Augustus – Rio de Janeiro – Vol. 07 – N. 15 – Jul./Dez. – 2002 – Semestral ALTERNÂNCIA DO USO DO PRETÉRITO IMPERFEITO E DO FUTURO DO PRETÉRITO NO DISCURSO ORAL Tania Maria Nunes de Lima Camara* RESUMO: O estudo do discurso oral de diferentes falantes mostrou a alternância no uso do pretérito imperfeito e do futuro do pretérito, ambos do modo indicativo em orações que apresentam idéia de possibilidade. As variáveis extralingüísticas “idade” e “escolaridade” foram consideradas determinantes da referida variação. Os resultados apontam caminhos para o aprofundamento do tema em questão, como, por exemplo, a verificação de variáveis lingüísticas como fatores determinantes dessa alternância. ABSTRACT: The study of oral speech’s native speakers revealed the alternance in the use of the imperfect past tense and the future in the past tense in the cases they intend to express the idea of “possibility”. According to the Linguist Variation Theory, the extralinguistic variables “age” and “scholar level” were considered to explain the differences in the uses. The present research also showed that linguist variables must be taken in account. Palavras-chave: variação – discurso oral – possibilidade – tempos verbais. Key words: variation – oral speech – possibility – verbal tenses. O presente trabalho tem por objetivo apresentar o emprego de formas verbais no pretérito imperfeito e no futuro do pretérito, ambos do modo indicativo, exprimindo a idéia de possibilidade, dentro da perspectiva da Teoria da Variação. Nosso interesse decorreu do fato de termos observado o uso freqüente de formas verbais no pretérito imperfeito em contextos em que a Gramática Tradicional postula o emprego do futuro do pretérito como forma mais adequada. No entanto, não se percebe qualquer tipo de estigmatização, por parte do interlocutor, quando o falante expressa a idéia de possibilidade, utilizando o pretérito imperfeito no lugar do futuro de pretérito. A partir de tal observação, duas hipóteses foram levantadas. A primeira diz que os falantes mais jovens seriam aqueles que utilizam com mais freqüência o pretérito imperfeito do indica–––––––––– tivo encerrando idéia de possibilidade. A segunda aponta para o fato de que o uso mais freqüente do futuro do pretérito estaria diretamente ligado ao nível de escolaridade. As hipóteses levantadas conduzem, assim, nossa pesquisa para o controle de dois fatores extralingüísticos: a idade e a escolaridade. Na organização do corpus para a pesquisa, utilizamos dados obtidos através de entrevistas realizadas da forma mais natural possível, procurando evitar constrangimentos que viessem impedir a espontaneidade das falas. A maior parte do material utilizado consta no banco de dados do Projeto Censo da Variação Lingüística no Estado do Rio de Janeiro, da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Nas entrevistas por nós realizadas, procuramos seguir o modelo do Projeto, sem, no entanto, deixar de levar em conta características e experiências pes- * Mestre em Língua Portuguesa (UERJ). 83 Augustus – Rio de Janeiro – Vol. 07 – N. 15 – Jul./Dez. – 2002 – Semestral soais de nossos entrevistados, no sentido de evitar, ao máximo, o paradoxo do observador. Entendemos a presente descrição e análise da sistematicidade que subjaz à variação do fenômeno lingüístico estudado como piloto para uma pesquisa mais ampla e detalhada. Julgamos importante, de início, fazer uma breve apreciação sobre a origem e formação latinas dos referidos tempos verbais, bem como sobre o surgimento dessas formas em português. Via de regra, elas originam-se de formas do latim popular. Dois grupos de tempos figuravam no sistema verbal latino, no período clássico: a) INFECTUM – grupos de tempos que indicam uma ação em curso. Deste grupo fazem parte, no indicativo, o presente, o imperfeito e o futuro imperfeito. b) PERFECTUM – grupo de tempos que indicam uma ação passada, já concluída. Este grupo compreende, no indicativo, o perfeito, o mais-que-perfeito e o futuro perfeito. O latim vulgar impôs modificações profundas na conjugação latina, levando ao desaparecimento de inúmeros tempos, tanto no infectum como no perfectum. A conjugação em latim falado, na sua última fase, ou latim bárbaro, mostra as seguintes particularidades, comparada com o latim clássico: a) Permanecem o presente, o imperfeito, o perfeito e o mais-que-perfeito. b) Desaparecem o futuro imperfeito, cujas terminações -bo, -bis, -bit provocavam fácil confusão com as do imperfeito -bam, -bas, -bat, e o futuro perfeito, que se fundiu com perfeito do subjuntivo, dando origem a um tempo novo, o Futuro do subjuntivo. Compensando a perda, o futuro imperfeito foi substituído por uma forma perifrásica, constituída pelo infinitivo do verbo e o presente do indicativo de haver (habēre): AMARE + HABEO > amar + * hai(o) > AMAREI. AMARE + HABES > amar + * has > AMARÁS. AMARE + HABET > amar + * hat > AMARÁ AMARE + HABEMUS > amar + * h (ab) emos > AMAREMOS. 