Gleicinara Botelho Públio * Kelle Oliveira Silva** Gustavo Freitas de Sousa Viana*** RESUMO Trata-se de um estudo descritivo e transversal desenvolvido com o objetivo de avaliar a qualidade de vida de pacientes com câncer submetidos à quimioterapia em uma clínica particular de Vitória da Conquista BA com convênio com o Sistema Único de Saúde. Após a autorização do comitê de ética e pesquisa, foram coletados dados de 100 pacientes maiores de 18 anos que estiveram em tratamento quimioterápico no período de abril a maio de 2014, por meio de entrevista. Na coleta dos dados foram utilizados dois instrumentos: um questionário com dados sóciodemográfico e clínicos e o European Organization for Research and Treatment of Cancer Quality of Life Questionnaire “Core” 30 itens (EORTCQLQ-C30), validado no Brasil. Os dados foram analisados através do software SPSS 20 e Excel 2010. Os pacientes se apresentaram com idade entre 21 a 88 anos e relatam dois sintomas com predominância: fraqueza 74% e náusea com 71%. O EORTC-QLQ-C30 mostrou a média do estado de saúde global/qualidade de vida 63,60, representando um nível pouco satisfatório. Nas escalas de sintomas, os mais frequentes foram: perda de apetite com média 41,64, insônia com 39,02, seguida de fadiga com 37,66. Esses sintomas alteraram as funções físicas, cognitivas, sociais e emocionais dos indivíduos, demonstrando que os efeitos colaterais da quimioterapia comprometem a qualidade de vida dos pacientes. Palavras-chave: Câncer. Quimioterapia. Efeitos Colaterais. Qualidade de vida. relatos de pesquisa QUALIDADE DE VIDA DE PACIENTES ONCOLÓGICOS SUBMETIDOS À QUIMIOTERAPIA *Farmacêutica Generalista. Graduada pela Faculdade Independente do Nordeste. E-mail: gleicypublio@hot mail.com **Farmacêutica Clínico-Industrial. Doutoranda pelo Programa Multicêntrico de Pós-graduação em Ciências Fisiológicas da Sociedade Brasileira de Fisiologia (SBFis). Mestre em Ciências Fisiológicas pela SBFis. Docente da Faculdade Independente do Nordeste – FAINOR, Departamento de Saúde, Vitória da Conquista, Bahia, Brasil. E-mail: [email protected] *** Farmacêutico Bioquímico. Mestre em Farmácia pela Universidade Federal da Bahia (UFBA). Docente da Faculdade Independente do Nordeste – FAINOR, Departamento de Saúde, Vitória da Conquista, Bahia, Brasil. E-mail: vianagustavo2 @gmail.com 1 INTRODUÇÃO De acordo com Machado e Sawada problema de saúde pública. Diversos as- (2008), o câncer é uma doença crônico- pectos como o diagnóstico precoce e os degenerativa por ter uma evolução lenta e meios de reabilitação física, social e psi- que tem se configurado como um grave cológica são imprescindíveis para incenti- 244 C&D-Revista Eletrônica da Fainor, Vitória da Conquista, v.7, n.2, p.244-257, jul./dez. 2014 Gleicinara Botelho Públio, Kelle Oliveira Silva, Gustavo Freitas de Sousa Viana var o paciente a lutar contra essa patolo- possível entender alguns dos efeitos gia. Além do impacto na confirmação do adversos e tóxicos relacionados aos diagnóstico, o tratamento oncológico tam- tratamentos oncológicos. Para Mansano- bém influencia significativamente na qua- Schlosser e Ceolim (2012), é comum a lidade de vida do indivíduo, por isso, é indução da depressão medular óssea pela importante o controle dos efeitos adversos maioria das drogas. Alopecia e alterações e das consequências sobre o desempe- gastrointestinais também ocorrem com nho físico, psicológico, emocional e, so- certa regularidade. bretudo, social do paciente. Andrade, Sawada e Barichello Para Mansano-Schlosser e Ceolim (2013) citam outros efeitos adversos da (2012), a hipótese diagnóstica de câncer quimioterapia que são frequentemente provoca mudanças relevantes no estilo de observados, tais como toxicidades pulmo- vida nares, cardíacas, hepáticas, neurológicas, do