1 Dinâmica Habitacional e Demográfica da Metrópole Paulista: Caracterização e Análises Preliminares Denise Yoneya Shinohara 1, Francisco de Assis Comarú 1 Resumo: o Brasil a partir de 1980, os índices de crescimento populacional das sedes metropolitanas começaram a apresentar queda, indicando desconcentração populacional dos centros em direção às periferias. Por meio de levantamentos e sistematização de dados qualitativos e quantitativos, primários e secundários, que contribuíram para diagnosticar a dinâmica populacional e demográfica da metrópole paulista, realizou-se, neste trabalho, uma análise do processo de perda populacional nos centros urbanos e aumento populacional nas regiões periféricas destes. Palavras chave: Dinâmica Populacional, Região Metropolitana de São Paulo, Centro, Periferia. Parnaíba, Caieiras) e a sul (distritos Grajaú e Parelheiros), e uma perda populacional nas porções centrais da metrópole: subprefeituras do MSP, como Sé, Lapa, Moóca, Pinheiros. Para fins de estudos foram selecionadas alguns locais com características de aumento/perda populacional: Bela Vista, Bom Retiro, Brás, Cambuci, Consolação, Liberdade, Pari, República, Santa Cecília, Sé (distritos centrais), Brasilândia, Cidade Tiradentes, Jardim Ângela (distritos periféricos), Rio Grande da Serra, Santo André e São Lourenço da Serra (municípios periféricos) representadas na Figura 2: I. INTRODUÇÃO partir da década de 1980, o padrão de urbanização brasileiro sofreu uma alteração: a taxa média geométrica de incremento anual da população residente urbana, que se mantinha em crescimento, apresentou declínio: de 5,22% em 1960 a 1970, passou a 4,44% em 1970 a 1980, e em 1991 a 2000 a taxa alcançou o índice de 2,47%, segundo “Séries Estatísticas” do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas (IBGE)[1]. Analogamente, a população das áreas centrais tanto de grandes municípios como de Regiões Metropolitanas, vêm sofrendo um declínio na taxa de crescimento. A Figura 1 ilustra esse fenômeno na Região Metropolitana de São Paulo (RMSP) e no Município de São Paulo (MSP): A Fonte: IBGE Censos 1991, 2000 apud Instituto Pólis, 2009 Figura 1 - Taxa geométrica de crescimento populacional na RMSP e no município de São Paulo de 1991 a 2000 _________________________ 1 Centro de Engenharia, Modelagem e Ciências Sociais Aplicadas (CECS) Denise Yoneya Shinohara: [email protected] Francisco de Assis Comarú: [email protected] Universidade Federal do ABC, Rua Santa Adélia, 166 – Bairro Bangu, Santo André – SP, Brasil. CEP 09210-170, Tel/Fax: +55 11 4996-3166 Observando a Figura 1, verifica-se um padrão de aumento populacional mais intenso nas porções periféricas da RMSP e do MSP, principalmente a oeste (municípios Santana de Figura 2- Localização dos distritos centrais, distritos e municípios periféricos em relação ao município de São Paulo As diferenças entre região central e região periférica também estão presentes nas questões de qualidade e quantidade de infra-estrutura, serviços urbanos e equipamentos públicos, concentração de empregos formais e informais, centros culturais e de consumo. As regiões centrais são detentoras desses recursos e além de estarem perdendo população permanente, a quantidade de imóveis ociosos vem aumentando, tornando-as “vazias” fora e até mesmo dentro do horário comercial. Já as regiões carentes desses quesitos se localizam na periferia e vêm acompanhadas de um processo de inchamento populacional muito intenso. E, conforme Maricato[2] : “os pobres tem sido impelidos a morar cada vez mais longe”, ou seja, todo esse processo está atrelado à exclusão sócio-territorial, fato que condiciona no desfavorecimento das famílias que são impossibilitadas de viver onde há mais