84 AMARE + HABETIS > amar + * (ab) etis > AMAREIS. AMARE + HABENT > amar + * haunt > AMARÃO. O futuro latino, na sua essência, não se conservou em nenhuma das línguas românicas. Para isso concorreram causas de ordem morfológicas, fonéticas e psicológica. Em primeiro lugar, do ponto de vista da formação do tempo, a posição do futuro, dentro do quadro da conjugação latina, era um tanto assistemática: havia um processo de formação para os verbos de 1ª e 2ª conjugações e outro para os de 3ª e 4ª, sem que se percebesse qualquer conexão entre ambos. Com relação às causas psicológicas, o futuro não é um tempo como um outro qualquer; não exprime uma realidade, como o presente e o passado, e, sim, uma possibilidade. Dado que as coisas possíveis têm raízes subjetivas, são tidas como desejáveis, necessárias ou mesmo inevitáveis, mas não como certas. Uma vez que o futuro passa pela subjetividade do sujeito falante, adquire caráter “modal”, pois o modo representa a interferência do sujeito no processo verbal, na medida em que consiste nas diferentes formas que o verbo toma para indicar atitude de certeza, de dúvida, de suposição, de mando, por exemplo, da pessoa que fala em relação ao fato que enuncia. Não é, pois, como o tempo, que relaciona o sentido do verbo com uma fase do acontecer, abstratamente considerado; a variação que indica o momento em que se dá o fato expresso pelo verbo. O não ser puramente um tempo verbal leva o futuro a um refazimento constante na língua viva, isto é, ali mesmo onde as línguas se elaboram. O estudo das tendências do latim vulgar, das suas características dominantes, mostra-nos como a língua se alterou para dar origem às línguas românicas e, particularmente, ao Português. Levado pela lei do menor esforço, presente em todas as línguas, e cedendo ante as dificuldades que a língua latina apresentava na sua estrutura muito complexa, dois objetivos principais o povo procurava alcançar ao falar: simplificar a língua e tornar analítico um idioma que, às vezes, se tornava duro pelo sintetismo demasiado. Augustus – Rio de Janeiro – Vol. 07 – N. 15 – Jul./Dez. – 2002 – Semestral Essas duas finalidades maiores o povo alcançava desenvolvendo tendências, entre as quais se faz pertinente destacar a tendência para o uso de formas perifrásticas, tendência essa que correspondia ao desejo de expressar, de modo claro, relações que a língua clássica exprimia muito concisamente por meio de sínteses gramaticais. Surgem, assim, perífrases verbais, com valor potencial, optativo ou necessitativo, constituídas pelo infinitivo do verbo principal e o auxiliar habëre, conforme vimos anteriormente. A forma do auxiliar podia ser colocada antes ou depois do infinitivo. Somente no último período do latim vulgar ou, talvez, na primeira fase do romance, o infinitivo passou regularmente ao primeiro lugar da construção. Com o auxiliar habēre posposto, no presente do indicativo, formou-se o futuro do português, correspondendo a uma forma que pode ser traduzida como HAVER de X, onde X representa o infinitivo do verbo principal. A consciência da composição do referido tempo verbal perdurou durante algum tempo em português. Hoje em dia, embora cada vez em registros mais limitados, ainda é possível se praticar a interposição do pronome pessoal oblíquo, colocação esta a que se dá o nome de mesóclise. Sejam, por exemplo, as formas: dar-me-ás; verte-ei; levá-lo-emos. Atualmente, é difícil pensar numa possível consciência do falante em relação à formação do futuro do indicativo que justifica o emprego da mesóclise, chegando, em alguns casos, a ser a única possibilidade admitida pela norma gramatical. Em se tratando do Português do Brasil, tal construção