paciente, modificações e renais, vesicais, dermatológicas, disfun- do ções reprodutivas, alterações metabóli- desconforto, da dor, da desfiguração, da cas, reações alérgicas, fadiga, alterações dependência e da perda da autoestima. hematológicas que englobam a leucope- Além disso, o paciente deverá encarar os nia, anemia, trombocitopenia e neutrope- diferentes tipos de tratamento para a nia febril. emocionais físicas, principalmente em psicológicas consequência doença, geralmente associados a efeitos colaterais adversos. Hespanhol Segundo as autoras Andrade, Sa- e wada e Barichello (2013), a avaliação da colaboradores (2010) afirmam que cerca qualidade de vida na oncologia teve como de 70% câncer ponto de partida um trabalho desenvol- receberão quimioterapia antineoplásica no vido no ano de 1940 para avaliar a função decorrer do tratamento. física e as condições de desempenho dos dos pacientes Segundo e pacientes, incluindo estado psicológico, das níveis de independência, relacionamento peculiaridades da quimioterapia e da social, características ambientais e espi- radioterapia é não diferenciar as células rituais. A expressão Qualidade de Vida neoplásicas das células normais que Relacionada à Saúde tem sido usada com proliferam com rapidez, desta forma, é a finalidade de avaliar o quanto a doença Hofling-Lima Chaves, com (2007), Gomes uma C&D-Revista Eletrônica da Fainor, Vitória da Conquista, v.7, n.2, p.244-257, jul./dez. 2014 245 Qualidade de vida de pacientes oncológicos submetidos à quimioterapia e seus sintomas passam a afetar o cotidi- em uma clínica de oncologia da cidade de ano de um indivíduo. Esse termo é co- Vitória da Conquista (BA) que atende aos mumente utilizado para examinar ensaios pacientes do Sistema único de Saúde clínicos com quimioterápicos, objetivando (SUS) de Vitória da Conquista e região. estimar os efeitos colaterais provocados Foram coletados dados de pacientes que pela quimioterapia e os seus impactos estiveram em tratamento quimioterápico sobre a qualidade de vida dos pacientes. no período de abril a maio de 2014. A Diante do exposto, é possível ob- amostra foi aleatória simples de uma po- servar que o câncer é um importante pro- pulação com características semelhantes, blema de saúde pública em todo o composta por 100 pacientes maiores de mundo. Além disso, observa-se também 18 anos, submetidos à no mínimo um ci- que pacientes em tratamentos oncológi- clo de quimioterapia. Para a coleta dos cos têm a qualidade de vida comprome- dados foram utilizados dois instrumentos: tida, por isso é necessário cada vez mais um questionário sóciodemográfico e clí- desenvolver estudos com a finalidade de nico, elaborado pelos próprios pesquisa- buscar medidas para melhorar a quali- dores, e o European Organization for dade de vida e promover a humanização Research na assistência aos pacientes em trata- Quality of Life Questionnaire “Core” 30 mento. O objetivo desse trabalho foi ava- itens (EORTC-QLQ-C30), ambos aplica- liar a qualidade de vida de pacientes com dos durante uma entrevista no momento câncer submetidos à quimioterapia e em que o paciente retornava à clínica atendidos em uma clínica particular de para a aplicação da quimioterapia antine- atendimento ao paciente com câncer, com oplásica. Informações relativas ao proto- convênio com o Sistema Único de Saúde- colo de tratamento foram obtidas através SUS. do acesso aos prontuários dos pacientes. and Treatment of Cancer O EORTC-QLQ-C30 é um instru2 METODOLOGIA mento de uso livre para fins acadêmicos, validado e traduzido para o português que 2.1 COLETA DE DADOS contempla particularidades relacionadas com o câncer. Abrange sintomas peculia- Trata-se de um estudo de delinea- res do câncer, efeitos adversos do trata- mento transversal e descritivo realizado mento, efeitos