Entrevista Especial câncer infantil Do bem Cinco

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setembro/outubro 2014
Ano 5 • n º 25
Entrevista
Oncologia para todas as especialidades
Cinco anos de avanços
no diagnóstico e
tratamento do câncer
O oncologista Sergio Simon
destaca a atualização dos
médicos como fundamental na
identificação precoce da doença
Especial câncer
infantil
Com índices elevados de cura,
tratamentos caminham na
direção das terapias-alvo
Do bem
Hospital-escola ajuda na
recuperação do paciente
ginecologia | odontologia | radioterapia pediátrica
sumário
entrevista
6
capa
14
Desde a criação da revista Onco&, houve muitas mudanças na oncologia,
melhorando a qualidade do tratamento e aumentando as chances de cura
dos pacientes
ginecologia
20
Abordagem inicial para preservação da fertilidade em pacientes oncológicos
Pedro Monteleone
odontologia
24
Cuidados odontológicos em pacientes oncológicos
Levy Anderson, Frederico Buhatem Medeiros e Ana Lidia Ciamponi
especial
29
A promessa das terapias-alvo no tratamento de crianças
e jovens
câncer infantil
30
Situação atual da oncologia pediátrica no Brasil
Carla Renata Donato Macedo
pediatria
34
Radioterapia pediátrica: condições para implantação e estratégias para o
aprimoramento da assistência
Paulo Eduardo R. S. Novaes
políticas públicas
39
Sem regras específicas, rede informal amplia recursos disponíveis e melhora
a estrutura voltada à oncologia pediátrica
do bem
42
Durante o tratamento de câncer infantil, o professor tem papel fundamental
para estimular qualidade de vida da criança e seu futuro promissor
campanhas
44
Conheça as ações sobre câncer que ganharam destaque na mídia e
nas redes sociais
curtas
46
Novidades sobre pesquisas, parcerias e eventos: um giro pelo mundo
da oncologia
mundo virtual
48
Aplicativos para tablets e smartphones que ajudam médicos a se manter
sempre atualizados para o diagnóstico e tratamento de seus pacientes
acontece
49
Fique por dentro dos congressos, simpósios, encontros de atualização e outros
tantos eventos da área
calendário
50
Programe-se: eventos e congressos que estão por vir
O oncologista Sergio Simon fala sobre a importância de estudar e manter uma
rede de relacionamento que facilite o acesso a estudos e pesquisas
Conselho
editorial
Editor clínico:
Sergio D. Simon
I – Cancerologia clínica
II – Cancerologia cirúrgica
IV – Patologia
Oncologia clínica:
Abdômen:
André Moraes (SP)
Anelise Coutinho (BA)
Artur Katz (SP)
Auro Del Giglio (SP)
Carlos Sampaio (BA)
Clarissa Mathias (BA)
Claudio Petrilli (SP)
Daniel Herchenhorn (RJ)
Fernando Maluf (SP)
Fernando Medina (SP)
Igor Morbeck (DF)
Jacques Tabacof (SP)
João Nunes (SP)
José Bines (RJ)
Karla Emerenciano (RN)
Marcelo Aisen (SP)
Marcelo Collaço Paulo (SC)
Maria de Fátima Dias Gaui (RJ)
Mario Luiz Silva Barbosa (SP)
Nise Yamaguchi (SP)
Oren Smaletz (SP)
Paulo Marcelo Gehm Hoff (SP)
Roberto Gil (RJ)
Sebastião Cabral Filho (MG)
Sérgio Azevedo (RS)
Sergio Lago (RS)
Ademar Lopes (SP)
José Jukemura (SP)
Laercio Gomes Lourenço (SP)
Marcos Moraes (RJ)
Paulo Herman (SP)
Carlos Bacchi (SP)
Felipe Geyer (SP)
Fernando Soares (SP)
Onco-hematologia:
Carlos Chiattone (SP)
Carmino de Souza (SP)
Daniel Tabak (RJ)
Jane Dobbin (RJ)
Nelson Spector (RJ)
Vânia Hungria (SP)
Transplante de medula:
Jairo Sobrinho (SP)
Luis Fernando Bouzas (RJ)
Nelson Hamerschlak (SP)
