PROBLEMAS NA FALA E DEGLUTIÇÃO 1 Carolina Schirmer 2 Deborah Salle Levy 3 Vanessa Santos Elias "[...] se eu tivesse que perder todas minhas posses e atribuições, com apenas uma exceção, escolheria ficar com o poder da comunicação, pois com ele eu logo reconquistaria todo o resto." Daniel Webster Em uma Unidade de Terapia Intensiva (UTI), muitos pacientes permanecem impossibilitados de se comunicarem por diversas razões: – pacientes intubados; – pacientes com traqueostomia; – pacientes com sequela de AVC; e – pacientes com dificuldades preexistentes. O que é a comunicação? Comunicar é o processo de transmitir e receber mensagens por meio de signos (sejam eles símbolos ou sinais), verbais ou não verbais. Pela comunicação, podemos compreender a visão de mundo do paciente, identificar o que ele sente, com base no significado que ele atribui aos fatos que lhe ocorrem. A comunicação, assim estabelecida, gera autoestima, apoio, conforto, confiança, resultando em segurança e satisfação, facilitando o alcance da excelência do cuidado, do bem-estar do paciente, fazendo com que se sinta respeitado como pessoa nas suas diferentes dimensões: física, psíquica, cultural, espiritual, social e intelectual. A dificuldade de se comunicar, não importando por quanto tempo, tem sido identificada como um dos mais frustrantes e estressante aspectos da UTI. A dificuldade 1 2 3 Fonoaudióloga, mestre em ciências da saúde – área de Neurociências pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS). Professora adjunto do curso de Fonoaudiologia e de pósFonoaudióloga, especialista em Motricidade Oral pelo CFFa. Mestre e Doutoranda em Ciências da Saúde PUC/RS. Aperfeiçoamento no Método Neuroevolutivo Bobath. Professora Adjunto do Curso de Fonoaudiologia do Centro Universitário Feevale. Fonoaudióloga do Instituto de Cardiologia PUC-RS. Fonoaudióloga, especialista em Voz pelo CFFa. Mestre em Distúrbios da Comunicação Humana. Professora Adjunto do Curso de Fonoaudiologia do Centro Universitário Feevale. Especializanda em Motricidade Oral pelo CEFAC – RS. Doutoranda em Linguística Aplicada pela PUCRS. permanente ou temporária dificulta a relação do paciente com a equipe (enfermeiros, fisioterapeutas, médico etc.) e família, impossibilitando, muitas vezes, o atendimento das necessidades básicas em função da não compreensão dos seus desejos. A relação dos pacientes com seus familiares também torna-se angustiante, resultando em pacientes frustrados, nervosos e deprimidos. A necessidade de comunicação entre equipe paciente/família e paciente é óbvia e pode ser determinante em sua recuperação. Comunicação Aumentativa e Alternativa – CAA A Comunicação Aumentativa e Alternativa – CAA4 é uma das áreas da Tecnologia Assistiva que atende pessoas sem fala ou escrita funcional ou em defasagem entre sua necessidade comunicativa e sua habilidade em falar e/ou escrever. Busca então, através da valorização de todas as formas expressivas do sujeito e da construção de recursos próprios desta metodologia, construir e ampliar sua via de expressão e compreensão. Recursos como às pranchas de comunicação, construídas com simbologia gráfica (desenhos representativos de idéias), fotografias, letras ou palavras escritas, são utilizados pelo sujeito com dificuldade grave na comunicação para expressar seus questionamentos, desejos, sentimentos e entendimentos. Alguns exemplos de estratégias e recursos que podem facilitar a comunicação do paciente: • O relógio – deve possuir ponteiros e números grandes para que possa ser visualizado a distância pelo paciente. Deve associá-lo ao uso de cartão com símbolos gráficos indicando o turno (manhã, tarde e noite). O objetivo principal é orientar o paciente (Fig. 1) • Calendário – deve mostrar o mês vigente, os dias de internação (caso o paciente esteja hospitalizado), o dia da cirurgia, o dia da intubação etc. com 4 Também encontramos na literatura os termos comunicação ampliada e alternativa, comunicação apoio de símbolos gráficos. O objetivo principal é manter o