praticamente inexiste na língua oral; na língua escrita, quando empregada, resulta da prática da coerção gramatical, consistindo em mais uma regra que o falante utiliza, sem dispor de uma razão plausível para o seu emprego, fato este decorrente, em grande parte, da perda da consciência da formação do tempo verbal, como dissemos anteriormente. Com relação ao futuro do pretérito, sabe-se que o latim arcaico e médio não o possuíam. O futuro do pretérito vem a ser uma criação tardia do latim vulgar, forjada sobre o modelo do futuro perifrástico com habeo, já bastante empregado na fala popular e até nos escritores do fim da época imperial, da forma como apresentamos a seguir: infinitivo do verbo principal + imperfeito de haver (habēre). AMARE + HABEBAM > amar + * h ( ab/ea) > AMARIA. AMARE + HABEBAS > amar + * h (ab/eas) > AMARIAS. AMARE + HABEBAT > amar + * h (ab/eat) > AMARIA. AMARE + HABABAMUS > amar + * h (ab/ amus) > AMARÍAMOS. AMARE + HABEBATIS > amar + * h (ab/eatis) > AMARÍEIS. AMARE + HABEBANT > amar + * h (ab/eant) > AMARIAM. Levando-se, pois, em conta a formação do futuro do pretérito, verificamos que, na origem, uma forma do tipo havia de amar veio dar, em português, amaria. Voltando ao problema da consciência do falante em relação à formação do tempo futuro, uma questão parece-nos possível de ser colocada. Vejamos: na análise dos dados levantados, é comum encontrarmos construções do tipo ia fazer, ia comprar, ia dar…, como formas correspondentes a faria, compraria, daria, respectivamente. A questão que se coloca é, pois, a seguinte: até que ponto o falante sinonimiza, por exemplo, ia dar e daria pelo fato de ver na terminação ia de daria uma forma do verbo ir? Quer dizer, a consciência do falante irá levá-lo a perceber o futuro de pretérito como uma construção perifrásica constituída de infinitivo do verbo principal + imperfeito do auxiliar ir, e nunca infinitivo do verbo principal + imperfeito do auxiliar haver. A hipótese levantada acima decorreu do fato de ser bastante freqüente o uso de construções em que aparece o auxiliar IA seguido do infinitivo do verbo principal, nos dados analisados. Um estudo mais aprofundado devesse, talvez, ser feito para que pudéssemos confirmar ou refutar a hipótese apresentada. Resta-nos ainda abordar o emprego dos diferentes tempos e modos. Sabemos que, com o modo indicativo, exprime-se, em geral, uma ação ou um estado considerados na sua realidade ou na sua certeza, quer em referência ao presente, quer ao passado ou ao futuro. Com relação ao pretérito imperfeito, a própria denominação desse tempo ensina-nos o seu valor fundamental: o de designar um fato passado, mas 85 Augustus – Rio de Janeiro – Vol. 07 – N. 15 – Jul./Dez. – 2002 – Semestral não concluído; ou ainda, uma ação habitual no passado. Encerra, pois, uma idéia de continuidade, de duração do processo verbal, mais acentuada do que os outros tempos pretéritos, razão por que se presta especialmente para descrições e marcações de acontecimentos passados. A gramática tradicional registra ainda o emprego do pretérito imperfeito do indicativo no lugar do futuro do pretérito para denotar um fato que seria conseqüência certa e imediata de outro que não ocorreu ou não poderia ocorrer. Sejam os exemplos: O patrão é porque não tem força. Tivesse ele os meios e isto virava um fazendão (Monteiro Lobato). Se eu não fosse mulher, ia também (M. Torga). O pretérito imperfeito, sendo um tempo relativo, tem o seu valor temporal comandado pelos verbos com os quais se relaciona, ou pelas expressões temporais que o acompanham. Sobre o tempo futuro, tem-se que indica uma ação por fazer. O futuro perfeito, especificamente, corresponde a uma ação por fazer em relação ao pretérito. Segundo a gramática tradicional, exprime a incerteza (probabilidade, dúvida) sobre os fatos passados; é empregado nas afirmações condicionadas, quando se referem a fatos que não se realizaram e que, provavelmente, não se realizarão. Considerem-se os seguintes exemplos: Se não houvesse diferenças, nós seríamos uma pessoa só (Graciliano Ramos). Qual a mulher que, se pudesse, o senhor levaria para uma volta ao cosmos? (Carlos Drummond de Andrade). Ainda sobre o futuro do pretérito, é importante dizer que pode também ser substituído por locuções verbais, formadas, como vimos anteriormente, pelo auxiliar ir + querer, desejar, dever, entre outros, + infinitivo do verbo principal. Sejam os exemplos: Se tivesse jogado, eu ia ser milionária (Falante entrevistado). Que palavras um sujeito podia usar para responder ao Vieirinha? (Fernando Namora). Do exposto podemos concluir que há motivos substanciais que levam o falante a fazer uso do 86 pretérito imperfeito do indicativo no lugar do futuro do pretérito, como exporemos a seguir. Em primeiro lugar, podemos considerar o próprio processo de formação do pretérito, outrora chamado “condicional”, que acaba por apresentar um ponto comum como o pretérito imperfeito: a forma de imperfeito do auxiliar haver, que, como já vimos, é um dos elementos formadores do referido tempo. Além disso, está o fato de ambos serem tempos relacionais, funcionando de maneira sincronizada com outros verbos que exprimiam fatos ou suposições com os quais tanto o pretérito imperfeito como o futuro do pretérito se ligam. Partindo para o sentido estritamente prático da pesquisa de campo realizada, temos a considerar os aspectos que se seguem. Os dados levantados sobre o fenômeno estudado perfizeram um total de 373 formas, distribuídas da seguinte forma: 233 registraram usos de pretérito imperfeito e 140 de futuro do pretérito. A primeira verificação realizada confirma a hipótese levantada: há efetiva variação no emprego do pretérito imperfeito do indicativo e do futuro do pretérito, no discurso oral. Os resultados demonstram a coexistência de formas que, semanticamente, se correspondem, mostrando-se mais freqüente o emprego do pretérito imperfeito sobre o futuro do pretérito. Mostra-se, pois, como um fenômeno que merece ser estudado com mais detalhe. Como já dissemos, foram levados em comta os fatores extralingüísticos: faixa etária e escolaridade. O critério da faixa etária está diretamente ligado ao dinamismo das línguas. A mudança por que as línguas passam através dos tempos não se dá de forma abrupta; ao contrário, as mudanças lingüísticas ocorrem de maneira gradual. A tendência maior é os falantes mais velhos preservarem as formas mais antigas ou, socialmente, consagradas, o mesmo ocorrendo em relação àqueles que apresentam maior escolarização, ou que ocupam cargos de mais prestígio social. Consideraram-se três faixas: de 15 a 29 anos; de 30 a 49 e de 50 anos em diante. Na análise da variável nível de escolaridade, foram examinados dois grupos: primeiro segmento do Ensino Fundamental (antiga quarta série Augustus – Rio de Janeiro – Vol. 07 – N. 15 – Jul./Dez. – 2002 – Semestral primária) e Ensino Médio. A escolha dessa variável visa à verificação do poder coercitivo da escola na seleção vocabular do falante nativo, incluindo-se aqui a escolha de uma ou outra forma verbal. Mesmo não tendo sido controlado o fator extralingüístico sexo, cuidou-se para que, na seleção de falantes, houvesse equilíbrio entre o número de homens e de mulheres entrevistados: 50% do sexo masculino e 50% do feminino. Com relação ao fator idade, a análise dos resultados obtidos nos revela que os mais jovens tendem a romper, de forma mais radical, com a tradição gramatical do que os indivíduos pertencentes às outras duas faixas etárias: é na faixa etária de 15 a 29 anos que se encontra o maior número de formas no pretérito imperfeito do indicativo, em contextos que apontam a idéia de “possibilidade”. Contrastando com a situação descrita acima, encontram-se os falantes mais velhos, que concentram o maior percentual de uso do futuro do pretérito. Pelo menos uma causa poderia ser destacada, no sentido de explicar tal fato: a força coercitiva do grupo e da escola, que acaba por determinar certos padrões lingüísticos de comportamento. É importante, ainda, observar que os resultados demonstram que o uso de cada um dos tempos verbais estudados está marcadamente mais diferenciado na fala dos mais velhos. É essa faixa etária que apresenta maior diferença percentual no uso do futuro de pretérito sobre o pretérito imperfeito do indicativo. Tal resultado vem seguido de perto pelos resultados apresentados pela faixa mais jovem, na qual se verifica vantagem do pretérito imperfeito sobre o futuro do pretérito do indicativo. Com relação à faixa intermediária, é nela que se pode observar o maior equilíbrio no emprego das formas verbais estudadas. A posição “intermediária” em relação