sobre o desempenho físico, 246 C&D-Revista Eletrônica da Fainor, Vitória da Conquista, v.7, n.2, p.244-257, jul./dez. 2014 Gleicinara Botelho Públio, Kelle Oliveira Silva, Gustavo Freitas de Sousa Viana psicológico, emocional e, sobretudo, so- assinaram o Termo de Consentimento cial do paciente e satisfação com o trata- Livre e Esclarecido (TCLE). A pesquisa foi mento (AARONSON et al.,1993). Este então realizada acompanhada do termo questionário é composto por 30 questões de permissão assinado pelo responsável que são divididas em três domínios: es- direto da clínica oncológica. tado de saúde global com duas questões de avaliação, cinco escalas funcionais 2.3 ANÁLISE DOS DADOS que compreendem: função física, cognitiva, social, emocional e desempenho de Análise estatística descritiva foi papel; três escalas de sintomas e mais empregada para analisar os dados socio- seis outros itens que contemplam sinto- demográficos (através da distribuição de mas relacionados ao câncer. A escala de frequência) dos voluntários da pesquisa e saúde global é representada no questio- para analisar os dados referentes aos es- nário pelos itens 29 e 30 que são apre- cores padronizados obtidos pelo questio- sentados em escala do tipo Likert de sete nário EORTC-QLQ-C30. Os dados foram pontos, em que um se refere a um estado codificados e tabulados, utilizando os pro- de saúde global péssimo e sete a ótimo gramas SPSS 20 e Excel 2010 para o (BRABO, 2006). tratamento estatístico. Análise de Variância (ANOVA) e o teste Tukey Post Hoc 2.2 PROCEDIMENTOS ÉTICOS foram executados para verificar se existiam diferenças significativas na qualidade O presente estudo foi autorizado de vida dos pacientes de acordo as variá- pela Comissão de Ética em Pesquisa da veis sociodemográficas categóricas. Foi instituição proponente, Faculdade Inde- considerado significante o valor de p < pendente do Nordeste, parecer número 0,05. 611.904/2014. Todas as pessoas que atendiam aos critérios de inclusão foram esclarecidas quanto aos objetivos e condutas da pesquisa, ao tempo em que fo- 3 RESULTADOS 3.1 CARACTERIZAÇÃO DA AMOSTRA ram convidadas a participar da mesma. Os pacientes se apresentaram com Os voluntários que aceitaram participar idade entre 21 a 88 anos, com média de C&D-Revista Eletrônica da Fainor, Vitória da Conquista, v.7, n.2, p.244-257, jul./dez. 2014 247 Qualidade de vida de pacientes oncológicos submetidos à quimioterapia 56,8. Em relação ao gênero, 48% eram do Em relação ao diagnóstico, a sexo masculino e 52% do sexo feminino; neoplasia mais frequente foi a de mama ao estado civil, 58% casados; quanto à (29%), seguida de colo retal (19%) e do escolaridade, 70% tinham primeiro grau pulmão (9%). No que tange ao início da incompleto. Com relação à origem, 34% quimioterapia antineoplásica, a análise eram de Vitória da Conquista - BA e os categorizada demonstrou que a maioria demais de cidades da região. Somente dos pacientes (36%) iniciou o tratamento 14% dos participantes eram ativos no num intervalo de um e três meses. Em trabalho; 85% declararam renda de até relação ao ciclo de quimioterapia, 34% um salário mínimo. E no que diz respeito dos pacientes participavam do ciclo de 8 à profissão, 31% relataram ser lavrador(a) dias (Tabela 1). (Tabela 2). Tabela 1 - Distribuição dos pacientes oncológicos submetidos à quimioterapia segundo dados sócio demográficos. (N=100). Tabela 2 - Distribuição dos pacientes oncológicos submetidos à quimioterapia segundo o diagnóstico e momento do tratamento. (N=100). Característica Gênero (sexo) Feminino Masculino Procedência Vitória da Conquista – BA Outros municípios vizinhos Ocupação/profissão Do lar Lavrador (a) Aposentado (a) Outros Condição do trabalho Afastado Aposentado Ativos Renda em salários mínimos Até 1 salário mínimo 1 a 2 