Principais avanços no tratamento de câncer de

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asco gu
Principais avanços no tratamento de
câncer de próstata, bexiga e rim
E
Divulgação
M 2014 CELEBRAMOS O 10º ANO DO SIMPÓSIO DE
CÂNCER GENITURINÁRIO (ASCO GU), OCORRIDO EM SÃO FRANCISCO, NOS ESTADOS UNIDOS.
Neste ano tivemos um recorde de público, somando mais de 3,1 mil médicos inscritos, entre oncologistas clínicos, urologistas e radioterapeutas,
sendo que 53% vieram de outras partes do mundo,
inclusive do Brasil.
Entre 30 de janeiro e 1º de fevereiro, pudemos
relembrar o progresso destes últimos dez anos em
apresentações sobre câncer de próstata, câncer
urotelial e câncer renal, além de apresentações científicas e educacionais direcionadas para as dificuldades e os triunfos do passado, sempre gerando
discussões polêmicas de temas com potencial de
mudar a prática clínica em um futuro próximo.
Este artigo discutirá os principais pontos apresentados no ASCO-GU 2014 nos temas de câncer
de próstata, bexiga e rim.
Câncer de próstata
Adriano Gonçalves e Silva
* Médico oncologista clínico
do ICTr – Instituto do Câncer e
Transplante – Curitiba, Board
Certified em oncologia clínica
pelo ABIM e ex-fellow em
oncologia clínica na Ochsner
Clinic, New Orleans, LA, EUA
Contato:
[email protected]
A uro-oncologia viu nos últimos anos o número
de drogas disponíveis para o tratamento do câncer
de próstata resistente a castração aumentar de um
(docetaxel) para seis (sipuleucel-T, cabazitaxel, abiraterona, enzalutamida e radium-223). Em 2013, a
apresentação do estudo AFFIRM, que demonstrou
benefício de sobrevida em pacientes tratados com
enzalutamida, e previamente tratados com docetaxel, gerou aprovação dessa droga pelo FDA (EUA)
e pelo EMEA (Europa).
Neste ano, outro estudo envolvendo enzalutamida chamou atenção dos participantes. No estudo de fase III – PREVAIL (abstract LBA1)1, 1.717
pacientes com câncer de próstata resistente a castração, assintomáticos ou levemente sintomáticos,
receberam 160 mg de enzalutamida ou placebo de
maneira duplo-cega. Os resultados foram revelados
após uma análise interina, que definiu que os desfechos primários do estudo, sobrevida global e
progressão radiológica, atingiram melhoras dramáticas. Após um acompanhamento médio de 22
meses, enzalutamida reduziu o risco de morte em
29% (HR=0,706 95% CI (0,60-0,84); p<0,0001)
e o risco de progressão radiológica em 81%
(HR=0,186 95% CI (0,15-0,223); p<0,0001). Outros desfechos secundários atingidos pelo estudo
foram taxa de resposta radiológica pelo critério
de RECIST de 59% e queda do PSA acima de
50% e 90% de 78% e 47%, respectivamente. Outro
dado importante do estudo foi o prolongamento do
início de quimioterapia citotóxica em 17 meses
(HR=0,35, 95% CI (0,30-0,40); p<0,001), em que
pacientes que receberam placebo iniciaram, em
média, docetaxel em 10,8 meses, enquanto pacientes que receberam o novo antiandrogênico iniciaram quimioterapia em 28 meses. Com esse estudo,
enzalutamida passa a ser mais uma opção para pacientes assintomáticos resistentes a castração, assim
como abiraterona e docetaxel. Apenas aguardamos
a análise das agências reguladoras para sabermos
quando estará disponível no Brasil.
O grupo escandinavo de câncer de próstata
apresentou resultados do estudo VII e atualização
do estudo IV. O estudo VII mostrou o benefício na
adição de radioterapia ao bloqueio hormonal completo em pacientes com câncer de próstata de alto
risco. A mortalidade câncer específica aos 10 e aos
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“Os últimos anos
mudaram muito
o modo como
entendemos e
tratamos
pacientes com
câncer renal”
15 anos reduziram de 18,9% e 30,7% para 8,3% e
12,4%, respectivamente (abstract 4)2. Já o estudo
IV, apresentado em 2013 como um estudo de não
inferioridade, comparando 18 e 36 meses de bloqueio hormonal adjuvante à radioterapia em pacientes com câncer de próstata de alto risco,
mostrou uma melhor qualidade de vida principalmente no que se refere a sintomas sexuais e relacionados ao hormônio (abstract 5)3. Os efeitos
colaterais da terapia hormonal também foram tema
da apresentação do grupo da Universidade de Vanderbilt (EUA), que mostrou maior risco de diabetes
melito e eventos cardiovasculares em pacientes
acima de 70 anos (abstract 31)4.
