A apropriação dos conceitos de desenvolvimento territorial, capital

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A APROPRIAÇÃO DOS CONCEITOS DE DESENVOLVIMENTO
TERRITORIAL, CAPITAL SOCIAL E ECONOMIA SOLIDÁRIA PELOS
COLETIVOS ORGANIZADOS NO TERRITÓRIO DO SISAL
Jamille da Silva Lima
UEFS; [email protected]
Resumo: O presente artigo se propõe a compreender os efeitos da apropriação e usos dos
conceitos de desenvolvimento territorial, capital social e economia solidária disseminados pela
política dos “Territórios Rurais” entre os coletivos organizados no Território do Sisal.
Inicialmente buscamos identificar a trajetória das políticas territoriais do Estado brasileiro para
caracterizar o atual cenário que conforma a implantação do Programa de Desenvolvimento
Sustentável dos Territórios Rurais (PDSTR) instituído pelo Ministério do Desenvolvimento
Agrário (MDA)/ Secretaria de Desenvolvimento Territorial (SDT), uma vez que no plano
discursivo, a adoção desse programa segue uma perspectiva antagônica as práticas
governamentais historicamente caracterizadas como autoritárias e centralizadas. Nesse rumo,
empreendemos uma discussão conceitual, no sentido de caracterizar e analisar as bases
teóricas que orientam os princípios, diretrizes e metodologias do PDSTR. Essa etapa
eminentemente teórica corroborou na elucidação do panorama conceitual inquietante
fundamentado nos documentos oficiais do PDTRS, mas também subsidiou a análise empírica
do arranjo espacial definido pelo novo recorte de planejamento e intervenção estatal,
chamado Território do Sisal. Nessa perspectiva, analisamos a ressonância entre as
fundamentações teórico-metológicas da política territorial e as concepções e ações dos
coletivos organizados no Território do Sisal. Este estudo se sustenta em numa ampla pesquisa
documental (consulta de documentos eletrônicos referenciais da atual política territorial,
especificamente dos documentos que fundamentam o PDTRS; revistas; mapeamentos e
relatórios de avaliação do processo de implantação da política territorial em todo o país;
paralelamente, também foi feito uma consulta à jornais e revistas, relatórios de atividades,
projetos elaborados de várias organizações que atuam no Território do Sisal) e numa
pesquisa de campo (entrevistas realizadas com as organizações de maior representatividade
que atuam no Território do Sisal).
Palavras-chave: Desenvolvimento Territorial; Capital Social; Economia Solidária; Território
do Sisal.
1. INTRODUÇÃO
A trajetória do Estado brasileiro é fortemente marcada pela postura intervencionista
em relação ao território. Desde o início do período republicano, o Estado preocupou-se em
forjar a unidade territorial e em concomitância, dotar o território de infra-estrutura necessária
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à ascensão econômica do país. “Nesse rumo, diversas políticas territoriais foram implantadas,
perseguindo a ocupação do espaço, através da colonização, construção de infra-estrutura
para modernização do território e a viabilização da integração nacional, formulando planos
nacionais de desenvolvimento com enfoque regional” (BECKER e EGLER, 1992; COSTA,
2001, apud COELHO NETO, 2009, s/p).
Justificado pela premissa do desenvolvimento regional e da busca pela coesão
nacional, o Estado assumiu uma postura centralizada e autoritária (BURZTYN, 1987),
adotando práticas verticalizadas e muitas vezes artificiais, já que a austeridade das ações
políticas favoreceu a assunção de artificialidades em diversos recortes espaciais do país, onde
projetos públicos foram executados sem sequer coadunar com a realidade a que foram
aplicados.
Essa perspectiva foi preponderante na década de 1960, em que baseado na Teoria
dos Pólos de Crescimento, elaborada por François Perroux (apud SANTOS, 2007),
conformou-se um modelo desenvolvimentista que concentrava as decisões na escala do poder
nacional e supervalorizava os elementos exógenos em detrimento das potencialidades
locais/regionais (COELHO NETO, 2004). Dessa forma, as políticas territoriais foram
pensadas e geridas por uma máquina governamental que ignorou o conhecimento e as
aspirações das comunidades locais, concebendo e implantando ações numa perspectiva
unilateral, uma vez que amputava a participação de diversos segmentos da sociedade nesse
processo de condução das políticas públicas.
