Hinduísmo - lição 4 - Carlos João Correia

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HINDUÍSMO 4
MARK W. MUESSE
O Caminho da Devoção
Objectivo
O Hinduísmo sustenta não apenas que o divino é múltiplo, mas, também, a multiplicidade de
caminhos em direcção à realidade divina. Pessoas diferentes requerem espiritualidades diferentes.
No exame que fizemos do caminho da sabedoria, investigámos um dos caminhos mais influentes.
Nesta aula, iremos analisar um outro, a saber, o caminho de bakhti ou devoção. A nossa análise da
prática bhakti será feita através de um dos mais importantes e amados textos dos hindus, a
Bhagavad-Gītā. Esta história extraordinária do dilema de um guerreiro e o conselho do deus
Krishna tem sido um tesouro de enriquecimento espiritual para os Hindus há séculos. .
I.
Muitos hindus consideram que o caminho da devoção, ou bhakti, é mais apelativo do que o da
sabedoria. O caminho devocional consiste em focalizar o amor passional numa divindade pessoal,
tornando-a suprema acima do que quer que seja.
A. Novos textos acrescentados ao cânone hindu no período pós-clássico foram muito importantes
na formação da religiosidade hindu no âmbito do movimento bhakti. Estas obras incluem o
Mahābhārata e o Ramāyāna, as duas grandes epopeias da Índia, assim como a colecção conhecida
como os Purānas. Estes últimos, compostos entre os anos 300-1600 da nossa era, fornecem as fontes
da mitologia dos deuses e deusas hindus.
B. Examinaremos o bhakti-mārga através da Bhagavad-gītā (que é, na realidade, uma parte do
Mahābhārata). Embora não seja o texto mais sagrado, ou com maior autoridade, a Gītā é
frequentemente lida e muito bem conhecida.
II.
Vishnu, manifestando-se como Krishna, é um dos personagens centrais da Bhagavad-gītā.
A. Segundo a mitologia hindu, Vishnu é um membro da tríade cósmica, em que os três deuses têm
responsabilidade pela criação, pela manutenção e destruição do universo. Vishnu sustenta o cosmo
entre as épocas de criação e destruição.
B. A religião de Vishnu, conhecida como Vaiśnava, é a religião hindu mais popular.
C. Na iconografia, Vishnu é identificado pelos atributos simbólicos que ele traz nas suas mãos: um
maço simbolizando conhecimento; uma bola significando a Terra; um cakra ou disco, simbolizando
poder; e uma concha que sugere água e as origens da existência.
D. As características mais salientes de Vishnu são os seus avatāras ou incarnações. Significam
literalmente "descida em", referindo-se aos tempos em que os deuses desciam à Terra e assumiam
uma manifestação terrena em momentos críticos da história do mundo.
1. Do ponto de vista das práticas religiosas, os mais importantes avatāras de Vishnu foram
Krishna e Rāma.
!
2. Como Rāma, Vishnu surge na terra como uma figura real que derrota o raptor da sua
mulher no Ramāyāna.
3. Como Krishna, será lembrado como um rapaz e jovem brincalhão e aventureiro, assim
como pelo seu papel na Bhagavad-Gītā.
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4. Krishna é provavelmente um nome familiar aos Ocidentais por causa da Sociedade
Internacional para a Consciência de Krishna (ISKCON), conhecida como o movimento
"Hare Krishna".
III.
A Bhagavad-gītā, usualmente traduzida como a "Canção do Senhor" foi provavelmente composta
entre o ano 400 antes da nossa era e 100 depois, sendo desconhecido quem foi o seu autor ou
autores. Embora geralmente lido como uma história independente, a Bhagavad-gītā é uma parte do
Mahābhārata, provavelmente o poema épico mais longo do mundo com mais de 100.000 versos.
A. A Gītā é essencialmente um diálogo entre Vishnu, no seu avatāra como Krishna, e um guerreiro
de nome Arjuna, que se dá no campo de batalha, mesmo quando dois exércitos, os Kurus e os
Pandavas, iam iniciar uma guerra.
1.
Os Kurus e os Pandavas são membros do mesmo clã e é precisamente porque no campo
inimigo estão os seus tios, primos e professores que Arjuna está muito agastado.
2.
Subitamente toda a acção é suspensa, como se o tempo tivesse parado. Arjuna vê a sua
família nas linhas inimigas e deixa cair o seu arco, perdendo toda a vontade de lutar.
Surpreendentemente a primeira reacção de Krishna é envergonhar Arjuna, mas tal atitude
não demove este último.
3.
B. O conflito de Arjuna é profundo e genuíno e ele sente-se paralisado até conseguir ver claramente
o seu caminho. A sua perturbação interior é-nos bem familiar - o conflito que alguém sente
quando valores distintos, mas importantes, se confrontam.
1.
Este conflito torna-se um momento de privilegiado de ensino e Arjuna pede, com sabedoria,
que Krishna seja o seu mestre [guru].
2.
Arjuna recebe várias lições provenientes dos ensinamentos das Upaniśads, incluindo a do
sem-sentido último tanto do nascimento e da morte como da aversão em criar qualquer tipo
de karma.
C. Através dos ensinamentos de Krishna a Arjuna, qualquer leitor da Gītā pode obter uma visão
abrangente das práticas e visões do mundo hindus. Sem nunca ser simplista ou claro, a riqueza
da Gītā permite praticamente a cada hindu encontrar sentido na sua vida.
D. À medida que o diálogo continua, as lições de Krishna parecem focar-se cada vez mais nele
próprio, algo bem característico do caminho de bhakti. Krishna encoraja Arjuna em concentrar a
sua mente, a sua vontade e o seu coração no divino e não se inquietar. Para a prática bhakti, o
que é feito não é tão importante como o modo como é feito. O que importa é fazer todas as
coisas com fé e devoção no divino [god].
E. Num momento de clímax, Arjuna pede a Krishna que lhe dê uma dádiva [boon] rara, a saber, a
capacidade de ver Krishna na sua glória integral como divino. Krishna dá a Arjuna uma visão
divina com a qual ele pode percepcionar a forma divina.
F. Após esta visão, Arjuna levanta-se e vai lutar, declarando que as suas dúvidas se dissiparam,
embora nunca fique claro o que fez dissipar as suas dúvidas. Muito na Gītā é deixado sem
solução, apesar do próprio Arjuna ter clarificado a sua mente.
IV.
De uma forma significativa, a própria Gītā termina antes que saibamos o resultado final da batalha,
mas nem a vitória nem o problema da guerra foram a questão central da Gītā. O contexto da guerra
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é, apesar de tudo, importante na Gītā porque o campo de batalha é, na realidade, uma metáfora da
alma, de si próprio [self], da mente e das suas lutas - os Hindus comuns têm como seu dever sagrado
lutar interiormente com os dilemas do dharma. Como metáfora de nós próprios [self] e das suas
lutas interiores, talvez a Gītā nos recorde que frequentemente não existem caminhos [avenues]
claros para a escolha. As nossas decisões são tomadas na ambiguidade e na incerteza
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