORDOFF et al., 2000). Ademais, a cobertura vegetal também pode reduzir as marcas visuais na paisagem causada por operações de mineração em grande escala (TORDO et al., 2000). 8 Áreas mineradas são normalmente difíceis de serem revegetadas, em função da fertilidade inadequada, excesso de acidez, alcalinidade ou salinidade, erosão entre outras desvantagens (FAVARETTO et al., 2000). Além disso, resíduos de minas têm diferentes restrições para revegetação e a composição química pode variar muito verticalmente e lateralmente no mesmo local (YE et al., 2002). O estabelecimento das plantas nessas áreas está sujeito às restrições físicas severas. Embora os fatores físicos podem limitar severamente o estabelecimento da vegetação, as propriedades químicas dos resíduos metálicos são consideradas como mais inibitória para as plantas, pela baixa disponibilidade de nutrientes e alta disponibilidade de metais pesados (TORDO et al., 2000). Entre as estratégias de fitorremediação, a fitoestabilização (que consiste no uso de plantas visando estabilizar os poluentes no solo) pode ser muito útil também para prevenir perdas de nutrientes e metais pesados por erosão ou lixiviação (PEREIRA et al., 2012). Os materiais condicionadores adicionados ao solo podem melhorar as condições dos substratos para permitir o estabelecimento relativamente rápido de plantas não tolerantes a altas concentrações de metais pesados (TORDO et al., 2000). Alguns pesquisadores relatam benefícios agronômicos, quando biocarvão (BC) é adicionado ao solo (NOVAK et al., 2009), como o aumento da retenção de nutrientes e diminuição da lixiviação. A adição de biocarvão em solos de mineração pode melhorar a cobertura vegetal, melhorando o desenvolvimento das raízes e promovendo maior biomassa tanto de parte aérea como de raízes das plantas (BRENNAN et al., 2014). 2.5. Biocarvão O biocarvão (biochar em inglês) é um produto rico em carbono obtido quando uma biomassa ou material orgânico sofre decomposição térmica em condições limitadas de fornecimento de oxigênio (LEHMANN; JOSEPH, 2009). A pirólise é uma tecnologia alternativa que é custo-efetiva e limpa, sendo possível reciclar materiais e reduzir os resíduos sólidos (TAN et al., 2014). Os gases gerados durante o processo podem ser capturados e condensados em bio-óleo e gás de síntese, que podem ainda serem usados como fonte de energia renovável (AHMAD et al., 2014). A produção de biocarvão (BC) pode ser útil para a reciclagem de grandes quantidades de resíduos agrícolas (ABDELHAFEZ et al., 2014), diminuindo a contaminação associada ao descarte para o meio ambiente (AHMAD et al., 2014). A 9 conversão de biomassa de resíduos em BC também promove a eliminação de todos os patógenos ativos (AHMAD et al., 2014) de dejetos de animais e lodo de esgoto. As características do BC variam em função da biomassa, do tamanho de partícula da matéria-prima e das condições de pirólise, como temperatura (PAZFERREIRO et al., 2014) e tempo (pirólise rápida ou lenta). Em estudo com BC de canade-açúcar pirolisado em quatro temperaturas (400, 500, 600 e 700 ºC) foi observado que a capacidade de sorção de Cd e Zn do BC produzido a 700 ºC foi quase quatro vezes maior do que o de 400 ºC (MELO et al., 2013). Contudo, a elevada variabilidade das características do material de origem e taxas de mineralização tornam difícil a recomendação de doses de BC (HMID et al., 2015). Além disso, o BC degrada-se lentamente, com uma meia-vida de 102-107 anos (ZIMMERMAN, 2010). Espera-se que, na medida em que o BC entra em contato com o solo durante um período de tempo prolongado, haja alteração de suas características de superfície, em um processo conhecido como envelhecimento. Esse processo resulta na formação de compostos fenólicos, carboxílicos, carbonílico, quinonas, fenólicos e grupos funcionais hidroxila (PAZ-FERREIRO et al., 2014). Devido aos grupos funcionais de superfície e a estrutura porosa do BC, sua aplicação ao solo afeta as propriedades químicas e físicas do solo, tais como aumento da CTC (BUTNAN et al., 2015), aumento da retenção de água e nutrientes (PAZFERREIRO et al., 2014), fertilização do solo (SOHI, 2012) e sequestro do carbono no solo (KOOKANA et al. 2011). Além disso, o BC adsorve metais pesados na sua superfície e reduz a concentração de contaminantes na solução do solo (BEESLEY; MARMIROLI, 2011). Em razão de sua elevada aromaticidade e elevada área superficial, o BC é considerado como um sorvente eficaz para poluentes orgânicos e inorgânicos (TONG et al., 2014), evitando, assim, a passagem desses para água subterrânea (FELLET et al., 2014). Ao contrário da maioria das matérias orgânicas do solo convencionais, que são facilmente decompostas, a natureza recalcitrante de BC aumenta o seu potencial como material que se altera em longo prazo (CHAN et al., 2007). Por ser mais resistente à decomposição (FELLET et al., 2011), o BC pode imobilizar contaminantes durante um período muito mais longo, protegendo, assim, as plantas e micro-organismos contra a toxicidade ao longo do tempo (BEESLEY et al., 2011). 10 2.6. Mitigação de metais pesados por biocarvão Os contaminantes inorgânicos que não podem ser degradados pela ação microbiana, como os metais pesados, podem possuir fração lábil (disponível e/ou solúvel) presente nos solos que são a de maior relevância ecológica por apresentar maior impacto ambiental imediato (BEESLEY; DICKINSON, 2010). A remediação dos solos tem o objetivo de reduzir o risco de transferência de poluentes para água ou organismos (BEESLEY et al., 2011). A atual agenda de remediação de áreas contaminadas depende mais fortemente de medidas de atenuação natural assistida, com o aumento da estabilidade do solo, conseguida com aplicação de materiais orgânicos (BEESLEY et al., 2014). A imobilização in situ de contaminantes com adição de materiais para os solos contaminados apresenta grande potencial e pode ser aplicada em áreas extensas (VENEGAS et al., 2015). Na técnica de imobilização dos metais pesados em solos, estes elementos são removidos da solução do solo por meio de adsorção, complexação ou precipitação, tornando assim o metal indisponível para os seres humanos, microbiota e para a absorção pelas plantas, assim como para lixiviação no perfil do solo (BOLAN et al., 2014). A adição de materiais orgânicos em solos contaminados provoca efeitos positivos ou negativos na mobilidade do metal, dependendo das características do solo (pH, matéria orgânica e argila) (VENEGAS et al., 2015). A retenção dos metais pela matéria orgânica depende de vários fatores, tais como o pH do solo e grau de humificação. A matéria orgânica fresca normalmente tem baixo grau de humificação e, portanto, contribui para a mobilização do elemento ao invés de sua retenção. Outros constituintes do solo, como a fração argila, podem aumentar a capacidade de retenção de elementos devido à interação com a matéria orgânica, formando complexos argilohúmicos (KUMPIENE et al., 2008). Materiais carbonáceos, devido às suas propriedades de cargas superficiais, área superficial elevada e grande volume de poros, são excelentes adsorventes para uma grande variedade de contaminantes (WANG et al., 2014). Especial atenção tem sido dada à aplicação de BC no solo devido ao potencial de suas propriedades e benefícios de suas características físico-químicas (BEESLEY et al., 2010). Sua estrutura física microscópica é um dos principais determinantes para caracterizar suas propriedades de condicionamento, pois, durante o processo de carbonização, a área de superfície do material pode ser aumentada, aumentando sua capacidade de retenção de água (THIES; 11 RILLIG, 2009). Keiluweit et al. (2010) caracterizaram BC de madeira e verificaram aumento da área superficial específica (1,6; 2,3; 3,0; 28,7; 196 e 392 m2 g-1) com o aumento da temperatura de pirólise (100, 200, 300, 400, 500 e 600 ºC). O sucesso da atuação do BC sobre os contaminantes depende da quantidade de contaminante que esse material pode reter antes da saturação de seus sítios ativos e da durabilidade do complexo BC-contaminante, que frequentemente está relacionada com parâmetros de sua produção como a biomassa de origem e a temperatura de pirólise (GELL et al., 2011). O BC é capaz de formar complexos com íons metálicos sobre sua superfície, reduzindo sua biodisponibilidade (BEESLEY et al., 2011). Os mecanismos de adsorção são altamente dependentes do tipo de solo e dos cátions presentes no BC e no solo. A adsorção do metal ocorre principalmente devido a uma interação eletrostática entre os íons metálicos carregados positivamente e cargas negativas associadas aos elétrons π nas estruturas aromáticas do BC (HARVEY et al., 2011). Outros compostos presentes nas cinzas, tais como óxidos, carbonatos, fosfatos ou sulfatos, também podem ajudar a estabilizar metais pesados por precipitação (PAZFERREIRO et al., 2014). A diminuição da disponibilidade dos metais pode ocorrer pela precipitação ou co-precipitação com carbonato, fosfato ou silicato ou pela sua adsorção em minerais recém-formados (REES et al., 2014). Trakal et al. (2011), estudando a sorção de metais em solos multicontaminados com aplicação de BC, verificaram que a aplicação do mesmo aumentou a sorção de Cu e Pb, porém não houve diferenças para Cd e Zn. Por outro lado, Beesley e Marmiroli (2011), em estudo sobre a retenção de Cd e Zn por BC de madeira em solos contaminados, observaram que esse material foi capaz de reduzir a mobilidade destes elementos, principalmente pelo mecanismo de sorção. Rees et al. (2014) observaram que, além da troca catiônica e complexação com a matéria orgânica solúvel, um dos principais efeitos do BC foi a imobilização de metais através da ligação com as fases minerais do BC, como calcita e sílica. Fellet et al. (2011) constataram que a aplicação de BC resultou em diminuição significativa da biodisponibilidade de Cd, corroborando os resultados obtidos por Park et al. (2011), os quais verificaram que a aplicação de BC aumentou a imobilização de Cd e Pb no solo, porém, não foi muito efetivo para o Cu. Ademais, o BC normalmente é alcalino e, desse modo, pode aumentar o pH do solo e provocar a imobilização de metais 12 (ALMAROAI et al., 2014). Desse modo, Bilgic e Caliskan (2001) observaram que a aplicação de BC aumentou o pH do solo de 5,1 para 7,5 e isto pode ter resultado na precipitação de Cd como Cd(CO)3 e de Pb como Pb5(PO4)3Cl. Quando o BC é introduzido num solo ácido, os minerais do BC são parcialmente dissolvidos na solução do solo, mas, novas fases minerais podem ser formadas na sua superfície (REES et al., 2014). Em suma, a aplicação de BC constitui um método de preparação do local, aumentando o sucesso de revegetação (REVERCHON et al., 2015), principalmente em locais contaminados. 13 3. CAPÍTULO I APLICAÇÃO DE BIOCARVÃO EM SOLOS CONTAMINADOS E FITODISPONIBILIDADE DE CÁDMIO, CHUMBO E ZINCO RESUMO Metais pesados em solos podem ocorrer de forma natural ou podem ser aumentados por atividades antrópicas, como a mineração. A absorção de metais pesados pelas plantas e sua bioacumulação na cadeia alimentar pode aumentar os riscos ecotoxicológicos. Assim, o presente estudo objetivou avaliar o efeito do biocarvão na mobilidade de Cd, Zn e Pb e no crescimento das plantas (feijão de porco e mucuna preta), em dois solos contaminados com metais de área mineração. O biocarvão (BC) de palha de cana-de-açúcar, produzido a 700°C, foi aplicado nas doses de 1,5, 3,0 e 5,0% (m/m) em dois Tecnossolos (A e B), oriundos de área de mineração contaminada por Cd, Pb e Zn. Foram avaliados a concentração de metais pesados na solução do solo, no solo, na parte aérea e nas raízes das plantas. Também foram calculados o índice de translocação (IT) e o fator de bioconcentração (FBC). Amostras das folhas das espécies foram avaliadas em MEV para detecção de alterações estruturais (anatômicas). No solo A, houveram redução linear na concentração de Zn na solução do solo com aumento das doses de BC, nas três coletas da solução dos dois solos. No solo B houve aumento linear da massa seca da parte aérea do feijão e aumento da massa seca de raiz das duas plantas. Houve reduções dos teores de metais pesados na parte aérea: 42% e 48% para Cd, 53% e 52% para Pb, e 49% e 27% para Zn, para feijão de porco e mucuna preta, respectivamente no solo A. No solo B as reduções foram menores: 19% e 42% para Cd, 48% e 21% para Pb, e 17% e 7% para Zn, para feijão de porco e mucuna preta, respectivamente. Houve diminuição também na concentração dos metais no solo: 32% para Cd, 21% para Pb e 42% para o Zn, no solo A, e 54% para Cd, 50% de Pb e 57% para o Zn, no solo B. Não foram detectadas alterações nos tecidos das estruturas internas das duas espécies, apesar dos sintomas de fitotoxicidade (enrolamento foliar, clorose, manchas necróticas). Foi constatado que o feijão de porco teve o maior IT nos dois solos. Com o FBC pode-se concluir que a absorção na parte aérea de Cd foi maior que as de Pb e Zn nas duas plantas e nos dois solos. A aplicação de BC reduziu as concentrações disponíveis de Cd, Pb e Zn nos solos e também as de Zn da solução do solo. A aplicação do BC diminuiu a absorção de Cd, Pb e Zn pelas plantas. O feijão de porco translocou maiores quantidades de metais, especialmente Cd, para a parte aérea. A mucuna preta apresentou translocação de metais mais limitada se comparada com a do feijão. Os resultados obtidos neste estudo indicam que a aplicação de BC para remediação dos solos pode reduzir as concentrações de metais potencialmente tóxicos nas plantas. Palavras-chave: contaminação do solo, biochar, metais, remediação, solução do solo 14 BIOCHAR APPLICATION IN CONTAMINATED SOILS AND BIOAVAILABILITY OF CADMIUM, LEAD AND ZINC ABSTRACT Heavy metals in soil can occur naturally or can be increased by human activities such as mining. The absorption of heavy metals by plants and its bioaccumulation in the food chain can increase the ecotoxicological risks. The present study aimed to evaluate the biochar effect on Cd, Pb, and Zn mobility and plant growth (jack bean and Mucuna aterrima), in two contaminated soils with metals from mining area. The biochar (BC) was produced from sugarcane straw at 700 °C and applied in the following doses: 0.0, 1.5, 3.0, and 5.0% (w/w) in two contaminated soils (A and B) by Cd, Pb, and Zn. It was evaluated the concentration of heavy metals in soil solution, soil, shoot, and roots of the plants tested. It was also calculated the translocation index (TI) and plant uptake factor (PAF). Samples of leaves were evaluated by SEM to detect structural changes. There was a linear decrease in Zn concentration in soil solution following application of BC, in three collections from two soils. In soil B a linear response of dry mass of jack bean shoots and increased in dry weight root of two plants. There were reductions in heavy metal content in shoot: 42% and 48% for Cd, 53% and 52% for Pb and 49% and 27% for Zn for jack bean and Mucuna aterrima respectively in soil A. In Soil B reductions were lower: 19% and 42% for Cd, 48% and 21% for Pb and 17% and 7% Zn respectively for jack bean and Mucuna aterrima. There was also a decrease in the concentration of metals in soil: 32% for Cd, Pb 21% and 42% for Zn in soil A, and 54% for Cd, Pb 50% and 57% for Zn in Soil B. There were no changes in internal structures from the two species despite phytotoxicity symptoms. It was found that the jack bean had the highest soil TI in both soil. About FAP can be concluded that uptake of Cd it was larger than Pb and Zn in both plants and in both soils. BC application reduced the available concentrations of Cd, Pb and Zn in soil and also Zn in soil solution. The application of BC decreased the uptake of Cd, Pb and Zn by plants. The jack bean translocated larger amounts of metals, especially Cd, to the shoot. Mucuna aterima showed translocation of metals more limited compared to jack bean. The results from this study indicates BC application for soil remediation can reduce the potentially toxic metal concentrations in plants. Keywords: soil contamination, metals, remediation, soil solution 15 3.1. INTRODUÇÃO Os metais pesados ocorrem naturalmente em solos, mas sua concentração pode ser aumentada devido às atividades antrópicas, como a mineração, onde os resíduos podem ser altamente concentrados em elementos metálicos. Além disso, o processamento e refinamento de metais pode causar poluição ambiental generalizada, com dispersão de vários metais, tais como chumbo, cobre, cádmio e zinco (WAGNER; KAUPENJOHANN, 2014). Altas concentrações de metais pesados em solos podem causar riscos em longo prazo para o ecossistema, associados com a transferência de metais do solo ou sedimento para o ambiente. Há riscos associados