salários mínimos 3 a 4 salários mínimos Escolaridade Analfabeto 1º grau incompleto 2º grau incompleto 2º grau completo 3º grau incompleto 3º grau completo Pós graduação Estado civil Casado (a) Solteiro (a) Divorciado (a) Viúvo (a) União estável Característica Tipo de neoplasia Mama Colo retal Pulmão Estômago Próstata Esôfago Outros Início da terapia antineoplásica Até 1 mês 1 a 3 meses 3 a 6 meses 6 a 12 meses Mais de 1 ano Ciclo de quimioterapia antineoplásica 8 dias 15 dias 21 dias 30 dias Fonte: Dados da Pesquisa Percentual 52% 48% 34% 66% 23% 31% 20% 26% 44% 42% 14% 85% 14% 1% 11% 70% 5% 11% 1% 1% 1% 58% 15% 11% 9% 7% de quimioterapia antineoplásica Percentual 29% 19% 9% 8% 6% 6% 23% 16% 36% 20% 15% 13% 34% 32% 30% 4% Fonte: Dados da Pesquisa 3.2 PROTOCOLO DE QUIMIOTERAPIA ANTINEOPLÁSICA No que diz respeito ao tratamento adotado, 11% utilizaram paclitaxel; 10% foi submetida à Cisplatina e fluoruracila 248 C&D-Revista Eletrônica da Fainor, Vitória da Conquista, v.7, n.2, p.244-257, jul./dez. 2014 Gleicinara Botelho Públio, Kelle Oliveira Silva, Gustavo Freitas de Sousa Viana associadas. A associação Leucovorin e Indigestão Sangramento gengival oxilaplatina foi utilizada em 9% dos Fonte: Dados da Pesquisa pacientes. Quanto à terapêutica adotada, A 19% 3% maior preocupação dos 48% dos pacientes utilizaram apenas um pacientes foi com seu estado de saúde. medicamento, a mesma porcentagem foi Noventa e cinco por cento dos pacientes submetida medicamentos relataram preocupar-se com a saúde; associados e apenas 4% dos pacientes 71% com o modo de viver; situação faziam financeira a uso dois de três ou mais medicamentos. 67%, acompanhada pela preocupação com a família e com os amigos 3.3 SINAIS E SINTOMAS 65%. predominante Outra foi com preocupação a aparência, perfazendo 54%. A preocupação menos No que refere aos sinais e sintomas apresentados, fraqueza, náusea e alterações no paladar foram (74%, 71% e 61%, respectivamente). Os sintomas menos frequentes foram sangramento gengival com 3% e indigestão com 19% (Tabela 3). Tabela 3 - Distribuição dos pacientes oncológicos submetidos à quimioterapia segundo os sinais e sintomas referidos. (N=100). Característica Sinais e sintomas relatados Fraqueza Náusea Perda de apetite Boca seca Baixa autoestima Vômito Insônia Agitação Constipação Alteração do paladar Dor Fadiga Cefaleia Diarreia Tonteira Feridas na boca Febre Alterações urinárias Percentual 74% 71% 61% 58% 53% 52% 50% 46% 44% 43% 43% 40% 36% 36% 29% 27% 24% 24% tratamento, 4% (Tabela 4). os relatados com maior frequência pelos pacientes relatada foi com as decisões quanto ao Tabela 4 - Distribuição dos pacientes oncológicos submetidos à quimioterapia segundo as preocupações relatadas. (N=100). Característica Preocupações referidas Minha saúde Meu modo de viver Situação financeira Minha família ou amigos Minha aparência Como me locomover até o local do tratamento Meu trabalho Efeitos colaterais do tratamento Como vou manter minhas atividades Sintomas que posso vir a apresentar As decisões quanto ao tratamento Percentual 95% 71% 67% 65% 54% 42% 39% 27% 27% 25% 4% Fonte: Dados da Pesquisa 3.4 QUALIDADE DE VIDA A avaliação da qualidade de vida dos pacientes oncológicos foi realizada pelo EORTC – QLQ C30. Os escores C&D-Revista Eletrônica da Fainor, Vitória da Conquista, v.7, n.2, p.244-257, jul./dez. 2014 249 Qualidade de vida de pacientes oncológicos submetidos à quimioterapia escala 39,02, 37,66 e 31,14, respectivamente. (escala funcional, escala de sintomas e Pode-se concluir que esses sintomas saúde global) foram transformados para predominantes provavelmente afetaram escores as funções físicas e emocionais dos brutos provenientes de cada padronizados, conforme preconizado pelo manual do questionário. pacientes (Tabela 5). Os escores padronizados