Yana Novis (SP)
Ginecologia:
Jorge Saad Souen (SP)
Sérgio Mancini Nicolau (SP)
Sophie Derchain (SP)
Mama:
Alfredo Barros (SP)
Antonio Frasson (SP)
Carlos Alberto Ruiz (SP)
Maira Caleffi (RS)
Ruffo de Freitas (GO)
Neurologia:
Manoel Jacobsen Teixeira (SP)
Marcos Stavale (SP)
V – Cuidados paliativos e dor
Ana Claudia Arantes (SP)
Fabíola Minson (SP)
João Marcos Rizzo (RS)
Ricardo Caponero (SP)
VI – Pesquisa
Carlos Barrios (RS)
Conceição Accetturi (SP)
Everardo D. Saad (SP)
Greyce Lousana (SP)
Gustavo Werutzky (RS)
VII – Radiologia e
diagnóstico por imagem
Jairo Wagner (SP)
Cabeça e pescoço:
VIII – Radioterapia
Luis Paulo Kowalski (SP)
Vergilius Araújo (SP)
João Victor Salvajoli (SP)
Ludmila Siqueira (MG)
Paulo Novaes (SP)
Robson Ferrigno (SP)
Rodrigo Hanriot (SP)
Wladimir Nadalin (SP)
Tecido osteoconjuntivo:
Olavo Pires de Camargo (SP)
Reynaldo J. Garcia Filho (SP)
Tórax:
Angelo Fernandez (SP)
Riad Naim Younes (SP)
IX – Especialidades médicas
Urologia:
Cardiologia:
Antônio Carlos L. Pompeu (SP)
Miguel Srougi (SP)
Roberto Kalil Filho (SP)
III – Biologia molecular
Mario Luiz Silva Barbosa (SP)
Ada Alves (RJ)
André Vettore (SP)
Carlos Gil (RJ)
Helenice Gobbi (MG)
José Cláudio Casali (RJ)
Luísa Lina Villa (SP)
Maria Isabel Achatz (SP)
Gastroenterologia:
Clínica médica:
Carlos de Barros Mott (SP)
Geriatria:
Wilson Jacob Filho (SP)
Pneumologia:
Carlos Roberto de Carvalho (SP)
Ano 5 • número 25
setembro/outubro 2014
Publisher Simone Simon
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Impressão: Ipsis Gráfica
Tiragem: 10 mil exemplares
ISSN: 2179-0930
Editorial Regiane de Oliveira
[email protected]
Jiane Carvalho
[email protected]
Jornalista responsável: Regiane de Oliveira
(MTb 35.749/SP)
Subeditor Gabriel Ferreira
[email protected]
Colaboraram nesta edição: Carla Renata Donato
Macedo, Elaine Almeida, Levy Anderson, Paulo
Eduardo R.S. Novaes, Pedro Monteleone,
Viviane Gomes
A revista Onco& – Oncologia para todas as especialidades,
uma publicação da Iaso Editora, especializada em comunicação médica, traz informações sobre oncologia a
profissionais de todas as especialidades médicas. De circulação bimestral, tem distribuição nacional e gratuita
por todo o território nacional. A reprodução do conteúdo
da revista é permitida desde que citada a fonte. A opinião
dos colaboradores não reflete necessariamente a posição
da revista.
Direção de arte/Prepress Ione Franco
[email protected]
Consultora médica Cristiane Benvenuto Andrade
Revisão Patrícia Villas Bôas Cueva
4
setembro/outubro 2014 Onco&
Errata: Diferentemente do informado na página 16 da última
edição de Onco&, o doutor Sérgio Roithman é oncologista do
Hospital Moinhos de Vento e não do Hospital Mãe de Deus
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(11) 2478-6985 (redação) – (21) 3798-1437 (comercial)
Tempo de comemorar e refletir
H
Á CINCO ANOS, QUANDO ACEITAMOS O DESAFIO
DE TIRAR DO PAPEL O PROJETO DA REVISTA
Onco&, COM O OBJETIVO DE LEVAR INFORMAÇÃO
de qualidade sobre o câncer para capacitar médicos
não especialistas, não eram poucas as dúvidas que
nos rondavam. Iríamos sensibilizar os oncologistas
de nossa cruzada? Seríamos capazes de chegar ao
nosso público-alvo? Como trataríamos do tema
com a profundidade de um profissional do setor de
saúde mas sem o peso da linguagem excessivamente técnico-científica?