paciente orientado quanto ao tempo de internação e/ou aos procedimentos aos quais vem sendo submetido (Fig. 2). Figura 1 • Figura 2 Prancha de atividades – deve indicar todas as atividade programadas para o paciente ao longo do dia, incluindo rotina de higiene e alimentação; também deve registrar as atividades importantes que acontecem sem programação prévia. O objetivo desse recurso é diminuir a ansiedade do paciente em relação aos procedimentos a que é submetido, bem como auxiliá-lo no processo de orientação e programação do seu dia (Fig. 3). suplementar e alternativa. Figura 3 • Prancha de comunicação, sentimentos e lazer – deve ser organizada com símbolos gráficos e vocabulário previamente selecionado, que indique uma séries de sentimentos e opções de atividade que podem ser realizadas pelo paciente. A prancha deve conter símbolos que permitam ao paciente fazer questionamentos e esclarecimentos sobre a sua situação. As pranchas de comunicação podem conter maior ou menor número de símbolos, isso dependerá da idade, possibilidade de compreensão, nível de consciência e acuidade visual. Sugere-se o uso de símbolos que sejam de fácil reconhecimento. É importante que, além de apresentar o recurso para o paciente, possa se nomear o símbolo para que ele ganhe significado (Fig. 4). Figura 4 • Prancha de necessidades básica e de dor – com símbolos gráficos e vocabulário previamente selecionado (Fig. 5). Figura 5 • Prancha de comunicação com o alfabeto – para o paciente que tem a possibilidade de escrever mensagens. Essa estratégia promove um aumento da frequência de comunicação em momentos em que o indivíduo não esteja obtendo sucesso no uso da fala por vários motivos um deles é a fadiga ou outra situação que influencie a qualidade da inteligibilidade da fala pelo interlocutor. Quando essa estratégia é empregada, tanto o paciente quanto os ouvintes sentem-se encorajados a manter a comunicação (Fig. 6). Figura 6 Outras estratégias devem incluir orientação ao grupo de enfermagem e a outros profissionais que trabalhem no hospital ou com o paciente em sua casa (por exemplo, fisioterapia), para esclarecer quanto ao uso dos recursos, sensibilizando a equipe para a necessidade de implementação e utilização dos recursos alternativos de comunicação (PELOSI, 2005). Quais são as técnicas de seleção? As técnicas de seleção referem-se à forma pela qual o paciente escolhe os símbolos no seu sistema de comunicação. É importante determinar a técnica de seleção mais fácil para cada sujeito. Deve ser determinado o posicionamento ideal da prancha e do sujeito, a precisão do apontar, o quanto ele cansa e a velocidade (JOHNSON, 1998). Seleção direta – é o método mais rápido e pode ser feito através do apontar do dedo ou outra parte do corpo, com uma ponteira de cabeça ou com uma luz fixada à cabeça. Técnica de varredura – exige que o indivíduo tenha uma resposta voluntária consistente como piscar os olhos, balançar a cabeça, sorrir ou emitir um som para que possa sinalizar sua resposta. Nos recursos de baixa tecnologia o paciente vai necessitar de um facilitador para apontar os símbolos. O que é voz? A laringe situa-se no interior do pescoço, é formada por cartilagens, músculos e ligamentos. Exatamente atrás da cartilagem tireóide (o gogó ou Pomo de Adão) localizam-se duas pregas vocais (popularmente conhecidas como cordas vocais). As pregas vocais afastam-se no momento da inspiração (quando o ar entra em direção aos pulmões). No memento da expiração (em que o ar volta dos pulmões) duas situações podem ocorrer, uma é que se tivermos a intenção de falar, enviaremos um comando via sistema nervoso que fará com que alguns dos músculos da laringe se aproximem, e o ar expiratório fará com que as pregas vocais vibrem ocorrendo a fonação, a outra é que se não quisermos falar elas irão manter-se abertas e o ar sairá pelo nariz e/ou boca. Ao encostarmos a palma da mão no pescoço, na altura do gogó, e emitirmos o som da letra /a/ de forma contínua perceberemos com precisão onde se