Atividade Bacteriana como condicionantes ambientais da distribuição de foraminíferos e tecamebas em regiões estuarinas do Brasil Bacterial activity with environmental conditioning of foraminifera and thecamoebians distribution in estuarine systems from Brazil Laut, L.L.M.1; Silva, F.F.1; Bonetti, C.2; Figueiredo Jr., A.G.1 & Crapez, M.A.C.3 Departamento de Geologia – LAGEMAR – UFF ([email protected], [email protected], [email protected]) Departamento de Geociências – LOC – UFSC ([email protected]) Departamento de Biologia Marinha – MICROMAR – UFF ([email protected]) INTRODUÇÃO O sedimento de regiões estuarinas são intensamente colonizadas por microrganismos (cianobactérias e bactérias < 150µm), que chegam a um total de 1010 células/g. A maioria organizada em biofilmes numa complexa associação entre microrganismos e a matriz orgânica extracelular, que consiste em substâncias poliméricas (EPS). Desta forma são criados microhabitats com gradientes ecológicos, químicos e fisiológicos específicos. Além do oxigênio, os microrganismos utilizam outros aceptores de elétrons (Ni, Mn, Fé, Su, CO2) para a oxidação da matéria orgânica. Essas habilidades combinadas com o crescimento exponencial e o curto tempo de geração fazem dos microrganismos os que possuem maior diversidade metabólica, interagindo de forma positiva ou negativa com outros organismos (Meyer-Reil, 1994), e isto pode ser um fator determinante para a distribuição das espécies de foraminíferos (Van Lith et al. 2005) e tecamebas. Muitos estudos que focavam as estratégias alimentares de foraminíferos somente com algas e diatomáceas, porém sabe-se que os foraminíferos utilizam as bactérias como fonte de carbono. Muitas espécies de foraminíferos são dependentes de relações simbiontes em regiões oligotróficas e disóxicas (Ward et al. 2003; Moodeley et al. 2003). Contudo, o papel preciso que os foraminíferos desenvolvem como as bactérias, ainda, não é bem definido. E nenhum estudo relacionado à estratégia alimentar de tecamebas foi realizado. Este estudo teve como objetivo identificar possíveis correlações entre a biomassa bacteriana e atividade metabólica desenvolvida como a população de foraminíferos e tecamebas de cinco regiões estuarinas do litoral brasileiro. MATERIAIS E MÉTODOS Foram coletadas amostras de sedimento na região de inframaré com draga van Veen em cinco estuários da costa brasileiras: estuário do Potengi – RN; enseada de Mataripe – BA, delta do Paraíba do Sul – RJ, estuário do Suruí – RJ e estuário do Itacorubí – SC. Do sedimento recuperado foram separados 50 ml para análise de foraminíferos e tecamebas, 10 ml para carbono bacteriano (COB) e atividade respiratória bacteriana (aerobiose, fermentação, desnitrificação e sulfato-redução) e 30 ml para análise matéria orgânica total (MOT). As análises de foraminíferos e tecamebas seguiram metodologia descrita em Boltovskoy (1965). Os valores de COB foram obtidos segundo a metodologia descrita em Kepner Jr. & Pratt (1994) e Carlucci et al. (1998), e a atividade respiratória bacteriana foi qualificada segundo os ensaios descritos por Alef & Nannipieri (1995). A MOT foi obtida pela diferença de peso do sedimento após calcinação por três horas em mulfa a 500ºC (Byers et al. 1978). RESULTADOS E DISCUSSÕES Foram identificadas nos cinco sistemas do litoral 21 espécies de tecamebas, 29 de foraminíferos aglutinantes e 55 de foraminíferos calcários. Todos os processos metabólicos puderam ser identificados com dominância dos processos em anaeróbiose nos estuário do Potengi, Suruí e Mataripe (Tab.1). Os maiores