Revisão/Atualização em Hipertensão Arterial: Tratamento clínico de

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J. Bras. Nefrol. 1996; 18(1): 47-50
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A. N. Attalah - Revisão/Atualização em Hipertensão Arterial
Revisão/Atualização em Hipertensão Arterial: Tratamento
clínico de estados hipertensivos na gestação
Álvaro Nagib Atallah
Disciplina de Nefrologia - Escola Paulista de Medicina - UNIFESP
Endereço para correspondência: Prof Dr. Álvaro Nagib Atallah
Rua Pedro de Toledo, 598
CEP: 04039-001 - São Paulo,SP
FAX: (011) 574-6300
Introdução
A hipertensão arterial acomete cerca de 10% das
gestantes no mundo todo 1 .
A doença hipertensiva na gestante, do ponto de
vista prático, pode ser classificada em:
1. Hipertensão arterial crônica e gestação;
2. Doença hipertensiva específica da gravidez ou
pré-eclâmpsia;
3. Intercorrências hipertensivas na gestação Ex:
glomerulonefrite difusa aguda, e
4. Hipertensão arterial crônica com pré-eclâmpsia
associada.
Na assistência clínica a essas pacientes, os seguintes diagnósticos diferenciais não podem ser negligenciados: Feocromocitoma e gestação, Coartação da
aorta. Ambos, devido aos altos riscos aos quais se
expõem, mãe e feto, requerem atenção redobrada,
Lupus Eritematoso sistêmico / cologenoses e gestação.
Tr a t a m e n t o d a P r é - E c l â m p s i a
O diagnóstico de certeza de pré-eclâmpsia pura
nem sempre é fácil. Porém, seu diagnóstico é mais
provável quando a paciente é primigesta e desenvolve proteinúria e hipertensão arterial. Quando o quadro sindrômico se manifesta, já se pode supor que o
mesmo foi precedido de processo de início muito
anterior. Particularmente, já houve acometimento do
leito vascular útero placentário com ateromatose e
presença de áreas de infarto. O processo de isquemia
placentária é maior ainda nos casos de hipertensão
arterial prévia (pré-eclâmpsia associada). De tal forma
há que se manter em mente que o tratamento da
hipertensão arterial poderá afetar o fluxo plasmático
útero placentário. Pequenas hipotensões poderão levar ao óbito fetal intrauterino. Parece-nos que o tratamento mais lógico da pré-eclâmpsia seria aquele
que bloqueasse a ateromatose e a coagulação ao nível
da placenta. Neste sentido, os resultados dos estudos
randomizados controlados com derivados do óleo de
peixe (eucosanóides) foram pouco animadores e o
uso de aspirina, que despertou um entusiasmo inicial
com pequenos estudos, 2, 3, 4 não se confirmou em
estudo realizado por nosso grupo no Brasil, cujos
resultados foram também observados por dois outros
estudos bem conduzidos de grande porte 5, 6, 7 .
A hipertensão arterial das pacientes com préeclâmpsia tem sensibilidade não muito boa ao alfametildopa, embora possam responder a esta droga e
nada impede que seja tentada na dose inicial de 250 mg
de 8 em 8 horas.
Nos casos em que o feto é capaz de sobreviver no
berçário do hospital, o tratamento mais seguro é sempre a realização do parto. Entretanto, havendo necessidade de prosseguimento da gestação devido a
inviabilidade fetal, a hipertensão arterial precisará ser
controlada até a maturação fetal.
O tratamento inclui internação, dieta hipossódica
e repouso em decúbito lateral esquerdo. Como
hipotensor, se a diastólica for maior do que 110 mm
de Hg, utilizamos hidralazina parenteral ou nifedipina
oral, conforme descrito. 8 Para hipertensão, iniciamos
com prazozim 1 mg ou nifedipina 5 mg v/o com controle rigoroso da pressão arterial após a 1 a dose, que
A publicação desta seção foi possível graças à colaboração dos
Laboratórios Pfizer Ltda.