das escalas variam de 0 a 100, em que um escore alto para a escala funcional representa um nível funcional saudável; já um escore alto para a escala de sintomas representa alto nível de sintomatologia, ou seja, problemas e, por fim, um escore alto para a escala de estado de saúde global representa melhor qualidade de vida. A tabela 5 apresenta as médias e desviopadrão dos domínios do EORTC – QLQ C30. A função global de saúde alcançou uma média de 63,60, demonstrando que esses pacientes consideram a sua Tabela 5 – Escore padronizado (média e desviopadrão) das escalas avaliadas pelo instrumento EORTC – QLQ C30. (N=100). Escalas Medida global de saúde Estado de saúde global/ QV Escala funcional Função física Desempenho de papel Função emocional Função cognitiva Função social Escala de sintomas Fadiga Náusea e vômitos Dor Dispneia Insônia Perda de apetite Constipação Diarreia Item Dificuldade financeira às funções 63,60 14,45 64,29 56,05 25,07 36,94 46,74 79,97 63,17 34,98 23,67 37,66 37,66 21,83 31,14 10,34 39,02 41,64 23,34 10,67 30,48 31,21 33,94 24,97 41,63 41,17 38,66 27,60 44,99 39,23 Para verificar se existiam social, diferenças significativas na qualidade de emocional e desempenho de papel, as vida dos pacientes de acordo as variáveis médias atingiram variações entre 64,29 a sociodemográficas e clínicas categóricas, 46,74, pouco utilizou-se o teste ANOVA e o teste Tukey emocional Post Hoc. Dentre as variáveis obtidas pelo retratando satisfatório. A física, Desvio-padrão Fonte: Dados da Pesquisa qualidade de vida não muito boa. Em relação Média um função nível apresentou média baixa (46,74), o que EORTC indica que os pacientes encontram-se selecionadas como variáveis dependentes deprimidos, (estado irritados, nervosos e preocupados. Nas escalas de sintomas, perda de – QLQ de C30, saúde três global, foram função emocional e náusea e vômito), sendo uma pertencente a cada escala. Como apetite, insônia, fadiga e dor tiveram varáveis independentes foram escolhidas: escores médios padronizados de 41,64, tempo 250 de tratamento quimioterápico, C&D-Revista Eletrônica da Fainor, Vitória da Conquista, v.7, n.2, p.244-257, jul./dez. 2014 Gleicinara Botelho Públio, Kelle Oliveira Silva, Gustavo Freitas de Sousa Viana quantidade de fármacos utilizados por de vida dos pacientes (GOZZO et al., pacientes e tipo de câncer (os três mais 2011). frequentes). Não foram observadas De acordo com Alcantara, diferenças significativas entre estados de Sant’Anna e Souza (2013), a realidade saúde e oncológica é tenebrosa, pois receber o sintomas (náusea e vômito) de acordo diagnóstico de uma neoplasia maligna com o tipo de câncer, o tempo de provoca um grande impacto na vida do tratamento de paciente, impacto este que está direta- fármacos utilizada por paciente (p > 0,05). mente associado a alterações relevantes global, e função com a emocional quantidade na vida desses indivíduos, como a não 4 DISCUSSÃO retomada ao trabalho. O resultado do presente estudo demonstrou que 44% dos Mesmo com o avanço da ciência e pacientes declararam estarem afastados da tecnologia em relação aos procedi- do trabalho. Silva e Santos (2010) desen- mentos realizados para o tratamento das volveram um estudo na cidade de Ribei- doenças crônicas, o câncer permanece rão Preto SP, em 2010, onde os pacientes com o seu aspecto sombrio, pois é quase relataram algumas razões para a opção sempre associado a um processo irrever- de não retomar o trabalho, como “as limi- sível (GOMES et al., 2013). O desenvol- tações físicas resultantes do tratamento vimento de novos protocolos de quimiote- que eram incompatíveis com a função rapia antineoplásica e a elevada utilização realizada anteriormente, a dificuldade em de tratamentos adjuvantes de poliquimio- conciliar papéis e uma mudança nas