com a lixiviação (contaminação das águas superficiais ou subterrâneas) ou com a absorção por organismos como plantas ou seres humanos (JIANG et al., 2012). Para reduzir o risco de danos por metais pesados, sua biodisponibilidade pode ser modificada para diminuir sua acumulação e toxicidade na cadeia alimentar (AHMAD et al., 2014). A estabilização in situ com aplicação de materiais no solo pode reduzir o risco de transferência de metais para as águas subterrâneas e o ecossistema em geral (REES et al., 2014). A chamada atenuação natural assistida, como a estabilização química do solo pelo uso de materiais orgânicos, é favorável em comparação com a remoção e despejo de solos contaminados, entre outras soluções (BEESLEY et al., 2013). O biocarvão é um material carbonizado de baixa densidade produzido pela queima de biomassa em condições de baixa temperatura (≤ 700 ºC) e mínimo oxigênio (BEESLEY et al., 2011). Sua aplicação em alguns solos pode melhorar parâmetros biológicos, físicos e químicos (PARK et al., 2011). Devido à sua elevada aromaticidade, o biocarvão é considerado adsorvente eficaz para imobilizar poluentes orgânicos e inorgânicos (BIAN et al., 2014). Os grupos funcionais do biocarvão influenciam o processo de sorção, dependendo da natureza da carga de superfície, de modo que os metais podem ser adsorvidos na superfície de partículas do biocarvão (AMONETTE; JOSEPH, 2009). Vários tipos de biomassa podem ser utilizadas como fontes para a produção de biocarvão, por exemplo, aparas de madeira, esterco e resíduos de colheita (TANG et al., 2013). Melo et al. (2013) verificaram que o aumento da temperatura de pirólise de palha de cana-de-açúcar produziu um biocarvão com capacidade superior de sorção de Cd e Zn, em testes de laboratório. Efeitos similares também foram observados em 16 estudos em casa de vegetação, citando a diminuição de metais pesados em solução do solo (BEESLEY et al., 2010), reduzindo fitotoxicidade e auxiliando a revegetação de áreas de mineração (FELLET et al., 2014). Os metais pesados retidos por biocarvão são liberados a uma taxa mais lenta do que outros materiais orgânicos usados que se decompõem mais rapidamente (TANG et al., 2013). O presente estudo teve como objetivos avaliar o efeito do biocarvão na mobilidade de Cd, Zn e Pb no solo e nas plantas de feijão de porco e mucuna preta (crescimento, absorção de metais, morfologia de estrtuturas internas), em solos de área de mineração contaminados com Cd, Pb e Zn. 3.2. MATERIAL E MÉTODOS Amostras de solos foram coletadas em dois pontos (A e B) em uma área de mineração de zinco na cidade de Vazante (MG) (17°55’43”S; 46°49’15”W), em uma cava que está desativada há mais de 15 anos (Figura 1), pertencente atualmente a companhia Votorantim Metais. Nos solos, além do Zn, ocorrem outros metais pesados, como Cd e Pb. As amostras de solo foram coletadas na camada de 0 a 20 cm (Figura 2a e b) e, após a secagem ao ar, foram homogeneizadas e peneiradas (< 2 mm) (Figura 2c e d). Ponto B Ponto A Figura 1. Vista dos dois pontos de coleta dos solos na cava de mineração em Vazante (MG). Fonte: Google Earth (2014) 17 a b d c Figura 2. Coleta do solo do ponto A (a) e do ponto B (b), homogeneização de toda a massa de solo coletada (c) e peneiramento (d). 18 As amostras foram submetidas a caracterização física e química. Para facilitar a escrita e discussão do trabalho, foi atribuído aos solos a nomenclatura solo A e solo B. A análise granulométrica foi realizada conforme Camargo et al. (2009), sendo o solo A classificado texturalmente como muito argiloso (argila: 626 g kg-1, silte: 150 g kg-1; areia: 224 g kg-1), e o solo B como argiloso (argila: 427 g kg-1, silte: 237 g kg-1; areia: 336 g kg-1). Os solos foram classificados como Tecnossolo de acordo com (IUSS-WRB, 2014). A análise química de fertilidade (Tabela 1) foi realizada de acordo com Raij et al. (2001): pH em CaCl2 (0,01 mol L-1); P, K, Ca e Mg extraídos por resina de troca iônica; S extraído por Ca3O8P2; Al extraído por KCl 1 mol L-1; capacidade de troca catiônica calculada pela soma de bases e H+Al e micronutrientes e metais pesados (Cd, Pb e Zn) (Tabela 2) extraídos por DTPA (pH 7,3). As determinações dos elementos químicos foram feitas em ICP-OES. As análises das concentrações semi-totais e totais de Cd, Pb e Zn (Tabela 2) foram realizadas utilizando o método EPA 3051A com adição de 9 mL de HNO3 e 3 mL de HCl (USEPA 2007), e EPA 3052 com adição de 9 mL de HNO3 e 3 mL de HF (USEPA 1994), respectivamente, e realizada a digestão em micro-ondas (CEM Mars Corportation). Para melhor caracterização, as amostras também foram submetidas ao ataque sulfúrico para determinar as concentrações totais de Si, Al, Fe e Mn, de acordo com Camargo et al. (2009) (Tabela 3). Para a produção do biocarvão (BC) foi utilizada a palha da cana-de-açúcar, dada a elevada disponibilidade deste resíduo no Brasil, devido à tendência de colheita mecanizada sem queima nos últimos anos, especialmente no Estado de São Paulo. Em estudo anterior, realizado por Melo et al. (2013), o BC produzido a partir da mesma biomassa mostrou maior retenção de Cd e Zn na temperatura de 700 °C, razão pela qual esta temperatura foi a escolhida. A palha de cana-de-açúcar (Figura 3a) foi coletada em áreas experimentais do Instituto Agronômico de Campinas (-22º52'24.7'S; -47º04 '39 0,7 'W) e, posteriormente, seca e moída (< 2 mm). Em seguida, ela foi colocada num reator selado (Figura 3b e c) para evitar a entrada de O2. O reator foi aquecido a uma taxa de 5°C/min até 700 °C e manteve-se a esta temperatura durante cerca de uma hora e posteriormente foi resfriada lentamente até a temperatura ambiente. O BC foi homogeneizado e peneirado a 2 mm (Figura 3d). 19 a b c d Figura 3. Biomassa do biocarvão (palha de cana-de-açúcar) (a), biomassa no reator (b), vista do reator (c) e biocarvão pronto (d). Para a caracterização química do BC (Tabela 4) foi medido o pH em água (razão sólido-solução – 1:10) e a condutividade elétrica (CE) (SINGH et al., 2010). O teor de cinzas e a umidade foram determinados de acordo com o procedimento ASTM D7582 (2011). A composição elementar (CHN) foi determinada em analisador elementar (Perkin Elmer, Série II 2400). A área superficial específica (ASE) foi obtida pelo método BET N2 e a CTC analisada de acordo com Song e Guo (2012), na qual é realizada a saturação da superfície de troca com acetato de amônio e a troca com KCl, sendo determinado o teor de NH4+ deslocado. Também foram determinadas as concentrações de macronutrientes, micronutrientes e alguns possíveis contaminantes (metais) em ICP-OES (Varian, Vista), após a digestão em micro-ondas (CEM Mars Corportation) com HNO3 concentrado (USEPA 3051). Todas as análises foram realizadas em triplicata. As imagens em microscopia eletrônica de varredura (MEV) do BC foram obtidas em microscópio eletrônico (Leo Electron Microscopy, Leo EVO 40) com com sistemas de microanálise de raios X. As imagens foram feitas em aumento de 250 e 3000 vezes. Todas as amostras foram cobertas com ouro para reduzir o efeito de cargas. A fitodisponibilidade dos metais e os possíveis efeitos do BC foram estudados por meio de experimento em vasos com volume de 4 L, onde foram colocados 3,0 kg de 20 solo. O experimento foi conduzido em casa de vegetação no Instituto Agronômico de Campinas (IAC), Campinas (SP). O delineamento experimental foi um fatorial 4 x 2, com quatro repetições, totalizando 32 vasos para cada solo. Os tratamentos foram quatro doses de BC (0; 1,5; 3,0 e 5,0%, m/m) e duas espécies de plantas, feijão de porco (Canavalia ensiformis) e mucuna preta (Mucuna aterrima). O BC foi misturado e homogeneizado nos solos (Figura 4) e a incubação ocorreu por 120 dias com a umidade dos vasos mantida a 70% da capacidade de retenção de água (CRA). A CRA dos solos foi determinada por meio da pesagem de 50 g de solo seco em papel-filtro acondicionado em funil de vidro (Figura 5). Em seguida, foram adicionados em cada funil 100 mL de água destilada, de modo gradual, sendo observado um período de 24 h até a drenagem da água em excesso, portanto, não adsorvida nos solos. A CRA foi calculada de acordo com a seguinte equação: CRA = ((100-volume de água drenada do funil)/50 g de solo). Não foram adicionados fertilizantes minerais ou orgânicos. a b Figura 4. Processo de mistura de biocarvão com o solo (a) e vasos com os tratamentos aplicados (b). 21 Figura 5. Análise da capacidade de retenção de água dos solos A e B Um teste de germinação (Figura 6) foi realizado para identificar as espécies capazes de sobreviver nos solos. Foram utilizadas diversas plantas (arroz, braquiária, eucalipto, feijão, feijão de porco, girassol, leucena, mamona, mucuna preta, sorgo, tabaco e trigo) e os destaques foram feijão de porco e mucuna preta, escolhendo-as como plantas teste. Foi feita a semeadura e, depois de oito dias, o desbaste foi realizado deixando quatro plantas de feijão e seis de mucuna por vaso. Figura 6. Teste preliminar de germinação de plantas para escolha das espécies capazes de germinar e crescer nos dois solos (A e B). Amostradores de solução do solo do tipo rhizon (Eijkelkamp Agrisearch Equipment, The Netherlands) (Figura 7a) foram instalados nos vasos após a incubação. 22 Um amostrador foi colocado em cada vaso, em três repetições de cada tratamento, de forma diagonal (± 45°) (Figura 7b e c) do topo para a base do vaso. Um dia antes de cada coleta da solução, os solos dos vasos foram irrigados até 100% da CRA. Foram realizadas três coletas da solução do solo (10, 20 e 30 dias após a emergência das plantas). Em cada amostrador foi acoplado uma seringa de 60 mL (Figura 7d) e feito o vácuo (1 atm), aguardando o volume ser preenchido. Como o amostrador possui uma membrana (0,10 µm), a solução amostrada resultante é límpida e pronta para análise. Imediatamente após a coleta, foi realizada a determinação de pH e condutividade elétrica e o restante encaminhado para o laboratório para análise dos demais atributos. As concentrações de Cd, Pb e Zn da solução foram medidos por GFAAS (Perkin Elmer HGA 900), demais cátions (K+, Ca2+, Mg2+, Na+) por ICP-OES (Varian Vista MPX), ânions (F-, Cl-, NO2-, NO3-, PO43-, SO42-) por cromatógrafo de íons modular (Metrohm) e carbono orgânico dissolvido (COD) por analisador elementar TOC-L (Shimadzu), para estudo da especiação química através do software Visual MINTEQ (versão 3.0). a b c d Figura 7. Amostrador de solução do solo (a), sua instalação (b) e vista geral (c). Acoplamento de seringa (d) para preparo da coleta. 23 Aos 60 dias após a semeadura, algumas folhas maduras (Figura 8a) foram coletadas dos tratamentos 0 (controle) e 5% (maior dose) do BC para análise em microscopia eletrônica de varredura (MEV), com o objetivo de detectar possíveis alterações morfológicas e anatômicas. Cortes transversais nas folhas perpendiculares à nervura central foram realizados (Figura 8b). As folhas foram colocadas em micro tubos contendo uma solução do fixador Karnovsky modificado (glutaraldeído, 2,5% de paraformaldeído, tampão de cacodilato 0,05 mol L-1 e 2,5% de CaCl2 0,001 mol L-1) a pH 7,2 (Figura 8c) e, em seguida, armazenada em freezer a 4°C até a análise. Amostras de folhas fixadas em Karnovsky modificado foram transferidas para 30% de glicerol durante 30 minutos e depois foram cortadas de forma transversal em nitrogênio líquido. Estas foram lavadas com água destilada e pós-fixadas em solução aquosa de tetróxido de ósmio a 1% durante 1 a 2 horas e, então, desidratados numa série de solução de etanol (25, 50, 70 e 90% durante 10 minutos, e três vezes por 10 minutos a 100%). a b c Figura 8. Folha madura de feijão de porco do tratamento controle, utilizada para análise de MEV (a), corte realizado próximo a nervura central (b) e amostra da folha em solução de fixador Karnovsky modificado (c). Foram realizados exames visuais das plantas para observação de sintomatologia de sintomas de toxicidade de metais pesados. Após a coleta de folhas para análise de MEV, as plantas de todos os tratamentos (Figura 9) foram colhidas e separadas em parte aérea e raízes. A parte aérea das plantas foi lavada com água de torneira seguida de solução a 1% de HCl e água destilada. As amostras foram levadas em estufa a 65 °C com circulação forçada de ar, para secagem até atingir peso constante. As raízes foram separadas do solo por peneiramento, lavadas em água de torneira e imersas em solução de 0,02 mmol L-1 de EDTA dissódico. Em seguida, foram lavadas em água destilada e secas em estufa, como mencionado acima. O extrato seco foi pesado e, em seguida, as amostras foram trituradas em moinho de aço 24 inoxidável e submetidas à digestão nítrico-perclórica segundo Bataglia et al. (1983). Assim, 0,20 g do material foi colocado no tubo de digestão (digestão em blocos) e 3 mL de HNO3 + HClO4 (2:1) foram adicionados. Após a digestão, a solução foi filtrada e transferida para um balão de 50 mL e o volume foi completado com H2O deionizada. Os teores de nutrientes e de metais pesados foram determinados em ICP-OES (Varian, Vista). Em cada rodada de análise foi utilizada uma amostra em branco para controle de qualidade. Figura 9. Vista geral do experimento com as plantas antes do corte. Após o cultivo das plantas, os solos foram amostrados com auxílio de sonda (Figura 10) e prosseguiram-se para análises químicas de fertilidade e metais disponíveis, de acordo com os procedimentos descritos anteriormente. 25 Figura 10. Amostragem do solo no vaso após o cultivo das plantas. A capacidade das espécies de plantas em translocar metais a partir das raízes para a parte aérea foi avaliada pelo índice de translocação (IT), como sugerido por Bicherquer e Bohrlen, citado por Paiva et al. (2002): Em que: QAPA é a quantidade acumulada na parte aérea e QAPAR é a quantidade acumulada na parte aérea + raiz, em mg por vaso. A absorção dos metais pesados pela parte aérea e raízes das plantas foi avaliada pelo fator de bioconcentração (FBC), que representa a relação entre a concentração de metais na planta em relação ao solo (LI et al., 2009): Em que: CP é a concentração na planta (mg kg-1) e CS é a concentração no solo (mg kg-1). 26 Os dados foram submetidos a análise de variância e, quando significativa (p<0,05), foi realizada análise de regressão para o efeito das doses e o teste F para detectar diferenças entre as espécies de plantas. Foi utilizado o programa Sisvar versão 5.3 (FERREIRA, 2011). 3.3. RESULTADOS E DISCUSSÃO 3.3.1. Caracterização dos solos Pela análise de fertilidade (Tabela 1) pode-se verificar que as amostras de solo são levemente ácidas (pH<7) e possuem teor de matéria orgânica muito baixo (<1%), com constituição majoritariamente inorgânica. Além disso, as amostras possuem elevado poder tampão, conforme medido pelo pH SMP, devido ao alto teor de argila. O complexo de saturação é composto 84% (solo do ponto A) e 91% (solo do ponto B) por bases (Ca, Mg e K). O Al encontra-se todo neutralizado pelo alto pH, assim, não foi detectado Al trocável nestas amostras. Os principais elementos com potencial contaminante, extraídos por DTPA, foram Cd, Pb e Zn. Tabela 1. Análise química de fertilidade dos solos A e B, oriundos de área mineradora Solo A B pH 5,8 6,1 pHSMP A B 7,3 7,5 MO g dm-3 7,0 7,0 Al mmolc dm-3 0,0 0,0 P mg dm-3 9,0 14,0 K 0,8 0,8 S B Ca Mg H+Al SB CTC mmolc dm-3__________________ 32 11,0 57,8 69 50 8,0 88,8 97 _________________ 25 38 V % 84 92 Cu Fe Mn mg dm-3 ________________ 0,1 0,2 2,0 2,4 0,1 0,6 4,0 5,0 _______________ 1,0 1,0 As concentrações semi-totais de Cd, Pb e Zn dos dois solos (Tabela 2) excedem o valor de referência de qualidade (0,5; 17 e 60 mg kg-1 de Cd, Pb e Zn, respectivamente) estabelecido pela Cestesb que define um solo como não contaminado, e, no caso de Pb, excede mesmo o valor de intervenção para sítios industriais (900 mg kg-1) (CETESB, 2014). 