A GEOGRAFIA POLÍTICA NO PERÍODO INTERGUERRAS O objetivo do nosso trabalho é dar continuidade aos estudos da geografia política e geopolítica. Nosso foco será voltado ao período do Interguerras a partir da interpretação do capítulo IV do livro “GEOGRAFIA POLÍTICA E GEOPOLÍTICA: Discursos sobre o Território e o Poder” de Wanderley Messias da Costa. Nesse capítulo o autor analisa as idéias de dois autores que se dedicaram ao tema: Isaiah Bowman e Karl Haushofer. Antes de entrarmos propriamente no tema, é preciso entender o contexto em que esses dois pensadores estavam inseridos. O período entre-guerras ocorreu entre 1919 e 1939, e foi denominado por Eric Hobsbawn como o intervalo entre o primeiro e segundo tempos da guerra mundial. Na Alemanha ocorria um grande sentimento de inferioridade por ela ter sido vencida e não possuir mais seus recursos e territórios. Já a França apesar de isolada politicamente, não mediu esforços para tentar evitar uma possível ascensão alemã. O Império Britânico, apesar de ainda dominar os mares, já não atuava como antes em relação à administração das suas colônias e se via cada vez mais dependente dos Estados Unidos. Este, por sinal, tornava-se uma potência e assumia uma postura “isolacionista”, ou seja, não tomou nenhum partido. Esse período não foi somente uma disputa por territórios, mas também uma disputa por poder político e econômico, em decorrência das transformações ocorridas com segunda revolução industrial e um conseqüente capitalismo, cada vez mais incorporado. Os estudos dos geógrafos da geografia política e da geopolítica produzem balanços, sempre apontando a presença ostensiva das mediações particulares, na maioria deles, está associada à nacionalidade do autor. Em outros, sobressaem a tentativa de neutralidade e imparcialidade. 1. Isaiah Bowman e o balanço do Pós-Guerra. Bowman publicou em 1921 um estudo sobre o quadro europeu e mundial do pós 1ª guerra, surgido nos EUA sob o titulo de The New World. Geógrafo dos anos 20 que teve interesse pela geografia política, foi membro da comissão constituída pelos EUA para realizar estudos preparatórios para a Conferência de Paz, trabalhou em Paris de 1917 a 1919. Constituiu um “Serviço de Informações Cientificas” que lhe permitiu acesso a material empírico sobre fatos de todo tipos relacionados aos temas integrantes da Conferência. O seu livro, publicado na França em 1928, foi traduzido e republicado, porém com certa desconfiança por ser um norte-americano analisando os efeitos de uma guerra européia. Brunhes, que fez o prefácio do livro, deixa claro que se trata de uma visão americana da Europa. A famosa escola francesa queria publicar ela mesma sua avaliação do conflito. O primeiro foi Albert Demangeon e para ele a guerra destruiu a riqueza material dos europeus e também perdera o seu papel de liderança no mundo. Os norte-americanos logo transformaram a Europa em sua zona de domínio econômico, financeiro e industrial, a “velha Europa” tornar-se-á uma “terra de colonização” para a “jovem América”. Bowman aponta para os riscos de instabilidade nas relações interestatais criado pelo desfecho da própria guerra. O velho status quo político-territorial dos antigos Impérios achava-se estilhaçado, as minorias buscavam abrigo em novos Estados. Apresenta uma lista com 32 diferentes contestações e reinvidicações territoriais, apenas na Europa Central após a guerra e registra-se que na Áustria-Hungria quando o governo queria fazer um comunicado, tinha que fazer em 18 línguas diferentes. A intenção de criar uma “zona de contenção“ entre dois grandes Estados continentais (a URSS e a Alemanha), era disputar o domínio do que Mackinder chamava de “coração continental” ou “heartland”. Os “Estados tampões” são as novas unidades territoriais na região que garantia a Inglaterra e França a possibilidade de alianças e mesmo domínio, desde a Europa Centro Oriental até o Oriente Médio e o norte da África. A Alemanha vencida e humilhada, com perdas territoriais e populacionais consideráveis, com destaque para a Alsácia-Lorena e o Oeste polonês, e pesadas indenizações imposta pelos vencedores é um quadro de instabilidade potencial