CONSTRUÇÕES COM VERBOS DE ALÇAMENTO: UM ESTUDO DIACRÔNICO FERNANDO PIMENTEL HENRIQUES DEPARTAMENTO DE LETRAS VERNÁCULAS Dissertação de Mestrado apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Letras Vernáculas da Universidade Federal do Rio de Janeiro como quesito para a obtenção do Título de Mestre em Letras Vernáculas (Língua Portuguesa). Orientadora: Professora Doutora Maria Eugênia Lamoglia Duarte Rio de Janeiro Março de 2008 As construções com verbos de alçamento: um estudo diacrônico Fernando Pimentel Henriques Orientadora: Professora Doutora Maria Eugênia Lamoglia Duarte Dissertação de Mestrado submetida ao Programa de Pós-Graduação em Letras Vernáculas da Universidade Federal do Rio de Janeiro - UFRJ, como parte dos requisitos necessários para a obtenção do título de Mestre em Letras Vernáculas (Língua Portuguesa). Aprovada por: _________________________________________________ Presidente: Profª. Doutora Maria Eugênia Lamoglia Duarte _________________________________________________ Profª Doutora Dinah Maria Isensee Callou - UFRJ _________________________________________________ Profª. Doutora Sílvia Regina de Oliveira Cavalcante – UFF _________________________________________________ Suplente: Profª. Doutora Célia Regina dos Santos Lopes – UFRJ _________________________________________________ Suplente: Prof. Doutor Juanito Ornelas de Avelar – UNICAMP Defendida a Dissertação Em ___/___/2008 SINOPSE Mudança na marcação do Parâmetro do Sujeito Nulo no PB. Sujeito referencial dos verbos de alçamento é afetado. Teoria da Variação e Teoria Gerativa explicam a mudança paramétrica em curso.Considerações sobre a relação entre a redução do paradigma flexional no PB e a preferência pelo alçamento. AGRADECIMENTOS Dedicar-se a um trabalho acadêmico, principalmente a uma dissertação, cria alguns hábitos diferentes, entre eles, escrever sempre (involuntariamente), tentando seguir os padrões acadêmicos. E não poderia ser diferente na seção referente aos agradecimentos: (i) primeiramente, agradeço a Deus por todas as conquistas, vitórias e obstáculos (e algumas derrotas, claro). Sem a Sua “ajuda”, esse trabalho não seria viável; (ii) em seguida, agradeço à minha família, especialmente à minha mãe, que tanto amo, por ter vibrado com todas as minhas conquistas; (iii) agradeço também a uma pessoa muito especial; alguém que foi obrigada, durante meses, a aprender tudo sobre a mudança paramétrica em progresso no PB. Camila França, muito obrigado pelos ouvidos e pela compreensão; (iv) não posso me esquecer de algumas pessoas muito especiais: Danielle de Rezende, muito obrigado pelo apoio e pelos temores compartilhados ao longo de toda a graduação, iniciação científica e pós-graduação; Juliana Marins, muito obrigado por tornar todos os momentos acadêmicos mais engraçados - não posso me esquecer de agradecer pelo primeiro gráfico no primeiro painel, que serviu de base para muitos outros gráficos, inclusive para alguns deste trabalho; (v) agradeço, ainda, à professora Dinah Callou, que se mostrou, desde o início, uma profissional cativante e sempre interessada em ajudar. À professora Célia Lopes, também devo agradecimentos pela paciência e dedicação, na tentativa de conciliar um trabalho sintático a pressupostos da sócio-pragmática; (vi) finalmente, não posso deixar de agradecer à professora Maria Eugênia Duarte. Muito obrigado pela dedicação, pela paciência, pelos “puxões de orelha” (sempre necessários) e, principalmente, pelo carinho. A você, cara mestra, dedico toda a minha admiração. Este trabalho foi financiado pela bolsa CNPq e pela Bolsa Nota Dez da FAPERJ SUMÁRIO Índice de tabelas e quadros ..........................................………………………. iii Índice de gráficos e figuras ............................................................................. v INTRODUÇÃO ............................................................................................... 1 1 1. PONTOS DE PARTIDA ............................................................................. 7 5 1.1 O que é alçamento ........................................................................ 7 5 1.2 Os verbos de “alçamento prototípico” ........................................... 10 7 1.3 As construções de alçamento na tradição gramatical ................... 18 14 1.4 Pontos de partida: estudos sincrônicos e diacrônicos .................. 17 1.4.1 Os sujeitos referenciais ................................................... 17 1.4.2 Os sujeitos não referenciais ............................................ 21 2. FUNDAMENTOS TEÓRICOS E METODOLOGIA .................................... 30 2.1 Teoria Gerativa e Teoria da Variação: modelos incompatíveis? .. 30 2.1.1 O modelo gerativista ....................................................... 31 2.1.2 O modelo variacionista ................................................... 32 2.2 Teoria Gerativa e Teoria da Variação: modelos compatíveis ...... 34 2.3 Metodologia ................................................................................. 35 2.3.1 Os grupos de fatores ..................................................... 39 3. ANÁLISE DE DADOS .............................................................................. 47 3.1 Construções com o verbo parecer .............................................. 48 3.1.1 A construção sem alçamento ........................................ 51 3.1.1.2 A presença do clítico dativo ............................ 55 3.1.2 O alçamento padrão ...................................................... 57 3.1.2.1 A representação do sujeito alçado .................. 58 3.1.2.2 Fatores estruturais relevantes ......................... 59 3.1.3 A construção com o deslocamento ............................. 63 3.1.4 O hiperalçamento .......................................................... 63 3.1.4.1 A representação do sujeito alçado .................. 65 3.1.4.2 Outros fatores relevantes ................................ 67 14 3.2 Os “demais” verbos de alçamento .............................................. 70 17 3.2.1 A construção sem alçamento ....................................... 72 17 3.2.1.1 A representação do sujeito da encaixada ...... 72 21 3.2.2 O alçamento padrão .................................................... 76 30 3.2.2.1 A expressão do sujeito alçado ...................... 77 30 3.2.2.2 A estrutura da oração encaixada .................. 80 31 3.2.2.3 Outros fatores estruturais ............................. 81 32 3.3 O que dizem os resultados: confrontando parecer e os “demais” verbos ...................................................................................... 34 85 CONSIDERAÇÕES FINAIS ..................................................................... 35 87 RESUMO .................................................................................................. 39 90 ABSTRACT .............................................................................................. 47 91 REFERÊNCIAS (peças teatrais) .............................................................. 48 92 REFERÊNCIAS (textos) ........................................................................... 51 93 ANEXOS ................................................................................................... 100 iii ÍNDICE DE TABELAS E QUADROS Tabela 1.1: Paradigmas flexionais em PB ..................................................... 18 Tabela 1.2: Construções com parecer na fala popular .................................. 23 Tabela 1.3: Construções com os outros verbos de alçamento ...................... 24 Tabela 1.4: Construções com parecer na fala culta ...................................... 24 Tabela 1.5: Construções com parecer na escrita padrão ............................. 26 Tabela 1.6: Construções com os outros verbos na escrita padrão ............... 26 Tabela 1.7: Estrutura de alçamento com todos os verbos ............................ 27 Quadro 2.1: Amostra utilizada segundo o período de tempo e autores ....... 38 Tabela 3.1: Construções com parecer através do tempo ............................. 48 Tabela 3.2: Distribuição dos sujeitos pronominais das encaixadas com parecer em construções sem alçamento, segundo a forma de expressão: pleno vs nulo 54 Tabela 3.3: Presença do clítico dativo vs não alçamento em construções com parecer ........................................................................................................... 55 Tabela 3.4: Correferência entre clítico dativo e DP sujeito vs não alçamento em construções com parecer .......................................................................... 56 Tabela 3.5: Distribuição dos sujeitos pronominais das encaixadas com parecer em construções de alçamento padrão, segundo a forma de expressão: pleno vs nulo............................................................................................................. 58 Tabela 3.6: Tipo de oração vs alçamento padrão com parecer...................... 61 Tabela 3.7: Distribuição dos sujeitos pronominais em construções de hiperalçamento, segundo a forma de expressão: pleno vs nulo ............................... 66 Tabela 3.8: O tipo de oração vs hiperalçamento com parecer ....................... 68 Tabela 3.9: Ocorrências das estruturas de alçamento com os outros verbos de alçamento ................................................................................................. 71 Tabela 3.10: Distribuição dos sujeitos pronominais das encaixadas com os demais verbos em construções sem alçamento, segundo a forma de expressão: pleno vs nulo ......................................................................................... 74 Tabela 3.11: Estrutura da encaixada segundo o tipo de verbo nas construções iv sem alçamento com os “demais” verbos ..................................................... 75 Tabela 3.9: Ocorrências das estruturas de alçamento com os outros verbos de alçamento ............................................................................................... 76 Tabela 3.12: Distribuição dos sujeitos pronominais das encaixadas com os “demais” verbos em construções de alçamento, segundo a forma de expressão: pleno vs nulo......................................................................................... 79 Tabela 3.13: Estrutura da encaixada segundo o tipo de verbo nas construções com alçamento com “os demais” verbos ..................................................... 80 Tabela 3.14: Tipo de oração vs alçamento com “os demais verbos” .......... 83 Tabela I: Traço semântico vs alçamento padrão com o verbo parecer ...... 100 Tabela II: Referência vs alçamento padrão com o verbo parecer .............. 100 Tabela III: Presença do verbo ser na encaixada vs alçamento padrão com Parecer ....................................................................................................... 100 Tabela IV: Traço semântico vs hiperalçamento com o verbo parecer ....... 101 Tabela V: A referência vs hiperalçamento com o verbo parecer ............... 101 Tabela VI: Traço semântico vs alçamento padrão com os “demais” verbos 102 Tabela VII: Sujeito específico / não específico vs alçamento padrão com os “demais” verbos ......................................................................................... 102 v ÍNDICE DE GRÁFICOS E FIGURAS Gráfico 1.1: Sujeitos nulos em peças teatrais (Duarte 1993) ..................... 20 Gráficos 1.2: Alçamento versus não alçamento na fala popular ................ 23 Gráfico 1.3: Alçamento versus não alçamento na escrita padrão .............. 25 Figura 3.1: Distribuição geral dos dados por período de tempo ................ 48 Gráfico 3.1: Construções com parecer na linha do tempo ........................ 49 Gráfico 3.2: Expressão do sujeito da encaixada nas construções sem alçamento com parecer (DP lexical, pronome pleno, pronome nulo) ............. 52 Gráfico 3.3: Presença de clítico dativo nas construções sem alçamento com parecer ............................................................................................. 55 Gráfico 3.4: A representação do sujeito alçado para a posição de sujeito de parecer (DPs lexicais, pronomes plenos, pronomes nulos) ............... 59 Gráfico 3.5: Sujeitos nulos em peças teatrais (Duarte 1993) .................. 64 Figura 3.2: Distribuição geral dos dados por período de tempo ............. 70 Gráfico 3.6: Ocorrências das estruturas de alçamento com os demais verbos na linha do tempo ....................................................................... 71 Gráfico 3.7: Expressão do sujeito da encaixada nas construções sem alçamento com os demais verbos de alçamento (DP lexical, pronome pleno, pronome nulo) ............................................................................. 74 Gráfico 3.8: Expressão do sujeito alçado nas construções com alçamen to com os demais verbos de alçamento (DP lexical, pronome pleno, pro nome nulo) ............................................................................................ 78 Gráfico I: A representação do sujeito alçado para a posição de sujeito de parecer nas construções de hiperalçamento (DPs lexicais, pronomes plenos, pronomes nulos) ...................................................................... 101 INTRODUÇÃO Nos últimos anos, pesquisas lingüísticas acerca do português falado indicam processos de mudança em progresso no Português Brasileiro (PB), o que tem contribuído para distinguir as variedades brasileira e européia, levando alguns autores a propor que estamos diante de gramáticas distintas (cf. entre outros Galves 1987, 1998). Dentre os processos em curso, está o que envolve a mudança na marcação do Parâmetro do Sujeito Nulo (Chomsky 1981). Duarte (1993, 1995, 2000) mostra que a representação do sujeito pronominal de PB, tanto o de referência definida quanto o de referência indeterminada, está se caracterizando pela preferência pelo sujeito pleno, ao contrário do que ocorria em estágios anteriores do português no Brasil (a julgar pela análise de peças de teatro popular apresentadas em Duarte 1993) e ainda ocorre no Português Europeu (PE), no espanhol (cf. Soares da Silva 2006) e no italiano (cf. Marins 2007). O crescente preenchimento do sujeito pronominal indica que o Português Brasileiro está deixando de ser uma língua de sujeito nulo para se tornar uma língua de sujeito preenchido, ou seja, [-prodrop]. Essa mudança na marcação do Parâmetro do Sujeito Nulo (PSN) estaria diretamente relacionada à redução do quadro de paradigmas flexionais verbais do PB (Duarte 1993, 1995). Até o início do século XX, predominava o paradigma com seis ou cinco formas verbais distintas. Hoje, com a neutralização entre as formas verbais que acompanham os pronomes de segunda pessoa você e tu, e a forte preferência pelo pronome a gente, particularmente na fala de grupos mais jovens, que já não usam o pronome nós para referência à primeira pessoa do plural, encontram-se apenas três formas verbais, considerando, naturalmente, as variedades em que ocorrem as marcas de concordância de segunda e terceira pessoas do plural. O crescente preenchimento do sujeito pronominal de referência definida ao longo do século XX caminhou paralelamente a essa simplificação do paradigma, como aponta o estudo diacrônico de Duarte (1993), culminando com a preferência pelo sujeito pleno para a fala culta e popular do Rio de Janeiro, como atesta Duarte (1995; 2003a). Esses resultados têm sido confirmados para outras variedades nas mais diferentes regiões do país. Duarte (2000) indica que essa mudança afeta igualmente o sujeito de referência indeterminada, que vem se caracterizando pela forma preenchida por diversas formas pronominais nominativas, entre as quais você e a gente. 2 Portanto, os estudos lingüísticos apontam para uma profunda mudança no Português Brasileiro. Se se levam em conta (a) o feixe de propriedades que caracterizam o PSN (Chomsky 1981) e (b) o pressuposto básico da teoria da mudança lingüística explicitado em Weinreich, Labov e Herzog (1968), segundo o qual uma mudança não é casual estando “encaixada” num sistema de “concomitantes lingüísticos e sociais”, a mudança paramétrica por que passa PB suscita alguns questionamentos: (i) alterações tão profundas no sistema causariam algum “efeito colateral”?; (ii) se a resposta for afirmativa, que efeitos seriam esses?; (iii) como se refletiria esse encaixamento na representação dos sujeitos não referenciais? Seriam eles afetados pela mudança na marcação do parâmetro? O presente trabalho parte de tais perguntas e tem como objetivo focalizar um tipo de estrutura que apresenta uma posição de sujeito não referencial / não temática, qual seja, a estrutura representada por verbos conhecidos na literatura gerativista como verbos de alçamento, na realidade verbos inacusativos que selecionam um argumento interno representado por uma oração, entre os quais parecer é o verbo prototípico. Uma análise atenta das construções com este verbo permite encontrar quatro possibilidades estruturais. Primeiramente, em (1), encontra-se uma construção sem o alçamento do sujeito da oração subordinada. Esta estrutura apresenta sujeito expletivo nulo à esquerda de parecer, o que indica que há uma posição sintática disponível. Como se pode observar, o sujeito da oração encaixada pode aparecer expresso (1a) ou nulo (1b). (1) a. [IP [øexpl] Parece [CP que o menino dormiu]]. b. [IP [øexpl] Parece [CP que [ø]i estoui flutuando]]. Por outro lado, em (2), encontra-se uma estrutura conhecida como alçamento clássico ou padrão. Esta construção caracteriza-se pelo alçamento do sujeito da oração encaixada para a esquerda do verbo de alçamento, onde ele recebe caso nominativo, enquanto o verbo da subordinada apresenta a forma infinitiva. (2) [IP As criançasi parecem [InfP ti querer o sorvete]]. 3 Em (3), encontra-se uma estrutura que exibe o sujeito da oração encaixada deslocado para uma posição externa à sentença. Dessa forma, parecer não entra em relação de concordância com o DP deslocado, que recebe Caso do verbo flexionado da oração subordinada, que o seleciona: (3) [TopP Eui [IP [øexpl] parece [CP que [ø]i vou explodir de raiva]]]. (Duarte 2007) Verificam-se, em (4), ao mesmo tempo, o alçamento do sujeito da encaixada para a posição à esquerda de parecer e a flexão dos dois verbos, o verbo da oração principal e o verbo da oração subordinada. Esta construção é referida na literatura como hiperalçamento. (cf. Ferreira 2000) e não é prevista pelas gramáticas: (4) [IP Os meninosi parecem [CP que ti sabem onde está o brinquedo]]. O trabalho parte de um estudo diacrônico (Duarte 1993) e de estudos sincrônicos (Duarte 2004, 2007, Henriques e Duarte 2006, Henriques 2005, entre outros) e busca investigar, através de um estudo diacrônico, como se comportam tais estruturas ao longo dos dois últimos séculos com base na mesma amostra de peças utilizadas por Duarte (1993) para a análise de sujeitos referenciais (escritas entre 1838 a 1992). Obviamente, não se podem tomar os resultados como o reflexo da fala de seu tempo, visto que as peças consistem em uma tentativa de reprodução da fala de cada período de tempo analisado. Entretanto, como se trata de peças de caráter popular e como os resultados obtidos por Duarte (1993) para a peça de 1992 se aproximam muito dos resultados obtidos para a fala espontânea, pode-se presumir que em relação aos verbos de alçamento possamos obter tendências reais de uso de cada período. Estudos da fala contemporânea acima referidos indicam que, embora o PB não tenha desenvolvido um pronome expletivo lexical, como ocorreu com o francês, o falante faz uso de diferentes estratégias para evitar o sujeito expletivo nulo à esquerda dos verbos de alçamento. Os resultados encontrados para a fala popular mostram que nas duas faixas de tempo analisadas (anos 80 e anos 2000) há (a) ausência de construções com sujeito deslocado à esquerda; (b) quase absoluta ausência de alçamento padrão; (c) as construções sem alçamento se encontram em variação com uma estratégia de alçamento não prevista pelas gramáticas 4 tradicionais: o hiperalçamento, uma estrutura que apresenta tanto o verbo de alçamento quanto o verbo da oração encaixada flexionados, “desafiando”, de certa forma, a teoria do Caso (cerca de 44% nos anos 2000 – cf. Duarte 2002, 2007; Henriques 2005, Henriques e Duarte 2006). Para a orientação deste trabalho, formularam-se algumas hipóteses que serão confirmadas ou não durante a análise dos dados. Como ponto de partida, acredita-se que nos períodos em que o PB se comporta como uma língua de sujeito nulo prototípica, serão preferidos o não alçamento e o alçamento padrão. Espera-se também a ocorrência de sujeitos deslocados, estruturas ainda encontradas no PE oral e citadas nas nossas gramáticas como uma instância de anacoluto. À medida que o paradigma flexional se reduz, espera-se uma preferência pelo alçamento padrão e só nas últimas peças, quando o sujeito referencial expresso está plenamente implementado no sistema, será possível encontrar o hiperalçamento (com os verbos que o permitem). Como será mostrado mais adiante, os resultados confirmam o “encaixamento” da mudança na marcação do sujeito nulo, com a nítida preferência pelo preenchimento da posição à esquerda tanto de parecer quanto dos demais verbos de alçamento. Este trabalho é dividido em três capítulos. O primeiro apresenta os seguintes itens: (a) definição dos verbos de alçamento; (b) descrição da abordagem oferecida pelas gramáticas tradicionais em relação a esses verbos; (c) um olhar sobre estudos anteriores referentes ao preenchimento do sujeito pronominal em PB (referencial e não referencial), pontos de partida para este trabalho. No segundo capítulo é apresentado o quadro teórico que orienta o trabalho, seguido de um detalhamento das hipóteses levantadas e da metodologia a ser seguida. No terceiro capítulo, analisam-se os dados obtidos no intuito de verificar quais estratégias de alçamento são implementadas em cada período de tempo analisado. Finalmente, diante dos resultados encontrados, apresentam-se as conclusões do estudo. Espera-se que este trabalho seja uma importante contribuição à descrição do Português Brasileiro, principalmente no âmbito dos estudos referentes à mudança na marcação do Parâmetro do Sujeito Nulo (PSN) e seus “efeitos colaterais” no sistema, levando em conta a noção de “encaixamento” da mudança proposta por Weinreich, Labov & Herzog (1968) e as propriedades que caracterizam o PSN (Chomsky 1981). 5 1. PONTOS DE PARTIDA Neste capítulo, são apresentadas, à luz da teoria gerativa, as construções que envolvem o movimento sintático conhecido como alçamento. Trata-se de estruturas com verbos que não selecionam um argumento externo, entre os quais se encontram os verbos de ligação e os que serão analisados neste trabalho, isto é, os verbos conhecidos como de alçamento. Serão ainda apresentadas as diferentes possibilidades estruturais com estes verbos e o tratamento que tais construções recebem nas gramáticas tradicionais. Por fim, faz-se uma descrição dos resultados encontrados em diferentes estudos empíricos relativos à mudança na marcação do Parâmetro do Sujeito Nulo (doravante PSN) no Português Brasileiro (PB) e sua possível relação com uma das possibilidades estruturais encontradas nas construções com os verbos de alçamento aqui focalizados. 