27 Tabela 2. Análise química da concentração disponível, sem-total e total de Cd, Pb e Zn nos solos A e B, oriundos de área mineradora Solo Disponível (DTPA) Pb Zn ___________ mg dm-3 ___________ A B 1,2 0,9 Cd 136 141 56 60 Semi-total (EPA 3051) Total (EPA 3052) Cd Pb Zn Cd Pb Zn _______________________ mg kg-1 _______________________ 8,4 4,5 2300 2334 698 1065 11,3 6,4 5700 3688 2906 2027 Os resultados de ataque sulfúrico mostraram elevados teores de óxidos de Al e Fe e menor proporção de Mn (Tabela 3). Os índices Ki e Kr obtidos indicam solos com baixo grau de intemperismo. O índice Ki>2 indica a presença de minerais do tipo 2:1. Provavelmente isso ocorreu pela localização dentro da cava, pode estar próximo à rocha. Tabela 3. Análise de ataque sulfúrico dos solos A e B, oriundos de área mineradora Solo SiO2 Al2O3 Fe2O3 MnO Ki* Kr* % A 22,3 ± 0,4 18,3 ± 1,7 17,8 ± 0,2 0,39 ± 0,03 2,07 1,27 B 18,4 ± 0,4 12,5 ± 0,2 6,9 ± 0,6 0,33 ± 0,04 2,49 1,84 * Ki = 1,7 x %SiO2/%Al2O3; Kr = 1,7 x % SiO2 /[%Al2O3 + (%Fe2O3 x 0,64)] 3.3.2. Caracterização do BC O pH do BC indica reação alcalina do material (Tabela 4), o que pode aumentar o pH do solo e imobilizar metais, especialmente em solos ácidos, onde eles são geralmente mais solúveis (NOVAK et al., 2009). Além disso, o BC apresenta teor relativamente elevado de macronutrientes (ordem de g kg-1), o que explica o alto teor de cinzas encontrado (Tabela 1) e, por sua vez, pode indicar em curto prazo, um efeito corretivo de acidez. Com o aumento da temperatura de pirólise, há perda de grupos funcionais oxigenados (MELO et al. 2013), o que explica a CTC baixa deste BC, em comparação com a dos solos (Tabela 4). As concentrações de Cd e Pb no BC são insignificantes e de Zn é baixa, refletindo o tipo de matéria-prima utilizada, ou seja, palha de cana-de-açúcar que são oriundas de áreas agrícolas com baixos níveis de metais no solo. 28 Tabela 4. Caracterização química e física do biocarvão de palha de cana-de-açúcar pirolisado a 700 ºC pH CE dS m-1 0,05 10,2 P C H N Rendimento Cinza Umidade % ______________________________ 31,0 13,4 4,8 ______________________________ 68,8 2,2 K Ca Mg g kg-1 ______________ 0,9 S Al ______________ 0,9 11,7 7,7 2,0 B ________________________ 1,9 443 5,4 CTC mmolc kg-1 14,3 ASE m2 g-1 5,0 Cd Pb Zn -1 ________________________ mg kg < LD < LD 22,2 LD: limite de detecção O BC apresenta estrutura porosa, como observado nas imagens feitas por MEV (Figura 11). Tal resultado de porosidade é devido à presença de estruturas tubulares formados pelas células das plantas que deram origem ao BC. Embora a estrutura seja micro porosa, a área superficial específica foi considerada baixa quando medida pelo método BET-N2. Apesar de o método de adsorção de N2 (77 K) ser amplamente utilizado, ele pode ser impreciso em materiais micro porosos, uma vez que N2 pode ter uma difusão de poro limitada devido ao seu tamanho, em condições de baixa temperatura, tal como aquela em que é feita a medição (YAO et al., 2011). Outra alternativa seria determinar a área superficial pela adsorção de CO2, na qual é realizada a temperaturas mais elevadas, e cineticamente menos limitada em comparação com o N2 (PIGNATELLO et al., 2006), e assim, é capaz de penetrar os microporos do BC. b a 100 µm 10 µm Figura 11. Imagens do biocarvão feitas em microscopia eletrônica de varredura em dois aumentos: 250 (a) e 3000 (b) vezes. 29 3.3.3. Efeitos do BC na solução do solo, nas plantas e nos solos A concentração de Cd e Pb na solução do solo só foi possível de ser determinada na 1ª coleta, pois, na 2ª e 3ª os valores encontravam–se abaixo do limite de detecção do equipamento (1,0 µg L-1). Pode ter ocorrido maior adsorção destes elementos nas partículas de BC ao longo do tempo, e também pela baixa concentração desses elementos na solução, principalmente o Cd. No solo A a aplicação de BC não afetou a concentração de Cd e Pb na solução do solo (Tabela 5), independentemente das plantas usadas, e, no solo B (Tabela 6), o mesmo ocorreu para os tratamentos com o feijão de porco. Contudo, nos solos em que a mucuna cresceu houveram diminuições das concentrações desses dois elementos com o aumento das doses de BC. De maneira geral houve aumento do pH com aplicação de BC nos dois solos (A e B) (Tabela 5 e 6). Tabela 5. Concentrações de Cd e Pb e pH na solução do solo do ponto A, em função das doses de biocarvão, em três coletas realizadas aos 10, 20 e 30 dias após a emergência das plantas Planta Coleta 0 Biocarvão (%) 1,5 3,0 Média CV% Regressão 0,43 0,46 0,44 0,52** 14,2 ns ns 12,09 4,23 5,06 3,73 18,09 5,54 31,7 ns ns 7,60 7,70 7,70 7,69 7,55 7,61 1,2 y = 0,06x + 7,41 r²: 0,97** y = 0,05x + 7,48 r²: 0,77** 7,60 7,87 7,77 7,93 7,59 7,59 2,0 ns y = 0,07x + 7,59 r²: 0,81** 7,52 7,45 7,63 7,70 7,46 7,49 1,0 y = 0,05x + 7,34 r²: 0,99** y = 0,07x + 7,32 r²: 0,84** 5,0 Cd (µg L-1) Feijão de porco Mucuna preta 1ª 0,53 0,58 0,49 0,52 0,45 0,51 Pb (µg L-1) Feijão de porco Mucuna preta 1ª 37,51 6,97 17,71 7,25 pH Feijão de porco Mucuna preta 1ª 7,43 7,43 7,47 7,60 pH Feijão de porco Mucuna preta 2ª 7,48 7,63 7,50 7,60 pH Feijão de porco Mucuna preta 3ª 7,35 7,30 7,40 7,51 **, * e ns - significativo a 1 e 5% de probabilidade, e não-significativo pelo teste F. 30 Tabela 6. Concentrações de Cd e Pb e pH na solução do solo do ponto B, em função das doses de biocarvão, em três coletas realizadas aos 10, 20 e 30 dias após a emergência das plantas Planta Coleta 0 Biocarvão (%) 1,5 3,0 Média CV% Regressão 0,39 0,39 0,45 0,45 17,4 ns y = -0,02x + 0,49 r²: 0,99** 3,82 3,91 2,61 2,20 4,06 4,14 38,6 ns y = -0,55x + 5,37 r²: 0,98** 7,50 7,80 7,82 7,93 7,59 7,81** 1,2 y = 0,05x + 7,47 r²: 0,59** ns 7,80 7,88 7,75 7,95 7,63 7,86** 1,0 y = 0,07x + 7,47 r²: 0,75** ns 7,67 7,72 7,68 7,75 7,62 7,69** 0,9 y = 0,03x + 7,54 r²: 0,87** ns 5,0 Cd (µg L-1) Feijão de porco Mucuna preta 1ª 0,49 0,49 0,48 0,47 0,43 0,43 Pb (µg L-1) Feijão de porco Mucuna preta 1ª 5,49 6,20 4,30 4,25 pH Feijão de porco Mucuna preta 1ª 7,53 7,53 7,51 7,79 pH Feijão de porco Mucuna preta 2ª 7,45 7,80 7,53 7,82 pH Feijão de porco Mucuna preta 3ª 7,52 7,63 7,60 7,65 **, * e ns - significativo a 1 e 5% de probabilidade, e não-significativo pelo teste F. Houveram reduções lineares na concentração de Zn com aumento das doses de BC, nas três coletas da solução dos dois solos cultivados com feijão de porco (Figuras 12a e 13a). As reduções das concentrações de Zn corresponderam a 42, 51 e 35% para o solo A, e, 61, 41 e 83% para o solo B, na 1ª, 2ª e 3ª coleta, respectivamente. Todavia, para a mucuna preta as concentrações de Zn em solução reduziram em aproximadamente 30 e 80% para o solo A e B, respectivamente, na 1ª coleta. Nas outras coletas (2ª e 3ª) não foi significativo. 31 100 a 80 60 48 -1 Concentração de Zn (µg L ) 1ª coleta y = -6,95x + 80,63 R² = 0,96** 2ª coleta y = -11,35x + 101,25 R² = 0,90** 3ª coleta y = -4,39x + 60,97 R² = 0,98** -1 Concentração de Zn (µg L ) 120 MP y = -2,64x + 43,48 R² = 0,96** 44 b 40 36 32 40 0,0 1,5 3,0 0,0 5,0 1,5 3,0 5,0 Doses de biocarvão (%) Doses de biocarvão (%) Figura 12. Concentração de Zn na solução do solo do ponto A, em função das doses de biocarvão, em três coletas realizadas para o feijão de porco (a) e para a primeira coleta da mucuna preta (b). ** - 5% de probabilidade pelo teste F. 50 100 80 a 60 40 MP y = -7,44x + 47,45 R² = 0,99** -1 1ª coleta y = -11,61x + 89,88 R² = 0,88** 2ª coleta y = -7,55x + 93,01 R² = 0,93** 3ª coleta y = -12,27x + 74,25 R² = 0,98** Concentração de Zn (µg L ) -1 Concentração de Zn (µg L ) 120 40 b 30 20 10 20 0,0 1,5 3,0 Doses de biocarvão (%) 5,0 0,0 1,5 3,0 5,0 Doses de biocarvão (%) Figura 13. Concentração de Zn na solução do solo do ponto B, em função das doses de biocarvão, em três coletas realizadas para o feijão de porco (a) e para a primeira coleta da mucuna preta (b). ** - 5% de probabilidade pelo teste F. Estes resultados corroboram os encontrados por Beesley et al. (2014). Esses autores verificaram que a concentração de Zn na solução do solo diminuiu de 7000 para 500µg L-1, com aplicação de 10% de BC de resíduos de poda de pomar pirolisado a 500 ºC, e, também houveram diminuições das concentrações de Cd e Pb. Apesar da diminuição de Zn na solução do solo, as concentrações de Zn (40 a 100 µg L-1) do presente experimento não são consideradas elevadas, de acordo MorenoJiménez et al. (2011). Tais pesquisadores comentam que concentrações relativamente 32 altas de Zn na solução do solo estão entre 150 e 1000 µg L-1, verificadas em estudo de solos impactados por atividades de mineração. Analisando a composição química da solução dos solos da terceira coleta, calculou-se que, em média em todos os tratamentos nos dois solos (Tabela 7 e 8), a maior parte do Zn presente na solução estava na forma livre, como íon Zn2+, seguido do Zn na forma de carbonatos (ZnCO3) e de bicarbonatos (ZnHCO3). Tabela 7. Especiação química da solução do solo da terceira coleta realizada no solo A Zn2+ Zn-M.O. 0% BC 1,5% BC 3,0% BC 5,0% BC 87,2 83,6 80,4 77,6 0,1 0,1 0,1 0,3 0% BC 1,5% BC 3,0% BC 5,0% BC 86,0 82,0 81,1 79,8 0,3 0,1 0,3 0,7 Tratamento ZnHCO3 espécies (%) feijão de porco 2,9 2,8 3,2 3,3 mucuna preta 2,1 2,8 2,9 3,3 ZnCO3 Outras 5,2 5,1 7,3 8,9 4,1 7,8 8,2 8,7 6,1 6,0 6,7 6,3 5,1 8,5 8,3 8,2 Tabela 7. Especiação química da solução do solo da terceira coleta realizada no solo B Tratamento 0% BC 1,5% BC 3,0% BC 5,0% BC Zn2+ Zn-M.O. 77,2 79,9 79,0 77,6 0,1 0,1 0,2 0,2 ZnHCO3 espécies (%) feijão de porco 4,0 3,4 3,0 3,2 ZnCO3 Outras 11,4 10,4 10,0 10,1 9,9 8,8 7,8 8,9 13,3 17,8 14,1 19,5 8,5 11,9 20,9 9,9 mucuna preta 0% BC 1,5% BC 3,0% BC 5,0% BC 74,0 65,6 61,1 65,8 0,2 0,1 0,1 0,2 4,0 4,6 3,8 4,6 A produção de massa seca das plantas no solo A não foi influenciada pelo BC. Contudo, no solo B houve aumento linear da massa seca da parte aérea do feijão (Figura 14a) e aumento da massa seca de raiz das duas plantas (Figura 14b). Isto pode ser devido à diminuição da disponibilidade de metais pesados (Cd, Pb e Zn) no solo. 33 3,2 FP y = 0,18x + 1,69 R² = 0,88** MP y = y = 0,17x + 2,052 R² = 0,98** 20 18 a 16 FP 14 0,0 1,5 Massa seca de raiz (g) Massa seca da parte aérea (g) 22 y = 0,93x + 16,35 R² = 0,79** 3,0 5,0 Doses de biocarvão (%) 2,8 2,4 b 2,0 1,6 0,0 1,5 3,0 5,0 Doses de biocarvão (%) Figura 14. Massa seca da parte aérea do feijão de porco (a) e massa seca da raiz do feijão de porco e mucuna preta (b) em função das doses de biocarvão cultivado no solo do ponto B. ** - 5% de probabilidade pelo teste F. A falta de resposta da aplicação do BC na massa seca da parte aérea da mucuna preta foi semelhante aos resultados encontrados por Namgay et al. (2010), que não observaram esse efeito em milho cultivado em solos contaminados que receberam BC de eucalipto. Fellet et al. (2014) também não constataram influência na massa seca de Anthyllis vulneraria, Noccaea rotundifolium e Poa alpina cultivadas em rejeito de mineração, com dois tipos de BC (resíduos de poda de pomar – 500 ºC e lascas de árvores – 350 ºC) nas doses de 1,5 e 3%. No presente trabalho, isso pode ter ocorrido também pela tolerância das espécies utilizadas. Quanto aos teores de Cd, Pb e Zn na parte aérea das plantas, foram verificadas reduções desses elementos para os dois solos (Figura 15 e 16), exceto para o Pb na mucuna cultivada no solo B. Esse efeito deve ter sido reflexo da diminuição da disponibilidade desses metais no solo com o aumento das doses de BC, que será discutido mais à frente. Essas reduções foram de 42% e 48% para Cd, 53% e 52% para Pb, e 49% e 27% para Zn, para feijão de porco e mucuna preta, respectivamente no solo A. No solo B, as reduções foram menores: 19% e 42% para Cd, 48% e 21% para Pb, e 17% e 7% para Zn, para feijão de porco e mucuna preta. No entanto, mesmo com reduções significativas destes valores eles ainda foram considerados elevados. 34 9 20 FP y = -0,59x + 7,50 R² = 0,98** MP y = -0,18x + 1,91 R² = 0,82** 8 FP y = -1,66x + 17,12 R² = 0,84** MP y = -1,24x + 11,75 R² = 0,91** -1 6 Teor de Pb (mg kg ) -1 Teor de Cd (mg kg ) 7 a 5 4 2 16 b 12 8 1 4 0,0 1,5 3,0 5,0 0,0 1,5 Doses de biocarvão (%) 3,0 5,0 Doses de biocarvão (%) 70 FP y = -1,02x + 31,12 R² = 0,93** MP y = -0,92x + 65,43 R² = 0,99** c -1 Teor de Zn (mg kg ) 65 60 35 30 25 20 0,0 1,5 3,0 5,0 Doses de biocarvão (%) Figura 15. Teores de Cd (a), Pb (b) e Zn (c) na parte aérea do feijão de porco e mucuna preta em função das doses de biocarvão, cultivados no solo do ponto A. ** - 5% de probabilidade pelo teste F. 35 3,0 18 FP y = -0,11x + 2,73 R² = 0,99** MP y = -0,07x + 0,79 R² = 0,67** FP 2,0 1,0 0,5 y = -1,44x + 15,96 R² = 0,96** -1 a Teor de Pb (mg kg ) -1 Teor de Cd (mg kg ) 16 2,5 14 b 12 10 8 0,0 1,5 3,0 0,0 5,0 1,5 3,0 5,0 Doses de biocarvão (%) Doses de biocarvão (%) 120 FP y = -4,66x + 47,70 R² = 0,87** MP y = -5,27x + 94,19 R² = 0,86** -1 Teor de Zn (mg kg ) 100 c 80 60 40 20 0,0 1,5 3,0 5,0 Doses de biocarvão (%) Figura 16. Teores de Cd (a), Pb (b) e Zn (c) na parte aérea do feijão de porco e mucuna preta em função das doses de biocarvão, cultivados no solo do ponto B. ** - 5% de probabilidade pelo teste F. Reduções de 80 e 89% de Cd e Pb na parte aérea de Indian mustard foram observadas com aplicação de 5% do BC de esterco de galinha (PARK et al., 2011). Em outro estudo, observou-se que com BC de lodo de esgoto pirolisado a 750 °C e aplicado em dose equivalente a 5% no solo, houveram reduções nos níveis de Cd de 2,95 para 0,99 mg kg-1, e de Zn de 183 para 38 mg kg-1 na parte aérea da aveia (WAGNER; KAUPENJOHANN, 2014). Resultados semelhantes foram observados por Houben et al. (2013), que verificaram diminuições dos teores de Cd, Pb e Zn na parte aérea de colza (Brassica napus L.) com aplicação de 5 e 10% BC (palha de miscanthus). Os mesmos autores não observaram diferenças na massa seca da parte aérea (na primeira colheita), comparando o controle com as doses de 1 e 5% de BC. Bian et al. (2014) observaram diminuições dos teores de Cd na parte aérea do arroz com aplicação de BC de palha de trigo (10, 20 e 40 t ha-1) em três anos experimento, contudo, o mesmo não foi observado para Pb. 36 Quando analisados os macronutrientes da parte aérea das plantas, foram observados aumentos dos teores de P na mucuna, nos dois solos, pela aplicação de BC (Tabela 9 e 10). O mesmo efeito foi observado para K nas duas espécies e nos dois solos. Os aumentos dos teores de K corresponderam a 96% (feijão) e 137% (mucuna) no solo A e 104% (feijão) e 234% (mucuna) no solo B. Isso deve ter ocorrido pelo BC apresentar K e P em sua composição (Tabela 1). Da mesma forma, Park et al. (2011) observaram aumento de 74% de K na parte área de Indian mustard com aplicação de 5% de BC de esterco de galinha. Zhao et al. (2014) observaram aumento da absorção de P e K pelas plantas de arroz e trigo após a aplicação do BC. Outro efeito observado foi a diminuição dos teores de Mg no feijão de porco (solo A e B) e na mucuna (solo A), provavelmente pela adsorção desse elemento às partículas do BC, já que também houve diminuição na concentração de Mg no solo, o que será discutido mais à frente. Tabela 9. Teores de macronutrientes na parte aérea do feijão de porco e mucuna preta cultivados no solo do ponto A, em função das doses de biocarvão Planta 0 Biocarvão (%) 1,5 3,0 5,0 Média CV% Regressão N (g kg-1) Feijão de porco 11,8 11,4 10,4 11,1 11,2 ns 10 Mucuna preta 18,5 21,4 25,0 22,1 21,8** y = -0,58x2 + 3,71x + 18,14 r²: 0,91** P (g kg-1) Feijão de porco 0,8 0,9 0,8 0,8 0,8 ns 9 ** Mucuna preta 0,9 0,9 1,0 1,1 1,0 y = 0,04x + 0,87 r²: 0,92** K (g kg-1) Feijão de porco 11,2 19,8 21,5 21,9 18,6** y = 1,97x + 13,92 r²: 0,71** 6 Mucuna preta 9,5 16,5 17,9 22,5 16,6 y = 2,43x + 10,83 r²: 0,93** Ca (g kg-1) Feijão de porco 16,7 15,1 16,2 16,1 16,0** ns 7 Mucuna preta 14,8 14,0 14,7 15,2 14,7 ns Mg (g kg-1) Feijão de porco 3,9 2,3 2,1 1,9 2,6 y = -0,36x + 3,41 r²: 0,72** 6 ** Mucuna preta 3,2 2,6 2,5 2,4 2,7 y = -0,15x + 3,02 r²: 0,76** S (g kg-1) Feijão de porco 0,7 1,5 1,6 1,4 1,3 y = -0,09x2 + 0,59x + 0,73 r²: 0,97** 11 ** Mucuna preta 1,0 2,2 2,7 3,3 2,3 y = -0,09x2 + 0,59x + 0,73 r²: 0,97** **, * e ns - significativo a 1 e 5% de probabilidade, e não-significativo pelo teste F. 37 Tabela 10. Teores de macronutrientes na parte aérea do feijão de porco e mucuna preta cultivados no solo do ponto B, em função das doses de biocarvão. Planta 0 Biocarvão (%) 1,5 3,0 5,0 Média CV% Regressão N (g kg-1) Feijão de porco 13,8 10,0 10,4 12,5 11,7 ns 19 Mucuna preta 11,7 23,0 20,6 22,0 20,8** ns P (g kg-1) Feijão de porco 0,9 0,9 1,0 1,1 1,0 ns 11 Mucuna preta 1,0 1,2 1,5 1,8 1,4** y = 0,16x + 0,99 r²: 0,99** K (g kg-1) y = 2,22x + 13,46 r²: 0,84** Feijão de porco 11,4 19,1 21,2 23,2 18,7 7 Mucuna preta 8,3 17,2 20,5 27,7 18,4 y = 3,71x + 9,62 r²: 0,97** Ca (g kg-1) Feijão de porco 18,1 18,2 18,5 16,7 17,9** ns 8 Mucuna preta 16,0 16,8 17,3 15,8 16,5 ns Mg (g kg-1) Feijão de porco 3,7 2,2 2,0 1,9 2,5 y = -0,33x + 3,23 r²: 0,69** 6 Mucuna preta 2,9 2,8 2,9 2,6 2,8** ns -1 S (g kg ) Feijão de porco 0,7 1,5 1,5 1,5 1,3 ns 15 y = 0,57x + 0,97 r²: 0,98** Mucuna preta 0,8 2,0 2,8 3,7 2,3** **, * e ns - significativo a 1 e 5% de probabilidade, e não-significativo pelo teste F. Nas raízes das duas espécies testadas, diminuições dos teores dos metais foram constatadas no solo A (Figura 17), com exceção do Cd. Nas plantas de feijão de porco estas reduções foram de 56 e 58%, e, nas plantas de mucuna preta foram de 68 e 35%, respectivamente para Pb e Zn. A aplicação de BC também causou diminuição nos teores de Pb e Zn nas raízes das duas espécies de plantas no solo B (Figura 18). O efeito mais pronunciado foi no feijão de porco, em que os teores de Pb e Zn reduziram 65% e 58% na dose de 5% BC, respectivamente, em comparação com o controle. Quando as duas espécies de plantas foram comparadas, ficou evidente que as raízes de mucuna absorveram mais Cd, Pb e Zn, em comparação com o feijão. Foi observado também aumento nos teores de Cd pela mucuna preta no solo B (Figura 18a). Park et al. (2011) verificaram que o teor de Cd nas raízes de Indian mustard não foi influenciado pelas doses de 1% e 5% de BC (resíduos verdes). Entretanto, no estudo de Bian et al. (2014) ocorreram diminuições dos teores de Cd e Pb nas raízes das plantas de arroz. 