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será repetida a cada, na dependência da duração do
efeito (de 4 a 6 horas).
É muito importante que o controle da pressão
arterial seja feito com a paciente na posição de
decúbito dorsal e lateral, sentada e, também, de pé,
para que se previna hipotensão postural que poderá
ser prejudicial ao feto. Existem pacientes extremamente sensíveis ao prazozim, casos nos quais há
hipotensão intensa, efeito paradoxal da primeira
dose. O uso de hipotensores, quando a pressão
distólica é menor do que 100 mm de Hg, é discutível 9.
Desta forma, a 1 a dose da droga deve ser acompanhada de monitoramento médico e a pressão arterial ser medida a cada 5 minutos na 1 a hora, como no
caso de qualquer hipotensor potente.
Embora, frequentemente, tenhamos obser vado
grande ênfase no tratamento da hipertensão arterial
na pré-eclâmpsia, é muito importante que ao mesmo
tempo se previna a Eclâmpsia. Para tal, é necessário
que se atente aos sinais premonitórios de Eclâmpsia
Iminente. Estes podem ocorrer em qualquer for ma de
pré-eclâmpsia, independentemente da gravidade do
caso. Os sintomas e sinais são cefaléia, escotomas,
dor
epigástrica
e
aumento
dos
reflexos
osteotendíneos. Estes dados devem ser pesquisados
diariamente. Nos casos positivos, a administração de
sulfato de magnésio, segundo o esquema de Pritchard
10
, deverá prevenir a ocorrência de Eclâmpsia, conforme observado em ensaio clínico recentemente publicado 11 . O tratamento preventivo consiste em terapia
de ataque e de manutenção. Em estudo randomizado
controlado multicêntrico recente, verificamos ser o
sulfato de magnésio a droga de escolha para tratamento da convulsão na Eclâmpsia. 12 . Administra-se
dose de ataque de 5 g (10 ml a 50% ou 25 ml a 20%)
em injeção lenta, e.v, em tempo de 10 a 15 minutos.
A seguir, aplica-se 10 g IM, 5 g IM em cada nádega. No
caso de não haver sulfato de Mg a 50%, poder-se-à
manter o medicamento EV com bomba de infusão ou
gotejamento contínuo controlado a ponto de completar 1 g por hora.
A terapia de manutenção é feita com doses de
sulfato de magnésio 5 g IM (2,5 g em cada nádega)
a cada 4 horas.
Cuidados com o Uso do Sulfato de
Magnésio
A concentração plasmática normal do Mg no soro
é em torno de 2,0 mEq/l. A sua toxidade consiste em
causar bloqueio da placa mioneural, com efeito semelhante a curarização, mas isto só ocorre com concentrações plasmáticas elevadas, maiores que 7mEq/l,
quando os reflexos osteotendíneos patelares já desapareceram 13. De forma que, antes de iniciar-se ou
administrar qualquer dose de sulfato de magnésio, é
necessário certificar-se sobre a presença dos reflexos
osteotendíneos.
Como o Mg é excretado por filtração glomerular,
o volume urinário precisa ser maior do que 50 ml/
hora para que possa ser excretado adequadamente. É
importante ter-se à disposição cálcio injetável para
antagonizar o Mg nos casos de intoxicação. Utiliza-se
gluconato de Cálcio EV, nos casos de suspeita de
intoxicação como fraqueza muscular, desaparecimento
de reflexos osteotendíneos e depressão ou parada
respiratória.
A Hemodinâmica na Pré-eclâmpsia
Discute-se muito os cuidados hemodinâmicos na
pré-eclâmpsia, particular mente com relação aos riscos
acarretados pela reposição de volume. Isto se deve à
pouca familiaridade com o manuseio clínico e
hemodinâmico em um tipo de doença, onde, realmente, a abordagem é complexa e deve ser
multidisciplinar. Mas o entendimento pode ficar mais
simples se lembrarmos que na pré-eclâmpsia o débito
cardíaco está geralmente diminuído, a resistência periférica está aumentada, a volêmia circulante efetiva
está diminuída, a pressão coloidosmótica está diminuída, facilitando o edema. Há proteinúria considerável,
há hemoconcentração, há ativação plaquetária com
liberação de tromboxane (potente vasoconstritor), há
estímulo simpático e aumento dos catecolaminas
circulantes, há isquemia placentária.