Esse cenário começa a ser modificado, principalmente devido ao processo de
redemocratização legitimada pela Constituição de 1988 e as lutas políticas empreendidas pela
sociedade civil, que esforçava-se em redefinir as relações Estado-Sociedade, buscando
envolver-se nos espaços de discussão e decisão política. Os princípios democratizantes
passam então a influenciar a postura estatal e fazem emergir novos modos de condução das
políticas territoriais, reforçando a necessidade fundamental da participação da sociedade
desde o planejamento até a execução das políticas governamentais, no sentido da
democratização da gestão pública.
Esse contexto elucida a implantação do conjunto de diretrizes, adotado pelo governo
Lula, especificamente a linha de ação perseguida pelo Ministério do Desenvolvimento Agrário
(MDA), que critica contundentemente abordagens economicistas e setoriais de projetos de
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desenvolvimento realizados no passado, intitulando-se inovador por apresentar uma
abordagem multidimensional e descentralizada, com metodologias participativas de gestão
social, calcadas no conceito de desenvolvimento territorial.
A perspectiva de desenvolvimento com enfoque territorial, em execução pelo governo
brasileiro desde o ano de 2003, através da Secretaria de Desenvolvimento Territorial –
SDT/MDA, tem provocado o debate acadêmico pela incorporação de termos/conceitos
bastante polêmicos, como o de desenvolvimento local, endógeno e sustentável, governança e
governabilidade, capital social e capital humano, autogestão, gestão social, participação
social, economia solidária, entre outros. Além disso, o viés de operacionalidade dessa política
de desenvolvimento baseia-se num conceito tão caro a Geografia: o território. A incorporação
deste nas políticas de planejamento do Estado corroborou não apenas para acentuar o debate
no âmbito acadêmico, dado a quantidade crescente de trabalhos que tratam da temática nos
últimos anos, como também potencializou o uso e apropriação pela sociedade civil
organizada, que apesar de re-significar o conceito através de suas próprias práticas, acabam
conferindo uma certa inércia a discussão do conceito/idéia do território em si, devido ao
significado social e político que lhes foi atribuído.
Atualmente no Brasil, a idéia de território está tão imbricada com a perspectiva
descentralizada de gestão e horizontalidade das relações sociais e políticas, que para muitos
segmentos da sociedade, território é um instrumento político reivindicatório que susbtancia a
luta política, sobretudo, dos grupos subalternos, tornando-se assim algo necessário a prática
social. Esta concepção, logicamente interfere na visão acerca da proposta de
desenvolvimento que defende o enfoque territorial.
Considerando essas constatações inquietantes, desencadeadas principalmente pela
disseminação dos conceitos supracitados no processo de descentralização das políticas
públicas no país, buscamos compreender os efeitos e usos dos conceitos de desenvolvimento
territorial, capital social e economia solidária formulados pela política de desenvolvimento do
MDA entre os coletivos organizados de um recorte espacial denominado por essa mesma
política de Território do Sisal.
A eleição desses três conceitos deve-se a forte articulação existente entre eles no
processo de implementação das atuais políticas territoriais do Estado. Segundo documentos
oficiais que fundamentam essas políticas, a economia solidária é apontada como possibilidade
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de angariar o desenvolvimento territorial, e o capital social é concebido como a
instrumentação das teorias de desenvolvimento cognitivo, podendo promover a inclusão
econômica e social da população menos favorecida nos territórios, conforme destacou
Vasconcelos (2007).
2. DESENVOLVIMENTO TERRITORIAL: RELAÇÕES COM A ECONOMIA
SOLIDÁRIA E O CAPITAL SOCIAL
A discussão teórica empreendida por Ricardo Abromovay (1999, 2003 e 2007)
acerca do conceito de desenvolvimento territorial, parece-nos basilar na fundamentação dessa
abordagem do desenvolvimento nas políticas públicas deste país implementadas a partir do
ano 2003. As contribuições desse autor podem ser vistas tanto nos documentos institucionais
do Plano Territorial de Desenvolvimento Rural Sustentável (BRASIL. MDA/SDT, 2005b e
2006), quanto na fundamentação teórica de diversos autores que tratam deste tema, a
exemplo de Cunha (2008), Silva; Corrêa; Neder (2007), Vasconcelos (2007).