qualidade de vida. II. PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS A. Levantamento de Dados Secundários A partir da pesquisa nos sites do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas – IBGE, da Fundação Sistema Estadual de Análise Dados - SEADE, da Empresa Paulista de Planejamento Metropolitano – Emplasa, do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos – 2 DIEESE, da Prefeitura Municipal de São Paulo - PMSP e da consulta à referência Dados Distritos 2004, da Prefeitura de São Paulo, foram levantados alguns indicadores (como demografia, trabalho, renda e rendimento, domicílios) para a análise da dinâmica populacional da metrópole paulistana. B. Levantamento de dados no âmbito da parceria com o Projeto “Moradia é Central” sob coordenação do Instituto Pólis em parceria à Oxfam Grã-Betanha i)Levantamento de campo no Pari de dados primários O levantamento de campo no Pari constituiu em coleta de dados primários, com objetivo de quantificar e qualificar os imóveis vazios ou subutilizados, a fim de verificar o potencial de transformação de habitação social. As duplas de pesquisadores utilizaram câmera fotográfica e instrumental para entrevista, composto por informações de observações do pesquisador, tipologia, estado de conservação, presença de anúncios de Aluguel/Venda, informações adquiridas por meio de perguntas ao zelador, morador, trabalhador ou vizinho do imóvel, e cuja referência é a pesquisa “Tributos imobiliários e imóveis vazios no centro de São Paulo” do Lincoln Institute of Land Policy e LabHab-USP [3]. (LABHAB/FAUUSP; FUPAM, 2006). A região foi divida em 17 perímetros (como representada na Figura 2) para organizar os roteiros das duplas, e foi escolhida como distrito central para estudo, pois apresentou queda expressiva na taxa de crescimento geométrico anual de 1996 a 2009: -3,97%, bem como queda de atividade econômica e pequena atividade no setor imobiliário. As entrevistas tiveram como meta checar o perfil, a opinião e a perspectiva da população do bairro que reside, trabalha ou emprega no comércio local. As equipes ou duplas de entrevistadores estavam equipados de câmera fotográfica, gravador e o instrumental de entrevista constituído por um roteiro de perguntas elaborado pela equipe, cujas questões eram de caráter quantitativo e qualitativo e foram adequados conforme os atores entrevistados: empregadores e empregados do comércio local, moradores de HIS (conjunto habitacional Vila dos Idosos) e moradores do Alto do Pari tradicionais. III. RESULTADOS E DISCUSSÃO A. Levantamento de Dados Secundários A partir do levantamento dos valores de população para as localidades estudadas, de 1980 à 2009, da Fundação SEADE [4] , calculou-se os valores de Taxa de Crescimento Geométrico Anual (TCGA), representados nas Figuras 4 e 5 a seguir: Fonte: Fundação SEADE, 2009 Figura 4 – TCGA dos distritos e municípios centrais de 1980 a 2009 Fonte: Fundação SEADE, 2009 Fonte: Instituto Pólis, 2008 Figura 3 - Perímetros delimitados no Pari para a pesquisa ii)Mapeamento de HIS e HMP em ZEIS O mapeamento de Habitação de Interesse Social (HIS) e Habitação de Mercado Popular (HMP) em Zona Especial de Interesse Social (ZEIS) teve como objetivo verificar em campo se os endereços de residências em áreas de ZEIS, disponibilizados pela prefeitura de São Paulo, estão condizentes com a realidade, obtendo-se uma coleta de dados secundários. Os dados (dados_Aprov) de maio de 2002 a julho de 2008 foram filtrados para que houvesse somente endereços das subprefeituras Sé e Moóca, mapeados espacialmente no AutoCAD. Realizou-se a verificação pessoal dos locais efetuando-se registros em imagem, coleta de contatos e de dados que auxiliem na análise de preços, unidades