FACULDADES ITECNE DE CASCAVEL RONISE CUSTÓDIO FIDELI CÂNCER BUCAL: FATORES DE RISCO E PROGRAMAS DE PREVENÇÃO CURITIBA 2010 RONISE CUSTÓDIO FIDELI CÂNCER BUCAL: FATORES DE RISCO E PROGRAMAS DE PREVENÇÃO Monografia apresentada como requisito parcial à obtenção do grau de Especialista no Curso de Pós-Graduação lato sensu em Gestão em Saúde Pública das Faculdades ITECNE de Cascavel. Orientadora: Profª Dra. Ana Maria Dyniewicz CURITIBA 2010 TERMO DE APROVAÇÃO RONISE CUSTÓDIO FIDELI CÂNCER BUCAL: FATORES DE RISCO E PROGRAMAS DE PREVENÇÃO Monografia apresentada às Faculdades ITECNE de Cascavel como requisito parcial para obtenção do grau de Especialista no Curso de Pós-Graduação lato sensu em Gestão em Saúde Pública. AVALIAÇÃO CONCEITO: ___________ PARECER DO ORIENTADOR: ___________________________________________________________________ ___________________________________________________________________ ___________________________________________________________________ ___________________________________________________________________ ___________________________________________________________________ ___________________________________________________________________ Orientação: _______________________________________ Profª Dra. Ana Maria Dyniewicz CURITIBA 2010 DEDICATÓRIA Dedico este trabalho à minha família, em especial aos meus filhos Camila e Leonardo, que são a razão do meu viver, aos meus pais Sireli e Tereza, que me encaminharam na trilha do saber, às minhas irmãs Gislaine e Patrícia e meu marido Antonio, que me incentivaram a procurar e alcançar esta vitória. AGRADECIMENTOS Primeiramente agradeço a Deus, pela saúde e sabedoria. Aos meus familiares e marido, um agradecimento especial pela compreensão e apoio nos meus momentos de ausência, para que eu pudesse realizar esse estudo. À professora Ana Maria Dyniewicz pela orientação e por me conduzir a desempenhar da melhor maneira a execução do meu estudo. À Dra. Sibele Pereira de Oliveira, uma das especialistas na área de lesões de boca do CEO Sylvio Gevaerd, pelo apoio e orientação. Aos profissionais da Secretaria Municipal de Saúde de Curitiba, em especial à Dra. Lise Mara Villani Souza, Dra Cintia Laporte e Dr. Mário Augusto Gori Gomes, que gentilmente me forneceram dados para enriquecer minha monografia. Ao Dr. Laurindo Moacir Sassi, exemplo de dedicação à causa da prevenção do câncer bucal. À Dra. Tânia Mara de Sá Belotto, Autoridade Sanitária do Centro de Especialidades Odontológicas (CEO) Sylvio Gevaerd, pela disposição em atender aos meus objetivos sobre o fluxo de atendimento na área de estomatologia. Ao Dr. Shozo Miyaki, um dos precursores do Centro de Diagnóstico de Lesões Bucais da Secretaria Municipal de Saúde de Curitiba. À Autoridade Sanitária Local da UMS Pantanal, Maria Midori Komiyama, por me permitir a pesquisa sobre o tema apresentado. À Prefeitura Municipal de Curitiba pela oportunidade de frequentar o curso, e assimilar novos conhecimentos para aprimorar meu trabalho. SUMÁRIO 1. INTRODUÇÃO ......................................................................................................09 2. METODOLOGIA ...................................................................................................10 3. CÂNCER BUCAL .................................................................................................10 4. EPIDEMIOLOGIA DO CÂNCER BUCAL .............................................................12 5. PRINCIPAIS FATORES DE RISCO PARA O CÂNCER BUCAL.........................15 5.1 FUMO..................................................................................................................15 5.2 ÁLCOOL.............................................................................................................17 5.3 EXPOSIÇÃO SOLAR .........................................................................................19 5.4 CHIMARRÃO .....................................................................................................19 5.5 FATORES IRRITANTES ....................................................................................21 6. FATORES SÓCIO-ECONÔMICOS ASSOCIADOS AO CÂNCER BUCAL..........21 7. PROGRAMA NACIONAL DE PREVENÇÃO DO CÂNCER BUCAL ...................25 8. POLÍTICA PÚBLICA DE DETECÇÃO PRECOCE E PREVENÇÃO DO CÂNCER BUCAL DO MUNICÍPIO DE CURITIBA ...................................................................27 9. PROGRAMAS DE PREVENÇÃO DO CÂNCER BUCAL DE OUTRAS LOCALIDADES DO BRASIL....................................................................................31 10. DISCUSSÃO .......................................................................................................33 11. CONCLUSÃO ....................................................................................................34 REFERÊNCIAS .........................................................................................................35 LISTA DE ILUSTRAÇÕES TABELA 1 – ESTIMATIVA PARA O ANO DE 2010 DOS CASOS NOVOS DE CÂNCER, SEGUNDO LOCALIZAÇÃO PRIMÁRIA, ENTRE HOMENS E MULHERES, NO BRASIL .........................................................................................13 GRÁFICO 1 – DISTRIBUIÇÃO DO PERCENTUAL DOS ÓBITOS POR CÂNCER BUCAL COMPARADO AO NÚMERO TOTAL DE ÓBITOS POR NEOPLASIAS. CURITIBA 1996-2008 ...............................................................................................14 GRÁFICO 2 – PERCENTUAL DOS ÓBITOS POR NEOPLASIAS DE BOCA SEGUNDO SEXO – CURITIBA – 1996-2008............................................................15 FIGURA 1 – FLUXOGRAMA DE ATENDIMENTO PARA PACIENTES COM LESÃO DE BOCA– CURITIBA – 2009...................................................................................31 LISTA DE ABREVIATURAS APS - Atenção Primária em Saúde ASB - Auxiliar de Saúde Bucal CBS - Coordenação do Programa de Saúde Bucal / Cárie Zero CD - Cirurgião-Dentista CEC - Carcinoma Espinocelular CEO - Centro de Especialidades Odontológicas CIS - Centro de Informação em Saúde CMCE - Central de Marcação de Consultas Especializadas HCMT - Hospital de Câncer do Mato Grosso HEG - Hospital Erasto Gaertner HPA - Hidrocarboneto Policíclico Aromático INCA - Instituto Nacional de Câncer MS - Ministério da Saúde OMS - Organização Mundial de Saúde SMS - Secretaria Municipal de Saúde SUS - Sistema Único de Saúde TSB - Técnica em Saúde Bucal UMS - Unidade Municipal de Saúde RESUMO O câncer bucal é um grave problema de saúde pública mundial pois constitui uma causa comum de morbidade e mortalidade, apesar de existirem métodos eficazes para sua prevenção. Um grande número de casos ainda são confirmados em estágio avançado, necessitando de um tratamento doloroso e prolongado. O presente trabalho consiste em uma revisão da literatura com o objetivo de relacionar os fatores mais comuns e as desigualdades sociais, com o desenvolvimento das neoplasias bucais, e analisar os Programas de Prevenção do Câncer de Boca Nacional, de Curitiba e de outras localidades do Brasil. Através deste estudo, foi verificado que as diferenças sócio-econômicas têm reflexos no perfil epidemiológico deste tumor. Fatores como tabaco e álcool, em homens com idade superior a 40 anos, são relevantes para o desenvolvimento da neoplasia. Outros fatores como baixa renda e escolaridade, ocupação com exposição a produtos oncogênicos, dieta deficiente de nutrientes, precária higiene oral, consumo de chimarrão e traumas bucais, quando associados a tabaco e álcool, tem grande relação com o surgimento do agravo. No Brasil, o Programa Brasil Sorridente foi criado para ampliar e possibilitar o diagnóstico precoce do câncer de boca. Em Curitiba, medidas de prevenção do câncer bucal são realizadas há mais de 10 anos através de campanhas e ações coletivas nas Unidades de Saúde, tendo no Programa de Prevenção e Detecção Precoce de Lesões Bucais uma atenção maior a este tipo de doença. Várzea Grande, no Estado do Mato Grosso e Recife também tiveram um Programa de Prevenção do Câncer Bucal. Palavras chaves: Câncer bucal; Fatores de risco; Condições sócio-econômicas; Programas de Prevenção do Câncer Bucal. 