Diante destes fatos, teremos duas possibilidades
teóricas de abordagem prática: A primeiras possibilidade, dar apenas hipotensores que diminuem a resistência periférica. Neste caso, há aumento do continente, leito vascular com possibilidade maior de
hipotensão e piora da isquemia, já que o conteúdo
vascular (volume plasmático) per manece constante,
enquanto o volume do leito vascular aumenta.
A segunda possibilidade, repor volume e dar
hipotensor. Com isso o continente vascular aumenta e
a volêmia é reposta. Se o volume de reposição for a
albumina, a pressão oncótica aumenta, o risco de
hipotensão diminui, a hemoconcentração diminui, há
menor agressão às plaquetas (e menor ativação com
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queda na liberação de tromboxane), a ativação simpática é restringida, a isquemia placentária, pelo menos,
não piora.
Entretanto, a expansão mal controlada traz o risco
de se promover sobrecarga e insuficiência cardíaca
com possibilidade de ocorrência de edema agudo de
pulmão. Desta for ma, nós optamos, nos casos onde
há grande hipoalbuminemia, pela reposição de
albumina com administração lenta e cuidadosa, associada ao uso de furosemida EV e hipotensores, quando necessários. Obviamente, estas pacientes requerem
monitoração intensiva por clínicos experientes. Como
ressaltamos anterior mente, as condutas baseadas apenas em dados teóricos geram controvérsias as quais
só podem ser resolvidas com Estudos Randomizados
Controlados Duplo Cegos, de bom padrão. No nosso
conhecimento, ainda inexistentes sobre este assunto.
Tr a t a m e n t o d a H i p e r t e n s ã o A r t e r i a l
Crônica
1. Dieta:
Recomendamos dieta hipossódica. Entretanto, em
estudo prospectivo por nós redigido, 14 todas as pacientes quando perguntadas afirmavam estar fazendo
dieta hipossódica. Porém, foram medidas as excreções
de sódio em decúbito lateral esquerdo por duas horas
em todas elas em três fases da gestação, e constatou-se
que a excreção de sódio neste período de 2 horas foi
em média de 32 mEq, equivalente a aproximadamente
2 gramas, o que já seria além do fisiologicamente
necessário para as 24 horas, de forma que, embora
embasada em fundamentos teóricos lógicos, na prática, pouco se consegue reduzir a ingestão sódica. Em
nosso entendimento, qualquer opinião quanto ao efeito
da dieta hipossódica requer e depende, ainda, de estudos desenhados especificamente para tal. Entretanto,
nos parece de bom senso reduzir a ingesta de sal
nestes casos.
2. Medicação:
Só iniciamos drogas hipotensoras quando a
diastólica está acima de 100 mmHg, em posição sentada, confirmada com inter valo igual ou maior a 6
horas.
Iniciamos terapêutica com alfa metildopa 250 mg
8/8 horas, aumentando, quando necessário, até 2000
mg nas 24 horas.
Quando esta monoterapia não é suficiente, associamos clortalidona 50 mg, em dias alternados, podendo progredir até dose diária com suplementação
de potássio.
Este esquema tem sido eficaz na grande maioria
dos casos. Os casos gravemente refratários geralmente
se referem a pacientes não aderentes ao tratamento
que quando internadas e, na vigência de ingesta real
da medicação e dieta hipossódica, têm a pressão arterial controlada.
Pacientes que com este protocolo persistem com
diastólica acima de 110 mm de Hg, são então internadas e a eficácia da medicação verificada. Alguns casos
continuam com níveis pressóricos elevados. São então
tratadas na crise com hidralazina ou nifedipina.