habitacionais construídas, participação de financiamento público e privado, situação dos empreendimentos (concluído, em construção, paralisado ou sem informação). iii)Entrevista com atores-chave no Pari Figura 5 - TCGA dos distritos e municípios periféricos de 1980 a 2009 Observando a Figura 4 nota-se que as curvas de todos os distritos estão inicialmente no lado negativo, devido à perda de população no período de 1980 a 2000. Após a TCGA de 1996/2000 as curvas são mais ascendentes, principalmente o distrito Pari que apresentou a maior velocidade de crescimento da taxa. No período de 2000 a 2009 as curvas de alguns distritos continuaram ascendentes, como Pari e Santa Cecília, e outros apresentaram queda, como Sé e Brás, entretanto isso não indica que há queda de população, apenas o crescimento foi menor que no período anterior. Na Figura 5 todas as curvas se encontram no eixo positivo, pois houve crescimento populacional em todas as localidades. No período estudado, elas apresentaram queda da taxa indicando que o crescimento vem diminuindo aos poucos, tendendo a se estabilizar, exceto por Brasilândia de 1980 a 1996. Sobre a população em idade ativa (PIA) (pessoas acima de 10 anos) em relação à população, empregados em relação à PIA e o rendimento médio dos trabalhadores das localidades, em 2000, obteve-se a Tabela 1: 3 Tabela 1 População em Idade Ativa, quantidade de empregados e rendimento médio da população dos distritos centrais, distritos e municípios periféricos em 2000 Localidade Bela Vista Bom Retiro Brás Cambuci Consolação Liberdade Pari Santa Cecília República Sé Brasilândia Cidade Tiradentes Jardim Ângela Rio Grande da Serra Santo André São Lourenço da Serra População em Idade Ativa (%) 90,79 86,12 84,97 88,71 92,67 89,56 88,35 90,26 90,35 86,96 79,29 77,62 78,42 79,45 85,14 79,66 Empregados em relação à PIA(% ) 119,17 627,96 222,74 109,30 123,69 44,95 84,11 87,06 370,14 1.471,91 2,41 1,95 3,00 6,85 20,91 66,70 Rendimento Médio (R$) 2201,96 1520,95 1034,72 1357,25 2840,62 1410,45 920,09 1356,39 1908,39 2827,87 723,39 860,91 817,3 813,44 916,47 536,06 Analisando a coluna de PIA (%), os distritos centrais Consolação e Bela Vista possuem os maiores valores acima de 90% de suas populações, e os distritos periféricos Cidade Tiradentes e Jardim Ângela possuem os menores valores com menos de 79%, indicando concentração de população jovem. Seguindo na coluna Empregados em relação à PIA (%), os distritos Sé, República, Brasilândia e novamente Cidade Tiradentes possuem os dois maiores e os dois menores valores respectivamente. O número de empregados indica quantos trabalhadores ocupados existem no local. Nos casos em que o valor em porcentagem é superior a 100%, significa que o local possui mais trabalhador que população total em idade ativa, portanto, é um pólo de empregos. Portanto, as regiões centrais concentram empregos, contrariamente à periferia que tem déficit. Rendimento médio é quanto um empregado recebe em média ao mês, e novamente a região central detém o maior valor e a periferia possui o menor. A diferença entre Consolação com R$2.840,62 e São Lourenço da Serra com R$536,06 chega a R$2.304,56. São 5 vezes de diferença. B. Levantamento de campo no Pari de dados primários O levantamento de campo visando os imóveis vazios ou subutilizados no Pari mostrou uma rápida mudança de perfil de bairro residencial para comercial. Foram notificados 224 imóveis vazios ou subutilizados, os quais houve concentração das tipologias “edificação térrea” e “sobrado” nos perímetros 1 e 2 (Figura 3); “edificação acima de 2 pavimentos” nos perímetros 3, 4, 5, e 8; e “galpão” nos perímetros 3, 4, 5. A classificação “edificação acima de 2 pavimentos” teve a distribuição