Os cuidados que os olhos nos merecem

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Os cuidados que os olhos nos merecem
São verdadeiros acessórios de moda, mas devem
ser encarados como importantes protectores
solares. Os óculos de sol vendem-se às centenas,
mas raras são as vezes em que a qualidade da lente
funciona como ponderador maior de decisão.
À primeira manifestação de luz surge o gesto imediato de
colocar uns óculos de sol. Ficam bem ao rosto e sempre trazem
algum conforto aos olhos. No entanto, o modelo e o preço são
geralmente sobrevalorizados em relação à capacidade protectora das lentes. O problema é comum e agravou-se com a
proliferação de lojas que comercializam modelos para todos
os gostos e carteiras, mas que não obedecem a quaisquer
padrões de qualidade e de rigor oftalmológicos. A questão assume dimensões ainda mais gravosas se considerarmos que a
sua utilização pode implicar efeitos nocivos, superiores à decisão de andarmos no dia-a-dia sem óculos de sol. O alerta
é lançado por Salgado Borges, oftalmologista, que lembra a
existência de determinados grupos de risco, designadamente
as pessoas idosas e as crianças, que requerem precauções
acrescidas. A explicação é simples e de ordem clínica. Tomando
os mais pequenos como exemplo demonstrativo, diz Salgado
Borges que, “por volta dos 3-4 anos de idade, o cristalino – a
lente dos nossos olhos -, não tem capacidade para filtrar a
radiação ultravioleta, pelo que é fundamental a protecção
com óculos de sol adequados, além do também importante
recurso a chapéus ou bonés, capazes de aumentar a área de
protecção”.
Mas há outros segmentos da população que, por um conjunto de factores, precisam de ter uma atenção especial no
momento da aquisição de uns óculos de sol, cujas lentes devem necessariamente absorver 99% a 100% da luz ultravioleta,
tanto a UV-A como a UV-B. Salgado Borges refere, a propósito,
“as pessoas que vivem junto à praia - local onde se verifica
um maior reflexo do sol sobre a água e a areia ,- e que estão
mais predispostas a lesões na retina”. Isto porque, prossegue
o especialista, “há diversos trabalhos que sustentam que a
exposição prolongada e cumulativa dos indivíduos às radiações UV aumenta a susceptibilidade à Degenerescência
Macular relacionada com a Idade, ou DMI”, uma doença que
atinge principalmente pessoas com idades superiores a 55
Salgado Borges
anos, e que resulta do envelhecimento da mácula, a zona mais
sensível da retina.
Um desses estudos foi realizado nos Estados Unidos da
América e demonstrou que as populações de pescadores têm
uma predisposição maior para desenvolverem a DMI do que os
restantes indivíduos. Na mesma linha de orientação, há investigações em Portugal que evidenciam uma menor tendência,
entre as populações rurais, para apresentarem aquela patologia.
Antioxidantes protegem a retina
Além dos factores de ordem ambiental, e que demandam
a correcta prescrição de uns óculos especiais de protecção,
também a alimentação é fundamental para atrasar ou reduzir
a gravidade da DMI. Salgado Borges aconselha a adopção de
uma “dieta equilibrada, o consumo de suplementos com
acção antioxidante - caso da luteína -, e a ingestão de vitaminas, entre elas a C, pois são elementos capazes de prote-
ger a retina dos efeitos nocivos dos raios ultravioleta”. Mas a
DMI não é o único problema resultante da exposição prolongada à luz UV, pois são vários os relatos de outras doenças a
nível dos olhos. Salgado Borges destaca o “desenvolvimento
de tumores da pele que circunda o olho e do melanoma intra-ocular, situações que têm sido ultimamente associadas
à influência da radiação ultravioleta”. O oftalmologista refere,
ainda, “os riscos em que incorrem os pacientes submetidos a
cirurgias às cataratas, uma vez que, depois de retirado o cristalino, se as lentes intra-oculares não tiverem protecção ad-
Autorefractometro
Topografia corneana
equada com os filtros ultravioletas, o perigo é bem maior”.
