Marcos Paulo Carrera Menezes

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UNIVERSIDADE FEDERAL DA PARAÍBA
UNIVERSIDADE FEDERAL RURAL DE PERNAMBUCO
UNIVERSIDADE FEDERAL DO CEARÁ
PROGRAMA DE DOUTORADO INTEGRADO EM ZOOTECNIA
VARIABILIDADE E RELAÇÕES GENÉTICAS ENTRE RAÇAS
CAPRINAS NATIVAS BRASILEIRAS, IBÉRICAS E CANÁRIAS
Marcos Paulo Carrera Menezes
AREIA – PARAÍBA – BRASIL
MARÇO – 2005
UNIVERSIDADE FEDERAL DA PARAÍBA
UNIVERSIDADE FEDERAL RURAL DE PERNAMBUCO
UNIVERSIDADE FEDERAL DO CEARÁ
PROGRAMA DE DOUTORADO INTEGRADO EM ZOOTECNIA
VARIABILIDADE E RELAÇÕES GENÉTICAS ENTRE RAÇAS
CAPRINAS NATIVAS BRASILEIRAS, IBÉRICAS E CANÁRIAS
Marcos Paulo Carrera Menezes
AREIA – PARAÍBA – BRASIL
MARÇO – 2005
Marcos Paulo Carrera Menezes
VARIABILIDADE E RELAÇÕES GENÉTICAS ENTRE RAÇAS
CAPRINAS NATIVAS BRASILEIRAS, IBÉRICAS E CANÁRIAS
Tese apresentada ao Programa de
Doutorado Integrado em Zootecnia da
Universidade Federal da Paraíba, do qual
participam a Universidade Federal Rural de
Pernambuco e Universidade Federal do
Ceará, como requisito parcial para obtenção
do título de Doutor em Zootecnia.
Área de Concentração: Produção Animal
Comitê de orientação:
Profª. Dra Maria Norma Ribeiro
Prof. Dr. Edgard Cavalcanti Pimenta Filho
Dra. Amparo Martinez Martinez
Prof. Juan Vicente Delgado Bermejo
AREIA – PARAÍBA – BRASIL
MARÇO – 2005
Ficha catalográfica elaborada na Seção de Processos Técnicos da
Biblioteca Setorial de Areia-PB, CCA/UFPB.
Bibliotecária: Márcia Maria Marques CRB4 – 1409
M543v Menezes, Marcos Paulo Carrera.
Variabilidade e relações genéticas entre raças caprinas
brasileiras, ibéricas e canárias./ Marcos Paulo Carrera
Menezes. – Areia, PB: CCA/UFPB, 2005.
110 p.: il.
Tese (Doutorado Integrado em Zootecnia) pela
Universidade Federal da Paraíba, Universidade Federal Rural
de Pernambuco e Universidade Federal do Ceará.
Orientadora: Maria Norma Ribeiro.
1. Caprinos. 2. Conservação genética. 3. DNA. 4.
Marcadores moleculares. I. Ribeiro, Maria Norma
(orientadora). II. Título.
CDU: 636.39:575.17(043.2)
VARIABILIDADE E RELAÇÕES GENÉTICAS ENTRE RAÇAS
CAPRINAS NATIVAS BRASILEIRAS, IBÉRICAS E CANÁRIAS
MARCOS PAULO CARRERA MENEZES
Tese defendida e aprovada pela banca examinadora em 31 de março de 2005.
Banca examinadora:
___________________________________________
Dra. Amparo Martinez Martinez
Avaliadora
____________________________________________
Profa. Dra. Luiza Suely Sêmen Martins
Avaliadora
____________________________________________
Prof. Dr. Manuel Adrião Gomes Filho
Avaliador
____________________________________________
Prof. Dr. Edgard Cavalcanti Pimenta Filho
Avaliador
____________________________________________
Profa. Dra. Maria Norma Ribeiro
Presidente
AREIA – PARAIBA – BRASIL
MARÇO – 2005
“Em verdade, em verdade te digo que se alguém não nascer de novo,
não pode ver o reino de Deus”. (João 3, 3)
“O vento sopra onde quer, ouves a sua voz,
mas não sabes donde vem, nem para onde vai;
assim é todo o que é nascido do Espírito”.
(João 3, 5-8)
ii
Agradecimentos
Inicialmente, agradeço aos criadores pela sensibilidade e persistência em conservar estes
valiosos e escassos recursos genéticos, pois sem a existência dos caprinos nativos do Brasil
este trabalho não poderia ser realizado.
A professora, orientadora e amiga Maria Norma Ribeiro, muito obrigado pela presença
na hora que necessitava e também pela ausência em momentos que foram importantes para o
meu crescimento pessoal e profissional.
Ao companheiro Edgard Cavalcanti Pimenta Filho, gostaria de agradecer pela nossa
amizade, conversas, viagens e sobretudo por “comungar” com várias idéias e preocupações
sobre a caprinocultura brasileira.
Para o meu irmão Ariosvaldo Nunes de Medeiros, obrigado pelo seu exemplo como
educador, acreditamos no ensino e temos a certeza que podemos contribuir com a formação
dos nossos alunos.
A Amparo y José Luis, gracias por la dedicación y competencia, vosotros fueron muy
importantes en la mia formación profesional, agradezco de corazón por todo.
A Esperanza y Juanvi (hermanos latinos), agradezco por la amistad y por todo el apoyo
prestado en la mia estadía en España.
A minha família, gostaria de expressar a minha eterna gratidão e dizer que apesar da
distância geográfica, vocês estiveram sempre presentes nestes últimos anos.
A todos os amigos que colaboraram direta e indiretamente com a realização deste
trabalho, o meu sincero muito obrigado.
A Universidade Federal da Paraíba, ao Departamento de Zootecnia e ao Programa de
Doutorado Integrado em Zootecnia.
A CAPES pelo apoio financeiro durante o período de doutorado desenvolvido no Brasil
e na Espanha.
A EMBRAPA MEIO-NORTE, EBDA e UFRPE pela contribuição com o nosso
trabalho.
A Universidad de Córdoba, Departamento de Genética de la Facultad de Veterinaria,
Diputación de Córdoba, RED CYTED, LABORATORIO DE GENETICA MOLECULAR
del Servicio de Cría Caballar y Remonta y a todos los ganaderos que colaboraron con este
trabajo.
iii
Índice
Lista de Figuras ................................................................................................................... vii
Lista de Tabelas.................................................................................................................. viii
Resumo..................................................................................................................................ix
Abstract ..................................................................................................................................x
Introdução...............................................................................................................................1
Referencial Teórico ................................................................................................................3
1. Origem das cabras domésticas ...........................................................................................3
2. Origem das cabras Ibéricas ................................................................................................4
3. Raças nativas espanholas de fomento ..............................................................................16
3.1. Murciana-Granadina......................................................................................................17
3.2. Malagueña .....................................................................................................................18
4. Raças Canárias .................................................................................................................19
4.1. Majorera ........................................................................................................................19
4.2. Palmera..........................................................................................................................19
4.3. Tenerifeña......................................................................................................................20
5. Raças nativas espanholas de proteção especial ................................................................20
5.1. Branca Celtibérica .........................................................................................................20
5.2. Branca Andaluza ...........................................................................................................21
6. Raças nativas portuguesa e suíça .....................................................................................22
6.1. Serpentina......................................................................................................................22
6.2. Saanen ...........................................................................................................................23
7. Origem das raças caprinas brasileiras ..............................................................................24
8. Raças nativas brasileiras...................................................................................................25
8.1. Moxotó ..........................................................................................................................25
8.2. Canindé..........................................................................................................................26
8.3. Serrana Azul..................................................................................................................29
8.4. Repartida .......................................................................................................................27
8.5. Marota ...........................................................................................................................28
8.6. Graúna ...........................................................................................................................29
9. Conservação de recursos genéticos ..................................................................................29
9.1. Conservação de recursos genéticos no Brasil ...............................................................30
10. Caracterização genética..................................................................................................32
iv
10.1. Marcadores moleculares..............................................................................................33
10.2. RFLPs..........................................................................................................................34
10.3. RAPD ..........................................................................................................................35
10.4. AFLP ...........................................................................................................................36
10.5. SNPs ............................................................................................................................36
10.6. DNA mitocondrial (mtDNA) ......................................................................................37
10.7. Microssatélites.............................................................................................................38
10.7.1. Seleção de microssatélites........................................................................................39
10.7.2. Técnicas utilizadas para caracterização alélica dos microssatélites.........................40
10.7.2.1. Extração de ácidos nucléicos.................................................................................40
10.7.2.2. A técnica de reação em cadeia de polimerase (PCR)............................................41
9.7.2.3. Amplificação das Sequências de microssatélites ....................................................42
10.7.2.4. PCR Multiples .......................................................................................................43
10.7.2.5. Métodos de eletroforese em gel ............................................................................44
10.7.2.6. Utilização de fluorocromos e sequeciamento automático.....................................44
10.7.3. Aplicação dos microssatélites .................................................................................45
10.7.3.1. Estudos de variabilidade genética .........................................................................45
10.7.3.2. Mapas genéticos ....................................................................................................46
10.7.3.3. Controle de paternidade ........................................................................................46
11. Análises estatísticas........................................................................................................47
11.1. Cálculo de frequências alélicas ...................................................................................47
11.2. Heterozigosidade.........................................................................................................48
11.3. Conteúdo de informação polimórfica (PIC)................................................................49
10.4. Equilíbrio de Hardy-Weinberg (EHW) .......................................................................49
10.5. Índices de fixação ou Estatisticas de F........................................................................50
10.6. Coeficiente de diferenciação genética (GST)..............................................................52
11. Distâncias genéticas .......................................................................................................52
11.1. Medidas de distâncias genéticas..................................................................................54
12. Árvores de distância genética.........................................................................................56
12.1. Árvores filogeneticas inidividuais...............................................................................57
12.2. Análises de correspondência .......................................................................................58
Referências Bibliográficas ...................................................................................................59
v
Capítulo I..............................................................................................................................68
Painel de 27 Microssatélites para Caracterização Genética das Raças Caprinas Nativas
Brasileiras.............................................................................................................................69
Resumo.................................................................................................................................69
Abstract ................................................................................................................................70
Introdução.............................................................................................................................71
Material e Métodos...............................................................................................................73
Resultados e Discussão ........................................................................................................76
Conclusões ...........................................................................................................................82
Referências Bibliográficas ...................................................................................................83
Capítulo II ............................................................................................................................86
Variabilidade Genética das Raças Caprinas Nativas Brasileiras Utilizando Marcadores
Moleculares ..........................................................................................................................87
Resumo.................................................................................................................................87
Abstract ................................................................................................................................88
Introdução.............................................................................................................................89
Material e métodos ...............................................................................................................89
Resultados e discussão .........................................................................................................92
Conclusões .........................................................................................................................100
Referências Bibliográficas .................................................................................................100
Capítulo III .........................................................................................................................102
Distância Genética entre Raças Caprinas Nativas Brasileiras, Ibéricas e Canárias Usando
Microssatélites....................................................................................................................103
Resumo...............................................................................................................................103
Abstract ..............................................................................................................................104
Introdução.................................................................................................................................
Material e métodos .............................................................................................................107
Resultados e discussão .......................................................................................................109
Conclusões ...............................................................................................................................
Referências Bibliográficas .......................................................................................................
Conclusões Gerais ..............................................................................................................123
vi
Lista de Figuras
Capítulo II ...................................................................................................................... 86
Figura 1 – Localização geográfica dos Estados onde foram coletadas amostras das raças
caprinas brasileiras........................................................................................ 90
Figura 2 – Dendrograma de UPGMA das raças brasileiras, baseado na distância DA de
Nei (1983) ..................................................................................................... 96
Figura 3 – Representação espacial das populações estudadas segundo as análises fatorial
de correspondências ...................................................................................... 97
Capítulo III ................................................................................................................... 102
Figura 1 – Estatísticas de F (Fit, Fis e Fst) para todos os loci analisados .................... 112
Figura 2 – Dendrograma de NJ baseado na distância genética Da de Nei et al. (1983), com
1.000 permutações ...................................................................................... 115
Figura 3 - Representação espacial das raças caprinas estudadas segundo a análise fatorial
de correspondência...................................................................................... 118
Figura 4 - Representação espacial dos indivíduos analisados segundo a análise fatorial de
correspondência .......................................................................................... 118
vii
Lista de Tabelas
Referencial Teórico ..............................................................................................................14
Tabela 1 – Espécies e raças em núcleos de conservação de recursos genéticos ..................31
Tabela 2 – Alguns critérios para eleição da medida de distância genética apropriada ........55
Capítulo I 68
Tabela 1- Microssatélites analisados com as seqüências (direta e reversa) dos iniciadores 74
Tabela 2 - Multiplex dos loci, tamanhos dos fragmentos, fluorocromos e temperatura de
anelamento utilizados..........................................................................................75
Tabela 3 - Número de alelos (NA), Heterozigosidade observada (Ho), Heterozigosidade
esperada (He), Conteúdo de Informação Polimórfica (PIC) em função dos loci
analisados ............................................................................................................78
Tabela 4 – Relação dos loci desequilibrados (Hardy-Weinberg) de acordo com as raças
caprinas estudadas...............................................................................................79
Tabela 5 - Coeficiente de diferenciação genética (Gst) e Testes de F (Fst, Fit e Fis) para cada
locus analisado ....................................................................................................81
Capitulo II ............................................................................................................................86
Tabela 1 – Número de amostras (N), número médio de alelos (NA), heterozigosidade média
observada (Ho) e heterozigosidade média esperada (He) das raças caprinas
brasileiras ............................................................................................................94
Tabela 2 – Matriz de distâncias genéticas de Da de Nei et al. (1983) entre as raças caprinas
brasileiras e os grupos controles analisados........................................................95
Capitulo III .........................................................................................................................102
Tabela 1 – Número de amostras (N), número de alelos (NA), heterozigosidade média esperada
(He), heterozigosidade média observada (Ho), índice de fixação (Fis) e desviação
do equilíbrio de Hardy-Weinberg (HW) para todas as populações analisadas.110
Tabela 2 – Matriz de distância genética de Da de Nei et al. (1983) para todas as populações
analisadas ..........................................................................................................112
viii
Resumo
A maioria dos caprinos brasileiros encontra-se em zonas semi-áridas com rebanhos
formados por animais considerados “Sem Padrão de Raça Definida (SPRD)” ou “crioulos”,
produto de cruzamentos indiscriminados entre raças exóticas e nacionais. A conservação
desses recursos genéticos locais representa uma grande contribuição para manutenção da
diversidade genética dos animais, que são extremamente adaptados às condições edafoclimáticas da região Nordeste do Brasil. O objetivo deste trabalho foi verificar a utilização de
um painel de 27 microssatélites para estudar a variabilidade e diversidade genética das raças
caprinas nativas brasileiras e analisar as relações genéticas entre as raças caprinas nativas
Brasileiras, Ibéricas e Canárias. Foram coletadas amostras de pêlos e/ou sangue das raças
brasileiras: Moxotó, Canindé, Serrana Azul, Marota, Repartida e Graúna; Espanholas:
Murciana-Granadina, Malagueña, Blanca Andaluza e Blanca Celtibérica; Canárias: Majorera,
Tenerifeña e Palmera; Portuguesa: Serpentina e Suíça: Saanen. Foram selecionados 27
microssatélites: BM6506, BM8125, BM1818, CSRD247, ETH225, HAUT27, ILSTS011,
INRA63, INRA5, SPS115, TGLA122, BM6526, CSRM60, CSSM66, ETH10, INRA6,
MM12, HSC, McM527, SRCRSP8, OarFCB48, BM1329 OarFCB11, OarFCB304, INRA23,
MAF209 e MAF65, amplificando-se mediante técnica de reação em cadeia de polimerase
(PCR). Os produtos amplificados foram submetidos a eletroforese em gel de poliacrilamida,
em seqüenciador automático ABI 377XL.
Os microssatélites analisados mostraram-se
polimórficos e os resultados obtidos demonstraram elevados níveis de variabilidade genética
em raças caprinas Brasileiras, Ibéricas e Canárias. O coeficiente de diferenciação genética Fst
para todos os loci indica que 13,3% da variabilidade genética total foi representada pela
diferença entre populações, e que 86,7% correspondem à diferença entre indivíduos. Por
intermédio da matriz de distância DA e o dendrograma UPGMA observou-se a formação de
dois grupos geneticamente distintos, o primeiro formado por Moxotó, Canindé, Repartida e
Marota, e o segundo por Serrana Azul e Graúna. As relações genéticas entre raças caprinas
Ibéricas, Canárias e Brasileiras foram ilustradas em três agrupamentos geneticamente
diferentes.
ix
Abstract
The majority of Brazilian goats are in semi-arid region. Considered as non defined breed
stand or crioulos, they are the result of uncontroled crossbreeding between exotic and national
breeds. The conservation of the local genetic resources represents an important contribution
for the genetic diversity of these animals, that are extremely adapted to the edaf-climatic
conditions of Brazilian Northest region. The aim of this study was to establish a panel of 27
microsatellites to study genetic diversity and variability of the Brazilian breeds and evaluate
the genetic relations between Brazilian, Iberian and Canary goat populations. Samples of hair
and/or blood from Brazilian (Moxotó, Canindé, Serrana Azul, Marota, Repartida and Graúna),
Spanish (Murciana-Granadina, Malagueña, Blanca Andaluza and Blanca Celtibérica), Canary
(Majorera, Tenerifeña and Palmera), Portuguese (Serpentina) and Suisse (Saanen) goat breeds
were collected. Twenty seven microsatellites (BM6506, BM8125, BM1818, CSRD247,
ETH225, HAUT27, ILSTS011, INRA63, INRA5, SPS115, TGLA122, BM6526, CSRM60,
CSSM66, ETH10, INRA6, MM12, HSC, McM527, SRCRSP8, OarFCB48, BM1329,
OarFCB11, OarFCB304, INRA23, MAF209 e MAF65) were selected and amplified through
polimerase chain reaction technic (PCR). The amplified fragments were separated using the
method of polyacrilamide gel electroforesis, in an automatic sequencer ABI 377XL. The
analyzed microsatellites were shown polymorphifics and the results obtained demonstrate
levels elevated of genetic variability in Brazilian goats. The populations of Brazilian, Iberian
and Canaries studied goats presented high values of intra-racial genetic variability. The
genetic coefficient of differentiation Fst for all loci and populations analyzed, indicates that
13,3% of the genetic total variability was represented by the difference between populations,
and that 86,7% correspond to differences between individuals. By using a matrix of distance
DA and the dendrogram UPGMA, was observed that the breed Brazilian goats formed
different groups, the first one formed by Moxotó, Canindé, Repartida and Marota, and the
second one by Serrana Azul and Graúna. The genetic relationships between Iberian, Canaries
and Brazilian breed goats were illustrated in three different genetic groups.
x
xi
Introdução
As primeiras cabras da América foram trazidas pelos colonizadores ibéricos no começo
do século XVI (Primo, 1999). Na colonização americana, geralmente, as rotas dos
colonizadores tinham parada obrigatória nas ilhas (Canárias, Madeira e Cabo Verde), antes de
seguir viagem à América, contudo havia um intercâmbio de animais antes mesmo da chegada
dos barcos ao novo mundo (Capote et al. 2002).
No Brasil, o rebanho nacional de caprinos é de aproximadamente 10 milhões de cabeças
FAOSTAT (2002), onde mais de 90% do rebanho encontram-se na região Nordeste,
sobretudo, em zonas semi-áridas, com a maioria dos rebanhos de caprinos formados por
animais considerados “Sem Padrão Racial Definido (SPRD)” ou “crioulos”, produto de
cruzamentos indiscriminados entre raças exóticas e nacionais.
Nos últimos anos, existe uma preocupação em conservar os recursos genéticos locais,
com esforços aplicados na manutenção da variabilidade genética dos animais por várias
organizações em diversos países do mundo (Egito et al. 2002). Atualmente, no Brasil existem
alguns trabalhos isolados entre as Instituições de Pesquisas, Universidades e produtores
privados para conservação das raças ameaçadas de extinção.
A caracterização genética é uma alternativa para quantificar a variabilidade e
diversidade genética dos animais, auxiliando os programas de conservação. O conhecimento
da variação genética é de grande importância para conservação dos recursos genéticos a fim
de evitar a erosão genética dentro das populações, assim como, conhecer relações genéticas
entre populações para evitar a extinção desses valiosos recursos genéticos.
Os microssatélites são marcadores moleculares que apresentam algumas vantagens
como: elevado grau de polimorfismo, herança mendeliana, codominantes e facilidade na
identificação. Desta forma, nos últimos anos, os microssatélites foram utilizados em diversos
estudos de caracterização genética dos animais domésticos.
Portanto, neste estudo pretende-se desenvolver um referencial teórico sobre a origem
das cabras domésticas, origem das raças caprinas nativas Ibéricas, Canárias e Brasileiras,
conservação de recursos genéticos, caracterização genética, marcadores moleculares e
tratamentos estatísticos. Em seguida, serão desenvolvidos três capítulos em formato de artigos
científicos, de acordo com as exigências da Revista Brasileira de Zootecnia. O capítulo I tratase da avaliação de um “Painel de 27 microssatélites para caracterização genética das raças
caprinas nativas brasileiras”. Em seguida, no capítulo II, verifica-se a “Variabilidade genética
das raças caprinas nativas brasileiras utilizando marcadores moleculares”. Enfim, no capitulo
1
III, analisou-se a “Distância genética entre raças caprinas nativas Brasileiras, Ibéricas e
Canárias usando microssatélites”. Finalmente, baseados nos resultados deste estudo, realizouse as conclusões gerais.
2
Referencial Teórico
1. Origem das cabras domésticas
As origens da Capra hircus ou cabra doméstica não são claras, mas evidências de
restos arqueológicos sugerem que, provavelmente, foi domesticada há 10.000 anos,
sendo o primeiro animal ruminante domesticado.
Segundo Nozawa (1991), existiu um período de continuidade genética entre cabras
selvagens e domésticas até se produzir o isolamento genético tal como o que
conhecemos hoje, no qual se inclina a intervenção conjunta do Markhol e o Ibex
abisínio na formação das cabras domésticas. Com base nesta teoria e, segundo as
acusadas diferenças fenotípicas, este autor estabelece três categorias que seriam úteis
para o seguimento e a classificação evolutiva das cabras históricas e pré-históricas do
mundo: 1) Cabra tipo Benzoar: identifica-se com a cabra selvagem e considera um tipo
não especializado com chifres em forma de cimitarra; 2) Cabra tipo Savana: com chifres
em espiral e adaptadas a ambientes quentes e, 3) Cabra de tipo Nubiano: com orelhas
grandes e caídas, estatura alta e perfil romano (convexo).
A origem e a história filogenética das cabras domésticas foram estudadas por
Luikart et al., (2001) sequenciando um segmento hipervariável do DNA mitocondrial
(mtDNA) de 407 animais, de 80 raças caprinas. Segundo esses autores, os 331 tipos de
mtDNA distribuem-se em três grupos altamente divergentes (Capra hircus 1, com 371
indivíduos; Capra hircus 2, com 25 indivíduos e Capra hircus 3, com 11 indivíduos).
Considerou-se a Capra aegagrus como a progenitora da Capra hircus pela maior
proximidade, assim como os tipos de DNA do cromossomo Y das Capra aegagrus
eram idênticos aos das cabras domésticas.
As sucessões da região de controle apresentavam uma estrutura geográfica
definida: Capra hircus 1, encontra-se em todos os países e todas as raças; Capra hircus
2, encontra-se pela Ásia (da Malásia a Mongólia e Paquistão) e, finalmente, a Capra
hircus 3, encontra-se na Eslovênia, Suíça e Mongólia. Os tipos de mtDNA bem
relacionados encontram-se em países bem distantes (Dinamarca e Portugal; Mongólia e
Ucrânia; Argélia e Turquia), estes resultados sugerem que as cabras eram transportadas
por motivos comercias a vários lugares do mundo.
3
2. Origem das cabras Ibéricas
Na Península Ibérica pode-se encontrar os três tipos de cabras descritos por
Nozawa (1991): raças com chifres em forma de arco ou cimitarra, em espiral e perfil
facial convexo.
Historicamente, havia um fluxo das correntes migratórias humanas entre a Europa
e África. No entanto, desde o Paleolítico Inferior a separação imposta pela formação do
Estreito de Gibraltar confere à península um isolamento faunístico que não é
comparável com outras zonas do continente europeu. Diante disso, caberia estabelecer
duas grandes épocas que influenciaram a formação das cabras espanholas, uma antes e
outra depois do Estreito de Gibraltar, tendo iniciado com a troca de material genético
entre Europa e África e, posteriormente, com a separação dos dois continentes,
favorecendo um isolamento das populações animais existentes na península, ainda que
existia uma outra via de abertura pelo norte para seguir recebendo outras influências.
