“Amazônia e o direito de comunicar” 17 a 22 de outubro de 2011 - Belém/PA O meio ambiente em pauta. Uma análise dos documentários “Uma verdade Inconveniente” e “A grande farsa do aquecimento global” 1 Camila BARROS2 Lorena PALHETA3 Rogério ALMEIDA4 Universidade da Amazônia, Belém, PA. RESUMO: A pauta Meio Ambiente é recorrente nos mais variados veículos de comunicação, no entanto o prisma da cobertura privilegia estereótipos. O meio ambiente é tido como um assunto de baixo calão e ainda é bastante estereotipado na grande mídia. O motivo desse descaso é diverso: o timming do noticiário que prima pela atualidade, a dificuldade de transpor para uma linguagem popular termos científicos, o interesse de grandes empresas, entre outras coisas. A partir desse ponto, com base na hipótese do Agenda-seeting, será definido a importância de se ter o ambiente como pauta. Por fim, será feito uma breve análise dos documentários “Uma Verdade Inconveniente” e “A grande farsa do aquecimento global”, que retratam duas visões opostas sobre o aquecimento global. PALAVRAS-CHAVES: Meio ambiente. Mídia. Aquecimento global. 1. INTRODUÇÃO O meio ambiente ainda é tratado como uma questão periférica nos meios de comunicação. É a partir dessa conclusão que o premiado jornalista André Trigueiro começa suas considerações a respeito da pauta ambiental na mídia brasileira no texto “Meio Ambiente na Idade Mídia”, que faz parte do livro “Meio Ambiente no Século 21”. Para Trigueiro (2008, p.76), a questão ambiental ainda se resume a exploração da fauna e da flora, ou seja, do que é exótico e selvagem. Desse modo, questões como o aquecimento global, acabam ficando em segundo plano nos noticiários. A explicação para isso, segundo Trigueiro, é que a pauta ambiental tem o timming a longo prazo, ou seja, relata o que vai acontecer daqui há muitas décadas. Enquanto que a pauta do jornalismo clássico 1 Artigo apresentado no I Seminário Regional da ALAIC - Bacia Amazônica. Estudante de graduação do 8º semestre do curso de Comunicação Social – Jornalismo da Universidade da Amazônia, e-mail: [email protected]. 3 Estudante de graduação do 8º semestre do curso de Comunicação Social – Jornalismo da Universidade da Amazônia, e-mail: [email protected]. 4 Orientador do trabalho. Professor do curso de Comunicação Social – Jornalismo da Universidade da Amazônia, email: [email protected]. 2 1 “Amazônia e o direito de comunicar” 17 a 22 de outubro de 2011 - Belém/PA diário (Hard News5) é muito acelerada, marcado por prazos de fechamento das edições, o deadline. Além do mais, a sociedade é muito imediatista e, em sua maioria, não se interessa por coisas em longo prazo. A partir e dos preceitos do jornalismo ambiental e do jornalismo clássico, esse artigo irá fazer uma análise de dois documentários relacionados à questão ambiental do aquecimento global, mas com visões divergentes sobre o assunto. O documentário “Uma verdade Inconveniente” (An Inconvenient Truth) foi produzido em 2006 pelo ex-vice presidente dos Estados Unidos, Al Gore. O documentário é uma análise das conseqüências da ação do homem no meio ambiente, que leva à elevação da temperatura do planeta. Na contra mão do exposto no documentário de Al Gore, A Grande Farsa do Aqeucimento Global (The Great Global Warming Swindle) é uma produção do britânico Martin Dukin, lançada em 2007, que apresenta idéias opostas àquelas sobre as quais se baseiam as teorias sobre o aquecimento global. Nesse documentário, o aquecimento global é tido como um processo natural. 2. O JORNALISMO AMBIENTAL O Dicionário Brasileiro de Ciências Ambientais, de 1999, diz que meio ambiente é “um conjunto de fatores naturais, sociais e culturais que envolvem um indivíduo e com os quais ele interage, influenciando e sendo influenciado por eles”. Esse conceito, entretanto, é desconhecido tanto do público, quanto da mídia que ainda associa meio ambiente a animais selvagens, plantas exóticas e paisagens espetaculares. Programas relacionados ao tema vinculados na televisão reforçam essa visão, um exemplo disso é o Globo Repórter, da Rede Globo, que há anos propaga essa idéia de meio ambiente ser sinônimo de fauna e flora. (TRIGUEIRO, 2008) O fato é que reduzir o meio ambiente à fauna e flora é, definitivamente, um erro de grandes proporções. E esse é um ponto fundamental na área da comunicação, porque obriga os profissionais de mídia a perceberem a realidade de uma forma inteiramente nova, e sob alguns aspectos, revolucionária: no mundo moderno, onde o conhecimento encontra-se 5 Hard News é a pura notícia, o relato objetivo de fatos relevantes