valores de COB de MOT foram identificados no estuário do Suruí (Tab. 01). Os estuários localizados no litoral do nordeste (Potengi – RN e Mataripe – BA) demonstraram redução nos índices ecológicos de diversidade (H’) e riqueza em relação ao COB, enquanto que os outros estuários apresentaram um aumento destes valores (Tab. 01). A dominância dos processos respiratórios sulfato-redutores pode ter sido a agente que diferenciou os estuários do litoral nordeste das outras regiões. As atividades microbiológicas em sulfato-redução promovem a acidificação do ambiente durante o consumo da matéria orgânica resultando na dissolução do carbonato de cálcio (Baumgartner et al. 2006), e este fato provavelmente desfavoreceu as espécies calcárias dominantes no litoral do nordeste. Nos estuários onde dominaram espécies de foraminíferos aglutinantes e de tecamebas os valores altos de COB significaram maior disponibilidade de alimento e consequentemente aumento progressivo dos índices ecológicos. A análise de correlação usando o coeficiente não paramétrico de Sperman mostrou que individualmente poucas espécies tiveram correlação como os tipos de metabolismos. Arenoparrella mexicana respondeu positivamente a sulfato-redução (0,77) e negativamente a desnitrificação (-0,52). É possível que esta espécie viva em simbiose com bactérias sulfato-redutoras, pois este tipo de relação já foi identificado em outra espécie de foraminífero que habita regiões oceânicas anóxicas. As espécies de Ammonia corelacionaram-se positivamente com o metabolismo aeróbico (0,97) e negativamente com a sulfato-redução (-0,93). Esta correlação que foi mais evidente nas amostras do estuário do Itaborubí pode estar ligada não somente a simbiose como também com a seletividade alimentar e competição. A. mexicana pode, por exemplo, ter maior preferência alimentar por bactérias sulfato-redutoras do que as espécies de Ammonia. Languezaal et al. (2005) observaram que Ammonia beccarrii não desenvolve relação simbionte como bactérias e que realiza digestão extracelular das células predadas. Este tipo de digestão é um processo mais lento, sendo assim, espécies que desenvolvam digestão intracelular seriam favorecidas. As espécies de Trochammina macrescens e Trochammina ochracea foram as únicas que responderam as atividades fermentativas em anaerobiose (0,68). Todas as espécies de tecamebas exceto Difflugia viscidula se correlacionaram positivamente com o COB e com a MOT. As espécies de foraminíferos Quiqueloculina polygona e Elphdium excavatum apresentaram correlação negativa com a MOT (-0,85) demonstrando que estas espécies possuem preferência por ambientes menos confinados do que Trochammina inflata, Haplophragmoides wilberti e Trochammina macrescens que apresentaram correlação positiva. CONCLUSÃO A biomassa de bactérias metabolicamente ativas desempenha um papel importante na diversidade e na riqueza de espécies de foraminíferos aglutinantes e tecamebas e apresenta-se como um fator negativo as espécies de foraminíferos calcários. A. mexicana foi espécie de foraminífero que apresentou melhor correlação com bactérias sulfatoredutoras e quase todas as espécies de tecamebas estiveram correlacionadas como carbono bacteriano e com a matéria orgânica total. Apesar de ter sido possível estabelecer algumas correlações entre algumas espécies de foraminíferos e tecamebas com a atividade bacteriana ainda são necessários estudos mais aprofundados para se detalhar relações simbiontes e de seletividade alimentar. REFERÊNCIAS Alef, K. & Nannipieri, P. 1995. Enrichment, isolation