Na formação das atuais raças caprinas espanholas, houve a influência de dois
importantes tipos de cabras: Savana com características fiéis à raça Blanca Celtibérica,
na qual está representado o fundo de perfil reto e chifres em espiral que aparece em
outras raças espanholas. Assim como, a presença do tipo Savana com perfil convexo
expresso na raça Branca Andaluza, com uma conjunção entre o tipo Savana e Nubiano.
E, o tipo Benzoar que é o fundo mais amplamente difundido entre as etnias espanholas.
Sua presença na península como derivada doméstica da Capra pyrinaica poderia datar
desde os finais do Mesolítico.
Segundo Gonzalo et al. (2002), atualmente, existem alguns tipos de cabras que
descrevem o caprino europeu como:
Tipo Alpino: de proporções médias, cabeça bem proporcionada, triangular, perfil
côncavos, cornos aegagrus, orelhas de direção oblíquas ou vertical, orbitais salientes e
grandes, tronco com linha dorso lombar ascendente para garupa, que é curta e caída,
ventre bem desenvolvido e úbere abolsado. Extremidades fortes e medianas. Pêlo curto,
pelagem com predomínio da cor negra e castanha com várias intensificações ou
presença de manchas.
Tipo Pirináico: de proporções alargadas, cabeça alargada, perfil subcôncavo ou
reto, cornos aegagrus, orelhas oblíquas ou horizontal. A linha dorso lombar é reta,
4
ligeiramente ascendente à garupa e o tronco fino e ventre recolhido. Extremidades fortes
e largas, pêlo fino e sedoso. Pelagem preta com gradações na parte inferior do corpo.
O tronco alpino localiza-se em zonas de maior altitude (Alpina Francesa, Peaclk e
Chamois Suíça) enquanto o pirináico apresenta maior capacidade de adaptação a zona
mais próximas ao nível do mar (Poitevine francesa, Thuringian Alemanha, Pirináica
espanhola).
Com relação à raça Murciana-Granadina, verifica-se que a Murciana apresenta
características semelhantes às pirináicas, enquanto que a Granadina assemelha-se às
alpinas. Da união do tronco Pirináico e tipo Savana-Nubiano primário à raça Blanca
Andaluza, e alguma semelhança com a Malagueña, pois conjugam os caracteres
Pirináicos e algo de convexidade de Nubiano que, neste caso, só alcança a
subconvexidade. Sobre as raças caprinas Canária, observa-se fundo Pirináico na
Tenerifeña do Norte; alpino na Palmera e forte influência do tronco Nubiano na
Majorera.
3. Raças nativas espanholas de fomento
As raças caprinas de maior expansão da Espanha são a Murciana-Granadina e a
Malagueña, possuem os maiores censos e aportam juntas a maior produção leiteira do
país. Apresentam associações de criadores consolidadas, em que o melhoramento
genético vem sendo desenvolvido através de livro genealógico e controle leiteiro
periódico. As cabras produzem leite de elevada qualidade em proteína e gordura, sendo
a grande maioria destinada à produção de queijos com diferentes denominações de
origem e preços diferenciados para venda interna ou vendidos a laticínios franceses. Os
rendimentos produtivos são claramente tributários à intensificação dos sistemas de
produção, com médias de produção passando dos 500 litros por lactação em rebanhos
especializados. Neste estudo de caracterização genética foram utilizadas cinco raças
espanholas de fomento descritas a seguir, de acordo com Gonzalo et al. (2002):
3.1. Murciana-Granadina
Com ascendência Alpina-Pirenaica, a Murciana-Granadina é a raça caprina que
apresenta o maior efetivo da Espanha (400.000 cabeças). Originária da região de
Andalucía Oriental e Levante, particularmente nas províncias de Murcia, Granada,
5
Almería e Alicante. Atualmente, é a raça caprina mais difundida pela Espanha,
chegando a exportar exemplares para vários países (México, Brasil, Venezuela,
Marrocos, Argélia, Portugal, Itália e França).
O padrão racial da Murciana-Granadina apresenta características como: tamanho
de pequeno a mediano (peso dos machos entre 50-60kg e fêmeas entre 40-50kg).
Pelagem uniforme preta ou caoba, com mucosas escuras, pele fina e elástica, pêlo curto
nas fêmeas e mais longo nos machos. Geralmente, não apresenta chifres, cabeça de
tamanho médio de forma triangular, perfil subcôncavo, fronte ampla, orelhas medianas
e retas, pescoço largo, fino e cônico nas fêmeas e mais curtos nos machos, com uma boa
base de implantação. Tronco amplo e profundo, costelas arqueadas, linha dorso lombar
reta, garupa ampla e inclinada. Ventre amplo, cauda curta e ereta. Úbere amplo,
volumoso, com uma boa base de implantação e tetas simétricas.
Raça de grande vocação leiteira, com produção média em cabras adultas de 513
litros de leite em 210 dias de lactação, com uma ordenha diária. O leite apresenta 5,3%
(gordura), 3,7% (proteína) e 14,2% (extrato seco), destinado à elaboração de queijos
frescos, semi-curados e curados, com denominação de origem.
Quanto às características reprodutivas da raça, é poliéstrica contínua, elevada
prolificidade, próximo a duas crias por parto, produzindo cabritos de 6-8kg aos 25-30
dias.
A raça Murciana-Granadina possui duas associações de criadores. Uma em
Murcia, denominada Associação Espanhola de Criadores da Cabra Murciano-Granadina
e outra em Granada, denominada Associação Nacional de Criadores de Cabras de Raça
Murciano-Granadina.
3.2. Malagueña
Raça de aptidão leiteira derivada dos cruzamentos entre os troncos Pirináicos,
Prisca e Ibex (Herrera, 2001). Encontra-se distribuída pela costa mediterrânea, nas
províncias de Almería, Granada, Málaga e Cadiz. Sua maior concentração está em
Axarquia, Vale do Guadalhorce, Antequera e Estepona (Málaga).
Trata-se de uma raça com perfil reto ou subcôncavo, biótipo leiteiro, com fêmeas
pesando entre 45-60kg e machos entre 60-75kg. Pelagem castanha com tonalidade de
distintas intensidades, pêlos largos, pele fina e sedosa. Cabeça de forma triangular e
bem proporcionada, com a fronte ligeiramente saliente, orelhas de pontas redondas,
6
largas e posição horizontal ou dirigida para cima e para frente. Pode apresentar chifres,
tanto em machos e fêmeas. Pescoço largo, reto e fino, de ampla inserção no tronco,
freqüentemente apresenta brincos. Tronco bem desenvolvido, linha dorso lombar reta,
elevando-se ligeiramente para garupa, que é larga e caída. Costelas arqueadas de grande
amplitude. Úbere bem desenvolvido, de forma abolsada e globulosa com ampla base de
inserção e forte ligamento suspensor.
É uma raça típica leiteira, de fácil ordenha. Poliéstrica permanente, com taxa de
prolificidade de 1,9-2,0 crias por partos e elevada precocidade sexual. A produção de
leite varia de acordo com o sistema de produção, com médias globais de 470 litros de
leite por lactação, com 5,1% (gordura), 3,7% (proteína) e 14,3% (extrato seco).
Também se destina à produção de cabritos de um mês de idade com 8-9kg e preço
elevado no mercado. Possui livro genealógico desde de 1984 e conta com 24.000
animais (10% do censo total) integrados na associação de criadores, com controle
leiteiro e estão inseridos no programa de melhoramento genético da raça.
No ano de 2003, a Associação Espanhola de Criadores da Cabra Malagueña
desenvolveu um esquema de seleção da raça com a participação efetiva de 42 dos 69
criadores, distribuídos em três comunidades autônomas, Andalucía (23.213),
Extremadura (695) e Castilla-León (1.295). No mesmo ano, foi realizado um total de
293 controles leiteiros com a participação de 42 criadores, em que coletaram 47.831
amostras de leite para análises em laboratório.
4. Raças Canárias
De acordo com Gonzalo et al. (2002), as raças Canárias são assim descritas:
4.1. Majorera
A raça caprina Majorera, com aproximadamente 200.000 cabeças, encontra-se em
todas as ilhas do Arquipélago, com sua maior parte distribuídas pelas ilhas orientais.
Com presença no território peninsular, concentrando-se núcleos mais relevantes nas
comunidades autônomas de Castilla-La Mancha e Andalucía.
Perfil reto-subcônvexo, longilínea, com chifres Aegagrus e pelagem composta e
pêlo curto. A produção leiteira média em 210 dias de lactação é de 551kg de leite com
3,4% (gordura), 3,9% (proteína), 4,5% (lactose) e 13,9% (extrato seco).
7
Leite de elevada qualidade, com conteúdo em proteína e caseína superior a de
outras populações caprinas, o que constitui um aspecto importante para a elaboração de
queijos frescos, semicurados e curados como o queijo Majorero de Fuerteventura, com
denominação de origem e produção anual superior a 300.000 kg.
Os sistemas de produção utilizados nas ilhas são o extensivo, semi-extensivo e
atualmente, existe uma tendência ao sistema de produção intensivo para esta raça.
4.2. Palmera
A raça Palmera encontra-se na Ilha Las Palmas, com aproximadamente 25.000
exemplares, especialmente nas comarcas montanhosas como Garafia e Punta Gorda.
Estes animais são criados extensivamente nos montes, onde se alimentam basicamente
de pastos.
Apresenta características raciais como: perfil sub-côncavo, longilínea, com chifres
em espiral, pelagem de tonalidade vermelha e pêlo largo. A produção leiteira é de 363
kg (210 dias de lactação), com 4,06% (gordura), 4,21% (proteína), 4,66% (lactose) e
13,75% (extrato seco). Está tramitando a Denominação de Origem Protegida (DOP)
para o queijo Palmero.
4.3. Tenerifeña
A raça Tenerifeña apresenta censo com aproximadamente 60.000 animais. Dentro
da raça Tenerifeña poderia diferenciar dois subtipos: A Tenerifeña Norte e a Tenerifeña
Sul, sendo o primeiro mais difundido. Geralmente, esses animais são criados em
sistemas semi-extensivos.
Apresentam perfil sub-cônvexo, longilínea, com chifres tipo Prisca e com dois
tipos de pelagem e pêlos, em zonas áridas (pelagem composta e pelo curto) e úmidas
(pelagem negra ou castanha e pelo largo). Produção leiteira de 347 kg de leite (210 dias
de lactação) com 3,91% (gordura), 3,79% (proteína), 4,46% (lactose) e 13,13% (extrato
seco).
A produção cárnica das raças caprinas Canárias apresenta importância especial,
tanto para produção de cabritos de leite (baifos) como para a produção de animais
adultos, bastante apreciados no mercado consumidor do arquipélago por ser a base da
gastronomia tradicional de origem Guanche.
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Os cabritos de leite são produzidos com amamentação natural à vontade, sendo os
machos sacrificados entre 25-30 dias de vida e as fêmeas, que não são utilizadas para
reposição, são sacrificadas em média duas semanas mais tarde. Por outro lado, os
animais adultos, independentes do sexo e da idade de sacrifício, denomina-se “carne de
cabra” e são utilizados para a elaboração de pratos típicos.
5. Raças nativas espanholas de proteção especial
Das raças caprinas que são consideradas de proteção especial na Espanha, duas
foram utilizadas neste estudo, que são descritas a seguir, segundo Gonzalo et al. (2002):
5.1. Blanca Celtibérica
A raça Blanca Celtibérica encontra-se situada nas províncias de Guadalajara,
Teruel, Castellón e Albacete. Nesta última província estima-se um censo de 3.200
animais.
Morfologicamente e segundo o Livro Genealógico da raça (DOCM nº 36 de 8 de
agosto de 1997), trata-se de animais com estatura mediana (machos com 75-85 kg e
fêmeas com 45-60 kg), proporções médias e pelagem branca. Apresenta perfil reto,
orelhas grandes, ligeiramente caídas e dirigidas para frente. Chifres bem desenvolvidos
em forma de espiral. Pescoço com brincos, grande e forte, com abundância de pêlos nos
machos. Tronco amplo e profundo, linha dorso lombar reta, garupa curta, ventre amplo,
cauda curta e erguida. Peito amplo e profundo. Extremidades fortes, altas e robustas
articulações com úbere pequeno e recolhido.
Raça fundamentalmente de corte, poliéstrica contínua e de baixa prolificidade (1,2
crias por parto), limitada por baixa disponibilidade de pastos de terrenos abruptos e de
clima extremado, onde são criados em regime extensivo. Sua produção está baseada na
produção de cabritos serranos de 10-12 kg de peso vivo e 40-60 dias de idade e em
menor proporção, de animais com 30 kg em 5 meses.
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5.2. Blanca Andaluza
Raça caprina que recebeu clara influência do Tronco Africano pelo perfil convexo,
de grande estatura e pêlos curtos. Está situada em Andalucía, nas províncias de Huelva,
Sevilla, Córdoba, Jaén e Granada, com presença ao sul de Ciudad Real e Albacete.
Trata-se de uma raça com estatura mediana (85 kg em machos e 60-65 kg em
fêmeas) e proporções longilíneas. A pelagem branca ou branca cremosa, pêlos curtos e
fortes, cabeça forte, cara curta com convexidade, orelhas grandes e caídas e presença de
brincos. Os chifres em espiral aberto (tipo Prisca) e pescoço curto e forte nos machos e
mais largos e delicados nas fêmeas. O tronco é amplo, linha dorso- lombar ligeiramente
caída para garupa e extremidades fortes e altas, úbere recolhido e pouco desenvolvido.
É uma raça serrana de aptidão de corte fundamentalmente, mantida em rebanhos
puros ou mestiços desta raça com a Negra Serrana, como ocorre com freqüência na
Serra de Cazorla (Jaén), onde convivem ambas as raças e os indivíduos berrendos
resultantes de sua mestiçagem.
Poliéstrica contínua, embora limitada pela baixa disponibilidade de pastos. O
sistema de produção desta raça está baseada no pastoreio dos rebanhos, sendo mais
freqüente a produção de cabritos, terminados após a desmama com rações à base de
alfafa e concentrados, com pesos entre 20 kg a 2,5-3,0 meses de idade.
6. Raças nativas portuguesa e suíça
Além das raças espanholas estudadas, verificou-se também a caracterização
genética de uma raça portuguesa e outra suíça que serão descritas, a seguir.
6.1. Serpentina
Antigamente, a cabra Serpentina era conhecida como Espanhola ou Castelhana,
devido aos primeiros animais serem trazidos para Portugal pelos vizinhos espanhóis;
posteriormente, pela presença fixada junto à fronteira passou a ser mais conhecida por
Raiana, e, finalmente, dada a multiplicação dos seus efetivos, predominantemente na
Serra de Serpa, passou
a se chamar Serpentina
Os caprinos da raça Serpentina
encontram-se quase na sua totalidade (57.203 cabeças) em zonas
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montanhosas e
marginais, com incidência particular nas Serras D'Ossa e de Portel. Atualmente, a
maioria dos rebanhos mantém-se em elevado grau de pureza.
Morfologicamente, são animais longilíneos, perfil subcôncavo e, normalmente, de
grande estatura (peso dos machos entre 60 a 75 kg e fêmeas entre 45 a 60 kg). A
pelagem branca ou creme, com uma lista preta da cernelha até a cauda, com ventre
preto, assim como a parte interna das orelhas, a face, o focinho e a extremidade dos
membros, a partir do joelho e do jarrete. A pele é grossa e elástica, com pêlo curto e
brilhante nas fêmeas, sendo mais espesso e comprido nos machos, sobretudo no dorso.
A cabeça é grande, fronte larga e ligeiramente convexa, chanfro retilíneo, orelhas
grandes e semipendentes, presença de barba nos machos, chifres largos e juntos na base,
dirigidos para cima e para trás, divergentes nas extremidades e sensivelmente
espiralados. O pescoço é médio, mais grosso nos machos, com presença de brincos,
freqüentemente, em ambos os sexos. O tronco é bem desenvolvido, sendo amplo e
profundo, sobretudo nos machos. A cernelha é ligeiramente destacada, com a linha
dorso-lombar quase horizontal e a garupa é curta e caída, cauda curta e ereta, com
inserção alta. O úbere é de tamanho médio, em forma de bolsa, com tetas bem
diferenciadas e de tamanho variado.
No início de 1991, com a homologação do respectivo regulamento, foi instituído
o Registro Zootécnico da raça Serpentina visando particularmente à conservação da
pureza desta raça, possibilitando o seu progresso zootécnico e favorecendo a difusão de
bom material genético pela venda de reprodutores de qualidade.
6.2. Saanen
Segundo Gonzalo e Sánchez (2002), a raça Saanen foi originária do vale do rio
Saanen (Suíça), atualmente é considerada uma raça cosmopolita. A Saanen é uma
excelente produtora de leite com produções médias de 786 kg de leite com 3,1%
(proteína) e 3,3% (gordura), em 275 dias de lactação.
Morfologicamente, é uma raça de biotipo leiteiro, estatura grande (60-90 kg nas
fêmeas e 90-120 kg nos machos), sub-longilínea pelagem branca. Cabeça triangular,
perfil côncavo e orbitais salientes. Orelhas erguidas e cônicas, possui chifres Aegagrus,
fortes nos machos. Pescoço largo e bem inserido, sendo mais robusto nos machos. O
tronco é amplo, profundo e musculoso. Peito arqueado, ventre bem proporcionado, linha
dorso-lombar ascendente para o terço posterior, garupa curta e caída. Extremidades
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finas, de longitude média, bem aprumada, pernas finas e arqueadas. Úbere abolsada e
profunda, com bases anteriores e posteriores de inserção bem desenvolvidas, volumosas
cisternas mamárias.
A raça Saanen apresenta uma boa prolificidade, bem adaptada ao sistema
produtivo intensivo e às zonas frias. A produção de cabritos de leite de excelente
qualidade (10 kg aos 30 dias) e reprodutores para venda constituem outras fontes de
renda aos produtores.
7. Origem das raças nativas brasileiras
A partir da segunda viagem de Cristóvão Colombo à América, houve um fluxo
intenso de animais da Península Ibérica que partia dos portos do sul da Espanha e dos
principais portos portugueses. Geralmente, nessas viagens havia uma parada na ilha da
Madeira e ilhas Canárias e daí, os espanhóis seguiam com destino às ilhas do Caribe, e
os portugueses partiam diretamente às colônias brasileiras. Estas populações foram as
precursoras que deram origem às principais raças ou grupos de animais domésticos do
Brasil (Rodero et al., 1992; Primo, 1992). Nestas viagens, as principais espécies de
animais domésticos introduzidos no Brasil foram os eqüinos e asininos, que eram
utilizados nas guerras pela capacidade de trabalho. Enquanto que os caprinos e galinhas
eram usados como fonte de alimentação da tripulação (Andrade, 1982).
Capistrano (1982) cita que três séculos após o descobrimento do Brasil havia
poucas cabras e ovelhas e só houve o aumento de seus efetivos quando se observou a
superioridade de sua pele e o aumento do consumo de sua carne, devido às grandes
secas observadas no século XVII.
No início do século XX ocorreu aumento significativo dos produtos caprinos,
principalmente a pele. A partir desse interesse houve algumas iniciativas para melhorar
a situação em que estava a criação de caprinos no Brasil, por parte dos criadores e
governo, através da introdução de caprinos de outros países (Pinheiro Junior, 1947).
Nesta época, o mesmo autor já se preocupava com os resultados das importações e
recomendava que, para o Nordeste, em vez de introduzir novas raças deveria ser feita a
seleção nos grupos étnicos existentes.
Segundo Domingues (1955), no início dos anos 50, eram encontrados mestiços
das raças exóticas e nativas; entretanto, a predominância remanescente era dos ecotipos
12
nativos encontrados no sertão nordestino e era possível se deparar com formas étnicas
distintas, capazes de servirem a um trabalho de seleção. Nesta época, foi feita a primeira
tentativa de conservar as raças nativas de animais domésticos nordestinos, e dentre os
caprinos estavam os da raça Moxotó e os tipos Marota e Repartida, que eram os mais
comuns no Nordeste (Domingues et al., 1954). Esta tentativa não teve êxito, e a diluição
do patrimônio genético dos caprinos nativos continuou.
Atualmente, encontram-se poucos caprinos nativos distribuídos em rebanhos
particulares e públicos, com destaque para as raças Moxotó e Canindé que são
encontradas em maior quantidade (Ribeiro e Pimenta Filho, 2003).
8. Raças nativas brasileiras
A maioria dos caprinos do Brasil são criadas em regime extensivo e mais de 90%
do rebanho nacional encontram-se na região Nordeste do Brasil. Ao longo dos anos,
essas raças foram desenvolvendo características de adaptação a ambientes como o semiárido nordestino. São animais que produzem peles de excelente qualidade, boa produção
de carne e leite, compatíveis com o sistema de produção adotado, podendo ser
considerados animais de múltipla função. Atualmente, as raças Moxotó e Canindé estão
homologadas no Ministério da Agricultura, e o grupo Serrana Azul encontra-se em vias
de homologação. Além dessas raças, existem mais três grupos raciais de cabras que são:
Repartida, Marota e Graúna, que serão descritos a seguir, de acordo com Santos (2003):
8.1. Moxotó
A raça Moxotó, originária do vale do Moxotó, em Pernambuco, encontra-se
distribuída em vários Estados (Pernambuco, Paraíba, Ceará, Piauí e Bahia). É
considerada uma raça de múltipla função (carne, pele e leite) e extremamente adaptada à
região semi-árida do Nordeste brasileiro.
Os animais apresentam estatura mediana, perfil levemente côncavo, orelhas
médias, dirigidas lateralmente e um pouco acima da horizontal, chifres leves, de
comprimento médio, saindo para trás para fora e para cima, em curvatura regular. Os
machos comumente possuem barbas e excepcionalmente são mochos. A pelagem é baia
ou mais clara, com uma lista preta que se estende do bordo superior do pescoço à base
da cauda. Apresenta auréola preta em torno dos olhos e duas listas que descem até à
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ponta do focinho, geralmente pretas. As orelhas, a face ventral do corpo e as
extremidades são pretas, assim como as mucosas, as unhas e o úbere, com pêlos curtos,
lisos e brilhantes. O tronco é amplo, linha dorso-lombar reto, garupa caída, membros
fortes e úbere pouco desenvolvido.
As fêmeas Moxotó são prolíficas, com a maioria dos partos duplos, poliéstricas
durante todo o ano. São excelentes produtoras de pele, boas produtoras de carne e
apresentam uma produção média de leite diária de 0,5 l / dia e duração de lactação de
120 dias.
Atualmente, alguns trabalhos vêm sendo desenvolvidos pelas Instituições de
Pesquisas, Universidades e produtores privados para conservação desses recursos
genéticos. Com relação à raça Moxotó, verificam-se várias ações de conservação in situ
por diversas instituições como: Embrapa – Caprinos, em Sobral - CE, Universidade
Federal Rural de Pernambuco, em Serra Talhada - PE, Universidade Federal da Paraíba,
em São João do Cariri - PB, Universidade Federal de Campina Grande, em Patos – PB,
além de vários rebanhos particulares de criadores da raça Moxotó nos Estados de
Pernambuco, Rio Grande do Norte e Paraíba.
8.2. Canindé
Originada na Zona do Canindé, no Estado do Piauí. Atualmente, os rebanhos da
raça Canindé encontram-se distribuídos pelo Ceará, Paraíba e Bahia. As cabras desta
raça possuem aptidão leiteira acima da média das cabras nacionais, são boas produtoras
de carne e pele.