prio- terapia e anticorpos monoclonais aumen- ridades da vida, excluindo a função exer- taram significativamente as taxas de so- cida” (SILVA; SANTOS, 2010, p.693). brevivência ao câncer. No entanto, ainda Em relação ao sexo feminino, o que essas drogas sejam desenvolvidas câncer mais comum é o de mama, em para erradicar as células tumorais, como que aproximadamente 1,3 milhões de não possuem especificidade, elas agridem mulheres no mundo são acometidas, a também os tecidos normais com intensa cada proliferação, ocasionando vários efeitos associada a vários fatores de risco, como colaterais e comprometendo a qualidade a menarca precoce, a menopausa tardia, ano. Esta malignidade C&D-Revista Eletrônica da Fainor, Vitória da Conquista, v.7, n.2, p.244-257, jul./dez. 2014 está 251 Qualidade de vida de pacientes oncológicos submetidos à quimioterapia a nuliparidade, o primeiro parto em idade 81% avançada, escolaridade e 85% renda mensal de até a exposição à radiação apresentaram idade da mulher, pois os casos de câncer principalmente de mama dobram a cada dez anos a mais aspectos vividos possuir certo viés, afinal o local de estudo menopausa. Também os Tais de 1 a mínimo. nível ionizante e, principalmente, o aumento da até salário baixo resultados, associados sociodemográficos, consiste a raça, por exemplo, a incidência do conveniada com câncer de mama é maior no ocidente que voluntários envolvidos no pacientes do sistema de saúde público Além disso, tem a predisposição genética que é responsável clínica podem influencia a variação geográfica, a etnia e oriente. numa aos o oncológica SUS, sendo na os pesquisa brasileiro. por 10% dos casos de câncer de mama Um estudo realizado em 2004 no (ROSA; RADUNZ, 2012). Neste estudo, o ambulatório da Associação de Combate câncer maior ao Câncer do Brasil Central destacou que frequência dentre as neoplasias, com a a fadiga relacionada ao câncer é um porcentagem de 29%. fenômeno de mama apresentou clínico, multifatorial e Quanto à situação conjugal, a mai- multidimensional (VENA et al., 2004). De oria dos pacientes era casado (58%). acordo com Vena e colaboradores (2004), Acreditamos que o casamento provavel- ainda não se tem uma metodologia mente influencia positivamente na recupe- padronizada ração do paciente, pois o companheiro relacionada ao câncer, e isso torna serve de apoio aos procedimentos reali- complexo comparar os resultados já zados, além do apoio emocional e social. encontrados nos estudos. No presente Segundo um estudo realizado em estudo, a para fadiga a fadiga avaliada pelo – C30 Uberaba-MG, em 2010, a incidência do questionário câncer é predominante na faixa etária apresentou média relativamente alta de acima dos 40 anos, baixo nível de 37,66, resultado semelhante ao de um escolaridade e mensal estudo realizado em Ribeirão Preto, em (ANDRADE; SAWADA; BARICHELLO, que a fadiga atingiu a média de 40 baixa renda EORTC medir 2013). Esses aspectos epidemiológicos (ANDRADE, também foram encontrados neste estudo, Andrade, Sawada e Barichello (2013), a em que 53% tinham mais de 40 anos, fadiga 252 está 2013). De QLQ acordo relacionada com com a C&D-Revista Eletrônica da Fainor, Vitória da Conquista, v.7, n.2, p.244-257, jul./dez. 2014 Gleicinara Botelho Públio, Kelle Oliveira Silva, Gustavo Freitas de Sousa Viana quimioterapia, radioterapia e as atividades perda de apetite com 50,71 (ANDRADE; diárias. As limitações do presente estudo, SAWADA; BARICHELLO, 2013). Através entretanto, não permitem afirmar qual a desses dados, foi possível concluir que causa principal da fadiga relatada pelos tais pacientes em questão. influência nas funções físicas, cognitivas e Para Campos e colaboradores sintomas provavelmente tiveram emocionais. Os resultados encontrados (2011), um dos efeitos predominantes no em