38 700 500 400 -1 -1 Teor de Zn (mg kg ) 600 Teor de Pb (mg kg ) FP y = -18,66x + 151,84 R² = 0,79** MP y = -32,34x + 451,48 R² = 0,92** FP y = -26,91x + 233,16 R² = 0,89** MP y = -41,15x + 622,34 R² = 0,96** a 500 200 b 300 150 100 50 100 0 0,0 1,5 3,0 5,0 0,0 1,5 Doses de biocarvão (%) 3,0 5,0 Doses de biocarvão (%) Figura 17. Teores de Pb (a) e Zn (b) nas raízes do feijão de porco e mucuna preta em função das doses de biocarvão, cultivados no solo do ponto A. ** - 5% de probabilidade pelo teste F. 9,0 FP y = -38,18x + 274,25 R² = 0,88** MP y = -62,61x + 955,72 R² = 0,91** -1 Teor de Pb (mg kg ) 8,0 -1 Teor de Cd (mg kg ) 1000 7,0 MP y = 0,53x + 5,85 R² = 0,70** 6,0 a 800 b 600 300 200 100 5,0 0,0 1,5 3,0 5,0 0,0 1,5 Doses de biocarvão (%) FP y = -17,41x + 141,89 R² = 0,76** MP y = -38,08x + 603,56 R² = 0,89** 600 -1 5,0 Doses de biocarvão (%) 700 Teor de Zn (mg kg ) 3,0 500 c 400 150 100 50 0,0 1,5 3,0 5,0 Doses de biocarvão (%) Figura 18. Teores de Cd (a), Pb (b) e Zn (c) nas raízes do feijão de porco e mucuna preta em função das doses de biocarvão, cultivados no solo do ponto B. ** - 5% de probabilidade pelo teste F. 39 Os resultados observados na solução do solo foram constatados também no solo. Independentemente da espécie, a aplicação de BC provocou redução linear na concentração disponíveis (DTPA) de metais pesados no solo (Figuras 19 e 20). Essa diminuição foi, provavelmente, devido à retenção de metal na superfície do BC, uma vez que o pH do solo se manteve no geral constante entre os tratamentos (Tabela 9 e 10). Estas diminuições corresponderam a 32% para Cd, 21% de Pb e 42% para o Zn, no solo A, e 54% para Cd, 50% de Pb e 57% para o Zn, no solo B. 130 1,2 1,1 a 1,0 0,9 0,8 FP y = -6,41x + 121,02 R² = 0,72** MP y = -3,77x + 121,30 R² = 0,86** -3 FP y = -0,09x + 1,22 R² = 0,93** MP y = -0,07x + 1,23 R² = 0,92** Concentração de Pb (mg dm ) -3 Concentração de Cd (mg dm ) 1,3 120 b 110 100 90 80 0,7 0,0 1,5 3,0 0,0 5,0 1,5 3,0 5,0 Doses de biocarvão (%) Doses de biocarvão (%) Concentração de Zn (mg dm-3) 60 FP y = -4,94x + 54,77 R² = 0,98** MP y = -4,09x + 53,59 R² = 0,98** 55 50 c 45 40 35 30 25 0,0 1,5 3,0 5,0 Doses de biocarvão (%) Figura 19. Concentrações disponíveis de Cd (a), Pb (b) e Zn (c), extraída por DTPA (pH 7,3), no solo do ponto A, após o cultivo de feijão de porco e mucuna preta. ** - 5% de probabilidade pelo teste F. 40 160 0,9 0,8 a 0,7 0,6 0,5 0,4 0,3 FP y = -13,94x + 135,12 R² = 0,99** MP y = -14,46x + 139,51 R² = 0,98** -3 FP y = -0,10x + 0,92 R² = 0,98** MP y = -0,10x + 0,92 R² = 0,96** Concentração de Pb (mg dm ) -3 Concentração de Cd (mg dm ) 1,0 140 120 b 100 80 60 0,0 1,5 3,0 5,0 0,0 Doses de biocarvão %) 1,5 3,0 5,0 Doses de biocarvão (%) FP y = -6,99x + 60,88 R² = 0,98** MP y = -7,51x + 62,12 R² = 0,97** -3 Concentração de Zn (mg dm ) 70 60 50 c 40 30 20 0,0 1,5 3,0 5,0 Doses de biocarvão (%) Figura 20. Concentrações disponíveis de Cd (a), Pb (b) e Zn (c), extraída por DTPA (pH 7,3), no solo do ponto B, após o cultivo de feijão de porco e mucuna preta. ** - 5% de probabilidade pelo teste F. Houben et al. (2013), aplicando 1, 5 e 10% de BC de palha de miscanthus também verificaram diminuições das concentrações disponíveis de Cd, Pb e Zn em solo contaminado. De acordo com Jiang et al. (2012), a adição de BC de palha de arroz foi efetiva para reduzir as concentrações disponíveis de Cu (II), Pb (II) e Cd (II) de um solo contaminado. Nesse contexto, em outro estudo houve uma redução de Pb disponível no solo de 80 para 51 mg kg-1, após aplicação de 3% de BC de resíduos de pomar (FELLET et al., 2014). Esse resultado é importante, pois, quanto menor a disponibilidade de metais, menor será a absorção pela planta e, consequentemente, menor a toxicidade (PAZFERREIRO et al., 2014). A menor disponibilidade de metais pode ser explicada pela presença de sítios de troca na superfície do BC que é responsável pela retenção de elementos e a diminuição da disponibilidade (FELLET et al., 2014). 41 O biocarvão age na fração biodisponível de metais pesados no solo, além de diminuir sua lixiviação (PAZ-FERREIRO et al., 2014). A imobilização por adsorção de metais em superfícies do BC é devido à abundância de grupos funcionais e da densidade de carga superficial (GOMEZ-EYLES, et al., 2013). A presença de sítios de troca no BC desempenha importante papel na retenção de elementos e diminuição de sua biodisponibilidade (FELLET et al., 2014). Beesley e Marmiroli (2011) relataram a retenção de Cd e Zn na superfície do BC. Provaram que estes metais são adsorvidos na superfície de BC e que o processo não é imediatamente reversível. A capacidade de sorção elevada do BC pode ser resultado de três razões: (i) interações eletrostáticas entre os cátions metálicos e do carbono de superfície carregada negativamente; (ii) troca iônica entre prótons ionizáveis na superfície de carbono e cátions metálicos e (iii) sorção envolvendo elétrons π do carbono (SOHI, 2012). Além do efeito nos metais, o BC também proporcionou alterações em alguns macronutrientes. Com a aplicação das doses de BC, houveram aumentos com ajustes lineares nas concentrações de MO, P e K nos solos A e B (Tabelas 11 e 12), para as duas espécies de plantas. No solo A, foi observado ajuste quadrático para a concentração de Ca e Mg, tanto para o feijão quanto para a mucuna. Apesar da concentração da MO ter demostrado resultado significativo com a aplicação das doses de BC, a metodologia utilizada com a solução de dicromato de potássio possivelmente não é adequada para o BC. Esse método não é eficiente para a completa oxidação das partículas de BC. Houve também aumento no pH do solo com as doses de BC, somente nos solos com a mucuna preta. 42 Tabela 11. Análise química do solo do ponto A após o cultivo das plantas de feijão de porco e mucuna preta em função das doses de biocarvão Planta 0 Biocarvão (%) 1,5 3,0 5,0 Média CV% Regressão 6,4 6,6 6,4 6,6** 1 Ns y = 0,0269x2 - 0,1516x + 6,6914 r²: 0,96** 9 9 8 8 6 y = 0,3653x + 7,1324 r²: 0,91** y = 0,5388x + 6,4703 r²: 0,84** 29 31 20 23** 12 y = 3,6621x + 11,553 r²: 0,89** y = 4,347x + 12,676 r²: 0,79** 7,1 8,9 3,6 5,0** 11 y = 1,305x + 0,5256 r²: 0,99** y = 1,5516x + 1,29 r²: 0,98** 30 35 29 30 10 y = -1,5448x2 + 9,2805x + 20,959 r²: 0,63** y = -0,7273x2 + 5,8182x + 23,273 r²: 0,76** 20 19 23 21 16 y = -1,2592x2 + 5,9352x + 20,315 R²: 0,39** y = -0,6512x2 + 3,0039x + 19,767 R²: 0,61** pH Feijão de porco Mucuna preta 6,5 6,7 6,4 6,5 6,4 6,5 MO (g dm-3) Feijão de porco Mucuna preta 7 6 8 8 8 8 P (mg dm-3) Feijão de porco Mucuna preta 9 8 21 24 22 29 K (mmolc dm-3) Feijão de porco Mucuna preta 0,6 0,9 2,4 4,2 4,4 5,9 Ca (mmolc dm-3) Feijão de porco Mucuna preta 19 22 37 34 30 31 Mg (mmolc dm-3) Feijão de porco Mucuna preta 18 19 33 25 21 21 **, * e ns - significativo a 1 e 5% de probabilidade, e não-significativo pelo teste F. 43 Tabela 12. Análise química do solo do ponto B após o cultivo das plantas de feijão de porco e mucuna preta, em função das doses de biocarvão Planta 0 Biocarvão (%) 1,5 3,0 5,0 Média CV% Regressão 6,8 7,1 6,7 7,0** 2 ns y = 0,02x2 - 0,1116x + 6,8316 r²: 0,47** 9 10 8 9** 4 y = 0,4292x + 6,7306 r²: 0,92** y = 0,6027x + 7,0685 r²: 0,99** 32 30 25 24 11 y = 2,9498x + 17,744 r²: 0,99** y = 2,5662x + 18,155 r²: 0,93** 8,0 9,8 3,7 5,0** 12 y = 1,4785x + 0,1635 r²: 0,97** y = 1,7817x + 0,7434 r²: 0,99** 42 45 41 44 13 ns ns 26 27 33 33 15 y = -2,1826x + 38,434 r²: 0,79** y = -3,3973x + 41,068 r²: 0,77** pH Feijão de porco Mucuna preta 6,8 7,2 6,8 7,0 6,6 6,9 MO (g dm-3) Feijão de porco Mucuna preta 7 7 7 8 8 9 P (mg dm-3) Feijão de porco Mucuna preta 17 18 23 21 27 28 K (mmolc dm-3) Feijão de porco Mucuna preta 0,7 1,0 1,9 3,1 4,1 6,0 Ca (mmolc dm-3) Feijão de porco Mucuna preta 35 42 42 48 44 41 Mg (mmolc dm-3) Feijão de porco Mucuna preta 36 42 38 38 33 25 **, * e ns - significativo a 1 e 5% de probabilidade, e não-significativo pelo teste F. Zhao et al. (2014) observaram aumentos das concentrações de P, K, Ca e Mg extraídos por Mehlich III após a aplicação do BC no solo. Este efeito de liberação de nutrientes é muito importante quando o BC atua como remediador, pois além de diminuir as concentrações dos poluentes, fornecer nutrientes, auxiliando na recuperação de áreas contaminadas. Recentemente, o BC tem chamado atenção devido, principalmente, à sua capacidade de sorver metais, reduzindo os efeitos fitotóxicos, que é uma barreira para a revegetação inicial dos solos (BEESLEY et al, 2011; GOMEZEYLES et al., 2013). Durante o experimento, foram observados alguns sintomas de toxicidade na parte aérea das folhas de feijão de porco do tratamento sem a aplicação de BC, tanto no solo A quanto no solo B. Na figura 21 pode-se visualizar a diferença das plantas de feijão de porco cultivadas em dois tratamentos: solo sem BC (a e c) e dose de 5% do BC (b e d). 44 a b c d Figura 21. Diferença visual entre as plantas de feijão de porco cultivadas nos tratamentos sem biocarvão (a e c) e com 5% de biocarvão (b e d), no solo A (a e b) e B (c e d), aos 90 dias após a emergência. Nas plantas de mucuna preta (Figura 22) houveram diferenças entre os tratamentos, mas não foram tão evidentes quanto no feijão de porco. 45 a b c d Figura 22. Diferença visual entre as plantas de mucuna preta cultivadas nos tratamentos sem biocarvão (a e c) e com 5% de biocarvão (b e d), no solo A (a e b) e B (c e d), aos 90 dias após a emergência. Foi observado que as plantas que cresceram no solo sem BC apresentaram menor desenvolvimento e sintomas de toxicidade de Cd, como clorose e enrolamento de folhas (Figura 23a e b). Nas plantas que cresceram na maior dose de BC não apresentaram tais sintomas. Nas plantas de mucuna preta que cresceram no tratamento controle (0% de BC) (Figura 23c e d), além de machas necróticas, ocorreu clorose internerval em folhas novas e crescimento lento das plantas. Esses sintomas de toxicidade Cd e Zn são alguns dos citados por Kabata-Pendias (2011). 46 a c b d Figura 23. Sintomas de fitotoxicidade de Cd e Zn em folhas de feijão de porco (a e b) e mucuna preta (c e d), nos tratamentos sem biocarvão. Não foram observados nódulos radiculares nas plantas cultivadas nos solos sem BC. Por outro lado, estes nódulos foram observados nas plantas cultivadas nos solos com BC (Figura 24), independentemente da dose. Isso indica que o BC forneceu condições (nutrientes e retenção de água) para a simbiose com bactérias do gênero Rhizobium que são fixadoras de nitrogênio e vivem em simbiose com as espécies leguminosas, formando nódulos em suas raízes, capazes de absorverem o nitrogênio da atmosfera, sintetizando substâncias nitrogenadas, também utilizadas pela planta hospedeira (ALMEIDA et al., 2008). Esse efeito é benéfico do ponto de vista de descontaminação de solos em áreas contaminadas por metais pesados, uma vez que estimula a revegetação com a introdução de nitrogênio por meio da fixação biológica. Além da toxicidade por metais 47 pesados, essas áreas têm restrições nutricionais graves, que limitam o crescimento das plantas. b a Figura 24. Presença de nódulos nas raízes de feijão de porco (a) e mucuna preta (b) cultivados em solo com a aplicação de biocarvão. Em doses mais elevadas de BC, as plantas mostraram raízes mais desenvolvidas e mais distribuídas, embora, o comprimento ou área não tenha sido medidos (Figura 25). A fitorremediação combinada com a adição de BC no solo pode aumentar a atividade biológica do solo (LU et al., 2015), além de promover o crescimento das raízes (BRENNAN et al., 2014). 48 a 0% 1,5% 3,0% 5,0% 3,0% 5,0% b 0% 1,5% Figura 25. Diferenças entre as raízes de feijão de porco (a) e mucuna preta (b) de acordo com as doses de biocarvão. As duas espécies de plantas escolhidas para esse estudo são comumente utilizadas como adubo verde no Brasil. Além disso, elas são leguminosas e podem fixar nitrogênio do ar para o solo. Essa característica é muito importante, visto que o BC geralmente possui baixos teores de nitrogênio, pois, durante a pirólise, o aquecimento causa volatilização de alguns elementos, especialmente aqueles da superfície do material (LEHMAN; JOSEPH, 2009). O feijão de porco e a mucuna preta mostraram-se capazes de germinar e se desenvolver nos solos estudados. Apesar de demonstrarem alguns sintomas de toxicidade nos tratamentos sem BC, as plantas ainda conseguiram se recuperar. Dessa 49 maneira, a absorção de metais pesados por plantas é um processo relevante, pois, o BC consegue imobilizar parte das concentrações disponíveis destes elementos e as plantas podem estabilizar o restante, evitando, assim, uma possível movimentação no perfil. As imagens de MEV foram obtidas para observação de possíveis alterações de estruturas internas nas folhas. Nas figuras 26 (feijão) e 27 (mucuna), é possível observar o corte da nervura central mostrando o mesófilo e os feixes vasculares. No entanto, não foram detectadas alterações nos tecidos das estruturas internas das duas espécies para ambas as doses (0% e 5% BC), apesar dos sintomas de fitotoxicidade, relatados anteriormente. a b Figura 26. Corte da nervura central da folha de feijão de porco no tratamento 0% de biocarvão (a) e 5% de biocarvão (b), não demonstrando anormalidades. Aumento de 750 vezes. b a Figura 27. Corte da nervura central da folha de mucuna preta no tratamento 0% de biocarvão (a) e 5% de biocarvão (b), não demonstrando anormalidades. Aumento de 750 vezes. 50 Na mucuna preta, foram verificados, no mesófilo a presença de cristais prismáticos de oxalato de cálcio, perto dos feixes vasculares (Figura 28), em ambos os tratamentos (0% e 5% de BC). A composição dos cristais foi confirmada por MEVEDS. A forma, localização e o tempo de desenvolvimento dos cristais são específicos para cada tecido e espécie (FRANK et al., 2001). O número e o tamanho dos cristais por área foliar não foi verificado. a b Figura 28. Corte da nervura central da folha de mucuna preta no evidenciando a presença de cristais de oxalato de cálcio. Aumento de 1400 vezes na dose 0% (a) e 1600 vezes na dose 5% de biocarvão (b). Apesar da falta de evidência para fundamentar algumas propriedades funcionais de cristais de oxalato de cálcio, a participação de regulação intra e extracelular de cálcio na proteção de plantas e desintoxicação de metal é bastante evidente (COSTA et al., 2009, NAKATA, 2003). Todeschini et al. (2011) verificaram que nas folhas de Populus alba L. cultivadas em solo com alta concentração de Zn houve maior número de cristais de CaOx (149.10−6 µm−2) quando comparado ao controle (35.10−6 µm−2). Analisando o índice de translocação (IT) foi constatado que o feijão de porco teve maior IT nos solos A e B, quando comparado à mucuna preta (Tabelas 13 e 14). Dos elementos analisados, o Cd foi o mais translocado das raízes para a parte aérea, seguido do Zn. 51 Tabela 13. Índice de translocação (IT) de metais pesados pelas plantas no solo do ponto A Planta 0 Biocarvão (%) 1,5 3,0 5,0 Média CV% Regressão IT Cd (%) Feijão de porco 93 93 91 88 91** ns 6,4 Mucuna preta 47 39 32 32 37 y = -3,05x + 44,74 r²: 0,83** IT Pb (%) Feijão de porco 37 45 45 34 40** ns 24,9 Mucuna preta 12 10 9 7 9 ns IT Zn (%) ns Feijão de porco 74 76 78 74 75** 7,8 Mucuna preta 59 59 56 57 57 ns **, * e ns - significativo a 1 e 5% de probabilidade, e não-significativo pelo teste F. Tabela 14. Índice de translocação (IT) de metais pesados pelas plantas no solo do ponto B Planta 0 Biocarvão (%) 1,5 3,0 5,0 Média CV% Regressão IT Cd (%) Feijão de porco 92 93 92 90 92** ns 7,4 Mucuna preta 49 30 24 22 32 y = -5,12x + 43,37 r²: 0,78** IT Pb (%) Feijão de porco 30 42 46 37 39** y = -1,10x2 + 8,81x + 30,33 r²: 0,99** 19,0 Mucuna preta 4 4 4 4 4 ns IT Zn (%) Feijão de porco 63 76 77 74 72** y = -1,47x2 + 9,38x + 63,58 r²: 0,96** 7,5 Mucuna preta 37 37 40 38 38 ns **, * e ns - significativo a 1 e 5% de probabilidade, e não-significativo pelo teste F. Foi verificado, que nos dois solos, com o aumento das doses de BC, houveram reduções do IT para Cd pela mucuna-preta. Também, foi notório que os menores IT da mucuna preta foram o Pb, translocando, em média, 9% deste elemento para a parte aérea