Os animais desta raça apresentam estatura mediana, (peso nas fêmeas 35-45 kg e
nos machos 40-60 kg). A cabeça é de tamanho médio, perfil reto, olhos grandes e
claros, orelhas eretas, estreitas e curtas, em forma de concha, direcionadas para frente,
chifres largos e achatados na base, seguindo paralelamente para cima até cerca da
metade do percurso total, voltando-se levemente para fora. Apresentam barba bem
desenvolvida nos machos, pescoço longo, com ou sem brincos. A pelagem é preta, com
ventre claro e extremidades escuras podendo apresentar manchas amarelas ou brancas
em torno dos olhos, de onde descem duas listras dessa mesma coloração até a comissura
labial. A parte distal dos membros e linha dorso-lombar são de cor clara. Os pêlos são
macios, finos e brilhantes e relativamente curtos. Ancas bem ligadas ao corpo e bem
espaçadas entre si, espáduas cheias e robustas, com peito largo e tórax profundo. O
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corpo é longo, altura compatível com a profundidade corporal, membros fortes, costelas
arqueadas e ventre profundo, amplo e firmemente sustentado. O dorso é reto e forte,
garupa curta e inclinada, úbere bem implantado e volumoso, tetas simétricas, apontadas
para baixo e levemente para frente. A Empresa de Pesquisas Agropecuária da Paraíba
(Emepa) desenvolve um trabalho de conservação da raça Canindé, na Estação
Experimental de Pendência, em Soledade - PB, assim como, a Embrapa – Caprinos, em
Sobral - CE e alguns criadores na Bahia, Paraíba e Rio Grande do Norte.
8.3. Serrana Azul
A cabra Azul é bem apreciada pelos criadores, rústica, boa produtora de leite,
carne e pele. Animal do tipo pirenaico, com perfil semicôncavo ou retilíneo, crânio
triangular alongado, orelhas pequenas, em concha voltada para cima ou para frente.
Chifres distanciados um do outro saindo para cima e para dentro. No macho, os chifres
nascem menos distanciados, muito largos na base. Pescoço muito forte no macho e mais
delicado nas fêmeas, com ou sem brincos. Corpo retilíneo, garupa pouco inclinada.
Altura média nas fêmeas: 60-65 cm e machos: 65-75 cm. Peso médio fêmeas: 45-55 kg;
machos: 60-75 kg. Pêlos fortes e grossos nos machos, principalmente no dorso-lombo e
mais delicado nas fêmeas. Pele é escura, as mucosas nasal e perineal são cinza-escuras
ou tom cinza claro. Pelagem é azulada, ou cinza-azulada; mais escura no inverno. Os
machos são mais escuros. Membros fortes, unhas escuras. Úbere bem inserido, com
tetas voltadas para frente.
8.4. Repartida
Grupo de cabras de origem nordestina com um número reduzido de animais.
Atualmente, existe um rebanho de cabras Repartidas mantida por um convênio entre a
Empresa Baiana de Desenvolvimento Agrícola (EBDA) em Jaguarari-BA e a Embrapa
Caprinos. As cabras Repartidas são também conhecidas como “Surrão” cujo significado
deve-se à mistura de pêlos claros e escuros de aspecto sujo.
São animais com estatura mediana, com altura entre 65-70 cm nas fêmeas e 68-78
cm nos machos; peso entre 45-55 kg nas fêmeas e 55-70 kg nos machos. Pelagem
repartida em duas cores, característica que originou o nome. Geralmente a parte anterior
do corpo é negra e o restante claro, branco-sujo, baio, creme ou pardo. Admite-se a
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pelagem invertida. Cabeça de tamanho médio, perfil reto, chifres para cima e para trás,
orelhas medianas, pescoço fino e bem implantado no tronco, corpo alongado com
abdômen amplo e linha dorso lombar reta, garupa curta e inclinada, cauda reta e ereta e
úbere pouco desenvolvido.
As cabras Repartidas são rústicas, resistentes a enfermidades e prolíficas. A
principal finalidade é a produção de carne e pele.
8.5. Marota
Originária da região Nordeste, as cabras Marota são procuradas por
selecionadores pela rusticidade e a cor da pelagem (branca) para usar em cruzamentos
diversos. Apresentam reduzido número de animais e são poucos os trabalhos de
conservação desses animais. Segundo Carvalho (2000), a Embrapa Meio-Norte, desde
1980, mantém um núcleo de conservação de cabras Marota em Castelo do Piauí - PI.
Animais de estatura média (altura média nas fêmeas entre 60-70cm e nos machos
entre 65-80cm, com peso médio nas fêmeas entre 39-55kg e nos machos entre 55-75kg).
Cabeça mediana, perfil reto, chifres bem desenvolvidos, voltados levemente para trás e
para fora, pescoço fino, proporcionando ao animal um aspecto elegante, linha dorso
lombar reta, garupa inclinada, membros alongados, fortes e bem aprumados sobre
cascos claros. Pele e mucosas são claras, com pigmentação na cauda. Úbere bem
conformado, porém pouco desenvolvido. As cabras Marota são produtoras de pele de
excelente qualidade e carne.
8.6. Graúna
Animal de tamanho mediano, altura média – fêmeas: 60-70 cm; machos: 65-78
cm. Peso médio – fêmeas: 40-60 kg; machos: 60-70 kg. Cabeça mediana, triangular,
alongada, perfil semicôncavo. Orelhas curtas, lanceoladas, com concha para baixo.
Pescoço forte nos machos com pêlos ásperos na parte dorsal, mais delicado nas fêmeas,
com pêlos lisos, com ou sem brincos. Corpo forte, membros fortes e bem aprumados,
cascos negros. Pele negra, pelagem com pêlos negros por todo o corpo; finos e curtos
nas fêmeas; mais grossos e ásperos nos machos. Úbere bem formado, de bom porte,
com tetas para baixo e para frente.
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Assim como todas as raças caprinas nativas do Brasil, a cabra Graúna é rústica,
prolífica, boa produtora carne, pele e leite.
9. Conservação de recursos genéticos
O desconhecimento da espécie caprina no mundo representa um grande perigo
para a sua conservação, podendo contribuir para a extinção de raças antes mesmo de
serem caracterizadas (Vallejo e Delgado, 2004). A espécie caprina, comparada com
outras espécies mais conhecidas, é a que possui o maior número de raças catalogadas
pela FAO com situação desconhecida, evidenciando um verdadeiro descaso com este
recurso genético. A nível mundial, verifica-se que a caracterização racial dos caprinos
está mais desenvolvida na Europa e na América do Norte, pela maior quantidade de
estudos realizados nesta área (Scherf, 2000).
Atualmente, existem aproximadamente 4.500 raças distribuídas entre 40 ou mais
espécies de animais em todo o mundo. Cerca de 30% dessas raças estão ameaçadas de
extinção. Provavelmente, estes dados podem ser influenciados pelo direcionamento
dado ao melhoramento animal, cujo enfoque é dirigido a algumas características de
produção baseados fundamentalmente em raças desenvolvidas para ambientes
produtivos menos estressantes e mais exigentes em insumos. Como conseqüência, raças
com características importantes como adaptação a ambientes em condições específicas,
com pouca e irregular distribuição de chuvas, baixa quantidade e qualidade de
alimentos, vêm sendo substituídas por raças exóticas causando uma rápida erosão
genética dos recursos genéticos locais (Mariante et al., 1999).
A variabilidade genética é um parâmetro extremamente importante para
conservação dos recursos genéticos, sendo importante para a adaptação animal às
mudanças ambientais. O conhecimento da diversidade genética intra e inter-raciais
poderá contribuir para evitar a erosão genética, assim como a extinção de raças (Gama,
2004). Segundo a FAO, biodiversidade é a variabilidade genética dos diferentes tipos
de recursos genéticos animais a nível de raças, espécies e genes. Nos últimos anos,
existe uma grande preocupação em conservar os recursos genéticos locais, com esforços
aplicados na manutenção da diversidade genética dos animais por várias organizações
em diversos países do mundo (Egito et al. 2002).
17
9.1. Conservação de recursos genéticos no Brasil
Aliada a uma preocupação mundial de conservação de recursos genéticos locais,
em 1974, a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (EMBRAPA) criou o Centro
Nacional de Recursos Genéticos (Mariante et al., 1999). Em 1983, transformado para
Centro Nacional de Pesquisa de Recursos Genéticos e Biotecnologia (CENARGEN),
inicia o primeiro Programa de conservação de recursos genéticos animais do Brasil
oficial, em parceria com Centros da EMBRAPA, Universidades, Empresas de Pesquisas
Estaduais e criadores particulares. Cabe ressaltar que alguns produtores de maneira
isolada e empírica há mais de 200 anos decidiram conservar seus animais em estado de
pureza. Dessa forma, os produtores foram os pioneiros na conservação de recursos
genéticos animais do país, disponibilizando excelente material para ser trabalhado
posteriormente (Sereno e Sereno, 2000).
Em 1994, em função das demandas, o programa teve seus objetivos ampliados,
abrangendo a conservação e a utilização dos recursos genéticos. Os objetivos do
programa de conservação e uso de recursos genéticos animais do Brasil são:
- Manutenção e enriquecimento do Banco de Germoplasma Animal já existente no
Cenargen, através da coleta e criopreservação de sêmen, ovócitos e embriões de raças
de animais domésticos ameaçados de extinção;
- Apoio à implantação de novos núcleos de conservação animal de populações
ameaçadas de extinção, que venham a ser identificadas;
- Orientação dos acasalamentos dos núcleos de conservação, com finalidade de
minimizar a endogamia;
- Conscientização da sociedade sobre a importância da conservação dos recursos
genéticos animais, com a criação de um parque em Brasília, onde serão mostrados
animais de raças ameaçadas de extinção;
- Formação de um banco de amostras que fará parte do Banco Genômico Animal,
visando o armazenamento de DNA e componente sanguíneos, bem como tecidos e
células imortalizadas das diversas espécies em estudo.
Na Tabela 1 encontra-se uma relação das espécies e raças que estão em núcleos de
conservação no Brasil. Estes animais estão distribuídos pelas cinco regiões brasileiras,
criados em ambiente naturais (conservação in situ), mantendo-os dentro dos sistemas de
produção, assim como a conservação de sêmen, embriões, tecidos, células, amostras de
DNA e componentes sanguíneos (Conservação ex situ) em bancos de germoplasma.
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Segundo Mariante et al. (1999), o programa de conservação dos recursos genéticos
animais inclui as seguintes etapas: (1) Identificação das populações através de
levantamento do número efetivo dos rebanhos que se encontra em estado avançado de
diluição genética, mediante questionários junto aos produtores; (2) Caracterização
morfológica dos animais com características quantitativas (altura de cernelha, perímetro
torácico, peso, etc.) e qualitativas (cor da pelagem, perfil cefálico, etc.), além da
caracterização genética do germoplasma usando marcadores moleculares (RFLP, AFLP,
RAPD, microssatélites e etc.), mensurando as diferenças entre e dentro das populações e
por fim, (3) a avaliação do potencial produtivo dos rebanhos, com dados de produção
(carne, leite, pele, pêlos, etc.).
Tabela 1 – Espécies e raças em núcleos de conservação de recursos genéticos no Brasil
Espécie
Bovinos
Raças
Mocho Nacional
Pantaneiro
Curraleiro ou Pé-duro
Crioulo Lageano
Caracu
Baio
Carabao
Jumento Nordestino
Jumento Brasileiro
Pantaneiro
Lavradeiro
Campeiro
Marajoara
Puruca
Canindé
Gurguéia
Marota
Moxotó
Repartida
Morada Nova
Diversas raças
Bubalinos
Asininos
Eqüinos
Caprinos
Ovinos
Suínos
Fonte: Mariante et al. (1999)
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10. Caracterização genética
A caracterização das diferentes raças de animais domésticos do Brasil, até pouco
tempo, baseava-se apenas em dados fenotípicos (morfológicos e de produção), os quais
podem ser insuficientes para distinguir raças puras, além de serem influenciados pelo
meio ambiente (Egito et al. 1999).
A caracterização genética dos animais é mais uma alternativa para quantificar a
diversidade genética, assim como para auxiliar os programas de conservação. A
variabilidade genética total de uma espécie resulta do conjunto representado pela
contribuição da variabilidade inter-racial e intra-racial. O conhecimento desses dois
fatores é de grande importância para conservação dos recursos genéticos, visando a
manutenção da variabilidade genética e, desta forma, evitar a extinção dos animais
ameaçados.
10.1. Marcadores moleculares
Segundo Ferreira e Grattapaglia (1998), os marcadores moleculares são definidos
como todo e qualquer genótipo molecular oriundo de um gene expresso ou de um
segmento específico de DNA. A seqüência de nucleotídeos e a função de um marcador
molecular podem ou não ser conhecidas. Ao se verificar o seu comportamento de
acordo com as leis básicas de herança de Mendel, um marcador molecular é considerado
como um marcador genético.
O desenvolvimento tecnológico na área de marcadores moleculares tem avançado
bastante nos últimos anos, principalmente, com a tecnologia de DNA recombinante e a
descoberta da amplificação de segmentos de DNA via PCR (Reação em Cadeia de
Polimerase). Várias técnicas vêm sendo aprimoradas e as análises moleculares têm se
mostrado acessíveis e eficientes, aliados ao desenvolvimento de métodos estatísticos
que têm permitido a manipulação de grandes quantidades de dados. Os marcadores
genéticos são loci que apresentam características detectáveis que podem diferir entre
indivíduos, apresentando variação nas seqüências de DNA, podendo ser revelada
mediante diferentes técnicas.
Com o desenvolvimento das técnicas de eletroforese surgiram os polimorfismos
protéicos. Basicamente, a técnica consiste na separação de moléculas, por sua carga
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elétrica, tamanho e forma, através da migração em um meio de suporte e tampões
adequados sob a influência do campo elétrico.
O polimorfismo de proteínas foi bastante usado para identificar características
específicas de indivíduos ou populações, com o objetivo de detectar determinados alelos
restritos a uma população específica. No Brasil, alguns trabalhos foram desenvolvidos
mediante polimorfismo protéico em estudos de caracterização genética de bovinos
(Nelore, Gir, Curraleiro, Pantaneiro e Mocho Nacional), bubalinos (Murrah, Jafarabadi
e Mediterrâneo) e ovinos (Santa Inês e Poll Dorset) por Lara et al. (1999). Em caprinos,
Menrad et al. (2002) trabalharam com polimorfismo protéico em estudos de diversidade
genética. Barker et al., (2001) efetuaram um estudo comparativo entre marcadores
protéicos e microssatélites para analisar raças caprinas asiáticas e concluíram que os
microssatélites apresentam um maior grau de polimorfismo.
Os marcadores genéticos moleculares apresentam algumas vantagens sobre os
marcadores bioquímicos como: tecnologias modernas relativamente fáceis de realizar e
de interpretar, elevada heterozigosidade, necessidade de pequenas amostras de DNA
que podem ser extraídas de qualquer tecido, provenientes de animais de qualquer idade
e é possível conservar amostras de DNA por um longo período. Enquanto que os
marcadores bioquímicos só podem ser estudados com tecidos frescos. Além do mais, os
marcadores de DNA não são afetados por variações ambientais e permitem selecionar
regiões específicas dentro da molécula de DNA para determinados estudos, dentre
outras (Ferreira e Grattapaglia, 1998).
Contudo, com o advento das técnicas modernas de biologia molecular, surgiram
diversos métodos de detecção de polimorfismo genético diretamente em nível de DNA,
comprovando que os estudos com o genoma possuíam níveis de variação genética
superior se comparado com análises de proteínas. Conseqüentemente, o emprego de
marcadores genético-bioquímicos perdeu parte de sua relevância e a identificação e
utilização de marcadores moleculares de DNA transformou-se no principal objeto de
estudo.
Diversas técnicas vêm sendo desenvolvidas para detectar variabilidade genética
nas seqüências de DNA, mediante marcadores moleculares como RFLP (Restriction
Fragment Length Polymorphism), RAPD (Radom Amplified Polymorphic DNA), AFLP
(Amplified
Fragment
Length
Polymorphisms),
SNPs
(Single
Nucleotide
Polymorphisms), mtDNA (DNA mitocondrial) e os STR (Short Tandem Repeats) ou
microssatélites.
21
10.2. RFLPs
O Polimorfismo no comprimento de fragmentos obtidos por corte da fita dupla de
DNA (RFLP) foi a primeira técnica utilizada para detecção de polimorfismo de DNA
em estudos de caracterização do genoma. A técnica dos RFLP é baseada na digestão do
DNA total de um indivíduo com diferentes enzimas de restrição, produzindo fragmentos
de DNA que em seguida, são separados por eletroforese em gel de agarose e depois,
transferidos por capilaridade a uma membrana de nylon, que é hibridizada com uma
sonda (Southern, 1975). O produto da hibridação é visualizado por meio de uma autoradiografia, de acordo com o peso molecular de cada banda.
De acordo com Bolstein et al. (1980), os RFLPs são numerosos, codominantes e
herdados segundo as leis de Mendel. Este método apesar de ser bastante utilizado para
revelar polimorfismo de DNA e para caracterizar populações de microorganismos,
plantas e animais, sua utilização é considerada cara, lenta e laboriosa.
10.3. RAPD
Desenvolvida por William et al. (1990), a técnica de DNA Polimórfico
Amplificado ao Acaso (RAPD) é baseada na amplificação do DNA genômico com
apenas um iniciador simples (10 pb) de seqüência de nucleotídeos conhecida e ponto de
homologia arbitrária. O método de RAPD apresenta algumas vantagens como: detecção
de polimorfismo na ausência de informações sobre a seqüência de nucleotídeos
específicos, possui atributos como simplicidade e rapidez na execução.
O uso da técnica de RAPD-PCR permite uma amplificação exponencial de um
segmento de DNA pela enzima DNA polimerase. Em função da grande quantidade de
DNA produzido, este segmento pode ser visualizado diretamente na forma de uma
banda em um gel. A eletroforese é conduzida em gel de agarose e a visualização é feita
com brometo de etídeo em luz ultravioleta. Alternativamente, géis de poliacrilamida de
alta resolução podem ser utilizados por auto-radiografia ou coloração com nitrato de
prata.
As principais limitações dos marcadores RAPD são o baixo conteúdo de
informação genética por locus. Apenas um alelo é detectado e os genótipos
22
heterozigotos não podem ser diretamente discriminados dos homozigotos pela técnica
de RAPD, além da baixa repetibilidade desta técnica.
Contudo, os marcadores de RAPD vêm sendo usados para estudos de
caracterização genética em bovinos (Spritze et al. 2003), em ovinos (Paiva, 2004) e em
caprinos (Oliveira, 2003; Xianglong et al. 2000), com bons resultados.
10.4. AFLP
Descrita por Vos et al. (1995) a técnica de Polimorfismo de Comprimento de
Fragmentos Amplificados (AFLP) foi desenvolvida inicialmente para construção de
mapas genéticos, principalmente em espécies de plantas cultivadas que apresentam uma
baixa taxa de polimorfismo de DNA e, depois surgiu o interesse em estudos de
identificação para elaboração de mapas genéticos e estabelecimento de relações
genéticas em animais.
A análise de AFLP consiste basicamente em quatro etapas: 1) clivagem do DNA
genômico com duas enzimas de restrição; 2) ligação de adaptadores específicos aos
terminais dos fragmentos genômicos gerados pela clivagem; 3) PCR seletiva de
fragmentos com iniciadores específicos e bases arbitrárias nos terminais 3′; 4)
eletroforese de fragmentos amplificados em gel de alta resolução.
A maior vantagem desse método é o grande número de fragmentos de restrição
que são gerados e analisados em um único gel, tornando possível cogitar a construção
de um mapa genético com aproximadamente 200 a 300 marcadores com apenas 5 a 7
géis de eletroforese de alta resolução. Os polimorfismos detectados correspondem a
mutações pontuais, inserções ou deleções que afetam as enzimas de restrição.
Manifesta-se como ausência ou presença de bandas. Portanto, são marcadores
dominantes e menos informativos (não diferencia heterozigoto e homozigoto). Contudo,
alguns estudos de diversidade genética foram desenvolvidos com marcadores AFLP em
caprinos (Ajmone-Marsan et al. 2001; Crepaldi et al. 2001).
10.5. SNPs
Os SNPs são variações mais comuns no genoma humano, calcula-se que existem
cada 100-300pb. Trata-se de pequenas mutações pontuais, como inserção ou deleção,
que ocorrem no genoma. Encontram-se em posições definidas do genoma chamadas
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“Sequence Tagged Sites” (STS) e são utilizados para elaboração de mapas genéticos,
para medir a estrutura genética de populações ou para realizar estudos funcionais.
Também pode ser uma ferramenta eficiente para identificação genética em aplicações
legais e forenses, além de ser muito importante como marcadores genéticos, já que
muitas doenças conhecidas (anemia falciforme) em humanos são produzidas por
mutações simples.
Os SNPs apresentam algumas vantagens comparadas com outros marcadores
genéticos, pois estão distribuídos uniformemente pelo genoma e presentes também em
regiões codificantes, em regiões que flanqueiam os genes. As técnicas empregadas para
sua detecção são simples e produzem padrões de leitura não ambíguos, seguem uma
herança mendeliana, baixa taxa de mutação e alta heterozigosidade em populações.
10.6. DNA mitocondrial (mtDNA)
Trata-se de uma molécula circular que se encontra presente em uma das organelas
subcelulares denominadas mitocôndrias. Existem dois domínios na região “D-loop” do
mtDNA que são bastante polimórficos e produzem substituições de nucleotídeos em
várias posições que proporcionam uma grande variabilidade. A região “D-loop” não
tem nenhuma função conhecida.
O mtDNA apresenta algumas vantagens comparadas com outros marcadores, pela
sua facilidade de amplificação em situações críticas, em casos como: tecido de amostra
antiga, pouca quantidade ou degradadas (restos de esqueletos, dentes e pêlo). Por esta
razão, tem sido utilizado com frequencia em medicina forense (Junge et al. 2002;
Andreasson et al. 2002).
Outra característica importante do mtDNA é que se herda por via materna, não
está submetida à recombinação. Portanto, as diferenças de nucleotídeos entre genomas
mitocôndrias são reflexo direto da distância genética que os separa. As regiões de
mtDNA mutam 5 a 10 vezes mais que o DNA nuclear e é homogêneo em todos os
tecidos do mesmo indivíduo.
Vários estudos com mtDNA foram desenvolvidos em diversas espécies de animais
domésticos como: ovinos (Hiendleder et al. 1998) e em caprinos, Luikart et al. (2001),
verificaram a origem filogenética da espécie, utilizando a região controle de mtDNA de
406 animais, distribuídos em 88 raças caprinas da Ásia, África e Europa.
24
10.7. Microssatélites
O genoma dos mamíferos está formado por aproximadamente 3 x 109 pares de
bases (pb) repartidos pelo número de cromossomos especifico de cada espécie. Cerca de
50-60% do DNA dos mamíferos são constituídos por DNA não-repetitivo (Lodish et al.
1999). A fração de DNA repetitivo é composta de seqüências de DNA presentes em
mais de uma cópia no genoma, podendo ser dividido em DNA moderadamente repetido
e DNA altamente repetitivo, de acordo com a freqüência de repetição. Seqüências
repetidas em tandem são especializadas para permitir um alinhamento imperfeito
durante o pareamento dos cromossomos e, portanto, o tamanho dos blocos de repetições
tende a ser altamente polimórfico. Geralmente, as seqüências repetidas em tandem são
divididas didaticamente em duas categorias: minissatélites e os microssatélites.
Os minissatélites são marcadores polimórficos, descobertos por Jeffreys et al.
(1985) em seres humanos e, posteriormente, descritos em outras espécies. Os
minissatélites são repetições ao acaso em seqüências de 10 a 60 pares de bases (pb),
altamente polimórficos e com elevadas taxas de heterozigosidade nas populações. Nesta
técnica utiliza-se a tecnologia de DNA-DNA, considerada bastante trabalhosa, lenta e
requer uma grande quantidade de DNA (fragmentos grandes e elevado número de
repetições). Diante dessas dificuldades, os minissatélites têm sido pouco utilizado nos
últimos anos.
Descrito por Tautz (1989), os microssatélites são segmentos curtos de DNA de 1 a
6 pb, que se repetem em seqüência de forma aleatória por todo o genoma de todos os
organismos eucariotas, abundantes, altamente polimórficos, herança mendeliana e as
repetições específicas dos loci de microssatélites são facilmente detectados pelo uso da
técnica de amplificação (PCR). Sua hipervariabilidade, codominância e dispersão pelo
genoma são as principais razões para sua utilização em estudos genéticos.
Nos indivíduos eucariotas pode-se encontrar uma seqüência de microssatélites a
cada 10.000 pb, aproximadamente. Possivelmente, estão distribuídos uniformemente
nos cromossomos (Tautz, 1989), embora sejam pouco observados nas regiões
teloméricas e centroméricas, tanto no homem (Stalling et al., 1991) como em animais
domésticos (Winter et al. 1992). Os microssatélites são porções de DNA que contêm
repetições di-, tri-, e tetra-nucleotídicos, que são transcritas em RNA e sua função e
mecanismo de formação são desconhecidos. A maioria dos microssatélites encontrado
nas numerosas espécies são di-nucleotídeos (Wang et al. 1994; Schug et al. 1998). As
25
repetições (CA)n são as mais estudadas até agora, já que são as mais abundantes no
genoma dos mamíferos. Em todos os genomas eucarióticos analisados observou-se
pouca presença ou total ausência, de repetições tipo (CG)n e a média desta seqüência
representa somente 0,2% de todas as repetições (Tautz, 1986).