1.1. O que é alçamento? As construções a que a Teoria Gerativa se refere como “construções de alçamento” envolvem o “alçamento” de um DP, sujeito de uma predicação em que não pode receber Caso do seu predicador (um adjetivo, um infinitivo não flexionado, por exemplo), para uma posição em que a atribuição de caso seja possível (cf. Haegeman 1994 e Mioto, Silva e Lopes 2005). Vejam-se, por exemplo, as estruturas em (1), em que os verbos parecer e acabar são usados como verbos de ligação: (1) a. Os mestrandosi parecem ti assustados. b. As professorasi acabaram ti estressadas. Os verbos parecer e acabar, nas sentenças em (1), tomam como argumento interno uma estrutura que contém uma predicação (as mini-orações – small clauses1 - "os mestrandos assustados" e "as professoras estressadas"), não selecionando um argumento externo, como ilustram os exemplos em (2): (2) a. Parecer [SC os mestrandos assustados] b. Acabar [SC as professoras estressadas] 1 Small Clause é uma predicação que se estabelece entre um constituinte DP e o predicado que o seleciona, mas não pode atribuir Caso a este DP. É o caso dos adjetivos e dos verbos em formas não finitas. (cf. Mioto, Silva e Lopes 2005). 6 Uma evidência de que “os mestrandos” e “as professoras” são argumentos de “assustados” e “estressadas” pode ser encontrada em (3): (3) a. *As pedras parecem assustadas. b. As pedras parecem molhadas. c. *Os livros acabaram estressados. d. Os livros acabaram molhados. As sentenças em (3a) e (3c) são agramaticais, não porque os verbos parecer e acabar não possam ocorrer com os sintagmas “as pedras” e “os livros”, mas porque “assustadas” e “estressados” não podem selecionar tais argumentos. Por outro lado, em (3b) e (3d), os referidos sintagmas não sofrem qualquer restrição semântica com os predicados “molhadas” e “molhados”. Assim, ao atuarem como verbos de cópula, parecer e acabar aceitam sujeito de qualquer valor semântico. Como os predicadores adjetivais não são atribuidores de Caso, os DPs precisam se mover para a posição disponível à esquerda de parecer e acabar, para receber Caso de flexão (em Spec de IP). Outras construções que envolvem alçamento são ilustradas em (4): (4) a. Os alunosi podem ti fazer as provas. b. Os professoresi costumam ti enfrentar problemas. c. Os professoresi parecem ti enfrentar problemas. d. Os professoresi acabaram ti enfrentando problemas. Os exemplos em (4a,b) ilustram construções com auxiliares modais e aspectuais, respectivamente, e os exemplos em (4c,d), construções com os conhecidos verbos de alçamento prototípicos. Tanto os auxiliares quanto os verbos plenos selecionam um argumento interno representado por um InfP/GerP, que não podem atribuir Caso ao seu argumento externo, como se vê em (5): (5) a. Poder [os alunos fazer as provas] b. Costumar [os professores enfrentar problemas] c. Parecer [os professores enfrentar problemas] d. Acabar [os professores enfrentando problemas] 7 Tal como ocorreu com as sentenças em (2), os DPs argumento externo dos verbos não flexionados no interior da oração encaixada precisam se mover para a posição não temática à esquerda de (Spec de IP) poder, costumar, parecer e acabar, onde recebem Caso nominativo de flexão (I). Observe-se, em (4) acima, que o elemento alçado/movido deixa um vestígio, representado por um t (de trace), na posição em que é gerado e onde recebe papel temático. A análise das sentenças em (1)-(5) leva a algumas conclusões: (i) o termo ‘alçamento’, utilizado dentro do quadro teórico da sintaxe gerativa, se refere ao fato de que verbos como parecer e acabar, quando selecionam apenas um argumento oracional, permitem o deslocamento do sujeito da oração subordinada para a posição de especificador de IP; (ii) os verbos de alçamento, entre eles parecer e acabar, nada mais são do que uma extensão dos tradicionais verbos de ligação ou cópula (cf. as sentenças em (1) e (2)); (iii) finalmente, os constituintes alçados nas sentenças em (4) constituem o sujeito sintático dos verbos da oração principal, mas não recebem papel temático destes, e sim dos verbos da oração encaixada2. 1.2 Os verbos de “alçamento” prototípicos Nesta seção, serão examinados detalhadamente os verbos de alçamento que serão foco de atenção deste trabalho. Em linhas gerais, trata-se de verbos que selecionam um único argumento de posição fixa pós-verbal, que aparece em forma de oração (um CP ou um InfP/GerP), exemplificados em (5c,d) acima. Pode-se, entretanto, apontar dentro desse grupo, dois sub-grupos segundo as estruturas que podem produzir. Inicialmente, esses verbos apresentam uma estrutura argumental particular. Um contraste entre as sentenças em (6) e (7) permite uma análise clara da estrutura argumental dos verbos acabar e levar em diferentes acepções: (a) quando atuam como predicadores verbais, como em (6), selecionando um argumento externo e um ou dois internos; (b) quando atuam como verbos de alçamento, isto é, não selecionam argumento externo, como em (7): (6) a. João acabou o exercício. b. A mãe levou o filho ao colégio. 2 Em Mioto, Silva e Lopes (2005), encontra-se uma explanação acerca das diferenças entre o sujeito sintático de uma sentença e o argumento externo do verbo. 8 (7) a. Acabou que o João não fez o exercício. b. Levou 30 minutos para a mãe deixar o filho no colégio. As sentenças em (6a) e (6b) têm a sua estrutura argumental representada, respectivamente, (8) e (9): (8) VP 2 DP V’ 2 João V NP acabar o exercício (9) VP 2 DP V’ A g mãe 2 V’ 2 PP V ao colégio DP levar o filho Ou seja, em (8), o VP é encabeçado por um verbo (acabar) que seleciona dois argumentos: um externo (“João”) e outro interno (“o exercício”). Por outro lado, em (9), levar é um verbo que seleciona três argumentos, um externo (“A mãe”) e dois internos (“o filho” e ao “colégio”). Um de seus argumentos, como se pode observar, é representado sob a forma de um PP e desempenha a função de oblíquo nuclear (cf. Mateus et alii 2003), ou complemento circunstancial (cf. Rocha Lima 2003 [1982]). Se em (6) os verbos acabar e levar selecionam um argumento externo e, pelo menos, um interno; em (7), eles não selecionam um argumento externo e pertencem à classe dos verbos de alçamento. Em (10), observa-se a estrutura 9 argumental de acabar e em (11) a de levar. (10) VP g V’ 2 V acabar CP 6 [CP que o João não fez o exercício] (11) VP g V’ 2 V’ PP 2 V g levar DP P g 30 minutos 2 InfP para 5 [InfP a mãe deixar o filho no colégio] Observa-se nos esquemas acima que acabar e levar não selecionam argumento externo (razão pela qual tanto a tradição quanto a teoria gerativa se referem a essas estruturas como “impessoais”). Enquanto em (10) o argumento interno é um CP, ou seja, uma oração desenvolvida, em (11), levar seleciona um PP (P + InfP), ou seja, uma oração infinitiva complemento de preposição, além de um segundo argumento, o DP [30 minutos], que tem aqui a função de oblíquo nuclear3. Veja-se que o DP sujeito da encaixada recebe Caso do verbo finito “não fez”, 3 Embora a estrutura seja um DP, sabemos tratar-se de um circunstancial que pode aparecer sob a forma de PP: [cerca de 30 minutos] 10 em (10), e do infinitivo pessoal “deixar”, em (11). O alçamento não se faz, portanto, necessário. O fato de selecionarem um argumento interno coloca esses verbos entre os inacusativos (cf. Mioto, Lopes e Silva 2005; Haegeman 1994). Evidência de que o argumento dos verbos de alçamento é interno está na agramaticalidade das sentenças em (12): (12) a. *[Que os jovens estudam na UFRJ [parece]]. b. *[Para o diploma ficar pronto [demorou]]. Entre os verbos de alçamento analisados neste trabalho, o verbo parecer4 constituirá um grupo à parte, uma vez que permite quatro estruturas, ilustradas em (13): (13) a. [IP [øexpl] Parece [CP que os jovens não estudam muito]]. b. [IP Os jovensi parecem [InfP ti não estudar muito]]. c. [TopP Os jovensi [IP [øexpl] parece [CP que øi estudam muito]]]. d. [IP Os jovensi parecem [CP que øi estudam muito]]. (eles)i e. [IP Os jovensi parecem [CP que elesi estudam muito]]. Em (13a), encontra-se uma construção que apresenta um sujeito expletivo nulo à esquerda de parecer devido ao não alçamento do DP sujeito do verbo da oração encaixada. Em línguas de sujeito preenchido, como o inglês e o francês, a posição argumental disponível na oração matriz é preenchida por um pronome expletivo, isto é, sem conteúdo semântico, respectivamente pelo it e pelo il. Encontra-se, em (13b), outra estrutura de alçamento, conhecida como alçamento padrão. Como se pode observar, essa construção se caracteriza pelo alçamento do DP sujeito da oração encaixada para a esquerda do verbo de alçamento, onde ele recebe caso nominativo de flexão, enquanto o verbo da 4 Diversos estudos já focalizaram o verbo parecer sob diferentes perspectivas teóricas. O autor deste trabalho investigou tal verbo, em trabalho de final de curso ministrado pela professora Célia Lopes, em uma estrutura que se assemelha à de um marcador discursivo (cf. Martelotta, Votre e Cezario 2004): (i) O concurso já foi feito dentro da escola, dentro da Escola da Aeronáutica e era no Campo dos Afonsos, aqui no Rio de Janeiro. Depois, eles tiraram isso daqui e colocaram lá em Pirassununga, parece. (Henriques 2006a) Gonçalves (2003), em sua tese de doutorado, focaliza o verbo parecer, sob a perspectiva funcionalista. 11 subordinada apresenta a forma infinitiva. Em (13c), encontra-se uma estrutura de deslocamento, que exibe o alçamento do sujeito da oração encaixada para uma posição externa à sentença. Dessa forma, a posição disponível à esquerda do verbo de alçamento apresenta um expletivo nulo, o verbo de alçamento se mantém na terceira pessoa do singular e o verbo da subordinada, que se encontra flexionado, atribui Caso ao seu sujeito nulo [ø], coindexado com o DP em TopP. Finalmente, em (13d) e (13e), observamos, ao mesmo tempo, o alçamento do sujeito da subordinada para a posição à esquerda do verbo de alçamento e a flexão dos dois verbos, o da oração matriz e o da oração encaixada. Ferreira (2000) referese a essa estrutura como hiperalçamento. Tal construção constitui um desafio à teoria sintática. Se um DP só pode receber Caso uma vez, como explicar as duas formas flexionadas em relação de concordância com o mesmo DP? Dentro da perspectiva minimalista, Ferreira (2000) e Martins e Nunes (2005) atribuem ao enfraquecimento da morfologia verbal no PB a possibilidade de uma sentença finita (T finito) atribuir Caso “opcionalmente”. Quando T(ense) da encaixada é defectivo, não podendo atribuir Caso ao seu especificador, este é alçado para a posição de especificador de T da sentença mais alta, onde o Caso é atribuído / checado. Mais recentemente, Martins e Nunes (2007) distinguem as estruturas de “hiperalçamento” das de “hiperalçamento aparente”, o que os leva a considerar os exemplos em (13d) e (13e) acima, aqui repetidos em (14), como duas estruturas de derivação diferente: (14) [TP Os jovensi parecem [CP que (eles)i estudam muito]]. Na construção com o pronome da encaixada nulo, tem-se o verdadeiro hiperalçamento. Como T é defectivo, o sujeito é alçado, deixando um vestígio (t) de movimento, como ilustrado em (15): (15) [TP Os jovensi parecem [CP que ti estudam muito]]. Em relação às estruturas em que se tem um pronome expresso na encaixada, os autores lançam mão da orientação do PB para o discurso e propõem que o DP é 12 gerado em [Spec, TopP] da encaixada. Na falta de um expletivo nulo na numeração, o T da matriz pode concordar com o tópico encaixado, atraindo-o para seu especificador a fim de checar o EPP (Extended Projection Principle), como mostram (16 a,b): (16) a. [TP Parece [CP que [TopP os jovensi [TP elesi estudam muito]]]]. b. [TP Os jovensi parecem [CP que [TopP ti [TP elesi estudam muito]]]]. Embora uma discussão sobre a pertinência dessas propostas fuja aos limites deste trabalho, optamos por manter as análises oferecidas por Martins e Nunes (2005, 2007), utilizando a distinção “hiperalçamento” e “hiperalçamento aparente” para as ocorrências ilustradas em (15) e (16), buscando investigar se há motivações diferentes para a diferença na representação do sujeito da encaixada. Nossa opção se deve ao fato de que, como se trata de um único argumento, o alçamento é uma explicação plausível para a estrutura (15); quanto à sentença em (16), é inegável que a estrutura de sujeito deslocado à esquerda é freqüente no PB, bem como a concordância entre um verbo que não seleciona argumento externo e um tópico5, o que torna a proposta bastante coerente. O comportamento dos demais verbos de alçamento é diferente, pois apenas duas estruturas são possíveis. É possível separar tais verbos em três grupos: os que selecionam um CP, um InfP / GerP ou um PP. Abaixo, encontram-se exemplos de verbos que selecionam um CP nas estruturas sem alçamento. Em (17), estão as construções sem alçamento e, em (18), as estruturas de alçamento padrão com esses verbos: (17) a. [IP [øexpl] Acabou [CP que os meninos foram ao colégio]]. b. [IP [øexpl] Só faltou [CP que os pais de Milena batessem na menina]]. c. [IP [øexpl] Custou [CP que os pais entendessem a situação]]. d. [IP [øexpl] Bastava [CP que os políticos tomassem uma atitude]]. e. [IP [øexpl] Convinha [CP que você chegasse lá mais cedo]]. 5 É bastante conhecida a ocorrência de construções com o sujeito deslocado à esquerda em PB, apresentada em (i), bem como são notórios os casos de concordância entre um tópico e um verbo que não seleciona argumento externo, em (ii): (i) Eu acho [CP que [TopP o povo brasileiroi [TP elei tem uma grave doença]]]. (Duarte 1995) (ii) [TP Essas janelas ventam muito]. (Pontes 1987) 13 (18) a. [IP Os meninosi acabaram [GerP ti indo ao colégio]]. b. [IP Os pais de Milenai (só) faltaram [InfP ti bater na menina]]. c. [IP Os políticosi bastavam [InfP ti ter tomado uma atitude]]. d. [IP Vocêi convinha [InfP ti chegar lá mais cedo]]6. A seguir, em (19), são apresentados exemplos de verbos que selecionam, nas estruturas sem alçamento, um InfP. Em (20), as construções com alçamento padrão com tais verbos são apresentadas: (19) a. [IP [øexpl] Faltou [InfP os pais de Milena irem ao encontro]]. b. [IP [øexpl] Bastou [InfP os políticos tomarem uma atitude]]. c. [IP [øexpl] Convinha [InfP eu prestar atenção às aulas]]. d. [IP [øexpl] Custou [InfP os pais entenderem a situação]] (20) a. [IP Eui só falto [InfP ti estudar mais]]. b. [IP O Joãoi basta [InfP ti acreditar no pai]]. c. [IP Eui convinha [InfP ti prestar atenção às aulas]]. d. [IP (eu)i Custo [PP ti a acreditar na palavra de político]]. Por fim, são apresentados os verbos que selecionam um PP. Em outras palavras, a oração encaixada é introduzida por uma preposição. Em (21), apresentam-se exemplos sem alçamento; em (22), as construções de alçamento padrão: (21) a. [IP [øexpl] Leva 1 ano [PP para o diploma ficar pronto]]. b. [IP [øexpl] Demorou (1 ano)7 [PP para o diploma ficar pronto]]. (22) a. [IP (eu)i Levo o dia inteiro [PP para ti resolver todos os problemas]]. 6 Por mais estranheza que as sentenças de alçamento com convir possam causar, o exemplo (20c) foi colhido de fala espontânea. Na escrita, foi atestado pelo menos um exemplo, em texto de Millôr Fernandes: (i) E convenho (!) lembrar: “Mineiro nunca é o que parece. Sobretudo quando parece o que é.” (Millôr Fernandes, Veja, 24 de maio de 2006). (A exclamação depois de “convenho” é do autor.) 7 Embora, o constituinte “1 ano” esteja relacionado aos verbos demorar e levar, seu papel em cada sentença é diferente. Se por um lado, tal constituinte faz parte da estrutura argumental com o verbo levar, por outro, com demorar, ele desempenha a função de adjunto adverbial. Neste caso, portanto, ele é um constituinte opcional. 14 b. [IP Os alunosi demoraram [PP para ti fazer a atividade]]. Em linhas gerais, até o momento, apresentou-se uma definição do conceito de alçamento, enfatizando que o deslocamento sintático só é possível devido à posição argumental disponível à esquerda dos verbos de alçamento. Além disso, mostrou-se que alguns verbos selecionam como argumento interno um CP e outros selecionam um InfP ou um PP. 1.3 As construções de alçamento na tradição gramatical As gramáticas tradicionais reúnem as construções a que nos referimos como construções de alçamento num conjunto de estruturas que apresentam um verbo impessoal na oração principal e uma subordinada classificada como substantiva subjetiva introduzida por uma conjunção integrante ou uma reduzida de infinitivo (cf. Bechara 1985 [1977], Cunha e Cintra 2001, Rocha Lima 2003 [1982])8. Em nenhum momento da descrição das substantivas subjetivas são apresentadas quaisquer observações, seja quanto à impossibilidade de mover a oração para a posição à esquerda do verbo da oração principal, seja quanto à possibilidade de alçamento do sujeito do verbo da subordinada. Rocha Lima (2003) apresenta os principais esquemas de construção em que as subordinadas subjetivas figuram, pois, segundo o autor, costuma haver certa dificuldade em reconhecê-las. Para que uma oração seja identificada como subjetiva, segundo a regra, o verbo da oração principal (cabe lembrar que o interesse está na presença de um verbo de alçamento na oração matriz) deve estar na 3ª pessoa do singular e ser seguido por uma conjunção integrante. Além disso, o autor apresenta os diferentes valores semânticos dos verbos que podem aparecer na oração principal: parecer está inserido no grupo semântico de “dúvida” e convir no grupo de “conveniência”. De um modo geral, não se pode considerar satisfatório o tratamento que as gramáticas tradicionais dão às estruturas com parecer, convir, entre outros, pois nunca mencionam a razão da dificuldade em classificar as orações que os seguem, nem oferecem uma explicação para a estrutura com o sujeito da subordinada movido 8 Em relação à classificação de orações, encontram-se, nas gramáticas, exemplos com somente quatro dos verbos de alçamento focalizados neste trabalho: parecer e convir, em orações desenvolvidas; bastar, que aparece no grupo das reduzidas (Cunha e Cintra 2001) e custar, que, quando tem o sentido de ‘ser custoso’, ‘ser difícil’, apresenta, necessariamente, uma oração reduzida como seu sujeito (Rocha Lima 2003). 15 para a posição de sujeito sintático da principal. Poucos são os filólogos e gramáticos que chamam a atenção para tais construções. Ao tratar da concordância com sentenças infinitivas, Said Ali (1966) e Mendes de Almeida (1969) afirmam que parecer faculta duas construções, ou, segundo as palavras de Said Ali (op. cit.), “parecer pode ser usado tanto impessoal como pessoalmente”. As duas possibilidades estruturais registradas pelos autores são apresentadas abaixo, em exemplos retirados de Mendes de Almeida (op. cit.:501): (23) a. Eles parecem estar doentes. b. Eles parece estarem doentes. Verifica-se, em (23), que a concordância pode estar tanto no verbo parecer quanto no outro verbo (no caso, estar). Em outras palavras, novamente retomando Said Ali (1966), parecer pode ser usado de forma impessoal (sem um sujeito) e de forma pessoal (com um sujeito). Para Mendes de Almeida (1969), em (23a), parecer atua como verbo de ligação e a oração [estar doentes] é o seu predicado. Por outro lado, em (23b), parecer é empregado intransitivamente, ou seja, ele tem o seu sentido completo, enquanto a oração [eles estarem doentes] é o seu sujeito. A sentença em (23b), segundo o autor, é equivalente a duas possibilidades estruturais, apresentadas em (24): (24) a. [[øexpl] Parece [estarem eles doentes]]. b. [[øexpl] Parece [que eles estão doentes]]. Pode-se, a partir dos exemplos extraídos de Mendes de Almeida (1969), concluir que: (i) temos em (23a) uma construção de alçamento padrão, representada em (23a’); (ii) em (23b), o sujeito da subordinada está deslocado numa posição de tópico, como evidencia a não concordância com parecer (cf. (23b’)). O Caso é atribuído ao pronome nulo pelo infinitivo flexionado. (23) a’. [IP Elesi parecem [InfP ti estar doentes]]. b’. [TopP Elesi [IP [øexpl] parece [IP øi estarem doentes]]]. 16 O deslocamento, ilustrado em (23b’) é apresentado em Cunha e Cintra (2001) nas seções dedicadas às figuras de sintaxe, sendo chamado de anacoluto ou “quebra na sintaxe”. De acordo com os autores, esse fenômeno abarca uma mudança na construção sintática no meio do enunciado, geralmente depois de uma pausa, e é muito comum na linguagem falada. Rocha Lima (2003), utiliza a expressão ‘desconexão sintática’ (:489) para se referir a esse elemento deslocado. Na sentença em (25), retirada de Cunha e Cintra (op. cit.:630), encontra-se um exemplo dessa estrutura: (25) [TopP Eui [IP [øexpl] parece-mei [CP que øi ainda não ofendi ninguém!]]] . Os autores adotam a seguinte explicação para o que denominam um “desvio na construção sintática”: o pronome, que seria o sujeito de parecer, fica sem função e a 1ª pessoa passa a ser representada pelo clítico me. A simples possibilidade de realizar foneticamente o pronome nulo, sujeito de “ofendi”, desmente tal explicação. E o que dizer do hiperalçamento? Embora tal estrutura não seja tratada nas gramáticas, registre-se o fato de ela ter chamado a atenção de Bechara (1985 :227), que se refere a ela, em uma nota de rodapé, como uma pessoalização do verbo parecer, ilustrando-a com um exemplo de Marquês de Maricá: (26) Nunca nos esquecemos de nós, [IP ainda quando øi parecemos [CP que mais nos ti ocupamos dos outros]]. Em relação aos demais verbos, o alçamento padrão com o verbo custar recebe destaque em Rocha Lima (2003 :428). O autor afirma que construções como “Custo a crer nisso” e “Custamos a resolver o problema” foram vulgarizadas a partir do Romantismo e que correspondem à “contribuição brasileira à sintaxe e à semântica” do verbo. Rocha Lima discute, ainda, os diferentes valores semânticos de custar, que estariam diretamente relacionados à presença ou ausência de uma preposição introduzindo a oração subordinada. Examinemos as sentenças em (27). (27) a. Custou-lhe fazer todos os exercícios. b. João custou a fazer todos os exercícios. 17 Se por um lado, para o autor, o verbo custar em (27a) tem o sentido de ‘ser custoso’, ‘ser difícil’, por outro, em (27b), tal verbo possui o valor semântico de ‘demorar’. Ou seja, neste último caso, há uma “convizinhança semântica” entre os dois verbos. Em suma, depreende-se que a preposição é importante na determinação do valor semântico de custar. Além disso, a partir dos exemplos apresentados por Rocha Lima, é possível questionar se a presença de um clítico ou um SP dativo (ao João) junto ao verbo de alçamento e a ausência de uma preposição introduzindo a oração subordinada estão interligadas. Se se leva em conta a redução no quadro de clíticos do PB (cf. Freire 2000, 2005, entre muitos outros), tem-se motivo para supor que a preferência pelo alçamento com os verbos de alçamento pode se dever a essa simplificação. Temos, então, se não um tratamento aprofundado ou unificado das construções aqui analisadas, pelo menos a certeza de que as quatro estruturas são possíveis com o verbo parecer há já bastante tempo no português, apesar de o hiperalçamento ser visto quase como um descuido, e o deslocamento, como um desvio. Quanto ao alçamento padrão, não há menção a outros verbos além de custar. Não há, tampouco, qualquer prescrição contrária ao seu uso. Na próxima seção, são apresentados alguns estudos diacrônicos e sincrônicos sobre a mudança na marcação do PSN em PB, e alguns de seus possíveis reflexos no sistema. 1.4 Pontos de partida: estudos sincrônicos e diacrônicos Nos últimos anos, pesquisas sobre o português falado do Brasil apontam para o fato de que a posição do sujeito pronominal vem se caracterizando pela forma plena, tanto para os de referência definida quanto para os de referência arbitrária (cf. Duarte 1993, 1995, 2000). Investigando os reflexos dessa mudança em direção ao preenchimento do sujeito pronominal no sistema, diversos trabalhos apontam que as construções com os verbos de alçamento vêm sendo afetadas. Nesta seção, apresentam-se os resultados encontrados em diversos estudos, que servem de pontos de partida para este trabalho. 