9 1. INTRODUÇÃO O câncer é uma enfermidade com origem multifatorial, caracterizada por um crescimento desordenado de células que podem se disseminar para regiões do corpo além do local da lesão inicial. Anualmente são diagnosticados cerca de 6,4 milhões de casos de tumores malignos no mundo. Acredita-se que a natureza silenciosa das lesões e o atraso no diagnóstico são fatores importantes para o alto índice de doença avançada (SILVA et al., 2009). Há vários fatores que podem predispor o desenvolvimento do câncer bucal. Além dos fatores relativos ao hospedeiro (idade, sexo, raça, herança genética, estado nutricional e de saúde geral), há os fatores extrínsecos como o ambiente de consumo (alimentos, medicamentos), o ambiente ocupacional (ação de produtos químicos), o ambiente cultural (estilo e hábitos de vida como tabaco e álcool), além do sócio-econòmico (renda, moradia, escolaridade) (MURARA, BISINELLI e ORLANDI, 2009). Apesar da origem multifatorial do câncer, alguns trabalhos relataram que esta doença é mais frequente em homens que mulheres, na faixa etária em torno de 40 anos, fumantes e consumidores de bebida alcoólica, apesar deste quadro estar se alterando devido ao aumento do número de mulheres tabagistas e etilistas (SILVESTRE e JERONYMO, 2007). Na maioria dos estudos, os indivíduos que desenvolvem câncer de boca têm uma história de vida marcada por baixas condições sócio-econômicas e baixa escolaridade, tendência à exposição a fatores de risco como o hábito de fumar e de ingerir bebida alcoólica, bem como precário estado de saúde bucal e carências nutricionais (BORGES et al., 2009). A associação câncer bucal e privação sócio-econômica é um assunto de grande importância para a saúde pública pois é a classe socialmente desprivilegiada que é a usuária do Sistema Único de Saúde (SUS), na sua grande maioria, e a que tem mais dificuldade de acesso aos serviços adequados. Neste trabalho serão relatados os principais fatores de risco conhecidos mundialmente para o desenvolvimento do câncer bucal e relacionar alguns destes e outros fatores com as condições sócio-econômicas. Também será analisado o 10 Programa de Prevenção do Câncer Bucal Nacional, de algumas localidades do Brasil e mais detalhadamente do município de Curitiba. Conhecendo como se comportam as neoplasias bucais na população, é possível contribuir para o planejamento de uma política pública resolutiva, através de programas de prevenção que além de alertar, possam também sensibilizar a população sobre o assunto e permitir uma mudança de hábitos e diminuição da exposição aos fatores de risco para o câncer bucal. 2. METODOLOGIA Este trabalho consiste em uma pesquisa de revisão da literatura, sobre o tema Câncer Bucal e Programas de Prevenção. Foi realizada por meio de consulta em livros, periódicos nacionais e internacionais, nas bases de dados SCIELO, BVS, MEDLINE, Google Acadêmico, site do Ministério da Saúde (MS) e do Instituto Nacional do Câncer (INCA), bem como em manuais e protocolos da Prefeitura Municipal de Curitiba. Os artigos selecionados tiveram sua publicação entre 2005 e 2010 e as informações da literatura anteriores a 2005 foram utilizadas quando consideradas apropriadas ao desenvolvimento desta monografia. 3. CÂNCER BUCAL A história natural do câncer bucal sofre a interferência de vários fatores, que não são uniformes para todos os indivíduos, e que estão relacionados ao tempo e tipo de exposição aos determinantes da doença, aos fatores genéticos e condições psicológicas e sociais que criam o ambiente onde se passa a ação (CARVALHO, 1997). A palavra câncer tem origem no latim, cujo significado é caranguejo. Este nome foi adotado porque as células doentes atacam e se infiltram nas células sadias assim como os movimentos dos tentáculos desse crustáceo (ONCOGUIA, 2010). O câncer é descrito como um processo crônico que se desenvolve em várias etapas e é caracterizado por um crescimento desordenado de células que invadem 11 tecidos e órgãos. Estas células, quando se dividem rapidamente, tendem a ser muito agressivas e incontroláveis, formando tumores malignos que podem se disseminar para outras regiões do corpo, processo este denominado de metástase (BRASIL, 2010a). O câncer de boca pode se originar nos lábios, sendo mais comum no lábio inferior, e também na cavidade oral (gengiva, mucosa jugal, palato duro, língua, assoalho da boca e amígdalas). Alguns autores consideram também a faringe como local para o aparecimento do câncer bucal, face à dificuldade de localização da lesão nesta região, no início da doença (BRASIL, 2010g). Segundo os estudos, o carcinoma espinocelular (CEC) ou carcinoma de células escamosas é a neoplasia maligna que ocorre em 90% dos casos entre os vários tipos de câncer que afetam a boca (AUGUSTO, 2007). Os principais sinais que podem indicar um câncer de boca são feridas que não cicatrizam, ulcerações superficiais de 2 cm de diâmetro e indolores que podem sangrar ou não, manchas brancas ou avermelhadas, dor ou desconforto à mastigação e deglutição, dificuldade na fala, emagrecimento acentuado e dor ou presença de linfadenomegalia cervical (BRASIL, 2003). É importante lembrar o fato de muitas lesões serem assintomáticas no início do desenvolvimento, necessitando, o profissional, atentar para a história clínica do paciente e pela busca de lesões suspeitas, principalmente aquelas com maior potencial para a cancerização, como as leucoplasias (lesões brancas), as eritroplasias (lesões avermelhadas), e a queilite actínica (DIAS et al., 2006). Existem basicamente três modalidades de tratamento para as neoplasias malignas bucais: cirurgia e radioterapia (usadas na maioria dos tumores) e a quimioterapia, usada como tratamento paliativo em tumores avançados (SPARA et al., 2005). Segundo Dias et al. (2006), em todo o país, o câncer bucal toma características alarmantes com a clara inexistência de políticas públicas de saúde que contemplem a coletividade integralmente e em todas as fases de prevenção, diagnóstico e tratamento da doença. A reabilitação, quando necessária após procedimentos cirúrgicos, geralmente é deixada em segundo comprometendo-se, assim, a qualidade de vida do paciente operado. plano, 12 A demora e a dificuldade no reconhecimento dos principais sinais e sintomas da doença está entre os principais motivos de atraso do paciente ao tratamento e nessa etapa são necessárias políticas de saúde com capacitação dos cirurgiõesdentistas para a detecção precoce da lesão cancerizável, bem como a educação coletiva da população acerca dos fatores de risco, sinais e sintomas comuns da doença e a importância do autoexame bucal (SILVA et al., 2009). Em um trabalho realizado por Sassi et al. (2005), das 6544 pessoas de vinte cidades do Paraná examinadas, desde 1989 até 2004, 20,4% nunca tinham ouvido falar sobre prevenção de câncer bucal. 