Os microssatélites, de acordo a sua estrutura, podem ser de três tipos: perfeitos,
que contêm unicamente um nucleotídeo repetido n vezes, imperfeitos, que contêm uma
seqüência não-repetitiva intercalada entre as repetições, e compostos, que estão
constituídos por dois ou mais segmentos repetitivos diferentes (Weber, 1990).
10.7.1. Seleção de microssatélites
Segundo a FAO, recomenda-se no mínimo 25 loci de microssatélites para estudos
de distância genética das espécies domésticas, de acordo com os seguintes critérios:
1)
Marcador de domínio público, previamente reportado em publicações
científicas;
2)
Não-ligados;
3)
Exibir herança Mendeliana;
4)
Cada microssatélite escolhido deve conter no mínimo quatro alelos;
5)
Microssatélite que possui homologia em várias espécies relacionadas são
preferíveis;
6)
Possível de ser usado em qualquer seqüenciador automático, em multiplex e
de fácil reprodutibilidade.
Os microssatélites são conservados entre as espécies semelhantes (Stallings et al.
1991). Segundo Moore et al. (1991), alguns iniciadores “primers” que têm sido
utilizados para amplificar uma determinada seqüência em uma espécie servem para
amplificação de uma seqüência homologa em uma espécie próxima. A amplificação de
microssatélites di-nucleotídeos em Chimpanzés, usando iniciadores humanos, indica
que os microssatélites estão bem conservados quanto à sua localização cromossômica e
esta conservação poderia sugerir uma conservação funcional.
Pepin et al. (1995) tipificaram um painel de 70 microssatélites bovinos na espécie
caprina e encontraram um total de 41 marcadores que podem ser susceptíveis de
amplificar em espécies próximas. Segundo Vaiman et al. (1996), estudando homologias
genéticas entre espécies de ruminantes, verificaram que 34% dos loci de microssatélites
26
de bovinos foram polimórficos em caprinos e ainda, no mesmo estudo, os
microssatélites de ovinos, 43% foram amplificados e polimórficos em caprinos.
10.7.2. Técnicas utilizadas para caracterização alélica dos microssatélites
10.7.2.1. Extração de ácidos nucléicos
Atualmente a extração de DNA ou RNA a partir dos distintos tecidos não
apresenta grandes dificuldades. O protocolo a seguir varia de acordo com o material
biológico disponível (sangue, sêmen, pêlo, tecido epitelial, fezes, etc.) assim como a
utilização posterior do ácido nucléico obtido.
A maioria dos protocolos de extração de DNA clássica tende a ser mais
trabalhoso, mas obtém-se um material de grande qualidade e alto peso molecular, útil à
análise da biologia molecular. A eleição do método a ser utilizado depende do material
disponível e das possibilidades de desenvolver a técnica escolhida. Geralmente, os
protocolos apresentam duas partes, na primeira pretende-se quebrar as células e
solubilizar o DNA, e a segunda seria eliminar, por métodos enzimáticos e/ou químicos,
as proteínas, o RNA e outras macromoléculas. Estas técnicas apresentam muitas
vantagens, entre elas a eficácia com a obtenção de grandes quantidades de DNA de alto
peso molecular a partir de pequenas amostras de tecido fresco ou congelado, assim
como a possibilidade de manter conservado durante muito tempo o material obtido.
Inicialmente, desenvolveram-se diversos métodos de extração de DNA
submetendo amostras de tecidos a uma digestão com proteinase K em presença de SDS
e EDTA, várias extrações com fenol e cloroformo e, finalmente, precipitação alcoólica
em presença de sais (David et al. 1986). A partir daí, foram surgindo novos protocolos
buscando reduzir o risco do manipulador, o tempo para obter o DNA purificado e,
principalmente, os custos. Assim, foram desenvolvidas várias técnicas (Ciulla et al.
1988; Grobet et al. 1991).
Para utilizar o DNA obtido exclusivamente para amplificar mediante a PCR, as
exigências de purificação diminuem enormemente, havendo estratégias realmente
simples para preparar as amostras. Kawasaki (1990) desenvolveu um método que
consiste em digerir uma amostra de poucos microlitros de sangue com proteinase K e
emprega diretamente o produto para digestão na PCR.
27
Classicamente, as amplificações mediante PCR são realizadas a partir de DNA
purificado. No entanto, em determinadas circunstâncias, a extração de DNA pode não
ser possível por não se dispor de uma fonte de qualidade suficiente, como ossos antigos,
pêlo, manchas de sangue, saliva, etc. Também, existe, por parte dos pesquisadores,
grande inquietude para simplificar a técnica e adequá-la para realizar amplificações a
partir de material biológico diretamente e reduzir o trabalho de isolar o DNA das
amostras, medida importante, sobretudo, em laboratórios que processam muitas
amostras por dia.
Geralmente, sangue e pêlo são as fontes de material genético a estudar. Vários
métodos foram desenvolvidos para amplificar as amostras de sangue diretamente sem
uma prévia extração de DNA, como submeter o material de origem a ciclos de
aquecimento a 940C e esfriamento a 500C previamente à execução da PCR propriamente
dita (Mercier et al., 1990). Também foram descritas técnicas para amplificar seqüências
a partir de amostras de sangue e pêlo, utilizando resinas quelantes como Chelex 100®
(Bio-Rad) para eliminar íons e metais (Walsh et al., 1991).
10.7.2.2. A técnica de reação em cadeia de polimerase (PCR)
A partir da década de 80, a descrição da técnica revolucionária concebida por
Kary Mullis, denominada reação em cadeia de polimerase – PCR (Polymerase Chain
Reaction), facilitou o entendimento dos processos biológicos, assim como a aplicação
em diagnósticos e em melhoramento genético de plantas e animais domésticos. A
técnica de PCR tem sido utilizada com os mais diferentes propósitos: identificação de
indivíduos a partir de restos mortais, análise de DNA pré-histórico, diagnóstico de
doenças, auxílio em investigações policiais, caracterização genética de populações e
determinação de paternidade, além de outras aplicações.
A PCR é uma técnica rápida e versátil que envolve a síntese enzimática in vitro de
milhões de cópias de um segmento específico de DNA na presença da enzima DNA
polimerase. A reação de PCR se baseia no anelamento e extensão enzimática de um par
de oligonucleotídeos (17-25 pares de bases) utilizados como iniciadores (primers) que
delimitam a seqüência de DNA da fita simples, alvo da amplificação. Estes iniciadores
são sintetizados artificialmente de maneira que suas seqüências de nucleotídeos sejam
complementares a seqüências específicas que flanqueiam a região alvo.
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A reação envolve ciclos seqüenciais completos compreendendo três etapas
básicas: a) Desnaturação – compreende a dissociação das ligações que mantêm unida a
dupla fita de DNA. Obtido tipicamente pela elevação para temperaturas entre 93-95°C;
b) Reanelamento – Ligação das seqüências iniciadoras com a seqüência alvo. Nesse
passo,
normalmente,
a
temperatura
é
reduzida
para
50-65°C,
dependendo
essencialmente do tamanho e seqüência dos iniciadores utilizados, permitindo a
hibridização DNA-DNA de cada iniciador com as seqüências complementares que
flanqueiam a região alvo; c) Síntese de DNA – A partir dos iniciadores já ligados à
seqüência alvo inicia a síntese de uma nova seqüência complementar. As temperaturas
que conferem maior eficiência nessa etapa estão entre 70-75°C. Geralmente, 30 a 35
ciclos são suficientes para produzir de 100 ng a 1µg de DNA a partir de uma cópia
simples de DNA molde.
10.7.2.3. Amplificação das seqüências de microssatélites
As concentrações de DNA molde e polimerase podem afetar a eficiência de
amplificação. Quantidade elevada de DNA pode inibir a reação por si mesmo ou até por
possíveis substâncias que podem ser arrastadas ao final da purificação. Por outro lado,
quantidade reduzida de uma só cópia pode ser amplificada. A concentração da
polimerase varia de 0,50 e 2 U para uma reação de 50 μl. Uma concentração baixa
limitará a quantidade de produtos obtidos e uma alta produzirá amplificações
inespecíficas (Saiki et al., 1989).
As concentrações de íons de magnésio afetam a reação de tal forma que em
quantidade baixas reduzem drasticamente o rendimento desta e quantidades altas
diminuem a especificidade da amplificação. A concentração ótima de MgCl2 varia entre
0,5 e 10 mM. Os desoxinucleósideos (dNTPs) captam íons de magnésio. Portanto,
qualquer ajuste em sua concentração na reação requer uma compensação na
concentração de MgCl2. Para os dNTPs, usam-se normalmente concentrações variando
entre 50-200 μM de cada um deles. Concentrações mais elevadas facilitam que a
polimerase possa cometer erros (Innis et al., 1988).
29
10.7.2.4. PCR Múltiples
As análises de seqüências de DNA específicas tornaram-se mais rápidas e eficazes
com o advento da PCR. A maioria dos protocolos de PCR estão desenhados para
amplificar uma seqüência molde com um par de iniciadores. No entanto, muitos estudos
experimentais requerem análises de várias seqüências de DNA e é necessário realizar
sucessivas reações da mesma amostra. Assim, o desenho de PCR múltiples realiza a
amplificação de várias seqüências simultaneamente em uma só reação. Desta forma,
reduz o tempo, trabalho e custos (Chamberlain et al., 1988; Chamberlain et al., 1989).
Um fator importante na obtenção de produtos de PCR é a correta eleição dos
iniciadores que devem estar enfocados na especificidade e eficiência da amplificação.
Para isso, deve-se utilizar iniciadores com mínima longitude, evitando que os
oligonucleotídeos sejam complementares uns com outros (Rychlik et al., 1990). Com a
PCR múltiples, aumenta a probabilidade de obter produtos de amplificação
inespecíficos. Este problema pode ser evitado substituindo qualquer iniciador que gere
produtos indesejáveis.
A otimização de uma PCR múltiples requer provar distintas condições de reação.
Os iniciadores devem ter temperaturas de acoplamento similares e devem amplificar
fragmentos por suas diferenças de tamanho. Além disso, deve-se procurar ajustar as
concentrações dos iniciadores, o tampão, a enzima, assim como, o tempo das distintas
etapas da PCR, até conseguir uma amplificação equilibrada das distintas amplificações e
ausência de produtos inespecíficos.
10.7.2.5. Métodos de eletroforese em gel
A eletroforese em gel é a técnica mais utilizada para detecção de variantes de
microssatélites. Para localizar as bandas de migração do DNA nos géis, classicamente
revelam-se os mesmos em soluções de brometo de etídio ou por meio da impressão de
placas radiográficas pela emissão de isótopos radiativos (Weber, 1990; Moore et al.,
1991; Arranz, 1994). Pode-se usar tinção de prata como método alternativo pela sua
simplicidade e segurança (Heukeshoven e Dernick, 1985). A partir daí, realizam-se
algumas técnicas com marcadores fluorocromos em distintos tipos de trabalhos com
estudos de paternidade (Bates et al. 1996) e em genética de populações (MoazamiGoudarzi et al., 1997).
30
10.7.2.6. Utilização de fluorocromos e sequenciamento automático
A detecção das bandas pode ser feita também com iniciadores marcados com
substâncias fluorescentes, emissores de raio laser e fotodetectores de fluorescência, o
que apresenta grande vantagem em relação aos outros métodos, pois as amostras são
detectadas em tempo real por intermédio de sofisticados programas de densiométria.
Cada banda determina o tamanho de forma praticamente automática, porém a
introdução desta técnica necessita de um seqüenciador automático.
Os seqüenciadores automáticos são sistemas capazes de determinar as seqüências,
tamanhos de fragmentos quantificando a fluorescência emitida por oligonucleotídeos ou
dNTPs marcados com fluorocromo. Os marcadores emitem uma fluorescência quando
se excitam com um laser. Cada um deles tem seu máximo de emissão de fluorescência
num determinado intervalo de comprimento de onda. Pode-se marcar o microssatélite
com fluorocromo tanto no extremo 5` de um dos iniciadores como nos dNTPs. No caso,
usando-se um iniciador marcado, apenas um de seus extremos marca com o
fluorocromo e os produtos se formam com uma fita marcada e outra não, detectando-se
pelo seqüenciador só a que possui o fluorocromo.
Para calcular o tamanho dos fragmentos de DNA desconhecido utiliza-se um
padrão formado por fragmentos marcados com diversas longitudes conhecidas. As
informações são transferidas a um computador para serem processadas e se apresentam
em forma de eletroferograma, em que cada pico representa um fragmento. Os picos que
aparecem apresentam cores diferentes, dependendo do fluorocromo utilizado e
possibilita conhecer o tamanho dos pares de bases de cada pico, sua altura e sua área,
que serão reflexos da quantidade de cópias amplificadas.
Esta técnica apresenta algumas vantagens como: possibilidade de trabalhar em
múltiples, maior automatização dos resultados pelo uso de software específico para
interpretar os eletroferogramas, maior sensibilidade nos resultados com menores
quantidades de produtos amplificados.
31
10.7.3. Aplicações dos microssatélites
10.7.3.1. Estudos de variabilidade genética
Os microssatélites têm sido amplamente utilizados em estudos genéticos, já que
permite estimar os níveis de variabilidade genética dentro das populações e analisar as
relações genéticas existentes entre elas. Este tipo de estudo é de grande importância para
estimar a diversidade genética existente em populações de animais domésticos
ameaçados de extinção.
A maioria dos microssatélites são neutros com respeito à seleção e isto os torna
úteis para realizar estudos de variação genética. Estes marcadores permitem a
identificação de cada alelo por locus, a obtenção de dados populacionais e o cálculo de
freqüências alélicas. Assim, podemos estimar as distâncias genéticas entre populações
ou entre indivíduos (Bowcock et al., 1994).
De acordo com Kumar (2000), os marcadores de microssatélites estão bem
descritos na literatura em algumas espécies, podendo ser usados para caracterização de
rebanhos, além de estabelecer as relações filogenéticas entre as diversas raças. Nos
últimos anos, diversos estudos foram desenvolvidos para analisar a diversidade genética
na espécie caprina utilizando microssatélites (Yang et al., 1999; Saitbekova et al., 1999;
Barker et al., 2001; Li et al., 2002; Ouafi et al., 2002). Assim como, em bovinos
(Moazami-Goudarzi et al., 1997; Martín-Burriel et al., 1999), ovinos (Buchanan et al.,
1994; Arranz et al., 1998; Diez-Tascón et al., 2000), em suínos Martinez (2000) e em
eqüinos (Sereno, 2002).
10.7.3.2. Mapas genéticos
Os primeiros mapas de ligamentos desenvolvidos foram para a espécie humana,
facilitados pela identificação de milhares de polimorfismos de DNA altamente
informativos, o que contribuiu para o avanço da genética molecular. O desenvolvimento
de vários programas estatísticos permitiram estabelecer a ordem e as distâncias entre os
genes. Os microssatélites foram utilizados de forma massiva para construção de mapas
de ligamento de várias espécies de mamíferos.
32
Atualmente
existem
no
banco
de
dados
da
espécie
caprina
(http://locus.jouy.inra.fr) 727 loci descritos, sendo 303 genes e 424 referentes a loci de
microssatélites. No Goatmap foram identificados 123 loci homólogos a ovinos e 275
homologias com bovinos.
O mapeamento genético é uma ferramenta muito importante para se determinar a
localização de genes de interesse. Do ponto de vista da produção animal, os genes mais
interessantes são os responsáveis por caracteres produtivo (QTLs), assim como, os da
sanidade animal que são genes que determinam certas patologias.
10.7.3.3. Controle de paternidade
Os marcadores protéicos e os grupos sanguíneos constituíam o padrão de teste de
paternidade para diversas espécies (humanos, bovinos e eqüinos). A partir da década de
1980, os marcadores bioquímicos foram sendo substituídos pelos marcadores de DNA
para teste de paternidade. De acordo com Bowling (2001), os testes de paternidade
necessitam de algumas características essenciais como: acurácia, efetividade, baixo
custo, rapidez de resposta, padronização de referência e fácil transferência de
informações entre laboratórios.
O alto grau de polimorfismo observado nos microssatélites está possibilitando sua
utilização com grande eficiência nos testes de paternidade em distintas espécies de
animais domésticos como: caprinos (Luikart et al., 1999; Araújo, 2004); bovinos
(Heyen et al. 1997; Usha et al. 1995); asininos (Arranguren-Méndez, 2001) e equinos
(Binns et al., 1995).
11. Análises Estatísticas
Nos últimos anos, as análises de polimorfismo de microssatélites têm sido
utilizadas em diversos estudos de variabilidade genética para verificar a variação
genética intra e interpopulacional, além de determinar a distância ou similaridade
genética entre populações.
Para análises com marcadores moleculares, o número de amostras e o número de
marcadores estudados são de extrema importância para acurácia dos resultados.
Segundo Barker (1994), a precisão da estimativa de diversidade genética depende do
33
número de loci analisados, a heterozigosidade dos loci e o número de amostras de cada
população.
Os parâmetros estatísticos mais usados em estudos genéticos de populações são:
freqüências alélicas, heterozigosidade observada (Ho) e esperada (He), conteúdo de
informação polimórfica (PIC), desvios do equilíbrio de Hardy-Weinberg (EHW),
estatísticas de F (Fst, Fit e Fis), coeficiente de diferenciação genética (Gst) e distâncias
genéticas.
11.1. Cálculo de freqüências alélicas
O cálculo das freqüências alélicas é feito com base na contagem direta dos alelos
encontrados. As observações com apenas um alelo são considerados homozigotos.
Assumindo que existe um estado ideal de equilíbrio Hardy-Weinberg (HWE), a
variância de uma freqüência alélica pode ser descrita pela expressão binominal:
σ x2 =
x(1− x )
2n
x: freqüência alélica e n: número de indivíduos das amostras
Segundo Nei (1987), o erro padrão da freqüência alélica obtém-se por meio da raiz
quadrada da variância. Para uma determinada freqüência alélica, o erro padrão diminui à
medida que aumenta o número das amostras. Considera-se uma amostra ideal aquela
constituída de 30 a 60 indivíduos. De acordo com a FAO (1998), o tamanho mínimo da
amostra deve ser de 25 animais para estudos de variabilidade e diversidade genética
intra e interpopulacional.
11.2. Heterozigosidade
A heterozigosidade pode ser considerada uma medida de variabilidade genética.
Considera-se um locus polimórfico quando o alelo mais comum tem uma freqüência
inferior a 0,95. A heterozigosidade de um marcador é a probabilidade de um indivíduo
ser heterozigoto no locus marcador, este parâmetro depende do número de alelos e da
freqüência deste na população. Segundo Ott (1992), um marcador é considerado
altamente informativo com heterozigosidade maior que 70%.
34
A heterozigosidade observada é a proporção de indivíduos heterozigotos
observada nas amostras da população. Calcula-se diretamente a partir dos genótipos
encontrados na população para todos os loci mediante a aplicação do programa
informático Genetix v. 4.0.4 (Belkhir et al., 1999).
Segundo Hedrick (1983), o erro padrão é a raiz quadrada da variância expressa
pela seguinte fórmula:
σ H2 =
H (1− H )
nr
n: número de indivíduos (tamanho das amostras) e r: número de loci estudados
O cálculo da heterozigosidade média observada depende do número de amostras e
loci estudados.
A heterozigosidade média esperada ou diversidade genética de um locus calculase (Nei, 1973) por:
k
He = 1 − ∑ xi 2
i=1
xi: freqüência do alelo i e k: número de alelos
Este parâmetro é equivalente à heterozigosidade observada, considerando-se
apenas que as populações estão em completo equilíbrio.
11.3. Conteúdo de informação polimórfica (PIC)
Descrito por Botstein et al. (1980), o conteúdo de informação polimórfica é um
indicador da qualidade do marcador em estudos genéticos (segregação, identificação de
populações e controle de paternidade). No entanto, é um parâmetro que apresenta uma
dependência do número de alelos e suas freqüências. Desta forma, a informação que
aporta não deve ser utilizada exclusivamente para eleger um marcador ou descartá-lo
(Moazami-Goudarzi et al., 1994).
Calcula-se de acordo com a seguinte fórmula:
⎛ k 2 ⎞ k −1 k
2 2
PIC = 1− ⎜⎜ ∑ xi ⎟⎟ − ∑ ∑ 2x i x j
⎝ i=1 ⎠ i =1 j= i +1
35
Segundo a classificação de Botstein et al. (1980), marcadores com valores de PIC
superiores a 0,5 são considerados muito informativos, valores entre 0,25 e 0,50
mediamente informativos e valores inferiores a 0,25 pouco informativos.
10.4. Equilíbrio de Hardy-Weinberg (EHW)
A lei de Hardy-Weinberg foi verificada por Hardy e Weinberg independentemente
em 1908. Segundo esses autores, em uma população grande, com acasalamento
aleatório, sem seleção, mutação ou migração, as freqüências alélicas e genotípicas
permanecem constantes de geração à geração, considerando-se uma população em
completo equilíbrio.
A constituição genética de uma população é descrita pela especificação dos alelos
e a proporção dos diferentes alelos em cada locus. Os desvios do EHW podem ter sua
origem em diversos fatores como: acasalamentos direcionados; subdivisões dentro das
populações; coancestrais e antepassados comuns; seleção natural; migração ou fluxo de
genes a partir de uma população externa; técnica de amostragem incorreta, além da
presença de alelos nulos não detectáveis experimentalmente.
Qualquer desvio significativo do EHW indicará que a população está subdividida,
que existe uma consangüinidade significativa ou que existe fluxo de genes de outra
população. Estas circunstâncias podem ser verificadas usando o teste de qui-quadrado,
teste exato de Fisher ou procedimentos de proporção de verossimilhança.
Os testes mais comuns para o EHW são os testes de qui-quadrado para as
proporções esperadas e observadas de heterozigotos. Geralmente, são recomendadas
para análises preliminares, pois estes testes produzem resultados imprecisos quando
existe um ou mais genótipos raros (Weir,1996).
O teste exato de Fisher para análise do EHW para cada locus/população foi
descrito por Guo e Thompson (1992) usando o algoritmo em cadeia de Monte Carlo
(poucos dados) ou cadeia Markov (muitos dados) para obter amostras aleatórias a partir
dos dados originais (permutação), utilizando o programa informático GENEPOP versão
3.1c (Raymond e Rousset, 1996).
36
10.5. Índices de fixação ou Estatísticas de F
Nas décadas de 40 e 50, Sewall Wright descreveu a teoria dos índices de fixação
ou estatísticas de F, posteriormente desenvolvida por outros autores (Chakraborty e
Danker-Hopfe, 1991; Weir e Cockerham,1984; Weir,1996). Essa teoria propõe medir os
desvios de freqüências genotípicas em populações subdividas usando três parâmetros:
Fis (subdivisão intrapopulacional), Fit (endogamia total) e Fst (subdivisão geográfica).
Segundo Weir e Cockerham (1984), as estatísticas de F representam uma maneira de
sumarizar a estrutura de uma população.
Estes parâmetros são obtidos de acordo com as seguintes fórmulas:
FST = 1 −
(1− FIT )
(1 − FIS )
O cálculo das estatísticas de F tem sido utilizado em vários estudos de comparação
de populações. Para um conjunto de t populações com freqüências alélicas para cada
alelo xi (i= 1,2,3,...k), a estatística FST define-se como:
∑ (x
i
FST =
− x)
2
i
(t − 1) = σ 2
x (1 − x )
x (1− x )
onde x = ∑ix i t é a freqüência média na amostra de todos os alelos e todas as
amostras, e σ2 é a variância da amostra.
De acordo com Nei (1977), as três estatísticas de F podem ser calculadas usando a
heterozigosidade observada e esperada.
FIS = 1 −
H
HeS ,
FIT = 1 −
HeS
H
FST = 1 −
H eT y
H eT
Onde H é a freqüência observada de heterozigotos, HeS e H eT são a
heterozigosidade esperada em equilíbrio Hardy-Weinberg ou a medida de diversidade
genética nas subpopulações e população total, respectivamente.
37
A medida FST padrão não pode ser considerada como uma medida de distância
genética, sendo que o FST se aplica a várias populações e a distância genética se
aplicaria para um par de populações. Segundo Nei (1987), o FST pode ser usado como
medida de distância genética considerando-se duas populações.