encontram as pregas vocais e onde produzimos a voz, é onde está tremendo. Este som produzido será articulado de acordo com os sons das palavras que queremos dizer e será amplificado na boca, nariz e no próprio pescoço. respiração fonação A laringe além da fonação tem mais duas funções de fundamental importância nas nossas vidas, a de proteger as vias aéreas inferiores (traquéia, pulmões) da entrada de substâncias estranhas, saliva ou alimento e a respiratória. Ao que devemos estar atentos? o voz com volume reduzido (soprosa) ou rouca pode indicar que alguns músculos de uma ou até das duas pregas vocais não estão trabalhando bem, que estão com uma paralisia, pois no momento que elas deveriam se aproximar para falar está ficando um espaço entre elas, por isso passa tanto ar. Quando isso pode ocorrer? o Quando o paciente ficou muito tempo com o tubo de ventilação, pois o tubo passa entre as pregas vocais, impedindo que elas fechem. o Quando em função de algumas cirurgias o médico teve que “manipular” o nervo que fornece motricidade para as pregas vocais. Qual o perigo? o O perigo é que temos que pensar que se as pregas vocais não estão fechando para falar, não fecharão também do momento da deglutição e isso poderá favorecer a entrada de substâncias para as vias aérea inferiores. E quando a voz está úmida, molhada, parece que a pessoa está falando de baixo d’água? o Quando percebemos esta alteração na qualidade da voz, geralmente é porque tem resíduos de alimento ou até mesmo de saliva sobre as pregas vocais ou bem próximo delas e que o barulho se dá pelo contato do ar com a secreção. Aí o que temos que fazer? o Inicialmente falar com o médico responsável, independente da sua especialidade, aí ele poderá solicitar a avaliação de um otorrinolaringologista, que irá ver se há ou não alteração no fechamento ou manutenção do fechamento das pregas vocais. o Além disso, poderá verificar como está a sensibilidade da região das pregas vocais e acima delas, pois quando há substâncias na região o certo seria tossir (contato brusco entre as pregas vocais) e se não houver condições desse fechamento, não ocorrerá a tosse. A traqueostomia é um procedimento cirúrgico que consiste na abertura da traquéia para o meio externo (no pescoço). É utilizada para manter uma via aérea permeável, em caso de obstrução das vias aéreas, necessidade de uso prolongado de ventilação mecânica, para controlar a aspiração de secreções patológicas, ou para monitorar a deglutição de indivíduos que apresentam problemas que comprometam o mecanismo esfincteriano da laringe. Esta abertura é realizada pelo médico cirurgião na altura do 2° e 3° anel traqueal, portanto abaixo do nível das pregas vocais. Após a incisão, é inserida uma cânula de traqueostomia a fim de impedir o fechamento deste orifício permitindo, assim, a passagem de ar no seu interior, possibilitando a ventilação pulmonar. Quando o indivíduo estiver com sua capacidade fisiológica de respirar restaurada funcionalmente e estiver deglutindo de forma segura é realizada a decanulação, ou seja, a retirada da cânula de traqueostomia; tal procedimento deve ser feito pelo médico ou equipe de enfermagem (desde que solicitado pelo médico). A cânula é um tubo curvo e sólido, que pode ser de metal, plástico (PVC) ou silicone Basicamente as cânulas são divididas em três partes distintas: cânula externa, cânula interna ou sub-cânula e obturador ou madril (Fig.7). A cânula externa é fixada ao pescoço do indivíduo por um colar de tecido, a fim de evitar migrações por tosse ou manipulação corporal e apoia também a sub-cânula. A interna é adaptada à cânula externa e é removível, funcionando para a limpeza. O mandril só utilizado no momento de inserção da cânula externa na traquéia, devendo ser retirado imediatamente. Fig.7 – Cânula e suas estruturas As cânulas variam ainda quanto ao tipo, podendo ser fenestradas ou não e possuir ou não balonete ou cuff. As fenestrações são pequenos orifícios que permitem a passagem do ar até as pregas vocais, a fim de