A hidralazina é administrada na dose de 5 mg E.V.
com a paciente no decúbito lateral esquerdo com
venoclise e monitoramento da freqüência cardíaca
fetal na primeira hora. Nifedipina pode ser ministrada
também como alternativa, na dose de 5 mg (metade
do volume no qual a cápsula é dissolvida), conforme
já descrito por nós anteriormente. 8 Verificada a resposta pressórica e dos batimentos cardíacos fetais até
1 hora após a administração da droga, ela será repetida quando a pressão diastólica for maior ou igual a
110 mm de Hg. Nesta situação, o objetivo principal é
trazer a pressão arterial diastólica para o intervalo
entre 90 e 105 mm de Hg. Nos casos onde há
hipotensão (diastólica menor do que 90) e/ou alterações da cardiotografia fetal, pequenos volumes de
solução salina podem corrigir a situação.
3. O número de consultas
É bem definido na literatura que quanto maior o
número de consultas no pré-natal melhor é o prognóstico da gestação. Obviamente, a prática impõe limites. Aprendemos ser essencial a avaliação das pacientes a cada 2 semanas até a 32 a semana e, após a 32 a
,semanalmente até o parto. Embora, teoricamente, o
atendimento diário seja ideal, na prática em nosso
meio seria impossível colocar todas as gestantes nesse
tipo de assistência.
Em resumo, o atendimento da gestante em hipertensão arterial crônica requer assistência redobrada.
Ela deve ser multidisciplinar. Nossa experiência na
Casa Maternal e Infância de São Paulo de atendimento da paciente na mesma sala, pelo nefrologista e
pelo obstetra, nos parece bastante satisfatória. A colaboração integral de oftalmologista experimentado
em fundoscopias de gestantes é importante. Caso não
se disponha de oftalmologista, o médico assistente
pode ser treinado na detecção de espasmos oculares
ou cruzamentos patológicos no exame de fundo de
olho. Em estudo prospectivo Cohort, 14 verificamos ser
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Tabela 1
Utilidade dos exames oftalmoscópicos de gestantes hipertensas crônicas, em estudo prospectivo,
como preditivo de ocorrência de recém-nascidos de baixo peso ou óbito fetal, atribuíveis à
hipertensão arterial, na presença ou não de espasmos e/ou cruzamento patológicos.
Ponto Estimado
Sensibilidade
Especificidade
Valor Preditivo Positivo
Valor Preditivo Negativo
Eficiência
Risco Relativo
Qui-quadrado
Incidência
Intervalo de Confiança
83,0
54,0
35,0
91,0
61,0
4,0
12,2
23,0
%
%
%
%
%
(64,0 - 94,0)
(44,0 - 64,0)
(24,0 - 48,0)
(81,0 - 97,0)
(52,0 - 69,0)
(1,9 - 9,0)
(P < 0,0001)
%
a oftalmoscopia excelente teste preditivo, tanto para
complicações maternas como fetais, (tabela 1)
Após a 34 a semana de gestação, a incidência de
insuficiência respiratória dos recém-nascidos de mães
hipertensas é relativamente baixa e a antecipação do
parto deve estar sempre em mente, quando se quiser
bloquear o prosseguimento dos riscos materno-fetais
nas hipertensões de difícil controle.
A prática tem mostrado que após a 34a semana de
gestação, o parto previne maiores complicações materno-fetais, enquanto que a demora consequente ao
excesso de exames complementares pouco objetivos
costuma prolongar a exposição da mãe e do feto a
riscos desnecessários.
A coartação da aorta pode ser diagnosticada pelo
exame físico que inclui necessariamente a asculta cardíaca e a medida da pressão arterial nos quatro membros e com a utilização da ecocardiografia e do
ultrasom do abdome. A conduta pode ser clínica ou
cirúrgica, porém o controle pressórico durante a gestação e a cirurgia pós-parto poderão salvar a vida da
paciente. 15,16,17 O feocromocitoma é doença rara associada a gestação, porém seu diagnóstico precoce é
extremamente importante para o prognóstico materno
fetal. Os interessados poderam ter maiores informações em artigo já publicado. 18
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