O FST para distância genética define-se como FSTi:
2
xi − yi )
(
FSTi =
2zi (1 − zi )
xi, yi: frequências de um alelo de um locus em duas populações
zi: média de xi e yi
FSTi pode ser calculado para cada alelo, com a média para cada locus e depois para
todos os loci.
O erro padrão do FSTi é:
⎛ 2 ⎞⎛
1⎞
⎟ ⎜ FSTi + ⎟
⎝ rk ⎠ ⎝
n⎠
σF = ⎜
STi
r: número de loci estudados
k: média do número de alelos em cada locus
n: número de indivíduos estudados
Verifica-se que o erro padrão é mais influenciado pelo número de loci utilizado do
que pelo tamanho da amostra. Então, em amostra com no mínimo 20 indivíduos, o
efeito sobre o erro padrão é irrelevante.
10.6. Coeficiente de diferenciação genética (GST)
De acordo com Nei (1973), para analisar a subdivisão de populações não é
necessário conhecer as freqüências genotípicas, pois este autor propõe trabalhar
diretamente com freqüências alélicas utilizando as heterozigosidades esperadas
(diversidade genética) intra e interpopulacional. Este método não é influenciado pelo
número de alelos por locus nem pelo modelo de evolução (mutação, seleção e
migração). Assim, a magnitude relativa da diferenciação genética entre subpopulações
pode ser medida pelo coeficiente de diferenciação genética:
38
GST =
H eS
HeT
H eS : diversidade genética média entre subpopulações.
HeT : diversidade genética média na população total.
11. Distâncias Genéticas
Segundo Nei (1987), a distância genética é reflexo das diferenças entre os genes
(diferenças genômicas), populações e espécies. Em genética de populações uma
população pode ser definida mediante as freqüências alélicas das variantes que
segregam nesta população. As distâncias genéticas apresentam propriedades
matemáticas, assim como um significado biológico.
Uma função deve ter algumas propriedades para ser considerada distância: a) a
distância entre uma população X e ela mesma deve ser zero: d(X,X)=0; b) a distância
entre duas populações X e Y deve ser simétrica: d(X,Y)=d(Y,X). Se a distância está de
acordo com essas duas propriedades anteriores, denomina-se distância semimétrica. E
além disso, apresenta uma desigualdade triangular que (d(X,Y)≤[d(X,Z)+d(Y,Z)] ),
denomina-se distância métrica (Katz, 1986).
As distâncias métricas são mais utilizadas que as semimétricas em estudos de
populações. Em estudos evolutivos e para a construção de árvores filogenéticas não é
necessário apresentar desigualdade triangular.
A distância natural entre dois vetores X e Y no espaço k-dimensional é a distância
euclidiana:
k
∑ (x
d(X,Y ) =
i
− yi )
2
i=1
onde xi e yi correspondem às freqüências do alelo i nas populações X e Y
respectivamente.
Esta distância satisfaz às três propriedades anteriores. Assim como a distância
genética de Rogers (1972), que se deriva da distância euclidiana.
DRogers =
2
1 k
(xi − yi )
∑
2 i=1
39
k
2
A raiz quadrada da distância euclidiana: d (X,Y ) = ∑ (xi − yi )
2
satisfaz às duas
i=1
primeiras propriedades, mas não à desigualdade triangular, assim como, as distâncias
derivadas desta expressão (distância mínima de Nei, distância de Reynolds, etc.), que
são consideradas semi-métricas.
Outro fator que se deve levar em consideração é a interpretação biológica das
distâncias genéticas, pois depende do modelo de divergência utilizado.
Na teoria da genética de populações existem quatro forças evolutivas que podem
modificar a estrutura genética das populações: deriva genética, mutação, seleção e
migração. A diversidade genética observada é determinada principalmente pela deriva
genética e mutação, uma vez que a migração é ignorada após a separação das
populações e assume-se que os loci em estudo são seletivamente neutros, da mesma
forma que a seleção não afeta as mudanças nas freqüências alélicas destes marcadores.
Em estudos envolvendo um período relativamente curto de tempo (divergência de
raças), o efeito da mutação pode ser ignorado e assume-se o modelo evolutivo de deriva
genética (Reynolds et al., 1983). No entanto, para estudos de divergência genética
envolvendo períodos mais longos (relação entre espécies) a mutação não deve ser
excluída e adota-se o modelo de evolução deriva-mutação.
11.1. Medidas de distâncias genéticas
As medidas de distâncias genéticas são indicadores da proximidade entre
populações e são úteis para reconstrução das relações históricas e filogenéticas entre
grupos. Segundo Eding e Laval (1999), são várias as medidas que podem ser utilizadas
para o cálculo da distância genética dependendo do objetivo de estudo. Nas seguintes
fórmulas os valores de xi e yi são as freqüências do alelo i nas populações X e Y
respectivamente. Para simplificar, as fórmulas são dadas para apenas um locus. Para
ampliar as expressões para vários loci, deve-se somar todas as distâncias para cada locus
e dividir pelo número de loci cujos alelos aparecem nas expressões:
40
⎛
⎜
Distância Padrão de Nei (D): D = − ln ⎜⎜
⎜
⎝
Distância de Goldstein:
⎞
⎟
i
⎟
2
2⎟
∑ xi ∑ yi ⎟⎠
i
i
∑x y
i i
(δμ )2 = (μX − μY )
2
μX = ∑ i ixi e onde
onde:
μY = ∑ i iyi são os tamanhos médios dos alelos de cada população.
Distância média ao quadrado (ASD): ASD = ∑ i,i' (i − i' ) x i yi'
2
i, i’ são os
tamanhos dos alelos de um locus.
Distância de Shriver (DSW): DSW = WXY − (WX + WY ) 2 onde: WX = ∑ i − i' xi x i' ,
i≠ i'
WY = ∑ i − i' yi yi' , WXY = ∑ i − i' xi yi'
i ≠i'
i≠ i'
⎛
⎞
Distância de Cavalli-Sforza (DC): DC = (2 π ) 2⎜⎜1 − ∑ xi yi ⎟⎟
⎝
⎠
i
Distância de Nei (DA): DA = 1 − ∑ xi yi
i
Distância mínima de Nei (Dm): Dm =
2
1
(
x
−
y
)
∑
i
i
2 i
1 ∑i (xi − yi )
=
2 1 − ∑i x i yi
2
Distância de Reynolds (DReynolds): DRe ynolds
Não existe um consenso sobre qual das distintas medidas de distâncias genéticas é
a mais apropriada para análises de populações dentro de espécies, especialmente no
caso de raça de animais domésticos e menos ainda entre variedades dentro de raças.
Segundo Nei (1983), existem altas correlações entre as várias medidas de distâncias,
particularmente quando se aplicam a populações comerciais.
Na Tabela 2, encontra-se o uso das distâncias genéticas de acordo com o
recomendado com o tempo de divergência das populações estudadas (Eding e Laval,
1999).
41
Tabela 2 – Alguns critérios para eleição da medida de distância genética apropriada
Tempo de divergência
Modelo aplicado
DC
DA
D
(δμ)2
Dm
DReynolds
Curto
(Raças no continente)
Deriva genética
+/+
Intermediario
(Raças no mundo)
Mutação e deriva
+
+
+
+
-
Longo
(Espécies)
Mutação e deriva
+
+
+
+
-
Na prática, recomenda-se calcular duas ou mais distâncias genéticas e avaliar as
similaridades e diferenças entre elas, considerando as propriedades matemáticas e
biológicas, para eleger uma distância genética apropriada com a realidade e assim obter
resultados mais confiáveis.
A distância padrão de Nei (D) é a medida mais utilizada e sua distância tem um
valor linear proporcional ao tempo de divergência e nas árvores construídas com esta
distância espera-se obter a filogenia das espécies.
A distância mínima de Nei (Dm) mede o número mínimo de alelos diferentes de
cada locus. Esta medida de distância está sendo utilizada em estudos de polimorfismo
genético já que sua utilidade é limitada quando se comparam populações
intraespecíficas (Nei, 1987).
A distância de Nei (DA) tem demonstrado ser linear com o tempo. No entanto,
apresenta um problema com dados de microssatélites de populações divergentes, devido
à alta proporção de mutação e grande número de alelos. As distâncias de Cavalli-Sforza
(DC) e de Reynolds (DReynolds) assumem que não existem mutações e todas as mudanças
nas freqüências são produzidas por deriva genética. No entanto, assumem que o
tamanho da população continua constante e igual em todas as populações. A medida de
Cavalli-Sforza modificada está sendo recomendada como medida alternativa para uso
em populações próximas em que a deriva genética é o determinante primário para a
diferenciação da evolução (Eding e Laval, 1999).
A distância de Nei e Goldstein (δμ)2 é mais apropriada que outras distâncias para
calcular o tempo de evolução. O problema com os loci de microssatélites é que o padrão
mutacional é freqüentemente irregular. Alguns loci de microssatélites são altamente
polimórficos em algumas populações e espécies, no entanto são mais monomórficos em
outras, também não se conhece as razões das diferenças de polimorfismo entre
populações. Outro fator limitante para o uso de loci de microssatélites é que a proporção
42
de mutação pode mudar de locus a locus e aumentar a variação dos valores da distância
(Goldstein et al. 1995).
12. Árvores de distância genética
As matrizes de distância genética oferecem toda a informação dos marcadores
genéticos com relação às diferenças entre as raças estudadas. No entanto, como são
muitos dados torna-se difícil a interpretação das matrizes de distância sem análises
adicionais. Segundo Eding e Laval (1999), as árvores de distância são representações
gráficas ou mapas da matriz de distância que em alguns casos podem representar a
filogenia. Existem diferentes métodos para construção de árvores a partir de uma matriz
de distância e os mais utilizados são UPGMA (Unweighted pair group method with
arithmetic means) e NJ (Neighbor-joining).
O método de UPGMA descrito por Sneath e Sokal (1973) baseia-se no
agrupamento sucessivo de pares de táxons de acordo com o nível de similaridade. O
algoritmo opera da seguinte forma: a) o par de táxons mais semelhante (menor
distância) é unido e um nó é posicionado exatamente na metade da distância que separa
os dois; b) a distância entre o par de táxons unidos e o táxon ao qual ele está sendo
comparado. Novamente a menor distância na nova matriz determina quais táxons devem
ser unidos e um novo nó é posicionado como anteriormente descrito; c) esse
procedimento é repetido até que todos os táxons tenham sido incorporados ao
dendrograma. Nei et al. (1983), em estudos de simulação, compararam diferentes
métodos para construir árvores filogenéticas e observaram que o UPGMA comportavase bem quando as taxas de substituição eram as mesmas para todas as árvores. Deve-se
assumir que as taxas de substituição sejam iguais para que o método possa ser aplicado.
Desenvolvido por Saitou e Nei (1987), o método de NJ é utilizado para identificar
os pares de vizinhos mais próximos, populações ou grupos de populações (unidades
taxonômicas), de forma que se minimize a longitude total da árvore. Um par de vizinhos
é conectado por um simples nó em uma árvore sem raiz e com duas ramas que se unem
em um nó interior. Em geral, é possível definir a topologia de uma árvore pela união
sucessiva de pares de vizinhos para formar novos pares de vizinhos. A princípio formase uma figura em forma de uma estrela, em que todas as ramas partem do mesmo ponto.
Consideram-se vizinhos um par de grupos que, quando se juntam, produzem uma árvore
cuja longitude total mais curta se unem para formar uma unidade combinada. O
43
procedimento é usado para identificar os vizinhos mais próximos entre um número
reduzido de unidades e repetido até que restem apenas três unidades e, assim, obtém-se
uma árvore sem raiz.
NJ é um método aplicado para dados puramente aditivos em que a distância entre
cada par de unidades taxonômicas é a soma das longitudes das ramas que as unem na
árvore. No caso aditivo, o NJ seria uma árvore de mínima evolução, ou seja, a soma dos
desvios entre as distâncias de pares de taxas e as longitudes de cada passo da árvore é
mínima.
O “Bootstrap” é uma técnica estatística de reamostragem que permite um ganho
de informação sobre os parâmetros de distribuição em um conjunto de dados. Sua
principal função é avaliar a magnitude dos erros amostrais sobre inferências (Weir,
1996). A técnica de reamostragem é utilizada na construção de árvores para obter
valores de confiança dos nóis da árvore. Os valores de reamostragem podem ser obtidos
dos dados de freqüências de alelos de loci, tomados aleatoriamente. As freqüências dos
loci em cada amostra são utilizadas para o cálculo da nova matriz que, posteriormente,
será utilizada para construção da árvore proporcionando dados que indicam a proporção
ou porcentagem de vezes que cada nó formado em todas as árvores calculadas na
reamostragem (Eding e Laval, 1999).
12.1. Árvores filogenéticas individuais
Descrito por Bowcock et al. (1994), as árvores individuais são um tipo de análise
que avalia a tendência dos animais se agruparem por população. Caso os animais
amostrados de uma mesma raça não se agrupem juntos, pode ser um sinal de que existe
um problema na definição da raça ou na amostragem. A possibilidade de avaliação da
relação genética interindividual de uma população baseada em genótipos de vários loci
sugere novos avanços em análises de genéticas de populações. Esta análise elimina a
necessidade a priori de definir cada população e facilita a detecção de recentes
migrações (Ruiz-Linares,1999).
Os microssatélites têm um grau relativamente alto de heterozigosidade e muitos
alelos para cada locus. Assim, cada indivíduo pode ser definido de forma quase
inequívoca. Isto implica que se podem obter resultados significativos de alelos
compartilhados entre indivíduos membros das populações estudadas e, podem-se
construir árvores filogenéticas usando os indivíduos como unidades taxonômicas.
44
12.2. Análises de correspondência
Aplicada a uma análise clássica multivariante fatorial, a análise de
correspondência é uma medida de diversidade genética básica, na qual permite estudar
uma variável qualitativa (raça) em função de outras variáveis qualitativas (alelos) e em
um termo clássico de inércia pode ser assimilado à diversidade. Assim, a análise de
correspondência estabelece relações entre categorias de variáveis, definindo
similaridades ou diferenças entre elas, o que permite depois seu agrupamento, caso
exista “correspondência” entre elas. Esta aproximação foi desenvolvida por CavalliSforza et al. (1994), aplicada a dados de várias populações humanas.
A análise efetua-se a partir de uma tabela de contingência por raça em que as
linhas estão constituídas pela variável a explicar (raça) e as colunas contêm o conjunto
de variáveis explicativas (alelos). Tratando-se da modalidade de correspondência
múltipla no caso que os diferentes loci consideram-se não ligados (Lebart et al., 1995),
os resultados permitem obter a importância relativa (inércia) tanto das populações
quanto dos alelos com uma representação gráfica mediante um sistema de pontos
situados no espaço euclidiano e a verificação de seu grau de robustez.
Na literatura pode-se encontrar vários trabalhos com animais domésticos que
utilizam esta análise (MacHaugh et al., 1998; Cymbron et al., 1999; Yang et al., 1999;
Hanslik et al., 2000; Wimmers et al., 2000).
45
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53
Capítulo I
Painel de 27 microssatélites para
caracterização genética das raças caprinas nativas brasileiras
54
Painel de 27 Microssatélites para Caracterização Genética das Raças Caprinas
Nativas Brasileiras
Resumo - O objetivo deste trabalho foi verificar a utilização de um painel de 27
microssatélites para caracterização genética das raças caprinas nativas do Brasil. Foram
coletadas amostras de pêlos de 332 animais, sendo 60 Moxotó, 50 Canindé, 55 Serrana
Azul, 68 Marota, 52 Repartida e 47 Graúna. Selecionou-se um painel de 27
microssatélites que foram amplificados mediante à técnica de reação em cadeia de
polimerase (PCR). Para realizar a separação por tamanhos de fragmentos, obtidos
mediante a PCR, submeteram-se estes produtos amplificados a uma eletroforese em gel
de poliacrilamida, em um seqüenciador automático ABI 377XL. Todos os
microssatélites analisados mostraram-se polimórficos para o estudo de caracterização
genética das raças nativas brasileiras. O número de alelos encontrado variou de três
(MAF209) até vinte e três (CSSM66). A heterozigosidade média esperada foi de 0,672 e
a observada de 0,582. Todos os microssatélites analisados foram informativos, com
exceção do marcador MAF209 (PIC: 0,042). Os microssatélites analisados mostraramse polimórficos e os resultados obtidos demonstram a capacidade desses marcadores em
identificar a variabilidade genética em raças caprinas nativas brasileiras.
Palavras-chave: caprinos, conservação genética, marcadores moleculares, variabilidade
genética
55
Panel of 27 Microsatellites for Genetic Characterization of the Breeds Native
BrazilianGoats1
Abstract - The objective of this work was to study the use of a panel of microsatellites
for genetic characterization of the breeds native of Brazil goats. Samples of hair of 332
animals, being 60 Moxotó, 50 Canindé, 55 Serrana Azul, 68 Marota, 52 Repartida and
47 Graúna were collected. A panel of 27 microsatellites was selected, amplified by
polymerase chain reaction (PCR). To stablish the separation of fragments obtained by
PCR, these amplified products were submitted to electrophoreses in poliacrylamide gel
using an ABI 377XL automatic sequencer. All the 27 analyzed microsatellites were
polymorphic for studies of characterization of the Brazilian breeds. The number of
alleles found varied between three (MAF209) and twenty-three (CSSM66). The
expected mean heterozigosity was 0,672 and the observed was 0,582. All the analysed
microsatellites were informative, except for the marker MAF209 (PIC: 0,042). The
microsatellites analysed were polymorphic and the results found demonstrate the
capacity of those markers in identifying the genetic variability in breeds
brazilian goats.
Keywords – goats, genetic conservation, molecular markers, genetic variability
56
native
Introdução
As raças caprinas nativas do Brasil estão localizadas na região nordeste, onde os
animais são criados em sistemas extensivo e semi-extensivo para produção de carne,
pele e leite. São caprinos bem adaptados à região semi-árida, resistentes a doenças e
parasitas. Porém, poucos trabalhos vêm sendo desenvolvidos com esses animais, que se
encontram ameaçados de extinção. Para minimizar esse problema, um programa de
conservação foi estruturado e uma das prioridades do programa é o estudo de
caracterização genética que poderá oferecer um maior nível de conhecimento sobre esse
patrimônio genético.
Segundo Gama (2004), a variabilidade genética total das espécies está
representada pela contribuição da variabilidade inter-racial e intra-racial. Diante disso,
verifica-se a importância de medir a variabilidade genética dos animais, já que a
conservação dos recursos genéticos estão efetivamente relacionados com a manutenção
da variabilidade inter-racial evitando a extinção das raças, assim como a manutenção da
variabilidade intra-racial, evitando a erosão genética.
A caracterização genética pelo uso de marcadores moleculares tem demostrado ser
uma ferramenta eficaz para quantificar a diversidade genética de animais domésticos.
Os marcadores genéticos são loci que apresentam características detectáveis que
diferenciam os indivíduos de uma determinada população, demonstrando variações
entre indivíduos e grupos de animais.
Os microssatélites são pequenas sequências repetidas (1 a 6 nucleótidos),
abundantes, distribuídos ao acaso por todo genoma. Apresentam grande polimorfismo,
são fáceis de se identificar e vêm sendo utilizados em mapas de ligação em mamíferos,
identificação individual em controle de paternidade e caracterização genética de
populações.
Microssatélites de bovinos e ovinos estão sendo testados em caprinos, por estes
serem bem conservados em espécies próximas. Tipificando um painel de 70
microssatélites bovinos em outras espécies, Pepin et al. (1995) encontraram um total de
41 microssatélites que podem ser susceptíveis a amplificar em outras espécies. Gotari et
al. (1997) verificaram que 39% dos microssatélites de bovinos analisados por esses
autores podem ser amplificados em ovinos. Segundo a FAO, os microssatélites que
possuem homologia em várias espécies relacionadas são preferíveis, pois facilitam o
trabalho nos laboratórios além de economizar tempo e reduzir custos.
57
Yang et al. (1999) analisaram 6 microssatélites em 4 raças de caprinos chineses,
demonstrando que os microssatélites de ovinos (OarFCB11, OarFCB20, OarFCB304,
OarFCB48 e Oar FCB34) e de bovino (BM4621) são eficientes para detectar
polimorfismo em raças caprinas. Ainda com caprinos nativos chineses, Li et al. (2002)
tipificaram 16 microssatélites recomendados pela EU Sheep and Goat Biodiversity
Project. A variabilidade genética intra e inter-racial em caprinos asiáticos nativos foi
verificada por Barker et al. (2001), com um painel de 25 microssatélites. Saitbekova et
al. (1999) realizaram um estudo sobre a diversidade genética entre raças de caprinos
suíças, mediante análise com 20 microssatélites de bovinos. O objetivo deste trabalho
foi verificar a utilização de um painel de 27 microssatélites para caracterização genética
das raças caprinas brasileiras.
58
Material e Métodos
Amostras e extração de DNA
Foram coletados um total de 332 amostras casualizadas de pêlos de caprinos das
raças: Moxotó (60), Canindé (50), Serrana Azul (55), Marota (68), Repartida (52) e
Graúna (47), de vários produtores e Estados distintos da região Nordeste do Brasil
(Paraíba, Pernambuco, Rio Grande do Norte, Bahia e Piauí). O DNA das amostras foi
extraído de 10 pêlos selecionados, segundo a metodologia estabelecida por Walsh et al.
(1991).
Microssatélites e PCR
Na Tabela 1 estão apresentados os 27 microssatélites analisados com a sequência
direta e reversa dos iniciadores (Primers). Os multiplex, os tamanhos dos fragmentos,
os fluorocromos, a temperatura de anelamento dos loci encontram-se na Tabela 2.
Os microssatélites foram amplificados mediante a técnica de reação em cadeia de
polimerase (PCR), com 25 μL de volume final de uma reação: 5 μL de DNA, 2,5 mM
de cloreto de magnésio, 1 unidade de Taq Polimerase, 200 mM de dNTPs e 0,25 mM de
primers. Preparadas as reações, foram levadas a um termociclador e submetidas às
seguintes condições de amplificação: 10 minutos a 94°C, seguidos de 35 ciclos de 94°C
por 30'', 55°C para a maioria dos marcadores e a 60ºC (CSRM60 e INRA23) por 45'' e
72°C por 30'', finalmente, após os 35 ciclos, acrescentou-se 10' a 72°C.
Desenvolveram-se vários experimentos de reações de amplificação múltiplas de
microssatélites para reduzir o número de reações, tempo e custos. Os produtos
amplificados foram submetidos à eletroforese em gel de poliacrilamida, em um
seqüenciador automático ABI 377XL (Applied Biosystems, Foster City, California,
USA). Os resultados das análises de fragmentos e a tipificação alélica realizaram-se
mediante os programas informáticos Genescan Analisys v. 3.7 e Genotyper 2.5,
respectivamente.
59
Análises estatísticas
Calcularam-se as frequências alélicas e as heterozigosidades por intermédio do
programa informático Genetix versão 4.01, proposto por Belkhir et al. (1999). O
conteúdo de informação polimórfica (PIC) foi obtido mediante fórmula proposta por
Botstein et al. (1980). Para o teste de equilibrio de Hardy-Weinberg, utilizou-se o
programa informático Genepop v. 3.4, aplicando-se o método de cadeia de Markov. Os
estatísticos F (Fst, Fit e Fis) segundo Weir e Cockerham (1984) e o Gst foram
calculados pelo programa informático Genetix versão 4.01, de acordo com Belkhir et al.
(1999).