normalizar a passagem do fluxo aéreo. São indicadas para indivíduos que não necessitam de ventilação mecânica (ROCHA, 1999). O balonete ou cuff é um balão situado em torno do terço distal da cânula que pode ser inflado com ar ou espuma para fixação do tubo na traquéia e tem indicação o indivíduo que é dependente de ventilação mecânica (ROCHA, 1999). Do ponto de vista fonoaudiológico, poderíamos pensar que este vedamento na transição entre a laringe e os pulmões seria uma ótima alternativa para impedir que alimentos, líquidos e até mesmo a saliva de indivíduos que aspiram cheguem às vias aéreas inferiores. Mas, na realidade, o uso cânula com cuff pode causar estenose traqueal, infecção ou ainda fístulas entre a parede traqueal e o esôfago. Existe, por fim, a possibilidade de acoplar a cânula de traqueostomia a uma válvula de fala (Fig. 2). Esta permite que o ar seja inspirado (pelo nariz, boca ou pelo orifício do pescoço) chegando até os pulmões e, durante a expiração, a pressão do ar faz com que a válvula se feche, dirigindo assim o fluxo de ar para a traquéia, laringe, cavidade oral e nasal, permitindo a fonação e a tosse Fig. 8 – Válvula de fala A traqueostomia oferece vantagens e desvantagens. Do ponto de vista fonoaudiológico ela pode afetar o sistema respiratório, fonatório e a deglutição. Quais são as vantagens e desvantagens da traqueostomia? FONAÇÃO DESVANTAGEM: Sabe-se que o maior combustível para a produção da voz é o ar. Desta forma, com a cânula situada abaixo das pregas vocais durante a expiração, o ar irá escapar pela abertura, não permitindo que ocorra a vibração das pregas e a produção do som glótico. ORIENTAÇÃO: Devemos orientar então que o indivíduo oclua manualmente a abertura para então poder falar ou que utilize a válvula de fala. DEGLUTIÇÃO VANTAGENS: Favorece a saída e a visualização do material aspirado e permite que na avaliação endoscópica possa ser observada a região inferior das pregas vocais durante a deglutição. DESVANTAGENS: Pensando na fisiologia da deglutição sabe-se que no momento em que ocorre o disparo ou a reação faríngea da deglutição a laringe é elevada e anteriorizada, tendo como consequência a abertura do esfíncter esofágico superior e a entrada do bolo no esôfago. Se a cânula acaba por fixar a laringe, provavelmente impede que esta excursão vertical ocorra adequadamente. Provavelmente isto diminuirá a eficiência do fechamento glótico e, consequentemente, a proteção das vias aéreas inferiores; favorece que ocorra aspiração durante a deglutição e a retenção de resíduos na região do esfíncter esofágico superior (EES) aumentando o risco de aspiração após a deglutição. O indivíduo que permanece por longo tempo traqueostomizado pode reduzir a sensibilidade laríngea e das pregas vocais, uma vez que o ar não passa mais pelas pregas vocais e nem pela região supraglótica. Este fato gera uma diminuição do reflexo de tosse, facilitando a presença de aspiração silente, em que o alimento ou a secreção passam pelas pregas vocais sem episódio de tosse ou engasgo, aumentando o risco de infecções pulmonares. Logemann et al. (1998) verificaram o efeito da oclusão digital leve do tubo de traqueostomia sobre a deglutição orofaríngea em 8 pacientes de cirurgia de cabeça e pescoço e concluíram que resultados variam individualmente, mas que a oclusão digital leve do tubo de traqueostomia pode melhorar a deglutição biomecanicamente e pode eliminar a aspiração; os autores ainda sugerem que os efeitos devem ser analisados individualmente por estudo dinâmico da deglutição (videofluoroscopia). ORIENTAÇÕES: § encorajemos o indivíduo a tossir regularmente, § quando conseguir permanecer alguns momentos com o traqueostoma ocluído devemos incentivar tal atitude, assim que as condições respiratórias e/ou pulmonares estiverem restabelecidas pela equipe, e o paciente conseguir deglutir com mais segurança deve-se solicitar a retirada da cânula de traqueostomia. O que é deglutição? O ato de deglutição (engolir) requer coordenação de diversos