and counting of soil microorganism. In: Alef, K. & Nannipieri, P. (Eds.) Methods in applied soil microbiology and Biochemistry. Academic Press, pp.: 123186. Baumgartner L.K.; Reid R.P.; Dupraz C.; Decho A.W.; Buckley D.H.; Apear J.R.; Przekop K.M. & Vissecher P.T. 2006. Sulfate reducing bacterial in microbial mats: Changing paradigms, new discoveries. Sedimentary Geology, 185: 131-145. Boltovskoy, E. (Eds.) 1965. Los foraminiferos recientes: biología, metodos de estudio y aplicación oceanográfica. Editora Universitária de Buenos Aires, 509 pp. Byers S., Mills E., Stewart P. 1978. Comparison of methods of determining organic carbon in marine sediments, with suggestions for a standard methods. Hydrobiologia, 58: 43-47. Carlucci A.F.; Craven D.B.; Robertson D.J. & Willians P.M. 1986. Surface-film microbial populations diel amino acid metabolism, carbon utilization and growth rates. Mar. Bio. 92: 289297. Kepner Jr., R. & Pratt, J.R. 1994. Use fluorochromes for direct enumeration of total bactéria in environmental samples: past and present. Micro.l Rev. 58: 603-615. Langezaal A.M., Jannink N.T., Pierson E.S., Van der Zwaan G.J. 2005. Foraminiferal selectivity towards bacteria: An experimental approach using a cell-perment stain. Journal of Sea Research, 54: 256-275. Meyer-Reil L.A. 1994. Microbial lifer in sedimentary biofilms – the challenge to microbial ecologists. Ma. Ecol. Proc. Ser., 112: 3003-311. Moodley L., Van der Zwaan G.J., Herman P.M.J., Kempers A.J., Van Breugel P. 1997. Differential response of benthic meio-fauna to anoxia with special reference to Foraminifera (Pro-tista: Sarcodina) to hydrogen sulfide. Mar. Ecol. Proc. Ser., 158: 151–163. Van Lith Y., Langezaal A.M., Van der Zwaan G.J. 2005. Foraminiferal depth distribuion as indicators for biogeochemical conditions in the sediment. Geophysical Research Abstract, 7: 6345. Ward J.N., Pond D.W., Murray J.W. 2003. Feeding of benthic foraminifera on diatoms and sewage-derived organic matter: an experimental application of lipid biomarker techniques. Mar. Environ. Res., 56: 515– 530. Tab. 01 – Variáveis ambientais analisadas ao longo do litoral brasileiro. Estações Mataripe – BA Potengí – RN COB Estuários PT02 0,007014 PT03 0,38179 PT04 PT05 Paraíba do Sul – RJ Suruí – RJ Atividade respiratória bacteriana Índices ecológicos Diversidade Riqueza (H’) AERO FERM DESNI SULF 2,6 N P P P 1,8 3,6 N P V V 1,3 13 0,010637 1,8 N P V P 0,8 15 (µg.C.g-1) Itacorubí – SC MOT (%) 24 0,006813 0,5 N P V P 0,4 3 MT 01 0,01853 1,71 P P P P 1,5 15 MT 02 0,017743 1,3 P P P P 1,7 19 MT 03 0,020729 1,1 N P P P 1,3 9 MT 04 0,015313 1,2 N P P P 2 17 MT 05 0,00919 1,13 N P P P 1,7 14 PB01 3,07 0,7 V P P P 1,7 12 PB02 1,99 1,1 V V P V 0,3 6 PB04 2,98 3,4 V V P P 1,4 8 PB08 3,53 5,3 V V P P 0,7 3 PB09 4,14 2,5 N P P P 2,1 10 PB12 3,36 0,5 P V P V 1,6 6 PB13 3,99 3,6 P V P P 2 13 PB14 2,48 0,2 P V P V 2,3 13 PB15 3,16 5,3 V V P P 1,5 11 PB17 3,93 7,5 P V P V 1,7 10 PB19 1,31 5,2 P V P P 1,4 5 PB20 3,22 1,4 P V P V 1,4 5 PB22 4,78 3 P V P V 0,8 10 PB25 1,67 1,2 N V P V 0,6 6 SU01 11,308642 1,96 N P P P 1,9 19 SU03 21,17284 9,53 N P P P 2,4 29 SU04 17,71605 11,05 N P P P 2,3 30 SU05 25,969136 7,54 N P P P 2,5 30 SU06 24,67284 14,27 N N P P 2,5 31 SU07 3,9320989 10,25 N P P P 2,2 16 SU08 2,1280865 0,29 N P P P 1,4 8 IT 01 0,011 3,61 P P P N 1,2 12 IT 02 0,009 3,91 P P P N 1,3 7 IT 03 0,018 4,04 P P P V 2,5 13 IT 04 0,008 4,11 P P P V 1,4 9 IT 05 0,031 4,54 P P P P 0,8 9 IT 06 0,014 3,58 P P P N 2,3 14 (P- presença de crescimento; N – ausência de crescimento; V – crescimento variável)