4. EPIDEMIOLOGIA DO CÂNCER BUCAL As doenças crônico-degenerativas representam um problema de saúde pública, e, entre elas, o câncer ocupa o segundo lugar como doença que mais causa morte em todo o mundo, ficando atrás somente das doenças do aparelho circulatório (SPARA et al., 2005). A Organização Mundial de Saúde (OMS) estima que até 2020 surgirão 15 milhões de novos casos de câncer no mundo, sendo que 60% destes casos ocorrerão em regiões do mundo menos desenvolvidas, em países que possuem menos que 5% de recursos para o controle do câncer (OLIVEIRA et al., 2008). Os cânceres de cabeça e pescoço representam 10% de todos os tumores malignos do mundo; destes, 40% estão localizados na cavidade bucal. Dos cânceres de boca, 53,4% são diagnosticados nas fases mais tardias (estágios III e IV) e 30,5% resultam em morte (CURITIBA, 2009a). A incidência de câncer de boca varia de país para país. Ele é muito mais comum na França, Hungria e Índia, por exemplo, do que nos Estados Unidos, e muito mais raro no México e no Japão (HOSPITAL A.C.CAMARGO, 2010b). Biazevic e Antunes (2006) relataram que na Índia há uma incidência elevada do câncer de boca, apontando o hábito de mascar tabaco como o principal fator de risco à doença, muito comum nesta região. Segundo Wünsch Filho et al. (2008), o Brasil é o segundo maior produtor mundial de tabaco em folha (14,1% da produção mundial), atrás somente da China, 13 e é o terceiro país no mundo com maior incidência de câncer bucal (SOCIEDADE BRASILEIRA DE CIRURGIA DE CABEÇA E PESCOÇO, 2010). Conforme referiram Andreotti et al. (2006), o Brasil possui a mais alta incidência da doença na América Latina, mas com grandes variações por regiões geográficas do país. Além disso, o diagnóstico da patologia no Brasil é, em geral, realizado mais tardiamente que nos países desenvolvidos. A tabela 1 mostra a estimativa, segundo o INCA (Instituto Nacional de Câncer), das principais neoplasias, para o ano de 2010 no Brasil. Note-se que o câncer de cavidade oral ocupa a quinta posição entre os homens e a sétima posição entre as mulheres (BRASIL, 2010b). TABELA 1 – NÚMERO DE NOVOS CASOS DE CÂNCER NO BRASIL ENTRE HOMENS E MULHERES (ESTIMATIVA PARA 2010). HOMENS Neoplasia maligna 1º Próstata 2º Traqueia, brônquios, pulmão 3º Estômago 4º Colon e reto 5º Cavidade Oral 6º Esôfago 7º Leucemia 8º Pele melanoma ************************************* Outras localizações Subtotal Pele não melanoma Todas as neoplasias Fonte: INCA-BRASIL (2010b) N° Casos Novos MULHERES Neoplasia maligna N° Casos Novos 52.350 1º Mama feminina 49.240 17.800 13.820 13.310 10.330 7.890 5.240 2.960 2º Colo do útero 18.430 14.800 9.830 7.680 4.340 3.790 2.970 2.740 78.770 192.590 60.440 253.030 59.130 182.830 53.410 236.240 3º Colon e reto 4º Traqueia, brônquios, pulmão 5º Estômago 6º Leucemias 7º Cavidade Oral 8º Pele melanoma 9º Esôfago Outras localizações Subtotal Pele não melanoma Todas as neoplasias Wünsch Filho et al. (2008) descreveram que as neoplasias de cavidade oral, associadas ao uso de tabaco, apresentam incidência mais alta no Centro-Oeste, Sudeste e Sul do Brasil, pois são regiões mais industrializadas e com maior prevalência de tabagismo. Atualmente Porto Alegre é a capital brasileira com maior consumo de tabaco (25,2%), sendo Rio Grande do Sul o estado responsável por cerca de 50% da produção nacional do produto. As taxas de incidência e mortalidade por câncer bucal em São Paulo e Porto Alegre só perdem para algumas 14 regiões da Índia. A cidade de São Paulo registra isoladamente a mais alta incidência de câncer oral no Brasil e na América Latina (AUGUSTO, 2007; MARCHIONI et al., 2007). Entre os anos de 2007 e 2008 o câncer de boca foi a 10ª causa de morte por câncer, entre os homens, e a 36ª, entre as mulheres de Curitiba, acometendo, então, 3,6 homens para cada mulher. No ano de 2007 representou 2,1 % do total de óbitos por neoplasias nesta cidade, conforme o gráfico 1, que mostra a distribuição percentual dos óbitos por câncer bucal desde 1996 (CURITIBA, 2009a,c). GRÁFICO 1 - DISTRIBUIÇÃO PERCENTUAL DOS ÓBITOS POR CÂNCER BUCAL COMPARADO AO NÚMERO TOTAL DE ÓBITOS POR NEOPLASIAS. CURITIBA - 1996-2008 3,0 2,6 2,5 2,0 2,3 2,2 2,2 2,1 2,1 2,1 1,9 1,8 1,7 1,5 1,9 1,5 1,5 1,2 1,0 0,5 20 08 M éd ia 20 07 20 06 20 05 20 04 20 03 20 02 20 01 20 00 19 99 19 98 19 97 19 96 0,0 Fonte: CURITIBA (2009a). Dados obtidos para a cidade de Curitiba mostram que o órgão da boca mais afetado pelo câncer de cavidade oral e responsável pelo maior número de óbitos por neoplasia é a língua, e a estimativa do número de casos novos da doença para homens, em 2010, é de 160, enquanto que para mulheres é de 40 casos (CURITIBA, 2009a; BRASIL, 2010o). De acordo com Dias et al. (2006), o câncer de lábio também assume importância, uma vez que a prática de atividades rurais, onde os trabalhadores expõem-se em demasiado à luz solar, é muito frequente. O número de casos de neoplasias bucais atendidos entre 1998 e 2004 em Curitiba, com faixa etária de 50 a 69 anos se assemelha ao observado nos casos de mortalidade no mesmo período, que atingiu com maior frequência indivíduos entre 15 40 e 79 anos. Este dado está de acordo com dados do INCA, que relata a idade superior a 40 anos como um dos fatores de risco para o câncer de boca (CURITIBA, 2009a). Em relação ao sexo, o percentual de óbitos no sexo masculino mostrou-se expressivo em todos os anos analisados, como aparece no gráfico 2, sugerindo que homens expõem-se com maior frequência aos fatores de risco da doença (CURITIBA, 2009a). GRÁFICO 2. PERCENTUAL DOS ÓBITOS POR NEOPLASIAS DE BOCA SEGUNDO SEXO. CURITIBA - 1996 A 2008. 100 % 80 84,8 94,6 89,7 79,2 75,5 85,2 75,6 81,8 87,5 92,3 90,5 81 84,0 74,1 60 Masc 40 20 15,2 20,8 10,3 Fem 25,9 24,4 24,5 14,8 18,2 19 12,5 5,4 7,7 9,5 16,0 19 96 19 97 19 98 19 99 20 00 20 01 20 02 20 03 20 04 20 05 20 06 20 07 20 08 M É DI A 0 Fonte: CURITIBA (2009a) O diagnóstico precoce do câncer bucal é de vital importância para um bom prognóstico. Se tratado na fase inicial, a expectativa de cura é de 80 a 100%. No entanto, a proporção de diagnóstico em fase inicial é de apenas 10% dos casos e nos cânceres de língua, esta taxa cai para 5% (CURITIBA, 2009b). 5. PRINCIPAIS FATORES DE RISCO PARA O CÂNCER BUCAL 5.1 FUMO O tabagismo consiste no hábito de fumar cigarros, charutos e cigarros de palha, sendo a principal causa do câncer de boca, pulmão e laringe (SILVESTRE e JERONYMO, 2006). 16 Segundo Soares et al. (2005), o tabagismo é a principal causa de enfermidades evitáveis e incapacidades prematuras, sendo seu controle um dos maiores desafios de saúde pública no mundo atual. Estudos no Brasil e no mundo evidenciam que o vício de fumar está se iniciando cada vez mais cedo, principalmente entre os adolescentes. O uso do tabaco fumado (cigarro, charuto, cigarro de palha) favorece o desenvolvimento do câncer de boca entre 4 e 15 vezes mais do que nos indivíduos não tabagistas; os consumidores de tabaco mascado (fumo de rolo) ou aspirado (rapé) apresentam um risco 4 vezes maior de desenvolver um tumor, podendo chegar a um risco 50 vezes maior quando o consumo é prolongado (PINTO, 2008). No tabaco e na fumaça que dele se desprende, podem ser identificadas cerca de 4700 substâncias tóxicas, entre elas, 60 substâncias possuem ação carcinogênica conhecida. Parte da fumaça é absorvida na mucosa bucal e além da ação dos produtos de combustão do tabaco, soma-se o efeito do tempo de uso e do estímulo térmico, potencializando as agressões sobre a mucosa, valendo observar que a temperatura na ponta do cigarro aceso varia de 835 a 884°C centígrados (PINTO, 2008). As substâncias presentes na composição do cigarro causam agressão química nas células, ressecam a mucosa e provocam alterações gengivais, doenças periodontais, maior risco de perda óssea alveolar, dificuldade de cicatrização, redução nos níveis de IGA secretória na saliva além da possibilidade do aparecimento de lesões cancerizáveis (AUGUSTO, 2007). Quanto ao número de cigarros de papel industrializados utilizados, Seroli e Rapoport (2009) relataram que portadores de lesões bucais utilizaram, em média, 21 cigarros por dia, enquanto que para o fumo de corda, foram usados 5 cigarros por dia. Silvestre e Jeronymo, apud Grein (2001), descreveram que o risco para fumantes de cigarros industrializados decresce com o término do hábito, chegando a se assemelhar ao risco de indivíduos não fumantes, enquanto que o risco para usuários de cigarro de palha continua aumentando mesmo com o término do hábito. Cerca de 37% dos pacientes aparentemente curados da doença, mas que insistem 