tratamento quimioterápico é o FRC (fadiga relação, pois estes sintomas também relacionada ao câncer), visto que 50 a foram predominantes no nosso estudo: 90% dos indivíduos apresentam este perda de apetite com média de 41,64, sintoma, provocando alterações graves na seguida de insônia com 39,02 e fadiga capacidade com 37,66. funcional do indivíduo, diminuindo a sua qualidade de vida. É um nossa A pesquisa Análise endossam de essa Variância não sintoma comum, não muito reportado, demonstrou diferenças significativas na persistente, atribuído ao cansaço físico, qualidade de vida dos pacientes de emocional e cognitivo que perdura por acordo as variáveis sociodemográficas. meses ou anos após o tratamento; “em Todos os voluntários envolvidos nesta um estudo, um terço dos pacientes que pesquisa haviam câncer sido curados de câncer possuem e o estão diagnóstico em tratamento apresentam fadiga por 5 anos após o final quimioterápico, de seus tratamentos(CAMPOS et al., sabidamente 2011, p.212)”. qualidade de vida das pessoas, pois os Uma pesquisa realizada no Centro fármacos duas de podem variáveis comprometer antineoplásicos que a apresentam de Quimioterapia do Hospital de Clínicas toxicidade a qualquer tecido ou órgão com da Universidade Federal do Triângulo intensa proliferação celular, tanto em Mineiro (HC/UFTM) em 2010 apresentou células como resultado nas escalas de sintomas favorecendo o aparecimento dos efeitos do colaterais ou toxicidades do tratamento EORTC – significativamente QLQ C30 elevados valores de três sadias quimioterápico. quanto Desta de efeitos cancerosas, forma, a sintomas: fadiga com uma média de diversidade 64,57, insônia com 56,90, seguida de decorrentes do tratamento oncológico C&D-Revista Eletrônica da Fainor, Vitória da Conquista, v.7, n.2, p.244-257, jul./dez. 2014 colaterais 253 Qualidade de vida de pacientes oncológicos submetidos à quimioterapia pode diminuir a qualidade de vida do satisfatório. E, por fim, apresentou baixa paciente relacionada à saúde e bem estar pontuação (SAWADA et al., 2009). Sendo assim, saúde/qualidade de vida com média de acredita-se que o nosso resultado esteja 63,60, demonstrando que os pacientes coerente, afinal há grandes semelhanças consideram a sua qualidade de via não entre as muito boa, diferente do estudo realizado diferenças existentes entre eles não foi em Uberaba em 2010 que apresentou suficiente para demonstrar alterações como resultado na escala global de saúde significativas na qualidade de vida dos do EORTC – QLQ C30 uma média de pacientes em estudo. 82,38 os grupos De realizado acordo em Quimioterapia de com 2011 e forma um no na que estudo Centro de Enfermaria de para o estado geral (ANDRADE; de SAWADA; BARICHELLO, 2013). 5 CONCLUSÃO Hematologia do Hospital das Clínicas da Esta pesquisa possibilitou avaliar a Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto efeitos qualidade de vida de pacientes em podem tratamentos oncológicos. provocar prejuízos nas funções físicas, encontrados sugerem emocionais, cognitivas e sociais dos diagnóstico de câncer e o início do pacientes em tratamento. E as alterações tratamento nessas a associados a efeitos colaterais adversos, pacientes já provoca mudanças relevantes no estilo – USP (HCFMRP/USP), adversos da quimioterapia funções qualidade oncológicos de os comprometem vida dos (ANDRADE, 2013). Os de vida dados o próprio que quimioterápico, do Os paciente, principalmente resultados desse estudo corroboram com modificações essa associação, visto que, nas escalas emocionais de sintomas, perda de apetite, insônia, desconforto, da dor, da dependência e da fadiga e dor tiveram altas médias (41,64, perda 39,02, 37,66 e 31,14, respectivamente). comprometer a qualidade de vida das Em relação às funções física, social, pessoas. emocional e