músculos da boca, garganta (faringe) e esôfago (tubo que transporta o alimento da faringe para o estômago). Durante o ato de deglutição, o alimento é posicionado na boca, os lábios são fechados para prevenir escape/perda de alimento, os músculos da língua e mandíbula movimentam o alimento dentro da boca para a mastigação. Quando essa ação é finalizada, o bolo alimentar é transportado, por movimentos ondulatórios e de propulsão da língua, para a parte posterior da boca, os músculos da faringe começam a se contrair para receber o alimento/líquido. A laringe eleva-se e anterioriza-se, o adito da laringe fecha-se para prevenir a entrada do bolo alimentar para os pulmões. A parte mole do céu da boca (palato mole) eleva-se para fechar a entrada do nariz (nasofaringe). À medida que o alimento passa para a parte posterior da língua, adentra a faringe, os músculos da faringe contraem-se para transportar o alimento através da mesma em direção ao esôfago. Quando o bolo alimentar atinge o esôfago, a válvula da entrada do esôfago (esfíncter esofágico superior – EES) abre-se permitindo a passagem do alimento. Após, os músculos do esôfago contraem-se empurrando o bolo alimentar até a segunda válvula do esôfago (esfíncter esofágico inferior), que relaxa possibilitando a passagem para o estômago. A deglutição normal é um processo muito rápido com uma duração média de dois segundos para transportar o alimento da cavidade oral para a faringe e esôfago. Ela é considerada segura, porque a laringe (entrada para a traquéia) fecha-se à medida que o alimento passa pela faringe. Desta forma podemos dividir a deglutição em quatro fases: Fase preparatória oral: o alimento é manipulado na boca e mastigado o quanto for necessário, lubrificado pela saliva formando-se o bolo alimentar. Fase oral (voluntária): a língua leva o alimento à parte posterior da cavidade oral até que o reflexo/reação de deglutição seja desencadeado. A língua realiza movimentos ondulatórios que funcionam como um pistão (êmbolo de uma seringa), transportando o bolo em direção à parte posterior da cavidade oral e faringe. Fase faríngea (involuntária- reflexa): a deglutição involuntária/reflexa leva o alimento pela faringe. As estruturas laríngeas movem-se para cima e para frente conforme a base da língua move-se para trás ao encontro da laringe. Os músculos faríngeos contraem-se, transportando o bolo ao longo da faringe. Fase esofágica: o alimento é levado pelo esôfago para o estômago. Fases da Deglutição Normal O que é disfagia? A disfagia é a dificuldade de engolir (deglutir) que pode apresentar-se de diferentes formas e ter diversas causas. Disfagia orofaríngea neurogênica: alteração da deglutição de causa neurológica, geralmente no tronco cerebral ou nos nervos que modulam o processo. Podemos observar também distúrbios dos músculos estriados da orofaringe. Disfagia esofagiana: os sintomas são freqüentemente caracterizados por um problema de transporte; o paciente tem dificuldade em transportar o alimento até o esôfago, uma vez que o bolo já tenha sido transferido através da faringe. Muitos pacientes, com esse tipo de disfagia, queixam-se que o alimento “para”, “não passa direto” ou sentem uma pressão no peito. Na disfagia esofagiana é mais provável que existam problemas em engolir sólidos. Disfagia mecânica: geralmente ocorre nos casos de pacientes que apresentem câncer de cabeça e pescoço, que tenham sido submetidos à cirurgia com ressecção de alguma estrutura dessa região. Fases da deglutição alteradas (disfagia) Quais são as causas mais comuns de disfagia? É importante reconhecer que a disfagia é um sintoma comum. Geralmente, resulta de uma doença de base. Muitas doenças e distúrbios podem produzir a disfagia. Além disso, essa pode ocorrer em qualquer idade, até mesmo na população pediátrica. Dentre as causas mais comuns estão: • Doenças neurológicas: Acidente Vascular Encefálico (AVE), Doença da Parkinson, Alzheimer, Esclerose Múltipla, Esclerose Lateral Amiotrófica, tumores cerebrais, paralisia