no solo A e 4% no solo B. De acordo com Karami et al. (2011), baixos IT indicam menor risco para os consumidores primários. Assim, a mucuna preta pode ser uma opção em programas de fitoestabilização, pois, os elementos são absorvidos pelas raízes e se acumulam no máximo nos apoplastos das raízes, e não são translocados. Isto evita a lixiviação de metais no perfil do solo e menor transferência solo-planta, reduzindo a contaminação da cadeia 52 alimentar. O feijão-de-porco pode ser considerada como espécie fitodescontaminadora, no qual absorve e transloca metais para a parte aérea, acumulando por mecanismos como a compartimentalização vacuolar. Os resultados do fator de bioconcentração (FBC) do presente estudo permitem concluir que a absorção na parte aérea de Cd foi maior que de Pb e Zn nas duas plantas e nos dois solos (Tabela 15 e 16). Outro fato a destacar é que o feijão de porco obteve o maior FBC para Cd e Pb na parte aérea, no solo A e no B. Os maiores valores de FBC encontrados na raiz correspondeu ao Cd na mucuna preta em ambos os solos. Entretanto, como visto anteriormente, em média, a mucuna só translocou 35% desse elemento para a parte aérea. Nos menores valores de FBC, tanto na parte aérea quanto na raiz, foram o Pb, para as duas plantas. Os menores IT também foram atribuídos ao Pb. Tabela 15. Fator de bioconcentração (FBC) de metais pesados pela parte aérea e raiz do feijão de porco e mucuna preta cultivadas no solo do ponto A Planta 0 Biocarvão (%) 1,5 3,0 Média CV% Regressão 0,54 0,13 0,72** 0,17 6,5 y = -0,07x + 0,89 r²: 0,98** y = -0,03x + 0,23 r²: 0,93** 0,59 1,54 0,60 1,74** 28,3 ns ns 0,003 0,003 0,006** 0,004 0,05 0,19 0,07 0,23** 20,1 y = -0,01x + 0,09 r²: 0,83* y = -0,02x + 0,27 r²: 0,99** 0,04 0,10 0,05 0,12** 4,8 y = -0,01x + 0,07 r²: 0,84** y = -0,01x + 0,14 r²: 0,94** 0,11 0,44 0,15 0,54** 16,7 y = -0,03x + 0,22 r²: 0,75** y = -0,05x + 0,65 r²: 0,93** 5,0 FBC parte aérea Cd Feijão de porco Mucuna preta 0,91 0,25 0,75 0,17 Feijão de porco Mucuna preta 0,68 1,85 0,54 1,79 0,69 0,14 FBC raiz Cd 0,57 1,78 FBC parte aérea Pb Feijão de porco Mucuna preta 0,007 0,005 0,007 0,004 0,006 0,003 14,5 y = -0,0008x + 0,008 r²: 0,84** y = -0,0004x + 0,005 r²: 0,84** FBC raiz Pb Feijão de porco Mucuna preta 0,11 0,27 0,07 0,24 0,06 0,22 FBC parte aérea Zn Feijão de porco Mucuna preta 0,07 0,14 0,05 0,12 0,05 0,11 FBC raiz Zn Feijão de porco Mucuna preta 0,25 0,67 0,15 0,56 0,11 0,48 **, * e ns - significativo a 1 e 5% de probabilidade, e não-significativo pelo teste F. 53 Tabela 16. Fator de bioconcentração (FBC) de metais pesados pela parte aérea e raiz do feijão de porco e mucuna preta cultivadas no solo do ponto B Planta Biocarvão (%) 1,5 3,0 0 Média CV% Regressão 0,49 0,11 0,55** 0,14 11,1 y = -0,02x + 0,60 r²: 0,98** y = -0,02x + 0,18 r²: 0,71** 0,39 1,75 0,43 1,58** 19,3 ns y = 0,18x + 1,30 r²: 0,71** 0,004 0,003 0,005** 0,003 0,05 0,29 0,08 0,35** 10,9 y = -0,02x + 0,12 r²: 0,85** y = -0,03x + 0,41 r²: 0,90** 0,02 0,06 0,03 0,06** 5,6 y = -0,002x + 0,031 r²: 0,77* ns 0,06 0,41 0,09 0,48** 12,1 y = -0,02x + 0,13 r²: 0,82** y = -0,03x + 0,56 r²: 0,88** 5,0 FBC parte aérea Cd Feijão de porco Mucuna preta 0,60 0,20 0,58 0,13 0,53 0,11 FBC raiz Cd Feijão de porco Mucuna preta 0,47 1,18 0,40 1,53 0,44 1,86 FBC parte aérea Pb Feijão de porco Mucuna preta 0,007 0,003 0,006 0,003 0,005 0,003 26,9 y = -0,01x + 0,07 r²: 0,99** ns FBC raiz Pb Feijão de porco Mucuna preta 0,13 0,43 0,08 0,35 0,06 0,32 FBC parte aérea Zn Feijão de porco Mucuna preta 0,03 0,06 0,03 0,06 0,02 0,06 FBC raiz Zn Feijão de porco Mucuna preta 0,15 0,59 0,09 0,48 0,07 0,45 **, * e ns - significativo a 1 e 5% de probabilidade, e não-significativo pelo teste F. O BC produzido a partir de palha de cana-de-açúcar tem grande potencial como ferramenta para a remediação de solos contaminados por metais pesados de áreas de mineração. O BC diminuiu a disponibilidade de metais, o que permite a germinação e crescimento das plantas, e pode melhorar a distribuição das raízes. São necessários mais estudos para avaliar a durabilidade em longo prazo de imobilização e em aplicação in situ, bem como o estudo de outras biomassas disponíveis. Além disso, o BC aumentou as concentrações de alguns macronutrientes (P e K) no solo. Esse efeito é importante no manejo e estabelecimento de plantas em áreas contaminadas. 3.4. CONCLUSÕES O biocarvão reduziu a disponibilidade de metais pesados (Cd, Pb e Zn) nos dois solos estudados (A e B) e proporcionou melhor crescimento das plantas de feijão de 54 porco e mucuna preta, sendo que o feijão de porco é mais recomendado em função da absorção de metais e de translocação para a parte aérea. O biocarvão diminuiu as concentrações de Zn na solução do solo em três coletas realizadas no solo A e no solo B, quando cultivados com feijão de porco. O biocarvão não afetou as estruturas internas das folhas de feijão de porco e mucuna preta, nos dois solos (A e B). 55 4. CAPÍTULO II LIXIVIAÇÃO E EXTRAÇÃO SEQUENCIAL DE METAIS PESADOS EM SOLOS DE MINERAÇÃO QUE RECEBERAM APLICAÇÃO DE BIOCARVÃO RESUMO A mobilidade dos metais pesados no solo e, consequentemente, o risco de lixiviação para águas subterrâneas são aspectos importantes a serem avaliados em áreas de mineração. O objetivo deste estudo foi avaliar o efeito da acidificação do solo e da aplicação de biocarvão (BC) na mobilidade de Cd, Pb e Zn e no fracionamento químico desses metais presentes em dois solos de área de mineração (A e B). Foi conduzido um experimento com cinco colunas de lixiviação e três lixiviações para cada solo: solo com pH original, solo com pH original + 3% de BC, solo acidificado, solo acidificado + 3% de BC, e solo com aplicação de CaCO3. O biocarvão foi produzido a 700 ºC por pirólise lenta a partir da palha de cana-de-açúcar. Durante o experimento foram realizadas 10 lixiviações e foram quantificados os teores de Cd, Pb e Zn e o pH após cada lixiviação. Ao final do experimento, foi realizada a extração sequencial destes elementos nos solos e determinados os metais presentes nas frações: móvel, trocável, ligado a óxido de Mn, ligado à matéria orgânica (MO), ligado a óxido de Fe e residual. Nos tratamentos acidificados o BC reduziu a concentração de Cd (57-73%), Pb (45-55%) e Zn (46%) lixiviados, em relação ao tratamento controle. Pela extração sequencial o Cd apresentou-se mais ligado a fração móvel (15-35%) e trocável (7-38%), o Pb ligado a fração óxido de Mn (32-70%) e MO (31-43%) e o Zn à fração residual (31-68%). O Cd foi o elemento que apresentou maior índice de mobilidade (33-53%) e o Pb o menor (13%). O biocarvão foi capaz de diminuir as concentrações de Cd, Pb e Zn disponíveis nos tratamentos em que os dois solos testados foram acidificados, na maioria das lixiviações realizadas. Nos tratamentos com o pH original dos solos, não houveram diferenças nas concentrações do lixiviado na presença ou ausência de biocarvão, ou com a aplicação de CaCO3. Em condições ácidas, o BC foi efetivo em reduzir a mobilidade de Cd, Pb e Zn. Palavras-chave: biocarvão, imobilização, fracionamento químico 56 LEACHING AND SEQUENTIAL EXTRACTION OF HEAVY METALS IN MINING SOILS THAT RECEIVED BIOCHAR APPLICATION ABSTRACT The distribution among soil fractions and the mobility of heavy metals in soils of mining areas are important to be assessed, in order to evaluate the risk of leaching into ground water . The aim of this study was to evaluate the effect of soil acidification and biochar (BC) application on Cd, Pb and Zn mobility and chemical fractionation of these metals present in two mining soils (A and B). Five leaching columns for each soil were packed and the following treatments were applied: soil with original pH, soil with original pH + 3% BC, acidified soil, acidified soil + 3% BC and soil + CaCO3. BC was produced by slow pyrolysis at 700 °C from sugarcane straw. Ten leachates were performed and Cd, Pb, Zn and pH were determined for each leaching. A sequential extraction was performed after leaching was finished. The following fractions were evaluated: mobile, exchangeable, bound to Mn oxide, bound to OM, bound to Fe oxide and residual. In acidified soils BC application reduced the Cd (57-73%), Pb (45-55%) and Zn (46%) concentration in the leaching. In the sequential extraction was observed that Cd was bound to mobile fraction (15-35%) and exchangeable fraction (7-38%), Pb was bound to Mn oxide fraction (32-70%) and OM (31-43%) and Zn to the residual fraction (31-68%). Cd presented the highest mobility index (33-53%) and Pb the lowest (1-3%). Biochar was able to reduce the concentrations of Cd, Pb and Zn in acidified soils over most leaching period. In the other treatments there was no difference in the heavy metal concentrations in the presence or absence of BC. Cd was found to be mainly in the mobile and exchangeable fraction, Pb was associated with Mn oxide and OM and Zn bound to the residual fraction. Cd was the metal with the highest mobility in soils, while Pb the lowest. Keywords: biochar, immobilization, chemical fractionation 57 4.1. INTRODUÇÃO A compreensão do potencial de mobilidade dos metais pesados é essencial para o planejamento de técnicas de remediação (HALIM et al., 2013). Uma das ferramentas para se avaliar o comportamento dos metais no solo é a extração sequencial ou fracionamento químico, na qual esses elementos contidos na parte sólida podem ser “fracionados” em formas geoquímicas específicas e ser extraídos seletivamente pelo uso de reagentes apropriados (LÃ et al., 2003). A extração sequencial permite obter informações mais detalhadas sobre o modo de ocorrência, disponibilidade e mobilização dos metais (TESSIER et al., 1979). Esta técnica torna-se cada vez mais importante em estudos ambientais, visando a remediação de solos contaminados e avaliação de risco (KHANLARI; JALALI, 2008). Os principais fatores que governam a mobilidade de um elemento no solo são: o pH, o potencial redox, o teor de matéria orgânica, a textura, a composição mineral, a forma química do elemento e a capacidade de absorção pela planta (SZOLNOKI; FARSANG, 2013). O aumento da sorção pode diminuir o transporte de poluentes e de resíduos de mineração (HASHIM et al., 2011). A capacidade de sorção do Cd é dependente do pH e envolve a competição entre os cátions metálicos e os prótons para sorção nos constituintes do solo. A elevação do pH resulta em aumento da sorção do Cd nos materiais orgânicos e em outras superfícies. A mobilização de Pb é geralmente lenta, mas o aumento de pH e a formação de complexos orgânicos podem diminuir a sua solubilidade. O Zn, apesar de ser muito móvel na maioria dos solos, pode ser retido fortemente pela argila e matéria orgânica, especialmente em solos com pH neutro ou alcalino (KABATA-PENDIAS; MUKHERJEE, 2011). O pH é um dos atributos do solo que mais afeta a mobilidade dos metais, pois, além do efeito direto da competição do H+ na superfície dos colóides do solo, o mesmo pode influenciar outras propriedades (ex. CTC, PCZ, etc.). A imobilização ou a estabilização de metais pesados através da aplicação de materiais no solo, é um dos métodos de remediação. A aplicação desses materiais diminui a fração que pode ser facilmente liberada para a solução do solo, água subterrânea e lixiviada para entrar no ciclo biológico (HOODA; ALLOWAY, 1998). Em áreas mineradas que tenham solos com pH próximo da neutralidade, espera-se que a mobilidade dos metais seja baixa. No entanto, para revegetação destas áreas é necessária a adição de fertilizantes, os quais podem reduzir o pH do solo (ex. fertilizantes 58 amoniacais) e aumentar a mobilidade dos metais e os riscos ambientais associados a tal movimentação. Recentemente, o uso do biocarvão foi sugerido para a estabilização in situ de metais em locais contaminados (UCHIMIYA et al., 2010b; BEESLEY et al., 2011). Além de tal propósito, com a produção do biocarvão ocorre a reciclagem de grandes quantidades de resíduos agrícolas (ABDELHAFEZ et al., 2014). Os mecanismos gerais para a imobilização de metais pelo biocarvão são: aumento do pH do solo, troca iônica, adsorção física e precipitação (GOMEZ-EYLES et al., 2013). Além disso, a imobilização também pode ser realizada através da formação de óxido/hidróxido, carbonato, fosfato ou precipitados e interações eletrostáticas entre os cátions do metal e os grupos funcionais (PARK et al., 2011). Ademais, impurezas minerais (cinzas) e grupos nitrogenados básicos podem servir como sítios de adsorção adicionais dos materiais carbonáceos (UCHIMIYA et al., 2010a). Uma das principais preocupações com relação às áreas contaminadas é a lixiviação de metais com possível contaminação das águas subterrâneas e aquíferos. Diante disso, o objetivo deste estudo foi avaliar o efeito da acidificação do solo e da aplicação de biocarvão na mobilidade vertical de Cd, Pb e Zn e nas concentrações desses metais nas diferentes frações de dois solos contaminados, oriundos de área de mineração. 4.2. MATERIAL E MÉTODOS Amostras de solos foram coletadas em dois pontos (A e B) em uma área de mineração de zinco na cidade de Vazante (MG) (17°55’43”S; 46°49’15”W), em uma cava que está desativada há mais de 15 anos, atualmente pertencente a companhia Votorantim Metais. Nos solos, além do Zn ocorrem outros metais, como Cd e Pb. As amostras de solo foram coletadas na camada de 0 a 20 cm e, após a secagem ao ar, foram homogeneizadas e peneiradas (< 2 mm). As amostras foram submetidas a caracterização física e química. Para facilitar a escrita e discussão do trabalho foi atribuído aos solos a nomenclatura solo A e solo B. A análise granulométrica foi realizada conforme Camargo et al. (2009), sendo o solo A classificado texturalmente como muito argiloso (argila: 626 g kg-1, silte: 150 g kg-1; areia: 224 g kg-1), e o solo B como argiloso (argila: 427 g kg-1, silte: 237 g kg-1; areia: 59 336 g kg-1). Os solos foram classificados como Tecnossolo de acordo com (IUSS-WRB, 2014). A análise química de fertilidade (Tabela 1) foi realizada de acordo com Raij et al. (2001): pH em CaCl2 (0,01 mol L-1); P, K, Ca e Mg extraídos por resina de troca iônica; S extraído por Ca3O8P2; Al extraído por KCl 1 mol L-1; capacidade de troca catiônica calculada pela soma de bases e H+Al e micronutrientes e metais pesados (Cd, Pb e Zn) extraídos por DTPA (pH 7,3). As determinações dos elementos químicos foram feitas em ICP-OES. Tabela 1. Análise química de fertilidade dos solos A e B, oriundos de área mineradora Solo A B pH 5,8 6,1 pHSMP A B 7,3 7,5 MO g dm-3 7,0 7,0 Al mmolc dm-3 0,0 0,0 P mg dm-3 9,0 14,0 K 0,8 0,8 S B Ca Mg H+Al SB CTC mmolc dm-3__________________ 32 11,0 57,8 69 50 8,0 88,8 97 _________________ 25 38 V % 84 92 Cu Fe Mn mg dm-3 ________________ 0,1 0,2 2,0 2,4 0,1 0,6 4,0 5,0 _______________ 1,0 1,0 As análises das concentrações semi-totais e totais (Tabela 2) foram realizadas utilizando o método EPA 3051A com adição de 9 mL de HNO3 e 3 mL de HCl (USEPA 2007), e EPA 3052 com adição de 9 mL de HNO3 e 3 mL de HF (USEPA 1994), respectivamente. Tabela 2. Análises químicas das concentrações disponíveis, semi-totais e totais de Cd, Pb e Zn nos solos A e B, oriundos de área mineradora Solo Disponível Cd Pb Zn ___________ mg dm-3 ___________ Semi-total Total Cd Pb Zn Cd Pb Zn _______________________ mg kg-1 _______________________ A B 1,2 0,9 8,4 4,5 136 141 56 60 2300 2334 698 1065 11,3 6,4 5700 3688 2906 2027 60 As amostras também foram submetidas ao ataque sulfúrico para determinar as concentrações totais de Si, Al, Fe e Mn, de acordo com Camargo et al. (2009) (Tabela 3). Tabela 3. Análise de ataque sulfúrico dos solos A e B, oriundos de área mineradora Solo SiO2 Al2O3 ___________________________________ Fe2O3 MnO Ki* Kr* % ___________________________________ A 22,3 ± 0,4 18,3 ± 1,7 17,8 ± 0,2 0,39 ± 0,03 2,07 1,27 B 18,4 ± 0,4 12,5 ± 0,2 6,9 ± 0,6 0,33 ± 0,04 2,49 1,84 * Ki = 1,7 x %SiO2/%Al2O3; Kr = 1,7 x % SiO2 /[%Al2O3 + (%Fe2O3 x 0,64)] Para a produção do biocarvão (BC) foi utilizada a palha da cana-de-açúcar, dada a elevada disponibilidade deste resíduo no Brasil, devido à tendência de colheita mecanizada sem queima nos últimos anos, especialmente no Estado de São Paulo. Em estudo anterior, realizado por Melo et al. (2013), o BC produzido a partir da mesma biomassa mostrou maior retenção de Cd e Zn na temperatura de 700 °C, razão pela qual esta temperatura foi a escolhida. A palha de cana-de-açúcar foi coletada em áreas experimentais do Instituto Agronômico de Campinas (-22º52'24.7'S; -47º04 '39 0,7 'W) e, posteriormente, seca e moída (< 2 mm). Em seguida, ela foi colocada num reator selado para evitar a entrada de O2. O reator foi aquecido a uma taxa de 5°C/min até 700 °C e manteve-se a esta temperatura durante cerca de uma hora e posteriormente foi resfriada lentamente até a temperatura ambiente. O BC foi homogeneizado e peneirado a 2 mm. Para a caracterização química do BC (Tabela 4) foi medido o pH em água e a condutividade elétrica (CE) (SINGH et al., 2010). O teor de cinzas e a umidade foram determinados de acordo com o procedimento ASTM D7582 (2011). A composição elementar (CHN) foi determinada em analisador elementar (Perkin Elmer, Série II 2400). A área superficial específica (ASE) foi obtida pelo método BET N2 e a CTC analisada de acordo com Song e Guo (2012), na qual é realizada a saturação da superfície de troca com acetato de amônio e a troca com KCl, sendo determinado o teor de NH4+ deslocado. Também foram determinadas as concentrações de macronutrientes, micronutrientes e alguns possíveis contaminantes (metais) em ICP-OES (Varian, Vista), após a digestão em micro-ondas (CEM Mars Corportation) com HNO3 concentrado (USEPA 3051). Todas as análises foram realizadas em triplicata. 