que Bowman traduz como uma autêntica “desorganização universal”. Em sua análise, ele aborda cada império colonial e paises que tiveram alterados, em graus variados os seus status quo territorial, político e econômicos devido ao conflito armado. O Império Britânico teve perdas de homens e de frota naval, porem foi conservado o seu poder marítimo. Bowman chama a atenção para a entrada, no cenário de pós-guerra, de uma potência mundial, os EUA, que possuía uma disputa pacífica com o Império Britânico na região do continente latino-americano, no Atlântico e no Pacífico. Outro fato a ser destacado é o processo de independência do Egito, um quadro político complexo com disputas entre ingleses, franceses e turcos. Os ingleses, derrotados na guerra e os turcos incentivando a independência dos movimentos nacionalistas. Mas a maior preocupação era com o domínio do canal de Suez, tão importante como o canal do Panamá.Em 1922 é declarada a independência, porém com a manutenção da vantagem à Inglaterra nas comunicações marítimas através do canal. A situação da França era bastante diferente da Inglaterra. Para Bowman a guerra quase arruinou o pais. Com 1,5 milhões de mortos a estrutura produtiva foi quase completamente destruída. Os males causados pela Alemanha ao pais foram tantos que as indenizações de guerra jamais seriam suficientes para a reconstrução. Ele destaca apenas um ganho efetivo para o pais, a reconquista dos territórios da Alsácia-Lorena, ricos em ferro, carvão, potássio e petróleo. A situação da Alemanha no pós-guerra é examinada sob dois ângulos: A questão nacional, com o desdobramento “pangermanico”. As conseqüências, especialmente, geopolíticas com as perdas territoriais. Para Bowman, mesmo com a derrota e o fim do império, as condições para retomada do “pangermanismo” como estratégia nacional foram mantidas. O ressentimento pelas perdas de território também poderiam reacender o velho sonho expansionista em direção ao Leste. Com a guerra a Alemanha perdeu 13 % da sua superfície mais as colônias e 12 % da população. A avaliação da situação alemã do pós-guerra também foi feita por geógrafos alemães, Otto Maull, Arthur Dix e Karl Haushofer. Os dois primeiros acreditavam que o balanço do pós-guerra aparece como parte de grandes ensaios geopolíticos. Arthur Dix fez um exame mais detalhado do pós-guerra. O interesse nacional é evidente em suas observações e interpretações da situação européia após o conflito, em especial a situação alemã: - a disputa da Alemanha com a França pela Alsácia Lorena, a Rússia com os problemas em torno do Vistula, Constantinopla e Dardanelo. - no fundo a disputa das rotas que ligavam a Ásia anterior ao oceano índico. - a ameaça Russa, a Áustria-Hungia, aliado alemão pela questão com a Servia, com a Inglaterra, o antagonismo alemão, baseava a disputa estratégica em torno da competição do poder naval em nível mundial. A Alemanha, encontrava-se cercada por antagonismos e ameaçada pelas “potencias mundiais”. O balanço de Dix coincide com o do geógrafo Bowman, quanto à potencialidade de um novo conflito no futuro: “O mapa atual da Europa tem aspectos, desfavoravelmente, repartidos, pois as fronteiras usam critérios puramente convencionais, sem que coincidam com limites etnográficos...são bastante arbitrários e é quase seguro que em prazo curto constituirão um verdadeiro celeiro de discórdia”. Otto Maull em Geografia Política de 1925 utiliza termos irônicos referentes ao trabalho de Bowman por conter fatos em série e esquemas mnemônicos. Bowman replica e diz que “esquemas mnemônicos” e não científicos são os quadros de Maull, que contem uma classificação das nações segundo o seu “quociente colonial”, índice que expressa o seu poder frente as outras. Maull dá grande ênfase, tal como Dix, ao modo como os aliados “reconstituíram” a Europa Central, Centro-Oriental e Balcânica, a partir da desagregação dos Impérios Centrais, especialmente o da Áustria-Hungia. A alteração no quadro geopolítico da Europa Central Oriental provocada pelos tratados do pós-guerra, não envolveu apenas os territórios dos desagregados impérios centrais (Alemanha, Áustria-Hungia, Turquia) derrotado pelos