1.4.1 Os sujeitos referenciais Tanto em pesquisa de cunho diacrônico (Duarte 1993) quanto em pesquisas sincrônicas (Duarte 1995, 2003a, para fala culta e popular, respectivamente), ficou 18 evidenciado o aumento progressivo no preenchimento de sujeitos pronominais no Português Brasileiro, tanto os de referência definida quanto os de referência indeterminada. Os resultados indicam que o PB está se tornando uma língua negativamente marcada em relação ao Parâmetro do Sujeito Nulo (Chomsky 1981), ao contrário do que ocorria em estágios anteriores do português no Brasil, como pode ser observado na análise de peças teatrais, empreendida por Duarte (1993), e ainda ocorre no Português Europeu (PE), no espanhol e no italiano, como apontam as pesquisas quantitativas de Duarte (1995), Soares da Silva (2006) e Marins (2007), respectivamente. Em sua análise de peças de teatro popular, Duarte (1993) sugere que a mudança em curso no PB em relação ao preenchimento do sujeito pronominal de referência definida estaria diretamente interligada à redução do quadro dos paradigmas flexionais verbais. A tabela 1.1 a seguir, adaptada de Duarte (1993), mostra os diferentes estágios do quadro de paradigmas verbais em PB: Pessoa Pronomes Paradigma 1 Paradigma 2 Paradigma 3 1ª singular Eu cant o cant o cant o 2ª singular Tu cant a s - - Você / Tu cant a cant a cant a 3ª singular Ele / Ela cant a cant a cant a 1ª plural Nós cant a mos cant a mos - A gente - cant a cant a Vós cant a is - - Vocês cant a m cant a m cant a m Eles / Elas cant a m cant a m cant a m 2ª plural 3ª plural Tabela 1.1: Paradigmas flexionais em PB A simplificação dos paradigmas flexionais é proposta inicialmente no estudo diacrônico de Duarte (1993) e retomada em sua análise da fala culta carioca (Duarte 1995). Como se pode observar na tabela acima, o paradigma que antes era 19 constituído por seis diferentes morfemas (paradigma 1), hoje está reduzido a quatro (paradigma 2) e, na fala dos grupos mais jovens, a apenas três (paradigma 3). Em linhas gerais, segundo a autora, a mudança no quadro se deve, principalmente, à perda da distinção entre as formas verbais para a referência à segunda pessoa do singular, levando à neutralização de formas como ‘tu canta – você canta’ e à concorrência entre ‘nós’ e ‘a gente’ para referência à primeira pessoa do plural. Portanto, devido a diversas mudanças no quadro pronominal em PB, uma forma como ‘canta’ pode estar relacionada a várias pessoas do discurso: ‘você / tu canta’, ‘a gente canta’ e, se o falante não apresentar a marca de concordância no plural, ‘vocês canta’, ‘eles canta’ e ‘nós canta’. Os dados apresentados em Duarte (1993), referentes à análise de textos teatrais escritos nos séculos XIX e XX, já apontam para uma notável simplificação nos paradigmas flexionais e sua relação com a ocorrência do sujeito expresso. Por outro lado, o espanhol, o italiano e o PE apresentam um paradigma flexional rico, o que, além de licenciar e identificar sujeitos nulos referenciais, licencia um sujeito expletivo nulo9. Duarte (1995) afirma que os elevados índices de sujeitos nulos no espanhol peninsular e no italiano podem ser creditados aos seus paradigmas verbais, os quais exibem desinências distintivas para cada pessoa gramatical. O inglês, entretanto, apresenta em seu paradigma uma única forma distintiva: a terceira pessoa do singular no tempo presente. Por sua vez, o francês medieval, à semelhança do que vem ocorrendo no PB, perdeu a propriedade de língua de sujeito nulo paralelamente à redução de seu quadro de paradigmas flexionais (cf. Duarte 1995). No gráfico 1.1, encontram-se os resultados gerais oriundos da análise de peças teatrais (cf. Duarte 1993). Percebe-se que o índice de sujeitos nulos reduz progressivamente à medida que o paradigma flexional em PB é simplificado. Note-se que nos três primeiros períodos de tempo analisados, quando vigorava um paradigma flexional rico, os índices de ocorrência do sujeito nulo eram superiores a 70%. À medida que o paradigma se reduz, verifica-se uma crescente preferência pelo sujeito expresso. Nas peças de 1937 e 1955, com o paradigma 2, os índices de sujeito nulo já não são tão altos. Por fim, em 1975 e 1992, quando prevalece o paradigma 3, percebe-se uma clara preferência pelo preenchimento da posição do 9 Haegman (1994) relaciona o parâmetro prodrop ao paradigma flexional das línguas. Segundo a autora, línguas que apresentam um paradigma rico, freqüentemente, licenciam o sujeito nulo. 20 sujeito pronominal. Portanto, a preferência pelo sujeito pleno acompanha a evolução do quadro de paradigmas flexionais, o que confirma a hipótese de Duarte (1993). Os resultados encontrados para a peça de 1992 estão muito próximos dos obtidos por Duarte (1995, 2003a), que revelam a crescente preferência pelo sujeito referencial pleno. Duarte (1995), com base na fala culta carioca, focaliza os sujeitos de referência definida, revelando que contextos estruturais em que uma língua de sujeito nulo deixaria vazia a posição de sujeito vêm sendo preenchidos por um item lexical. A fala popular, à semelhança do que foi apontado para a fala culta, também apresenta elevados índices de preenchimento do sujeito pronominal referencial (cf. Duarte 2003a). Sujeitos nulos em peças teatrais 90% 80% 70% 60% 50% 40% 30% 20% 10% 0% 1845 1882 1918 1937 1955 1975 1992 Gráfico 1.1: Sujeitos nulos em peças teatrais (Duarte 1993) Em (28a) e (28b), encontram-se sujeitos de referência definida e arbitrária, respectivamente, que evidenciam a mudança não somente em termos quantitativos, mas também qualitativos, com a expressão de pronomes correferenciais em orações encaixadas, sem qualquer ambigüidade que levasse a tal preenchimento numa língua de sujeito nulo do tipo românico: (28) a. Elai ganha bem, mas eu acho que elai devia ganhar mais porque elai merece. (Duarte 2003a) b. Vocêi, quando vocêi viaja, vocêi passa a ser turista. Então vocêi passa a fazer coisas que vocêi nunca faria no Brasil. (Duarte 1995) 21 Os índices de preenchimento do sujeito referencial encontrados nos referidos estudos apontam que o PB está, de fato, passando por uma mudança na marcação do Parâmetro do Sujeito Nulo: de língua positivamente marcada em relação ao parâmetro para uma língua negativamente marcada. Os dados indicam, ainda, que a mudança afeta as três pessoas gramaticais. No entanto, nota-se uma resistência maior da terceira pessoa e da primeira pessoa do plural ‘nós’, que apresenta uma desinência mais saliente quando comparada às demais, apesar da freqüência de uso deste pronome ser muito baixa na fala dos grupos mais jovens (cf. Duarte 1995; Barbosa, Duarte e Kato 2005). A mudança paramétrica pela qual está passando o PB deixa alguns “vestígios” ou “efeitos colaterais” no sistema. Duarte (1995) mostra que o primeiro subproduto da mudança em curso está na significativa ocorrência de estruturas com o sujeito deslocado à esquerda, conhecidas também como construções de duplo sujeito. Em (29), encontram-se exemplos de tal estrutura, retirados de Duarte (1995, 2003a). (29) a. A Clarinhai elai cozinha que é uma maravilha. b. A minha filhai, quando era pequena, elai sempre desceu, sempre brincou lá. c. Mulher nenhumai elai pode querer dominar o homem. O homemi elei é livre por natureza. A mulheri elai tem que aceitar isso. 1.4.2 Os sujeitos não referenciais Com base nos resultados para os sujeitos referenciais, a pergunta seguinte que o pesquisador interessado na mudança lingüística se faz, particularmente na questão do “encaixamento”, seria: o contexto do sujeito não referencial seria, de alguma forma, afetado pela mudança na marcação do PSN (Chomsky 1981)? Em busca de possíveis subprodutos da mudança, Duarte (2003b) desenvolve diferentes estudos focalizando, inicialmente, as sentenças existenciais com ter e haver. Os resultados sugerem que a preferência pelo verbo ter teria aberto caminho para as construções pessoais10 (cf. ainda Callou e Avelar 2002, Avelar 2006, Duarte 2003b, Callou e Duarte 2005, entre outros). 10 Já em 1996, Duarte chamava a atenção para um crescente uso de “você”, além de outras formas nominativas com ter existencial: (i) Você não tem mais comércio no centro da cidade. 22 Em seguida, foram investigados os verbos inacusativos que selecionam como argumento interno um DP. Buscava-se observar se a posição disponível à esquerda desses verbos, que igualmente não selecionam um argumento externo, seria preenchida quer com o deslocamento do argumento interno para a posição de Spec de IP quer com a inserção de outros elementos. Embora a ordem V DP ainda seja muito freqüente com esses verbos, os índices encontrados apontam que esse contexto também é, de alguma forma, afetado pela mudança paramétrica em curso no PB11 (cf. Duarte 2003b, Santos e Duarte 2005, Santos 2006, entre outros). Finalmente, a análise enfocou as construções com verbos de alçamento dentro da mesma “perspectiva paramétrica”, numa investigação de que participou o autor desta dissertação como bolsista de Iniciação Científica (cf. Duarte 2003b, 2004, 2007; Henriques 2005; Henriques e Duarte 2006). Esses estudos mostram que, de fato, há um crescimento no uso das estruturas de hiperalçamento na fala e de alçamento padrão na escrita, o que evidencia uma tendência a realizar foneticamente uma posição não temática. Na falta do desenvolvimento de um expletivo lexical, como parece ocorrer, por exemplo, no espanhol da República Dominicana12 (cf. Toribio 1996), o PB usa elementos com conteúdo semântico para preencher essa posição. Em Henriques (2005) e Henriques e Duarte (2006) investigou-se o comportamento dos verbos de alçamento, em particular o verbo parecer, que permite o hiperalçamento, na fala popular e na escrita padrão de PB. A análise quantitativa da fala utilizou duas amostras de fala popular carioca, constituídas pelo Projeto PEUL (Programa de Estudos sobre o Uso da Língua), representativas de dois períodos de tempo: anos 80 e anos 2000. Ou seja, fez-se um estudo da mudança em tempo real de curta duração (cf. Paiva e Duarte 2003). Nos gráficos 1.2, abaixo, encontram-se os resultados gerais para a fala popular (reunindo alçamento versus não alçamento), agrupando as ocorrências com parecer e com os demais verbos. Os resultados para a fala popular, aqui 11 Embora freqüentes na fala espontânea, como já apontava Pontes (1987), sentenças como (i), abaixo, não são encontradas nas entrevistas sociolingüísticas: (i) Meu teclado não está funcionando o acento. ([øexpl] Não está funcionando o acento do teclado) 12 Segundo Toribio (1996), uma variedade do espanhol dominicano desenvolveu o expletivo ello, que aparece em construções como: (i) a. ello hay muchos mangos en este año b. ello lhegan guagas a toda hora. c. ello parece que va a llover. 23 apresentados, se encontram também em Duarte, Martins e Nunes (2002), Duarte Anos 2000 66% 34% Alçamento Não Alçamento (2003b, 2004, 2007). Gráficos 1.2: Alçamento versus80 não alçamento na fala popular com todos os verbos de alçamento Início dos Anos Percebe-se que, em ambos os períodos analisados, há uma nítida preferência pelo alçamento do sujeito do verbo da oração encaixada, com cerca de 60% nos 60% anos 80 e 66% nos anos 2000. Na tabela 1.2, abaixo, são apresentados com 40% maiores detalhes as ocorrências de alçamento em relação ao verbo parecer. Alçamento Não Alçamento Ocorrências com parecer na fala popular Anos 80 Anos 2000 (1) Sem alçamento 26 (64%) 23 (48%) (2) Alçamento padrão 1 (02%) (3) Deslocamento 1 (02%) 3 (06%) (4) Hiperalçamento 14 (34%) 21 (44%) Total 41 (100%) 48 (100%) Tabela 1.2: Construções com parecer na fala popular Os resultados para a fala popular apresentados na tabela acima indicam que (a) diminui no tempo real de curta duração a ocorrência de construções sem alçamento, passando de 64% para 48%; (b) o hiperalçamento já é freqüente no primeiro momento e cresce em 10% no segundo; (c) o deslocamento tem baixíssima freqüência, enquanto o alçamento padrão se revela como uma estrutura em extinção na fala popular. Duarte (2007) aponta, em relação à fala popular, para a possibilidade de hiperalçamento com o verbo acabar, o que poderia sugerir uma mudança em curso na mesma direção de parecer. Em (30), é apresentado um exemplo de hiperalçamento com acabar. 24 (30) a. Aí, chega: me dá aqueles papeizinhos, me dá aqui, me dá ali, “vote nesse, vote nesse, vote nesse”. [IP E eui acabo [CP que ti não sei]], não sei mesmo. Em relação aos demais verbos de alçamento, encontra-se um resultado quase categórico: há uma supremacia na ocorrência do alçamento padrão, com mais de 80%. Os resultados encontrados, em ambos os períodos de tempo analisados, indicam que a preferência pelo alçamento com esses verbos começou a se implementar há mais tempo do que o alçamento com parecer (cf. Duarte 2007). A tabela 1.3 apresenta os índices encontrados detalhadamente: Ocorrências com demais verbos na fala Anos 80 Anos 2000 (1) Sem alçamento 10 (20%) 10 (18,5%) (2) Alçamento clássico 39 (80%) 44 (81,5%) Total 49 (100%) 54 (100%) Tabela 1.3: Construções com os outros verbos de alçamento Em Henriques (2006b) foram investigadas as construções de alçamento na fala culta carioca com o verbo parecer. Para isso, utilizou-se a amostra do Projeto NURC (Norma Lingüística Urbana Culta), constituída por diversos inquéritos distribuídos em dois períodos de tempo distintos, um nos anos 70 e o outro nos anos 90. Fez-se, portanto, à semelhança do estudo sobre a fala popular, um estudo em tempo real de curta duração. Encontramos a distribuição dos dados na tabela 1.4, abaixo: Ocorrências com parecer Anos 70 39 (87%) (1) Sem alçamento 1 (2%) (2) Alçamento padrão (3) Deslocamento 5 (11%) (4) Hiperalçamento Total 45 (100%) Anos 90 14 (74%) 1 (5%) 4 (21%) 19 (100%) Tabela 1.4: Construções com parecer na fala culta Os dados apresentados apontam diferenças percentuais significativas em relação à fala popular, com a preferência pelas estruturas sem alçamento, embora, no segundo momento, já se note uma redução de 13%. Quanto ao hiperalçamento, vêem-se índices inferiores aos da fala popular, mas há igualmente uma tendência de 25 aumento (10%). Atente-se, entretanto para a semelhança no que diz respeito à quase ausência absoluta do alçamento padrão e do deslocamento. Embora tanto nos dados do NURC quanto nos do PEUL tenham sido encontradas ocorrências de hiperalçamento, é possível observar algumas diferenças: na fala popular, os constituintes alçados para a esquerda do verbo de alçamento pertencem a diferentes pessoas do discurso (3ª pessoa do singular e do plural e 1ª pessoa do singular); por outro lado, na fala culta, só foram encontrados sujeitos de terceira pessoa do singular, uma estratégia ambígua entre hiperalçamento e deslocamento. Entretanto, a ocorrência de construções com elemento deslocado em sentenças com a primeira pessoa do singular ou com a terceira do plural, por exemplo, permite considerar tais ocorrências como instâncias de hiperalçamento. Em (31a) e (31b), encontram-se, respectivamente, exemplos de hiperalçamento na fala culta e na fala popular: (31) a. [IP Nova Trentoi sempre parece [CP que ti acabou de ser construída na véspera de tão bem tratada]], mas foi-se embora, de maneira assim, bastante violenta, toda uma forma de edificação. b. [IP Eui pareço [CP que ti vou explodir de raiva]] Em Henriques (2005) e Henriques e Duarte (2006) foram investigadas as construções de alçamento na escrita padrão de PB. Para isso, foi utilizada uma amostra também constituída pelo Projeto PEUL, com base em textos de opinião, crônicas, notícias e reportagens publicados nos jornais Povo, Extra, O Globo e Jornal do Brasil, entre 2002 e 2004. No gráfico 1.3, apresentam-se os resultados gerais, reunindo, novamente, alçamento versus não alçamento. Alçamento x Não Alçamento 87% 13% Alçamento Não Alçamento 26 Gráfico 1.3: Alçamento versus não alçamento na escrita padrão com todos os verbos Verifica-se no gráfico acima uma forte preferência pelo preenchimento da posição disponível à esquerda dos verbos de alçamento (87%). A tabela 1.5 apresenta mais detalhadamente os resultados encontrados. Ocorrências com parecer na escrita (1) Sem alçamento 20 (17%) (2) Alçamento padrão 89 (75%) (3) Deslocamento (4) Hiperalçamento 9 (8%) Total 118 (100%) Tabela 1.5: Construções com parecer na escrita padrão Os resultados indicam que a escrita privilegia o alçamento padrão com cerca de 75%, indo num sentido diametralmente oposto ao da fala. Além disso, já apresenta uma tímida ocorrência do hiperalçamento (8%), um indício de que essa estrutura, que não é descrita pelas gramáticas, já se implementa nessa modalidade. Abaixo, em (32), apresenta-se um exemplo de hiperalçamento retirado da amostra de escrita de jornais cariocas constituída pelo Projeto PEUL. A maioria dos dados foram encontrados no gênero crônica, que apresenta um caráter mais informal, aproximando-se, portanto, da fala: (32) [IP Com os anos, as idéiasi parecem [CP que ti vão ficando cada vez mais longe]], enquanto o seu poder de convocá-las diminui. A tabela 1.6 revela os índices encontrados para os demais verbos de alçamento. Verifica-se que o alçamento padrão é a opção preferida, com 90%. Tal como ocorre com o verbo parecer, não há qualquer restrição por parte das gramáticas em relação a essa construção; daí sua ocorrência se dar mais prontamente nas três pessoas do discurso (cf. Henriques e Duarte 2006). Ocorrências com os outros verbos na escrita (1) Sem alçamento 14 (10%) (2) Alçamento padrão 126 (90%) Total 140 (100%) 27 Tabela 1.6: Construções com os outros verbos na escrita padrão Os estudos sincrônicos sobre as construções de alçamento, aqui brevemente descritos, motivaram um estudo, utilizando cartas familiares e cartas mais formais escritas em fins de século XIX no período entre 1866 e 1889 (Henriques 2007). Trabalhou-se com duas amostras constituídas pelo Projeto PHPB-Rio (Para uma História do Português Brasileiro). Abaixo, as amostras são descritas: (a) a primeira amostra é composta por cartas enviadas por diversos remetentes a Rui Barbosa, no período de 1866 a 1899, que constam do Arquivo de Rui Barbosa - Inventário Analítico da Série Correspondência Geral Vol. 1 – Correspondentes usuais: pessoas físicas (Fundação Casa de Rui Barbosa, Rio de Janeiro); (b) a segunda amostra é constituída por 41 cartas particulares escritas entre 1879 e 1889, pelo casal Christiano Benedicto Ottoni e Bárbara Balbina de Araújo Maia Ottoni, conhecidos como vovô e vovó, respectivamente. Os informantes, portanto, pertencem ao mesmo grupo etário, mas a vovó apresentava um grau de escolaridade menor, o que era comum na época. Todas as cartas eram endereçadas a seus netos Mizael e Christiano. O avô escreveu 27 cartas e a avó 14 (cf. Lopes 2005). O reduzido número de dados obtidos (apenas 14) se deve não só ao fato de se tratar de amostras curtas, como também à baixa freqüência de construções com verbos de alçamento que selecionam um argumento interno oracional. Como pode ser observado na tabela 1.7, os índices apontam para uma preferência pelas estruturas sem o alçamento do sujeito da encaixada (57%) e pelo alçamento padrão (36%). O deslocamento, tal como se observa nos dados sincrônicos, é raro, e o hiperalçamento, ausente. Em outras palavras, o expletivo nulo é preferido ao alçamento: Estruturas de alçamento nas cartas pessoais (1) Sem alçamento 8 (57%) (2) Alçamento padrão 5 (36%) (3) Deslocamento 1 (7%) (4) Hiperalçamento - 28 Total 14 (100%) Tabela 1.7: Estrutura de alçamento com todos os verbos Em (33) e (34) são apresentados, respectivamente, dados retirados das cartas a Rui Barbosa e das cartas familiares: (33) a. Em 1879 [IP [øexpl] pareceu a todos os profissionais [CP que as aguas dos rios do Ouro, Santo Antonio e São Pedro: as d’aquelles dous rios, calculadas em 30.000.000 de litros e as deste em 45.000.000, saptisfasiam as exigencias da occasião e as de um futuro afastado, por ventura de 50 annos]]. b. Não me esqueci do Lucasi, não me tem sido possivel encontralo, na prisão não está, [IP me [øexpl] parece [CP que øi foi para algum Batalhão]], (34) a. Como está, [IP [øexpl] parece [CP que o zinco é de agoa]]. b. Antes de responder ao que nella nos cõmunicaste, observarei que talvez por (tu)i escreveres pouco, a tua calligraphia ainda naõ me satisfaz: para melhorar, [IP [øexpl] basta [CP que øi escrevas de vagar e caprichando em formar as letras bem distinctas]]. Dessa forma, os resultados, englobando todos os verbos, aliados aos resultados encontrados por Duarte em seu estudo diacrônico (1993), permitem uma análise enriquecedora de como se configurava a posição do sujeito pronominal de PB em fins do século XIX. Todos os estudos apresentados nesta seção estão relacionados à mudança na marcação do Parâmetro do Sujeito Nulo (Chomsky 1981) em PB. Outros focalizam, ainda, as conseqüências no sistema dessa mudança em progresso. Independentemente da perspectiva adotada, se diacrônica ou sincrônica, os resultados mostram que a crescente preferência pelo preenchimento do sujeito não referencial dos verbos de alçamento corresponde àquilo que Weinreich, Labov e Herzog (1968) chamam de “encaixamento” da mudança ou, simplesmente, “efeito colateral” no sistema. Neste capítulo, a partir da teoria gerativa, definiu-se o movimento sintático conhecido como alçamento. Mostrou-se que os verbos de alçamento nada mais são do que uma expansão dos verbos de cópula. Em seguida, fez-se uma descrição dos verbos de alçamento, que constituem o foco deste trabalho, além de uma descrição 29 do tratamento que essas construções recebem nas gramáticas tradicionais. Finalmente, foram mostrados os resultados de diferentes trabalhos empíricos relacionados à mudança paramétrica em curso no Português Brasileiro. Em linhas gerais, esses resultados mostram que o hiperalçamento, estrutura aparentemente inovadora, pode ser considerado um dos “efeitos colaterais” mais evidentes de que o PB, ao se tornar uma língua [-prodrop], pelo menos no contexto das línguas românicas, começa a exibir estruturas que não se encontram nem em línguas de sujeito nulo como o Português Europeu e o italiano, nem em línguas de sujeito preenchido como o inglês e o francês. 30 2. Pressupostos teóricos e metodologia Neste capítulo, apresenta-se a linha teórica que orienta este estudo: a associação dos pressupostos da Teoria de Princípios e Parâmetros (Chomsky 1981) e da Sociolingüística Variacionista (Labov 1972, 1994), principalmente a noção de “encaixamento” da mudança nos moldes de Weinreich, Labov e Herzog (1968). Pretende-se mostrar como a associação de perspectivas teóricas aparentemente tão irreconciliáveis e incompatíveis, expressões utilizadas por Duarte (1998), contribui para uma apurada descrição da sintaxe do PB, no presente caso, da mudança em direção ao preenchimento do sujeito pronominal. Procura-se mostrar, ainda, que essa associação entre modelos teóricos distintos corresponde, de fato, a um “feliz encontro”, ou segundo Kato (2002), a um “feliz casamento”. Na segunda parte do capítulo, descreve-se a metodologia empregada na investigação, focalizando a amostra utilizada e descrevendo os grupos de fatores contemplados na análise. Por fim, são reiterados os objetivos e as hipóteses que orientam o estudo. 