Entretanto, as idéias de Abromovay sustentam-se em teorias e estudos internacionais,
como a teoria do desenvolvimento de Boisier (1999), as contribuições dos economistas
italianos Bagnasco; Trigilia (1993, apud ABROMOVAY, 2007) e dos franceses Maillot
(1996, apud ABROMOVAY, 2007), Pecquer (1996, apud ABROMOVAY, 2007), a
teoria do capital social de Bourdieu (1996), Putnam (1998), entre outros. Estes dois últimos e
a teoria de Boisier (1999), por exemplo, também fazem parte do arcabouço teórico do
PTDRS (BRASIL, 2005). As experiências internacionais, também têm repercutido nos
escritos de Saquet (2007), que por sua vez, tem pesquisado a abordagem territorial do
desenvolvimento, traçando comparações entre perspectivas internacionais (principalmente
italianas) e brasileiras.
Nesse sentido, a literatura apreciada sobre o conceito de desenvolvimento territorial
elucida a existência de fortes elos de intersecção entre matrizes conceituais de vários autores
que tratam desta temática. Verifica-se ainda que majoritariamente esses autores têm
apontado, de maneira categórica, o território enquanto instrumento/estratégia conceitual e
operativo(a) que viabiliza o desenvolvimento.
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A inserção da dimensão territorial ao conceito de desenvolvimento está relacionada a
basicamente três argumentos: a) renúncia à ação verticalizada do poder público, que passa a
estimular a descentralização e participação social no processo de elaboração e gestão das
políticas públicas; b) perspectiva híbrida do desenvolvimento entre as dimensões econômica,
social, ambiental e político-institucional, em contraposição a abordagens setoriais que
acabavam excluindo as parcelas historicamente negligenciadas na sociedade brasileira; c)
valorização das raízes histórico-geográficas do território, das redes sociais e de solidariedade,
enquanto processos endógenos de desenvolvimento.
A concepção de território imbrica-se a outro modo de empreender a política
territorial, ligada a uma reclamação horizontal entre Estado e Sociedade. O território é então
concebido como uma nova institucionalidade, fruto da construção coletiva dos diferentes
sujeitos territoriais.
Neste caso, o território é a unidade espacial de intervenção governamental na
qual se pretende construir ou dinamizar uma determinada institucionalidade
pública capaz de criar ou de estimular oportunidades para o deslanche de
processos econômicos, sociais e políticos julgados coletivamente como
adequados ao desenvolvimento sustentável do território (DELGADO et al
2007, p. 22).
Dessa forma, “o território é condição de processos de desenvolvimento” (SAQUET,
2007, p. 113), na medida em que “reconhecer uma dimensão territorial do desenvolvimento
significa, em outros termos, identificar o território como sujeito do desenvolvimento”
CUNHA, 2008, p. 56).
Contudo, o apelo ao conceito de desenvolvimento territorial e, por conseguinte do
território, torna-se uma tônica predominante, que parece garantir a superação da concepção
setorial e exógena de desenvolvimento e ao mesmo tempo abranger a complexa dinâmica
social. Assim, incorre-se num sério risco de sobrevalorização do conceito e de “[...]
transformá-lo num conceito que não só, epistemologicamente, tem a pretensão de dar conta
de toda a complexidade do espaço geográfico [...], como também, num sentido normativo,
acaba se tornando uma verdadeira panacéia em termos de políticas públicas” (HAESBAERT,
2010, p. 156).
Entretanto, para polemizar ainda nossa discussão, a estratégia de desenvolvimento
territorial implantada pela SDT/MDA reporta-se em sua fundamentação conceitual, a teoria
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do capital social proposta por Bourdieu (1996) e Putnam (1998). O capital social no âmbito
do PTDRS é apresentado como um dos elementos mediador do desenvolvimento, haja vista
que é entendido como fator endógeno as comunidades territoriais, que combina atitudes de
confiança com condutas de reciprocidade e cooperação (BRASIL. MDA, 2005c). Sob essa
ótica, acredita-se que o capital social potencializa o empoderamento coletivo, o pluralismo e a
democratização, mostrando-se ainda como elemento que viabiliza a coesão social e a
equidade territorial.