aliados. A Rússia, que se tornara Estado Socialista em 1917 retira-se da guerra, e apesar de ter lutado ao lado dos vencedores, acaba constituindo-se no novo e perigoso inimigo para todas as potências, até para a Alemanha. As novas “zonas de contenção, “estados-tampões” ou “cordões –sanitárias” visam neutralizar possíveis expansões futuras, não apenas dos alemães, mas também da URSS. A Rússia Soviética ao termino da guerra perdera território e sofreria conseqüências equivalentes as da Alemanha, apesar da sua condição singular de potencia que lutara na guerra ao lado dos aliados. No balanço pós-guerra de Bowman sobre a situação soviética a sua preocupação com o comunismo e a ameaça potencial no novo Estado sobre os paises “livres”. nesse sentido , faz coro às advertências de Mackinder. Maull tem o mesmo ponto de vista, mas com uma análise mais apurada. Trata-se da tomada do poder por uma minoria, apoiada pelo operariado e, secundariamente, pelos camponeses.Ambos os autores apontam para a estrutura interna precária do novo Estado, marcado por perdas territoriais, crises econômicas e pelo sentimento separatista ou autonomista de muitas etnias da região. Sobre os EUA, que entrou na guerra em fins de 1917, houve mais comentários sobre a participação em Versailles e no Tratado de Paz do que na contribuição para o desfecho do conflito. Uma unanimidade entre as análises é que antes mesmo da guerra, os EUA já era uma potencia econômica do globo, mas não se traduzia em hegemonia política no quadro internacional. Uma pesquisa de Paul Kennedy, em 1914 faz um comparativo entre as potências: EUA - 37 bilhões de Renda Nacional Bruta Inglaterra – 11 bilhões de Renda Nacional Bruta Alemanha – 12 bilhões de Renda Nacional Bruta Rússia – 7 bilhões de Renda Nacional Bruta França – 6 bilhões de Renda Nacional Bruta EUA – 400.00 km de ferrovias Rússia – 75.000 km de ferrovias EUA – 455.000.000 tonelada de produção de aço Inglaterra – 292.000 tonelada de produção de aço Alemanha – 277.000 tonelada de produção de aço EUA eram a 3° maior marinha do mundo, com 19% dos recursos federais em investimentos. Maior produtor de petróleo e produzia mais ferro-gusa que os três outros grandes produtores seguintes. Possuía mais veículos que o resto do mundo junto. “Os Estados Unidos tinham se tornado uma grande potência, mas não era parte do sistema de grandes potências.” Sua entrada na guerra passou por grandes discussões internas, sendo que até 1917 limitava-se a apoiar materialmente a Inglaterra e a França. Dada a sua situação econômica privilegiada, fez-se sentir muito mais pelo poderio material e financeiro que propriamente militar. Os débitos de guerra para os EUA garantiram a sua supremacia, aliada ao fato de que o pais só tivera estímulos positivos em sua economia e, nenhuma conseqüência direta em seu território. Os analistas encontraram apenas duas contradições no “debut” norte-americano: 1° o aparente inexplicável isolamento do pais nos anos da pós-guerra e 2° pelo tratamento com a dívida dos aliados. Daí o comportamento irônico dos franceses em relação a Bowmam. O julgamento do próprio Bowman dessa contradição na política externa do seu país parte da ignorância em que se encontram geralmente os americanos das questões da política e da geografia universais. Esse alheamento do país justificava-se pelo fato de que “o pensamento não é imperialista” em questões internacionais, já visto nas relações internas a política do “big stick”. Mesmo entre os aliados a desconfiança com a “nova potencia” é generalizada. Essa desconfiança, como exemplo extremo, são o caso dos franceses e os alemães. Os franceses pela rejeição do Tratado de Versailles pelo senado americano. Os alemães pela tendência Imperialista, de conquistar territórios e consolidar a hegemonia no continente. Os EUA emergem na guerra como uma potência capaz de alterar radicalmente o horizonte da política internacional. Para Bowman quanto à cobrança da divida dos aliados, não vê solução imediata de inteiro agrado dos devedores, como a suspensão, mas sim, uma negociação. Ao dedicar-se ao balanço da Primeira Guerra Mundial, a geografia política ganhou enorme impulso. De