2.1 Teoria Gerativa e Teoria da Variação: modelos incompatíveis? Duarte (1998) inicia seu texto afirmando que nas décadas de 70 e 80 os conceitos fundamentais da Sociolingüística e da Teoria de Princípios e Parâmetros eram considerados incompatíveis e irreconciliáveis. Isso acontecia, e ainda acontece em alguns meios acadêmicos, porque a teoria gerativa se preocupa primordialmente com a competência do falante (Língua-I), enquanto aquela se interessa pela língua em uso (Língua-E). Entretanto, como salienta a autora, atualmente ambos os modelos são empregados numa colaboração amistosa na análise da variação e da mudança lingüística no Português Brasileiro. Esse “feliz encontro” teóricometodológico, que tem sido chamado de Sociolingüística “Paramétrica” e teve em Tarallo (1987) seu anúncio formal num artigo-manifesto intitulado “Por uma Sociolingüística românica paramétrica” e uma proposta concreta de associação em Tarallo e Kato (1989), contribui para o estudo da compreensão da mudança sintática empreendida pelo PB. A partir de então, muitos têm sido os trabalhos desenvolvidos sob essa perspectiva, entre os quais Berlinck (1989), Moino (1989), Duarte (1989), Nunes (1992), Pagotto (1992), Duarte (1995), Cavalcante (1999), como fica evidenciado em Kato (2002). Para mostrar como essa comunhão entre os modelos 31 gerativista e variacionista é eficaz, faz-se necessário, antes de tudo, descrever cada perspectiva separadamente e entender seus princípios. 2.1.1 O modelo gerativista Em linhas gerais, o modelo gerativista enxerga a linguagem como uma faculdade inata e específica da mente humana13. Todo ser humano seria dotado de um sistema cognitivo inato que faz parte da herança genética, ou seja, seria dotado de uma faculdade da linguagem. Esse sistema de natureza exclusivamente lingüística, que recebe o nome de Gramática Universal (GU), permitiria a aquisição de uma língua complexa, rica e bem articulada a partir dos dados (input) a que o falante é exposto. Essa interação (GU e dados) levaria ao desenvolvimento daquela, acarretando a aquisição de uma gramática particular na mente de cada indivíduo. A descrição do desenvolvimento da faculdade da linguagem dá a impressão de ser bastante homogênea. Entretanto, Raposo (1992) ressalta que a própria teoria gerativa reconhece o seu caráter heterogêneo, pois ela interage de maneira complexa com outros módulos mentais também autônomos. A visão inatista da faculdade da linguagem pode dar a falsa impressão de que todas as línguas apresentam as mesmas características. Na tentativa de dar conta da diversidade das línguas, Chomsky (1981) propôs o modelo de Princípios e Parâmetros. Segundo esse modelo, a GU seria constituída por princípios rígidos, invariáveis e comuns a todas as línguas naturais, e por princípios abertos chamados “parâmetros”, que se referem na verdade a limites de variação interlingüística. Ou seja, os parâmetros admitiriam uma escolha binária de valores [+] ou [-], opções determinadas pela experiência lingüística do falante, o que explicaria as diferenças entre as línguas humanas (cf. Mioto, Silva e Lopes 2005). Um desses princípios seria o que se refere ao fato de todas as línguas humanas representarem o sujeito. Tomado este princípio, as línguas difeririam no que diz respeito à expressão do sujeito pronominal, havendo línguas em que o sujeito é obrigatoriamente expresso e línguas em que o sujeito é preferencialmente nulo. Temos, então, um parâmetro que ficou conhecido como o Parâmetro do Sujeito Nulo (PSN). O inglês e o francês, por exemplo, são línguas de sujeito preenchido, enquanto o italiano e o espanhol são línguas de sujeito nulo. O PB dos séculos XIX 13 Haegeman (1994) assim explica essa noção: “Human beings with normal mental faculties are able to learn any human language. The innate linguistic endowment must be geared to any human language and not to just one” (:12). 32 até meados do século XX, como foi apontado em diversos estudos empíricos (cf. seção 1.4), seria uma língua [+prodrop] prototípica e agora parece estar em franco processo de mudança em direção ao preenchimento da posição do sujeito pronominal referencial. Dessa forma, o modelo gerativista, ao propor um conjunto de propriedades associadas ao PSN, mostra-se muito útil na investigação dessa mudança em curso. O modelo Variacionista também contribui para uma eficaz análise da mudança do PB em direção à preferência pelo sujeito pleno. Na próxima subseção, são apresentadas as suas principais características. 2.1.2 O modelo variacionista A visão de que a variação é parte inerente a todas as línguas naturais é a bandeira do modelo Variacionista, que tem seu marco na proposta de Weinreich, Labov e Herzog (1968, 2006). A Sociolingüística Variacionista (Labov 1972, 1994, entre outros) defende que a gramática da comunidade de fala consiste em um sistema heterogêneo e plural, fruto do processo histórico de constituição da língua. No entanto, tal variação não é aleatória, e sim condicionada por fatores internos à língua (lingüísticos) e por fatores sociais (extralingüísticos). Portanto, verifica-se um rompimento com a visão estruturalista de que o sistema lingüístico seria o domínio da invariância. Em suma, a língua é vista como um sistema heterogêneo, mas ordenado. O termo “ordenado” atribui à variação um caráter sistemático. Ao lingüista cabe entender, descrever e explicar essa sistematicidade. A Sociolingüística não defende somente que a variação é inerente a todos os sistemas lingüísticos. O modelo tem como um de seus pressupostos a idéia de que é justamente a variação, ou, em termos sociolingüísticos, a competição de duas ou mais formas variantes para a realização de uma variável (cf. Labov 1972)14, a condição básica para a mudança, quando se dá a vitória final de uma dessas formas variantes, chegando-se à resolução de um processo variável. O modelo Variacionista, segundo Tarallo (2002 [1985]), é um modelo teóricometodológico que assume o “caos” lingüístico como objeto de estudo, pois, como lembra Alkmim (2003), o seu objeto de estudo é a língua falada, que ainda é vista por muitos como o lugar da desorganização lingüística. Alkmim (op. cit.:33) afirma 14 Autores como Kroch (1989) interpretam essas formas variantes como gramáticas em competição. Tal pressuposto é bem claro em Avelar (2005) e Cavalcante (2006), entre outros. 33 que a língua falada deve ser observada, descrita e analisada em seu contexto social, isto é, em situações reais de uso, já que “a Sociolingüística encara a diversidade lingüística não como um problema, mas como uma qualidade constitutiva do fenômeno lingüístico”. Como já foi dito, a variação lingüística é uma etapa vital do processo de mudança lingüística. Se ao lingüista cabe investigar a mudança lingüística, ele deve fazer uso de uma teoria que identifique satisfatoriamente as condições que determinam o início, a velocidade, a direção e o término de cada mudança (cf. Labov 1982; apud Duarte 1998). O modelo variacionista oferece ferramentas que permitem ao pesquisador investigar, por exemplo, a competição entre sujeito nulo e pleno no PB. Assim, a Sociolingüística Variacionista, ao investigar uma mudança em progresso, tem como foco (a) a propagação ou transmissão das inovações lingüísticas no sistema; (b) os condicionamentos lingüísticos e extralingüísticos, já que “fatores lingüísticos e sociais estão intimamente inter-relacionados no desenvolvimento da mudança lingüística” (Weinreich, Labov e Herzog 2006 :126 [1968]); (c) a transição, isto é, os estágios no processo da mudança; (d) a implementação dessa mudança e seu “encaixamento” no sistema; (e) a avaliação da mudança pelos membros de uma comunidade. O “encaixamento” da mudança nos moldes de Weinreich, Labov e Herzog (1968) é uma das questões mais importantes no estudo da mudança, pois uma mudança lingüística sempre é decorrente de outras e ocasiona “efeitos colaterais” no sistema. Por exemplo, se o PB apresenta uma redução de seu paradigma flexional verbal, é natural esperar alguma conseqüência no sistema. O PB era uma língua que apresentava características típicas de língua de sujeito nulo; entretanto, diversos estudos empíricos apontam uma crescente preferência pelo sujeito pleno (cf. seção 1.4, no capítulo 1). Se alterações tão profundas podem causar alguma conseqüência no sistema, por que não esperar que a mudança em direção ao preenchimento da posição do sujeito pronominal o afete de alguma maneira? Assim, surgem algumas questões: (i) como esse “efeito colateral” se manifestaria no sistema?; (ii) uma vez constatada a preferência por sujeitos referenciais plenos, os sujeitos não referenciais também seriam afetados? Se levamos em conta o feixe de propriedades associadas ao PSN, é natural esperar que sim. 34 Através de um tratamento estatístico dos dados coletados, o que leva alguns estudiosos a rotularem o modelo de análise lingüística proposto por Labov de “sociolingüística quantitativa” (cf. Tarallo 2002), o modelo variacionista procura investigar as causas, as etapas e as conseqüências de uma mudança lingüística no sistema. Não se pode, no entanto, dispensar, como instrumento de análise, no levantamento das hipóteses de trabalho, no estabelecimento dos grupos de fatores, na interpretação dos resultados, uma teoria da linguagem (cf. Weinreich, Labov e Herzog (1968). No presente caso, o modelo de Princípios e Parâmetros da teoria gerativa constitui essa teoria da linguagem. Como se verá na próxima seção, a associação entre os modelos gerativista e variacionista permite interpretar os fatos sem deixar que eles passem por idiossincrasias, conforme aponta Duarte (1999). 2.2 Teoria Gerativa e Teoria da Variação: modelos compatíveis A discussão sobre qual perspectiva adotar, se a gerativista ou a variacionista, acreditando que uma pode ser melhor que a outra, remonta à discussão secular entre empiricistas e racionalistas, bem lembrada por Tarallo e Kato (1989). Na verdade, o “feliz casamento” (cf. Kato 2002) entre modelos aparentemente tão discrepantes traz benefícios mútuos. Ou seja, eles se complementam. Ao defender que a associação entre as teorias Gerativa e da Variação enriquece os estudos referentes à mudança sintática do PB, não se pretende levantar qualquer discussão a respeito de expressões como ‘Sociolingüística Paramétrica’, como a levantada por Ramos (1999), que prefere ‘Variação Paramétrica’. Independentemente da nomenclatura mais apropriada, esta perspectiva parece dar conta do problema do “encaixamento” da mudança, ou melhor, dos “efeitos colaterais” que o sistema exibe com a mudança paramétrica em curso no PB. Sendo assim, esta investigação privilegia uma “perspectiva paramétrica”, expressão utilizada por Duarte (2007). Se por um lado, o modelo gerativista, a partir de Teoria de Princípios e Parâmetros (Chomsky 1981), consegue mostrar que a mudança lingüística em progresso no PB não corresponde a uma idiossincrasia, estando relacionada à mudança na marcação de um parâmetro, por outro lado, a perspectiva variacionista, através da Sociolingüística Variacionista de Labov (1972, 1994), aponta as causas intra e extralingüísticas da variação, já que enxerga uma clara relação entre língua e 35 sociedade. Há vários estudos referentes à sintaxe do PB que comprovam que a “comunhão” entre a Teoria de Princípios e Parâmetros (Chomsky op. cit.) e a Sociolingüística Variacionista laboviana (op. cit.) é eficaz. O estudo diacrônico de Duarte (1993) e outros trabalhos sincrônicos (entre eles Duarte 1995, 2003a, 2003b, 2007) apontaram que há variação entre o sujeito nulo e pleno no PB e, graças à perspectiva teórica, foi possível verificar que essa variação não era casual, estando, na verdade, relacionada à mudança na marcação do Parâmetro do Sujeito Nulo, ou seja, PB estava deixando de ser uma língua de sujeito nulo para se tornar uma língua de sujeito preenchido. A partir daí, outras análises se seguiram, buscando mostrar como essa mudança se encaixaria no sistema, através da observação do sujeito não referencial, incluindo as construções com os verbos de alçamento, objeto de análise deste trabalho. Portanto, é possível perceber como a associação entre os modelos gerativista e variacionista rendeu, e ainda rende, frutos até hoje (cf. Duarte 2007). Através desse “feliz encontro”, as mudanças sintáticas em curso do PB podem ser mais bem delineadas, e se pode até mesmo prever os caminhos que elas vão trilhar. Além disso, podem-se também abrir outros caminhos, à medida que comportamentos inesperados se manifestam. 2.3 Metodologia Neste trabalho, defende-se a associação dos pressupostos teóricos do modelo gerativista, mais notadamente da Teoria de Princípios e Parâmetros (Chomsky 1981), e do modelo variacionista, através da Sociolingüística Variacionista nos moldes propostos por Labov (1972, 1994). Para buscar entender os “efeitos colaterais” que afetam o sistema do PB devido à mudança em direção ao preenchimento da posição do sujeito pronominal, faz-se uso da noção de “encaixamento” da mudança defendida por Weinreich, Labov e Herzog (1968). Como já foi apontado, esses modelos eram vistos como incompatíveis, mas atualmente são complementares na investigação de mudanças paramétricas em curso no PB (cf. Duarte 1997, 1998), entre as quais a remarcação do valor do PSN. Privilegia-se, neste trabalho, uma perspectiva diacrônica, ou seja, é feito um estudo em tempo real de longa duração. O foco da investigação é o comportamento das construções com os verbos de alçamento no PB nos séculos XIX e XX. Objetiva- 36 se verificar se a preferência pelo alçamento do DP sujeito da oração encaixada para a posição não temática disponível à esquerda do verbo de alçamento na oração matriz acompanha a redução no quadro do paradigma flexional verbal do PB. Como já foi apontado, a simplificação do paradigma seria o principal responsável pela mudança sintática em progresso no PB (cf. Duarte 1993, 1995). Além disso, diversos estudos sob diferentes perspectivas teóricas defendem que o PB é uma língua parcialmente orientada para o discurso. Se uma das características das línguas orientadas para o discurso é a ausência de expletivos lexicais (cf. Li & Thompson 1976 apud Duarte 2007) é de se esperar que o PB desenvolva outras estratégias para realizar foneticamente a posição do sujeito não referencial, através do alçamento de constituintes, por exemplo, evitando o verbo em posição inicial (Kato 2002) nas sentenças. E é isso o que os estudos empíricos sobre o sujeito não referencial apontam (cf. Duarte 2004, 2007 entre outros). A partir dos trabalhos empíricos sobre a mudança na marcação do PSN (Chomsky 1981), da proposta de Duarte (1993) a respeito da simplificação da morfologia verbal, dos resultados sincrônicos obtidos para as construções de alçamento (Duarte 2004, 2007, Henriques 2005, Henriques e Duarte 2006), dos estudos de Freire (2000, 2005), entre outros, que apontam para uma redução do quadro de clíticos, da orientação parcial do PB para o discurso (Pontes 1987, Vasco 1999, 2006; Orsini 2003) e da noção de “encaixamento” da mudança (Weinreich, Labov e Herzog 1968), as hipóteses que orientam este trabalho são as seguintes: 1. à medida que o seu paradigma flexional se reduz e devido à sua orientação parcial para o discurso, PB deve apresentar uma gradativa preferência ao longo dos períodos de tempo pelo alçamento do DP sujeito do verbo da oração encaixada para a posição não temática disponível à esquerda dos verbos de alçamento na oração matriz. ; 2. o uso do clítico dativo deve diminuir sensivelmente ao longo do tempo, o que deve favorecer igualmente um paulatino aumento do alçamento do DP sujeito nas peças investigadas; 3. a construção de alçamento padrão com o verbo parecer deve diminuir em freqüência, restringindo-se nos períodos mais recentes aos casos em que o verbo ser aparece na oração encaixada, enquanto essa estrutura deve se mostrar recorrente com os demais verbos já no início do século XX; 37 4. o hiperalçamento deve ser implementado a partir do último quartel do século XX, quando o paradigma 3 se consolida; 5. os sujeitos pronominais - quer junto aos verbos de alçamento, quer junto aos verbos temáticos (que os selecionam) - devem aparecer preferencialmente nulos nos primeiros períodos e expressos nos mais recentes. A amostra de peças teatrais utilizada é a mesma analisada no estudo diacrônico de Duarte (1993). Entretanto, como a estrutura investigada não é muito freqüente, foi necessário acrescentar outras peças à amostra originalmente utilizada por Duarte, buscando manter os sete períodos de tempo. A amostra é composta por peças teatrais escritas no Rio de Janeiro por diferentes autores entre 1838 e 1992. Trata-se, em grande parte, de comédias de costume, ou seja, de textos que procuravam retratar as principais características de sua época. A partir dos anos 50, trabalhou-se, preferencialmente, com textos humorísticos, mais leves e escritos por autores bem populares em seu tempo. Foram evitados textos mais dramáticos a fim de manter certa homogeneidade de estilo. Embora não seja possível tomar os resultados como absolutos, visto que se trata de textos escritos tentando reproduzir a fala de um determinado período de tempo, é possível entendê-los como tendências de uso de uma determinada época, dado o seu caráter popular. Abaixo, no quadro 2.1, encontram-se as principais informações referentes às peças analisadas. Ano Período I 1838 - 1847 Período II 1861 - 1883 Período III 1918 Período IV 1937-1938 Período V 1949 - 1955 Peça(s) O juiz de paz na roça (1838), O Judas em sábado de Aleluia (1844), O noviço (1845), Os irmãos das almas (1847) Tipos da atualidade (1862), Direito por linhas tortas (1870), Como se fazia um deputado (1882), Caiu o ministério (1883), As doutoras (1889) O simpático Jeremias O hóspede do quarto n° 2 (1937) Autor Martins Pena França Júnior Gastão Tojeiro Armando Gonzaga A vida tem três andares (1938) A garçonnière do meu marido (1949) Humberto Cunha Silveira Sampaio Pedro Mico (1954) Antônio Callado Um elefante no caos (1955) Millôr Fernandes A mulher integral (1975) Carlos Novaes 38 Período VI 1975 - 1984 O último carro ou as 14 estações (1976) João das Neves Os órfãos de Jânio (1979) Millôr Fernandes Confidências de um espermatozóide careca (1984) No coração do Brasil Carlos Novaes Período VII Miguel Falabella 1992 Quadro 2.1: Amostra utilizada segundo o período de tempo e autores Como se pode observar na tabela acima, as peças foram divididas em sete períodos de tempo. Na tentativa de aumentar o número de dados, foram analisadas diversas peças de um mesmo autor (Períodos I e II e VI) ou foram lidos textos escritos por diferentes autores numa mesma época (Períodos IV, V, VI e VII). Se levarmos em conta os três paradigmas em vigor na análise diacrônica de Duarte (1993), teremos a seguinte distribuição: (a) do período entre 1838 e 1918, quando predominava o paradigma 1, temos os textos de Martins Pena, França Júnior (representantes, respectivamente, da primeira e da segunda metade do século XIX) e Gastão Tojeiro (primeiro autor do século XX); (b) do período entre 1937 e 1955, em que predominava o paradigma 2, as peças analisadas foram escritas por Armando Gonzaga, Humberto Cunha, Silveira Sampaio, Antônio Callado e Millôr Fernandes; (c) por fim, do período entre 1975 e 1992, quando prevalecia o paradigma 3, temos os textos de Carlos Eduardo Novaes, João das Neves, Millôr Fernandes e Miguel Falabella. No decorrer da análise das peças, foram encontrados alguns dados que, aparentemente, atendiam às características buscadas, mas que tiveram de ser descartados, como se mostra a seguir. Em (1), o verbo ter é impessoal, não selecionando argumento externo, o que impede a ocorrência de estrutura de alçamento. Por outro lado, em (2), foram descartadas duas sentenças com demorar- 39 se, cuja estrutura argumental se diferencia da estrutura dos verbos de alçamento prototípicos15: (1) [IP [øexpl] Parece [CP que agora [øexpl] tem um cara de bigodinho rondando aí o morro]], mas acho que não é tira não. (Antônio Callado - 1954) (2) a. Que culpa tenho eu que [IP o boticárioi se demorasse [PP PROi em fazer o sinapismo?]] (Martins Pena - 1847) b. Bate-se à escada, [IP e se [øarb] se demoram [PP PROi a vir saber quem é]], assenta-se o homem um momento, descansa... (Martins Pena - 1847) O trabalho privilegia uma análise quantitativa e qualitativa dos dados. Os resultados encontrados serão analisados à luz de uma “leitura paramétrica” (cf. Tarallo 1987) e relacionados à mudança no paradigma flexional do PB proposta por Duarte (1993) em seu estudo diacrônico. Na próxima subseção, são apresentados os grupos de fatores levantados para a análise dos dados. Verifica-se um predomínio de fatores lingüísticos, pois se acredita que a redução do quadro de clíticos e sua relação com o DP sujeito do verbo da oração encaixada, o tipo de oração e o verbo são importantes condicionadores para o (não) alçamento. O período de tempo, entretanto, é o fator extralingüístico fundamental na interpretação dos resultados. 2.3.1 Os grupos de fatores Ao todo, trabalha-se com quatorze grupos de fatores. Serão mostrados separadamente os resultados para o verbo parecer, que permite a ocorrência do hiperalçamento, e para os dados com os demais verbos de alçamento. Embora Duarte (2007) tenha apresentado dados que indiquem que acabar, à semelhança de parecer, já exibe o hiperalçamento, não foram encontradas tais ocorrências nos textos examinados. A variável dependente será o período de tempo (cf. quadro 2.1 acima). As variáveis independentes são as seguintes: 15 Agradeço à professora Sílvia Cavalcante por ter me alertado para o comportamento diferente do verbo demorar nessas estruturas durante uma comunicação no V Seminário de Teses e Dissertações da Pós-Graduação da UFRJ, realizado em novembro de 2007. 40 1. Tipologia verbal: o verbo parecer é separado dos demais verbos pelas razões já expostas. Compõem o grupo de “outros” verbos: acabar, bastar, convir, custar, demorar, faltar, e levar. 2. O tipo de construção: procura-se controlar qual a estrutura implementada em cada dado, focalizando a expressão ou não (nulo ou pleno) do sujeito pronominal e sua referência. (i) sem alçamento com o sujeito da encaixada nulo e não anafórico: (3) Ai, ai, [IP [øexpl] Parece-me [CP que [øarb] estão me arrancando os miolos]]. (França Júnior - 1870) (ii) sem alçamento com o sujeito da encaixada nulo anafórico: (4) [IP [øexpl] Parece-[me]i [CP que não [øi] faço outra coisa nesta casa]], desde que ela nasceu! (França Júnior - 1870) (iii) sem alçamento com o sujeito da encaixada pleno não anafórico: (5) O tempo não está nada seguro… Tivemos um lindo dia, [IP mas [øexpl] parece [CP que [a noite] se resolverá em aguaceiro…]] (Armando Gonzaga - 1937) (iv) sem alçamento com o sujeito da encaixada pleno anafórico (aqui leva-se em conta também a referencialidade do clítico): (6) Perdendo-me de Santa Rita no meio do povo, [øi] encontrei aquele homem que convidou-[me]i para tomar um sorvete, [øi] dei-lhe o braço e [IP [øexpl] parecia-mei a todo o momento [CP que eui conhecia aquela voz]]; porém meu coração estava longe de pensar que fosse sinhô]]. (França Júnior - 1870) (v) alçamento padrão com DP sujeito alçado nulo: 41 (7) Fraca proteção! [IP [øi] Levo o dia inteiro [PP para ti coser para sustentá-lo]] e o senhor a tocar viola e a cantar modinhas. (França Júnior - 1870) (vi) alçamento padrão com DP sujeito alçado pleno: (8) a. Tem gente que luta com a vida. [IP Vocêi realmente parece [InfP ti ser um que luta pela vida]]. (Carlos Novaes - 1975) b. E o mais importante: [IP vocêi acaba [GerP ti descobrindo que ele tem uma doença incurável]]. (Miguel Falabella - 1992) (vii) sujeito deslocado: (9) [TopP Eui [IP [øexpl] parece [CP que [ø]i estou enganado]]]. (Armando Gonzaga 1937) (viii) hiperalçamento: (10) [IP Vocêsi parecem [CP que ti não pensam na vida]]. (Miguel Falabella - 1992) 3. Expressão do sujeito pronominal nas construções de hiperalçamento: embora, como já foi dito, fuja ao escopo deste trabalho discutir o hiperalçamento e o “hiperalçamento aparente”, procura-se verificar se o sujeito pronominal nas estruturas de hiperalçamento aparece nulo ou pleno, tanto na oração encaixada quanto na oração matriz, uma vez que para Martins e Nunes (2007) as duas estruturas (com o sujeito da encaixada nulo ou pleno) têm derivações diferentes; para os objetivos do presente estudo, independentemente da expressão fonética do sujeito, trata-se de hiperalçamento: (11) Pelo jeito, [IP [øi] parecem [CP que ti já levam a sua conta]]. (Gastão Tojeiro 1918)16 16 A sentença em (i) abaixo representa o que Martins e Nunes (2007) chamam de “hiperalçamento aparente”: (i) Pelo jeito, [IP elesi parecem [CP que elesi já levam a sua conta]]. 