à faixa etária manifesta-se do mesmo modo no que diz respeito ao comportamento lingüístico. A análise do fator escolaridade no desempenho lingüístico dos falantes entrevistados trouxe-nos o seguinte resultado: a escolaridade de segundo grau condiciona o maior emprego do futuro do pretérito. Tal resultado aponta, também aqui, a força coercitiva da escola tradicional, do ensino prescritivo no desempenho lingüístico do indivíduo. Nesse caso, a finalidade maior da escola é impor um registro que valoriza única e exclusivamente a norma culta da língua, que, por sua vez, se caracteriza pela rigidez formal em relação às normas gramaticais. O objetivo da escola é, pois, nesse caso, fazer com que o aluno “fale e escreva de maneira correta”. Falar e escrever corretamente significa obedecer às regras apresentadas pela gramática tradicional. É necessário notar que ocorre o inverso, quando se considera o grupo com nível de primeiro grau. Os números percentuais se correspondem às avessas. Quanto menor o nível de escolaridade, mais freqüente é o emprego do pretérito imperfeito em substituição ao futuro do pretérito, ocorrendo o inverso em relação ao futuro do pretérito. Assim sendo, conclui-se que existe, efetivamente, na língua uma tendência forte de substituir o futuro de pretérito pelo pretérito imperfeito do indicativo, nos contextos em que está presente a idéia de possibilidade. Embora encontremos nas gramáticas que tal substituição verdadeiramente ocorre, sendo-nos apresentados exemplos extraídos de textos literários, no discurso oral, na fala mais espontânea e descontraída, é possível verificar a veracidade lingüística da questão. As hipóteses levantadas inicialmente foram confirmadas pela análise dos dados estudados. A primeira delas dizia respeito ao comportamento lingüístico dos mais jovens. Nosso estudo revelou que os jovens realmente tendem a usar com mais freqüência o pretérito imperfeito do indicativo do que o futuro do pretérito, acontecendo o oposto com os falantes mais velhos, que utilizam, bem mais freqüentemente, o futuro do pretérito do indicativo. Com relação à segunda hipótese, mostrou-se forte o papel desempenhado pela escola no momento em que o falante deve escolher entre duas formas verbais de que dispõe. Os que apresentam maior nível de escolaridade optam pelo uso do futuro do pretérito, caindo na escolha do pretérito imperfeito para os de escolaridade mais baixa. Entendemos, inclusive, que, caso a escola deixe 87 Augustus – Rio de Janeiro – Vol. 07 – N. 15 – Jul./Dez. – 2002 – Semestral de exercer um autoritarismo tão grande em relação à valorização exclusiva do registro culto, a partir da obediência rigorosa ao padrão gramatical, é bem provável que venha a ocorrer um fenômeno de mudança lingüística, por ocasião do apagamento do uso do futuro do pretérito. A avaliação constante da presente pesquisa não dá conta, no entanto, de tudo quanto há ainda para ser analisado. Por exemplo, ao lado dos fatores extralingüísticos responsáveis pelo aparecimento de uma ou outra forma verbal, a verificação das condições ou ambientes lingüísticos mais ou me- nos favoráveis ao emprego de cada uma das formas verbais aqui estudadas seria extremamente importante para o aprofundamento do estudo realizado. Considerar, por exemplo, o tipo de verbo (se auxiliar ou principal), a presença ou ausência de um item condicional, a existência ou não de modalidade ampliariam, sem sombra de dúvida, o foco do assunto, ainda superficialmente, analisado. Esperamos, em outro momento, poder vir a realizar os planos aqui levantados. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS: ALI, M. Said. Gramática histórica da língua portuguesa. Rio de Janeiro: Acadêmica, 7. ed., 1971. BECHARA, Evanildo. Moderna gramática portuguesa. São Paulo: Nacional, 27. ed., 1982. CAMARA Jr., J. Mattoso. Estrutura da língua portuguesa. Petrópolis: Vozes, 5. ed., 1975. –––––––. História e estrutura da língua portuguesa. Rio de Janeiro: Padrão, 2 ed., 1976. –––––––. Dicionário de lingüística. Petrópolis: Vozes, 1977. –––––––. CUNHA, Celso Ferreira e CINTRA, L. F. Nova gramática do português contemporâneo. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1985. JAKOBSON, Roman. Lingüística e comunicação. São Paulo: Cultrix, 1969. KEMP, William. 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