para a vida política, econômica e cotidiana (ZANOTTI, 1998, p. 21). Assim, a estrutura do hard news faz referência ao factual, às notícias urgentes e de importância pública. Essa urgência do factual se acentua com a era digital, que faz com que as notícias sejam transmitidas pelos meios de comunicação digital em tempo real. 2 “Amazônia e o direito de comunicar” 17 a 22 de outubro de 2011 - Belém/PA fragmentado, compartimentado em áreas que muitas vezes não se comunicam, a discussão ambiental resgata o sentido holístico, o caráter multidisciplinar que permeia todas as áreas do conhecimento, e nos induz a uma leitura da realidade em que tudo está conectado, interligado, relacionado. (TRIGUEIRO, 2008, p. 77) Sabendo do conceito de meio ambiente definido pelo Dicionário Brasileiro de Ciências Ambientais, Trigueiro (2008, p.81) ressalta uma premissa básica do jornalismo ambiental: “Perceber a realidade que nos cerca de um ângulo mais abrangente, privilegiando a qualidade de vida no planeta e do planeta”. Essa premissa foi definida na Conferência Mundial da ONU sobre Meio Ambiente de Desenvolvimento - Rio-92, que foi um divisor de águas para a prática do jornalismo ambiental no Brasil. O evento exigia uma ampla cobertura e, como não havia jornalistas ambientais o suficiente, muitos especialistas foram chamados pra cobrir o que estava sendo debatido. Novos suplementos e cadernos foram criados, gerando uma disputa, que Trigueiro considera como saudável, nas redações. A Rio-92, também conhecida como ECO-92, permitiu que expressões que antes só eram conhecidas no meio científico passassem a fazer parte da pauta de discussão social. Contudo, quando a Rio-92 acabou, a pauta meio ambiente voltou a ter espaço somente na editoria de ciência. A explicação que Trigueiro (2008, p. 82) dá para esse descaso com a temática na pauta diária é que o jornalismo ambiental ameaça os interesses de empresas públicas e privadas que agem na contramão da sustentabilidade. Desse modo, os jornalistas que optam por essa temática, encontraram na internet um meio de comunicação poderoso e buscaram alternativas em jornais e revistas desvinculados da grande mídia. Também foram criadas articulações para fortalecer a classe, como a Federação Internacional dos Jornalistas Ambientais, de 1993 e, no Brasil, a Rede Brasileira de Jornalismo Ambiental, de 1998. Levando em consideração o tema abordado pelo jornalismo ambiental, Trigueiro (2008) ressalta uma peculiaridade do jornalismo ambiental perante o jornalismo clássico: a quebra do dogma da imparcialidade. O jornalismo ambiental quebra o dogma da imparcialidade, tão propalada e discutida nos cursos de comunicação, ao tomar partido em favor da sustentabilidade, do uso racional dos recursos naturais, do equilíbrio que deve reger as relações do homem com a natureza, do transporte coletivo, da energia limpa. (TRIGUEIRO, 2008, p.89) 3 “Amazônia e o direito de comunicar” 17 a 22 de outubro de 2011 - Belém/PA 3. POR QUE É PRECISO NOTICIAR? - A TEORIA DO AGENDA-SEETING E AS DIFICULDADES DE COLOCAR O JORNALISMO AMBIENTAL EM PAUTA Com o intuito de analisar o efeito do material jornalístico vinculado nos meios de comunicação, a hipótese do agenda-setting ou agendamento ressalta que a pauta de discussão social é determinada pelo que é notícia, ou seja, as pessoas colocam em suas discussões o que é considerado noticiável pelos órgãos de comunicação, o que não é, é excluído do debate social. Essa hipótese é um tipo de efeito social da mídia que compreende a seleção, disposição e incidência de notícias sobre os temas que o público falará e discutirá. A hipótese do agendasetting6 propõe, a partir da investigação dos efeitos da comunicação de massa, um estudo do poder que o jornalismo e a mídia exercem sobre a opinião pública. Os mass media, descrevendo e precisando a realidade exterior, apresentam ao público uma lista daquilo sobre que é necessário ter uma opinião e discutir. O pressuposto fundamental do agenda-setting é que a compreensão que as pessoas tem de grande parte da realidade social lhes é fornecida, por empréstimo pelos mass media. (SHAW, 1972 apud WOLF, 2009, p.145) A hipótese elaborada por Maxweel McCombs e Donald Shaw, em 1972, ressalta o poder da mídia não em dizer como as pessoas devem pensar, mas em dizer o que pensar. Partindo dessa idéia, se faz necessário que se tenha uma pauta voltada para o meio ambiente, caso contrário vai acontecer como tantos outros assuntos que já ignorados pela sociedade. Contudo, é preciso que a informação sobre a pauta ambiental seja repassada de forma correta e responsável para que não se espalhe mais estereótipos. Assim, além do timming da pauta ambiental, que não condiz com o jornalismo de Hard News, o jornalista que for trabalhar com essa temática precisa superar a barreira da conciliação entre a concisão jornalística e a linguagem científica. O padrão objetivo do jornalismo de ser sintético, porém, não pode comprometer informações do meio científico. 