42 4. Presença de clítico dativo junto ao verbo: investiga-se se a presença de um clítico dativo ou de um SP dativo lexical17 junto ao verbo de alçamento interfere na preferência por uma construção sem alçamento. Dados em que há a presença e a ausência de clíticos são apresentados, respectivamente, em (12a) e (12b): (12) a. [IP [øexpl] Parece-mei [CP que [ø]i estou a vê-la a dizer adeus à gente com os dedinhos miúdos, assim]]. Ai! Que gracinha! (França Júnior - 1889) b. [IP [øexpl] Parece [CP que a minha presença o atordoou…]] (Gastão Tojeiro 1918) 5. Correferência entre o clítico e o sujeito da encaixada (i) há correferência com o sujeito da encaixada: (13) Bravo! No fim das contas, [IP [øexpl] parece-mei [CP que, em vez de uma, [ø]i tenho duas doutoras em casa]]. Falta-te só o grau. (França Júnior - 1889) (ii) não há correferência com o sujeito da encaixada: (14) [IP [øexpl] Parece-me [CP que [ø]i não te casaste com uma analfabeta!]] (França Júnior - 1889) 6. A pessoa do sujeito da encaixada: procura-se verificar se a pessoa do discurso (no singular ou no plural) interfere na ocorrência das construções de alçamento, como ilustram os exemplos de (15a)-(15e). Levam-se em consideração também os dados que apresentam um sujeito de referência indeterminada, como o apresentado em (15f): (15) a. [IP [øi] Ainda acabo [GerP ti praticando um ato de loucura!]] (Gastão Tojeiro 1918) b. Que modos, Carlos! [IP [øexpl] Parece até [CP que você está correndo com “seu” Candinho]]. (Armando Gonzaga -1937) 17 Não houve ocorrência na amostra de SP dativo lexical, como a sentença em (i): (i) [IP [øexpl] Custa ao Joãoi [InfP [ø]i acreditar nas palavras de um político]]. 43 c. [IP Margarethi parece [CP que ti tem bicho carpinteiro!]] (Miguel Falabella 1992) d. [IP Vocêsi parecem [CP que ti não pensam na vida]]. (Miguel Falabella 1992) e. Vossa Excelência pode usar de outros termosi: [IP [øexpl] basta [CP que elesi exprimam o que o seu coração sente]]. (França Júnior - 1862) f. Zombar de ti! Seria mais fácil zombar do meu ministro! Mas, silêncio, que [IP [øexpl] parece-me [CP que [øarb] sobem as escadas]]. (Martins Pena - 1844) 7. O traço semântico do sujeito de 3ª pessoa: objetiva-se verificar se o traço [+ / animado], [+ / - humano] do sujeito de 3ª pessoa favorece ou restringe o alçamento. (i) [+hum, +anim] (16) Como o homem era importante, o rapazi ficou tolhido, sem saber como explicar o revólver, sem poder se livrar do homem e [IP [øi] acabou mesmo [GerP ti desistindo de matar a mulher]]. (Millôr Fernandes - 1955) (ii) [-hum+anim]: (17) Mas, de repente, todos sentimos [CP que [IP elei parecia [InfP ti penetrar em alguma zona de turbulência]]]. (Carlos Novaes - 1984) (iii) [-anim] (18) [IP [øexpl] Parece-me [CP que o negócio vai correndo às mil maravilhas]]. (França Júnior - 1882) 8. Referência do sujeito de 3ª pessoa: investiga-se se o traço [+ específico] ou [+ genérico], respectivamente em (19a) e (19b), é relevante na (não) ocorrência do alçamento. (19) a. [IP [øexpl] Só faltava [CP que esse Dr. Leocádio saísse agora daqui]] para complicar novamente as cousas… (Armando Gonzaga - 1937) 44 b. [IP [øexpl] Parece, no entanto, [CP que as coisas estão mudando]]. (Carlos Novaes - 1984) 9. A estrutura do DP sujeito do verbo da encaixada: investiga-se a estrutura que favorece ou restringe o alçamento18. (i) DP lexical: (20) [IP Essa Helenei demora muito [PP pra ti fazer as coisas]]. (Miguel Falabella 1992) (ii) DP pronominal: (21) a. Eu já vou, Cristina, [IP senão eui acabo [GerP ti desintegrando essa mulher integral]]. (Carlos Novaes - 1975) b. Espero, Carlos, [IP vocêi vai acabar [GerP ti se comprometendo]]. (Armando Gonzaga - 1937) 10. Tipo sintático da oração em que se encontra o verbo de alçamento: investiga-se se a preferência por uma estrutura de alçamento está relacionada ao tipo de oração em que o verbo de alçamento se encontra. (i) oração matriz: (22) [IP [øexpl] Parece [CP que a criada não gostou de me ver conversar com o Jeremias]]. (Gastão Tojeiro - 1918) (ii) oração completiva: (22) O último então… Acho [CP que [IP [øexpl] demorou mais de mês [PP pra pobre da Helene conseguir botar o moleque no mundo]]]. (Miguel Falabella - 1992) 18 Não foram encontrados na amostra dados em que o sujeito da encaixada é um demonstrativo (i) ou um quantificador (ii): (i) [IP Issoi parece [InfP ti ser difícil]]. (ii) [IP [øexpl] Convém [CP que alguém lave a louça]]. 45 (iii) oração relativa: (23) Já não freqüentas a nossa casa como antes, e hoje tenho notado que já não procuras aquelai [CP quei [IP [tvbl]19 parecia [InfP ti ser o único objeto de teus pensamentos!]]] (França Júnior - 1862) (iv) oração adverbial (24) O senhor tem uma fala tão doce [CP que [IP [øexpl] parece [CP eu estar ouvindo uma disca de gramofone…]]] Continua! (Gastão Tojeiro - 1918) 11. Preposição que introduz a oração encaixada: a presença de uma preposição introduzindo a oração encaixada interfere no alçamento do DP sujeito? Ocorreram dados somente com as preposições ‘a’ e ‘para / pra’. (i) preposição A: (25) E para maior infelicidade, vim viver com minha sograi, que é um demônio; [IP [ø]i leva todo o dia [PP ti a atiçar a filha contra mim]]. Vivo num tormento. (Martins Pena - 1847) (ii) preposição PARA / PRA: (26) Fraca proteção! [IP [ø]i Levo o dia inteiro [PP para ti coser para sustentá-lo]] e o senhor a tocar viola e a cantar modinhas. (França Júnior - 1870) 12. Verbo da encaixada: investiga-se se o alçamento padrão com o verbo parecer é favorecido pelos verbos ser e estar na oração encaixada, como têm demonstrado os resultados para a fala (cf. Duarte 1995). Neste capítulo, foram apresentados os aspectos teórico-metodológicos que orientam o presente estudo. Os dados foram codificados e analisados utilizando os 19 Vbl é o símbolo usado para variável. No caso, trata-se de um vestígio de movimento para uma posição A-barra. 46 pacote de programas Varbrul (Pintzuk 1988). A análise dos dados, empreendida no próximo capítulo, levará em conta não só a proposta levantada por Duarte (1993) em seu estudo diacrônico, proposta essa que relaciona a preferência pelo sujeito pleno à simplificação do paradigma flexional do PB à luz da Teoria de Princípios e Parâmetros (Chomsky 1981) e da Sociolingüística Variacionista (Labov 1972, 1994), buscando evidências do “encaixamento” da mudança (Weinreich, Labov e Herzog 1968) e tomando como guia as propriedades do PSN. A leitura dos dados mostrará que os modelos gerativista e variacionista são complementares e contribuem para uma apurada descrição da mudança sintática em curso no PB. 47 3. Análise dos dados Neste capítulo são apresentados os resultados obtidos na análise das peças teatrais. Embora eles não tenham sido encontrados em grande quantidade, é possível chegar a algumas conclusões e verificar se as hipóteses levantadas são ou não confirmadas. Os resultados apresentados são analisados à luz da associação da Teoria de Princípios e Parâmetros (Chomsky 1981) e da Sociolingüística Variacionista (Labov 1972, 1994), particularmente no que diz respeito à noção de “encaixamento” da mudança. Leva-se ainda em conta a noção de língua parcialmente orientada para o discurso, que caracteriza o PB, e que pode nos auxiliar na interpretação dos reflexos que a mudança na marcação do PSN tem em nosso sistema. Como já foi dito no capítulo anterior, a investigação privilegia fatores lingüísticos, como a ocorrência ou não de alçamento, o tipo de oração em que se encontra o verbo de alçamento e a presença / ausência de um clítico junto a esse tipo de verbo. Por razões óbvias, esses fatores estruturais são observados segundo a única variável extralingüística, os períodos de tempo. A princípio, pretendia-se, após a análise quantitativa e qualitativa, fazer uma rodada do programa VARB2000, tomando os períodos de tempo como a variável dependente a fim de verificar o peso dos fatores em cada sincronia. No entanto, como será visto mais adiante, não será possível fazer uma análise de regra variável, pois a necessária separação entre as construções com parecer, que admite quatro formas variantes, e os demais verbos de alçamento, com apenas duas possibilidades de construção, sem contar o número reduzido de dados, leva a diversos knockouts, tornando inviável essa etapa da análise. Reunir os dois grupos de verbos não seria metodologicamente aconselhável, uma vez que o comportamento de uns e outros é diferente. Naturalmente, o aumento do número de dados, numa análise futura, permitirá chegar a tal etapa. No capítulo 1, foi mostrado que o verbo parecer, dentre todos os verbos de alçamento, merece atenção especial devido às suas diferentes possibilidades estruturais (construção sem alçamento, alçamento padrão, deslocamento e hiperalçamento). Por outro lado, os demais verbos exibem apenas duas construções: a estrutura sem alçamento e o alçamento padrão. Por isso, são 48 apresentados separadamente os resultados encontrados para parecer e para os demais verbos. Abaixo, na figura 3.1, é apresentada a distribuição geral em números absolutos dos dados encontrados em cada período de tempo, englobando todos os verbos de alçamento, 84 dos quais com parecer e 67 com os demais verbos. Observam-se diferenças quantitativas entre os períodos de tempo, principalmente no Período II, com um número bem maior de dados (42). Talvez a diferença entre os períodos esteja relacionada não somente ao número de peças disponíveis, mas também ao estilo do autor, pois o Período I, que contou com 4 peças (1 a menos que o Período II, portanto), não apresentou quantidade expressiva de dados. Distribuição dos dados por período de tempo 42 18 12 20 21 19 19 Período I Período II Período III Período V Período VI Período VII Período IV Figura 3.1: Distribuição geral dos dados por período de tempo 3.1. Construções com o verbo parecer Na tabela 3.1, abaixo, encontra-se a distribuição dos 84 dados levantados com o verbo parecer ao longo do tempo, segundo o tipo de estrutura em que se encontram: Sem alçamento Alçamento padrão Deslocamento Hiperalçamento Período I Período II Período III Período IV Período V Período VI Período VII Total 5 (100%) 0 (0%) 0 (0%) 0 (0%) 26 (81%) 6 (19%) 0 (0%) 0 (0%) 8 (57%) 4 (29%) 0 (0%) 2 (14%) 4 (40%) 3 (30%) 1 (10%) 2 (20%) 6 (75%) 0 (0%) 0 (0%) 2 (25%) 4 (50%) 3 (38%) 0 (0%) 1 (12%) 0 (0%) 0 (0%) 0 (0%) 7 (100%) 53 16 1 14 49 Total 5 32 14 10 8 8 (100%) (100%) (100%) (100%) (100%) (100%) Tabela 3.1: Construções com parecer através do tempo 7 (100%) 84 Uma leitura horizontal da tabela com a distribuição dos dados já permite verificar que a construção sem alçamento ocorre em todos os períodos de tempo analisados, excetuando-se o Período VII, enquanto a estrutura com alçamento padrão aparece a partir do Período II e a construção com hiperalçamento no Período III. A ocorrência de apenas 1 dado da estrutura de deslocamento no Período IV sugere ser esta uma construção rara no PB, mesmo em sincronias passadas. O gráfico abaixo representa na linha do tempo a ocorrência das construções de alçamento com parecer, a partir dos percentuais na linha vertical, excetuando-se o único caso de deslocamento: 100% Sem alçamento 90% Alçamento padrão 80% Hiperalçamento 70% 60% 50% 40% 30% 20% 10% 0% Período I II III IV V VI VII Gráfico 3.1: Construções com parecer na linha do tempo No século XIX, nota-se um amplo predomínio da construção sem alçamento preferência categórica no Período I (100%), o que pode se dever a uma questão de estilo, e de 81% no período seguinte, quando se observa a ocorrência de alçamento padrão (19%). Contudo, é a partir do Período III, início do século XX, que encontramos as maiores alterações: (i) há uma considerável redução na utilização da estrutura sem alçamento (de 81% passa para 57%); (ii) a ocorrência de alçamento padrão é maior em comparação ao período anterior (29%); (iii) finalmente, 50 surge, com 14%, uma nova construção de alçamento, que exibe a flexão dos dois verbos (o da oração matriz e o da encaixada), o hiperalçamento. É possível observar no Período IV a concorrência entre a construção sem alçamento (40%), o alçamento padrão (30%) e o hiperalçamento (20%)20. Entretanto, no Período V, há uma reviravolta nas ocorrências das estruturas de alçamento com parecer, pois se observa um considerável crescimento na ocorrência da estrutura sem alçamento (índice de 75%, quase o dobro do período anterior), o que vai de encontro às expectativas iniciais, já que era esperado que tal construção fosse diminuindo gradualmente. É importante, porém, observar a não ocorrência do alçamento padrão, o que reflete resultados encontrados para a fala espontânea, culta e popular, e 25% de implementação do hiperalçamento. No período seguinte, há uma outra alteração na preferência pelas construções de alçamento. Novamente, verifica-se uma redução na implementação da estrutura sem alçamento (50%) e do hiperalçamento (12%) e um crescimento na ocorrência do alçamento padrão com 38%. Por fim, no Período VII, as expectativas iniciais são confirmadas: observa-se a não ocorrência da construção sem alçamento e do alçamento padrão e a preferência categórica pelo hiperalçamento com 100%. Isso não significa que as construções sem alçamento estejam ausentes na fala, mas, de um modo geral, os resultados encontrados no Período VII estão, até certo ponto, em conformidade com os índices encontrados para o verbo parecer na fala popular (cf. Duarte 2004, 2007; Henriques 2005, Henriques e Duarte 2006), confirmando, portanto, uma das hipóteses que orientam este estudo: a gradativa preferência ao longo do tempo pelo alçamento do DP sujeito do verbo da oração encaixada para a posição não temática disponível à esquerda do verbo de alçamento parecer e a concordância entre esse DP e o verbo da encaixada, do qual é argumento externo, ou seja, a construção de hiperalçamento. Os resultados encontrados por Duarte (1993) nas peças teatrais para o mesmo período de tempo apontam para uma ampla preferência pelo sujeito nulo até o início do século XX. A partir de 1937, a concorrência entre sujeito nulo e sujeito pleno torna-se mais evidente. Nos períodos seguintes, a autora mostra a crescente preferência pelo sujeito preenchido no PB. Se levarmos em consideração a proposta de Duarte (1993, 1995) que defende que a preferência pelo sujeito pleno está 20 A única ocorrência de deslocamento, apresentada na tabela 3.1 e excluída deste gráfico, representa 10%. 51 interligada à redução no paradigma flexional verbal do PB, é possível a seguinte leitura geral do gráfico acima: (a) a preferência pela manutenção da posição do sujeito não referencial de parecer nula (ou seja, sem alçamento) no século XIX é coerente com os índices apresentados por Duarte para os sujeitos referenciais definidos para o mesmo período de tempo, pois eles apontam para uma ampla preferência pelo não preenchimento da posição do sujeito referencial. Ou seja, PB ainda se comportava como uma língua prototipicamente de sujeito nulo; (b) assim como na peça de 1937, em que Duarte já apresenta um crescimento dos índices de sujeito expresso, as construções com parecer também se encaminham neste período, embora timidamente, em direção à diversidade estrutural, embora predominem as construções sem alçamento; (c) nos Períodos V e VI, apesar da simplificação do paradigma verbal no PB, encontramos índices favoráveis ao não alçamento, opondo-se completamente aos resultados do Período IV e aos resultados encontrados por Duarte para o mesmo período, que apontam para uma crescente preferência pelo sujeito referencial pleno; (d) no Período VII, os índices, que mostram a preferência pelo hiperalçamento, “efeito colateral” da mudança que afeta o sistema, corroboram os resultados de Duarte, que mostram que PB está caminhando em direção à mudança na marcação do Parâmetro do Sujeito Nulo, embora sem fazer uso de um expletivo lexical. Após a análise dos resultados gerais com todas as construções de alçamento, faz-se necessária uma investigação mais aprofundada de cada estrutura no intuito de verificar se há particularidades que favorecem cada uma delas. Além de observar a preferência pelo alçamento do DP sujeito do verbo da oração encaixada para a posição à esquerda de parecer, procura-se verificar a expressão desse constituinte, se nulo ou preenchido. 3.1.1 A construção sem alçamento A estrutura sem alçamento se caracteriza, naturalmente, pelo não alçamento do DP sujeito do verbo da encaixada para a posição disponível à esquerda do verbo de alçamento na oração matriz, como se vê em (1a, b,c): (1) a. [IP [øexpl] Parece [CP que me estala a cabeça]]. (Martins Pena - 1845) 52 b. [ø]i Estás com uma personalidade inteiramente diferente. [IP [øexpl] Parece até [CP que [ø]i estás acometido de dupla personalidade...]] (Silveira Sampaio 1949) c. Que frieza! [IP [øexpl] Parece até [CP que [øarb] estamos no Pólo Norte]]. (Gastão Tojeiro - 1918) Em (1a), temos um sujeito representado por um DP lexical novo; em (1b), um nulo referencial definido e em (1c), um nulo de referência arbitrária. 3.1.1.1 A representação do sujeito da encaixada No gráfico 3.2, abaixo, são apresentados os índices referentes à forma de representação do sujeito da subordinada - DP lexical pleno, pronome nulo, pronome pleno - nas construções sem alçamento: 100% DP lexical pleno 90% 80% Pronome pleno 70% Pronome nulo 60% 50% 40% 30% 20% 10% 0% Período I II III IV V VI VII Gráfico 3.2: Expressão do sujeito da encaixada nas construções sem alçamento com parecer (DP lexical, pronome pleno, pronome nulo) Em (2), são apresentados exemplos com o sujeito da encaixada pleno com as duas possibilidades de preenchimento: (2) a. Outro dia, choveu tanto [CP que [IP [øexpl] parecia [CP que a lagoa ia subir o morro]]], pensei que a chuva ia derreter o chão aqui embaixo e jogar este barraco feito uma caixa de fósforos lá no mato do fundo. (Antônio Callado 1954) 53 b. Ai, que corrida! Já não posso! Oh, [IP [øexpl] parece-me [CP que por cá ainda dura o medo]]. (Martins Pena - 1844) c. Impressionante a rapidez com que essas profissionaisi tiravam a roupa. [IP [øexpl] Parece [CP que elasi soltavam uma presilha]] e saía tudo de uma vez: blusa, saia, meia, calcinha, sapato. (Carlos Novaes - 1979) d. Perdendo-mei de Santa Rita no meio do povo, [ø]i encontrei aquele homem que convidou-mei para tomar um sorvete, [ø]i dei-lhe o braço e [IP [øexpl] parecia-mei a todo o momento [CP que eui conhecia aquela voz]]; porém meu coração estava longe de pensar que fosse sinhô. (França Júnior - 1870) Em (3), são apresentadas construções sem alçamento com o sujeito da encaixada nulo: (3) a. Aquilo já é moléstia! [IP [øexpl] Parece [CP que, [IP se elei não sair ministro desta vez, [ø]i arrebenta!]]] (França Júnior - 1883) b. [ø]i Estás com uma personalidade inteiramente diferente. [IP [øexpl] Parece até [CP que [ø]i estás acometido de dupla personalidade...]] (Silveira Sampaio 1949) c. Ah, ah, ah, [IP [øexpl] parece-mei [CP que [ø]i estou vendo o D. Abade horrorizado]]. (Martins Pena - 1845) d. Zombar de ti! Seria mais fácil zombar do meu ministro! Mas, silêncio, [IP que [øexpl] parece-me [CP que [øarb] sobem as escadas]]. (Martins Pena - 1844) e. É claro que morar sozinho tem os seus problemas: é só você se trancar no banheiro que o telefone toca. Ou a campainha da porta. [IP E às vezes [øexpl] parece [CP que [øarb] armam um complô]]: toca tudo ao mesmo tempo. (Carlos Novaes - 1984) Embora a distribuição no gráfico 3.2 não seja muito eloqüente para os nossos propósitos, uma vez que reúne DPs lexicais e pronominais, algumas observações podem ser feitas. A expressão do sujeito da oração encaixada sofre alterações ao longo do tempo. Se por um lado, nos Períodos I, II e III, verifica-se o predomínio do pronome nulo na oração encaixada (note-se, entretanto, uma redução percentual nos dois últimos períodos), com índices entre 60% e 50%, por outro, a partir do Período IV, observa-se a preferência pelo preenchimento do sujeito da subordinada. 