cerebral, trauma • Doenças motoras como a Miastenia Gravis • Distrofias musculares • Lesões locais: tumores, ressecção cirúrgica da orofaringe • Cirurgia de cabeça e pescoço • Demências • Doenças da coluna cervical • Efeitos de medicamentos (como alguns antidepressivos, antibióticos, quimioterápicos) • Mudanças no sistema sensório-motor decorrentes do envelhecimento, entre outras Quais os sinais e sintomas de disfagia que o cuidador deve estar atento? Alguns pacientes não apresentam sinais ou sintomas de distúrbios na deglutição. Entretanto, outros demonstram sinais evidentes de dificuldades em deglutir. Os sinais mais comuns de disfagia são: • Tosse durante a alimentação e/ou deglutição de líquidos, ou até mesmo logo depois. • Voz molhada durante ou depois da alimentação e/ou deglutição de líquidos. • Aumento de secreção depois de beber ou comer. • Tempo de alimentação prolongado. • Deglutições múltiplas a cada colherada ou gole de líquido. • Dificuldade visível e esforço de mastigação ou deglutição. • Cansaço ou falta de ar durante a alimentação. • Pneumonias de repetição. • Perda de peso associada a aumento no tempo de alimentação. • Acúmulo de alimento na cavidade oral. • Regurgitação nasal: o alimento sai pelo nariz. • Dificuldades de deglutir remédios e certos tipos de alimentos. • Medo de deglutir, odinofagia (dor ao deglutir), engasgos. Quais são os outros fatores que podem influenciar o mecanismo de deglutição? Postura: uma postura adequada é extremamente importante para prevenir engasgos, tosse e pneumonia por aspiração. O paciente deve estar sentado com a cabeça pendendo ligeiramente para frente, auxiliando o fechamento do trato aéreo. Higiene bucal: higiene bucal precária em que placa, restos de alimentos, dentes em mal estado de conservação, com cáries são fontes de bactérias. O risco de aspiração é alto em idosos, que em geral aspiram a própria saliva, desenvolvendo assim um quadro de pneumonia de aspiração. Boca seca: pode ser causada por medicamentos ou ser resultante do processo normal do envelhecimento. Comportamento: em geral decorre de comprometimento cognitivo, da inabilidade em comunicar-se, de medicamentos que causem alterações do estado de consciência (exemplo: sonolência). Medicamentos: a presença de boca seca, como já mencionada é uma das consequências. Diminuição de apetite, lentidão nas respostas, incoordenação e lentidão nos movimentos orofaciais podem ser causados por certos tipos de medicamentos. Quais são as consequências da disfagia? A disfagia é uma condição altamente debilitante e pode ser fatal quando ameaça a saúde pulmonar, o estado de hidratação e a condição nutricional do paciente. A relação entre disfagia, desnutrição, desidratação e pneumonia aspirativa é complexa e interdependente. Como deve ser avaliado o paciente que apresenta disfagia? A avaliação da deglutição, em pacientes que apresentam disfagia, deve ser realizada pelo fonoaudiólogo para verificar a segurança e a possibilidade de alimentação por via oral. Algumas informações a respeito da alimentação do paciente são obtidas mediante consulta ao prontuário médico, e indivíduos encarregados de cuidar do paciente. Os procedimentos de avaliação incluem técnicas não-invasivas de: observação clínica, avaliação das estruturas orais e alimentação monitorados muitas vezes através da ausculta cervical (realizada com estetoscópio) e/ou oximetria de pulso. oxímetro estetoscópio A partir dos resultados e dados obtidos na avaliação, monitoramento da deglutição e reavaliação pode ser necessário a solicitação de um exame complementar, como por exemplo, o Estudo Dinâmico da Deglutição (também chamado de Videofluoroscopia) para diagnosticar de forma mais objetiva a deglutição. Estudo Dinâmico da Deglutição Orientações para o cuidador do paciente com disfagia: Postura: O alinhamento correto facilita a passagem do alimento pela faringe e do esôfago com menor comprometimento da respiração e da deglutição. Na cama o paciente deve manter a cabeça elevada. A cabeceira deve