6 O conceito começa a ser formulado em 1968 a partir de um acompanhamento inicial feito pelo professor americano Maxwell McCombs, que por meio de cem questionários analisou o efeito dos meios de comunicação nos eleitores que ainda se encontravam indecisos entre os candidatos Hubert Humprey e Richard Nixon. Em um prazo de 24 dias antes das eleições, McCombs fez uma seleção de cinco jornais, dois canais nacionais de televisão e duas revistas semanais. McCombs concluiu que de fato os meios de comunicação influenciaram o eleitor, e também observou que além do eleitor, a mídia também influenciou os próprios candidatos, já que muitos incluíram em suas agendas de campanha temas que, inicialmente, não constavam, ou por terem sido abordados pela concorrência ou por terem sidos abordados pela mídia e acabarem por ser considerados relevantes. Em 1972, em uma nova campanha eleitoral, Maxwell Mc Combs aliou-se a Donald Shaw para aprofundar os estudos iniciados em 1968 e concluir a hipótese. 4 “Amazônia e o direito de comunicar” 17 a 22 de outubro de 2011 - Belém/PA Assim, algumas nomenclaturas, como “transgênico”, “biomassa” e “ecossistema”, merecem ser repassadas à população de forma original. Trigueiro (2008) destaca que o Brasil deveria ser um dos países que mais deveria ter discussões sobre meio ambiente, devido a grandes reservas, e a Amazônia, o maior ecossistema mundial. É intrigante como no Brasil, país que detém a maior reserva mundial de água doce, a maior biodiversidade, a maior floresta tropical do planeta, a maior disponibilidade de solo fértil em áreas desocupadas haja tanta escassez na oferta de cursos de meio ambiente voltados para estudantes de comunicação e jornalistas profissionais. (TRIGUEIRO, 2008, p. 82) A partir dessa inquietação, o autor define o desafio do profissional de comunicação que almeja trabalhar com essa temática: Um dos maiores desafios dos jornalistas interessados nos assuntos ambientais é dar visibilidade na grande mídia aos diagnósticos que apontam os atuais meios de produção e de consumo como os grandes vilões ambientais da atualidade. (TRIGUEIRO, 2008, p. 83) 4. OS DOCUMENTÁRIOS A Grande Farsa do Aquecimento Global (The Great Global Warming Swindle) é um documentário produzido em 2007 pelo britânico Martin Dukin, que apresenta conceitos opostos aqueles sobre os quais se baseiam as teorias do aquecimento global. O documentário apresenta cientistas e especialistas premiados por instituições de renome, como a NASA, que refutam completamente a teoria atual sobre aquecimento global que defende que a elevação do planeta é causada pela liberação do dióxido de carbono (CO2). O documentário mostra pesquisas que defendem que o efeito da radiação cósmica e o aumento atividade solar, que diminui a formação de nuvens e, por conseguinte, eleva a temperatura, podem ser uma explicação mais precisa das alterações nas temperaturas globais do que a teoria de que a emissão do CO2 é que causa essa alteração. No vídeo, especialistas em consenso expõem que a alteração do clima da terra é um processo recente que não possui relação direta com o aumento da emissão de dióxido de carbono na atmosfera. Para fundamentar esse argumento, há a constatação de que a temperatura do planeta subiu no período que antecede a década de 1940 e decaiu durante o crescimento econômico do pós-guerra, quando o nível das emissões de dióxido de carbono foi 5 “Amazônia e o direito de comunicar” 17 a 22 de outubro de 2011 - Belém/PA muito maior. Outro ponto que o documentário sustenta é que a meta de redução de atividades que geram a emissão de carbono pode causar conseqüências não intencionais no desenvolvimento do terceiro mundo, prolongando assim fatores comuns nesses países, como pobreza e doenças endêmicas. A partir da concepção de cientistas renomados, a produção de Dukin mostra que o aquecimento global possui muitas falhas cientificas, e que por trás de toda essa espetacularização acerca do tema, há interesses monetários de instituições cientificas e de órgãos de comunicação que desencorajam um debate mais aprofundado do público e da comunidade cientifica sobre o tema. O climatologista Timothy Ball afirma que “é desperdício de