54 Neste período, não há ocorrências de pronome nulo e sim um equilíbrio percentual entre as duas possibilidades de preenchimento (50% tanto para o DP lexical pleno quanto para o pronome pleno). No período seguinte, o pronome nulo volta a aparecer com 33%, enquanto o DP lexical pleno apresenta 67% de preferência. No último período em que foi encontrada a ocorrência da construção sem alçamento, verifica-se, novamente, um aumento nos índices referentes ao pronome nulo (50%). Apesar disso, deve-se atentar para o fato de que no Período VI não há clara preferência pelo preenchimento ou pelo não preenchimento do sujeito da oração encaixada, pois o DP lexical pleno e o pronome pleno, juntos, somam 50% dos dados, o mesmo índice do pronome nulo. Mas que quadro teríamos, considerando separadamente os DPs e a forma de expressão (vazia vs preenchida) dos sujeitos pronominais? A tabela a seguir apresenta a distribuição dos sujeitos das encaixadas, incluindo os DPs lexicais (necessariamente plenos), os sujeitos pronominais de terceira pessoa (necessariamente anafóricos), os sujeitos de primeira e segunda pessoas, e finalmente os sujeitos de referência arbitrária (todos nulos na amostra): Período I 0/1 (0%) 0/1 (0%) Período II 3/8 (38%) 1/7 (14%) Período III 0/0 (0%) 1/3 (33%) Período IV 0/0 (0%) 2/2 (100%) Período V 0/1 (0%) 0/1 (0%) Período VI 1/1 (100%) 0/1 (0%) Período VII 0/0 (0%) 0/0 (0%) Pronomes 3ª pessoa Pronomes 1ª e 2ª pessoas Sujeito de 0/1 0/2 0/2 0/0 0/0 0/1 0/0 ref. (0%) (0%) (0%) (0%) (0%) (0%) (0%) arbitrária DPs 2/2 9/9 3/3 2/2 4/4 1/1 0/0 (0%) lexicais (100%) (100%) (100%) (100%) (100%) (100%) novos Tabela 3.2: Distribuição dos sujeitos pronominais das encaixadas com parecer em construções sem alçamento, segundo a forma de expressão: pleno vs nulo De um modo geral, os resultados para a estrutura sem alçamento mostram que os pronomes de 3ª pessoa aparecem preferencialmente nulos na oração encaixada. Somente nos Períodos II e VI foram encontrados dados com o sujeito pronominal de 3ª pessoa preenchido. Os pronomes de 1ª e 2ª pessoas apresentam comportamento semelhante: enquanto no Período IV temos 100% de preenchimento do sujeito da oração encaixada, nos Períodos II e III, encontramos índices de 55 preenchimento mais modestos (14% e 33%, respectivamente). Nos períodos mais recentes não há dados; fica, pois, a sugestão de que a construção sem alçamento é mais presente em sincronias passadas e o sujeito pronominal de referência definida era então preferencialmente nulo. 3.1.1.2 A presença do clítico dativo Uma das hipóteses defendidas neste trabalho é de que a presença de um clítico dativo junto ao verbo de alçamento seria um obstáculo ao alçamento do DP sujeito do verbo da oração encaixada. Dos 24 dados com clítico dativo encontrados na amostra, 23 aparecem, de fato, em estruturas sem alçamento, o que confirma a expectativas iniciais. Diversos estudos sobre o PB, entre eles o de Freire (2000, 2005), apontam para uma redução no quadro de clíticos, principalmente para o franco desuso do clítico dativo. Examinemos a tabela 3.3 e o gráfico 3.3, abaixo, com os resultados que as peças apontam: Período Período Período Período Período Período Período Total I II III IV V VI VII Clítico 3/5 17/26 1/8 2/4 0/6 0/4 0/0 23/53 dativo (60%) (65%) (13%) (50%) (0%) (0%) (0%) (43%) Tabela 3.3: Presença do clítico dativo vs não alçamento em construções com parecer Clítico dativo nas construções sem alçamento 80% 60% 40% 20% 0% Período I Período II Período III Período IV Período V Período VI Período VII Gráfico 3.3: Presença de clítico dativo nas construções sem alçamento com parecer A tabela 3.3 e o gráfico 3.3 mostram que em 23 dos 53 dados o verbo parecer é acompanhado de clítico dativo nas estruturas sem alçamento. Mostram ainda que nos dois primeiros períodos investigados do século XIX, a presença do clítico favorece o não alçamento, com índices entre 60 e 65%. A partir do Período V, o clítico dativo não é mais encontrado nas construções sem alçamento. Essa ausência do clítico está em consonância com os trabalhos que apontam seu quase 56 desaparecimento no português coloquial. Abaixo, em (4), encontram-se alguns exemplos da amostra: (4) a. Ah, ah, ah, [IP [øexpl] parece-me [CP que [ø]i estou vendo o D. Abade horrorizado]]. (Martins Pena - 1845) b. [IP [øexpl] Parece-me [CP que [ø]i estou a vê-la a dizer adeus a gente com os dedinhos miúdos, assim]]. Ai! que gracinha! (França Júnior - 1889) Além da presença do clítico dativo junto ao verbo de alçamento, investigou-se também se a correferência com o sujeito da encaixada poderia ser mais um obstáculo ao alçamento. Abaixo, em (5) e (6), apresentam-se, respectivamente, dados com e sem correferência entre o sujeito da encaixada e o clítico dativo junto a parecer: (5) a. [IP [øexpl] Parece-mei [CP que [ø]i estou livre de uma carga!]] (França Júnior 1862) b. [IP [øexpl] Parece-mei [CP que [ø]i o vejo a cada momento entrar pela casa adentro com a ventas esmurradas, ou com alguma faca nas tripas]]. (França Júnior - 1862) (6) a. [IP [øexpl] Parece-me [CP que esse doutorzinho em medicina que freqüenta a casa faz a corte e pode tirar-lhe do lance]]. (França Júnior - 1862) b. [IP [øexpl] Parece-me [CP que a senhora está verdadeiramente enamorada!]] (Humberto Cunha - 1938) Como é possível observar nos exemplos apresentados em (4)-(6), foram encontrados somente dados com o clítico dativo ‘me’ junto ao verbo parecer na amostra. Examinemos a distribuição por período na tabela 3.4, a seguir: Correferente Não correferente Total Período I 1/3 (33%) 2/3 (67%) 3 (100%) Período II 6/17 (35%) 11/17 (65%) 17 (100%) Período III 1/1 (100%) 0/1 (0%) 1 (100%) Período IV 0/2 (0%) 2/2 (100%) 2 (100%) Período V 0/0 (0%) 0/0 (0%) 0 (100%) Período VI 0/0 (0%) 0/0 (0%) 0 (100%) Período VII 0/0 (0%) 0/0 (0%) 0 (100%) 57 Tabela 3.4: Correferência entre clítico dativo e DP sujeito vs não alçamento em construções com parecer Em todos os períodos de tempo que apresentam clítico dativo - à exceção do Período III - há uma supremacia do fator ‘não correferente’. No Período II, por exemplo, em 11 dos 17 dados encontrados não há correferência entre o clítico dativo e o sujeito da encaixada. Apesar disso, mesmo que esse clítico não seja correferente com o constituinte da encaixada, ele atua como um obstáculo ao alçamento. Embora o clítico dativo ‘me’ mantenha uma estreita relação com a estrutura sem alçamento, pelo menos nas peças analisadas, não se pode afirmar que seu uso esteja limitado a tal construção. Foi encontrado um único dado, no Período III, em que ele aparece em uma construção singular: o sujeito da encaixada é alçado para a posição do clítico e o verbo da subordinada aparece na forma infinitiva, uma instância de alçamento padrão absolutamente distinta das demais, que serão examinadas a seguir. O sujeito alçado, em vez de nominativo, recebe Caso dativo, certamente um caso de traço inerente: (7) De acordo. [IP [øexpl] Parece-mei [InfP ti não ser destituído das qualidades exigidas pelas americanas]]… modéstia à parte. (Gastão Tojeiro - 1918) 3.1.2 O alçamento padrão O alçamento padrão é uma construção raríssima tanto na fala culta quanto na fala popular (cf. Henriques 2006b, Duarte 2004, 2007, respectivamente), apesar de plenamente recuperado na escrita padrão, como foi visto no capítulo 1, na seção 1.4.2 (cf. Henriques 2005, Henriques e Duarte 2006). A análise das peças teatrais de caráter popular, textos escritos tentando reproduzir a fala de sua época, mostrou, como foi visto no gráfico 3.1, que tal construção, embora menos freqüente que o não alçamento, aparece com índices expressivos nos Períodos II, III, IV e VI. Sua absoluta ausência no Período I, longe de sugerir seu não uso na época, pode significar a preferência do autor pelo verbo em posição inicial associado à presença do clítico dativo. Sua ausência no último período, por outro lado, confirma, sem dúvida, o que os dados de fala espontânea mostram: sua substituição pelo hiperalçamento. 58 3.1.2.1 A representação do sujeito alçado O sujeito alçado para a posição à esquerda de parecer pode se apresentar sob a forma de um DP lexical, um pronome pleno ou um pronome nulo, identificado pela flexão verbal. Os exemplos em (8), (9) e (10) ilustram esses três tipos de representação, respectivamente: (8) a. Capaz disso é elai. [IP Essa americanai parece [InfP ti ter o diabo no corpo]]. (Gastão Tojeiro - 1918) b. Mau! [IP A senhorai parece [InfP ti querer irritar-me!]] (Gastão Tojeiro - 1918) (9) e. Tem gente que luta com a vida. [IP Vocêi realmente parece [InfP ti ser um que luta pela vida]]. (Carlos Novaes - 1975) d. Mas, de repente, todos nós sentimos [CP que [IP elei parecia [InfP ti penetrar em alguma zona de turbulência]]]. (Carlos Novaes - 1984) (10) a. Este inglêsi possui uma fortuna de mais de quinhentos contos, [IP [ø]i parece [InfP ti gostar de Beatriz]]. (França Júnior - 1883) b. O acaso atirou-me aos braços dessa raparigai. A princípio [IP [ø]i parecia [InfP ti gostar de mim]] e mostrava-se carinhosa. (Gastão Tojeiro - 1918) Do total de 16 ocorrências de alçamento padrão encontradas na amostra, 13 exibem o sujeito alçado expresso. O gráfico 3.4, a seguir, apresenta sua distribuição segundo a representação: 59 100% DP lexical pleno 90% 80% Pronome pleno 70% Pronome nulo 60% 50% 40% 30% 20% 10% 0% Período I II III IV V VI VII Gráfico 3.4: A representação do sujeito alçado para a posição de sujeito de parecer (DPs lexicais, pronomes plenos, pronomes nulos) Verifica-se que o sujeito da encaixada alçado aparece preferencialmente expresso em todos os períodos em que houve ocorrência da construção de alçamento padrão. Essa preferência pelo sujeito pleno chega a ser categórica no Período VI com 100% (33% para DP lexical pleno e 67% para o sujeito pronominal pleno). O maior índice encontrado para o sujeito pronominal nulo foi no Período IV, com 40%. Em relação ao preenchimento à esquerda do verbo parecer na estrutura de alçamento padrão, o gráfico 3.4 mostra que, nos Períodos II e VI, o sujeito pronominal pleno era a representação do sujeito mais utilizada, enquanto nos demais períodos o DP lexical pleno aparece como a estratégia de preenchimento mais freqüente. A tabela 3.5, abaixo, expõe, mais detalhadamente, a relação sujeito pleno vs sujeito nulo, segundo a pessoa gramatical: Período I 0/0 (0%) 0/0 (0%) Período II 3/4 (75%) 0/0 (0%) Período III 1/2 (50%) 0/0 (0%) Período IV 0/1 (0%) 0/0 (0%) Período V 0/0 (0%) 0/0 (0%) Período VI 1/1 (100%) 1/1 (100%) Período VII 0/0 (0%) 0/0 (0%) Pronomes 3ª pessoa Pronomes 1ª e 2ª pessoas DPs 2/2 2/2 2/2 1/1 0/0 0/0 0/0 lexicais (100%) (100%) (100%) (100%) (0%) (0%) (0%) novos Tabela 3.5: Distribuição dos sujeitos pronominais das encaixadas com parecer em construções de alçamento padrão, segundo a forma de expressão: pleno vs nulo 60 Os resultados apresentados na tabela acima mostram que os pronomes de 3ª pessoa aparecem preferencialmente preenchidos na estrutura de alçamento padrão. Dos 8 dados encontrados, 5 são expressos. Por outro lado, foi encontrada apenas 1 ocorrência de alçamento padrão, com o pronome de 2ª pessoa ‘você’. Não houve ocorrência de primeira pessoa. 3.1.2.2 Fatores estruturais relevantes A observação atenta dos dados mostrou que alguns fatores contribuem para a ocorrência do alçamento padrão, entre eles o traço semântico, o traço de referência, a estrutura do DP sujeito alçado e o tipo de oração em que parecer se encontra. As tabelas relativas ao traço semântico e de referência se encontram no Anexo 1. A análise do traço semântico levou em conta somente os DPs lexicais e os pronomes de 3ª pessoa, excluindo o dado encontrado no Período VI com o pronome ‘você’, que, inerentemente, apresenta o traço [+hum, +anim]. Em linhas gerais, o traço [+hum, +anim] aparece como o mais favorável ao alçamento padrão. O seu menor índice é 50% nos Períodos II e VI. O traço [-anim] só apresenta índice expressivo no Período II (50%). Houve apenas uma ocorrência de alçamento padrão com sujeito [-hum, +anim], no Período VI, na peça de 1984 de Carlos Novaes (cf. tabela I no Anexo 1). Em (11), (12) e (13), são ilustrados, respectivamente, dados com os traços [+hum, +anim], [-anim] e o único exemplo com o traço [-hum, +anim]: (11) a. O pior é que [IP o rapazi parece [InfP não ti ter jeito para arranjar noiva]]. (Humberto Cunha - 1938) b. [IP O velhoi parecia [InfP ti ler alguma coisa, à espera do sono]]. (Carlos Novaes - 1984) (12) a. [IP Os seus olhos tristesi pareciam [InfP ti querer dizer-me qualquer coisa]]. (Humberto Cunha - 1938) b. Acabe com essa tarefai, [CP quei [IP [tvbl]i não parece [InfP ti ser das mais espinhosas]]]. (Gastão Tojeiro - 1918) (13) Mas, de repente, todos sentimos [CP que [IP elei parecia [InfP ti penetrar em alguma zona de turbulência]]]. (Carlos Novaes - 1984) 61 O pronome ‘ele’, em (13), retoma o sintagma ‘o espermatozóide’, por isso esse constituinte é classificado com [-hum, + anim]. Os resultados relativos aos traços [+específico] e [+genérico] apontam, quase categoricamente, que o traço [+específico] favorece o alçamento padrão. O índice chega a 100% nos Períodos III, IV e VI. Somente no Período II o traço [+genérico] apresenta uma ocorrência, representando 17%. Obviamente, o número reduzido de dados não permite conclusões mais precisas, mas é possível, ao menos, constatar tendências de uso. (cf. tabela II no Anexo 1). São apresentados, em (14), dados com o traço [+específico] e, em (15), o único dado com o traço [+genérico]: (14) a. Longe dos exemplos de sua mãe, sua alma ia se amoldando à minha e [IP o futuroi parecia [InfP ti sorrir-nos nesses dias felizes que passávamos um ao lado do outro, conchegados no regaço do mais puro amor]]. (França Júnior 1870) b. [IP O sistemai parece [InfP ti ser facílimo]]. (França Júnior - 1883) (15) Meus senhores, apresento-lhes Mr. James, que requer um privilégioi [CP quei [IP [øexpl] parece [InfP ti ser de grande utilidade]]. (França Júnior - 1883) Até o momento, vimos que o DP sujeito da oração subordinada que apresenta os traços [+hum, + anim] e [+específico] parece ser um contexto favorável à ocorrência do alçamento padrão. Mas qual tipo de oração favorece a ocorrência dessa estrutura? Vejamos a tabela 3.6: Período Período Período Período Período Período Período I II III IV V VI VII Matriz 3/6 3/4 3/3 2/3 0/0 0/0 0/0 (50%) (75%) (100%) (67%) (0%) (0%) (0%) Completiva 1/3 0/0 0/6 0/4 0/0 0/0 0/0 (33%) (0%) (0%) (0%) (0%) (0%) (0%) 3/6 1/4 Relativa 0/0 0/0 0/3 0/0 0/0 (50%) (25%) (0%) (0%) (0%) (0%) (0%) Adverbial 0/0 0/6 0/4 0/0 0/0 0/3 0/0 (0%) (0%) (0%) (0%) (0%) (0%) (0%) Total 0 6 4 3 0 3 0 (100%) (100%) (100%) (100%) (100%) (100%) (100%) Tabela 3.6: Tipo de oração vs alçamento padrão com parecer 62 Como pode ser visto, o alçamento padrão ocorre, preferencialmente, quando parecer está localizado em uma oração matriz. O menor índice encontrado para esse tipo de oração é 50%, no Período II. Não houve nenhuma ocorrência com oração adverbial e apenas 1 dado com oração completiva no Período VI, representando 33%. Por outro lado, a oração relativa apresenta 50% de ocorrência no Período II e 25% no período seguinte. Abaixo, em (16), (17) e (18), são apresentados exemplos com alçamento padrão em que parecer está, respectivamente, em uma oração matriz, relativa e completiva: (16) a. Se você oi escutasse falar, se visse o calor que [ø]i empregava nas suas palavras, e como a apertava contra o peito… [IP [ø]i Parecia [InfP ti temer que a roubassem!]] (Humberto Cunha - 1938) b. Este inglêsi possui uma fortuna de mais de quinhentos contos, [IP [ø]i parece [InfP ti gostar de Beatriz]]. (França Júnior - 1883) (17) a. Acabe com essa tarefai, [CP quei [IP [tvbl] não parece [InfP ti ser das mais espinhosas]]]. (Gastão Tojeiro - 1918) b. Ora, o Senhor Doutor Carlos de Britoi, [CP quei [IP [tvbl] parecia [InfP ti ser um mau moço]]], mas que hoje vejo que é um moço de excelentes qualidades, possui com a morte de um tio uma fortuna de mil contos; (...). (França Júnior 1862) (18) a. Mas, de repente, todos sentimos [CP que [IP elei parecia [InfP ti penetrar em alguma zona de turbulência]]]. (Carlos Novaes - 1984) Uma observação atenta dos dados permite constatar que a presença do verbo ser na oração encaixada, principalmente em uma oração relativa, favorece a ocorrência do alçamento padrão, confirmando as nossas hipóteses. São apresentados, em (19), alguns dados com o verbo ser em diferentes tipos de orações: 63 (19) a. Já não freqüentas a nossa casa como antes, e hoje tenho notado que não procuras aquelai [CP que [IP [øexpl] parecia [InfP ti ser o único objeto de teus pensamentos!]]] (França Júnior - 1862) b. [IP O sistemai parece [InfP ti ser facílimo]]. (França Júnior - 1883) c. Tem gente que luta com a vida. [IP Vocêi realmente parece [InfP ti ser um que luta pela vida]]. (Carlos Novaes - 1975) Dos 5 dados com esse verbo, em 3 ele se encontra em uma oração relativa, totalizando 67% das ocorrências no Período II e 33% no Período VI (cf. Tabela III no Anexo 1). Portanto, a análise de diversos fatores revelou que os DPs lexicais novos e os sujeitos pronominais plenos, os traços [+hum, +anim] e [+específico], a presença do verbo ser na oração encaixada e do verbo parecer na oração matriz parecem ser contextos favoráveis à ocorrência da construção de alçamento padrão. 3.1.3 A construção com deslocamento O deslocamento, como apontam diversos estudos empíricos (entre eles Duarte 2004, 2007; Henriques 2005, 2006b), não é uma estrutura recorrente nem na fala nem na escrita do PB. A análise das peças teatrais vai ao encontro desses resultados, pois foi encontrado apenas 1 único dado com essa construção na peça de Armando Gonzaga, do Período IV, que é apresentada em (20), abaixo: (20) [TopP Eui [IP [øexpl] parece [CP que [ø]i estou enganado]]]. (Armando Gonzaga 1937) Como não é possível fazer para o deslocamento a mesma análise empreendida para a construção sem alçamento e o alçamento padrão, segue-se para a leitura dos dados relativos ao hiperalçamento, uma construção aparentemente inovadora no sistema. Fica, porém, uma observação: o aparecimento do deslocamento em nossas descrições tradicionais, especialmente entre as figuras de sintaxe, deve ser atribuído ao seu uso no português europeu (cf. exemplos (13) da fala contemporânea portuguesa em Duarte 2007:40). 3.1.4 O hiperalçamento 64 A flexão de ambos os verbos, o da oração matriz e o da encaixada, é característica que diferencia o hiperalçamento das demais construções aqui focalizadas. Tal construção viola a Teoria do Caso: um DP selecionado por um predicado não pode receber Caso duas vezes. Como tal estrutura não é contemplada nas descrições, parece que estamos diante de uma construção “aparentemente inovadora”21. A expressão “aparentemente inovadora” utilizada no parágrafo anterior não foi escolhida ao acaso. Embora a tradição gramatical não contemple o hiperalçamento em sua descrição, como já foi mostrado no capítulo 1, e os estudos sincrônicos sobre o sujeito do PB indiquem que se trata de uma construção que surgiu há menos tempo no sistema (cf. Duarte 2004, 2007, entre outros), o gráfico 3.1, apresentado no início deste capítulo, mostra que o hiperalçamento já aparecia, ainda que timidamente (apenas 2 dados), na peça de Gastão Tojeiro, de 1918. Neste período, ainda predominava o paradigma flexional 1 e PB ainda preferia o sujeito nulo (cf. Duarte 1993). Mas o hiperalçamento não teria surgido como uma conseqüência da mudança na marcação do Parâmetro do Sujeito Nulo (Chomsky 1981)? Como explicar a sua ocorrência no Período III? Se observarmos atentamente os resultados apresentados no estudo diacrônico de Duarte (1993), ilustrados, novamente, no gráfico 3.5, abaixo, perceberemos que a partir da peça de 1937, o PB apresenta índices de sujeitos nulos na faixa dos 50%. Esses índices, ao longo do tempo, vão diminuindo gradativamente em direção ao preenchimento da posição do sujeito pronominal. Em outras palavras, de alguma maneira, na peça de 1918, o sistema de certa forma já reagia a uma mudança profunda que estava começando a ocorrer: o PB estava se tornando uma língua [-prodrop]. Obviamente, não se pode afirmar que o hiperalçamento já fosse uma estrutura recorrente na primeira metade do século XIX, entretanto, suas ocorrências nos Períodos IV, V, VI e VII, principalmente no último período investigado, mostram a sua considerável ocorrência. Um outro aspecto importante é que o sistema já “permitia” a estrutura, mas as “condições” para sua implementação ainda não tinham aparecido22. Sujeitos nulos em peças teatrais (Duarte 1993) 21 Como dissemos no capítulo 1, Bechara (1985) considera o hiperalçamento encontrado no texto do Marquês de Maricá uma90% estrutura marginal e que se caracteriza pela pessoalização do verbo parecer. 80% 22 O português europeu contemporâneo “permite” essa estrutura, que causa estranhamento aos falantes, mas que 70% foi atestada60% uma única vez por Duarte (comunicação pessoal) em dados de fins dos anos 90, que aparecem no CD coordenado por Nascimento (2001): 50% 40% 30% 20% 10% 0% 65 Gráfico 3.5: Sujeitos nulos em peças teatrais (Duarte 1993) Os estudos de Duarte (1993, 2007) mostram que há diferenças qualitativas entre o texto escrito pelos autores e a fala dos atores. A sentença em (21b) foi extraída da peça de Miguel Falabella. Note-se que no texto escrito, em (21a), o pronome da oração encaixada aparece nulo, enquanto na representação do palco o pronome foi pronunciado: (21) a. [IP Vocêsi parecem [CP que [ø]i não pensam na vida]]. b. [IP Vocêsi parecem [CP que [TopP ti [TP vocêsi não pensam na vida]]]]. 3.1.4.1 A representação do sujeito alçado Em (22 a,b,c), abaixo, são apresentados exemplos de hiperalçamento com as diferentes formas de representação do sujeito alçado - DPs lexicais plenos, pronomes plenos e pronomes nulos : (22) a. [IP Margarethi parece [CP que ti tem bicho carpinteiro!]] (Miguel Falabella 1992) b. [IP Vocêsi parecem [CP que ti não pensam ma vida]]. (Miguel Falabella 1992) c. Pelo jeito, [IP [øarb]i parecem [CP que ti já levam a sua conta]]. (Gastão Tojeiro - 1918) Nos dois primeiros períodos em que foi observada a ocorrência de hiperalçamento houve um equilíbrio entre preenchimento e não preenchimento do (i) e depois vinha a neve, nósi a andar parecíamos que [ø]i estávamos a andar em cima de cascalho. Ficava vidrado. Custava muito, mas tínhamos amor à camisola. (falante de 68 anos) 66 sujeito alçado para a posição de sujeito de parecer. No entanto, no Período III, a concorrência acontece entre os DPs lexicais plenos e os pronomes nulos, enquanto no Período IV os pronomes plenos e os pronomes nulos disputam a preferência. A partir do Período V, verifica-se que o pronome pleno surge como a representação do sujeito favorita nas construções de hiperalçamento encontradas na amostra (cf. Gráfico I no Anexo 2). A tabela 3.7, abaixo, expõe, com mais detalhes, a relação sujeito pleno vs sujeito nulo na estrutura de hiperalçamento com parecer: Período I 0/0 (0%) 0/0 (0%) Período II 0/0 (0%) 0/0 (14%) Período III 0/0 (0%) 0/0 (0%) Período IV 1/1 (100%) 0/1 (0%) Período V 0/0 (0%) 2/2 (100%) Período VI 0/0 (0%) 1/1 (100%) Período VII 1/3 (33%) 2/2 (100%) Pronomes 3ª pessoa Pronomes 1ª e 2ª pessoas Sujeito de 0/0 0/0 0/1 0/0 0/0 0/0 0/0 ref. (0%) (0%) (0%) (0%) (0%) (0%) (0%) arbitrária DPs 1/1 2/2 0/0 0/0 0/0 0/0 0/0 lexicais (100%) (100%) (0%) (0%) (0%) (0%) (0%) novos Tabela 3.7: Distribuição dos sujeitos pronominais em construções de hiperalçamento, segundo a forma de expressão: pleno vs nulo Verifica-se nos resultados acima que dos 14 dados com hiperalçamento, 6 apresentavam sujeitos alçados de 2ª pessoa (singular e plural). Percebe-se que nos Períodos V, VI e VII esses pronomes aparecem preferencialmente expressos, enquanto no Período IV o único dado com essa pessoa do discurso aparece nulo à esquerda de parecer. Os pronomes de 3ª pessoa, por outro lado, não apresentam, no Período VII, um índice de preenchimento considerável - apenas 33% dos dados. Observa-se, ainda, que foram encontrados somente 3 exemplos com DPs lexicais e 1 único dado com sujeito de referência arbitrária. Quanto à representação do sujeito da encaixada, não foram encontradas na amostra construções como a ilustrada em (21b). Como já foi mencionado, Martins e Nunes (2007) fazem uma distinção entre essa sentença e construção em (21a). Para os autores, a sentença em (21a) seria um hiperalçamento, em que, como dissemos 67 no capítulo 1, seção 1.2, o T(empo) da encaixada é defectivo para atribuir Caso, o que leva o DP a ser alçado para uma posição em que Caso esteja disponível. Em (21b), O DP à esquerda de parecer tem outra derivação, a partir de uma posição de tópico, havendo, pois, alçamento “aparente”. (cf. capítulo 1, seção 1.2). Remetemos o leitor a Martins e Nunes (2005, 2007) para discussão teórica relativa às suas propostas. Mas, a julgar pela representação do sujeito na modalidade escrita e na modalidade oral, a diferença parece mais relacionada à razoável conservação do sujeito nulo na escrita e não a uma possível derivação diferente, como propõem Martins e Nunes. 3.1.4.2 Outros fatores relevantes À semelhança do que foi encontrado para a construção de alçamento padrão, a análise mostrou que o traço semântico, o traço de referência, a estrutura do DP sujeito alçado e o tipo de oração em que parecer se encontra são fatores que contribuem para a ocorrência do hiperalçamento. As tabelas relativas ao traço semântico e ao de referência se encontram no Anexo 2. Em (23) e (24), ilustram-se, respectivamente, dados com o sujeito alçado [+hum, +anim] e [-anim], encontrados na amostra: (23) a. Pelos modos, [IP o senhori parece [CP que ti anda com más intenções acerca dela]]. (Gastão Tojeiro - 1918) b. [IP Margarethi parece [CP que ti tem bicho carpinteiro!]] (Miguel Falabella 1992) (24) Tem que aprender a mexer com aqueles ferrinhos, [IP mas o salárioi parece [CP que ti compensa]]. (Miguel Falabella - 1992) O traço [+hum, +anim] surge como um fator que favorece a ocorrência da estrutura de hiperalçamento. A análise atenta dos dados aponta a categórica preferência por esse traço semântico nos Períodos III e IV. O traço [+hum, +anim] apresenta índice de 60% no último período de tempo analisado - e justamente neste período foram encontrados os 2 únicos dados em que o DP sujeito alçado apresenta o traço [-anim], representando 40% das ocorrências (Tabela IV no Anexo 2). 