mais uniforme, e a classificação “terreno” foi a menos expressiva. Também se observa a pouca existência de vazios nos perímetros 7, 11, 12, 13 e 17. Isso deve-se ao dinamismo de cada perímetro: perímetros 1 e 2 constituem áreas de ZEIS, portanto voltados para a habitação, perímetros de 3 a 8 são predominantemente de uso industrial, ou para o comércio atacadista, perímetros 9, 10, 13 e 14 são mais residenciais, e os perímetros 11 e 12 possuem galpões inativos e áreas residenciais, possivelmente antigas vilas operárias. Em relação ao tempo de vacância, a maioria dos imóveis (61%) não permanece mais que 5 anos desocupados, indicando alta procura por imóveis na região. E também, a grande maioria dos imóveis ociosos (71%) não apresenta qualquer anúncio de venda e/ou aluguel, reforçando o dinamismo da região. C. Mapeamento de HIS e HMP em ZEIS A vistoria em campo verificou que a maioria dos endereços listados e filtrados está concluída: 4.908 unidades de HIS e 1.122 de HMP, totalizando em 6.030 unidades habitacionais (UHs). A maior quantidade de HIS é um bom índice, pois são destinadas, teoricamente, à famílias com renda abaixo de 6 salários mínimos (pela lei de São Paulo), a fim de oferecer acesso à moradia e à inclusão social, enquanto que à habitação HMP é para famílias com renda de 6 a 15 salários mínimos.Outro bom índice é a maior parte da UHs estar dentro de áreas de ZEIS (59,62%). A participação do setor privado é maior que a do setor público ou de associações de moradores: foram 2.778 UHs de HIS e todas de HMP, sendo que o poder público vem abaixando a sua produção possivelmente devido à mudança de gestão em 2004. D. Entrevista com atores-chave no Pari As entrevistas realizadas formam um universo de 16 registros. Foram entrevistados os atores-chaves: empregador, empregado, morador de HIS e morador tradicional do Alto do Pari. Os empregadores diferem dos empregados na questão do tempo de trabalho, no qual os empregadores possuem de 5 a 15 anos, enquanto que os empregados possuem menos de 5 anos; e na questão de pontos positivos/negativos, no qual a violência foi citada como ponto negativo para os empregadores e a segurança foi citada como ponto positivo para os empregados. Já os moradores de HIS e do Alto do Pari não convergiram no questão da satisfação em morar no bairro: apenas 1 está satisfeito e 2 não estão dentre os moradores de HIS, enquanto que 4 de 5 entrevistados do Alto do Pari estão satisfeitos. Esse fato está relacionado à localização destas regiões no Pari: vizinhança predominantemente comercial na Vila dos Idosos e mais residencial no Alto do Pari. IV. CONCLUSÃO No presente trabalho levantaram-se diversos indicadores de dados primários e secundários que constataram o fenômeno de esvaziamento das regiões centrais e adensamento das periféricas na Região Metropolitana de São Paulo. Os dados também mostram que na maior metrópole do pais a desigualdade de oportunidades continua sendo significativa, e condicionada, entre outras variáveis, pelo local de moradia da família. V. AGRADECIMENTOS A aluna agradece ao professor orientador Francisco Comarú e ao Instituto Pólis pelo auxílio e apoio ao projeto. VI. REFERÊNCIAS [1] Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE): www.ibge.gov.br; acessado em 01/03/2009. [2] Maricato E. Brasil, Cidades: alternativas para a crise urbana. Petrópolis; 2001. [3] LABHABFAUUSP; FUPAM. Observatório do uso do solo e da gestão fundiária do centro de São Paulo. Relatório de Pesquisa. Laboratório de Habitação e Assentamentos Humanos da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP. FAUUSP:FUPAM: São Paulo; 2006. [4] Fundação Sistema Estadual de Análise de Dados (SEADE): www.seade.gov.br; acessado em 01/03/2009.