61 Tabela 4. Caracterização química e física do biocarvão de palha de cana-de-açúcar pirolisado a 700ºC pH 10,2 P CE dS m-1 0,05 C H N 68,8 2,2 K Ca Mg g kg-1 ______________ 0,9 S ______________ 0,9 11,7 Rendimento Cinza Umidade % ______________________________ 31,0 13,4 4,8 ______________________________ 7,7 2,0 Al B ________________________ 1,9 443 5,4 CTC mmolc kg-1 14,3 ASE m2 g-1 5,0 Cd Pb Zn -1 ________________________ mg kg 0,0 0,0 22,2 A mobilidade vertical de Cd, Pb e Zn e os possíveis efeitos do BC foram estudados em experimento com colunas de lixiviação. O experimento foi conduzido em laboratório no Instituto Agronômico de Campinas (IAC), Campinas (SP). O delineamento experimental foi inteiramente casualizado, em arranjo fatorial 2 (BC: sem e com) x 2 (pH: original e acidificado) + tratamento adicional (aplicação de CaCO3) e com parcela subdividida (10 lixiviações), com três repetições, totalizando 15 colunas para cada solo. Os tratamentos constituíram de: 1) solo com pH original; 2) solo com pH original + 3% BC (m/m); 3) solo acidificado (pH ≅ 4,5) solo acidificado (pH ≅ 4,5) + 3% BC (m/m) e 5) solo com pH original + CaCO3. Testes preliminares foram feitos para verificar as concentrações de HNO3 necessárias para atingir pH 4,5 (DOMINGUES, 2009), no qual calcula-se a quantidade de íons H+ necessários para saturar os pontos de troca desse solo e a concentração da solução de HNO3 necessária para suprir à quantidade de íons de H+ da quantidade de solo estipulada para a realização do teste. Outro teste foi realizado para verificar a concentração necessária de CaCO3 para atingir um valor pH próximo ao do tratamento solo + 3% BC. Na base de colunas de acrílico com 40 cm de altura e 10 cm de diâmetro foram colocadas uma manta acrílica, tela de nylon, 200 g de sílica granulada inerte e outra tela de nylon. As amostras de solos (A e B) foram secas, peneiradas (< 2 mm) e misturadas às doses de BC. O empacotamento das colunas foi realizado cuidadosamente com auxílio de um funil de haste longa, para evitar a compactação dos solos. O preenchimento das colunas com solo foi feito até a altura de 30 cm, o qual foi coberto com manta acrílica para minimizar o impacto das gotas de água e evitar perda de partículas sólidas. O solo foi colocado nas colunas de forma a se obter uma densidade de 1,2 g cm-3 (Figura 1). 62 10 cm manta têxtil 40 cm solo tela de nylon sílica manta acrílica lixiviado Figura 1. Esquema representativo (sem escala) da coluna de lixiviação. O volume de água aplicado por coluna foi obtido de acordo com Amaral Sobrinho et al. (1999). Depois do acondicionamento, colocaram-se as colunas em bandejas plásticas contendo água deionizada em quantidade necessária para o aparecimento de uma película de água no topo da coluna. Nesse ponto, a coluna foi pesada e, por diferença, obtida a massa de água contida na amostra, que correspondeu ao volume de poros. Obteve-se um volume de poros para cada tratamento, que constituiu a unidade para a percolação dos diversos volumes de poros através das colunas. As colunas foram saturadas com H2O deionizada, lentamente, de baixo para cima, para eliminação de todas as bolhas de ar (Figura 2). 63 a b c Figura 2. Saturação das colunas de lixiviação (a). Água deionizada saturando o solo A (b) e o solo B (c), da base para o topo da coluna. O processo de lixiviação das colunas foi feito com H2O deionizada (Figura 3). A cada 7 dias foi realizada lixiviação com adição de água equivalente ao volume de poros. No total, foram feitas 10 lixiviações. Cada lixiviado foi filtrado em papel filtro quantitativo faixa azul e analisado determinando-se o pH e as concentrações de Cd, Pb em espectrômetro de absorção atômica acoplada com forno de grafite (GFA-AS) (Perkin Elmer, modelo HGA 900), devido às concentrações destes metais estarem muito baixas no lixiviado. Por outra lado, a concentração de Zn foi medida em espectrômetro de emissão óptica com plasma indutivamente acoplado (ICP-OES) (Varian, modelo Vista). 64 Figura 3. Lixiviação das colunas com água deionizada. Foi realizado o cálculo de Cd, Pb e Zn acumulado e o ajuste ao modelo de cinética química de primeira ordem, em função das lixiviações para descrever o processo de mobilidade do metal: Em que: y = concentração do metal (mg L-1) na lixiviação n a = quantidade potencialmente lixiviada do elemento k = constante de velocidade de lixiviação L = número de lixiviações Após todas as percolações, as amostras de solos foram secas ao ar e peneiradas (< 2,0 mm) para análise química das concentrações dos metais pesados, usando o método de extração por DTPA (pH 7,3) (RAIJ et al., 2001). Os 5 cm finais de solo em cada coluna foram separados para análise do fracionamento químico, seguindo-se o método de Voegelin et al (2008), com modificações. Foi feita também a análise da concentração tototal dos metais pesados pelo método EPA 3052 (USEPA 1994). Essa fração de solo foi escolhida para simular lixiviação da camada de 0 a 20 cm. Seis 65 frações de Cd, Pb e Zn foram analisadas em triplicata, além de utilizar um branco em cada tratamento. O procedimento de extração sequencial está descrito na Tabela 5. A concentração total de metais no solo foi extraída pelo método EPA 3052 (USEPA, 1994). As leituras dos extratos foram feitas em ICP-OES. Tabela 5. Metodologia do procedimento de extração sequencial para os solos das colunas de lixiviação Fração Extrator F1: móvel F2: facilmente trocável F3: ligado aos óxidos de Mn F4: orgânica F5: ligado fracamente aos óxidos de Fe cristalinos F6: ligado aos óxidos de Fe cristalinos RES: residual 1 mol L-1 NH4NO3 1 mol L-1 NH4OAc; pH 6,0 0,1 mol L-1 NH2OH.HCl + 1 mol L1 NH4OAc; pH 6,0 0,025 mol L-1 EDTA; pH 4,6 0,2 mol L-1 oxalato de NH4; pH 3,25 0,1 mol L-1de ác.ascórbico + 0,2 mol L-1 (NH4)2C2O4; pH 3,25 - Condições 2 g solo + 50 mL extrator, agitação por 24 h Resíduo da F1 agitado por 24 h Resíduo da F2 agitado por 30 min Resíduo da F3 agitado por 90 min Resíduo da F4 agitado por 2 h no escuro Resíduo da F5 agitado por 2 h, em banho maria (96°C) Calculado pela diferença entre a conc. total e o ∑ das 6 frações Adaptado de Voegelin et al (2008): inserção da fração residual A determinação do índice de mobilidade (IM) dos metais pesados foi baseada na equação adaptada de Kabala e Singh (2001): A análise de variância foi utilizada pelo teste F (p<0,05) para verificar os efeitos dos tratamentos nas concentrações de Cd, Pb e Zn. A comparação de médias foi realizada pelo teste de Tukey (p<0,05). As comparações de cada tratamento com o tratamento adicional foram feitas pelo teste de Dunnett (p<0,05). A análise estatística foi feita no software SISVAR 5.1, com exceção do teste de Dunnett que foi feito no ASSISTAT 7.7. 66 4.3. RESULTADOS E DISCUSSÃO 4.3.1. Lixiviação de metais nas colunas Os teores de metais pesados foram influenciados pelos tratamentos aplicados (Tabelas 6, 7 e 8). Comparando-se o efeito da acidificação em cada ponto, verificou-se que a acidificação do solo, sem a adição de BC, provocou maior concentração de Cd no lixiviado até a oitava lixiviação no solo A, e, em todas as coletas para o solo B (Tabela 6). A redução do pH fez com que, na média, a concentração do Cd aumentasse 226 (solo A) e 92 vezes (solo B), em relação aos solos com pH original (na ausência de BC). 67 Tabela 6. Concentração de Cd no lixiviado em função dos tratamentos com ou sem biocarvão, com pH original ou acidificado, e, com aplicação de CaCO3, em dois solos contaminados (A e B) ________ Solo A ________ __________________________ Lixiviação Tratamento Original ________ Solo B ________ __________________________ pH do solo Acidificado Original Acidificado __________________________ Cd (µg L-1) __________________________ sem BC 2,7 aB 910 aA* 1,9 aB 277 aA* 1 com BC 1,8 aB 394 bA* 1,1 aB 58 bA* CaCO3 2,1 1,8 sem BC 3,9 aB 1224 aA* 1,5 aB 255 aA* 2 com BC 2,4 aB 632 bA* 1,1 aB 45 bA* CaCO3 3,5 1,7 sem BC 3,2 aB 667 aA* 1,2 aB 173 aA* 3 com BC 2,0 aB 261 bA* 0,8 aB 35 bA* CaCO3 2,8 1,2 sem BC 1,9 aB 348 aA* 1,1 aB 103 aA* 4 com BC 1,6 aB 124 bA* 0,7 aB 29 bA* CaCO3 1,8 0,9 sem BC 1,2 aB 201 aA* 1,0 aB 59 aA* 5 com BC 0,9 aB 87 bA* 0,6 aB 24 bA* CaCO3 1,1 0,8 sem BC 1,1 aB 169 aA* 0,8 aB 17 aA* 6 com BC 0,9 aA 58 bA* 0,5 aB 14 bA* 0,9 0,7 CaCO3 sem BC 0,9 aB 124 aA* 0,8 aB 12 aA* 7 com BC 0,8 aA 41 bA* 0,5 aB 9 aA* CaCO3 0,8 0,6 sem BC 0,7 aB 87 aA* 0,7 aB 9 aA* 8 com BC 0,5 aA 28 aA* 0,4 aB 6 aA* 0,6 0,5 CaCO3 sem BC 0,6 aA 59 aA* 0,6 aB 6 aA* 9 com BC 0,4 aA 16 aA* 0,3 aB 5 aA* CaCO3 0,5 0,5 sem BC 0,3 aA 43 aA* 0,4 aB 4 aA* 10 com BC 0,2 aA 6 aA* 0,3 aA 3 aA* CaCO3 0,3 0,3 Médias seguidas de mesma letra, maiúscula na linha e minúscula na coluna, não diferem entre si pelo teste de Tukey (p<0,05). *Significativo e superior ao CaCO3, pelo teste de Dunnett a 5% de probabilidade. A aplicação de BC teve influência na concentração de Cd somente quando as amostras de solo (A e B) foram acidificadas, sendo observadas menores concentrações até a sétima e sexta lixiviações nos solos A e B, respectivamente (Tabela 6). Esses resultados indicam que, embora a acidificação do solo aumente a mobilidade de Cd, a presença de BC diminui este efeito. A mobilidade do Cd é muito dependente do pH e do 68 teor de matéria orgânica do solo (MOS) (MARTINELLI; VICENT, 2014), pois a acidificação e o baixo teor de MOS podem aumentar a mobilidade dos metais pesados (YANG et al., 2010). O Cd tem mobilidade elevada na faixa de pH de 4,5 a 5,5 e pode precipitar em solo alcalino na presença de fosfato, cromato, sulfeto e arsenato (HASHIM et al., 2011). Embora alguns autores relatem que tanto a MOS quanto o pH têm grande influência na mobilidade de Cd no solo, no presente trabalho o efeito do pH sobrepõe o efeito da MOS, conforme pode ser visto na comparação pelo teste de Dunnett entre os tratamentos (sem ou com BC) com aqueles que receberam CaCO3 (Tabela 6). As concentrações de Cd foram maiores no tratamento acidificado (com ou sem adição de BC) comparado ao tratamento com pH original e nos tratamentos com pH original não houveram diferenças em ambos os solos. Comparando as flutuações de pH dos lixiviados (Figuras 4a e b) verificou-se o efeito direto deste na lixiviação de Cd, conforme discutido anteriormente. Nos tratamentos em que o pH não foi alterado e naqueles que receberam CaCO3, os valores de pH foram similares e se mantiveram acima de 7,5, em ambos os solos. Todavia, nos tratamentos em que o solo A foi acidificado, observou-se que quando aplicou-se BC houve diferença de pelo menos uma unidade de pH do lixiviado até a 6ª lixiviação (de 6,4 para 7,3), possivelmente interferindo na mobilidade dos metais pesados, assim como no solo B, no qual os valores de pH passaram de 5,2 (sem BC) para 6,8 (com BC). 8 7 a pH orig sem BC pH orig com BC acid sem BC acid com BC CaCO3 6 5 1 2 3 4 5 6 Lixiviação 7 8 9 10 pH do lixiviado pH do lixiviado 8 7 b 6 5 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 Lixiviação Figura 4. pH dos lixiviados nas dez lixiviações do solo A (a) e do solo B (b), em função dos tratamentos com biocarvão e diferentes faixas de pH. A legenda é válida para todas as figuras. 69 Esses resultados ressaltam a importância que deve ser dada às mudanças nas propriedades químicas dos solos quando se visa a recuperação dessas áreas. Com a acidificação desses solos aumenta-se o risco de mobilidade dos metais, como observado neste estudo. Quando o pH não foi alterado, as concentrações de Cd no lixiviado dos dois solos estavam abaixo dos valores de referência de qualidade para água subterrânea (5 µg L-1) definida pelo órgão ambiental do Estado de São Paulo (CETESB, 2014). Nos tratamentos em que os solos foram acidificados, esses valores só foram atingidos na presença do BC no final das lixiviações. Lu et al. (2014) relataram que o aumento na precipitação e adsorção de Cd, Cu, Pb e Zn nos tratamentos que receberam BC pode ter contribuído para a redução da solubilidade e biodisponibilidade desses metais. Quanto à mobilidade do Zn, observou-se que, independentemente do local avaliado, a concentração desse elemento foi igual, tanto na presença como na ausência de BC no tratamento com pH original (Tabela 7). Além disso, constatou-se que a concentração de Zn nos referidos tratamentos não diferiu do tratamento que recebeu CaCO3 (Tabela 7). Todavia, a influência da acidificação do solo teve efeito na concentração de Zn somente quando as amostras de solo não receberam aplicação de BC, até a sexta (solo A) e quinta (solo B) lixiviações, mostrando aqui a importância do pH. 70 Tabela 7. Concentração de Zn no lixiviado em função dos tratamentos com ou sem biocarvão, com pH original ou acidificado, e, com aplicação de CaCO3, em dois solos contaminados (A e B) ________ Solo A ________ __________________________ Lixiviação Tratamento Original ________ Solo B ________ __________________________ pH do solo Acidificado Original Acidificado __________________________ Zn (µg L-1) __________________________ sem BC 9 aB 26237 aA* 961 aB 23308 aA* 1 com BC 7 aA 773 bA 791 aB 12345 bA* CaCO3 41 837 sem BC 43 aB 73404 aA* 1350 aB 17590 aA* 2 com BC 38 aB 8351 bA 1144 aB 10065 bA* CaCO3 123 1169 sem BC 219 aB 20769 aA* 1026 aB 12805 aA* 3 com BC 148 aB 3583 bA* 779 aB 7360 bA* CaCO3 176 882 sem BC 627 aB 16478 aA* 938 aB 11421 aA* 4 com BC 226 aA 1821 bA 669 aB 4663 bA* CaCO3 301 724 sem BC 947 aB 8621 aA* 722 aB 4218 aA* 5 com BC 467 aA 1277 bA* 518 aA 2357 aA* CaCO3 444 610 sem BC 781 aB 4162 aA* 707 aA 934 aA* 6 com BC 335 aA 1073 aA 484 aA 788 aA* CaCO3 418 546 sem BC 644 aA 3120 aA* 493 aA 655 aA* 7 com BC 178 aA 799 aA* 303 aA 426 aA CaCO3 396 388 sem BC 524 aA 2017 aA* 377 aA* 393 aA* 8 com BC 117 aA 687 aA* 198 aA 343 aA 311 293 CaCO3 sem BC 233 aA 1270 aA* 204 aA 255 aA* 9 com BC 65 aA 463 aA 94 aA 158 aA 269 152 CaCO3 sem BC 124 aA 743 aA* 75 aA 163 aA* 10 com BC 56 aA 271 aA 44 aA 87 aA CaCO3 215 66 Médias seguidas de mesma letra, maiúscula na linha e minúscula na coluna, não diferem entre si pelo teste de Tukey (p<0,05). *Significativo e superior ao CaCO3, pelo teste de Dunnett a 5% de probabilidade. O tratamento com aplicação de CaCO3 foi utilizado no presente trabalho para separar o efeito do pH, sendo observado um efeito bastante interessante nos tratamentos que receberam acidificação (Tabela 7). Considerando o local A, das 10 lixiviações realizadas, em 6 não houve diferenças na concentração de Zn nos tratamentos com BC e com CaCO3. O mesmo efeito foi observado nas quatro últimas lixiviações no solo B. Isso provavelmente indica o efeito de sorção deste elemento nas partículas do BC. 71 Beesley e Marmiroli (2011) relataram diminuição de Cd e Zn nos lixiviados com evidência de sorção na superfície do BC, examinado por microscopia eletrônica de varredura (MEV). A importância da aplicação de BC na movimentação do Zn no perfil do solo foi observada nos tratamentos acidificados (Tabela 7). A concentração de Zn foi menor na presença de BC até a quinta lixiviação no ponto A (com redução média de 89%) e quarta lixiviação no solo B (com redução média de 47%). Esses resultados indicaram a importância tanto do pH quanto das partículas de BC na mobilidade de Zn em solos contaminados. Diminuição nas concentrações de Zn no lixiviado após aplicação de BC de casca de nozes foram observadas em outro trabalho e, possivelmente, foi relacionada com o aumento do pH de 4,3 para 6,3 devido à aplicação desse material (NOVAK et al., 2009). As concentrações de Zn no lixiviado das amostras de solo com pH original estiveram abaixo do valor de referência (1800 µg L-1) sugerido pela Cetesb (2014). Entretanto, no solo acidificado essas concentrações só foram alcançadas com aplicação de BC. Por isso, é necessário ter cautela nas ações de manejos dessas áreas, principalmente