68 Alguns exemplos da amostra que ilustram o sujeito alçado com o traço [+específico] são apresentados em (25). Em (26), é apresentado o único exemplo com o traço [+genérico]: (25) a. Uma hora dessas era pra ela já estar aqui. Aquelai é outra [CP quei [IP [tvbl]i parece [CP que ti não tem o que fazer]]]. (Miguel Falabella - 1992) b. [IP Elei parece [CP que ti gosta muito da sua filha]]. Dará um bom marido… e um bom genro… (Armando Gonzaga - 1937) (26) Pelo jeito, [IP [øarb]i parecem [CP que ti já levam a sua conta]]. (Gastão Tojeiro 1918) Os resultados apontam que no Período III os traços [+específico] e [+genérico] coexistem em equilíbrio e que nos períodos IV e VII há uma supremacia absoluta do traço [+específico] (cf. Tabela V no Anexo 2). Examinemos a tabela 3.8, abaixo, com os índices relativos ao tipo de oração em que se encontra o verbo parecer no hiperalçamento: Período Período Período Período Período Período Período I II III IV V VI VII Matriz 0/0 0/0 6/7 2/2 2/2 2/2 1/1 (0%) (0%) (86%) (100%) (100%) (100%) (100%) Completiva 0/0 0/0 0/2 0/2 0/2 0/1 0/7 (0%) (0%) (0%) (0%) (0%) (0%) (0%) Relativa 0/0 0/0 0/2 0/2 0/2 0/1 1/7 (0%) (0%) (0%) (0%) (0%) (0%) (14%) Adverbial 0/0 0/0 0/2 0/2 0/2 0/1 0/7 (0%) (0%) (0%) (0%) (0%) (0%) (0%) Total 0 0 2 2 2 1 7 (100%) (100%) (100%) (100%) (100%) (100%) (100%) Tabela 3.8: O tipo de oração vs hiperalçamento com parecer O hiperalçamento ocorre, categoricamente, do Período III ao VI, em sentenças em que parecer está localizado em uma oração matriz, diferenciando-se, portanto, do alçamento padrão. No último período, verifica-se ainda a supremacia desse tipo de oração (86%), mas também a ocorrência de hiperalçamento em uma oração relativa. Embora o pronome relativo não “pouse” na posição de sujeito de parecer, como pode ser visto em (27d), ele é resultado de movimento do DP nulo em Spec de IP, aqui representado por uma variável: 69 (27) a. [IP Elei parece [CP que ti gosta muito da sua filha]]. Dará um bom marido… e um bom genro… (Armando Gonzaga - 1937) b. [IP Margarethi parece [CP que ti tem bicho carpinteiro!]] (Miguel Falabella 1992) c. Puro, integral, vitaminado… [IP Vocêi parece [CP que ti está fazendo anúncio de leite em pó]]. (Carlos Novaes - 1975) d. Uma hora dessas era pra ela já estar aqui. Aquela é outra [CP quei [IP [tvbl]i parece [CP que ti não tem o que fazer]]]. (Miguel Falabella - 1992) Os resultados apresentados apontam que não há muitas diferenças significativas para a ocorrência das estruturas de alçamento com o verbo parecer. Em linhas gerais, em relação a tal verbo, é possível concluir que: a) houve um progressivo aumento nas ocorrências de estruturas que permitem o alçamento do DP sujeito da oração encaixada para a posição não temática à esquerda de parecer, localizado na oração matriz. O surgimento de uma estrutura como o hiperalçamento, a partir da peça de 1918, último período em que ainda predominava o paradigma flexional 1 (Duarte 1993), pode ser considerado um marco, a partir do qual o sistema começa a sofrer alterações devido à simplificação do paradigma verbal, o que leva a uma mudança sintática em direção ao preenchimento da posição do sujeito pronominal no PB; sem dúvida, apesar de a fala espontânea hoje alternar construções sem alçamento com construções com alçamento, como foi mostrado no Capítulo 1 (seção 1.3), o predomínio absoluto do hiperalçamento no Período VII (cf. gráfico 3.1) confirma as nossas hipóteses; b) o alçamento padrão, raríssimo tanto na fala culta quanto na fala popular (cf. Duarte 2004, Henriques 2006b), apresenta índices oscilantes, chegando a 0% de ocorrência na peça de 1992, no Período VII, o que também confirma as nossas hipóteses. O verbo ser na encaixada favorece o alçamento do alçamento padrão, e, embora não ocorra nenhum dado no período VII, é o contexto em que a fala ainda apresenta tal construção, em índices baixíssimos (cf. Duarte 2007, entre outros trabalhos aqui mencionados); 70 c) a presença do clítico dativo junto ao verbo parecer, principalmente nos Períodos I, II e III, aparece como um obstáculo ao alçamento do sujeito da encaixada. A partir do Período V, apesar do seu crescente desuso, houve um aumento na ocorrência da estrutura sem alçamento, o que vai de encontro às expectativas iniciais. Partia-se da hipótese de que a construção sem alçamento apresentaria índices cada vez menores de ocorrência devido à ausência do clítico dativo; entretanto, os resultados para a fala espontânea apontam igualmente a concorrência entre o não alçamento e o hiperalçamento; d) o sujeito pronominal, na estrutura sem alçamento, aparece, em alguns momentos, preferencialmente nulo no século XX. Por outro lado, no alçamento padrão, há uma crescente preferência ao longo do tempo pelo sujeito preenchido sob a representação de DPs lexicais ou pronomes. É preciso analisar as construções de alçamento com os demais verbos, para verificar se o sujeito pronominal aparece preferencialmente nulo ou pleno no século XX, quando PB já apresenta claros indícios de que está se tornando uma língua [-prodrop]. Após verificar a distribuição das construções com parecer e apontar alguns fatores estruturais que caracterizam tais estruturas, empreende-se, na subseção seguinte, a análise com os demais verbos de alçamento. 3.2 Os demais verbos de alçamento Como já foi mostrado no capítulo 1, na seção 1.2, os verbos de alçamento acabar, bastar, convir, custar, demorar, faltar e levar apresentam um comportamento diferente do verbo parecer, pois só duas estruturas são possíveis: a construção sem alçamento e o alçamento. Embora Duarte (2007) já tenha encontrado duas ocorrências de hiperalçamento com acabar na amostra da fala popular (cf. capítulo 1, seção 1.4.2), não foram observadas ocorrências com tal estrutura nas peças investigadas. Abaixo, na figura 3.2, apresenta-se a quantidade de dados distribuída por verbo: 71 Distribuição dos dados por verbo 31 11 7 Acabar 4 4 Bastar Convir 8 Custar Demorar 2 Faltar Levar Figura 3.2: Distribuição geral dos dados por verbo Há uma discrepância quantitativa entre acabar e os demais verbos de alçamento. Embora tal verbo só apareça na amostra a partir da peça de Gastão Tojeiro, em 1918, ele é o mais freqüente. O reduzido número de ocorrências com os verbos demorar e levar se deve ao fato de só aparecerem em alguns dos períodos de tempo analisados. Os exemplos em (28a) e (28b) ilustram as construções sem e com alçamento, respectivamente: (28) a. Acho [CP que [IP [øexpl] demorou mais de mês [PP pra pobre da Helene conseguir botar o moleque no mundo]]]. (Miguel Falabella - 1992) b. Por favor, senhora, [IP quanto tempo a gentei demora [PP pra ti encher a mulher?]] (Carlos Novaes - 1984) Das 67 ocorrências com os “outros verbos” de alçamento aqui analisados, 21 foram de construções sem alçamento (31% dos dados) e 46 de alçamento padrão (69% dos dados). A distribuição por período de tempo está representada na tabela 3.9 e no gráfico 3.6 a seguir: Período Período Período Período Período Período Período Total I II III IV V VI VII Sem 3 6 0 4 6 0 2 21 alçamento (43%) (55%) (0%) (40%) (60%) (0%) (14%) (31%) Alçamento 4 5 4 6 4 11 12 46 (57%) (45%) (100%) (60%) (40%) (100%) (86%) (69%) Total 7 11 4 10 10 11 14 67 (100%) (100%) (100%) (100%) (100%) (100%) (100%) (100%) Tabela 3.9: Ocorrências das estruturas de alçamento com os “outros” verbos de alçamento 72 100% Sem alçamento 90% 80% Alçamento 70% 60% 50% 40% 30% 20% 10% 0% Período I II III IV V VI VII Gráfico 3.6: Ocorrências das estruturas de alçamento com os “demais” verbos na linha do tempo Como se pode observar, o não alçamento é a estrutura preferida em dois momentos: os Períodos II e V. Nos demais períodos de tempo, a situação se inverte, com um significativo índice de ocorrência da construção com alçamento. A preferência chega a ser categórica nos Períodos III e VI. De um modo geral, nos dois últimos períodos, o alçamento é, sem dúvida, a variante vitoriosa, o que confirma as nossas hipóteses. A distribuição dos dados na linha do tempo mostra que o alçamento com esses verbos não é uma estrutura nova no sistema, tendo sido sempre uma opção, certamente motivada por razões de ordem discursiva. É o que mostram os percentuais de ocorrência em todos os períodos, especialmente freqüente já nas peças de Martins Pena, no Período I. Mas não há dúvida de que a mudança na marcação do PSN, que leva à presença de um elemento à esquerda do verbo, deve ser responsável pelo crescimento e pela consolidação dessa estratégia no último quartel do século XX. Esses resultados vão ao encontro dos resultados apresentados em diversos estudos, entre eles Henriques (2005, 2006b) e Duarte (2007), que mostram que o alçamento padrão com tais verbos é a estrutura preferida em ambas as modalidades, a fala e a escrita. Após uma breve leitura dos resultados gerais, apresentam-se os fatores lingüísticos que podem estar relacionados à ocorrência da construção sem alçamento e do alçamento padrão com os sete verbos de alçamento aqui investigados, particularmente nos períodos em que a escolha entre uma e outra estratégia não era impulsionada por uma mudança interna ao sistema, que é a nossa crença em relação aos últimos períodos. 73 3.2.1 A construção sem alçamento 3.2.1.1 A representação do sujeito da encaixada Como foi feito na seção precedente, começaremos pelo exame da estrutura do DP sujeito da encaixada, que pode aparecer sob a forma de (a) um DP lexical, como em (29): (29) a. Acho [CP que [IP [øexpl] demorou mais mais de mês [PP pra pobre da Helene conseguir botar o moleque no mundo]]]. (Miguel Falabella - 1992) b. Muito bem, Mr. James. [IP [øexpl] Falta agora [CP que o senhor23 confirme o que acaba de dizer casando-se com uma brasileira]]. (França Júnior - 1883) (b) um pronome pleno, como em (30): (30) a. Agora, [IP [øexpl] basta [InfP você esquecer de bajular a máfia de Gutemberg]]. (Millôr Fernandes - 1979) b. [IP [øexpl] Não bastava [InfP aturar eu o desavergonhado do irmão]]. (Martins Pena - 1847) c. Vossa Excelência pode usar de outros termos: [IP [øexpl] basta [CP que eles exprimam o que o seu coração sente]]. (França Júnior - 1862) (c) ou um pronome nulo de referência definida ou arbitrária, como em (31): (31) a. Vocêi só fala em emprego de malandro. É agência de automóveis, é corretagem de imóveis… [IP [øexpl] Só falta [InfP [ø]i querer ser jogador de futebol]]. (Millôr Fernandes - 1955) b. [IP Não [øexpl] convém mais [InfP [ø] mexer nessa história. Já está tudo explicado. (Armando Gonzaga - 1937) c. [IP [øexpl] Bastou [CP que [øarb] lhe acenassem com a possibilidade de freqüentar este apartamento]] para que você mudasse completamente… (Silveira Sampaio - 1949) 23 Consideramos as formas de tratamento como DPs plenos. 74 O gráfico 3.7, abaixo, apresenta os índices referentes à forma de representação do sujeito da subordinada - DP lexical pleno, pronome pleno, pronome nulo - nas construções sem alçamento: 100% DP lexical pleno 90% 80% Pronome pleno 70% Pronome nulo 60% 50% 40% 30% 20% 10% 0% Período I II III IV V VI VII Gráfico 3.7: Expressão do sujeito da encaixada nas construções sem alçamento com os “demais” verbos de alçamento (DP lexical, pronome pleno, pronome nulo) O gráfico mostra que a incidência de sujeitos nulos na oração encaixada se mantém com elevados índices em 4 dos 5 períodos de tempo em que foram encontrados dados com a estrutura sem alçamento. O menor percentual é encontrado no Período I (33%), quando as três estratégias de representação do sujeito da encaixada apresentam o mesmo índice. Apesar da simplificação dos paradigmas verbais, a partir do Período IV, o sujeito pleno da oração encaixada é preterido pela forma não preenchida. Nos Períodos IV e VII, verifica-se que o DP lexical aparece como a única forma de preenchimento do sujeito da encaixada, com 25% e 50%, respectivamente. Por outro lado, no Período V, o pronome surge como a única de estratégia de preenchimento, com 33%. Observemos a tabela 3.10, que apresenta a distribuição dos sujeitos das encaixadas, incluindo os DPs lexicais, os sujeitos pronominais de terceira pessoa, os sujeitos de primeira e segunda pessoas e os sujeitos de referência arbitrária (todos nulos na amostra): Pronomes Período I 0/0 Período II 1/3 Período III 0/0 Período IV 0/0 Período V 1/1 Período VI 0/0 Período VII 0/1 75 3ª pessoa (33%) (100%) (0%) (0%) (0%) (0%) (0%) Pronomes 1/2 1/3 0/2 0/0 0/3 0/1 0/0 1ª e 2ª (50%) (33%) (0%) (0%) (0%) (0%) (0%) pessoas Sujeito de 0/0 0/0 0/0 0/0 0/1 0/0 0/0 referência (0%) (0%) (0%) (0%) (0%) (0%) (0%) Arbitrária 1/1 1/1 DPs 1/1 1/1 0/0 0/0 0/0 (100%) (100%) lexicais (100%) (100%) (100%) (0%) (0%) novos Tabela 3.10: Distribuição dos sujeitos pronominais das encaixadas com os “demais” verbos em construções sem alçamento, segundo a forma de expressão: pleno vs nulo Os resultados apresentados acima mostram que a preferência pelo sujeito nulo é notória para todas as formas de expressão do sujeito, excetuando-se, por razões óbvias, os DPs lexicais novos. O maior índice de preenchimento com pronomes de 1ª e 2ª pessoas é de 50% no Período I, entretanto, deve-se atentar para o reduzido número de dados. Por outro lado, os pronomes de 3ª pessoa aparecem preenchidos na oração encaixada nos Períodos II e V, com 33% e 100%, respectivamente. A representação do sujeito da encaixada preferencialmente vazia nas construções sem alçamento com os demais verbos de alçamento, pelo menos na amostra utilizada, pode estar associada à estrutura da oração encaixada e à presença ou não de um clítico dativo junto ao verbo de alçamento na oração matriz. Abaixo, na tabela 3.11, temos os índices referentes à estrutura da oração encaixada segundo o verbo de alçamento: Acabar Bastar Convir Custar Demorar Faltar Levar 3/4 5/11 0/0 0/0 0/0 0/0 0/0 (75%) (45%) (0%) (0%) (0%) (0%) (0%) InfP 6/11 1/1 1/3 1/4 0/0 0/0 0/0 (55%) (100%) (33%) (25%) (0%) (0%) (0%) 2/3 2/2 PP 0/0 0/0 0/0 0/0 0/0 (66%) (100%) (0%) (0%) (0%) (0%) (0%) Tabela 3.11: Estrutura da encaixada segundo o tipo de verbo nas construções sem alçamento com os “demais” verbos CP A observação atenta dos dados encontrados na amostra revela que: (i) todas as construções com os verbos acabar e levar apresentam o alçamento do DP sujeito da encaixada para a oração matriz; (ii) os verbos bastar e faltar só apresentam dados sem alçamento; (iii) os verbos convir, custar e demorar são os únicos verbos 76 investigados que apresentaram estruturas com e sem o alçamento do sujeito da encaixada. A tabela acima revela que, em relação ao verbo bastar, a construção sem alçamento pode ocorrer tanto em orações desenvolvidas (45%) quanto em orações infinitivas (55%), como pode ser observado em (30). O verbo custar, na construção sem alçamento, também pode ocorrer em dois tipos de estruturas, a oração infinitiva, com 33%, e a oração infinitiva introduzida por preposição, com 67%. Por outro lado, em relação aos demais verbos, o não alçamento tende ocorrer, preferencialmente, em um tipo de estrutura. O verbo convir, com apenas 1 dado, apresenta índice de 100% para a ocorrência da estrutura sem alçamento em oração infinitiva, como é ilustrado em (31b). Enquanto os índices referentes ao verbo faltar indicam que a construção sem alçamento parece ocorrer, preferencialmente, em orações desenvolvidas, como pode ser observado em (29b), o verbo demorar, como já era esperado, prefere o não alçamento em orações infinitivas introduzidas por preposição, ilustrado em (29a). Ao contrário do que ocorreu com o verbo parecer (cf. exemplo 7, seção 3.1.1.) a ocorrência de um clítico dativo junto aos verbos aqui tratados envolve obrigatoriamente a estrutura de alçamento do sujeito da encaixada e sua correferência com o clítico, como será mostrado na seção seguinte. 3.2.2 O alçamento padrão Diversos estudos empíricos mostram que o alçamento padrão (com os verbos focalizados nesta seção) é uma estrutura extremamente recorrente na fala e na escrita do PB, diferentemente dos resultados encontrados para o verbo de alçamento mais prototípico, parecer (cf. Henriques 2005, 2006b; Henriques e Duarte 2006, Duarte 2007). Repetimos, aqui, a tabela 3.9, apresentada no início desta parte, com a distribuição das duas estruturas, para facilitar a leitura. Mesmo levando em conta o número reduzido de ocorrências, pode-se dizer que, já partir do Período I, o alçamento é preferido ao não alçamento, exceto por uma inversão nos períodos II e V. Sem alçamento Período Período Período Período Período Período Período I II III IV V VI VII 3 6 0 4 6 0 2 (43%) (55%) (0%) (40%) (60%) (0%) (14%) Total 21 (31%) 77 Alçamento 46 4 5 4 6 4 11 12 (69%) (57%) (45%) (100%) (60%) (40%) (100%) (86%) Total 7 11 4 10 10 11 14 67 (100%) (100%) (100%) (100%) (100%) (100%) (100%) (100%) Tabela 3.9: Ocorrências das estruturas de alçamento com os outros verbos de alçamento É interessante notar que essa preferência, embora indo ao encontro da nossa expectativa de encontrar o crescimento da presença de um elemento à esquerda do verbo da matriz, vai de encontro aos baixíssimos índices de alçamento padrão com parecer na fala, sendo preferido o hiperalçamento, como vimos na seção 3.1.4. Passemos ao exame da expressão do sujeito da encaixada nas construções de alçamento com os “outros” verbos. 3.2.2.1 A expressão do sujeito alçado Do total de 46 dados, 5 exibem o clítico dativo numa clara construção de alçamento, em que o elemento alçado, ao contrário das demais ocorrências, não ocupa a posição de sujeito do verbo de alçamento, mas se cliticiza a esse verbo, mantendo-se um expletivo nulo em Spec de IP. A distribuição das 5 ocorrências é interessante: 4 aparecem com verbo custar+clítico me e estão concentradas no século XIX: duas no Período I e duas no Período II. A única ocorrência com estrutura semelhante aparece no Período III, início do século XX, que exibe o verbo convir e o clítico te. Observem-se os exemplos em (32): (32) a. Em boa hora o digas. Arre! [IP [øexpl] Custou-mei [InfP ti achar um guarda]]. (Martins Pena - 1838) b. [IP [øexpl] Custa-mei tanto [InfP ti subir esta escada]]. (França Júnior - 1889) c. A tal fingida já lhe disse tudo. Não é tanto assim, Senhor Doutor Carlos: a sociedade não está tão corrompida como julga e [IP [øexpl] custa-mei [PP a ti crer que ainda tão jovem, já esteja tão descrente]]. (França Júnior - 1862) d. [IP [øexpl] Não tei convém [InfP ti ficar aqui]]. (Gastão Tojeiro - 1918) Esses resultados, embora numericamente modestos (como, aliás, são todos os números apresentados nesta pesquisa), são importantes na medida em que confirmam: (a) a preferência pela posição vazia à esquerda do verbo, mesmo com alçamento e (b) o progressivo desaparecimento do clítico dativo: a partir do Período IV, não houve outras ocorrências na amostra. O Português Europeu, que apresenta 78 um sistema produtivo de clíticos (cf. Freire 2000, 2005 entre outros), exibe a estrutura já ausente do PB em variação com DP nominativo24. Os exemplos em (33) ilustram as ocorrências de alçamento para a posição de Spec de IP (sujeito) do verbo de alçamento, seja por um DP lexical, um pronome pleno e um pronome nulo de referência definida ou arbitrária: (33) a. Não te emagreças por isto não. Daqui a pouco a peste está aí de volta. [IP E o irmão delai também não custa [PP a ti estourar por aí]]. (Antônio Callado 1954) b. No final das contas, [IP elei acaba [GerP ti me comendo na soleira da porta]]. (Miguel Falabella -1992) c. É porque eui pretendo resolver uns negócios e não sei [IP quantos dias [ø]i levarei [PP ti para receber o que tenho que receber]]. (Armando Gonzaga 1937) d. E, como sempre acontece no Brasil, [IP [øarb]i acabaram [GerP ti descobrindo que era homossexual]]. (Millôr Fernandes - 1955) A distribuição dessas ocorrências se encontra no gráfico abaixo. Lembremo- nos de que aqui só se encontram as construções com alçamento: 100% DP lexical pleno 90% 80% Pronome pleno 70% Pronome nulo 60% 50% 40% 30% 20% 10% 0% Período I II III IV V VI VII Gráfico 3.8: Expressão do sujeito alçado nas construções com alçamento com os “demais” verbos de alçamento (DP lexical, pronome pleno, pronome nulo) 24 Vejam-se os exemplos do PE, extraídos de Duarte (2007: 42): (i) E depois [IP [øexpl] custa-mei imenso [InfP ti andar a bater-lhe]]. (ii) eh, pá, [IP eui custo muito [PP a ti falar por causa de uma coisa]]. 79 Como vimos acima, 5 dos sujeitos alçados se encontram sob a forma de um clítico. O gráfico acima exclui esses dados. Os resultados apresentados são bastante significativos para este trabalho. Se nos Períodos I, II e III observamos que a posição à esquerda dos verbos de alçamento se encontra preferencialmente vazia, a partir do Período IV, há uma crescente preferência pelo sujeito pleno na oração matriz, chegando a 75% do total das ocorrências. Esses índices vão ao encontro das hipóteses levantadas e confirmam os resultados encontrados por Duarte (1993) em seu estudo diacrônico: a partir do Período IV o paradigma flexional verbal começa a sofrer alterações, o que teria impulsionado a mudança do PB em direção ao preenchimento da posição do sujeito pronominal. Em outras palavras, embora o alçamento tenha sido a opção preferencial em quase todos os períodos, a representação do sujeito pronominal se fazia por uma categoria vazia. Nos Períodos IV, VI e VII, a opção pelo pronome pleno é claríssima. A tabela 3.12, abaixo, apresenta, detalhadamente, a relação sujeito pleno vs sujeito nulo, segundo a pessoa gramatical. Excluem-se, novamente, os dados com o clítico dativo junto ao verbo de alçamento na oração matriz: Período Período Período Período Período Período Período I II III IV V VI VII DPs 1/1 1/1 1/1 3/3 0/0 0/0 2/2 novos (100%) (100%) (100%) (100%) (100%) (0%) (0%) 2/3 1/1 4/6 Pronomes 5/8 0/1 0/1 0/3 (67%) (100%) (67%) 1ª e 2ª (63%) (0%) (0%) (0%) pessoas 2/2 1/2 Pronomes 2/2 0/1 0/1 0/1 0/0 (100%) (100%) (50%) de 3ª (0%) (0%) (0%) (0%) pessoa 0/0 Sujeito 0/0 0/0 0/0 0/0 0/1 0/0 (0%) Arbitrário (0%) (0%) (0%) (0%) (0%) (0%) Total 2 3 3 6 4 11 12 (100%) (100%) (100%) (100%) (100%) (100%) (100%) Tabela 3.12: Distribuição dos sujeitos pronominais das encaixadas com os “demais” verbos em construções de alçamento, segundo a forma de expressão: pleno vs nulo Os resultados acima indicam que os pronomes de 1ª e 2ª pessoas aparecem preferencialmente preenchidos a partir do Período IV. O menor índice de preenchimento é de 63% no Período VII. Os pronomes de 3ª pessoa aparecem categoricamente preenchidos, pelo menos na amostra investigada, nos dois últimos períodos de tempo, o que também confirma as nossas hipóteses. Foi encontrado 80 apenas 1 dado com sujeito de referência arbitrária no Período V e 8 dados com DPs lexicais. 