Nesse contexto, o conceito de capital social é associado com o estabelecimento de
redes solidárias de articulação dos atores sociais, baseadas nos princípios de reciprocidade e
cooperação, o que se constitui numa das diretrizes centrais perseguidas pelo Programa de
Desenvolvimento Sustentável dos Territórios Rurais.
Assim, conjuga-se o conceito de capital social com o conceito de economia solidária,
uma vez que ambos alicerçam-se sobre os princípios acima citados. Juntos, esses conceitos
corroboram para a promoção do desenvolvimento territorial, segundo análise dos
documentos oficiais do Ministério do Desenvolvimento Agrário, sendo que a valoração da
economia solidária faz parte de um ousado projeto político de reorganização da vida
produtiva da sociedade, unindo a forma industrial de produção com a organização
comunitária da vida social, conforme destaca Singer (2002).
Desse modo, a idéia de economia solidária é apresentada como fundamentalmente
importante para a promoção do desenvolvimento territorial (ARAÚJO et al, 2005),
constituindo-se num instrumento que pode fomentar a geração de um conjunto de normas e
valores, tendentes a criar laços de confiança que propiciem ou facilitem a consecução de
objetivos comuns e, concomitantemente, permitam o estabelecimento de novas relações
horizontais (VASCONCELOS, 2007).
Entretanto, a idéia de economia solidária e sua respectiva correlação com a equidade
territorial, é veementemente contestada por autores de outra vertente teórica, a exemplo de
Vainer (2000), que defende que o termo economia solidária é uma expressão muito
ambiciosa e abrangente, que configura uma suntuosa contradição, pois é impossível conciliar o
conceito de economia, intrínseco a competição, com solidariedade que enseja a
intercooperação entre os atores econômicos. “A economia solidária difunde a crença na
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possibilidade de a solidariedade se desenvolver de forma ampla sob a égide do capital”
(VAINER, 2000, p. 47).
A contribuição de Vainer (2000) apenas ajuda-nos a problematizar algumas
concepções tidas com uma relativa consensualidade entre acadêmicos acerca de conceitos
imbricados a atual política de desenvolvimento territorial implementada neste país.
Estas reflexões preliminares nos revelam a complexidade teórica necessária a análise
da política “territorial” do MDA. Nesse sentido, as articulações que aqui procuramos
estabelecer constituem-se apenas numa breve reflexão teórica para subsidiar a interpretação
da materialidade empírica que propomos investigar, o Território do Sisal.
3. TERRITÓRIO DO SISAL: EFEITOS E USOS DO CONCEITO DE
DESENVOLVIMENTO TERRITORIAL, CAPITAL SOCIAL E ECONOMIA
SOLIDÁRIA PELOS COLETIVOS ORGANIZADOS
A aderência do Território do Sisal à proposta de implantação da atual política
territorial do Estado brasileiro ganhou destaque em escala nacional, sendo ele apresentado
como uma experiência bem sucedida de organização (BRASIL. MDA, 2005c).
Localizado na região semi-árida da Bahia, esse recorte espacial, conhecido pela
cultura do agave sisalana, o sisal, apresenta uma realidade bastante conflituosa, que Coelho
Neto (2010) denominou de permanências e emergências. As chamadas permanências
manifestam-se pelo conjunto de condições estruturais e pela particularidade histórica que se
forjou nesse recorte espacial, haja vista que o referido “Território”, é reconhecido pela
prevalência das suas adversidades físico-naturais atribuídas à seca, por um conjunto de
indicadores sócio-econômicos desfavoráveis exemplificados pelos índices de analfabetismo,
desemprego, baixa renda, concentração fundiária, bem como pelos esquemas de
autoritarismo e clientelismo político. As emergências configuram-se pelo processo marcante
de mobilização e organização da sociedade civil, que se manifesta na proliferação de
movimentos sociais, ONG’s, sindicatos, associações e cooperativas, que tem reescrito a
história regional, especialmente no sentido de construção e fortalecimento da participação
social e formação das complexas redes de cooperação.
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Na realidade, esse contexto emblemático e contraditório, corroborou para a
aderência singular a proposta de desenvolvimento territorial do MDA. Especialmente a
sociedade civil que atua neste arranjo espacial, tem incorporado com facilidade as
concepções basilares da política territorial do Estado, principalmente os conceitos de
desenvolvimento territorial, capital social e economia solidária, tratados no escopo deste
trabalho.