estar em um ângulo de 70 a 90 graus. Na cadeira o paciente deve manter-se sentado em posição ereta, a pélvis deve estar encostada na parte de trás da cadeira. Evitar a hiperextensão do pescoço, a cabeça deve estar pendendo levemente para frente, em flexão, protegendo a via aérea. Estratégias de Alimentação: • O cuidador que estiver administrando a alimentação deve se posicionar sempre na mesma altura do paciente. • Utilizar somente colher de chá para oferecer a alimentação, sendo uma colher de cada vez. • O cuidador não deve apressar as refeições, dar tempo para o paciente engolir para então oferecer a próxima colherada. • Não misturar alimentos de consistências diferentes, ao mesmo tempo, como por exemplo, líquidos e sólidos. • Não usar líquidos para fazer o alimento descer. • Quando for observada presença de resíduo alimentar depois da deglutição, uma colher vazia pode ser colocada na boca do paciente para incentivar uma deglutição em seco que limpe o resíduo deixado. • Caso o paciente apresentar tosse, não oferecer líquido imediatamente. A tosse é um reflexo de proteção, é preciso aguardar que ela cesse para então depois oferecer o líquido. Em virtude do paciente com disfagia ser considerado de alto risco nutricional e de hidratação, assim como risco de complicações pulmonares por aspiração, muitas vezes é necessário realizar algumas modificações na sua dieta por via oral. Os objetivos de modificar a dieta são: manter um nível nutricional seguro e adequado, reduzir o risco de aspiração. Através dos resultados da avaliação fonoaudiológica são definidas as modificações da dieta através da textura, temperatura e viscosidade dos alimentos para cada indivíduo com disfagia. Em algumas situações, os pacientes apresentam sinais clínicos de aspiração com líquidos, nesses casos os líquidos são modificados para líquidos engrossados, espessados (néctar). Segue a definição de texturas: Líquidos: líquido ralo; como exemplo a água. Néctar (líquidos engrossados): semelhante ao suco de ameixa ou de tomate. Mel (pastoso fino): semelhante ao mel (mais espesso que o néctar). Pastoso: consistência de pasta (não muito fina). Pudim/mousse (pastoso grosso): consistência de pudim, semelhante ao purê de batatas. Semissólido: alimentos sólidos que se tornam pastosos na cavidade oral quando mastigados; exemplos: banana inteira, galinha desfiada com molho, batata cozida. Sólidos: alimentos mais duros, que necessitam ser mastigados e triturados; exemplos: carnes, pão, maçã. É importante salientar que as modificações na dieta só devem ser feitas após avaliação fonoaudiológica e com orientação nutricional para que o paciente não corra riscos de desnutrir, desidratar e aspirar o alimento. Em alguns casos de disfagia, pode se indicada uma via alternativa de alimentação como: gastrostomia, jejunostomia, sonda nasoentérica ou nasogástrica. Principalmente em pacientes que a via oral não é segura ou quando o aporte nutricional por via oral não está sendo suficiente. Considera-se importante salientar que no caso de pacientes com disfagia sem diagnóstico ou tratamento adequado, a desnutrição progressiva e suas seqüelas podem aparecer. Geralmente, o diagnóstico da disfagia requer avaliações clínica e complementar. Quando diagnosticada e identificada, é possível iniciar um programa de reabilitação que reduza risco de complicações respiratórias e/ou desnutrição. Esse tratamento deve ser feito sempre em conjunto com uma equipe multidisciplinar (médico, nutricionista, fonoaudiólogo, fisioterapeuta, entre outros profissionais que estejam envolvidos com o processo terapêutico do paciente com disfagia). Referências BERSCH, R.; SCHIRMER, C. Tecnologia Assistiva e Educação Inclusiva. In: Ensaios Pedagógicos Construindo Escolas Inclusivas. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Especial. Brasília, DF, 2005. BRAUER, C; FRAME, D. Manual de Disfagia - Guia de Deglutição para Profissionais da Saúde e Famílias de Pacientes Dsifágicos. 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