Não podemos dizer que cinco anos depois
temos muitas certezas, aliás, aprendemos que não
há certezas na luta contra o câncer. Vivemos um
constante embate entre esperanças, erros e acertos.
Mas podemos garantir que tivemos muitas vitórias.
Com uma tiragem de 10 mil exemplares, a Onco&
se consolidou como referência na cobertura especializada sobre o câncer, chegando gratuitamente a
médicos em todas as regiões do Brasil.
E isso só é possível com o apoio de tantos médicos parceiros, que, nestes cinco anos, colaboram
com reportagens, artigos, sugestões e muito encorajamento. São médicos como o nosso entrevistado
desta edição, Sergio Simon, diretor do Centro Paulista de Oncologia e um dos maiores especialistas
do tema no Brasil, que nos acompanha desde o começo como editor clínico, compartilhando de nossa
missão de disseminar o conhecimento.
A todos os colaboradores, obrigada por dividirem com a gente este sonho!
Temos que admitir também que a Onco& foi
beneficiada por um período de grande inovação na
pesquisa e no tratamento do câncer, o que tornou
nosso trabalho muito mais recompensador. Quando a revista foi lançada, não ouvíamos falar na
associação entre obesidade e câncer, por exemplo.
E só poucos dias antes de fecharmos a reportagem
de capa é que a revista médica The Lancet publicou
um estudo mostrando que um alto índice de massa
corpórea (IMC) pode aumentar o risco de desenvolvimento de dez dos mais comuns tipos de câncer. Trata-se da maior pesquisa do gênero, com
5 milhões de adultos participantes, que mostra
resultados alarmantes: o excesso de peso pode ser
responsável por 41% dos casos novos de câncer de
útero e 10% ou mais dos casos de tumores na vesícula, rim, fígado e cólon, no Reino Unido.
Neste período acompanhamos ainda a genética
se tornando parte indissociável da pesquisa e do
tratamento de câncer. A ANS definiu critérios para
o uso de tecnologias no rastreamento e tratamento
de 29 doenças genéticas, como a pesquisa do gene
BRCA1/BRCA2 pelos planos de saúde. Outra área
que vem avançando é a imunoterapia, que há cinco
anos era considerada apenas promissora e foi apontada como o breakthrough de 2013 pela revista
Science, não só para o tratamento de melanoma
mas também para outros tipos de câncer, como o
de pulmão.
Isso não é tudo. Tivemos avanços consideráveis
em políticas públicas, como a compra pelo Ministério da Saúde de 80 aceleradores lineares, a lei dos
60 dias para atendimento de pacientes com câncer
e mesmo o Programa Nacional de Apoio à Atenção
Oncológica (Pronon). Mas sabemos que há muito
a ser revisto no que diz respeito à atenção pública
ao câncer, a começar pelo entendimento de que o
aumento na incidência da doença é iminente.
A Onco& também está fazendo sua revisão. Por
isso, pela primeira vez, trazemos um especial sobre
câncer infantil, em parceria com a Sociedade Brasileira de Oncologia Clínica (Sobope), que nos orientou e nos ajudou a definir prioridades na cobertura
e definição de artigos. Será um campo fértil para
explorarmos no futuro, abrindo espaço para ampliar o alcance da revista a outros profissionais.
Boa leitura!
Simone Simon
Publisher
Contato: [email protected]
Onco&
Onco& setembro/outubro
setembro/outubro 2012
2014
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entrevista
Disseminar conhecimento,
missão que facilita o diagnóstico
Ficar alerta aos sintomas é a principal forma de identificar se
um paciente está ou não com câncer. Para que isso aconteça,
é preciso estudar e manter uma rede de relacionamento que
facilite o acesso a estudos e pesquisas
Por Elaine Almeida
M
Divulgação
ANTER-SE EM CONSTANTE ATUALIZAÇÃO. ESSE
É O GRANDE DESAFIO DOS PROFISSIONAIS ES-
Sergio Simon
*Doutor em medicina pela
Universidade de São Paulo e autor
de várias publicações nacionais e
internacionais. Oncologista do
Hospital Israelita Albert Einstein,
onde dirige o Programa de Residência Médica em Cancerologia Clínica,
além do Programa de Pós-Graduação
em Oncologia Clínica. É também
diretor-fundador do Centro Paulista
de Oncologia (CPO) e diretor-presidente do Grupo Brasileiro de
Estudos Clínicos em Câncer de
Mama e Hematologia.