60
Tabela 1. Microssatélites analisados com as respectivas seqüências (direta e reversa) dos
iniciadores
Table 1. Analyzed Microsatellites, with the sequence (direct and reverse) of primers
locus
Direta
Reversa
BM6506
BM8125
BM1818
CSRD247
ETH225
HAUT27
ILSTS011
INRA63
INRA5
SPS115
TGLA122
BM6526
CSRM60
CSSM66
ETH10
INRA6
MM12
HSC
McM527
SRCRSP8
OarFCB48
BM1329
OarFCB11
OarFCB304
INRA23
MAF209
MAF65
GCACGTGGTAAAGAGATGGC
CTCTATCTGTGGAAAAGGTGGG
AGCTGGGAATATAACCAAAGG
GGACTTGCCAGAACTCTGCAAT
GATCACCTTGCCACTATTTCCT
TTTTATGTTCATTTTTTGACTGG
GCTTGCTACATGGAAAGTGC
ATTTGCACAAGCTAAATCTAACC
TTCAGGCATACCCTACACCACATG
AAAGTGACACAACAGCTTCTCCAG
CCCTCCTCCAGGTAAATCAGC
CATGCCAAACAATATCCAGC
AAGATGTGATCCAAGAGAGAGGCA
ACACAAATCCTTTCTGCCAGCTGA
GTTCAGGACTGGCCCTGCTAACA
AGGAATATCTGTATCAACCTCAGTC
CAAGACAGGTGTTTCAATCT
CTGCCAATGCAGAGACACAAGA
GTCCATTGCCTCAAATCAATTC
TGCGGTCTGGTTCTGATTTCAC
GAGTTAGTACAAGGATGACAAGAGGCAC
TTGTTTAGGCAAGTCCAAAGTC
GGCCTGAACTCACAAGTTGATATATCTATCAC
CCCTAGGAGCTTTCAATAAAGAATCGG
GAGTAGAGCTACAAGATAAACTTC
GATCACAAAAAGTTGGATACAACGTGG
AAAGGCCAGAGTATGCAATTAGGAG
AGCAACTTGAGCATGGCAC
GGGGGTTAGACTTCAACATACG
AGTGCTTTCAAGGTCCATGC
CACTGTGGTTTGTATTAGTCAGG
ACATGACAGCCAGCTGCTACT
AACTGCTGAAATCTCCATCTTA
CTAAAATGCAGAGCCCTACC
AAACCACAGAAATGCTTGGAAG
AAATATTAGCCAACTGAAAACTGGG
AACGAGTGTCCTAGTTTGGCTGTG
AATCACATGGCAAATAAGTACATAC
TGAAGGTAGAGAGCAAGCAGC
AGGACCAGATCGTGAAAGGCATAG
AATTTAATGCACTGAGGAGCTTGG
CCTCCAGCCCACTTTCTCTTCTC
CTGAGCTGGGGTGGGAGCTATAAATA
ATCGACTCTGGGGATGATGT
GTCTGTCTCCTGTCTTGTCATC
AAACCACTTGACTACTCCCCAA
CCTGCATGAGAAAGTCGATGCTTAG
GACTCTAGAGGATCGCAAAGAACCAG
AACACCGCAGCTTCATCC
GCAAGCAGGTTCTTTACCACTAGCACC
CGCTGCTGTCAACTGGGTCAGGG
TAACTACAGGGTGTTAGATGAACTC
TCATGCACTTAAGTATGTAGGATGCTG
CCACTCCTCCTGAGAATATAACATG
61
Tabela 2 - Múltiples dos loci, tamanhos dos fragmentos, fluorocromos e temperatura de
anelamento utilizados
Table 2 – Loci multiplex, size range, fluorescence and annealing temperature used
Multiplex
locus
Tamanhos (pb)
Fluorocromo
Temp. anelamento (ºC)
Size
Fluorescence
Annelingtemperature
References
M1
BM6506
INRA63
CSRD247
ETH225
TGLA122
190-228
153-185
208-250
130-165
130-180
HEX
HEX
FAM
NED
FAM
55
Bishop et al. ,1994
Vaiman et al., 1994
FAO, 2004
Barendse et al., 1994
Georges et al., 1992
M2
INRA5
HAUT27
BM8125
125-155
125-160
100-128
HEX
NED
FAM
55
Vaiman et al., 1994
Thieven et al., 1997
Bishop et al., 1994
M3
ILSTS011
SPS115
BM1818
253-295
235-265
250-290
HEX
NED
FAM
55
Luikart et al,. 1999
Moore et al., 1993
Li et al., 2002
M4
CSSM66
BM6526
175-265
145-195
HEX
FAM
55
Barendse et al., 1994
Bishop et al., 1994
M5
INRA6
MM12
100-130
85-135
HEX
NED
55
Bishop et al., 1994
Mommens et al., 1994
M6
OarFCB304
OarFCB11
MAF209
MAF65
BM1329
130-180
120-160
100-125
110-152
153-185
HEX
FAM
HEX
N ED
NED
55
Yang et al., 1999
Yang et al., 1999
Luikart et al., 1999
Luikart et al., 1999
Bishop et al., 1994
M7
HSC
McM527
SRCRSP8
270-306
150-190
210-260
HEX
NED
NED
55
ISAG, 2002
ISAG, 2002
Luikart et al,. 1999
M8
INRA23
CSRM60
185-230
75-110
HEX
FAM
60
Li et al., 2002
Moore et al., 1994
M9
ETH10
OarFCB48
200-230
140-170
FAM
FAM
55
Solinas et al., 1993
Yang et al., 1999
62
Referências
Resultados e Discussão
Os valores de polimorfismo dos loci analisados encontram-se na Tabela 3. Os
marcadores (TGLA122, MM12, CSSM60, BM6526, HSC e BM8125) apresentaram um
elevado grau de heterozigosidade média observada com valores superiores a 0,7. No
entanto, os marcadores (MAF209, BM6506, SPS115, ETH225, INRA63, HAUT27,
ETH10 e INRA23) apresentaram um nível reduzido de heterozigosidade com valores
inferiores a 0,5. Para heterozigosidade média esperada, a maioria dos loci (85%)
apresentaram valor superior a 0,5, indicando uma elevada diversidade genética dos
marcadores analisados. A qualidade dos marcadores foi verificada pelo conteúdo de
informação polimórfica que apresentaram valores superiores a 0,5, em mais de 75% dos
loci analisados.
Todos os 27 microssatélites analisados foram polimórficos para caracterização
genética das raças caprinas brasileiras. Os resultados de número de alelos obtidos por
locus analisado revelaram coerência com o número mínimo de alelos sugerido por
Barker (1994), à exceção do MAF209. Segundo esse autor, o número inferior a quatro
alelos por locus reduz o efeito sobre o erro padrão para cálculos de distância genética
entre populações. O locus MAF209 é um marcador de ovinos e apesar de amplificar
bem em caprinos, este locus tem-se mostrado pouco polimórfico para essa espécie
como encontrado neste estudo com apenas 3 alelos, resultado condizente com os
encontrados por Luikart et al., (1999) em cabras espanholas. Possivelmente, este locus
se encontra em uma zona com baixa variabilidade genética em caprinos.
Por outro lado, o marcador CSSM66 apresentou um elevado número médio de
alelos (23). Essa quantidade elevada pode ser considerada um número excessivo de
alelos, que não é interessante, do ponto de vista prático, em análise de tificação alélica,
dificultando a interpretação dos resultados. Possivelmente, este locus encontra-se em
uma zona hiperváriavel do DNA no genoma dos caprinos.
Os valores encontrados de número médio de alelos estão de acordo com os
reportados por alguns autores que estudaram diversidade genética em caprinos (Araújo,
2004; Saitbekova et al., 1999; Li et al., 2002; Yang et al., 1999), demonstrando alto
nível de polimorfismo dos loci analisados. Em contraste, Maudet et al. (2002),
trabalhando com microssatélites em cabras Alpina Ibex, verificaram número médio de
alelos por loci variando entre dois (ILSTS029) e seis (SR-CSRP-24), mostrando um
baixo nível de polimorfismo dos loci em cabras selvagens.
63
Em uma análise global, os valores obtidos de heterozigosidade média observada
por locus revelaram elevado grau de polimorfismo, apresentando valores superiores a
0,5 em mais de 70% dos loci analisados.
Em estudos de diversidade genética em cabras asiáticas, Barker et al. (2001)
verificaram alto nível de heterozigosidade em 17 microssatélites analisados. Enquanto
Saitbekova et al. (1999) encontraram heterozigosidade total variando de 0,15 (ETH225)
a 0,87 (ILSTS030) em cabras Suíças, Ibex e Benzoar, apresentando uma elevada
variação entre loci (possivelmente, os valores de heterozigosidade das cabras selvagens
influenciaram nestes resultados). Por outro lado, Li et al. (2002) observaram
heterozigosidade média total variando entre 0,65 (ILSTS005) e 0,88 (BM2113),
apresentando menor variação entre loci, demostrando altos níveis de heterozigosidade
em cabras chinesas.
O marcador CSSM66 pode ser considerado altamente informativo (PIC=0,908),
no entanto, o PIC depende do número de alelos e suas freqüências. Desta forma, como
foi comentado anteriormente, o locus com número médio de 23 alelos pode diminuir a
eficiência das análises, enquanto que para classificação de Botstein et al., (1980) este
marcador seria considerado o mais informativo. Portanto, a informação que este
parâmetro produz não deve ser o único aspecto usado para eleger um marcador ou
descartá-lo (Moazami-Goudarzi et al., 1994).
Apenas seis marcadores apresentaram valores de PIC inferior a 0,5, com cinco
microssatélites considerados medianamente informativos (ETH225; BM6506; SSP115;
HAUT227 e INRA63) e apenas um microssatélite foi considerado pouco informativo
(MAF209). Estes valores de PIC são condizentes com os encontrados por Yang et al.
(1999); Li et al. (2002) e Jandorová et al. (2004).
O equilíbrio de Hardy-Weinberg (EHW) dos loci para cada população de cabras
brasileiras foi apresentado na Tabela 4. A raça Moxotó foi a população que apresentou o
maior número de locus em desequilíbrio (11), seguidos por Serrana Azul, Marota e
Repartida (9), Canindé (8) e Graúna (7). No geral, verificou-se diferença de apenas 4
loci em desequilíbrio entre as raças estudadas, demonstrando reduzida amplitude dos
desvios do EHW para o painel de microssatélites analisados. Diante disso, tal fato pode
ser explicado pela estrutura genética das populações, devido a vários fatores como:
acasalamentos dirigidos, subdivisões dentro das populações, antepassados comuns,
seleção natural, migração ou fluxo de genes a partir de população externa. No entanto,
64
estes resultados podem ser esperados tanto em raças comercias como em raças
ameaçadas de extinção.
Tabela 3 - Número de alelos (NA), Heterozigosidade observada (Ho) e esperada (He) e
Conteúdo de Informação Polimórfica (PIC), em função dos loci analisados
Table 3 – Alelle number (AN), observed heterozygosity (Ho), expected herozygosity (He), Polymorphyc
Information content (PIC) in function of analyzed Loci
Locus
NA
Ho
He
PIC
CSSM66
OarFCB304
MM12
BM6526
INRA6
HSC
BM1329
OarFCB11
MAF65
CSRM60
BM6506
BM1818
TGLA122
CSRD247
HAUT27
SRCRSP8
INRA23
INRA5
OarFCB48
ILSTS011
McM527
BM8125
INRA63
SPS115
ETH10
ETH225
MAF209
23
16
14
14
13
11
11
11
11
10
10
10
10
09
09
09
09
08
08
07
07
06
06
05
05
04
03
0,680
0,669
0,733
0,716
0,638
0,731
0,678
0,659
0,508
0,720
0,371
0,671
0,754
0,666
0,461
0,675
0,495
0,623
0,598
0,524
0,631
0,713
0,454
0,412
0,493
0,416
0,037
0,819
0,795
0,752
0,744
0,847
0,789
0,741
0,687
0,717
0,755
0,406
0,761
0,829
0,748
0,479
0,776
0,666
0,709
0,632
0,786
0,699
0,769
0,572
0,503
0,650
0,483
0,043
0,908
0,777
0,724
0,724
0,830
0,761
0,698
0,643
0,675
0,718
0,391
0,737
0,807
0,717
0,436
0,742
0,612
0,667
0,572
0,752
0,651
0,733
0,480
0,398
0,576
0,383
0,042
Em uma análise global, verificou-se que o desequilíbrio de Hardy-Weinberg para
os marcadores alternaram-se dentro das populações e que a maioria dos marcadores
(cerca de 70%) estão equilibrados, demonstrando a capacidade dos loci em identificar e
avaliar a diversidade genética nas raças caprinas brasileiras.
65
Tabela 4 – Relação dos loci desequilíbrados (Hardy-Weinberg) nas populações
estudadas
Table 4 - Relation between desequilibrated Hardy-Weinberg loci in the population studied
S. Azul
Moxotó
Marota
Canindé
Repartida
Graúna
BM6506
BM8125
BM1818
1,000
0,209
0,627
1,000
0,145
0,181
0,762
0,230
0,209
0,378
0,866
0,844
0,238
0,618
0,130
0,275
0,603
0,322
CSRD247
ETH225
HAUT27
ILSTS011
INRA63
0,295
0,596
0,745
0,258
0,079*
0,248
0,461
0,294
0,000*
0,518
0,346
1,000
0,173
0,922
0,827
0,776
0,658
0,169
0,000*
0,006*
0,099*
0,000*
0,024*
0,943
0,094*
0,436
0,053*
0,106
0,248
0,233
INRA5
SPS115
TGLA122
BM6526
CSRM60
0,014*
0,072*
0,130
0,000*
0,369
0,420
0,000*
0,311
0,080*
0,841
0,087*
0,750
0,200
0,923
0,039*
0,905
0,002*
0,220
0,138
0,071*
0,606
0,005*
0,273
0,311
0,771
0,914
0,773
0,130
0,357
0,392
CSSM66
ETH10
INRA6
MM12
HSC
0,133
1,000
0,000*
0,560
0,230
0,596
0,107
0,062*
0,025*
0,013*
0,364
0,386
0,231
0,298
0,047*
0,032
0,170
0,065*
0,734
0,874
0,001*
0,019*
0,664
0,273
0,086*
0,002*
0,067*
0,000*
0,842
0,185
McM527
SRCRSP8
OarFCB48
BM1329
OarFCB11
0,594
0,106
0,056*
0,951
0,206
0,026*
0,022*
0,403
0,347
0,032*
0,686
0,093*
0,043*
0,849
0,085*
0,606
0,075*
0,307
0,419
0,174
0,047
0,869
0,355
0,574
0,718
0,662
0,012*
0,468
0,160
0,127
OarFCB304
INRA23
MAF209
MAF65
0,636
0,016*
0,000*
0,000*
0,500
0,137
0,000*
0,000*
0,001
0,000*
0,000*
0,003*
0,161
0,000*
1,000
0,204
0,298
0,240
0,051*
0,148
0,337
0,000*
0,000*
0,017*
9
11
9
7
9
7
locus
Total
(P>0,10)*
Na Tabela 5, verificam-se valores dos parâmetros da estrutura genética das raças
brasileiras, com base nos loci analisados. Os resultados de Gst variaram de 0,023
(MAF209) a 0,235 (ILSTS011). De acordo com Nei (1973), na estimativa deste
parâmetro leva-se em consideração diretamente a heterozigosidade esperada. Os
resultados deste parâmetro não são influenciados pelo número de alelos por locus, assim
como o modelo de evolução (mutação, seleção e migração).
O valor médio de Gst foi de 0,075 para todos os loci analisados, o que representa
baixa proporção relativa da variação genética inter-populações. Tal fato pode ser
66
explicado, provavelmente, pela história evolutiva em comum dos caprinos analisados,
assim como pelo uso em comum de reprodutores na formação dessas raças. Em estudos
de diversidade genética, Saitbekova et al., (1999) encontraram diferenças entre nove
raças caprinas suíças de 17%, possivelmente, são populações mais heterogêneas, com
maior troca de genes entre os rebanhos.
Geralmente, os resultados de Gst e Fst são similares como se verifica neste
trabalho (0,075 e 0,079), respectivamente. No entanto, o Fst é um parâmetro mais
preciso, pois leva-se em consideração tanto as frequências alélicas quanto as
genotípicas. Para todos os loci, o Fst foi relativamente baixo, indicando que apenas
7,9% (Tabela 5) da variabilidade genética total foi explicado pelas diferenças entre
raças e 92,1% correspondem a diferença entre indivíduos. Li et al. (2002), avaliando a
diversidade genética em caprinos chineses, encontraram Fst de 10,5% para todos os loci
analisados. Já Barker et al. (2001), encontraram valor médio de Fst de 14,3%,
demonstrando uma maior diferenciação genética entre as raças asiáticas, comparados
aos resultados encontrados neste estudo.
A origem e a estrutura filogeográfica da cabra doméstica, mediante DNA
mitocondrial, foram estudadas por Luikart et al. (2001), encontrando pouca diferença
genética entre raças de caprinos da Ásia, África e Europa, de 10,70%, valor considerado
relativamente baixo, quando comparado aos encontrados em bovino (84%). Esses
autores relataram que há muitos anos existia um maior fluxo de caprinos entre os
continentes, justificado pela facilidade relativa de transporte, animais de menor preço e
adaptabilidade. No entanto, em tempos mais recentes, existe menor interesse econômico
e comercialização de caprinos, comparados com bovinos, assim como menor utilização
da inseminação artificial e transferência de embriões nesta espécie. Provavelmente, esta
seria a explicação para pouca diferença genética entre as raças de caprinos do mundo,
ou seja, já existia pouca diferença genética entre as raças de caprinos que deram origem
às raças nativas brasileiras.
O valor médio de Fit para todos os loci foi de 14,8%, verificando o índice de
fixação dos indivíduos referente à população global. Enquanto, o Fis médio para todos
os loci foi de 7,4%, demonstrando moderada deficiência de indivíduos heterozigóticos
dentro das subpopulações analisadas.
67
Tabela 5 - Coeficiente de diferenciação genética (Gst) e estatísticas de F (Fst, Fit e Fis)
para cada locus analisado
Table 5 - Coefficient of genetic differentiation (Gst) and statistical of F (Fst, Fit and Fis) for each
analyzed locus
Locus
Gst
Fst
Fit
Fis
BM6506
BM8125
BM1818
CSRD247
ETH225
HAUT27
ILSTS011
INRA63
INRA5
SPS115
TGLA122
BM6526
CSRM60
CSSM66
ETH10
INRA6
MM12
HSC
McM527
SRCRSP8
OarFCB48
BM1329
OarFCB11
OarFCB304
INRA23
MAF209
MAF65
Media/average
0,056
0,064
0,070
0,095
0,033
0,041
0,235
0,043
0,140
0,041
0,053
0,042
0,035
0,098
0,141
0,086
0,026
0,042
0,063
0,061
0,075
0,045
0,066
0,079
0,123
0,023
0,050
0,075
0,080
0,080
0,079
0,078
0,080
0,080
0,071
0,080
0,076
0,080
0,080
0,081
0,081
0,078
0,076
0,078
0,082
0,081
0,080
0,080
0,079
0,081
0,079
0,079
0,077
0,079
0,080
0,079
0,149
0,150
0,148
0,149
0,148
0,150
0,138
0,146
0,148
0,147
0,150
0,152
0,152
0,146
0,143
0,142
0,153
0,151
0,149
0,148
0,151
0,150
0,151
0,147
0,142
0,148
0,141
0,148
0,075
0,076
0,075
0,076
0,073
0,076
0,072
0,071
0,077
0,072
0,075
0,077
0,076
0,073
0,072
0,069
0,077
0,075
0,075
0,074
0,077
0,075
0,078
0,073
0,070
0,074
0,066
0,074
Li et. al., (2002) reportaram valor de Fit de 13,2% e Fis de 3%, com menor
deficiência de heterozigotos em raças caprinas chinesas. Enquanto, Barker et al., (2001)
verificaram Fit de 34% e Fis de 23%, demonstrando extrema deficiência de indivíduos
heterozigotos nas raças asiáticas. Segundo esses autores, estes resultados podem ser
explicados por vários fatores: presença de alelos nulos, efeito de Wahlund (subdivisão
das populações) e seleção contra heterozigotos. Geralmente, é difícil distinguir qual o
fator mais importante. No entanto, as informações descritas pelos autores é que existe
uma forte endogamia dentro das raças nativas asiáticas sul-oriental, com acasalamentos
não orientados em populações com número reduzido de indivíduos.
68
Conclusões
Os microssatélites analisados são polimórficos, demonstrando alta capacidade
em identificar variabilidade e diversidade genética em caprinos, com exceção dos
marcadores MAF209 e CSSM66. Este painel de microssatélites pode ser utilizado para
caracterização genética das raças caprinas brasileiras, auxiliando os programas de
conservação de recursos genéticos do País.
69
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71
Capítulo II
Variabilidade genética das raças caprinas nativas brasileiras utilizando
marcadores moleculares
72
Variabilidade Genética das Raças Caprinas Nativas BrasileirasUtilizando
Marcadores Moleculares
Resumo - O objetivo deste trabalho foi verificar a variabilidade genética das raças
caprinas nativas brasileiras usando marcadores moleculares. Foram coletadas amostras
de pêlos de 332 caprinos das raças: Moxotó, Canindé, Serrana Azul, Marota, Repartida
e Graúna, de vários estados do nordeste do Brasil (Paraíba, Pernambuco, Rio Grande
do Norte, Bahia, Piauí). Foram selecionados 27 microssatélites: BM6506, BM8125,
BM1818, CSRD247, ETH225, HAUT27, ILSTS011, INRA63, INRA5, SPS115,
TGLA122, BM6526, CSRM60, CSSM66, ETH10, INRA6, MM12, HSC, McM527,
SRCRSP8, OarFCB48, BM1329, OarFCB11, OarFCB304, INRA23, MAF209 e
MAF65, que foram amplificados mediante técnica de reação em cadeia de polimerase
(PCR). O número médio de alelos variou entre 6,07 para raça Marota e 6,76 para raça
Repartida. A heterozigosidade observada variou entre 0,53 para raça Serrana Azul e
0,62 para raça Repartida. Verificou-se, pelo dendrograma UPGMA, que as raças
brasileiras formaram dois grupos distintos: um grupo formado por Moxotó, Canindé,
Repartida e Marota e outro formado por Serrana Azul e Graúna. Os resultados
encontrados para número médio de alelos e heterozigosidade média observada
indicaram que existe variabilidade genética intra-racial nas raças brasileiras.
Considerando a estrutura genética da espécie caprina, pode-se considerar que existe uma
boa diferenciação genética entre as raças brasileiras.
Palavras-chave: caprinos, conservação genética, microssatélites, diversidade genética
73
Genetic Variability in breeds Native Brazilian Goats Using Molecular Markers
Abstract - The objective of this work was to verify the genetic variability of the
Brazilian native goats using molecular markers. Samples of hair of 332 animals were
collected: Moxotó, Canindé, Serrana Azul, Marota, Repartida and Graúna, of several
states of the northeast of Brazil (Paraíba, Pernambuco, Rio Grande do Norte, Bahia,
Piauí). A panel of 27 microssatélites was Selected: BM6506, BM8125, BM1818,
CSRD247, ETH225, HAUT27, ILSTS011, INRA63, INRA5, SPS115, TGLA122,
BM6526, CSRM60, CSSM66, ETH10, INRA6, MM12, HSC, McM527, SRCRSP8,
OarFCB48, BM1329, OarFCB11, OarFCB304, INRA23, MAF209 and MAF65, were
amplified the microsatellites by using the Polimerasa Chain Reaction (PCR) technique.
The average number of alelos varied among 6,07 for Marota breed and 6,76 for
Repartida breed. The heterozygosity observed varied between 0,53 for Serrana Azul
breed and 0,62 for Repartida breed. It was verified through the dendrograma UPGMA
that the Brazilian goats formed two different groups, a group of Moxotó, Canindé,
Repartida and Marota and another one formed by Serrana Azul and Graúna. The results
found for the average number of alleles and observed average heterozygosity indicated
that a intra-racial genetic variability exists in the Brazilian breeds. Considering the
genetic structure of the bovid species, it can be considered that a good genetic
differentiation exists among the Brazilian races.
Keywords – goats, genetic conservation, microsatellites, genetic diversity
74
Introdução
A maioria dos animais domésticos do Brasil foram trazidos pelos colonizadores e,
ao longo de 500 anos, foram se diferenciando e formaram várias raças de animais
adaptados às diversas regiões do país, desenvolvendo características únicas como
rusticidade, prolificidade e resistência a enfermidades (Mariante,1999).
O Brasil possui cerca de 9,8 milhões de cabeças de caprinos, segundo a
FAOSTAT (2002). Aproximadamente, 90% do rebanho nacional
é formado por
animais Sem Padrão de Raça Definida (SPRD), oriundos dos cruzamentos
indiscriminados entre as raças exóticas e nacionais.
Nos últimos anos, a introdução de raças exóticas, altamente especializadas, nos
rebanhos brasileiros tem provocado rápida substituição e erosão genética das raças
nativas. De acordo com Egito et al. (2002), existe uma grande preocupação e esforços
têm sido feito através de programas de conservação de recursos genéticos para manter a
variabilidade genética destes animais, sobretudo, aqueles que estão ameaçados de
extinção. A perda de um único tipo ou raça compromete o acesso a seus genes e essas
combinações genéticas podem ser úteis em ambientes específicos.