17 no hábito de fumar, vão ter um segundo câncer de boca, garganta ou laringe, comparados a apenas 6% dos que param de fumar. O uso de cachimbos e charutos também é considerado um importante fator de risco para o câncer de boca e de faringe. Além disso, fumar cachimbo aumenta consideravelmente o risco de câncer no lábio, principalmente no local onde há o contato com a haste do cachimbo (HOSPITAL A.C.CAMARGO, 2010a). Em um relato de caso apresentado por Sassi et al. (2010), houve a relação do uso do tabagismo e da maconha como os fatores de risco responsáveis pelo agravo da doença, em jovem de 21 anos de idade, onde o câncer bucal se desenvolveu de maneira agressiva e com evolução desfavorável. Estima-se que um terço da população de adultos no Brasil seja fumante e que das pessoas que apresentam câncer bucal, 95% são fumantes e 76% fumam e consomem bebida alcoólica regularmente (BIAZEVIC e ANTUNES, 2006). Sassi et al. (2009) relataram em um estudo feito desde o ano de 1989 até 2008 em Curitiba, que houve um declínio no número de fumantes, mas mesmo havendo esta tendência, os fumantes precisam de cuidados especiais para prevenir o câncer bucal. Assim, ressaltaram a importância do diagnóstico precoce, bem como de campanhas preventivas enfatizando a necessidade de se ter hábitos saudáveis. 5.2 ÁLCOOL O consumo de álcool tem aumentado em várias populações, a faixa etária tem sido cada vez mais baixa e a relação com o câncer bucal se torna mais evidente quando o álcool é associado com o hábito de fumar (CARRARD et al., 2008). Conforme Fernandes et al. (2008), a definição de etilista ou alcoólatra não está relacionada à quantidade de bebida consumida, mas sim, com o hábito de beber. Uma pessoa é considerada dependente se não conseguir ficar ao menos um dia sem consumir o álcool, mesmo que em pequena quantidade. O álcool atua tanto de forma local, aumentando a permeabilidade da mucosa bucal, potencializando a penetração de agentes carcinogênicos, produzidos pelos metabólitos do etanol (aldeídos), quanto de forma sistêmica, pois o consumo crônico do álcool leva a distúrbios do sistema imune e do estado nutricional, podendo 18 contribuir, desta maneira, na sua relação com o desenvolvimento do câncer bucal (CARRARD et al., 2008). O uso do álcool está mais relacionado a tumores do assoalho da boca e da língua, por ter um contato mais fácil e prolongado nestas regiões, principalmente quando consumido na forma de destilados, como a cachaça, embora o vinho de má qualidade possa ser mais maléfico no que se refere ao câncer de língua (PINTO, 2008). Carrard et al. (2008) apontaram ainda que a quantidade total de álcool ingerida e o tempo de duração do hábito são mais importantes que o tipo de bebida ingerida. O risco de o etilista desenvolver o câncer de boca é de 8,5 a 9,2 vezes maior que o não consumidor de bebida alcoólica. Quando o álcool está associado ao tabaco, com o consumo alto e prolongado, o sinergismo entre estas substâncias eleva em até 141,6 vezes a chance de desencadear um câncer (PINTO, 2008). Como resultado da pesquisa realizada por Fernandes et al. (2008), sobre a prevalência de lesões cancerizáveis na boca de indivíduos etilistas, obtiveram o dado de que a prevalência destas lesões foi baixa na população estudada, dado este em conformidade com outro estudo onde o álcool puro, de forma crônica, nunca se mostrou ser carcinogênico em experimentos com animais. Entre os alcoólatras, as lesões apareceram em pacientes que tinham outros fatores de risco associados, como o tabaco. Uma associação do câncer bucal com enxaguantes orais foi apresentada em uma pesquisa realizada por Marques et al. (2008), onde as pessoas que relataram usar o produto mais de uma vez ao dia, apresentaram um aumento significativo de três vezes o risco de câncer oral, comparado com aqueles que nunca os usaram, sugerindo assim que o uso frequente de enxaguatórios parece contribuir para o surgimento do câncer bucal, apesar de não existirem evidências conclusivas do aumento do risco. O álcool é usado como solvente de outros ingredientes e conservantes do enxaguatório. Há várias marcas de enxaguatórios comercializados no Brasil, sendo que alguns deles chegam a conter 27% de álcool, e são produtos vendidos livremente. Algumas pesquisas recentes indicaram que a associação entre enxaguatório e câncer bucal pode ser falsa, já que fumantes e consumidores de bebidas alcoólicas (que já têm alto risco), usam estes produtos com frequência bem 19 maior que as pessoas que não fumam nem bebem (HOSPITAL A.C.CAMARGO, 2010a). 5.3 EXPOSIÇÃO SOLAR A exposição frequente à luz solar tem sido referida como elemento que concorre para o aumento de risco de câncer bucal, principalmente para o câncer de lábio inferior. As lesões são características da idade adulta, embora também tenham sido observadas em crianças. A ação co-cancerígena da luz solar acomete principalmente pessoas de pele clara, e cuja ocupação natural os mantêm expostos às radiações actínicas do sol, vento e outros elementos naturais (TOMMASI, 2002). A exposição repetida e excessiva aos raios ultravioleta, principalmente a radiação UV-B do espectro da luz solar, por períodos superiores a 15 ou 30 anos, pode representar um considerável fator de risco para o câncer de lábio inferior (PERES, 2006; DAHER et al., 2008). Para Tommasi (2002), trabalhadores da área rural, pescadores e marinheiros, entre outros, são considerados de risco para esta neoplasia devido à natureza de suas atividades estar relacionada à exposição solar prolongada e na maioria das vezes sem proteção. Em certos indivíduos, a lesão regride parcial ou totalmente, quando deixam de se expor durante relativo tempo àqueles elementos naturais. A primeira alteração resultante da exposição solar é o eritema (vermelhidão) da pele. Indivíduos que se expõem por tempo prolongado à luz solar, principalmente no horário entre 10 e 15 horas, devem se proteger com o uso de chapéus e filtros solares para, dessa maneira, reduzir os efeitos nocivos desses raios sobre a pele e lábio (ODONTOLINE, 2010). Segundo Silveira et al. (2009), a transformação maligna da lesão inicial varia de 10 a 20% dos casos. somática resultante da exposição da luz solar é o 5.4 CHIMARRÃO O hábito de tomar mate ou chimarrão através de infusão quente com as folhas secas e picadas de Ilex paraguariensis tem sido mencionado como possível 20 causa de câncer no trato aerodigestivo na América do Sul, onde este hábito é comum, principalmente no Sul do Brasil, no Uruguai e Argentina, acometendo as regiões oral e orofaríngea, além de pulmão, rins, bexiga e esôfago (JOTZ et al., 2006). Os mesmos autores descreveram que os possíveis mecanismos envolvidos na elevação dos riscos de câncer, envolvem, além das substâncias cancerígenas encontradas no extrato da planta, a injúria térmica provocada pela elevada temperatura do mate ingerido, cerca de 69,5ºC, potencializando a ação de outros carcinógenos, como os presentes no tabaco e no álcool . Dasanayake et al. (2010) apontaram estudos de caso-controle realizados na América Latina que tiveram uma associação positiva entre o hábito de beber mate e o aparecimento de câncer oral e orofaríngeo. Um estudo realizado por Kamangar et al. (2008), teve como objetivo analisar a exposição aos hidrocarbonetos policíclicos aromáticos (HPAs), presentes no mate, quando da ingestão do mesmo. Os HPAs em pequenas quantidades, como ocorre em alguns alimentos e bebidas, normalmente não causam nenhum problema à saúde, mas em quantidades maiores , podem aumentar o risco de câncer a longo prazo. Os pesquisadores analisaram os níveis de 21 HPAs em 8 marcas comerciais de erva-mate e encontraram altas concentrações das substâncias em infusões quentes e frias. Concluíram que o potencial cancerígeno do mate pode estar relacionado ao seu conteúdo de HAP. Bernardi et al. (2005) identificaram fungos filamentosos em 14 das 34 amostras de erva mate de diferentes marcas comerciais, sendo Aspergillus sp. e Penicillium sp. as duas principais espécies encontradas, sendo estes também presentes em alguns alimentos. Estes agentes podem ser produtores de micotoxinas que, dependendo da quantidade ingerida, podem se nocivas à saúde, vindo a ser carcinogênicas ou hepatotóxicas. Segundo Loria, Barrios e Zanetti (2009), a ação sinérgica entre mate, álcool e tabaco foi um resultado claro em vários estudos. No entanto, ainda é imprecisa a quantidade de erva mate consumida e a temperatura de infusão, que podem desempenhar um papel importante no desenvolvimento da neoplasia. 