evitando adoção de medidas que causem a acidificação do solo. Dos elementos estudados, o Pb é o que apresenta menor mobilidade (McBRIDE et al., 1997). Porém, comparando-se os teores de Pb nos tratamentos com pH original e acidificado, observa-se o efeito da acidificação no aumento do teor desse elemento nos lixiviados, com exceção da décima lixiviação na presença de BC (Tabela 8). Tal efeito foi verificado para as amostras de solo coletadas nos dois locais. A aplicação do BC nos tratamentos acidificados causou diminuição na concentração de Pb dos lixiviados do solo A e B (Tabela 8). Além disso, verificou-se que todos os tratamentos do solo acidificado foram maiores em relação ao tratamento adicional (com aplicação de CaCO3), com exceção da décima lixiviação (com BC) no solo A (Tabela 8). Esse fato demonstra a influência que o pH exerce sobre a mobilidade do Pb e outros metais. Houben et al. (2013) demonstraram que a imobilização de Cd, Zn e Pb foi controlada principalmente devido ao aumento do pH do solo. 72 Tabela 8. Concentração de Pb no lixiviado em função dos tratamentos com ou sem biocarvão, com pH original ou acidificado, e, com aplicação de CaCO3, em dois solos contaminados (A e B) ________ Solo A ________ ________ Solo B ________ __________________________ Lixiviação Tratamento Original pH do solo __________________________ Acidificado Original Acidificado __________________________ Pb (µg L-1) __________________________ 17 aB 104 aA* 19 aB 1493 aA* sem BC 5 bB 22 bA* 9 bB 966 bA* 1 com BC 9 9 CaCO3 21 aB 158 aA* 14 aB 1133 aA* sem BC 9 bB 47 bA* 7 bB 846 bA* 2 com BC 7 17 CaCO3 29 aB 266 aA* 11 aB 970 aA* sem BC 13 bB 88 bA* 6 bB 620 bA* 3 com BC 6 22 CaCO3 26 aB 214 aA* 9 aB 669 aA* sem BC 12 bB 73 bA* 5 bB 376 bA* 4 com BC 5 17 CaCO3 23 aB 170 aA* 8 aB 633 aA* sem BC 11 bB 55 bA* 4 bB 203 bA* 5 com BC 4 13 CaCO3 21 aB 93 aA* 7 aB 391 aA* sem BC 7 bB 47 bA* 2 bB 91 bA* 6 com BC 3 11 CaCO3 19 aB* 69 aA* 7 aB 205 aA* sem BC 4 bB 34 bA* 2 bB 76 bA* 7 com BC 2 9 CaCO3 16 aB 46 aA* 6 aB 104 aA* sem BC 3 bB 23 bA* 1,3 bB 61 bA* 8 com BC 1,3 7 CaCO3 14 aB* 33 aA* 5 aB 80 aA* sem BC 3 bB 13 bA* 0,9 bB 43 bA* 9 com BC 1,2 5 CaCO3 9 aB 22 aA* 3 aB 55 aA* sem BC 2 aA 6 bA 0,8 aA 27 bA* 10 com BC 0,9 3 CaCO3 Médias seguidas de mesma letra, maiúscula na linha e minúscula na coluna, não diferem entre si pelo teste de Tukey (p<0,05). *Significativo e superior ao CaCO3, pelo teste de Dunnett a 5% de probabilidade. Há dificuldade de separação dos efeitos do pH e da sorção de metais nas partículas de BC, na movimentação de metais no perfil de solos por eles atuam con. Porém, os resultados apresentados na Tabela 9 ajudam a compreender melhor a contribuição do BC na movimentação de Pb no solo do ponto B. Essas lixiviações foram escolhidas, pois, foram as únicas em que é possível observar que o pH não foi o efeito determinante. Nos tratamentos acidificados deste solo, o pH dos lixiviados da 73 sexta até a oitava lixiviação foram praticamente os mesmos, porém ainda houve diminuição na concentração de Pb, demonstrando assim a retenção desses metais pelo BC. A eficiência do BC em imobilizar Pb pode ser resultado da precipitação de hidróxido de Pb ou fosfato de Pb (AHMAD et al., 2014). Tabela 9. pH, concentrações de Pb e suas respectivas reduções no lixiviado do solo B, na sexta, sétima e oitava lixiviação, em função dos tratamentos com ou sem biocarvão, em pH acidificado. Tratamento pH ___________________ Pb Redução µg L-1 % 6ª lixiviação acid. sem BC 7,4 392 acid. com BC 7,5 92 ___________________ 7ª lixiviação acid. sem BC 7,4 205 acid. com BC 7,5 76 ___________________ 8ª lixiviação acid. sem BC 7,5 104 acid. com BC 7,5 61 ___________________ 77 ___________________ 63 ___________________ 41 Nas lixiviações do solo A, o Pb teve o mesmo comportamento nos tratamentos acidificados e com pH original, no qual houve um aumento da concentração na 3ª lixiviação e depois houve queda dos valores. Os picos nas concentrações possivelmente representam a fração móvel de Pb neste solo. Todavia, no solo B, houve queda na concentração de Pb com as lixiviações realizadas a partir da primeira lixiviação. Abdelhafez et al. (2014) em estudo de lixiviação observaram que a concentração de Pb foi de 8,42 mg L-1 para menos de 5 mg L-1, com aplicação de 10% de BC de bagaço de cana-de-açúcar. Nos tratamentos com pH original as concentrações de Pb chegaram próximas ou alcançaram o valor de qualidade para água subterrânea da Cetesb (10 µg L-1). Entretanto, quando os solos foram acidificados, a concentração de Pb foi bem maior do que esse padrão de qualidade da água e a aplicação de BC nesses tratamentos reduziu a concentração média de Pb de 23 para 6 µg L-1 (solo A) e de 966 para 27 µg L-1 (solo B). 74 Com os valores acumulados de metais pesados nas lixiviações foram feitos ajustes ao modelo de cinética química de primeira ordem. Nas Figuras 5 e 6, observouse o comportamento do Cd e constatou-se que a quantidade máxima lixiviada desse elemento foi menor nos tratamentos com BC tanto no pH original quanto no tratamento acidificado nos dois solos (Figura 5a, 5b, 6a e 6b). Essas diminuições corresponderam a 22% e 37% no tratamento com pH original do solo A e B, respectivamente, enquanto que no tratamento acidificado foram de 57% e 73% no solo A e B, respectivamente. Verificou-se também que a velocidade do processo (constante k – na equação) foi semelhante, contudo, os tratamentos com solo acidificado apresentaram valores mais elevados. Esse efeito é coerente dada a importância do pH para a mobilidade dos metais. Outro fato observado foi que o acúmulo de Cd no lixiviado nos tratamentos que receberam CaCO3, foi mais elevado do que os tratamentos com BC no pH original, no solo A (Figura 5c) e no solo B (Figura 6c). Isso demonstra a importância da aplicação de BC para diminuição da lixiviação de Cd em solos contaminados. 75 4000 15 3000 -1 Cd acumulado (µg L ) -1 Cd acumulado (µg L ) 20 10 a 5 1 2 3 4 5 6 7 8 9 b 1000 400 Original y = 18,8*(1-e-0,23*L) R2: 0,99** -0,19*L 2 ** Original + BC y = 14,2*(1-e ) R : 0,99 0 2000 Acidificado y = 3951,2*(1-e-0,38*L) R2: 0,98** Acidificado + BC y = 1695,3*(1-e-0,42*L) R2: 0,97** 200 0 1 10 2 3 4 5 6 7 8 9 10 Lixiviação Lixiviação -1 Cd acumulado (µg L ) 16 12 8 c 4 -0,22*L CaCO3 y = 16,8*(1-e 2 ** ) R : 0,99 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 Lixiviação Figura 5. Cd acumulado nas lixiviações em função dos tratamentos com pH original e pH original com BC (a), e, acidificado, acidificado com BC (b) e com aplicação de CaCO3 (c), no solo A. 76 1000 800 9 -1 Cd acumulado (µg L ) -1 Cd acumulado (µg L ) 12 6 a 3 600 200 Original y = 13,5*(1-e-0,14*L) R2: 0,99** Original + BC y = 8,5*(1-e-0,15*L) R2: 0,99** 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 b 400 0 -0,43*L 2 ** Acidificado y = 949,6*(1-e ) R : 0,99 -0,27*L 2 ** Acidificado + BC y = 253,5*(1-e ) R : 0,99 1 10 2 3 4 5 6 7 8 9 10 Lixiviação Lixiviação 8 -1 Cd acumulado (µg L ) 10 6 4 c 2 -0,18*L CaCO3 y = 11,1*(1-e 2 ** ) R : 0,99 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 Lixiviação Figura 6. Cd acumulado nas lixiviações em função dos tratamentos com pH original e pH original com BC (a), e, acidificado, acidificado com BC (b) e com aplicação de CaCO3 (c), no solo B. O mecanismo de adsorção do cádmio pelo BC é atribuído principalmente a: (1) a precipitação de superfície através da formação de compostos de Cd insolúveis em condição alcalina induzida pelo poder tampão do BC, e (2) troca iônica entre íon Cd em solução e cátions trocáveis do BC, como o Ca (TAN et al., 2015). A quantidade máxima lixiviada de Pb foi menor nos tratamentos com BC tanto no solo com pH original quanto no tratamento acidificado nos dois solos (Figuras 7a, 7b, 8a e 8b). Essas diminuições corresponderam a 77% e 40% no tratamento com pH original do solo A e B, respectivamente, enquanto que no tratamento acidificado foram de 55% e 45% no solo A e B, respectivamente. O acúmulo de Pb lixiviado nos tratamentos que receberam CaCO3 foi maior do que no tratamento solo com pH original + BC, nos dois solos (Figuras 7c e 8c). 77 1200 Pb acumulado (µg L ) 150 -1 -1 Pb acumulado (µg L ) 200 a 100 50 0 -0,05*L 2 ** Original y = 539,1*(1-e ) R : 0,99 -0,09*L 2 ** Original + BC y = 124,7*(1-e ) R : 0,96 1 2 3 4 5 6 7 8 9 900 600 300 b Acidificado y = 1664,4*(1-e-0,14*L) R2: 0,96** Acidificado + BC y = 756,6*(1-e-0,08*L) R2: 0,96** 0 1 10 2 3 4 5 6 7 8 9 10 Lixiviação Lixiviação -1 Pb acumulado (µg L ) 120 90 60 c 30 -0,10*L CaCO3 y = 191,6*(1-e 0 1 2 3 4 5 6 7 8 2 ** 9 10 ) R : 0,98 Lixiviação Figura 7. Pb acumulado nas lixiviações em função dos tratamentos com pH original e pH original com BC (a), e, acidificado, acidificado com BC (b) e com aplicação de CaCO3 (c), no solo A. 78 6000 80 5000 -1 Pb acumulado (µg L ) -1 Pb acumulado (µg L ) 100 a 60 40 20 -0,17*L 2 4000 3000 b 2000 1000 ** Acidificado y = 6197,3*(1-e-0,29*L) R2: 0,99** -0,40*L 2 ** Acidificado + BC y = 3410,3*(1-e ) R : 0,99 Original y = 112,0*(1-e ) R : 0,99 -0,25 2 ** Original + BC y = 44,8*(1-e ) R : 0,99 0 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 1 10 2 3 4 5 6 7 8 9 10 Lixiviação Lixiviação -1 Pb acumulado (µg L ) 40 30 20 c 10 -0,25*L CaCO3 y = 47,7*(1-e 2 ) R : 0,99 ** 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 Lixiviação Figura 8. Pb acumulado nas lixiviações em função dos tratamentos com pH original e pH original com BC (a), e, acidificado, acidificado com BC (b) e com aplicação de CaCO3 (c), no solo B. No solo A, não foi possível o ajuste ao modelo de cinética química de primeira ordem para o Zn nos tratamentos com o pH original e com aplicação de CaCO3 (Figura 9a e c). Todavia, houve grande redução no acúmulo de Zn com aplicação de BC, no tratamento acidificado do solo A, sendo essa redução de 87% (Figura 9b). Tal efeito foi similar ao encontrado para Cd e Pb. De acordo com Uchimiya et al. (2010b) estudos realizados com carvões ativados têm sugerido que, dependendo da composição da solução e o tipo de carbono, os seguintes mecanismos predominam: (1) interações eletrostáticas entre cátions metálicos e superfície do carbono carregado negativamente, (2) troca iônica entre prótons ionizáveis da superfície de carbono e cátions metálicos, e (3) sorção em elétrons π deslocalizados do carbono. 79 160000 Zn acumulado (µg L ) 140000 -1 -1 Zn acumulado (µg L ) 4000 3000 a 2000 1000 Original Original + BC 120000 b 100000 80000 60000 Acidificado y = 163128,0*(1-e-0,41*L) R2: 0,93** Acidificado + BC y = 20974,2*(1-e-0,27) R2: 0,93** 40000 20000 0 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 1 2 3 4 Lixiviação 5 6 7 8 9 10 Lixiviação 3000 -1 Zn acumulado (µg L ) 2500 2000 CaCO3 1500 c 1000 500 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 Lixiviação Figura 9. Zn acumulado nas lixiviações em função dos tratamentos com pH original e pH original com BC (a), e, acidificado, acidificado com BC (b) e com aplicação de CaCO3 (c), no solo A. Como observado para o Cd e Pb, houve diminuição do acúmulo de Zn no solo B tanto no pH original quanto no tratamento acidificado (Figura 10a e b). Essas diminuições corresponderam a 33% no tratamento com pH original, e, 46% no tratamento acidificado. O acúmulo de Zn no lixiviado no tratamento que recebeu CaCO3 no solo B também foi maior do que o tratamento solo com pH original + BC (Figura 10c). 80 80000 7500 Zn acumulado (µg L ) -1 -1 Zn acumulado (µg L ) 70000 6000 4500 a 3000 1500 -0,16*L 2 50000 40000 30000 b ** Original y = 8885,8*(1-e ) R : 0,99 -0,21*L 2 ** Original + BC y = 5986,8*(1-e ) R : 0,99 0 60000 -0,43*L 10000 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 2 ** Acidificado y = 74622,7*(1-e ) R : 0,98 -0,44*L 2 ** Acidificado + BC y = 39934,6*(1-e ) R : 0,99 1 2 3 4 Lixiviação 5 6 7 8 9 10 Lixiviação 6000 -1 Zn acumulado (µg L ) 7500 4500 c 3000 1500 CaCO3 y = 7076,6*(1-e -0,18*L 3 7 2 ) R : 0,99 ** 0 1 2 4 5 6 8 9 10 Lixiviação Figura 10. Zn acumulado nas lixiviações em função dos tratamentos com pH original e pH original com BC (a), e, acidificado, acidificado com BC (b) e com aplicação de CaCO3 (c), no solo B. Foram calculadas as quantidades totais lixiviadas de Cd, Pb e Zn (Figura 11) e não foram verificadas diferenças entre os tratamentos com o pH original, pH original + BC e CaCO3 (Figura 11a, c e e). Todavia, os tratamentos que receberam BC lixiviaram menor quantidades dos metais pesados, tanto para o solo A quanto para o solo B. Nos tratamentos nos quais os solos foram acidificados, apresentaram quantidade total lixiviada bem maior do que os tratamentos com pH original (Figura 11b, d e f). Houveram diferenças entre os tratamentos com e sem BC. Os que receberam aplicação de BC liviaram menor quantidade de Cd, Pb e Zn do que áqueles sem BC. 81 5 1200 (a) a 4 solo A solo B a 900 3 Cd (µg) Cd (µg) a 2 a a 1 a (b) 600 a 300 b a b 0 0 pH original pH original + BC pH acidificado CaCO3 Tratamento 12 7000 (c) a solo A solo B a a 6000 a (d) a a Pb (µg) 9 Pb (µg) pH acidificado + BC Tratamento 6 a 3 5000 2000 1000 a 0 0 pH original pH original + BC CaCO3 pH acidificado Tratamento 1600 80 a a (e) solo A solo B Zn (mg) 60 800 400 pH acidificado + BC Tratamento 1200 Zn (µg) b b 40 a a a a (f) a 20 b a 0 b 0 pH original pH original + BC Tratamento CaCO3 pH acidificado pH acidificado + BC Tratamento Figura 11. Quantidade total de metais pesados lixiviados em função dos tratamentos com pH original e pH original com BC (a, c e e, para Cd, Pb e Zn), e, acidificado, acidificado com BC e com aplicação de CaCO3 (b, d e f, para Cd, Pb e Zn), nos solos A e B. Médias seguidas de mesma letra não diferem entre si pelo teste de Tukey (p<0,05). 82 Os resultados apresentados na Tabela 10 mostram que o Cd apresentou um alto índice de lixiviação em relação à concentração total na matriz dos solos. Esse resultado foi mais relevante no solo A em condições ácidas (96 % de lixiviação). Por outro lado, o Pb apresentou um índice de lixiviação muito baixo e o Zn uma lixiviação moderada. Isto se deve a forma como estes elementos estão ligados na matriz dos solos, conforme será discutido posteriormente no estudo de extração sequencial. Tabela 10. Percentuais de redução das concentrações de Cd, Pb e Zn em relação à concentração total (EPA 3052) após 10 lixiviações dos solos A e B. Solo Tratamento Cd Pb Zn ______________________________ % 0,006 0,2 0,003 0,02 1 20 0,1 2 0,02 0,3 0,019 0,3 0,003 0,2 4 43 3 17 0,1 0,4 _____________________________ A B original original + BC acidificado acidificado + BC CaCO3 original original + BC acidificado acidificado + BC CaCO3 34 27 96 65 35 5 4 38 33 16 4.3.2. Extração sequencial A extração sequencial é amplamente utilizada para estimar as quantidades e proporções de metais em solo e prever a biodisponibilidade e lixiviação dos metais (JALALI; ARFANIA, 2011). Os resultados de extração sequencial estão apresentados nas figuras 12 e 13. 83 100 100 b 80 80 60 60 Pb % Cd % a 40 40 20 20 0 0 1 2 100 3 4 5 1 Tratamento 2 3 4 5 Tratamento c Zn % 80 móvel trocável óx. de Mn M.O. frac. óx de Fe óx. de Fe residual 60 40 20 0 1 2 3 4 5 Tratamento Figura 12. Distribuição das diferentes frações de Cd (a), Pb (b) e Zn (c) em função dos tratamentos, no solo A. Tratamentos = 1: pH original sem BC; 2: pH original com BC; 3: solo acidificado sem BC; 4: solo acidificado com BC e 5: solo com CaCO3. 