3.2.2.2 A estrutura da oração encaixada A tabela 3.13 apresenta os resultados referentes ao tipo de estrutura selecionada pelos verbos de alçamento quando ocorre o alçamento do sujeito da encaixada para a oração matriz. Note-se que há mais uma possibilidade estrutural: o GerP, tipo de oração selecionada pelo verbo acabar: Acabar Bastar Convir Custar Demorar Faltar Levar 0/0 0/0 0/0 0/0 0/0 0/0 0/0 (0%) (0%) (0%) (0%) (0%) (0%) (0%) InfP / GerP 31/31 1/1 3/5 0/0 0/0 0/0 0/0 (100%) (100%) (60%) (0%) (0%) (0%) (0%) 7/7 2/5 2/2 PP 0/0 0/0 0/0 0/0 (100%) (40%) (100%) (0%) (0%) (0%) (0%) Tabela 3.13: Estrutura da encaixada segundo o tipo de verbo nas construções com alçamento com os “demais” verbos CP Os resultados apresentados acima englobam as 5 construções de alçamento com o clítico dativo. Foram encontrados na amostra dados de alçamento com 5 dos 7 verbos investigados: acabar, convir, custar, demorar e levar. Os resultados para acabar e levar são mais expressivos devido ao número de dados. Em relação à estrutura da encaixada quando ocorre alçamento, para todos os verbos investigados, o resultado é categórico, com 100%. A única exceção é o verbo custar, que pode selecionar, na construção de alçamento, tanto um InfP (32 a,b) quanto um PP (32c), com 60% e 40%, respectivamente. É importante apontar que todas as 3 ocorrências de alçamento com tal verbo em que a estrutura selecionada é um InfP apresentam o clítico dativo na oração matriz. Se por um lado os verbos demorar (28b) e levar (33c) selecionam um PP + InfP, nas estruturas de alçamento, por outro, o verbo acabar seleciona um GerP, como pode ser visto em (33 b,d). O verbo custar, pelo menos na amostra analisada, foi o único verbo de alçamento em que se verificou a presença e a ausência de preposição na oração encaixada, levando-se em consideração os dados sem e com alçamento. Os verbos levar e demorar, em contrapartida, exibem, obrigatoriamente, uma preposição 81 introduzindo a oração subordinada, tanto nas construções sem alçamento quanto no alçamento. Em relação às construções com o alçamento do sujeito da encaixada, 3 das 6 ocorrências com o verbo custar exibem a preposição ‘a’ introduzindo a oração encaixada. Obviamente, não é possível fazer afirmações categóricas, devido ao reduzido número de dados. Em (34), são apresentadas essas ocorrências: (34) a. Mas também há [IP quemi [tvbl]i custe [PP a ti morrer como o diabo!]] (Humberto Cunha - 1938) b. Não te emagreças por isto não. Daqui a pouco a peste está aí de volta. [IP E o irmão delai também não custa [PP a ti estourar por aí]]. (Antônio Callado 1954) Tanto nas construções sem alçamento e com alçamento, o verbo de alçamento demorar exibe, em sua oração encaixada, a preposição ‘para’ (ou a variação ‘pra’). Como pode ser visto na tabela acima, foram encontrados apenas dois 2 dados de alçamento com esse verbo. O verbo levar só apresentou ocorrências de alçamento nas peças investigadas e em todos os dados a oração encaixada ou é introduzida pela preposição ‘para’ ou pela preposição ‘a’, como pode ser observado em (35): (35) a. É porque eu pretendo resolver uns negócios e não sei [IP quantos dias [ø]i levarei [PP para ti receber o que tenho que receber]]. (Armando Gonzaga 1937) b. [IP Oito dias e oito noites [ø]i levei [PP a ti passar pela tua porta]], e tua não me aparecias; (…). (Martins Pena - 1847) A opção por uma das preposições, ‘a’ ou ‘para’, não afeta estruturalmente as construções. Além disso, as sentenças acima parecem não apresentar diferenças semânticas entre si. 3.2.2.3 Outros fatores estruturais À semelhança do que foi constatado em relação às construções de alçamento padrão com o verbo parecer, a observação atenta dos dados com os demais verbos 82 de alçamento mostrou que alguns fatores parecem contribuir para a ocorrência dessa construção: o traço semântico, o traço de referência e o tipo de oração em que o verbo de alçamento se encontra. As tabelas relativas ao traço semântico e de referência se encontram no Anexo 3. A análise do traço semântico do DP sujeito alçado, que excluiu as ocorrências com os pronomes de 1ª e 2ª pessoas, revela que o alçamento é favorecido pelo traço [+hum, +anim], que apresenta 100% de ocorrência nos Períodos I, II, IV e V. Os índices referentes ao traço [-anim], nos Períodos VI e VII, não ultrapassam 25% (cf. Tabela VI no anexo 3). Em (36) e (37) são apresentadas, respectivamente, ocorrências de alçamento com o sujeito [+hum, +anim] e [-anim]: (36) a. Como o homem era importante, o rapazi ficou tolhido, sem [ø]i saber como [ø]i explicar o revólver, sem [ø]i poder se livrar do homem e [IP [ø]i acabou mesmo [GerP ti desistindo de matar a mulher]]. (Millôr Fernandes - 1955) b. [IP Essa Helenei demora muito [PP pra ti fazer as coisas]]. (Miguel Falabella 1992) (37) a. [IP Todo passadoi acaba [GerP ti sendo ficcional de uma forma ou de outra]]. (Miguel Falabella - 1992) b. Tá acontecendo alguma coisa, gente. Isso não é normal. [IP Esse tremi vai acabar [GerP ti batendo]]. (João das Neves - 1976) A análise do traço de referência revela que o traço [+específico] favorece a implementação do alçamento com os verbos de alçamento focalizados nessa seção. Apesar de ter sido encontrada apenas 1 ocorrência dessa estrutura no Período I, os elevados índices encontrados para o traço [+específico] nos Períodos V e VII atestam a sua supremacia. Entretanto, nos Períodos II e IV, provavelmente devido ao reduzido número de dados, há um equilíbrio entre os dois traços, com 50% para cada um. Somente no penúltimo período o traço [+genérico] aparece como favorecedor do alçamento padrão (cf. Tabela VII no Anexo 3). Os exemplos apresentados em (38) e (39) ilustram, respectivamente, DPs sujeito com traço [+específico] e [+genérico]: 83 (38) a. Não te emagreças por isto não. Daqui a pouco a peste está aí de volta. [IP E o irmão delai também não custa [PP a ti estourar por aí]]. (Antônio Callado 1954) b. [IP Essa Helenei demora muito [PP pra ti fazer as coisas]]. (Miguel Falabella 1992) (39) a. Sim, [IP as pessoasi acabam [GerP ti se acomodando]], mas se você enfia três seguidas, aí, não quer mais parar. (Carlos Novaes - 1984) b. Mas também há [IP quemi [tvbl]i custe [PP a ti morrer como a diabo!]] (Humberto Cunha - 1938) Período Período Período Período Período Período I II III IV V VI Matriz 2/2 3/3 3/3 5/6 4/4 10/11 (100%) (100%) (100%) (83%) (100%) (91%) Completiva 1/6 1/11 0/2 0/3 0/3 0/4 (17%) (9%) (0%) (0%) (0%) (0%) Relativa 0/2 0/3 0/3 0/6 0/4 0/11 (0%) (0%) (0%) (0%) (0%) (0%) Adverbial 0/2 0/3 0/3 0/6 0/4 0/11 (0%) (0%) (0%) (0%) (0%) (0%) Total 2 3 3 6 4 11 (100%) (100%) (100%) (100%) (100%) (100%) Tabela 3.14: Tipo de oração vs alçamento com os “demais” verbos Período VII 10/12 (83%) 1/12 (8.5%) 0/12 (0%) 1/12 (8.5%) 12 (100%) A oração matriz apresenta-se como o tipo de oração mais favorável à ocorrência do alçamento, como podemos ver na tabela acima. Nos Períodos I, II, III e V os índices chegam a 100%. E mesmo nos demais períodos, os outros tipos oracionais apresentam apenas 1 ocorrência, não ultrapassando 17%, como podemos ver em relação à oração completiva no Período IV. Dessa forma, tanto em relação a parecer quanto aos demais verbos, pode-se afirmar que o alçamento padrão ocorre, preferencialmente, quando o verbo de alçamento está localizado em uma oração matriz. Porém, há algumas diferenças: (i) a oração relativa, nos Períodos II e III, aparece como um tipo oracional favorável ao alçamento padrão com o verbo parecer, o que não é constatado na tabela referente aos demais verbos. Não foram encontradas ocorrências em que os verbos de alçamento estivessem localizados em uma oração relativa; (ii) por outro lado, diferentemente do que foi observado para o verbo parecer, foram encontrados mais dados em que os demais 84 verbos de alçamento estivessem localizados em orações completivas (3 ocorrências) e 1 dado em oração adverbial. Portanto, em relação ao tipo oracional, verificamos que a oração matriz favorece a ocorrência do alçamento. Abaixo, em (40), (41) e (42), são apresentados exemplos da amostra que ilustram, respectivamente, os verbos de alçamento localizados em uma oração matriz, completiva e adverbial: (40) [IP [ø]i Acabo [GerP ti indo para o hospital]], se não for para o cemitério. (Gastão Tojeiro - 1918) (41) a. Enfim, quem ia imaginar [CP que [Ip eui ia acabar [GerP ti tendo uma filha francesa?]]] (Miguel Falabella - 1992) b. Eu sabia [CP que [IP vocêi ia acabar [GerP ti me jogando na cara]]]. (João das Neves - 1976) (42) Eu não te falei? Olha aí, tá suando tanto [CP que [IP [ø]i vai acabar [GerP ti manchando o uniforme]]]. (Miguel Falabella - 1992) Foi encontrada somente 1 ocorrência de alçamento em que o verbo ser estivesse localizado na oração encaixada (no Período VII), ao contrário do que ocorreu para o verbo parecer. Os outros dois dados encontrados com o verbo ser na encaixada ilustram a ocorrência da construção sem alçamento. Abaixo, em (43), apresenta-se o único dado encontrado de alçamento com tal verbo: (43) [IP Todo passadoi acaba [GerP ti sendo ficcional de uma forma ou de outra]]. (Miguel Falabella - 1992) Em linhas gerais, a análise atenta dos resultados apresentados nos permite concluir que: a) o alçamento do DP sujeito da oração encaixada para a posição não temática à esquerda dos sete verbos de alçamento focalizados nesta seção é uma estrutura recorrente no sistema já a partir das peças de Martins Pena, no Período I. Provavelmente, o alçamento com o clítico dativo junto aos verbos custar e convir 85 seja o responsável pelos índices favoráveis a essa construção em um período de tempo em que o PB ainda se apresentava como uma língua de sujeito nulo prototípica. O não alçamento prevalece apenas nos Períodos II e V, no entanto, não foram encontradas ocorrências com essa construção nos Períodos III e VI. (cf. gráfico 3.6). Os resultados confirmam as nossas hipóteses, pois atestam que o alçamento com os verbos acabar, bastar, convir, custar, demorar, faltar e levar não é uma estrutura nova no PB; b) o sujeito pronominal, na estrutura sem alçamento, aparece preferencialmente nulo nos séculos XX e XXI. Somente nos Períodos I e VII há concorrência entre as estratégias de representação do sujeito da encaixada, com 50% para os pronomes nulos e 50% para DPs lexicais e pronomes plenos. No alçamento, o pronome nulo se sobrepõe às demais estratégias até o Período III (depois, somente no Período V), quando ainda predomina o paradigma flexional 1 (cf. Duarte 1993). Nos Períodos IV, VI e VII, quando o paradigma já sofreu uma simplificação, o sujeito alçado aparece preferencialmente pleno através de pronomes; c) o tipo de estrutura selecionada pelo verbo de alçamento se apresenta como um fator relevante na ocorrência das estruturas de alçamento. Enquanto os verbos demorar e levar selecionam obrigatoriamente, tanto na estrutura sem alçamento quanto no alçamento, um PP, o verbo custar oscila entre esse tipo de oração e um InfP, em ambas as construções de alçamento. O verbo bastar, no não alçamento, também pode selecionar 2 tipos de estruturas: neste caso, um CP e um InfP. Os verbos faltar e convir, na amostra, selecionam apenas orações infinitivas e o verbo acabar, que só apresentou ocorrências de alçamento, orações com gerúndio. 3.3 O que dizem os resultados: confrontando parecer e os “demais” verbos Neste capítulo, foi feita uma análise dos dados encontrados na amostra de peças teatrais, separando-se as construções com o verbo de alçamento mais prototípico, parecer, que permite quatro diferentes estruturas, e as estruturas com os “outros” verbos, que permitem apenas duas. Contrapondo os resultados, pode-se verificar que: 86 (i) em relação a parecer, a estrutura sem alçamento, a partir do Período IV, começa a ser preterida pelas outras construções, chegando a 0% de ocorrência na peça de 1992. O alçamento padrão, por sua vez, não se apresenta como uma estrutura recorrente na amostra, o que fica evidenciado em seus índices (o maior é 38% no Período VI) e na sua ausência nos Períodos I, V e VII. O hiperalçamento, construção que, pelo menos na amostra investigada, só ocorre com o verbo parecer, já apresenta duas ocorrências na peça de 1918 e se torna uma estrutura amplamente utilizada no Período VII, com 100%. Os resultados aqui apresentados relativos ao verbo parecer confirmam nossas hipóteses e vão ao encontrado de outros estudos empíricos, entre eles Duarte (2004, 2007) e Henriques (2005); (ii) em relação aos “demais” verbos, o alçamento do DP sujeito da encaixada se mostra uma estrutura recorrente já a partir do Período I e se apresenta como uma construção amplamente utilizada nos dois últimos períodos de tempo, o que também corrobora resultados apresentados em estudos anteriores (cf. Duarte op. cit., Henriques op. cit.). O alçamento com clítico dativo junto aos verbos custar e convir, que aparece apenas nos três primeiros períodos de tempo, comprova a obsolescência dessa construção com o clítico em particular, inserida na redução do quadro de clíticos no PB; (iii) diferentemente do que foi encontrado para o verbo parecer nas construções sem alçamento, o sujeito da encaixada aparece preferencialmente nulo ao longo do tempo. Em contrapartida, em relação ao alçamento padrão, os dois grupos de verbos analisados neste trabalho apresentam resultados semelhantes: o pronome pleno surge, com o passar do tempo, como a estratégia favorita de representação do sujeito alçado. Esse resultado era esperado, pois a partir da peça de Gastão Tojeiro, em 1918, o PB já começava a caminhar em direção à mudança na marcação do Parâmetro do Sujeito Nulo (Chomsky 1981) devido, segundo Duarte (1993), à simplificação do paradigma flexional verbal. Após esse breve resumo dos resultados, passemos às considerações finais. 87 Considerações finais A representação do sujeito pronominal do Português Brasileiro, tanto o de referência definida quanto o de referência indeterminada, está se caracterizando pela preferência pelo sujeito preenchido, como atestam diversos estudos de Duarte (1993, 1995, 2000). Assim, pode-se observar que o PB, ao longo do tempo, está mudando sua marcação em relação ao Parâmetro do Sujeito Nulo (Chomsky 1981), ou seja, está se tornando uma língua [-prodrop]. Essa mudança na marcação do PSN, segundo proposta de Duarte (1993, 1995), estaria associada à redução do quadro de paradigmas flexionais verbais do PB. O estudo diacrônico da autora confirma essa hipótese: a simplificação do paradigma e o crescente preenchimento do sujeito pronominal de referência definida ao longo do século XX caminharam juntos. Levando em conta o feixe de propriedades que caracterizam o PSN e a noção de “encaixamento” da mudança, proposto em Weinreich, Labov e Herzog (1968), supõe-se que alterações tão profundas no sistema causem algum “efeito colateral”, afetando, por exemplo, os sujeitos não referenciais. Por isso, neste trabalho, foi investigada a posição do sujeito não referencial à esquerda de 8 verbos de alçamento ao longo de sete períodos de tempo (da metade século XIX até o final do século XX): parecer, que permite 4 possibilidades estruturais, entre elas o hiperalçamento, não incluída nas descrições das gramáticas tradicionais, e um outro grupo de verbos (acabar, bastar, convir, custar, demorar, faltar e levar), que permitem apenas 2 construções. Para a investigação proposta, analisou-se a mesma amostra de peças teatrais utilizada por Duarte (1993) em seu estudo diacrônico, ampliada por questões metodológicas, mas mantendo o mesmo tipo e, quando possível, o mesmo autor. Algumas hipóteses nortearam o estudo; a maioria delas está relacionada à simplificação do paradigma flexional verbal do PB ao longo do século XX. Partiu-se do pressuposto de que, devido a essa redução e à orientação parcial do PB para o discurso, a variedade brasileira apresentaria uma gradativa preferência ao longo dos períodos de tempo pelo alçamento do DP sujeito do verbo da oração encaixada para 88 a posição não temática disponível à esquerda dos verbos de alçamento. Entretanto, em relação ao verbo parecer, acreditava-se, com base em resultados sincrônicos, que o alçamento padrão não se mostrasse uma construção recorrente nos períodos de tempo mais recentes e que o hiperalçamento começasse a se implementar no sistema a partir do último quartel do século XX. Para os demais verbos, defendia-se a supremacia do alçamento padrão a partir do início do século XX. Os resultados encontrados confirmam e, em certa medida, superam as nossas expectativas. A construção de hiperalçamento, não é tão nova no sistema, uma vez que já apresenta 2 ocorrências na peça de Gastão Tojeiro, no Período III (1918), quando ainda predominava um paradigma flexionalmente rico e, segundo os resultados das peças teatrais analisadas por Duarte (1993), o PB ainda preferia o sujeito referencial nulo. A presença tímida dessa estrutura certamente já sinalizava uma possibilidade no sistema e talvez já fosse um indício de que uma mudança maior estava em seu início: a preferência pelo sujeito pronominal pleno. Os resultados referentes às demais construções de alçamento com o verbo parecer confirmam nossas hipóteses, na medida em que o alçamento padrão se apresenta como uma estrutura raríssima na amostra e que o não alçamento, concorria, até o Período VI, com as outras estruturas de alçamento. A análise dos resultados relativos aos “demais” verbos de alçamento também confirma as expectativas iniciais: o alçamento com esses verbos é uma estrutura amplamente recorrente, principalmente nos dois últimos períodos de tempo. Nota-se que tal construção apresenta um elevado índice de ocorrência já no Período I, nas peças de Martins Pena, o que, de certa forma, vai além das nossas hipóteses. O alçamento com clítico dativo com alguns desses verbos também é interessante, visto que as ocorrências encontradas se concentram nos três primeiros períodos de tempo, quando o PB ainda se comportava como uma língua de sujeito nulo prototípica (cf. Duarte 1993) e apresentava um sistema de clíticos mais produtivo. De um modo geral, os resultados apresentados neste trabalho corroboram diversos estudos relativos ao (não) preenchimento do sujeito não referencial dos verbos de alçamento, entre eles os de Duarte (2004, 2007), Henriques (2005) e Henriques e Duarte (2006). Mais do que isso: o estudo diacrônico aqui empreendido comprova que o a posição não temática à esquerda dos verbos de alçamento é afetada pela mudança na marcação do Sujeito Nulo, que ocorre, conforme hipótese de Duarte (1993, 1995), devido à simplificação dos paradigmas flexionais. 89 Dessa forma, acredita-se que este trabalho seja uma importante contribuição para a investigação da mudança paramétrica em progresso no PB. Além disso, a análise aqui realizada mostra que a colaboração amistosa entre pressupostos da Teoria Gerativa e da Teoria da Variação permite uma leitura minuciosa dessa mudança sintática no PB, representando muito bem aquilo que Kato (2002) considera um “feliz casamento”. 90 RESUMO Nos últimos anos, estudos empíricos sobre o português falado do Brasil indicam que a posição do sujeito pronominal (de referência definida ou arbitrária) vem sendo preenchida. O PB está mudando sua marcação em relação ao Parâmetro do Sujeito Nulo, um processo que estaria associado à simplificação do paradigma flexional verbal ao longo do século XX. É de se esperar que uma mudança tão profunda ocasione algum “efeito colateral” no sistema ou, nas palavras de Weinreich, Labov e Herzog (1968), um “encaixamento”. Neste trabalho, faz-se um estudo diacrônico, utilizando uma amostra de peças teatrais escritas por autores brasileiros ao longo dos séculos XIX e XX. Investiga-se o comportamento do sujeito não referencial dos verbos de alçamento ao longo de sete períodos de tempo e se esse comportamento está relacionado à redução do paradigma flexional do PB. A principal hipótese é de que o alçamento padrão e o hiperalçamento se tornem mais recorrentes ao longo do tempo, seguindo a tendência de preenchimento dos sujeitos referenciais, à medida que o paradigma flexional se simplifica. Os resultados da nossa análise confirmam a nossa hipótese, mostrando uma significativa preferência pela representação fonética de um sujeito na posição de Spec de IP dos verbos de alçamento. A similaridade observada entre as peças teatrais mais recentes e os resultados encontrados para a fala espontânea permite considerar as peças populares como uma importante ferramenta para o estudo da mudança da língua em sincronias passadas. 91 ABSTRACT Empirical studies focusing on spoken Brazilian Portuguese have shown that the representation of the pronominal subject (both referential and arbitrary ones) is changing: the preference for the full pronominal variant is increasing during the last decades. PB is becoming a [-prodrop] language, a process of change possibly related to the reduction of the inflectional paradigm in the second quarter of the 20th century. As a consequence of the parametric change in progress in PB, some consequences, to which Weinreich, Labov and Herzog (1968) refer to as “embedding”, are expected. The present study, based on 20 plays written by Brazilian authors along the 19th and 20th centuries, focuses on the non-referential subject of raising verbs in the attempt to investigate if the reduction of the inflectional paradigm and the raising of the embedded subject to the matrix clause are related. The main hypothesis is that the raising and hyper-raising constructions will increase along the time, following the tendency to fill referential subjects, as the inflectional verb paradigm reduces. The results of our analysis confirm our hypothesis, showing significant preference for the phonetic representation of a “subject” in Spec of IP of raising verbs. The similarity found in recent plays with the results for spontaneous speech makes the use of popular plays an important sample to study language change in past synchronies. 92 Referências (peças teatrais): CALLADO, Antônio. Pedro Mico. 1954. CUNHA, Humberto. A vida tem três andares. 1938. FALABELLA, Miguel. No coração do Brasil. 1992. FERNANDES, Millôr. Um elefante no caos. Porto Alegre: LPM editores, 1979. ___________, Millôr. Os órfãos de Jânio. Porto Alegre: LPM, editores, 1979. FRANÇA JÚNIOR, Joaquim J. de. Teatro de França Júnior. Tomo II. Serviço Nacional de Teatro, Fundação da Arte, 1980. GONZAGA, Armando. O hóspede do quarto n° 2. 1937. MARTINS PENA, Luiz C. As melhores comédias de Martins Pena. Apresentação de Guilhermino César. Porto Alegre: Mercado Aberto, 1987. NEVES, João das. O último carro ou as 14 estações. 1976. NOVAES, Carlos Eduardo. A mulher integral. 1975. ________, Carlos Eduardo. Confidências de um espermatozóide careca. Rio de Janeiro: Nórdica, 1986. 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São Paulo: Parábola Editorial, 2006. 100 ANEXO 1 [+hum,+anim] [-hum,+anim] [-anim] Total Período I 0/0 (0%) 0/0 (0%) 0/0 (0%) 0 (100%) Período II 3/6 (50%) 0/6 (0%) 3/6 (50%) 6 (100%) Período III 3/4 (75%) 0/4 (0%) 1/4 (25%) 4 (100%) Período IV 3/3 (100%) 0/3 (0%) 0/3 (0%) 3 (100%) Período V 0/0 (0%) 0/0 (0%) 0/0 (0%) 0 (100%) Período VI 1/2 (50%) 1/2 (50%) 0/2 (0%) 2 (100%) Período VII 0/0 (0%) 0/0 (0%) 0/0 (0%) 0 (100%) Tabela I: Traço semântico vs alçamento padrão com o verbo parecer Período Período Período Período Período Período I II III IV V VI [+específico] 5/6 4/4 2/2 2/2 0/0 0/0 (83%) (100%) (100%) (100%) (0%) (0%) 1/6 [+genérico] 0/4 0/2 0/0 0/2 0/0 (17%) (0%) (0%) (0%) (0%) (0%) Total 0 6 4 2 0 2 (100%) (100%) (100%) (100%) (100%) (100%) Tabela II: Referência vs alçamento padrão com o verbo parecer Período VII 0/0 (0%) 0/0 (0%) 0 (100%) Período Período Período Período Período Período Período I II III IV V VI VII 1/3 4/6 Ser 0/0 0/4 0/3 0/0 0/0 (33%) (67%) (0%) (0%) (0%) (0%) (0%) Outros 2/6 4/4 3/3 2/3 0/0 0/0 0/0 (33%) (100%) (100%) (67%) (0%) (0%) (0%) Total 0 (100%) 6 (100%) 4 (100%) 3 (100%) 0 (100%) 3 (100%) 0 (100%) Tabela III: Presença do verbo ser na encaixada vs alçamento padrão com parecer 101 ANEXO 2 100% DP lexical pleno 90% 80% Pronome pleno 70% Pronome nulo 60% 50% 40% 30% 20% 10% 0% Período I II III IV V VI VII Gráfico I: A representação do sujeito alçado para a posição de sujeito de parecer nas construções de hiperalçamento (DPs lexicais, pronomes plenos, pronomes nulos) Período Período Período Período Período Período I II III IV V VI [+hum,+anim] 2/2 1/1 0/0 0/0 0/0 0/0 (100%) (100%) (0%) (0%) (0%) (0%) [-anim] 0/0 0/0 0/2 0/1 0/0 0/0 (0%) (0%) (0%) (0%) (0%) (0%) Total 0 0 2 1 0 0 (100%) (100%) (100%) (100%) (100%) (100%) Tabela IV: Traço semântico vs hiperalçamento com o verbo parecer Período VII 3/5 (60%) 2/5 (40%) 5 (100%) Período Período Período Período Período Período I II III IV V VI 1/2 1/1 [+específico] 0/0 0/0 0/0 0/0 (50%) (100%) (0%) (0%) (0%) (0%) [+genérico] 1/2 0/0 0/0 0/1 0/0 0/0 (50%) (0%) (0%) (0%) (0%) (0%) Total 0 0 2 1 0 0 (100%) (100%) (100%) (100%) (100%) (100%) Tabela V: A referência vs hiperalçamento com o verbo parecer Período VII 5/5 (100%) 0/5 (0%) 5 (100%) 102 ANEXO 3 Período Período Período Período Período Período I II III IV V VI [+hum,+anim] 1/1 2/2 1/1 3/3 5/6 0/0 (0%) (100%) (100%) (100%) (100%) (83%) [-anim] 1/6 0/1 0/2 0/0 0/1 0/3 (17%) (0%) (0%) (0%) (0%) (0%) Total 1 2 0 2 3 6 (100%) (100%) (100%) (100%) (100%) (100%) Tabela VI: Traço semântico vs alçamento padrão com os “demais” verbos Período VII 3/4 (75%) 1/4 (25%) 4 (100%) Período Período Período Período Período Período Período I II III IV V VI VII [+específico] 1/1 1/2 1/2 2/3 2/6 3/4 0/0 (0%) (100%) (50%) (50%) (67%) (33%) (75%) 1/2 1/3 4/6 1/4 1/2 [+genérico] 0/0 0/1 (50%) (33%) (67%) (25%) (50%) (0%) (0%) Total 1 2 0 2 3 6 4 (100%) (100%) (100%) (100%) (100%) (100%) (100%) Tabela VII: Sujeito específico / não específico vs alçamento padrão com os “demais” verbos