O conhecimento da variabilidade genética destes animais domésticos é
fundamental para conservação e utilização desses recursos. Para isso, a caracterização
genética dos animais através dos marcadores moleculares tem se mostrado bastante
eficaz para quantificar a variabilidade genética em caprinos (Araújo, 2004; Li et al.,
2002; Barker et al., 2001; Saitbekova et al., 1999; Yang et al., 1999).
Neste contexto, o objetivo deste trabalho foi verificar a variabilidade intra-racial e
a diversidade genética inter-racial das raças caprinas nativas brasileiras utilizando
microssatélites.
75
Material e métodos
Amostras e extração de DNA
Foram coletadas amostras de pêlos de forma casualizadas de 332 animais: 60
Moxotó, em duas propriedades privadas e duas Universidades (UFPB e UFCG); 50
Canindé, em duas propriedades privadas; 55 de Serrana Azul, em uma propriedade
privada; 68 Marota, em uma Instituição de Pesquisa (Embrapa Meio-Norte); 52
Repartida, em uma Instituição pública, (EBDA) e 47 Graúna, em uma propriedade
privada.
Na Figura 1, encontra-se marcado em vermelho os Estados da região Nordeste do
Brasil onde foram coletadas as amostras. Utilizaram-se amostras da raça MurcianaGranadina como grupo controle. O DNA das amostras foi extraído de 10 pêlos
selecionados de cada animal, segundo a metodologia proposta por Walsh et al. (1991).
Figura 1 – Localização geográfica dos Estados onde foram coletadas as amostras das
raças caprinas brasileiras.
Figure 1 – Geographic localization of the States where samples of brasilian goats were colected
76
Microssatélites e PCR
Foram selecionados 27 microssatélites: BM6506, BM8125, BM1818, CSRD247,
ETH225, HAUT27, ILSTS011, INRA63, INRA5, SPS115, TGLA122, BM6526,
CSRM60, CSSM66, ETH10, INRA6, MM12, HSC, McM527, SRCRSP8, OarFCB48,
BM1329, OarFCB11, OarFCB304, INRA23, MAF209 e MAF65 para posteriormente,
serem amplificados mediante a técnica de reação em cadeia de polimerase (PCR), 25 μL
de volume final de uma reação com: 5 μL de DNA, 2,5 mM de cloreto de magnésio, 1
unidade de Taq Polimerase, 200 mM de dNTPs e 0,25 mM de primers.
Preparadas as reações, foram levadas a um termociclador e submetidas às
seguintes condições de amplificação: 10 minutos a 94°C, seguidos de 35 ciclos de 94°C
por 30'', 55°C para a maioria dos marcadores e a 60ºC (CSRM60 e INRA23) por 45'' e
72°C por 30'', finalmente, após os 35 ciclos, acrescentou-se 10' a 72°C.
Os produtos amplificados foram submetidos à eletroforese em gel de
poliacrilamida, em um seqüenciador automático ABI 377XL (Applied Biosystems,
Foster City CA, USA). As análises de fragmentos e a tipificação alélica realizaram-se
com auxílio dos programas computacionais Genescan Analisys v. 3.7 e Genotyper 2.5,
respectivamente.
Análises estatísticas
As frequências alélicas, heterozigosidades, índice de fixação (Fis) e o coeficiente
de diferenciação genética (Fst), proposto por Weir e Cockerham (1984) foram
calculados usando o programa computacional Genetix v.4.01 (Belkhir et al., 1999).
As distâncias genéticas entre cabras brasileiras foram calculadas de acordo com
DA de Nei et al. (1983), usando o programa informático Populations v.1.2.28 (Langela,
1999). Os dendrogramas gerados a partir das matrizes de distância genética foram
determinados por agrupamentos pelo método de agrupamento com média aritmética não
ponderada (UPGMA). Utilizou-se o programa PHYLIP versão 3.57c (Felsenstein,
1995), aplicando-se TREEWIEW (Page, 1998).
Para estudo da associação entre as diferentes subpopulações analisadas e
distribuição das freqüências alélicas dos diferentes marcadores utilizados, realizou-se
uma análise fatorial de correspondência, que é um tipo de análise canônica,
particularmente adaptado para descrever associações entre duas variáveis qualitativas
77
(análise de uma tabela de contingência). Para esta análise utilizou-se o programa
computacional Genetix v.4.01 (Belkhir et al., 1999).
78
Resultados e discussão
A variabilidade genética intra-racial e o índice de fixação (Fis) das raças caprinas
nativas brasileiras são apresentados na Tabela 1. Todas as populações estudadas
apresentaram número médio de alelos superior a seis. A população que apresentou o
maior polimorfismo foi a Repartida e o menor foi a Marota. A heterozigosidade média
observada das raças brasileiras foi superior a 0,5. Estes resultados demonstram que
existe elevada variabilidade genética dentro das populações analisadas, com valores
variando entre 0,53 (Serrana Azul) e 0,62 (Repartida). Os valores de heterozigosidade
média esperada seguiram a mesma tendência, variando entre 0,58 (Serrana Azul) e 0,65
(Repartida). O Fis das populações estudadas foi relativamente reduzido, com valores
inferiores a 10%, à exceção do obtido para raça Moxotó (13%).
A ocorrência do elevado nível de polimorfismo (6,70) e heterozigosidade média
observada (0,62) para Repartida pode ser atribuído pela forma como se originou esta
população. Segundo informações da Instituição pública (EBDA) de onde se obteve os
dados, este rebanho foi formado a partir da compra na região de animais que
apresentavam pelagem característica da raça, de diferentes criadores, proporcionando
um aumento da variabilidade genética da raça Repartida. Supõe-se que esses animais
não se encontravam em estado de pureza racial.
A proporção de indivíduos heterozigotos dentro das populações caprinas
brasileiras foi considerada relativamente alta (superior a 0,5), demonstrando que existe
elevado nível de heterozigosidade nas raças caprinas nativas brasileiras.
Neste estudo, verificou-se heterozigosidade média observada de 0,55 para raça
Moxotó, enquanto Araújo (2004) encontrou heterozigosidade média observada para a
raça Moxotó de apenas 0,44. Possivelmente, este resultado superior pode ser atribuído
ao maior tamanho de amostra utilizado neste trabalho.
Barker
et
al.
(2001),
estudando
raças
caprinas
asiáticas,
verificaram
heterozigosidade média observada inferior a 0,5; segundo esses autores, algumas
justificativas podem explicar esses valores reduzidos, como: rebanhos com
acasalamentos descontrolados, em que existem reprodutores dominantes que,
presumidamente, procriam a maioria da descendência, conduzindo a um efeito de
Wahlund (subdivisão das populações); outro fator seria o tamanho reduzido das
populações de cabras asiáticas.
79
Por outro lado, Li et al. (2002), estudando raças nativas chinesas, verificaram
heterozigosidade média observada superior a 0,6, mostrando elevado grau de
heterozigosidade nestas populações. De acordo com os autores, a causa pode estar
relacionada com o maior número de indivíduos dentro dos rebanhos, a área de
distribuição e uma maior troca de genes entre as populações.
Diante de uma análise global, os valores de número médio de alelos e
heterozigosidade média observada encontrados neste trabalho sugerem que existe
elevada variabilidade genética intra-racial nas raças caprinas nativas brasileiras.
Contudo, ainda existe uma preocupação com a erosão genética desses animais, pelo
reduzido número de indivíduos dentro de algumas poupulações. Assim, uma gestão de
população eficiente é extremamente necessária para conservação desses recursos
genéticos, evitando acasalamentos entre indivíduos aparentados dentro das populações,
como também pela introdução de indivíduos de outras raças.
De acordo com os loci estudados, observou-se que existe elevado nível de
diversidade genética nas populações caprinas brasileiras, com heterozigosidade média
esperada (He) superior a 0,5. A heterozigosidade média esperada de 0,62 para raça
Moxotó foi superior ao encontrado por Araújo (2004), estudando diversidade genética
para raça Moxotó (He < 0,5). Enquanto, Yang et al. (1999) verificaram alto nível de
diversidade genética em raças chinesas com valores superiores a 0,7.
As populações da raça Moxotó apresentaram Fis de 13%, indicando desequilíbrio
entre as freqüências alélicas e genotípicas devido ao nível elevado (acima de 10%) dos
indivíduos homozigotos intra-populacional. Barker et al. (2001) verificaram Fis
variando entre 9% para raça Medan e 33% para raça Ujung pandang. Segundo esses
autores, o alto nível de consangüinidade dentro das populações de caprinos nativos sulorientais asiáticos que são promovidos por acasalamentos descontrolados e
indiscriminados em populações reduzidas e utilização de poucos reprodutores.
Elevado valor de Fis pode ser causado por meio de diversos fatores:
acasalamentos direcionados, subdivisões dentro das populações, coancestrais e
antepassados comuns, seleção natural, migração ou fluxo de genes de uma população
externa, amostragem incorreta ou presença de alelos nulos não detectáveis
experimentalmente.
Provavelmente, exista uma subdivisão dentro das populações da raça Moxotó,
devido ao reduzido fluxo de genes entre os rebanhos; geralmente essas populações são
fechadas com reduzido número de reprodutores, favorecendo a endogamia. Entretanto,
80
faz-se necessário realizar novos trabalhos, com maior número de rebanhos para verificar
a estrutura genética da raça Moxotó.
Tabela 1 – Número de amostras (N), número médio de alelos (NA), heterozigosidade
média observada (Ho), heterozigosidade média esperada (He) e índice de
fixação (Fis) das raças brasileiras
Table 1 - Number of samples (N), average number of alleles (NA), average observed heterozygosity
(Ho), average expected heterozygosity (He) and fixation index (Fis) of the Brazilian breeds
Populações
N
NA
Ho
He
Fis
Serrana Azul
55
6,22
0,53
0,58
0,08
Moxotó
60
6,29
0,55
0,62
0,13
Marota
68
6,07
0,58
0,61
0,04
Canindé
50
6,15
0,60
0,64
0,06
Repartida
52
6,70
0,62
0,65
0,07
Graúna
47
6,56
0,61
0,62
0,03
Populations
A matriz de distâncias genéticas DA de Nei et al., (1983) entre as raças caprinas
nativas brasileiras, encontram-se na Tabela 2. A menor distância genética foi observada
entre a raça Serrana Azul e Graúna (0,082). Por outro lado, a maior distância genética
foi observada entre a raça Serrana Azul e Canindé (0,145). Quanto ao grupo controle
Murciana-Granadina, a população mais divergente foi a Serrana Azul, com valores de
0,313.
O coeficiente de diferenciação genética entre as raças caprinas nativas brasileiras
(Fst) foi relativamente baixo, indicando que apenas 7,9% da variabilidade genética total
foi explicado pelas diferenças entre raças e 92,1% correspondem a diferenças entre
indivíduos. Li et al. (2002), avaliando a diversidade genética em caprinos chineses,
encontraram Fst de 10,5% para todos os loci analisados. Já Barker et al. (2001),
encontraram valor médio de Fst de 14,3%, demonstrando uma maior diferenciação
genética entre as raças asiáticas, comparados aos resultados encontrados neste estudo.
A diversidade genética inter-populações das raças brasileiras são ilustradas no
dendrograma da matriz obtida pelo método de UPGMA (Figura1). Pode-se identificar
que foram formados dois grupos distintos: o primeiro, formado por Repartida, Moxotó,
Canindé e Marota e o segundo agrupamento, formado por Serrana Azul e Graúna. O
grupo controle Murciana-Granadina formou um grupo distinto do agrupamento das
81
raças brasileiras. Os elevados valores de “Bootstrap” (acima de 50) demonstram o grau
de confiança na formação dos nóis do dendrograma apresentado.
82
Tabela 2 – Matriz de distâncias genéticas DA entre as raças caprinas nativas brasileiras
Table 2 – Matrix of distance genetics DA between the breeds native Brazilian goats
Populações
Populations
S. Azul
Moxotó
Marota
Canindé
S. Azul
***
Moxotó
0,124
***
Marota
0,143
0,110
***
Canindé
0,100
0,144
***
0,145
Repartida
0,140
0,086
0,121
0,097
Graúna
0,130
0,130
0,144
0,082
M.Granadina
0,313
0,312
0,288
0,265
Números em negrito sao os menores e maiores valores para DA
Repartida Graúna
***
0,139
0,259
***
0,246
M.Granadina
***
Numbers in bold face are lowest and values of DA
No primeiro grupo formado, verifica-se uma maior proximidade entre as raças
Repartida, Moxotó e Canindé. Este resultado pode ser explicado pela formação do
rebanho Repartida que se originou com base exclusivamente na cor da pelagem, em
uma região do Estado da Bahia, onde a ocorrência da raça Canindé era relativamente
alta. Possivelmente, no passado existia troca de genes entre esses animais, pois os
acasalamentos eram descontrolados, o que pode ter contribuído para a similaridade
observada entre essas populações.
Por outro lado, apesar da distância geográfica em que se encontram esses rebanhos
da raça Moxotó (Paraíba e Rio Grande do Norte), Repartida (Bahia) e Canindé (Rio
Grande do Norte), provavelmente estas três raças caprinas foram originadas de animais
com história evolutiva comum.
A raça Marota apresentou maior distância genética dentre as raças desse grupo
(Figura 2). Este resultado pode estar relacionado ao isolamento genético desta
população através de acasalamentos controlados, possivelmente, causando efeito de
deriva genética. Além da distância geográfica entre a raça Marota e os demais, pois
encontra-se no Piauí, com
mais de 1000 km
de distância dos demais rebanhos
estudados.
Para o segundo grupo, verifica-se elevado grau de similaridade entre as raças
Serrana Azul e Graúna. Estes rebanhos pertencem ao mesmo criador e possivelmente,
houve troca de genes entre os rebanhos, favorecendo a menor distância genética entre as
populações analisadas.
83
A raça Murciana-Granadina mostrou-se um grupo geneticamente distinto das
cabras brasileiras, contribuindo efetivamente para a interpretação das distâncias
genéticas dos grupos de cabras analisadas.
Murciana-Granadina
100
Serrana AzulL
98
Graúna
84
Marota
58
Canindé
60
Moxotó
78
Repartida
Figura 2 – Dendrograma de UPGMA das raças brasileiras, baseado na distância DA de
Nei (1983).
Figure 2 – UPGMA dendrogram of brasilian breeds, based on Neis’s DA distance (1983).
Na Figura 3 encontra-se a análise fatorial de correspondência das populações
estudadas. Os três eixos responderam por mais de 70% da variação total, mostrando alto
grau de confiança da análise, distinguindo claramente as relações genéticas entre as
populações.
84
Serrana Azul
Graúna
Moxotó
Repartida
Marota
Canindé
Figura 3 – Representação espacial das raças estudadas segundo a análise fatorial de
correspondências.
Figure 3 - Spatial representation of studied breeds using factorial correpondence analysis.
Verificou-se que a raça Marota foi o grupo mais distinto, apresentando-se como
uma população geneticamente controlada. Este rebanho está sob a responsabilidade de
uma empresa de pesquisa, fruto de um trabalho de mais de 20 anos de conservação, um
exemplo de trabalho a ser aplicado às demais raças caprinas brasileiras.
A raça Canindé mostrou-se isolada das demais. Possívelmente, tal fato pode ser
explicado pelo manejo destes rebanhos com acasalamentos controlados, pois estes
pertencem a selecionadores da raça com tendência em manter esses animais em estado
de pureza racial.
As raças Repartida e Moxotó encontram-se mais próximas, fato que pode ser
atribuído pela forma como o rebanho foi originado, pela compra de animais, tomando
85
basicamente como referência a cor da pelagem; provavelmente, eram indivíduos
mestiços com estreita relação genética proporcionada por história evolutiva comum.
Por outro lado, observa-se uma nítida separação das raças Serrana Azul e Graúna
das demais e uma elevada correspondência entre essas duas populações. Este resultado
pode ser explicado por acasalamentos entre indivíduos desses rebanhos, permitindo
maior troca de genes entre eles, pois os rebanhos pertencem a um mesmo criador.
A análise fatorial de correspondência para todos os indivíduos encontra-se na
Figura 4. Este tipo de análise permite uma melhor visualização da distribuição dos
indivíduos dentro das populações estudadas. Pode-se verificar que os indivíduos Marota
e Canindé são os que apresentaram maior distinção dos demais. Enquanto, os indivíduos
Moxotó e Repartida apresentaram maior correspondência entre eles, o que foi observado
também com os indivíduos Serrana Azul e Graúna.
Com esta perspectiva, pode-se observar que cada raça caprina nativa brasileira
apresenta algumas particularidades e que, a partir daí, a gestão de população deve ser
determinada pelos programas de conservação de recursos genéticos com bastante
critério, levando-se em consideração o tamanho efetivo da população, grau de
variabilidade genética e a finalidade específica de cada raça.
86
Serrana Azul
Graúna
Moxotó
Repartida
Marota
Canindé
Figura 4 – Representação espacial de todos os indivíduos analisados segundo a análise
fatorial de correspondências.
Figure 4 - Spatial representation of individuals analysed factorial correpondence analysis.
87
Conclusões
Os resultados de polimorfismo genético indicaram que existe elevada
variabilidade genética intra-racial nas populações caprinas estudadas.
Considerando a estrutura genética da espécie caprina, pode-se considerar que
existe uma boa diferenciação genética entre as raças brasileiras.
88
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89
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90
Capítulo III
Distância genética entre raças caprinas nativas brasileiras,
ibéricas e canárias usando microssatélites
91
Distância Genética entre Raças Caprinas Nativas Brasileiras, Ibéricas e Canárias
Usando Microssatélites
Resumo - O objetivo deste trabalho foi verificar a diversidade genética entre raças
caprinas nativas brasileiras, ibéricas e canárias usando microssatélites. Foram coletadas
amostras de pêlos e/ou sangue das raças brasileiras: Moxotó, Canindé, Serrana Azul,
Marota, Repartida e Graúna; das raças espanholas: Murciana-Granadina, Malagueña,
Blanca Andaluza, Blanca Celtiberica; das raças canárias: Majorera, Terifenha e
Palmera; da raça portuguesa: Serpentina e da raça suiça: Saanen. Foram selecionados 27
microssatélites: BM6506, BM8125, BM1818, CSRD247, ETH225, HAUT27,
ILSTS011, INRA63, INRA5, SPS115, TGLA122, BM6526, CSRM60, CSSM66,
ETH10, INRA6, MM12, HSC, McM527, SRCRSP8, OarFCB48, BM1329, OarFCB11,
OarFCB304, INRA23, MAF209 e MAF65, amplificando-se mediante técnica de reação
em cadeia de polimerase (PCR). As populações analisadas apresentaram elevados
valores de variabilidade genética intra-racial. O valor de Fit foi de 19,9%. O coeficiente
de diferenciação genética Fst para todos os loci analisados indica que 13,3% da
variabilidade genética total foi representada pela diferença entre populações e que
86,7% correspondem às diferenças entre os indivíduos. As relações genéticas entre
raças caprinas brasileiras, ibéricas e c anárias permitiram a formação de três
agrupamentos geneticamente distintos.
Palavras-chave: caprinos, conservação genética, marcadores moleculares, diversidade
genética
92
Genetic Distance Among Native Brazilian Breeds, Ibericas, and Canaries Using
Microsatellites
Abstract - The objective of this work was to verify the genetic diversity between
brazilian, iberians and canaries breeds goats using microsatellites. Samples of hair
and/or blood were collected of brazilian breeds: Moxotó, Canindé, Serrana Azul,
Marota, Repartida and Graúna; Spanish Breeds: Murciana-Granadina, Malagueña,
Blanca Andaluza and Blanca Celtiberica; Breeds Canaries: Majorera, Tenerifeña and
Palmera; Portuguese Breed: Serpentina and breed Swizo: Saanen. A panel of 27
microsatellites were selected: BM6506, BM8125, BM1818, CSRD247, ETH225,
HAUT27, ILSTS011, INRA63, INRA5, SPS115, TGLA122, BM6526, CSRM60,
CSSM66, ETH10, INRA6, MM12, HSC, McM527, SRCRSP8, OarFCB48, BM1329,
OarFCB11, OarFCB304, INRA23, MAF209 and MAF65, being amplified by the
polimerase chain reaction (PCR). The goat populations showed high values of intraracial genetic variability. The value of Fit was of 19,9%. the coefficient of genetic
differentiation Fst for all of the analyzed loci indicated that 13,3% of the genetics total
variability were represented by the difference among populations, and that 86,7%
corresponded to the difference among individuals. The genetic relationships among
Iberian, Canaries and Brazilian breeds goats were illustrated, by the formation of three
groupings genetically different.
Keywords – goats, genetic conservation, molecular markers, genetic diversity
93
Introdução
De acordo com restos arqueológicos, a origem das cabras domésticas (Capra
hircus) sugere que sua domesticação foi por volta de 10.000 anos atrás. Segundo
Luikart et al. (2001), existem origens maternas múltiplas, sendo três linhagens distintas
de (Capra hicus) com possível centro de origem na Ásia. A partir daí, pela facilidade
relativa de transporte e adaptabilidade, as cabras acompanhavam os homens em suas
viagens, sendo levadas para Europa e África e, posteriormente, repartidas pelo mundo.
O processo de conquista do novo mundo pode ser dividido em três fases:
inicialmente pela fase de descobrimento e exploração, em que os animais eram
indispensáveis na alimentação dos colonizadores. Em seguida, a fase de conquista, com
a utilização de animais para guerra, sobretudo o cavalo como elemento principal e suíno
para alimentação. E finalmente, a fase de colonização com a introdução de animais
domésticos, promovendo mudanças na fauna do novo mundo (Rodero et al., 1992).
Segundo Primo (1992), a distribuição e as características dos rebanhos crioulos na
América são, em parte, conseqüência de sua história. De acordo com Mariante e
Cavalcante (2000), diferentes agrupamentos de caprinos procedentes da Espanha, de
Portugal e da África teriam sido levados nas viagens do descobrimento, formando os
rebanhos iniciais do Brasil. Na colonização americana, geralmente, as rotas dos
colonizadores tinham parada obrigatória nas ilhas Canárias, Madeira e Cabo Verde,
antes de seguir viagem à América. Contudo, havia um intercâmbio de animais antes
mesmo da chegada dos barcos ao novo mundo (Capote et al. 2002).
Atualmente, existem poucos estudos genéticos em caprinos no Brasil. Oliveira
(2003) verificou a variabilidade genética em populações da raça Moxotó, utilizando
marcadores RAPD. Enquanto Araújo (2004), em populações das raças Saanen, Alpina e
Moxotó, analisou a diversidade genética, usando marcadores microssatélites.
Em estudos de relações genéticas, Machado et al. (2000) avaliaram a distância e
árvore taxonômica das cabras crioulas do Brasil, comparando as cabras européias e
africanas mediante freqüências alélicas em cada população para algumas características
morfológicas e verificaram que as cabras crioulas são mais próximas às cabras
européias do oeste do continente do que às cabras norte-africanas, balcânicas ou
mediterrâneas insulares.
O objetivo deste trabalho foi verificar a variabilidade e as relações genéticas entre
raças caprinas nativas Brasileiras, Ibéricas e Canárias utilizando microssatélites.
94
Material e métodos
Amostras e extração de DNA
Foram coletadas amostras de pêlos e/ou sangue das raças caprinas brasileiras:
Moxotó (Paraíba e Rio Grande do Norte), Canindé (Rio Grande do Norte), Serrana Azul
(Paraíba), Marota (Piauí), Repartida (Bahia) e Graúna (Paraíba); Raças espanholas:
Murciana-Granadina (Murcia e Granada), Malagueña (Malága), Blanca Andaluza
(Córdoba), Blanca Celtiberica (Albacete); Raças Canárias: Majorera (Fuerteventura e
Tenerife), Terifeña (Tenerife) e Palmera (Las Palmas); Raça Portuguesa: Serpentina
(Alentejo) e Raça Suiça: Saanen (Córdoba-ES e Recife-PE). Neste estudo foram
utilizados duas populações de cabras selvagens: Creta e Ibice, além de uma população
de ovino como grupo controle. O DNA das amostras foi extraído segundo a
metodologia proposta por Walsh et al. (1991).
Microssatélites e PCR
Foram selecionados 27 microssatélites: BM6506, BM8125, BM1818, CSRD247,
ETH225, HAUT27, ILSTS011, INRA63, INRA5, SPS115, TGLA122, BM6526,
CSRM60, CSSM66, ETH10, INRA6, MM12, HSC, McM527, SRCRSP8, OarFCB48,
BM1329, OarFCB11, OarFCB304, INRA23, MAF209 e MAF65 para, posteriormente,
serem amplificados mediante a técnica de reação em cadeia de polimerase (PCR), com
25 μL de volume final de uma reação com: 5 μL de DNA, 2,5 mM de cloreto de
magnésio, 1 unidade de Taq Polimerase, 200 mM de dNTPs e 0,25 mM de primers.