desempenho de papel, as Ao da físicas, geralmente em psicológicas consequência autoestima, relacionar que os e do podem dados médias atingiram variações entre 64,29 a sociodemográficos e clínicos com os 46,74, domínios de qualidade de vida não foi 254 retratando um nível pouco C&D-Revista Eletrônica da Fainor, Vitória da Conquista, v.7, n.2, p.244-257, jul./dez. 2014 Gleicinara Botelho Públio, Kelle Oliveira Silva, Gustavo Freitas de Sousa Viana encontrado diferença significante, todavia, estatisticamente esse estudo distúrbios de sono, fadiga, dor, função emocional, social e física. Conclui-se possibilitou identificar os sintomas que que o fato de o levam a um maior comprometimento da indivíduo passar pela fatal experiência de qualidade de vida desses pacientes em ter câncer e submeter-se à quimioterapia tratamentos quimioterápicos, dos quais se possibilita compreender o quanto os destacam: fraqueza, náusea, perda de pacientes têm sua qualidade de vida apetite, boca seca e baixa autoestima, prejudicada. Desta forma, os resultados para que no futuro realizem-se pesquisas encontrados nessa pesquisa fortalecem de fármacos com mecanismo de ação os mais específico, a fim de minimizar os mostrando a importância de estudos efeitos desse caráter que avaliam a influência adversos e tóxicos dos antineoplásicos. dos Os dados estatísticos desse estudo demostraram que os domínios de qualidade de vida relacionada à saúde dados presentes efeitos da na literatura, quimioterapia antineoplásica e da própria patologia na qualidade de vida relacionada à saúde dos pacientes oncológicos. mais afetados foram: perda de apetite, QUALITY OF LIFE OF PATIENTS UNDERGOING CHEMOTHERAPY ONCOLOGY ABSTRACT This is a descriptive cross-sectional study was conducted with the aim of it assessed the quality of life of cancer patients undergoing chemotherapy at a private clinic in Vitória da Conquista BA in partnership with the National Health System. After the release of the research ethics committee, data on 100 patients older than 18 years who were undergoing chemotherapy treat-ment in the period April-May 2014, through interviews were collected. For data collection, we used two instruments: a questionnaire with sociodemographic and clinical data and the European Organization for Research and Treatment of Cancer Quality of Life Questionnaire "Core" 30 items (EORTC-QLQ-C30), validated in Brazil. Data were ana-lysed using SPSS 20 and Excel 2010 software. The patients presented aged 21-88 years and describe two predominant symptoms: weakness and nausea 74% to 71%. The EORTC-QLQ-C30 showed the mean state of global health / quality of life 63.60, representing an unsatisfactory level. In symptom scales, the most common were: loss of appetite averaging 41.64, insomnia with 39.02, followed by fatigue with 37.66. These symptoms altered the physical, cognitive, social and emotional functioning C&D-Revista Eletrônica da Fainor, Vitória da Conquista, v.7, n.2, p.244-257, jul./dez. 2014 255 Qualidade de vida de pacientes oncológicos submetidos à quimioterapia of individuals, demonstrating that the side effects of chemotherapy compromise the quality of life of patients. Keywords: Cancer. Chemotherapy. Side effects. Quality of Life. REFERÊNCIAS AARONSON, N. K. et al.. The European Organisation for Research and Treatment of Cancer QLQ-C30: A quality-of-life instrument for use in international clinical trials in oncology. Journal of the National Cancer Institute, v.85, 365-376, 1993. CAMPOS, M. P. et al.. Fadiga relacionada ao câncer: uma revisão. Rev. Assoc. Med. Bras., v.57, n.2, p. 211-219, 2011. ANDRADE, V. Avaliação da qualidade de vida relacionada à saúde de pacientes onco-hematológicos em quimioterapia antineoplásica. 2013. 70 p. 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