Contato:
[email protected]
6
setembro/outubro 2014 Onco&
PECIALIZADOS EM ONCOLOGIA COMO SERGIO
Simon, diretor do Centro Paulista de Oncologia e
um dos maiores especialistas do tema no Brasil.
Para ele, a disseminação do conhecimento é a melhor e mais eficaz ferramenta para o diagnóstico
precoce da doença. Especializado em câncer de
mama, Simon atende todos os dias no seu consultório, no Hospital Albert Einstein. São pacientes
recém-diagnosticados com câncer que são atendidos nos consultórios, ambulatórios, além dos que
já estão internados ou que concluíram o tratamento
mas ainda precisam de atenção especial. Além de
clinicar, Simon é professor-doutor da Universidade
Federal Paulista (Unifesp) e dirige o Programa de
Residência Médica em Cancerologia Clínica e o de
Pós-Graduação em Oncologia Clínica do Hospital
Albert Einstein, onde faz parte ainda da equipe que
realiza semanalmente reuniões científicas para estudar e apresentar novidades de tratamento. “Oncologia é um terreno que está sempre mudando. É
preciso estar atualizado o tempo todo porque as
coisas evoluem, as pesquisas são muito dinâmicas
e a quantidade de material publicado é gigantesca.”
Formado em medicina pela Universidade de São
Paulo, Simon optou por fazer a sua residência nos
Estados Unidos numa época em que não existiam
estudos sobre oncologia no Brasil – e mesmo nos
Estados Unidos eles ainda eram embrionários.
“Minha ideia inicial era me especializar em hematologia, pois não existia oncologia clínica ainda, nem
nos Estados Unidos”, diz. Até que um de seus predecessores chamou sua atenção para o tratamento
de tumores sólidos. “Naquela época, havia poucas
drogas, os resultados eram péssimos e os cuidados
paliativos muito pobres. Era uma área muito complicada, mas também com um desafio muito
grande”, afirma o médico. Ele então se candidatou
a uma vaga de residente no Memorial Sloan Kettering Cancer Center de Nova York e foi aceito. Até
hoje, 30 anos depois, ele fala sobre o seu trabalho
com sensibilidade e brilho nos olhos, mas com toda
a serenidade e a dedicação de quem é considerado
um dos maiores especialistas do tema no país.
Onco& – Como o senhor avalia o nível de informação e a formação dos médicos não especialistas, especialmente em relação à capacidade
de diagnosticar um câncer em um paciente que
chega ao consultório sem suspeitar da doença?
Sergio Simon – Nos últimos anos, eu diria que nos
últimos 20 anos, a qualidade de avaliação melhorou
muito, porque o câncer passou a ser uma doença
muito frequente. A maioria dos clínicos ou das especialidades básicas da medicina está muito alerta
para o câncer. Hoje, eles se informam melhor e estudam mais e a gente nota que, de uma maneira
geral, os não especialistas estão conhecendo mais
sobre o assunto. Nesse sentido, a revista Onco& contribui para espalhar conhecimento e para que todos
fiquem alertas aos sinais de sintomas de câncer.
Onco& – O senhor comentou que a incidência
de câncer tem sido mais frequente nos dias de
hoje. Essa maior incidência tem a ver com um
número mais elevado de casos de câncer ou é a
melhora da capacidade de diagnosticar que
eleva a quantidade de casos identificados?
Sergio Simon – Em alguns tipos de câncer, a incidência aumenta, como nos casos de linfoma e melanoma, que são algumas
das doenças cujo número
de casos tem crescido. Mas,
em outros, a prevalência aumenta e o número de casos
cresce porque a população
está vivendo muito mais. O
câncer é uma doença que
normalmente vem com a
idade, é a partir dos 60 anos
que começa a aumentar
bastante o número de casos, e hoje temos muita
gente acima dos 60 anos,
70 anos ou até na casa dos
90 anos e 100 anos. Essas
pessoas estão mais sujeitas
à doença e é por isso que os
casos de câncer têm aumentado no país.
caro, mas não montar o programa é mais caro ainda,
porque o diagnóstico é feito quando os casos já
estão avançados, exigindo tratamentos custosos.