84 100 100 b 80 60 60 Pb % Cd % a 80 40 40 20 20 0 0 1 2 3 4 5 1 Tratamento 2 3 4 5 Tratamento 100 c Zn % 80 60 40 móvel trocável óx. de Mn M.O. frac. óx de Fe óx. de Fe residual 20 0 1 2 3 4 5 Tratamento Figura 13. Distribuição das diferentes frações de Cd (a), Pb (b) e Zn (c) em função dos tratamentos, no solo B. Tratamentos = 1: pH original sem BC; 2: pH original com BC; 3: solo acidificado sem BC; 4: solo acidificado com BC e 5: solo com CaCO3. Na fração móvel do solo A (Tabela 11), observou-se que no tratamento acidificado houve maior concentração de Cd do que no pH original, com aplicação de BC. O mesmo ocorreu na fração trocável do solo A, e também foi verificado nessa fração que nos tratamentos acidificados a maior porcentagem de Cd estava no solo que recebeu BC. Todavia, no solo B (Tabela 12) as concentrações de Cd foram maiores nos tratamentos com o pH original (com e sem BC), na fração trocável e na fração ligada a óxido de Mn. Na fração ligada a matéria orgânica (solo A), observou-se que no solo acidificado houve maior concentração de Cd no tratamento sem BC do que aquele que recebeu BC. Comparando aqueles que receberam aplicação de BC o tratamento com pH original apresentou maior concentração de Cd do que o acidificado. Nenhuma diferença foi encontrada no solo B. 85 Na fração ligada fracamente a óxido de Fe (solo B), as concentrações de Cd foram maiores nos tratamentos com o pH original (com e sem BC), entretanto, nenhuma diferença foi encontrada no solo A. Nenhum tratamento foi significativo na fração ligada a óxidos de Fe e na fração residual para os dois solos. Tabela 11. Percentuais de Cd, Pb e Zn nos tratamentos (pH original sem BC; pH original com BC; solo acidificado; solo acidificado com BC e solo com CaCO3) nas diferentes frações do solo A. _________________________________ pH do solo ______________________________ original acidificado original acidificado original acidificado Cd (%) Pb (%) Zn (%) sem BC 12,1Aa* 26,6Aa* 0,1Aa 0,2Aa* 1,3Ba 8,0Aa* Móvel com BC 9,6Ba 27,0Aa* 0,0Aa 0,1Aa* 0,9Ba 4,4Aa* CaCO3 10,5 0,0 0,4 sem BC 24,3Aa 14,4Ab 1,1Aa 1,2Aa* 9,5Aa 7,5Aa Trocável com BC 23,7Ba 25,8Aa 1,0Aa 1,1Aa* 8,2Aa 7,4Aa CaCO3 38,3*** 0,8 8,1 sem BC 8,6Aa** 4,7Aa 24,1Bb 35,7Aa** 8,4Aa 6,1Aa Óxido de com BC 7,4Aa 7,9Aa 32,0Aa** 33,3Aa** 8,3Aa 7,6Aa Mn CaCO3 10,8** 36,4** 7,8 sem BC 29,0Aa* 20,0Aa* 43,1Aa 31,2Bb 6,9Aa* 2,2Aa Matéria com BC 30,5Aa* 1,5Bb 37,4Aa 38,8Aa 6,8Aa 1,0Aa orgânica CaCO3 15,8 31,6 4,3 sem BC 3,2Aa 2,4Aa 12,8Aa 9,7Aa 6,1Aa 3,3Aa Óxido de Fe com BC 2,8Aa 3,1Aa 9,8Aa 8,2Aa 5,0Aa 5,2Aa (fracamente) CaCO3 3,3 9,1 3,1 sem BC 2,8Aa 3,5Aa 4,0Aa 4,9Aa 0,1Aa 0,1Aa Óxido de Fe com BC 3,3Aa 4,8Aa 4,4Aa 5,1Aa 0,1Aa 0,1Aa CaCO3 4,2 6,3 0,1 sem BC 19,9Aa 28,4Aa 14,9Aa 17,0Aa 67,7Ba 71,0Aa Residual com BC 22,8Aa 29,9Aa 15,4Aa 13,4Aa 70,7Ba 71,7Aa CaCO3 30,4 15,8 76,9 Médias seguidas de mesma letra, maiúscula na linha e minúscula na coluna, não diferem entre si pelo teste de Tukey (p<0,05). *Significativo e superior ao CaCO3, ** igual ao CaCO3 e *** CaCO3 é superior aos outros tratamentos, teste de Dunnett a 5% de probabilidade. Fração Tratamento 86 Tabela 12. Percentuais de Cd, Pb e Zn nos tratamentos (pH original sem BC; pH original com BC; solo acidificado; solo acidificado com BC e solo com CaCO3) nas diferentes frações do solo B. _________________________________ pH do solo ______________________________ original acidificado original acidificado original acidificado Cd (%) Pb (%) Zn (%) sem BC 21,6Aa* 31,2Aa* 0,1Aa 0,2Aa* 1,8Aa 6,8Aa* Móvel com BC 15,8Aa* 35,1Aa* 0,1Aa 0,2Aa* 1,3Ba 12,3Aa* CaCO3 7,6 0,0 0,3 sem BC 21,6Aa** 7,6Ba 1,7Aa* 2,3Aa* 11,6Aa 8,3Aa Trocável com BC 19,3Aa** 10,1Ba 2,0Aa 2,3Aa* 13,0Aa 11,1Ba 27,1** 1,6 9,2 CaCO3 sem BC 16,8Aa 12,7Ba 67,7Aa** 68,6Aa** 15,7Aa 14,2Aa Óxido de com BC 13,5Aa 13,0Ba 55,8Ba 69,8Aa** 13,0Aa 16,5Aa Mn CaCO3 19,7 67,9** 14,1 sem BC 2,3Aa 0,5Aa 16,5Aa 14,0Aa 11,1Aa** 7,3Aa Matéria com BC 2,7Aa 0,6Aa 21,1Aa 14,3Aa 10,5Aa** 9,2Ba orgânica 2,7 15,7 11,3** CaCO3 sem BC 7,5Aa 7,0Ba 2,7Aa 3,3Aa 21,3Ab** 17,7Ba** Óxido de Fe com BC 13,3Aa* 6,7Ba 4,2Aa 2,6Aa 29,9Aa** 15,3Ba (fracamente) CaCO3 0,8 3,4 23,8** sem BC 6,1Aa 4,9Aa 2,3Aa 2,3Aa 12,8Aa 14,7Aa Óxido de Fe com BC 5,5Aa 4,3Aa 3,1Aa 2,1Aa 5,5Ab 4,4Ab 7,4 2,5 15,5 CaCO3 sem BC 24,0Aa 38,0Aa 9,1Aa 9,3Aa 25,8Aa 31,2Aa Residual com BC 29,9Aa 30,1Aa 13,7Aa 8,8Aa 26,8Aa 31,1Aa CaCO3 34,8 8,9 25,7 Médias seguidas de mesma letra, maiúscula na linha e minúscula na coluna, não diferem entre si pelo teste de Tukey (p<0,05). *Significativo e superior ao CaCO3, ** igual ao CaCO3 e *** CaCO3 é superior aos outros tratamentos, teste de Dunnett a 5% de probabilidade. Fração Tratamento Quando comparada a distribuição de Cd entre todas as frações do solo A (Tabela 13), verificou-se que as frações que mais continham esse elemento nos tratamentos foram: pH original - trocável e ligada a M.O.; pH original + BC - M.O.; acidificado móvel; acidificado + BC - móvel e trocável, e CaCO3 - trocável. Fazendo a mesma comparação para o solo B (Tabela 14) verificou-se que não houve diferença entre as frações nos seguintes tratamentos: original + BC; acidificado e acidificado + BC. Contudo, no tratamento original e CaCO3 a maior porcentagem do Cd, estava ligada a fração trocável. 87 Tabela 13. Comparação das porcentagens de Cd, Pb e Zn nos tratamentos em função das frações do solo A Móvel Trocável Óx. de Mn Cd Orig orig + BC Acid acid + BC CaCO3 Fração M.O. Óx. de Fe (fra) Óx. de Fe Residual ______________________________________________ ______________________________________________ % 12,1b 24,3a 8,6bc 29,0a 3,2c 2,8c 19,9c 9,6c 23,7b 7,4cd 30,5a 2,8d 3,3cd 22,8cd 26,6a 14,4b 4,7c 20,0a 2,4c 3,5c 28,4bc 27,0a 25,8a 7,9b 1,5b 3,1b 4,8b 29,9b 10,5b 38,3a 10,8b 15,8c 3,3c 4,2c 30,4b Pb Orig orig + BC Acid acid + BC CaCO3 0,1d 0,0c 0,2c 0,1b 0,0c 1,1d 1,0bc 1,2bc 1,1b 0,8bc 24,1b 32,0a 35,7a 33,3a 36,4a 43,1a 37,4a 31,2a 38,8a 31,6a 12,8c 9,8b 9,7b 8,2b 9,1b 4,0cd 4,4bc 4,9bc 5,1b 6,3bc 14,9cd 15,4bc 17,0bc 13,4b 15,8bc Zn Orig orig + BC Acid acid + BC CaCO3 1,3cd 0,9a 8,0b 4,4a 0,4e 9,5ab 8,2a 7,5b 7,4a 8,1b 8,4ab 8,3a 6,1b 7,6a 7,8bc 6,9bc 6,8a 2,2bc 1,0a 4,3cd 6,1bcd 5,0a 3,3bc 5,2a 3,1de 0,1d 0,1a 0,1c 0,1a 0,1e 67,7a 70,7a 71,0a 71,7a 76,9a Tratamento Médias seguidas de mesma letra não diferem entre si pelo teste de Tukey (p<0,05). Tabela 14. Comparação das porcentagens de Cd, Pb e Zn nos tratamentos em função das frações do solo B Tratamento Móvel Fração M.O. Óx. de Fe (fra) Óx. de Fe Residual ______________________________________________ ______________________________________________ % 21,6a 16,8bc 2,3d 7,5c 6,1d 24,0d 19,3a 13,5a 2,7a 13,3a 5,5a 29,9a 7,6a 12,7a 0,5a 7,0a 4,9a 38,0a 10,1a 13,0a 0,6a 6,7a 4,3a 30,1a 27,1a 19,7b 0,8c 0,8c 7,4c 34,8c Trocável Óx. de Mn Cd Orig orig + BC Acid acid + BC CaCO3 21,6ab 15,8a 31,2a 35,1a 7,6c Pb Orig orig + BC Acid acid + BC CaCO3 0,1c 0,1c 0,2c 0,2c 0,0c 1,7c 2,0c 2,3c 2,3c 1,6c 67,7a 55,8a 68,6a 69,8a 67,9a 16,5b 21,1b 14,0b 14,3b 15,7b 2,7c 4,2c 3,3c 2,6c 3,4c 2,3c 3,1c 2,3c 2,1c 2,5c 9,1c 13,7bc 9,3bc 8,8bc 8,9c Zn Orig orig + BC acid acid + BC CaCO3 1,8c 1,3d 6,8b 12,3ab 0,3c 11,6b 13,0b 8,3b 11,1ab 9,2b 15,7ab 13,0b 14,2ab 16,5a 14,1b 11,1b 10,5bc 7,3b 9,2ab 11,3b 21,3a 29,9a 17,7a 15,3a 23,8a 12,8b 5,5cd 14,7ab 4,4b 15,5b 25,8b 26,8b 31,2ab 31,1ab 25,7b Médias seguidas de mesma letra não diferem entre si pelo teste de Tukey (p<0,05). Para o Pb, verificou-se que não houveram diferenças entre os tratamentos nas frações móvel, trocável, ligado fracamente a óxido de Fe, ligada a óxido de Fe e na 88 fração residual, nos dois solos (Tabela 11 e 12). Também não houve diferença na fração ligada a M.O. no solo B. Na fração ligada a óxido de Mn, observou-se maior concentração de Pb no solo A (Tabela 11) no tratamento acidificado comparado com o original, sem aplicação de BC. Comparando os tratamentos com pH original, o que recebeu BC apresentou maiores concentrações de Pb. Todavia, no solo B (Tabela 12) houve maior concentração de Pb no tratamento acidificado comparado com o original, com aplicação de BC. Na fração ligada a M.O. no solo A, comparando os tratamentos que não receberam aplicação de BC, aquele com pH original apresentou maior concentração de Pb do que o acidificado. Quando realizada a comparação entre os solos acidificados verificou-se que o que não recebeu BC apresentou menor porcentagem de Pb. Quando comparada a distribuição de Pb entre todas as frações do solo A (Tabela 13), verificou-se que em todos os tratamentos a maior parte do Pb estava ligada a fração óxido de Mn e M.O., exceto para o solo com pH original, no qual grande parte do Pb estava ligada a fração M.O., devido à afinidade deste elemento por compostos orgânicos (KABATA-PENDIAS, 2011). Entretanto, no solo B (Tabela 14) verificou-se que em todos os tratamentos a maior parte do Pb estava ligada a fração óxido de Mn. Tal preferência pelos óxidos de Mn foi previamente relatada em outros trabalhos (JALALI; MOHARAMI, 2010). Esta fração pode ser considerada relativamente ativa devido à instabilidade do óxido de Mn no ambiente, dependendo das propriedades físicas e químicas do solo (LU et al., 2005). Para o Zn, verificou-se que não houveram diferenças entre os tratamentos nas frações trocável, ligado a óxido de Mn, ligado a M.O., ligado fracamente a óxido de Fe e ligado a óxido de Fe, no solo A (Tabela 11). No solo B (Tabela 12) somente não houve diferença entre os tratamentos na fração residual. Na fração ligada fracamente a óxido de Fe do solo A as concentrações de Zn foram maiores nos tratamentos acidificado (com e sem BC) tanto na fração móvel quanto na fração residual. O mesmo foi observado na fração móvel do solo B no tratamento que recebeu BC. Na fração trocável e na ligada a M.O. (solos B) a maior porcentagem de Zn estava nos tratamentos com pH original, com aplicação de BC. Esse efeito também foi observado na fração ligada fracamente a óxido de Fe. Quando comparado os tratamentos com pH original foi observado que o que recebeu BC continha mais Zn. 89 Na fração ligada a óxido de Fe (solo B) não houve diferença entre os valores de pH do solo. Contudo, os tratamentos sem BC apresentaram maiores porcentagens de Zn. Quando comparada a distribuição de Zn entre todas as frações do solo A (Tabela 13), verificou-se que nos tratamentos com pH original, acidificado e com CaCO3, a fração residual apresentou as maiores porcentagens desse elemento. O Zn associado à fração residual indica baixo risco de mobilização. Na fração residual o metal está incorporado na rede cristalina dos minerais do solo e, portanto, é a fração mais inativa (LU et al., 2005). Todavia, nos tratamentos com BC, não houveram diferenças entre as frações. Já no solo B (Tabela 14), em todos os tratamentos a maior concentração de Zn estava ligada aos óxidos de Fe, e, no tratamento acidificado + BC, esse elemento também estava ligado aos óxidos de Mn. Segundo Zhang et al. (1997), quando o pH do solo é elevado (próximo ou acima da neutralidade), o Zn é mais adsorvido pelos óxidos e hidróxidos de Fe, de Al e de Mn. Nessa adsorção os complexos de esfera interna com os íons metálicos são formados (NOGUEIROL; ALLEONI, 2013). Silveira et al. (2006) em estudo para desenvolver metodologia de extração sequencial para Cu e Zn em solos tropicais, constataram que a maior parte do Zn estava relacionada às frações residual e ligada a óxidos de Fe. Segundo esses autores, essas frações de Zn estão ocluso no interior das estruturas cristalinas e não facilmente disponíveis para absorção pelas plantas. Os metais ligados à fração solúvel em água e a trocável são considerados prontamente móveis e biodisponíveis, enquanto que quando ligados a outras frações, especialmente a residual, são considerados imóveis e podem não ser liberadas em condições naturais (JALALI; ARFANIA, 2011). No presente trabalho, apenas dois pontos da área contaminada foram estudados, porém as diferenças dos metais ligados às frações indicam grande variabilidade espacial, o que também deve ser levado em conta na tomada de decisões para remediação da área. Calculando o índice de mobilidade (IM) dos metais pesados, o Cd foi o elemento com maior mobilidade nos dois solos (IM entre 33% e 53%). Isso indica, possivelmente, a maior participação de ligações menos energéticas (eletrostáticas) e, consequentemente, maior mobilidade do Cd no solo (COSTA et al., 2007). O Pb foi o elemento que apresentou o menor IM (1% a 3%), tanto no solo A quanto no solo B, apresentando menor risco de contaminação. O Zn apresentou mobilidade intermediária com IM entre 9% e 22%. 90 50 a solo A solo B Índice de mobilidade de Cd (%) Índice de mobilidade de Cd (%) 60 50 40 30 20 10 40 30 20 10 0 0 pH orig pH orig + BC pH acid pH acid + BC CaCO3 pH orig pH orig + BC pH acid pH acid + BC CaCO3 Tratamento Tratamento 1,6 3,0 c Índice de mobilidade de Pb (%) Índice de mobilidade de Pb (%) b 1,2 0,8 0,4 0,0 2,5 d 2,0 1,5 1,0 0,5 0,0 pH orig pH orig + BC pH acid pH acid + BC CaCO3 pH orig pH orig + BC pH acid pH acid + BC CaCO3 Tratamento Tratamento 20 16 e e 12 8 4 0 Índice de mobilidade de Zn (%) Índice de mobilidade de Zn (%) 25 f 20 15 10 5 0 pH orig pH orig + BC pH acid pH acid + BC CaCO3 pH orig pH orig + BC pH acid pH acid + BC CaCO3 Tratamento Tratamento Figura 14. Índice de mobilidade de Cd (a e b), Pb (c e d) e Zn (e e f) em função dos tratamentos com pH original e pH original com BC, acidificado, acidificado com BC e com aplicação de CaCO3, nos solos A e B. 91 Os valores dos índices de mobilidade encontrados confirmaram os resultados encontrados no estudo de lixiviação, no qual o Cd mostrou-se ser o elemento que mais foi lixiviado nas colunas de solo. Os resultados aqui encontrados mostram a importância do pH no manejo da recuperação das áreas contaminadas com metais. Nessas áreas, um dos objetivos almejados é a revegetação, fazendo com que os solos readquiram suas funções normais. Em áreas com altas concentrações de metais pesados, como as estudadas, deve-se ter prudência no uso de fertilizantes com reação ácida, principalmente os nitrogenados. A escolha correta desses insumos pode evitar o aumento da mobilidade e possível lixiviação e contaminação do lençol freático. Além disso, o BC mostrou-se como ferramenta para redução das concentrações de Cd, Pb e Zn em possíveis lixiviações. 4.4. CONCLUSÕES O biocarvão de palha de cana de açúcar foi efetivo na redução da lixiviação dos metais pesados (Cd, Pb e Zn), sendo que esse efeito não é somente função do aumento do pH. O Cd está presente principalmente nas frações móvel e trocável, enquanto que o Pb está ligado principalmente aos óxidos de Mn e a MO e muito pouco ligado às frações móvel e trocável. Por fim, o Zn está mais associado à fração residual, de acordo com o fracionamento químico. Isso faz com que o Cd seja o metal de maior mobilidade nos solos e o Pb o de menor mobilidade. 92 5. CONSIDERAÇÕES FINAIS O biocarvão utilizado nesse estudo foi produzido por pirólise lenta (700 °C), a partir da palha da cana-de-açúcar, e apresentou grande potencial na mitigação da toxicidade de metais pesados (Cd, Pb e Zn) em dois solos de áreas de mineração. O biocarvão foi capaz de reduzir as concentrações de metais pesados disponíveis no solo e aumentar as concentrações de alguns macronutrientes (P, K e Mg) no solo. Além disso, foi observada a diminuição da concentração de Zn na solução do solo. A aplicação de biocarvão também diminuiu a absorção de Cd, Pb e Zn por duas espécies de plantas leguminosas (feijão de porco e mucuna preta). Diante disso, é possível incluir a aplicação de biocarvão como ferramenta para a remediação de solos contaminados por metais pesados. Os efeitos observados são importantes no manejo e estabelecimento de plantas em áreas contaminadas. O biocarvão diminui as quantidades tóxicas de metais, o que permite a germinação e crescimento das plantas, e pode ainda de acordo com a literatura, melhorar as propriedades físicas do solo (permitindo maior volume e distribuição das raízes), auxiliando no processo de recuperação de áreas mineradas ou contaminadas. Foi verificado também o sucesso de imobilização dos metais pesados na lixiviação de solos ácidos, efeito muito importante para diminuição do risco de contaminação de corpos d’água e águas subterrâneas. O biocarvão, além de elevar o pH, possui outras vantagens comparadas ao calcário (normalmente utilizado em remediação), como: disponibilizar alguns nutrientes (dependendo da biomassa), aumento de cargas dos solos (devido aos grupamentos funcionais de superfície), aumento da umidade e porosidade, resistência elevada à degradação (devido a similaridade da estrutura interna com o grafite), criação de ambiente favorável para micro-organismos e minhocas, sequestro de carbono no solo, entre outros. Além disso, outra vantagem com a produção de biocarvão é a possível utilização de resíduos que não possuem finalidade assim como dar destino àqueles contaminados, como alguns lodos de esgoto e curtume, diminuindo custos com logística e armazenamento, além do passivo ambiental. Obviamente estudos em campo devem ser realizados para testar a efetividade do biocarvão, assim como outras biomassas regionais disponíveis, doses e formas de aplicação, além da viabilidade econômica. 93 6. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ABDELHAFEZ, A.A.; LI, J.; ABBAS, M.H.H. Feasibility of biochar manufactured from organic wastes on the stabilization of heavy metals in a metal smelter contaminated soil. Chemosphere, v.117, p.66-71, 2014. AHMAD, M.; RAJAPAKSHA, A.U.; LIM, J.E.; ZHANG, M.; BOLAN, N.; MOHAN, D.; VITHANAGE, M.; LEE, S.S. OK, Y.S. Biochar as a sorbent for contaminant management in soil and water: A review. Chemosphere, v.99, p.19-33, 2014. ALLEONI, L.R.F.; IGLESIAS, C.S.M.; MELLO, S.C.; CAMARGO, O.A.; CASAGRANDE, J.C.; LAVORENTI, N.A. Atributos do solo relacionados à adsorção de cádmio e cobre em solos tropicais. Acta Scientiarum. Agronomy v.27, p.729-737, 2005. ALLEONI, L.R.F.; MELLO, J.W.V.; ROCHA, W.S.D. Eletroquímica, adsorção e troca iônica no solo. 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