todos os lados envolvidos no conflito, brotaram análises muitas vezes também divergentes, como demonstrar as dificuldades intrínsecas de se produzirem estudos dessa natureza absolutamente imparciais ou “neutras”. Bowmam acabou saindo-se bem da espinhosa empreitada, os franceses como J. Ancel e Damangerom, mal conseguiram disfarçar os ressentimentos e a rivalidade com os alemães. Já os alemães, como Maull e Dix, apesar do esforço em produzir estudos completos numa perspectiva globalizante, acabaram denotando vieses germanófilos explícitos. O confronto entre as vertentes acadêmicas e instrumentos da geografia política estava indiscutivelmente aberto. 2. Karl Haushofer e a geopolítica alemã: a geografia política vai à guerra Karl Haushofer, general-geógrafo, é considerado um dos mais polêmicos e conhecidos integrantes da escola de geopolítica de todos os tempos. A partir das idéias de Ratzel e com influência direta de Kjellen é que se desenvolve a geopolitik, contextualizada no período interguerras e com grande repercussão dentro e fora da Alemanha. Além disso, é utilizada, principalmente, em estudos estratégicos em países de 3º mundo, e também ganha adeptos nos setores militares norte-americanos. Em razão de conteúdo polêmico, geopolitik desencadeia grandes reações críticas, o que inspirou debates teóricos e científicos em torno da geopolítica. A França sempre esteve alerta ao que era produzido na Alemanha, tanto que Vidal de La Blache contestou Ratzel e desde o início da geopolítica alemã, A. Demangeon e J. Ancel questionaram seu caráter científico. A reação norte-americana coincidiu com o início da 1ª guerra mundial em razão da falta de caráter científico, pelas idéias expansionistas e totalitarismo e, sobretudo, visando desmistificar essas idéias. Dentre os geógrafos responsáveis pelas reações dos EUA podemos citar I. Bowman, R. Hartshone, H. Weight, A. Dorpallen e D. Whittlessey. “Como exemplo da repercussão das idéias da “geopolitik” é possível citar uma reportagem da revista Reader’s Digest: ”Os mil cientistas que existem por detrás de Hitler”. O nível de envolvimento de Haushofer com os nazistas nunca foi totalmente esclarecido, mas suas idéias aparecem fortemente incorporadas em “Mein Kampf (Minha luta, livro escrito por Hitler). Dorpallen diz: “No curso dessa visita, Hitler foi iniciado nos mistérios da geopolitik. Ali Haushofer pontificou sobre a necessidade de do “espaço vital” e deu a Hitler um de seus mais efetivos argumentos para suas subseqüentes loucuras”. Apesar da forte ligação com as idéias nazistas, Haushofer não era nazista e nem poderia, já que sua esposa possuía ascendência judia, e, além disso, suas idéias transcendiam muito mais no âmbito militar do que no ideal nazista. Haushofer sempre negou sua participação no livro de Hitler e, alegava que só fiou sabendo da obra após sua publicação. Apesar das diferenças, o geógrafo sempre demonstrou agrado em relação à política externa do regime. Com o passar do tempo, discorda cada vez mai da prática armada e renuncia aos seus “postos de responsabilidade”. Mesmo com seu afastamento, os julgamentos sofridos dentro do meio acadêmico continuaram. Dentre os críticos havia Carl Troll que publicou artigo que, mais uma vez, questionava o viés científico da geopolítica de Haushofer. A crítica de Troll tratava do interesse da “geografia cultural” pelos nacional-socialistas e da “geografia econômica” às autarquias políticas. Um ponto considerado positivo por Troll foi a “consciência ecológica” em que havia preocupação com a preservação e as formas de uso da natureza: “A tendência de proteger a paisagem natural contra a agricultura extensiva do homem, de manter a fertilidade do solo, a sua economia de água e cobertura vegetal, num equilíbrio harmonioso, tomou incentivo na ciência e técnica moderna, com a crescente destruição da natureza. O movimento de proteção da natureza generalizou-se nos últimos decênios em quase todo o mundo... Também na Alemanha, o movimento envolveu a ciência e a imprensa. O ponto de partida da iniciativa oficial foi saída do decreto de proteção à natureza de 1935, ao qual se seguiu em 1936, o primeiro Congresso