No entanto, se a qualidade da lente é uma exigência a não
descurar, já a cor constitui um elemento de menor importância, obedecendo quase exclusivamente a critérios de gosto
pessoal. Apenas a ressalva, diz Salgado Borges, para “os óculos demasiado escuros, que não significam necessariamente
maior protecção para os olhos. A sensação de conforto e de
segurança é falsa, pois há uma maior dilatação da pupila e
um aumento significativo de percentagem de radiação UV,
que não é filtrada adequadamente.” Ainda no plano das cores,
há quem prefira a utilização de óculos fotocromáticos passíveis
de conferirem, a quem os usa, maior comodidade e bem-estar,
porque escurecem e aclareiam em função da intensidade da
luz. Mas mais importante do que tudo isto, sublinha Salgado
Borges, é perceber que cada pessoa tem necessidades específicas, dependentes da sua condição ocular, pelo que “deverão
consultar um oftalmologista para um rastreio visual periódico, pois há certas patologias, como por exemplo a retinite
pigmentar, que demandam lentes com propriedades particulares”. Depois, adianta o especialista, “a melhor garantia é
o recurso a estabelecimentos, reconhecidos e credenciados,
que operam sob um rigoroso controlo de qualidade, optando por óculos capazes de reunir, não só as características ópticas ideais, como também as características adequadas de
protecção ultravioleta.”
Prevenção é o melhor remédio
O rastreio oftalmológico a crianças pode ajudar a prevenir
patologias oculares na idade adulta. A afirmação não oferece
dúvidas e, por isso, o Serviço de Oftalmologia do Hospital de
São Sebastião - dirigido por Salgado Borges -, e a Câmara Municipal de Santa Maria da Feira implementaram, em 2001, um
projecto cujo objectivo é a detecção de factores passíveis de
provocarem graves problemas visuais, como a cegueira e a ambliopia. A iniciativa, coordenada pela oftalmologista Madalena
Monteiro, foi destinada, numa fase inicial, a crianças entre os
3 e os 5 anos de idade. Um período fundamental, afiança Salgado Borges, pois “se a criança não desenvolve a sua visão até
esta altura, nunca mais o fará”. Em 2005, as acções de rastreio
pediátrico estenderam-se, igualmente, a crianças com 1 ano de
idade, num claro respeito pelo valor inequívoco da prevenção
primária, também defendido pelo Programa Nacional de Saúde
da Visão. Rotativamente, os alunos das escolas do município
foram observados por uma equipa formada por um oftalmologista, uma técnica de ortóptica e uma enfermeira, que diagnosticaram patologias e encaminharam os casos com alterações
para tratamento adequado. Segundo Salgado Borges, até ao
momento “já foram rastreadas mais de 10 mil crianças, sendo
que 7 por cento apresentaram suspeitas de patologia”. O projecto, garante Salgado Borges, é “inovador e foi recentemente
galardoado pelo Lions Club dos Estados Unidos da América
como um dos trabalhos de mérito executado a nível internacional”.