Dois artigos chamaram a atenção sobre a utilização de novas drogas no câncer de próstata, ipilimumabe e orteronel (TAK-700). Em uma análise
retrospectiva do estudo CA184-043, ipilimumabe
parece ter maior efeito em pacientes com melhor
prognóstico. Em pacientes com fosfatase alcalina e
hemoglobina próximos do normal e sem doença
visceral, a sobrevida global foi de 22,5 meses para
o grupo que recebeu ipilimumabe, comparado com
15,8 meses para pacientes que receberam placebo
(HR=0,61) (abstract 2)5. Já o estudo internacional,
randomizado de fase III ELM-PC5, que analisava o
uso do novo inibidor da CYP17, orteronel (TAK700), foi terminado por não atingir o desfecho
primário de sobrevida global em pacientes previamente tratados com docetaxel. No entanto, na
população não europeia e não americana os benefícios foram significativos. Além disso, orteronel
mostrou um benefício na sobrevida livre de progressão, mostrando ter atividade significativa na
doença que pode ter sido mascarada pelo desenho
do estudo (abstract 7)6.
Câncer urotelial
Câncer de bexiga parece ser a ovelha negra dos
tumores do trato geniturinário, por não ter apresentado os avanços dos últimos dez anos como no
câncer de próstata e no câncer renal. Ineficácia no
estadiamento, idade avançada ao diagnóstico e não
oferecer tratamento curativo aos pacientes são alguns dos motivos para essa falta de progresso.
Porém, a escassez de estudos prospectivos e a difi-
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março/abril 2014 Onco&
culdade de arrolar pacientes nos poucos que existem continuam sendo os maiores obstáculos.
Mesmo assim, alguns estudos trouxeram benefícios
a pacientes com câncer de bexiga.
Em pacientes não candidatos a cistectomia ou
que recusaram cirurgia para o tratamento do câncer
de bexiga, a quimiorradioterapia tem sido usada em
um período de indução, seguida de avaliação cistoscópica após 40Gy. Tradicionalmente, apenas pacientes com resposta completa (T0) completavam
o tratamento com intenção curativa. Em uma análise de dois estudos do RTOG (9906 e 0233), pacientes com resposta quase completa, ou seja,
pacientes que na cistoscopia de intervalo tenham
resultado da biópsia Ta ou Tis, tiveram um risco de
recorrência ou necessidade de cistectomia semelhante ao de pacientes com resposta completa (T0).
Após um acompanhamento médio de 5,9 anos, pacientes com resposta T0 tiveram uma taxa de recorrência de 35,6%, enquanto pacientes com resposta
Ta/Tis tiveram 27,8% (p=0,52). A sobrevida em
cinco anos também foi semelhante, 72% e 61%,
respectivamente (abstract 284)7.
Dados do Cancer Genome Atlas em relação a
tumores de bexiga foram apresentados. Após analisados 131 espécimes de tumores não tratados, as
múltiplas alterações envolvidas chamaram atenção.
A presença frequente de alterações do HER-2 abriu
uma esperança na terapia-alvo no câncer urotelial.
O estudo de fase I/II RTOG 0524 analisou o uso de
paclitaxel concomitantemente com radioterapia
e traztuzumabe em pacientes com expressão de
HER-2. Taxas de resposta completa foram de 60%
em ambos os grupos, mas o índice de complicações
hemorrágicas e gastrointestinais de 30% preocupam (abstract LBA 287)8. Esse estudo cria uma
grande expectativa para o futuro, por ser o primeiro tratamento baseado em biomarcador em carcinoma urotelial.
Câncer de rim
Os últimos anos mudaram muito o modo como
entendemos e tratamos pacientes com câncer renal.
Das múltiplas mutações à grande heterogeneidade
intratumoral já descrita, dos inibidores de tirosina
kinase e mTOR aprovados ao futuro da imunotera-
pia com os novos anticorpos contra PD-1 e PDL-1, o último dia do
simpósio foi reservado apenas para neoplasias renais. Primo Lara da
UC Davis Cancer Center destacou em sua apresentação as cinco histórias de sucesso em CCR na última década. Foram elas: 1. Maior entendimento da biologia do CCR; 2. Rápido desenvolvimento de drogas;
3. Melhora no prognóstico dos pacientes; 4. Avanços em técnicas de
nefrectomia parcial; e 5. Melhora no tratamento multidisciplinar.
James Larkin, do Hospital Royal Marsden, no Reino Unido, por
sua vez, reforçou a heterogeneidade dos CCR, onde 65% das mutações
encontradas em uma lesão não são encontradas em suas metástases.