de Proteção à Natureza.” Troll falava também da relação da geografia com a geopolítica de Haushofer e a considerava a “degenerada filha da geografia”. Sua geopolítica causava admiração e repulsa. Essa repulsa não era claramente declarada devido ao receio da ligação de Haushofer com o nazismo. Apesar disso dois Marxistas G. E. Graff e J. F. Horrabin questionaram de forma direta a geopolitik, principalmente diante da tentativa de relacioná-las aos materialismos geográficos e históricos. Na França havia a crítica à geopolítica alemã, porém era generalizada e não apenas em relação à geopolítica de Haushofer. Para Troll a geopolítica alemã foi superestimada, o que contribuiu para o caráter “pseudocientífico” dos projetos nazistas e mitificada, em razão da divulgação da existência de um grandioso instituto de geopolítica, que na verdade era bem pequeno dentro da Universidade de Berlim e dirigido pelo filho de Haushofer. Após 1945, Haushofer passa por diversos interrogatórios e julgamentos com a acusação de ser colaborador do nazismo. Defende-se utilizando a ascendência judia de sua esposa, a censura de seu livro por Hitler, a prisão sob a acusação de participação no atentado contra o Fuhrer e o assassinato de seu filho pela GESTAPO. Segue um trecho de sua carta-testamento: “a partir do outono de 1938 começa o calvário da geopolítica alemã no interior do calvário da ciência política de toda a Europa central; ela foi esmagada pelo poder absoluto de um partido: os órgãos oficiais abusaram dela e a desfiguraram”. Haushofer teve a vida vasculhada e sua biblioteca confiscada. A fim de legitimar sua geopolítica, fala de suas inspirações em Ratzel e das influências do geógrafo alemão nas obras de outros nomes importantes como: E. Semple, T. Mahan, I. Bowman, H. Mackinder e Kitchener. Todas essas justificativas estavam em sua carta testamento, que foi entregue a E. Walsh, geopolítico norte americano de Georgetown, que assumiu o papel de mentor de Haushofer. Por fim, foi proibido de lecionar na Universidade de Munique e juntamente com sua esposa, comete suicídio em 1946. A geopolítica de Haushofer primava pela aplicação de técnicas e ele mesmo afirmava que não possuía preocupação com fundamentos. Seu contato com a obra de Kjellen, em suas palavras “abriu-lhe os olhos”, pois salientava a relação entre solo e estado, as pesquisas etnopolíticas (povo e raça) e reflexão sociopolítica. Defendia que a questão partidária deveria ser deixada de lado, ou seja, que a aplicação da geopolítica deveria servir igualmente à extrema esquerda e a extrema direita. Os governos é que deveriam saber usá-las conforme suas pretensões. Quanto à previsão de acontecimentos, Haushofer dizia que não ultrapassava 25% de assertividade, já que a imprevisibilidade é uma característica intrínseca da política. Por esse motivo dizia que a geopolítica deveria tomar o lugar da paixão política. “Além disso, leva ao extremo o determinismo territorial de Ratzel, dizendo que o “espaço vital” rege a história da humanidade” e como Ratzel, condenava povos que se conformavam com pequenas comodidades. “Só uma nação cujo espaço se ajusta às suas necessidades, tanto espirituais como materiais, pode ter esperança de alcançar verdadeira grandeza.” O conceito de “espaço vital” de Ratzel entra em seus estudos pela necessidade de relação entre espaço e população. Além desse conceito, há também as idéias malthusianas de crescimento demográfico e de produção de alimentos, que para ele prejudicava a evolução e desenvolvimento de uma nação. Chega a citar o Brasil, no que se refere a quantidade de migrantes alemães, italianos e japoneses, o que caracterizaria a “falta de domínio do espaço”. Conclui que é uma geopolítica universal, pois o que é aplicado à Europa, não pode ser aplicado ao EUA, por exemplo. “Para nós, os alemães, é da maior importância que compreendamos que carecemos até do mínimo espaço vital. A educação política mundial da Alemanha deve, portanto, fazer compreender incansavelmente que a mutilação de nosso território nacional é intolerável”. Essa situação alemã o leva aos conceitos de “fronteiras vivas” ou “móveis”, autênticos “organismos vivos” e