O rastreio pediátrico vai continuar, assegura o especialista,
“porque a detecção precoce de alterações oculares permite
que a criança cresça saudável e consiga ter uma vida normal”. E como se pretende que a medicina preventiva ganhe
Patologias do olho
terreno à correctiva, convém colocar em evidência os principais momentos que pedem um exame oftalmológico. De acordo com Salgado Borges, “todos os indivíduos precisam de ser
consultados esporadicamente, consoante as características
que reúnam e a altura da vida em que se encontram, sendo
certo que o aparecimento de sintomas visuais e a presença
de uma história familiar positiva obrigam a uma consulta de
José Salgado Borges, doutorado em Oftalmologia, no
ano de 1990, pela Faculdade de Medicina do Porto, recebeunos nas modernas e acolhedoras instalações da sua Clínica
Oftalmológica, localizada junto ao Jardim de S. Lázaro, no
centro histórico da cidade do Porto. Embora preparada para
todo o tipo de avaliações e de tratamentos oftalmológicos, a
clínica dedica-se, essencialmente, a patologias do segmento
anterior, designadamente as patologias da córnea – médica
e cirúrgica -, catarata e glaucoma, entre outros problemas
oculares. Uma das práticas mais comuns consiste na realização
de cirurgias refractivas a laser, uma operação que permite a
correcção dos erros refractivos, como a miopia, a hipermetropia
e o astigmatismo. Um procedimento que, segundo Salgado
Borges, está “a ganhar cada vez mais adeptos entre os jovens,
ansiosos por poderem deixar de usar óculos ou lentes de
contacto”.
Oftalmologia assim que possível”. Mas porque os exemplos
simplificam a compreensão, diz Salgado Borges que “nenhuma criança devia entrar para a escola sem uma avaliação
oftalmológica prévia, bem como um jovem entre os 15 e os
17 anos, ou seja, antes de atingir a idade adulta”. Por outro
lado, prossegue o especialista, “um indivíduo adulto, ainda
que sem queixas, deve fazer um exame oftalmológico, pelo
menos de quatro em quatro anos, de forma a serem prevenidas doenças oculares que, se identificadas atempadamente,
podem ser corrigidas ou os seus efeitos retardados”. Obviamente, este espaçamento entre consultas é menor se houver
uma predisposição genética para patologias oftalmológicas,
como é o caso do glaucoma, uma doença do nervo óptico susceptível de provocar a perda de visão e que, segundo Salgado
Borges, é “um dos problemas mais importantes do ponto de
vista da urgência de tratamento”. Entre as doenças de maior
incidência, destacam-se, ainda, a catarata - embora resolúvel
por meio de cirurgia -, a Degenerescência Macular e a diabetes ocular, uma das principais causas da cegueira, em Portugal.
Um grupo de patologias, diz Salgado Borges, “com relação directa à idade, pelo que a tendência para a sua diminuição é
pouco provável, tendo em conta o aumento da esperança
de vida”. O que será garantidamente melhor, afiança Salgado
Borges, “é a forma de tratamento destes problemas, graças
aos trabalhos de investigação efectuados na área e aos consequentes avanços na oftalmologia”. Também os desenvolvi-
Anéis intra-estromais no Ceratocone
mentos alcançados no campo da genética, prossegue o especialista, “poderão trazer no futuro soluções para o controlo
e prevenção de uma série de patologias de predisposição
hereditária. Provavelmente aí será possível evitar doenças
que agora são inevitáveis”.
A importância da lubrificação dos olhos
Ainda sobre problemas oftalmológicos, Salgado Borges
destaca o ceratocone, uma patologia ocular, que afecta a forma
da córnea, provocando a percepção de imagens distorcidas, e
que surge geralmente nos jovens antes dos 30 anos: “Tratase de uma patologia de que pouco se falava, até há algum
tempo atrás, e que se torna, muitas vezes, incapacitante.
Actualmente, há uma técnica inovadora, passível de retardar
a evolução da doença – o “cross-linking” -, que, embora não
reúna consenso quanto à sua aplicação, está já a ser utilizada
em diversos países, associada a outras abordagens terapêuticas, tais como a introdução de anéis corneanos intra-estromais, e que será, na minha perspectiva, um dos tratamentos
do futuro dos doentes com ceratocone”.