Esses conceitos (desenvolvimento territorial, economia solidária e capital social), por
sua vez, têm sido incorporados e ressignificados pelos coletivos organizados do Território do
Sisal, devido a basicamente três fatores:
a) Enaltecimento da política territorial do MDA. Já que o Território do Sisal, é
historicamente marcado pelas ações clientelistas e paternalistas, como informa os estudos de
Santos (2007), o fomento a participação da sociedade civil no processo de planejamento e
gestão das políticas públicas, representa uma conquista muito salutar, sobretudo para os
atores sociais que têm ajudado a reescrever a história regional. Entretanto, mesmo ciente que
o direito à participação política não é uma benesse do Estado, é comum que vários segmentos
da sociedade civil no Território do Sisal, enalteçam a política territorial do MDA, uma vez que
defender o PDSTR consiste numa maneira legal de resistir e opor-se as oligarquias políticas
locais, bem como de enfatizar seus princípios de horizontalidade e participação na gestão
pública.
b) Políticas de fomento do MDA. O Estado através de suas ações estratégicas de
estímulo ao desenvolvimento territorial cria diversos projetos para aqueles considerados
animadores(as), facilitadores(as) e assessores(as) das dinâmicas territoriais, como por
exemplo, conselheiros(as), técnicos(as) de movimentos sociais, sindicatos, organizações
não-governamentais, entre outros. Mas, para que estes sujeitos sejam beneficiados pelos
referidos projetos, é necessário atentar as exigências normativas técnicas e conceituais
estabelecidas pelo governo federal, especificamente pelo Ministério do Desenvolvimento
Agrário. Nesse sentido, no intuito de concorrer aos projetos, a sociedade civil, sobretudo a
do Território do Sisal, abordado neste estudo, acaba incorporando e reproduzindo as
propostas governamentais.
c) Apoio institucional ao Conselho Regional de desenvolvimento Rural Sustentável da
Região Sisaleira (CODES-SISAL). Criado em 2002, este conselho é composto por vinte
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prefeituras municipais, quatro órgãos governamentais, vinte e quatro entidades da sociedade
civil e uma empresa de transportes rodoviários (CODES-SISAL, 2007). Entretanto, a
implantação do PDSTR conferiu um maior destaque não apenas a essa ação colegiada em si,
mas, principalmente ao Estado, que apoiando o conselho territorial, adorna-se com uma
roupagem descentralizada e participativa de gestão. Nesse rumo, defender a perspectiva de
desenvolvimento territorial do MDA torna-se uma necessidade umbilical para garantir
legalmente o envolvimento local/regional da sociedade civil no encaminhamento das políticas
públicas.
Os dois últimos fatores que contribuem para aproximar os coletivos organizados do
Território do Sisal a proposta política do MDA, são muito perigosos, pois este acaba
induzindo e orquestrando a ação daqueles. Mesmo atentando a capacidade crítica e criativa
dos sujeitos sociais, não se pode negar o poder de persuasão das políticas públicas do
Estado na concepção e ação desses sujeitos. A guisa de exemplo, é comum que a sociedade
civil organizada do Território do Sisal, discuta no CODES-SISAL a gestão dos recursos
econômicos, analisando a melhor localização para investir determinados benefícios angariados
através da política territorial, e acabem perdendo a essência da discussão política em si, os
valores que norteiam seus objetivos de luta e subversão política.
Desenvolvimento territorial, capital social e economia solidária são conceitos/idéias
que após a instituição da política territorial do MDA, passaram a fazer parte do coro dos
coletivos organizados do Território do Sisal, que parecem não perceber o sentido da
racionalização institucional intrínseco a essa política territorial, como destaca os estudos de
Cunha; Paulino; Meneses (2009) sobre uso de alguns desses conceitos como estratégia de
modernização.
Na realidade, a proposta de desenvolvimento territorial e por sua vez, seus conceitos
e diretrizes norteadores, apresentam acentuados limites e não provocaram mudanças
estruturais, ainda que se proponha a descentralização das políticas públicas e a abordagem
não-setorial do desenvolvimento (SANTOS; MARSCHNER, 2008). Capital social e
economia solidária encerram em si conceitos distintos e contraditórios, o que já põe em
questão a veracidade da visão integradora e multidimensional do almejado desenvolvimento
territorial.
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