21 5.5 FATORES IRRITANTES O uso de próteses removíveis ou totais, mal adaptadas, com câmera de sucção e bordas cortantes, higiene deficiente da prótese ou da boca, bem como restaurações fraturadas e saúde do hospedeiro debilitada, com presença de infecção por fungos, deficiências vitamínicas nutricionais ou diabetes, podem causar o aparecimento de lesões como candidose, hiperplasia inflamatória e úlcera traumática (GOIATO et al., 2005). Estes são considerados fatores predisponentes para o câncer bucal, pois a ação prolongada dos mesmos sobre a mucosa da boca, possibilitam a indução ao desenvolvimento do carcinoma pela potencialização de agentes carcinogênicos que podem estar presentes na boca, advindos do tabaco e do álcool, por exemplo (DAHER et al., 2008). As consequências do uso de próteses, com as características acima relacionadas, acometem principalmente indivíduos idosos, por apresentarem situações peculiares como rebordo alveolar reduzido, mucosa menos resiliente, tecido muscular em degeneração e xerostomia, que dificultam a adaptação de uma prótese e colaboram para a formação de lesões na cavidade oral (GOIATO et al., 2005). 6. FATORES SÓCIO-ECONÔMICOS ASSOCIADOS AO CÂNCER BUCAL A associação entre condições sócio-econômicas da população e a incidência e mortalidade por câncer envolve múltiplos aspectos. Distintos padrões culturais entre as classes sociais têm influência nesta relação, pois os estilos de vida e exposição de risco para o câncer sofrem contínuas mudanças no tempo e espaço. A localização anatômica do tumor é outra variável relevante na análise dos determinantes sociais em câncer. Como exemplo, tumor de colo de útero e de cabeça e pescoço apresentam maior incidência nos estratos populacionais com piores condições sociais (WÜNSCH FILHO et al., 2008). Vários elementos sociais como a industrialização e a maior expectativa de vida da população, contribuem para o aumento das doenças crônico-degenerativas, 22 nas quais o câncer se apresenta como um dos mais representativos (Dias et al., 2006). Os estudos epidemiológicos revelam a contribuição da condição social e econômica da população como fatores significativos no aparecimento de doenças. Desde a década de 1950 tem sido registrada uma alta incidência e alta mortalidade por câncer bucal em grupos de pior condição social, utilizando-se aferição por indicadores de renda, escolaridade e ocupação (BIAZEVIC e ANTUNES, 2006). A grande incidência de doenças no grupo da população marginalizada pode ter como causas o diagnóstico tardio das neoplasias, a dificuldade de acesso ao diagnóstico e ao tratamento adequado e a incapacidade adquirida em decorrência da doença (WÜNSCH FILHO et al., 2008). A OMS (Organização Mundial de Saúde) estima que cerca de 30% de todos os casos de câncer sejam provavelmente relacionados a padrões nutricionais como baixo consumo de frutas, vegetais e micronutrientes, com o consumo excessivo de proteínas, gorduras, carboidratos, conservantes e aditivos (BIAZEVIC e ANTUNES, 2006). Evidências científicas apontam para o papel protetor de certos alimentos da dieta sobre a doença, assim como a deficiência de nutrientes pode alterar a biotransformação de agentes tóxicos no organismo e, portanto, a sua toxicidade. Para os indivíduos, a dieta reflete o status e a condição favorável ou desfavorável de saúde. O padrão alimentar revela a correlação positiva entre o consumo diário de frutas e o número de anos de estudo dos indivíduos. Dieta inadequada e sedentarismo induzem à obesidade. Esses fatores, isoladamente ou em conjunto, influenciam a incidência de câncer (WÜNSCH FILHO et al., 2008). Marchioni et al. (2007) investigaram a associação de fatores dietéticos com o câncer oral. Alimentos como feijão, vegetais crus (verdes e amarelos) e frutas, tiveram uma tendência significativa para maior proteção quanto maior o consumo, principalmente no caso de compostos com atividade de vitamina A, como o betacaroteno . Sugeriram também que o consumo diário do prato típico brasileiro, arroz e feijão, pode diminuir os riscos para o câncer bucal e que mais que o alimento em si, a combinação dos mesmos associados ao estilo de vida, podem ser fatores determinantes na etiologia do câncer oral. 23 Outro fato a se considerar é que indivíduos de baixa renda, que não têm condições de pagar uma prótese para reposição de perdas dentárias, apresentam mastigação dos alimentos mais improdutiva, e como consequência, deixam de ter quantidades adequadas de nutrientes absorvidos pelo organismo, contribuindo com a má nutrição e o aumento da debilitação nestes indivíduos (SEROLI e RAPOPORT, 2009). De acordo com a pesquisa de Wünsch Filho et al. (2008), trabalhadores que realizam atividades manuais ou que têm pouca qualificação profissional, estão submetidos a maiores riscos de exposição a substâncias químicas, fumaça de diesel, tintas e corantes, entre outros agentes nocivos. Além disso, esses trabalhadores também apresentam baixo consumo de frutas e verduras, com deficiência de micronutrientes. Estes indivíduos apresentam a situação cumulativa de vulnerabilidade orgânica e da exposição, às vezes, a níveis bastante altos, a substâncias cancerígenas nos locais de trabalho. O potencial carcinogênico é definido como qualquer substância, combinação ou mistura de substâncias que quando exposto por via oral, respiratória ou dérmica, resulte na indução do tumor em um local diferente do local da administração. O risco de câncer em decorrência da exposição ocupacional aos agentes químicos é elevado em países em desenvolvimento, como o Brasil, onde há limitada legislação quanto à manipulação e à exposição aos agentes cancerígenos, baixo investimento empresarial em saúde e segurança, além do desconhecimento dos trabalhadores sobre os riscos presentes no ambiente de trabalho (OLIVEIRA et al., 2008). A inter-relação do álcool e tabaco em indivíduos de baixa renda vem sendo comprovada, e sua associação com o câncer de boca também, visto que esses grupos populacionais tendem a ter maior contato com os fatores de risco, bem como precárias condições de saúde bucal e carências nutricionais (BORGES et al., 2009). O consumo de bebidas alcoólicas é variável nas diferentes sociedades, tanto em termos de qualidade como de quantidade. Aspectos culturais influenciam no padrão de consumo de álcool, que em excesso, está relacionado à maior ocorrência de alguns tumores. Estudos revelam que o consumo excessivo de álcool é mais frequente entre pessoas com menor nível educacional. Entretanto, avaliar o efeito isolado do álcool sobre câncer é difícil, face à sua associação geralmente com o 24 tabagismo, além da dificuldade de obtenção de informações confiáveis do indivíduo etilista, por sua dificuldade de relacionamento social (WÜNSCH FILHO et al., 2008). Considerando-se o tabaco, os mesmos autores relataram que, em estudos, o consumo do mesmo foi duas a três vezes maior em grupos com piores condições sociais. Além disso, baixa renda, ocupação em atividade com baixa qualificação profissional e restrita escolaridade, foram fatores preditivos de baixa taxa de abandono do tabagismo e elevada quantidade de cigarros fumados. No estudo realizado