consideram os povos da Europa Central, essas “fronteiras vivas” por possuírem esse “instinto geográfico”. Afirma que o caráter jurídico não é capaz de dar conta desse sentimento enraizado. Outra preocupação de Haushofer diz respeito a não renunciar ao Leste, onde a Alemanha possuía grande papel histórico. A geopolítica de Haushofer associa a luta por espaço a um povo racialmente homogêneo, mas sua concepção sobre raça diz respeito aos traços centrais de um povo. A partir disso defendia que direitos políticos só deveriam ser concedidos a quem demonstrasse fidelidade ao Reich. Repudiava os Estados Democráticos, onde o indivíduo voltava-se contra o próprio Estado. Repudiava também o comunismo e o marxismo que tentavam desestabilizar a Alemanha, e com a anexação da Áustria proclamavam que todos os alemães um dia “abriguem-se em uma única tenda”. Lamentavam que poucos Estados podiam contar com uma nação racialmente homogênea, o que provocaria “movimentos centrífugos” dificultando a política estatal e cita os problemas originados pelas “raças de cor”, excetuando-se as pacíficas. “Só na França esse problema se complica pelos perigos que encerra a promiscuidade com a gente de cor. A política francesa tem criado, inescrupulosamente, um foco de infecção que atenta contra a pureza da raça branca do continente europeu” Quanto aos EUA: “Em nossos dias, a política interior de um estado orgânico deve prestar atenção preferencial ao preceito de seleção racial. É por isso que a manutenção do princípio ariano e a questão judia desempenham um importante papel na Europa”. Hanna Arendt disse: “ficou difícil distinguir na Alemanha o mero racionalismo do racismo declarado” Quanto ao anti-semitismo, à mesma autora dizia que nenhuns dos slogans nazistas eram novos, só tinham nova roupagem. “um muro em torno do povo, a atuar como substituto de fronteiras que não podiam ser definidas com clareza pela geografia ou pela história”. Henning e Korholz: “O fascismo (no sentindo mais amplo da palavra) tem sido adotado pelos seguintes países: Alemanha, Brasil, Estônia, Finlândia, Hungria, Irã, Itália, Polônia, Portugal, Romênia, Turquia e Iugoslava. É de se esperar que dentro em pouco a Espanha se faça presente definitivamente nessa lista”. Quanto à política externa, Haushofer dizia que ela repousava sobre o espaço vital e a partir dessa idéia, defendia uma estratégia política que deveria fazer correspondência entre densidade populacional, projetos de realização econômica e cultural das nações e base territorial. Acreditava que por haver semelhanças entre Japão e Alemanha, deveriam se unir a fim de consolidar o pangermanismo e o movimento pan-asiático. Essa união gerou o pacto anti-komintern que futuramente teve a adesão da Itália de Mussolini, o que indicava o caminho ao tão sonhado pangermanismo.. Haushofer se utiliza da idéia de Mackinder sobre o “pivô geográfico”, pois acreditava em um bloco euroasiático. As teorias do inglês serviram de base para o inimigo. Mackinder alertara sobre o controle do “coração continental” cair nas mãos de Alemanha e Rússia. A intenção era formar um bloco continental que fizesse frente às potências marítimas ocidentais e conter as ameaças dos anglo saxões. Em 1939 há o pacto de não agressão entre Alemanha e URSS, o que agradou muito a Haushofer, pois abriu possibilidades de ampliar o tão sonhado espaço vital. Dentro desse contexto, afirma: “Se a polônia tivesse se dado conta de suas dificuldades geopolíticas, de suas fronteiras móveis, do delicado problema do acesso ao mar, dos esforços centrífugos das populações arrancadas de seus dois grandes vizinhos, dos 80% da população urbana judia num país agrícola, ela teria procurado a calma e a estabilidade, em lugar de se deixar reduzir ao papel de instrumento de uma política britânica excitadora de conflitos”. Dessa forma justificava a agressão à Polônia. Porém em 1941, Hitler ignora o pacto e ataca a URSS, decepcionando Haushofer e seu grupo. Com isso a tese de que as idéias de Hitler eram gerenciadas por geopolíticos, caiu por terra. Com a derrota alemã, ficou provado que é muito difícil vencer uma guerra contra países de vastos territórios.