tempo e dinheiro combater o aquecimento global e previsões catastróficas como as do relatório do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC) da ONU”. O climatologista confirma que a emissão de dióxido de carbono possui pouca influencia nas variações de temperatura do planeta e sustenta a idéia de que as variações de intensidade do sol explicam períodos como a última Era do Gelo, quando a terra era em média cinco graus na medida Celsius mais fria do que hoje. Thimothy Ball ainda destaca que no início de sua carreira, o que a maioria dos cientistas temia e especulava era um “resfriamento global”. Já o documentário “Uma Verdade Inconveniente” (Na Incovenient Truth), produzido em 2006 pelo ex-vice-presidente norte-americano Al Gore, analisa o aquecimento global como uma conseqüência da ação humana, que a partir da sistemática degradação do meio ambiente e à elevada porcentagem de dióxido de carbono preso na atmosfera terrestre, tem causado aumento na temperatura do planeta, o que interfere no ecossistemas, no derretimento das calotas polares, extinção de espécies da fauna e flora, alteração no nível das marés, indução à tsunamis, ciclones e terremotos, dentre outros desastres. O documentário é uma produção que deriva de uma versão em película de slide-show que Al Gore vem exibindo em eventos e conferências pelo mundo desde 1978. O vídeo não poupa na exibição de cenas impactantes dos efeitos climáticos possivelmente causados pelo aquecimento global: tornados, furacões, enxurradas, secas, disseminações de pragas, erosões e queimadas. As cenas de destruição são acompanhadas de uma trilha sonora marcante que causa toda essa sensação de impacto e reflexão perante a um futuro incerto. Além dos desastres, Gore exibe possíveis saídas para que o planeta não passe por uma catástrofe climática nas próximas décadas. 6 “Amazônia e o direito de comunicar” 17 a 22 de outubro de 2011 - Belém/PA O relatório “Mudanças do Clima, Mudanças de Vida”, lançado em 2008, pela organização não governamental Greenpeace compactua com o vídeo de Al Gore e aponta que os Estados Unidos figura como maior emissor de gás carbônico na atmosfera, com um quarto do total das emissões do mundo. Já o Brasil ocupa a quarta posição de países poluidores, e a causa disso é a emissão de CO2 provenientes do desmatamento e queimadas na Amazônia. 5. CONCLUSÃO Estamos em uma época que é moda ser “ecologicamente correto” e “sustentável”, contudo, o que isso realmente significa pouca gente sabe. O motivo dessa ignorância pode ser o trato da mídia com essa questão, já que, segundo a hipótese do Agenda-setting, a pauta que a mídia escolhe para ser vinculada nos meios de comunicação, se constitui na pauta social. Desse modo, não se pode discutir com profundidade o que é repassado com superficialidade sob o estereotipo de fauna e flora. Não é fácil noticiar questões ambientais, é preciso ultrapassar a perecividade das notícias do jornal diário, a barreira entre a concisão jornalística e a linguagem científica e mais os interesses de grandes empresas. Na contra mão da grande mídia, o jornalismo ambiental encontra a internet para se propagar. Entretanto, é preciso estar atento à premissa básica dessa especialização jornalística, que ressalta a relação do homem com o meio em que vive. Com relação à temática ambiental tratada nos documentários surgem visões divergentes. Não cabe a nós dizer qual é a visão correta, o que nos cabe é considerar o debate que se forma em torno dessas opiniões, e quão construtivo essa discussão pode ser. 6. REFERÊNCIAS BIBLIOGÁFICAS DICIONÁRIO Brasileiro de Ciências Ambientais. RJ: Thex Ed., 1999. DUKIN, Martin. A grande farsa do Aquecimento Global. [Documentário], direção de Martin Dukin. Londres, 2007. 75m. color. com. GORE, Al. Uma verdade Inconveniente. [Documentário], direção de Davis Guggenheim. Estados Unidos, 2006. 100m. color. som. 7 “Amazônia e o direito de comunicar” 17 a 22 de outubro de 2011 - Belém/PA HOHLFELDT, Antonio. Os estudos sobre a hipótese de agendamento. Revista Famecos, Porto Alegre, n. 7, p. 42-51, nov. 1997. TRIGUEIRO, André. Meio ambiente na Idade Mídia. In: Meio ambiente no século 21. Rio de Janeiro: Sextante, 2008. MUDANÇAS de clima, Mudanças de Vida – Como o Aquecimento Global já afeta o Brasil. Greenpeace, 2008. Disponível em: http://www.greenpeace.org.br/clima. Acesso em 02 jun. 2011. ZANOTTI, Carlos A. O paradoxo do lide: sedução e afastamento. Revista de Estudos de Jornalismo, Ano 1. Nº 1. Campinas: PUC-Campinas, 1998, P. 15-24. WOLF, Mauro. Teorias da Comunicação. 10. ed. Lisboa: Presença, 2009. 8