por Melo et al. (2005) foi investigada a participação da família na adoção de hábitos considerados como fatores de risco para o câncer bucal, tendo como amostra mulheres portadoras da doença. Relataram que a maioria das entrevistadas que fumavam ou afirmaram já ter fumado, iniciaram o hábito na infância, com os pais, assim ocorrendo também em relação ao uso de bebida alcoólica. O vício adquirido desde a infância ou adolescência, pode ter contribuído para o desenvolvimento do tumor na população estudada. O perfil sóciodemográfico da amostra revelou ainda, um quadro composto de mulheres de baixa renda e analfabetas, coincidindo com achados de outros autores. O fator idade, associado às desigualdades sociais, teve uma relação diferente de outros fatores para o câncer bucal, conforme é apresentado no trabalho de Borges et al. (2009), onde regiões de melhores indicadores sócio-econômicos são mais propícias ao desenvolvimento de doenças crônico degenerativas, como é o câncer. Isto se deve ao fato de que tais regiões possuem melhores indicadores demográficos para esperança de vida aos 60 anos de idade e, consequentemente, maior proporção de idosos na população, fortalecendo a relação do câncer com a longevidade. Borges conclui que este resultado obtido pode ser pela melhor notificação dos registros de câncer nessas regiões. Como o câncer bucal geralmente se manifesta em idade mais avançada, quanto mais velha é uma população, maiores são as taxas de incidência e mortalidade. O Brasil, devido à diminuição da taxa de fecundidade, pode chegar em 2025 à sexta população mais idosa do mundo, refletindo assim, a necessidade de prevenção e diagnóstico precoce para o câncer bucal (AUGUSTO, 2007). 25 7. PROGRAMA NACIONAL DE PREVENÇÃO DE CÂNCER BUCAL A preocupação com a elevada taxa de mortalidade e morbidade do câncer de boca no Brasil, é relatada desde 1938, quando Mário Kroeff, através de palestras, procurava conscientizar os cirurgiões-dentistas para o diagnóstico precoce dessas lesões (DIAS, 2006). Mesmo a prevenção tendo assumido um papel significativo no combate ao câncer bucal, os altos índices de morbidade e mortalidade representam a importância desta doença como um problema de saúde pública nacional (FRANÇA et al., 2010). O Instituto Nacional de Câncer (INCA) é o órgão auxiliar do Ministério da Saúde (MS) no desenvolvimento e coordenação das ações integradas para prevenção e controle do câncer no Brasil, ações estas de assistência médicohospitalar, prestada direta e gratuitamente como uma das ações do Sistema Único de Saúde (SUS), aos pacientes com câncer (BRASIL, 2010l). O INCA coordena e executa, em âmbito nacional, o Programa de Controle de Tabagismo e outros Fatores de Risco de Câncer, com o objetivo de promover ações que estimulem a adoção de comportamentos e estilos de vida saudáveis, contribuindo na redução da incidência e mortalidade por câncer e de doenças tabaco-relacionadas no país, como é o caso do câncer de boca (BRASIL, 2010m). Dentre as ações realizadas pelo INCA, estão as campanhas realizadas no Dia Mundial sem Tabaco, comemorado no dia 31 de Maio, Dia Nacional de Combate ao Fumo, comemorado do dia 29 de Agosto e Dia Nacional de Combate ao Câncer, no dia 27 de Novembro, além de um fluxo contínuo de informações sobre prevenção do câncer (BRASIL, 2010c,d,e,m). O Dia Nacional de Combate ao Câncer é uma oportunidade para se “evocar o importante significado histórico das entidades de combate ao câncer, de consagração aos inumeráveis e valiosos serviços prestados ao país e proporcionar importante mobilização popular quanto aos aspectos educativos e sociais na luta contra o câncer” (BRASIL, 2010c). Como resultado da batalha do Ministério da Saúde (MS) contra o tabagismo, obteve-se, entre os anos de 2006 e 2009, uma queda no percentual de fumantes na 26 população brasileira de 16,2% para 15,5%. Estes dados fazem parte da pesquisa de Vigilância de Fatores de Risco e Proteção para Doenças Crônicas por Inquérito Telefônico (Vigitel). Essa redução pode ser explicada por uma série de ações como a proibição de publicidade do tabaco, o aumento de impostos sobre o produto e a inclusão de advertências mais explícitas sobre os efeitos danosos do fumo nos maços de cigarro (BRASIL, 2010n). A Política Nacional de Atenção Oncológica, incorporada pela Portaria nº 2.048, de 3 de setembro de 2009, define, para o país, abrangente controle do câncer, através de ações voltadas desde a prevenção até a assistência de alta complexidade, integradas em redes de atenção oncológica, com o objetivo de reduzir a incidência e a mortalidade por câncer (BRASIL, 2010f). A gestão deve utilizar, da melhor maneira, os recursos disponíveis para o planejamento e avaliação das estratégias de controle da doença. A prevenção e o controle do câncer estão entre os mais importantes desafios científicos e de saúde pública. No Brasil, há várias décadas vêm se desenvolvendo ações para prevenção e combate ao câncer de boca e um grupo técnico de especialistas nesta área, do Ministério da Saúde, começou a discutir políticas públicas voltadas para o controle dessa doença (DIAS et al., 2006). Em março de 2004, foi lançado o Brasil Sorridente, uma política do governo federal, caracterizado por um programa estruturado, com o objetivo de ampliar o atendimento e melhorar a saúde bucal da população brasileira (BRASIL, 2010h). Para a estruturação da atenção à saúde bucal no âmbito do SUS através do programa Brasil Sorridente, foi necessário elaborar um documento com as Diretrizes da Política Nacional de Saúde Bucal a partir de discussões sobre o assunto em congressos e encontros de Odontologia e de Saúde Coletiva, em consonância com as deliberações das Conferências Nacionais de Saúde e da I e II Conferência Nacional de Saúde Bucal (BRASIL, 2010i). A ampliação e qualificação da atenção básica, voltada para o câncer bucal, ocorreu por meio da organização e desenvolvimento de ações de prevenção e controle do câncer, através de: a) exames preventivos para detecção precoce do agravo, garantindo-se a continuidade da atenção, em todos os níveis de complexidade; b) oferta de oportunidades de identificação de lesões bucais através 27 de visita domiciliar ou em campanhas específicas; c) acompanhamento dos casos suspeitos e d) estabelecimento de parcerias para prevenção, diagnóstico, tratamento e recuperação do câncer bucal com Universidades e outras organizações (BRASIL, 2010i). A implantação dos Centros de Especialidades Odontológicas (CEO), através da Portaria nº 599/GM de 23 de março de 2006, foi mais um passo para a ampliação do atendimento e garantia da integralidade da assistência à saúde. Uma ação decisiva do MS na atenção às doenças bucais foi a instituição das ações de diagnóstico bucal como requisito para a implantação dos CEOs, incentivando a formação de serviços de diagnóstico de boca (BRASIL, 2010k). Os CEOs são uma das frentes do Brasil Sorridente. O tratamento oferecido nestes centros é uma continuidade do trabalho realizado pelas equipes de saúde bucal. Os profissionais da atenção básica são responsáveis pelo primeiro atendimento ao paciente e pelo encaminhamento aos centros apenas nos casos mais complexos. Cada CEO credenciado passa a receber recursos do MS, e funciona por meio de parceria entre municípios, estados e governo federal (BRASIL, 2010j). 