Preparadas as reações, foram levadas a um termociclador e submetidas às seguintes
condições de amplificação: 10 minutos a 94°C, seguidos de 35 ciclos de 94°C por 30'',
55°C para a maioria dos marcadores e a 60ºC (CSRM60 e INRA23) por 45'' e 72°C por
30'', finalmente, após os 35 ciclos, acrescentou-se 10' a 72°C.
Os produtos amplificados foram submetidos à eletroforese em gel de
poliacrilamida em um seqüenciador automático ABI 377XL (Applied Biosystems,
Foster City CA, USA). As análises de fragmentos e a tipificação alélica realizaram-se
com auxílio dos programas informáticos GeneScan Analisys v. 3.7 e Genotyper v. 2.5,
respectivamente.
95
Análises estatísticas
As frequências alélicas e heterozigosidades e índices de fixação (Fis) foram
calculados com o auxílio do programa informático Genetix versão 4.0.4, proposto por
Belkhir et al. (1999).
As distâncias genéticas entre as populações foram calculadas de acordo com a DA
de Nei et al. (1983), usando o programa computacional POPULATIONS v. 1.2.28
(Langella, 1999). Os dendrogramas gerados a partir das matrizes de distância genética
foram determinados por agrupamentos pelo método de NEIGHBOR, modelo de
PHYLIP v. 3.57c, com o pacote computacional (Felsentein, 1995) e foi utilizado o
software TREEWIEN (Page, 1996).
Para construir as árvores filogenéticas com indivíduos como unidades
taxonômicas operativas (OTU), utilizou-se o programa informático MICROSAT v.1.5b
desenvolvido por Minch (1998) para calcular os pares de distâncias genéticas entre
indivíduos, baseados na proporção de alelos compartilhados DSA (Bowcock et al. 1994).
As árvores filogenéticas foram construídas mediante o modelo NEIGHBOR do
programa PHYLIP versão 3.57c (Felsenstein, 1995), aplicando-se TREEWIEW (Page,
1998).
Para estudos de associação entre as diferentes subpopulações analisadas e a
distribuição das frequências alélicas dos diferentes marcadores utilizados, realizou-se
análise fatorial de correspondência, que é um tipo de análise canônica particularmente
adaptada para descrever as associações entre duas variáveis qualitativas (análise de uma
tabela de contingência), utilizando o programa computacional Genetix v. 4.0.4 software
(Belkhir et al., 1996).
96
Resultados e discussão
Na Tabela 1, são apresentados os valores de variabilidade genética intra-racial, o
índice de fixação (Fis) e o desvio do equilíbrio de Hardy-Weinberg (HW) para todas as
raças caprinas estudadas. A Blanca Celtibérica foi a raça que apresentou o maior
número médio de alelos (7,96). Por outro lado, o menor valor encontrado foi para raça
Palmera (4,29). Os valores de heterozigosidade média esperada seguiram a mesma
tendência para essas duas raças, com maior diversidade genética para a raça Blanca
Celtibérica (0,69) e a menor para a raça Palmera (0,53). Para os valores de
heterozigosidade média observada, a maior variabilidade genética encontrada foi para a
raça Saanen (0,65) e a menor para a raça Serrana Azul (0,52). O maior valor de Fis foi
obtido para a raça Moxotó (0,13) e o menor para a raça Palmera (–0,02). Apenas as
raças Majorera e Moxotó apresentaram desvios do equilíbrio de Hardy-Weinberg
(P>0,10).
Os elevados valores de variabilidade genética intrapopulacional para as raças
Blanca Andaluza e Blanca Celtibérica, valores de Fis de (0,09 e 0,07), respectivamente,
e o desequilíbrio de Hardy-Weinberg significativo (P>0,05) sugerem que,
possivelmente, tenham ocorrido acasalamentos com reprodutores de outras raças nestes
rebanhos, permitindo maior variabilidade genética, pois são raças nativas consideradas
de proteção especial e os rebanhos são relativamente reduzidos. Apesar dos valores de
Fis inferiores a 10%, verifica-se tendência de possível subdivisão dentro destas
populações com altas diferenças entre indivíduos, confirmado pelo desvio do equilíbrio
de Hardy-Weinberg.
Portanto, esta prática é um perigo para conservação destas raças. Com a criação
recente da Associação de Criadores da Raça Blanca Celtibérica, espera-se, em um
futuro próximo, rebanhos mais controlados. Com relação à raça Blanca Andaluza,
atualmente existem alguns projetos de conservação que também podem contribuir com
a manutenção desta raça.
Para as raças Murciana-Granadina e Malagueña, os resultados seguem a mesma
tendência, porém, são raças de fomento, com rebanhos maiores que permitem uma
maior troca de genes dentro de cada raça, permitindo valores de Fis relativamente altos
(0,08 e 0,09), respectivamente, provocando desequilíbrio nas populações, com maiores
diferenças entre indivíduos dentro das populações. Como são raças comerciais, estes
resultados são previsíveis.
97
A raça Palmera apresenta número médio de alelos e heterozigosidade esperada
mais reduzidos, porém o valor de heterozigosidade observada (0,55) foi superior à
esperada (0,53), demonstrando que, apesar do elevado valor de heterozigosidade, não
houve diferenças significativas para o equilíbrio de Hardy-Weinberg. Provavelmente,
este fato pode ser explicado pelo menor número de indivíduos desta raça, assim como
pelo reduzido fluxo gênico intra-rebanhos e entre outras raças. Conseqüentemente,
existe menor diferença entre os indivíduos dentro dessas populações.
Para as raças Serrana Azul, Moxotó, Marota, Canindé, Repartida e Graúna,
verifica-se níveis elevados de variabilidade genética intra-racial, apesar do reduzido
número de animais destas populações e do manejo reprodutivo aplicado com a
utilização de poucos reprodutores. Estes valores estão de acordo com vários estudos na
espécie caprina (Yang et al., 1999; Saitbekova et al., 1999; Barker et al., 2001; Li et al.,
2002; Araújo, 2004).
Tabela 1 – Número de amostras (N), número de alelos (NA), heterozigosidade média
esperada (He), heterozigosidade média observada (Ho), índice de fixação
(Fis) e deviação do equilíbrio de Hardy-Weinberg (HW) para todas as raças
caprinas analisadas
Table 1 - Number of samples (N), average number of alleles (NA), average observed heterozygosity (Ho)
average expected heterozygosity (He), average inbreeding coefficient(Fis) and deviations
from Hardy-Weinberg equilibrium(HW) for all analysed breeds goats
Populações
Populations
Majorera
Palmera
Tenerifeña
Serrana azul
Moxotó
Marota
Canindé
Repartida
Graúna
Malagueña
Branca Andaluza
Murciana-Granadina
Branca Celtibérica
Saanen
Serpentina
** (P>0,05), *** (P>0,10)
N
NA
Ho
He
Fis
HW
40
34
40
40
40
40
40
40
39
40
40
40
40
36
40
6,85
4,29
5,66
5,85
5,70
5,80
5,88
6,51
6,52
7,18
7,11
7,11
7,96
6,81
7,29
0,59
0,55
0,59
0,52
0,53
0,59
0,60
0,61
0,61
0,64
0,64
0,62
0,64
0,65
0,63
0,65
0,53
0,60
0,57
0,61
0,61
0,63
0,64
0,62
0,69
0,68
0,67
0,69
0,66
0,66
0,10
-0,02
0,04
0,08
0,13
0,04
0,06
0,07
0,03
0,09
0,09
0,08
0,07
0,03
0,05
***
ns
ns
**
***
ns
**
**
ns
**
**
**
**
ns
**
As raças Saanen e Serpentina apresentaram grau de variabilidade genética intraracial alto, demonstrados pelos elevados valores de número médio de alelos e
heterozigosidade observada, assim como pelo nível de diversidade genética verificado
através do valor de heterozigosidade esperada de 0,66 para as duas raças. Estes valores
98
podem ser atribuídos à gestão destas populações, pois são raças comerciais, com um
número elevado de animais, em que ocorre maior fluxo de animais entre os respectivos
rebanhos.
Os resultados elevados de Fis de 0,13 e 0,10 para as raças Moxotó e Majorera,
respectivamente, é um indicativo de populações heterogêneas. Possivelmente, este fato
pode ser reflexo de vários fatores como: subdivisão das populações, presença de alelos
nulos não identificados ou consanguinidade, proporcionando maiores diferenças entre
os indivíduos dentro das populações. Consequentemente, ocorreu desvio do equilíbrio de
Hardy-Weinberg para essas duas populações.
A partir dos dados de microssatélites, obteve-se os resultados da estrutura das
populações, de acordo com as Estatísticas de F, apresentados na Figura 1. O valor de Fit
foi de 19,9%. O coeficiente de diferenciação genética Fst para todos os loci analisados
indica que 13,3% da variabilidade genética total foi representada pela diferença entre
populações, e que 86,7% correspondem a diferença entre indivíduos. Este resultado
sugere uma elevada diversidade genética entre as raças estudadas, valor relativamente
alto para a espécie caprina. Li et al. (2002) verificaram Fst de 10,5%, em caprinos
chineses. Enquanto que, Barker et al. (2001) reportaram Fst de 14,3%, em cabras
asiáticas.
O Fis de 6,6% para todos os loci demonstra que existem moderadas diferenças
entre os indivíduos dentro das subpopulações. Este resultado pode ser atribuído a uma
troca de genes equilibrada, em que não há excesso ou deficiência de indivíduos
heterozigotos.
Li et al. (2002), estudando diversidade genética em raças caprinas chinesas,
encontraram Fis de 3%, resultado inferior ao encontrado neste trabalho. Ao contrário,
Barker et al. (2001), estudando diversidade genética, em caprinos asiáticos, verificaram
altos valores de Fis 23%. Segundo esses autores, este resultado pode ser explicado por
alguns fatores como: presença de alelos nulos ou alelos mal tipificados, efeito de
Wahlund (população subdividida) ou seleção contra heterozigotos.
99
Valores (%) para todos os loci
25
20
19,9
13,3
15
10
6,6
5
0
Fit
Fis
Fst
Estatisticos de F
Figura 1 – Estatísticas de F (Fit, Fis e Fst) para todos os loci analisados.
Figure 1 – F- Statistics (Fit, Fis e Fst) for all analysed loci.
A matriz de distância genética DA, proposta por Nei et al., (1983), encontra-se na
Tabela 2. Os resultados da Matriz de DA demonstraram as maiores diferenças genéticas
para as populações de cabras selvagens e de ovino, comparando-se com as populações
de cabras domésticas estudadas. Verificou-se que as raças Moxotó e Repartida são as
populações geneticamente mais similares, enquanto, as raças Palmera e Serrana Azul
são as mais distintas.
Na Figura 2, encontra-se o dendrograma baseado no método de agrupamento de
Neighbor–Joining (NJ), com 1.000 permutações para reamostragem dos loci para todas
as populações analisadas. Verificou-se neste dendrograma apenas os valores de
bootstrap acima de 50. No entanto, pode-se verificar claramente a formação de três
agrupamentos geneticamente distintos. O grupo das raças caprinas Ibéricas formou-se
com uma estreita relação entre Malagueña e Blanca Andaluza, seguidas por MurcianaGranadina e Blanca Celtibérica, e a Serpentina e Saanen aparecem um pouco mais
distante das raças espanholas. No grupo das raças Canárias, verificou-se uma maior
proximidade entre as raças Tenerifeña e Majorera, enquanto a raça Palmera encontra-se
um pouco mais distante.
E finalmente, o grupo formado pelas raças brasileiras, demonstrando maiores
relações genéticas entre Moxotó, Repartida e Canindé. Assim como, para raças Serrana
Azul e Graúna, distintas das demais. Para raça Marota demonstra-se ser uma população
mais isolada das demais.
100
Tabela 2 – Matriz de distâncias genéticas DA para todas as raças caprinas estudadas
Table 2 – Matrix of distance genetics DA for all breeds goats estudieds
S.A
MO
MA
CA
RE
GR
MJ
PA
TN
BA
BC
ML
S.A
*
MO
0,126
*
MA
0,162
0,118
*
CA
0,158
0,106
0,160
*
RE
0,155
0,092
0,137
0,104
*
GR
0,097
0,133
0,134
0,154
0,149
*
MJ
0,314
0,291
0,251
0,277
0,254
0,244
*
PA
0,389
0,368
0,307
0,334
0,344
0,330
0,130
*
TN
0,349
0,343
0,288
0,303
0,315
0,293
0,115
0,124
*
BA
0,298
0,301
0,245
0,261
0,258
0,225
0,207
0,265
0,217
*
BC
0,296
0,305
0,261
0,248
0,267
0,239
0,229
0,285
0,234
0,107
ML
0,298
0,274
0,265
0,230
0,241
0,237
0,204
0,266
0,215
0,099
0,104
*
MG
0,353
0,335
0,299
0,277
0,280
0,275
0,235
0,282
0,235
0,117
0,111
0,123
MG
SN
SE
CR
OV
IB
*
*
SN
0,250
0,247
0,239
0,228
0,221
0,178
0,257
0,323
0,267
0,138
0,151
0,157
0,168
*
SE
0,275
0,275
0,262
0,221
0,243
0,234
0,236
0,308
0,256
0,110
0,098
0,118
0,133
0,130
CR
0,577
0,596
0,538
0,543
0,596
0,517
0,468
0,510
0,442
0,392
0,382
0,416
0,418
0,531
0,418
*
OV
0,664
0,707
0,673
0,683
0,691
0,648
0,710
0,723
0,710
0,644
0,657
0,710
0,683
0,668
0,668
0,690
*
IB
0,583
0,581
0,561
0,532
0,550
0,541
0,497
0,542
0,510
0,479
0,487
0,483
0,509
0,554
0,512
0,607
0,768
*
*
SA- Serrana Azul; MO- Moxotó; MA- Marota; CA- Canindé; RE- Repartida; GR- Graúna; MJ-Majorera; PA- Palmera; TNTenerifeña; BA- Blanca Andaluza; BC- Blanca Celtibérica; ML- Malagueña; MG- Murciana-Granadina; SN- Saanen; SESerpentina; CR- Creta; OV- Ovis e IB- Ibice
Números em negrito sao os menores e maiores valores para DA
Numbers in bold face are lowest and highest values for DA
Utilizaram-se, neste estudo, amostras de duas populações de cabras selvagens
(Creta e Ibice) e uma raça ovina como grupo controle, verificando-se distintas relações
genéticas com os grupos das raças domésticas estudadas. A utilização de um grupo
controle com uma espécie próxima como, neste caso, a ovina, contribui com a
interpretação dos resultados filogenéticos e oferece uma idéia ao longo do tempo como
foi a distribuição genética das raças estudadas.
Em uma análise global, de acordo com a história evolutiva das raças, verificou-se
que, apesar das diferenças genéticas atuais entre as raças Ibéricas, Canárias e
Brasileiras, no passado remoto, houve uma influência genética de cabras selvagens,
neste caso, Creta e Ibice na formação das raças caprinas Ibéricas e Canárias,
posteriormente, contribuíram geneticamente com a origem das raças brasileiras.
Estes resultados corroboram com a história sobre a introdução dos animais
domésticos à América, descrita por Rodero et al. (1992), em que estes autores afirmam
que as populações de animais da Península Ibérica e Canárias influenciaram na
101
formação da maioria das raças crioulas, já que as rotas dos navegantes da época
iniciavam-se nos portos de Portugal e Espanha com escalas nas ilhas Madeira e
Canárias, respectivamente, e daí seguiam viagem com destino ao novo mundo.
Alguns aspectos devem ser ressaltados para esta época quanto à formação dos
animais ibero-americanos. Primeiro, que neste momento não existia um conceito de raça
definido, segundo informou Rodero et al. (1992). Apenas no final do último século
foram considerados o cavalo (Raça Pura Espanhola), o carneiro (Merino Espanhol), o
touro (Lidia) e a cabra (Murciana-Granadina) como raças. Nesta época, os animais eram
definidos pela identificação geográfica ou pela cor da pelagem. No entanto, os animais
que foram levados ao novo continente eram procedentes de várias cores de pelagem e
distintos tipos de estruturas morfológicas.
Ao longo dos tempos, através de sucessivos acasalamentos entre indivíduos desses
rebanhos, formaram-se diferentes raças caprinas brasileiras que, atualmente, apresentam
uma identidade genética, distinta das raças Ibéricas e Canárias e totalmente adaptadas
aos sistemas ecológicos naturais. Este fato pode ser explicado por motivos históricos e
genéticos.
Antigamente, devido às dificuldades de transporte de animais vivos, o cavalo era
um animal que apresentava prioridades nas tripulações pela necessidade desses animais
nas guerras. Assim, a maioria das outras espécies eram levadas desde escalas posteriores
nas Ilhas Canárias e em Cabo Verde e não partiam da Península Ibérica. Geralmente, as
embarcações não podiam levar muitos animais e algumas espécies eram utilizadas na
alimentação dos navegadores (caprinos e galinhas).
Contudo, pode-se verificar que, do ponto de vista genético, as populações caprinas
atuais formaram-se a partir de um reduzido número de animais fundadores e que no
processo de expansão destas populações, apresentavam uma constituição genética
distinta das originais, possivelmente pelo efeito de deriva genética, aliado a uma seleção
natural devido às condições ambientais. Para Mariante e Cavalcante (2000), o longo
processo de seleção natural a que estiveram submetidos os caprinos do Nordeste,
resultou na formação de animais de pequeno porte, com alta fertilidade e rusticidade
adaptados às condições da região semi-árida do país.
102
Ovis
Ibice
Saanen
Serpentina
B. Celtibérica
M.Granadina
Malaguenha
B. Andaluza
68
68
Creta
86
57
86
Majorera
Tenerifenha
Moxotó
59
Palmera
Repartida
Canindé
Marota Graúna
S. Azul
0.1
Figura 2 – Dendrograma de NJ baseado na distância genética Da de Nei et al. (1983),
com 1.000 permutações.
Figure 2 – Dendrogram of relations between studied populations using neighbour-joining method based
on the Da genetic distance of Nei et al. (1983), with 1000 permutations.
103
De acordo com Primo (1999), os caprinos do Brasil são derivados de animais do
Sul da Espanha, além de uma possível influência de caprinos da África (1532 a meados
de 1850), com alguns animais utilizados para alimentação nas tripulações dos navios
negreiros. Enquanto, Mariante e Cavalcante (2000) reportaram que as primeiras cabras
brasileiras originaram-se de animais das atuais raças portuguesas (Alentejana,
Ribatejana e Serrana), com datas da época do governo geral de Tomé de Souza (1549).
Segundo Tudela (1987), citado por Rodero et al. (1992), os caprinos do novo
continente apresentavam uma adaptação e dispersão por todo o continente, desde áreas
quentes a frias. Possivelmente, esses animais são procedentes das Canárias, Andaluzia e
outras populações de Cabo Verde e Guinea. As características morfológicas similares
entre as populações atuais e as populações originais são evidentes.
Entretanto, pode-se verificar, pelos resultados deste estudo com marcadores
moleculares, que a caracterização genética baseada exclusivamente em caracteres
morfológicos não é suficiente para identificar e definir as raças. Tal fato pode ser
verificado neste trabalho, que apesar da semelhança das cores da pelagem das raças
Moxotó e Serpentina, são duas raças geneticamente diferentes, possivelmente pelo
efeito de deriva genética. Por outro lado, as raças Serrana Azul e Graúna possuem
pelagem distintas; no entanto, apresentam estreitas relações genéticas, possivelmente,
houve uma troca de genes entre essas populações, pois esses dois rebanhos pertencem
ao mesmo criador. Este resultado é interessante para mostrar que, em geral, na seleção
de indivíduos, deve-se levar em consideração outros critérios, além da cor da pelagem.
Na Figura 3, encontra-se o dendrograma de indivíduos como unidade taxonômica,
em que a maioria dos indivíduos se agrupou com as respectivas raças caprinas; no
entanto, verifica-se intercâmbio entre indivíduos de algumas raças como Blanca
Celtibérica, Blanca Andaluza, Malagueña, Serpentina, Serrana Azul e Graúna;
possivelmente, estas raças apresentam alguns alelos em comum ou também podem
existir animais dentro das raças caprinas citadas que não apresentam pureza racial.
104
Blanca Celtibérica
Blanca Andaluza
Murciana Granadina
Malagueña
Saanen
Serpentina
Palmera
Tenerifeña
Majorera
Serrana Azul
Graúna
Marota
Moxotó
Canindé
Repartida
0.
Figura 3 – Dendrograma de indivíduos baseada pelo método de UPGMA.
Figure 3 - Dendrogram of relations between individuals based on UPGMA method..
105
As análises das relações genéticas entre populações podem ser representadas
graficamente
no
espaço
bidimensional
canônico
pela
análise
fatorial
de
correspondência, apresentadas na Figura 4.
Serrana Azul
Graúna
Moxotó
Repartida
Marota
Canindé
Tenerifeña
Majorera
Palmera
Serpentina
Saanen
Murciana-Granadina
Malagueña
Blanca Celtibérica
Blanca Andaluza
Figura 4 - Representação espacial das populações de cabras estudadas segundo a análise
fatorial de correspondência.
Figure 4 - Spatial representation of the studied goat populations using factorial correpondence analysis.
106
Os três eixos formados representam apenas 55% da variação total da análise de
correspondência, porém, pode-se observar claramente a separação dos grupos, formada
pelas cabras Ibéricas, Canárias e Brasileiras. E os resultados são semelhantes aos
verificados pela árvore de distância genética pelo método de agrupamento de NJ,
utilizada neste estudo.
Pode-se verificar que, no grupo Ibérico, as raças Serpentina e Saanen apresentamse mais distantes das raças espanholas, e que há uma estreita relação genética entre as
raças Malagueña, Murciana-Granadina, Blanca Celtibérica e Blanca Andaluza.
Para raças Canárias, verifica-se uma maior afinidade genética entre as raças
Tenerifeña e Palmera, enquanto que a raça Majorera encontra-se um pouco mais
distante dentro deste grupo.
As raças Brasileiras apresentaram claramente subgrupos distintos, o primeiro
formado pelas raças Moxotó, Repartida e Canindé, e o segundo pelas raças Serrana
Azul e Graúna. A raça Marota apresentou-se distinta das demais.
107
Conclusões
As raças caprinas Ibéricas, Canárias e Brasileiras estudadas apresentam elevados
níveis de variabilidade genética intra-racial.
As raças caprinas Ibéricas e Canárias são as possíveis progenitoras das raças
brasileiras, mas estas últimas apresentam uma identidade genética distinta das demais.
A caracterização genética dos animais não deve ser baseada exclusivamente em
caracteres morfológicos. Atualmente, os marcadores moleculares são ferramentas úteis
para identificar e caracterizar a estrutura genética das populações.
108
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110
Conclusões Gerais
Os microssatélites podem ser utilizados em estudos de variabilidade genética das
raças caprinas nativas brasileiras, auxiliando os programas de conservação de recursos
genéticos do País.
Os marcadores moleculares são ferramentas úteis para estabelecer a estrutura
genética das populações e que a caracterização genética dos animais deve ser baseada
em caracteres morfológicos associados à genética molecular.
As raças caprinas brasileiras estudadas apresentam uma elevada variabilidade
genética intra-racial. Porém, algumas raças necessitam de uma gestão de população
eficiente para manter a variabilidade e evitar a erosão genética.
Há pouca diferenciação genética entre as populações caprinas brasileiras
estudadas; no entanto, são níveis aceitáveis de distância genética para espécie caprina e
que podem ser consideradas raças geneticamente distintas.
As raças caprinas nativas Ibéricas, Canárias e Brasileiras apresentaram níveis
elevados de variabilidade genética intrapopulacional.
As raças Ibéricas e Canárias são as possíveis progenitoras das raças caprinas
nativas brasileiras, de acordo com a história do descobrimento das Américas, em que a
maioria dos animais domésticos do Brasil foram trazidos pelos portugueses e espanhóis.
Atualmente, as raças brasileiras apresentam uma identidade genética. Esses
recursos genéticos são patrimônios genéticos distintos dos demais e devem ser
conservados e utilizados como uma alternativa adequada à realidade do sistema de
produção agropecuário da região Nordeste do Brasil.
Diante destas conclusões, espera-se que este estudo possa contribuir com a
sociedade, oferecendo aos criadores, técnicos e responsáveis políticos, valiosas
informações sobre a origem e relações genéticas das raças caprinas nativas brasileiras.
111
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