E para remate dos problemas visuais - e porque são muitas
as horas que passamos em frente aos ecrãs -, Salgado Borges
deixa alguns conselhos para diminuir o cansaço ocular: “Em
primeiro lugar, é fundamental que o ambiente seja o menos
poluído possível e que a iluminação do local se faça de forma
adequada. Também devemos privilegiar uma postura correcta, proceder a intervalos regulares de descanso (de 20
em 20 minutos), e pestanejar os olhos, com frequência, no
sentido de lubrificá-los e de prevenir a sua secura. Para isso,
e porque a lubrificação é fundamental, existem lágrimas artificiais, que proporcionam um maior conforto e melhoram o
próprio desempenho dos olhos”. De resto, acrescenta Salgado
Borges, “a saúde visual pode ser assegurada se as pessoas
seguirem as recomendações dos médicos oftalmologistas,
só eles capazes de orientar o paciente, em tempo útil, para
a execução correcta de terapêuticas com vista a prevenir o
aparecimento de problemas maiores, que levam à cegueira.
Para tal é fundamental que as pessoas comecem a encarar
os exames oftalmológicos como parte integrante das avaliações médicas de rotina. Quando esta mensagem estiver
assimilada, a saúde ocular em Portugal vai melhorar muito”.
Campos visuais
Cirurgia refractiva nos dias de hoje
A cirurgia refractiva compreende um conjunto de
procedimentos que, de alguma forma, vai libertar o paciente
da utilização de óculos ou de lentes de contacto. A técnica mais
aplicada continua a ser a do LASIK, um dos avanços tecnológicos
de maior significado na área da oftalmologia. Regra geral, a
cirurgia refractiva é realizada em indivíduos com idades que
se estendem dos 20 aos 40-45 anos, estando particularmente
indicada para situações de miopia, até 7 dioptrias, e para casos
de hipermetropia e de astigmatismo, até 4. Através do LASIK é
ainda possível corrigir erros esféricos e cilíndricos residuais, após
a cirurgia de catarata. Estes tratamentos personalizados de que
actualmente dispomos permitem, em circunstâncias específicas
e seleccionadas, garantir uma melhoria significativa da qualidade
da visão.
O primeiro aspecto a considerar é o da necessidade de
informar o candidato a cirurgia refractiva acerca das expectativas
que guarda em relação à operação. Segue-se o gesto obrigatório
de proceder a um estudo rigoroso e completo das características
morfo-funcionais dos olhos para detecção de eventuais situações
que contra-indiquem este tipo de cirurgia, designadamente o
ceratocone. Se estes elementos se conjugarem, os resultados
são, em mais de 95 por cento dos casos, excelentes. Outra das
vantagens do LASIK é o facto de se tratar de uma técnica que,
além de não requerer internamento, dispensa a anestesia geral e
permite, decorridas 24 horas, uma visão muito boa.
No entanto, quando as córneas são demasiado finas há
a indicação de procedimentos que, embora realizados com
recurso ao mesmo aparelho que efectua o LASIK, vão actuar
sobre a superfície - e não após o rebatimento de uma camada
da córnea -, diminuindo assim a potencial fragilidade induzida
por aquela técnica cirúrgica. Como alternativa, nos casos em
que o LASIK está contra-indicado, existem actualmente as lentes
intra-oculares fáquicas, capazes de corrigirem erros refractivos
esféricos elevados, e também susceptíveis de apresentarem
resultados ópticos excelentes, quando aplicadas em doentes
devidamente seleccionados.
Hoje em dia, é também usual a colocação de uma lente intraocular, no decurso da cirurgia da catarata, evitando os óculos com
lentes muito espessas, frequentes em tempos passados. Assim,
as lentes intra-oculares multifocais de que agora dispomos,
permitem a correcção da visão intermédia e de perto. Por seu
turno, e apesar de merecer controvérsia e discussão, a técnica
que é utilizada nos doentes com catarata pode ser também um
método opcional de cirurgia refractiva para indivíduos acima dos
50-55 anos, sem catarata ou com catarata incipiente, desde que a
selecção dos candidatos se faça de maneira criteriosa e cuidada.
Felizmente, todas estas técnicas são hoje uma possibilidade
real entre nós, o que dispensa, em absoluto, o recurso a centros
fora do país.
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