8. POLÍTICA PÚBLICA DE DETECÇÃO PRECOCE E PREVENÇÃO DE CÂNCER BUCAL DA CIDADE DE CURITIBA A administração do Município de Curitiba, amparada pela necessidade de promoção de saúde de sua população, apóia desde 1989, campanhas de prevenção do câncer bucal, idealizadas e realizadas pelo chefe do Serviço de Cirurgia BucoMaxilo-Facial do Hospital Erasto Gaertner (HEG), Dr. Laurindo Moacir Sassi, referência no tratamento de câncer de cabeça e pescoço. O projeto surgiu após se perceber o alto índice de pacientes portadores de sintomas do câncer bucal. Até o ano de 2008 foram realizadas 20 campanhas, onde profissionais prestaram orientações e exames clínicos à população do município (ODONTOSITES, 2010). Através da Lei Ordinária nº 9000 de 27 de dezembro de 1996, foi instituído o Código de Saúde de Curitiba, que estabelece normas para a promoção, fiscalização e controle das ações e serviços de saúde no âmbito de competência do município, e 28 dispõe sobre a proteção à saúde, direcionada no setor de saúde bucal, com ações para o diagnóstico, encaminhamento e tratamento precoce do câncer bucal, entre outros (JUS BRASIL, 2010). A partir de 1997 a Secretaria Municipal de Saúde (SMS) de Curitiba deu o primeiro passo para tentar diminuir a mortalidade desta doença. Iniciou um monitoramento dos dados epidemiológicos no município, utilizando o índice de morbidade desde 1990 monitorados pela Liga Paranaense de Combate ao Câncer e o índice de mortalidade a partir de 1996 obtidos do Sistema de Informação de Mortalidade (SIM) e avaliou os dados ano a ano (MOYSÉS et al., 2002). Estes dados foram divulgados em todas as Unidades Municipais de Saúde (UMS), com o objetivo de despertar a atenção dos profissionais para esta patologia. Assim, em 1999, foi criado o Protocolo de Referência e Contra-Referência na Atenção ao Câncer Bucal, para motivar e capacitar os profissionais a identificar pacientes de risco, detectar lesões suspeitas e realizar educação em saúde sobre a doença. Em 2000 foi criada uma Unidade de Referência, a UMS Ouvidor Pardinho, que além de atender o idoso, concretizou o Programa de Diagnóstico e Tratamento de Lesões Bucais (MOYSÉS et al., 2002). Shozo et al. (2001) avaliaram os resultados do trabalho clínico de funcionamento desta UMS por um período de 15 meses e relataram que, dos 1316 pacientes avaliados, 14 casos tiveram confirmação de câncer, demonstrando a real necessidade de um centro de referência para o serviço em questão. O CEO Rosário é a mais antiga das duas unidades especializadas em odontologia da rede municipal de saúde de Curitiba. O segundo é o CEO Sylvio Gevaerd, inaugurado em 2006 (CURITIBA, 2010d). Em 2009, o prefeito de Curitiba e todos os secretários e presidentes de institutos, empresas e fundações municipais, assinaram as Diretrizes e Bases para o Contrato de Gestão, documento este que continha os principais compromissos do Plano de Governo da Gestão 2009-2012 (CURITIBA, 2010a). Uma das ações contempladas entre as metas do contrato de gestão foi o número de exames para detecção de câncer de boca na população acima de 40 anos, através do lançamento do Programa de Prevenção e Detecção Precoce do Câncer Bucal, meio pelo qual se 29 planejou atingir 8.000 exames em 2009, e propôs para 2010 a realização de 20.000 exames (CURITIBA, 2010b,c). O Programa teve como finalidade difundir a importância da detecção precoce das lesões de boca, integrar a Equipe de Saúde Bucal das UMS aos programas de controle do tabagismo e etilismo e outras ações de proteção e prevenção do câncer bucal, além de informar a população sobre locais de referência para o exame de diagnóstico precoce da patologia (CURITIBA, 2009b). Simultaneamente ao lançamento do programa, cirurgiões dentistas (CD), técnicos de saúde bucal (TSB) e auxiliares de saúde bucal (ASB) passaram por um processo de capacitação, coordenado pela Secretaria de Saúde. De acordo com o programa, as 106 UMS que possuem clínica odontológica, podem se utilizar dos recursos possíveis para sensibilizar a população sobre a doença e atraí-la para o diagnóstico precoce (LUCIANO DUCCI, 2010). As ações coletivas, centradas na promoção da saúde, incluem ações educativas, de prevenção e detecção precoce das lesões de mucosa e câncer de boca, para todas as faixas etárias, principalmente para adultos e idosos, direcionadas ao controle dos fatores e condições de risco, destacando o tabagismo e etilismo, estimulando o autoexame e o exame sistemático da cavidade bucal pelos profissionais da saúde (CURITIBA, 2009b). O autoexame da boca é um método suficientemente simples e acessível a qualquer pessoa, bastando ter um ambiente bem iluminado e um espelho, com a finalidade de identificar anormalidades na face e mucosa bucal, alertando o indivíduo e estimulando-o a procurar cuidados na rede de saúde (PINTO, 2008). O cirurgião-dentista da atenção básica deve realizar uma boa anamnese, seguida de um correto e completo exame da cavidade bucal na primeira consulta e nas consultas de urgência; estes exames devem ser periódicos em usuários com maior vulnerabilidade para o desenvolvimento de câncer de boca, possuindo mais de um dos fatores de risco: sexo masculino, mais de 40 anos, tabagista e etilista, sofrer exposição ocupacional a radiação solar sem proteção ou portador de deficiência imunológica (CURITIBA, 2009b). Além do exame intrabucal (de lábios, bochecha, língua e palato), deve ser realizado o exame clínico extrabucal (da face, regiões submandibular e 30 submentoniana e articulação temporomandibular), incluindo visualização e palpação, de forma a detectar anormalidades (CURITIBA, 2009b). Qualquer lesão dos tecidos moles da boca que não apresente regressão espontânea ou com remoção de possíveis fatores causais (dentes fraturados, bordas cortantes em próteses, etc), e que indique qualquer suspeita da doença, deve ser encaminhada para o serviço de Estomatologia dos CEOs Rosário ou Sylvio Gevaerd, via Central de Marcação de Consultas Especializadas da Secretaria Municipal de Saúde (CURITIBA, 2009b). Havendo necessidade, é feito biópsia da lesão. A biópsia é um procedimento no qual se colhe uma pequena quantidade de tecido ou células, para posterior estudo em laboratório. Pode ser feito por punção, para saber se a lesão é sólida ou cística quando de lesões intraósseas. A biópsia pode ser incisional, onde é retirada parte da lesão, quando de lesões extensas ou suspeita de malignidade, ou biópsia excisional, onde é feita remoção completa da lesão, sendo que o diagnóstico e o tratamento desta última são definitivos, não indicada para tratamento de tumores malignos (ALVES, 2010). Os dentistas devem estar atentos ao exame da cavidade bucal nas estruturas de maior acometimento para o câncer bucal, para realizar o diagnóstico precoce, favorecendo o prognóstico da doença, que quase sempre começa em local de fácil visualização e inspeção para o paciente. A investigação dos pacientes conforme as regiões anatômicas específicas, fornece bases científicas para orientar campanhas de prevenção educativas (CURITIBA, 2009a). Segue na figura 1, o fluxograma do Programa de Prevenção e Detecção de Câncer Bucal (CURITIBA, 2009b). Este fluxograma compreende todos os passos de encaminhamentos do paciente, desde o exame inicial, quando se suspeita de uma lesão de boca, até seu acompanhamento pela equipe da UMS após o tratamento da lesão. 