Após a mutação inicial (driver mutation), o CCR passa a uma série de
mutações de maneira ramificada e evolucionária. Se assumíssemos que
a perda do VHL estivesse no tronco da árvore evolutiva do tumor, ela
seria seguida por diversas mutações subclonais que ocorrem em diferentes áreas do tumor primário e de suas metástases. Sendo assim, o
tratamento deve sempre focar o tronco desta árvore, i.e. a mutação encontrada em todas as áreas (driver). Contudo, a emergência de clones
resistentes é inevitável, e a imunoterapia surge como uma grande expectativa em reprogramar o sistema imune a fim de combater o câncer
de forma dinâmica.
Tradicionalmente dividimos os pacientes com CCR metastático em
grupos prognósticos usando o modelo do MSKCC ou os critérios de
Motzer. Um estudo do Consórcio Internacional de Banco de Dados de
CCR metastático (IMDC) criou uma nova classificação baseada em
dados como performance do paciente, tempo entre diagnóstico e tratamento, anemia, plaquetopenia, neutrofilia e hipercalcemia. Dando
um ponto para cada critério e estratificando os pacientes em risco
baixo (zero ponto), intermediário (1-2 pontos) e alto (3-6 pontos), o
modelo distingue com grande acurácia a sobrevida dos três grupos,
43,2 meses, 22,5 meses e 7,8 meses, respectivamente. Esse modelo é
o primeiro desenvolvido na era dos inibidores de tirosina kinase. Embora o modelo do IMDC seja mais eficaz que modelos anteriores, ainda
necessitamos de modelos que levem em conta alterações biométricas
e genômicas específicas de cada caso, como os biomarcadores MET,
PD-1, BAP1.
A nefrectomia radical, mesmo em pacientes com doença metastática, continua sendo terapia padrão no tratamento do CCR, porém não
há nenhum estudo prospectivo após a era dos inibidores de tirosina
kinase mostrando benefício dessa estratégia. Em uma análise do
IMDC, a sobrevida global foi de 20,6 meses para pacientes submetidos a cirurgia radical, contra 9,5 meses para pacientes não operados
(HR=0,60; p<0,0001). No entanto, o benefício parece ser maior para
pacientes com prognóstico pré-tratamento maior que 12 meses, enquanto pacientes de mau prognóstico (i.e. IMDC > 4 fatores) não se
beneficiariam de nefrectomia citorredutora (abstract 396)9.
A terapia-alvo mudou a história do CCR, com drogas como sunitinibe, pazopanibe, sorafenibe, temsirolimus, everolimus e bevacizumabe. A dúvida está em saber qual seria o melhor sequenciamento
entre elas. O estudo SWITCH randomizou pacientes para começarem
com sunitinibe e trocarem para sorafenibe na progressão, ou viceversa. Sobrevida livre de doença e sobrevida global foram semelhantes
em ambos os braços do estudo, sendo 12,5 e 31,5 meses na sequência
So-Su e 14,9 e 30,2 na Su-So, respectivamente (abstract 393)10.
Muitas dúvidas permanecem: qual é o melhor acompanhamento
de pacientes com doença localizada? Como diagnosticar pacientes com
recidivas tardias? Um estudo de revisão de 3.725 casos de CCR operados entre 1970 e 2008 mostrou que, baseados em protocolos como os
da Associação Americana dos Urologistas (AUA) e do National Comprehensive Cancer Network (NCCN), deixamos de diagnosticar em
torno de 30% a 65% das recidivas, e que um acompanhamento baseado
no estádio, prognóstico e padrão de recidiva identificaria pacientes que
deveriam ser acompanhados por até 10-20 anos (abstract 402)11.
Por fim, o tópico mais aguardado do simpósio: os dados sobre a
nova classe de imunoterápicos, os anti-PDs, sejam anticorpos monoclonais contra PD-1 ou seu ligante PDL-1. Em tumores geniturinários,
principalmente o renal, os dados são apenas de pequenos estudos de
fase I/II, mostrando respostas duradouras para um grupo seleto de pacientes. A toxicidade existe, porém é facilmente manejada ambulatorialmente. Estudos de fase III estão em andamento, incluindo um
estudo comparando nivolumabe a everolimus em pacientes que progrediram com outra droga. Resultados desse estudo não devem ser divulgados até 2015. Antes disso, aguardamos os resultados de estudos
em outros tipos de tumores, como melanoma e carcinoma pulmonar
de células não pequenas, que devem ser publicados em breve.
Tenha acesso aos links para as pesquisas divulgadas na ASCO GU no site da revista Onco& • http://revistaonco.com.br/noticias/dez-anos-de-asco-gu/
Onco& março/abril 2014
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