31 FIGURA 1 – Fluxograma para atendimento de pacientes com lesão de boca- CURITIBA 2009. Fonte: Curitiba (2009b) Siglas: APS - Atenção Primária em Saúde CBS - Coordenação do Programa Saúde Bucal/ Cárie Zero CIS - Centro de Informação em Saúde CMCE - Central de Marcação de Consultas Especializadas UBS - Unidade Básica de Saúde 9. PROGRAMAS DE PREVENÇÃO DE CÂNCER BUCAL DE OUTRAS LOCALIDADES DO BRASIL No Estado do Mato Grosso, um grupo voluntário de cirurgiões-dentistas, vinculados à Rede Feminina de Combate ao Câncer, implantou, em agosto de 2001, o serviço de Estomatologia no Hospital de Câncer do Mato Grosso (HCMT) com o 32 objetivo de prestar atendimento odontológico aos pacientes com câncer, internos ou não, visto que os mesmos não dispunham de um local na rede pública que prestasse tal atendimento. Na maioria dos casos, as neoplasias de boca eram diagnosticadas em estágio avançado no HCMT, sem realização prévia de exames por médicos ou cirurgiões-dentistas. Mesmo havendo uma parceria com as prefeituras, com a realização de exames e procedimentos para lesões de boca nas UMS, não havia um sistema racionalizado de prevenção e intervenção às doenças da mucosa bucal. Foi então que, através da Portaria nº 195 de 30 de novembro de 2004, foi estabelecida uma política de atenção às doenças da boca, portaria esta que evoluiu para a Lei nº 8.342 em 30 de junho de 2005, que institui a Política Estadual de atenção às doenças da boca e da face, no âmbito da Secretaria Estadual de Saúde – SES. Esta lei teve como finalidade garantir o atendimento aos pacientes com lesões de boca, atuando também com atividades preventivas e realização de diagnóstico das lesões buco-faciais (BORGES, 2007). No ano de 2002, em Recife, foi desenvolvido um programa de prevenção do câncer de boca, no Distrito Sanitário IV, com cursos de capacitação para CDs, TSBs, ASBs e Agentes Comunitários de Saúde (ACS), por meio de aulas teórico-práticas, com carga horária e conteúdo específico para cada grupo de profissionais, para a realização de exames preventivos e diagnósticos como o autoexame e citologia esfoliativa da mucosa bucal, além da apresentação de palestras educativas. As ACSs faziam busca ativa na comunidade de indivíduos portadores de lesões suspeitas e encaminhavam para exame com os CDs (VIDAL et al., 2003). Como continuidade da ação, anualmente o Programa de combate ao câncer de boca é realizado no período de 18 a 25 de outubro, tendo como público alvo a população do Estado de Pernambuco, para a prevenção e diagnóstico, e cirurgiões-dentistas, médicos otorrinolaringologistas, oncologistas de cabeça e pescoço, TSB, ASB, ACS e profissionais dos serviços privados, para execução do programa, cada um na sua esfera de atuação (PERNAMBUCO, 2010). O Programa de Diagnóstico de Câncer de Boca em Várzea Grande, Mato Grosso, teve início com o empenho de acadêmicos da Univag – Centro de Diagnóstico, objetivando o incremento de ações preventivas e precoces do câncer bucal, por meio de palestras educativas, divulgação do autoexame, além da 33 realização de exames de lesões bucais, citologia esfoliativa e biópsia da mucosa bucal. Iniciou no segundo semestre de 2005 até os dias atuais, na clínica de odontologia da Univag, sendo que as ações estenderam-se para empresas, Centros de Convivência para Idosos, Fundações, Policlínicas e Clínicas Odontológicas de Várzea Grande e Cuiabá, utilizando-se dos meios de comunicação para divulgação do programa (FRANÇA et al., 2010). 10. DISCUSSÃO Este estudo mostrou que a maioria dos tumores malignos da boca é representada por CEC, com ocorrência mais comum em homens com idade superior a 40 anos e que os principais fatores de risco para o surgimento do câncer bucal são o tabagismo e o alcoolismo (SILVESTRE e JERONYMO, 2007; AUGUSTO, 2007; PINTO, 2008). A exposição prolongada à luz solar também representa risco ao surgimento de um câncer de boca, principalmente no lábio inferior; o consumo frequente de chimarrão e a presença de fatores irritantes na boca, quando associados ao tabaco e ao álcool, são considerados fatores de risco ao agravo (TOMMASI, 2002; JOTZ, 2006; DAHER, 2008) Conforme os trabalhos de Wünsch Filho et al. (2008) e Marchioni et al. (2007), observou-se que as condições sócio-econômicas e o câncer bucal têm entre si, grande relação, mostrando que grupos sociais desprivilegiados, tendem a ter maior contato com os fatores de risco, além de precárias condições de saúde bucal, carências nutricionais e exposição ocupacional a substâncias cancerígenas. O câncer bucal e sua prevenção são assuntos ainda desconhecidos da população, como mostra o trabalho de Sassi et al. (2005), e a detecção precoce e a procura tardia ao tratamento são realidades ainda presentes. No Brasil, o câncer bucal está entre as 7 principais neoplasias existentes e este dado nos mostra a necessidade de políticas públicas que visem a sensibilizar o maior número de pessoas quanto à prevenção a essa doença e a necessidade de incorporar hábitos mais saudáveis. 34 A atenção nacional a esse tipo de agravo à saúde, através de uma política pública, iniciou com o programa Brasil Sorridente, com a divulgação das orientações aos exames para detecção precoce, além de se estabelecer parcerias com Universidades e outras organizações para ampliar o acesso da população à atenção secundária e terciária, além das Campanhas Anti-Tabagismo, auxiliando na sensibilização da população quanto ao risco à saúde causado pelo cigarro (BRASIL, 2010d,e,h). Através desta pesquisa, observou-se que os programas de prevenção do câncer bucal, na maioria das regiões, resumem-se a campanhas anuais, realizadas por um período de tempo limitado, sem um planejamento de ações específicas como parte da rotina da assistência das UMS. Algumas localidades do Brasil iniciaram um programa de prevenção do câncer bucal, realizado não só por cirurgiões-dentistas, mas também por acadêmicos de odontologia, TSB, ASB e ACS, além de ter sido instituído por meio de uma lei estadual (VIDAL et al., 2003; BORGES, 2007; FRANÇA et al., 2010). Em Curitiba, a preocupação com a neoplasia tem sido demonstrada desde 1989, nas campanhas de Prevenção do Câncer Bucal, que pode atingir todas as classes sociais e através do trabalho de profissionais especializados na área de câncer bucal, que teve início no ano de 2000, na UMS Ouvidor Pardinho e depois para os CEOs, contemplando os usuários do sistema público de saúde. A prevenção ao câncer bucal ganhou destaque através do lançamento do Programa de Prevenção e Detecção Precoce do Câncer Bucal, sendo que o exame para detecção de lesão bucal foi estabelecido como uma meta do Contrato de Gestão no ano de 2009. 11. CONCLUSÃO 1 – O câncer bucal é um problema de saúde pública e deve ser considerada sua importância com a adoção de uma política de prevenção efetiva, contribuindo para a redução do impacto dos fatores de risco sobre o câncer de boca, permitindo uma mudança de hábitos e diminuição da exposição da população a estes fatores. 35 2 - Embora ainda não se tenham dados suficientes para avaliar se houve um decréscimo da mortalidade por câncer bucal, como resultado do Programa de Prevenção e Detecção do Câncer Bucal em Curitiba, poderiam ser utilizados os modelos de atenção em saúde bucal realizados por outras localidades como Várzea Grande e Recife, que têm um diferencial quanto aos agentes realizadores das ações, e quanto aos procedimentos realizados na UMS, para complementar o programa já existente e estendê-lo como meta de governo para o Estado, abrangendo maior quantidade de municípios, a exemplo da lei Estadual do Mato Grosso. 3 - O dentista desempenha um papel importante na prevenção, diagnóstico precoce e conduta clínica dos pacientes com câncer bucal, com a parceria de médicos, fonoaudiólogos, nutricionistas e outros profissionais. É de competência e maior responsabilidade do cirurgião-dentista, a conscientização da população em relação aos fatores de risco a que a mesma está sujeita, e sua sensibilização quanto à necessidade do autoexame e da consulta odontológica periódica, principalmente quando se tratar de grupo de risco. 4 - Além da atuação da esfera pública no controle do agravo em questão, a compreensão das entidades privadas quanto à necessidade da prevenção do câncer bucal, seria de grande auxílio no enfrentamento deste grande desafio. REFERÊNCIAS ALVES, F. Quando indicar e como realizar biópsia. Disponível em:<http://www.fosp.saude.sp.gov.br/docs/campanha/apresentacao_06_2009.pdf>. Acesso em 10 Jul. 2010. ANDREOTTI, M. et al. Ocupação e câncer da cavidade oral e orofaringe. Cad. Saúde Pública, Rio de Janeiro, v. 22, n. 3, p. 543-555, Mar. 2006. AUGUSTO, T. A. Medidas preventivas do câncer bucal – Revisão de Literatura . Prêmio Colgate Profissional, Campinas, Fev. 2007. BERNARDI, E.; CALDEIRA, M. 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