Quando se detecta um câncer de mama em estágio
avançado, por exemplo, o tratamento é caríssimo,
porque é preciso fazer quimioterapia, radioterapia,
cirurgia etc. Na maioria das vezes, o mesmo caso
diagnosticado numa fase precoce poderia ser resolvido com uma simples cirurgia.
Onco& – Além de mais investimento do setor
público, que outras sugestões o senhor daria
para melhorar o processo de diagnóstico no país?
Sergio Simon – Seria preciso disponibilizar acesso
mais fácil aos métodos de diagnóstico para a população no serviço público, especialmente nos municípios menores. A presidente Dilma (Rousseff) até
designou uma verba adicional em 2011 para investir no diagnóstico de câncer de colo do útero e câncer de mama de forma mais precoce no Brasil.
Foram destinados cerca de 4 bilhões de reais para
melhorar os laboratórios, especialmente no Norte
e no Nordeste, regiões que ainda pecam pela qualidade. Mas acho que isso ainda não causou impacto significativo. No Norte do país, o câncer de
colo do útero, que é uma doença evitável e curável,
ainda não baixou sua incidência. Em lugares como
Belém do Pará, por exemplo, o câncer de colo do
útero é mais frequente que o câncer de próstata ou
de mama, e isso não poderia ser assim. É um câncer
fácil, com tratamento muito eficaz e que cura praticamente tudo.
Onco& – Na sua avaliação, esse atraso nos pro-
Onco& – O senhor acha
que ainda existem muitos erros de diagnóstico
no Brasil? Comparando
hoje com cinco anos
atrás, o que mudou?
Sergio Simon – Sim, há
problemas. Mas não há
dúvida de que melhorou,
apesar de ainda ter que melhorar muito. O Brasil, em
termos de saúde pública,
tem poucos programas de
detecção precoce de câncer.
Montar o programa é muito
cessos de diagnóstico nas regiões Norte e Nordeste tem a ver com a falta de profissionais
mais qualificados atendendo nessas áreas?
Sergio Simon – Esse diagnóstico precoce pode ser
feito por não médicos. Existe um programa realizado na Índia com testes baratos, feitos com vinagre.
São testes baratíssimos, que custam centavos por
pessoa, nos quais se localizam e se identificam lesões
pré-malignas ao aplicar vinagre no colo do útero.
Onco& – Por que programas como esse ainda
não são realizados no Brasil?
Sergio Simon – Pois é... Por que tanta coisa não
acontece no Brasil ainda? E no caso desse teste com
vinagre, é possível treinar uma enfermeira para
Onco& setembro/outubro 2014
7
“Montar o programa
(de prevenção) é
muito caro, mas
não montar o
programa é mais
caro ainda, porque
o diagnóstico é
feito quando os
casos já estão avançados, exigindo tratamentos custosos”
fazer o exame. Um técnico que vá aonde as mulheres mais pobres estão – de preferência mulher, para
vencer a resistência natural do exame ginecológico.
Essa pessoa entra nesses bolsões de pobreza, nos
pequenos municípios e em áreas remotas. Isso daria
acesso ao diagnóstico, porque, se for esperar essas
pessoas virem até o hospital, vai custar caríssimo.
Esse tipo de atitude, preventiva do câncer, ainda
falta muito no Brasil.
Onco& – Na sua avaliação, o que o profissional
não especializado precisa para que tenha em
mãos informações que o ajudem a identificar
casos de câncer quando se deparar com eles?
Sergio Simon – Ele precisa participar de cursos e
congressos nacionais e internacionais. Ter uma rede
de contatos e saber o que está acontecendo em outros países é fundamental. Além disso, a internet
facilitou a vida do médico. Pela internet ele tem
acesso a portais muito bem-feitos, com informações
de qualidade e de acesso rápido. Além disso, há
uma série de publicações científicas na internet,
além da própria revista Onco&, que ajuda a disseminar todos esses conceitos básicos que todo médico tem que saber. Desde o psiquiatra até o
ortopedista, todo mundo tem que conhecer sintomas básicos de câncer, porque muitas vezes o paciente chega a nós por esses consultórios.
Onco& – O senhor acha que existe uma falha na
formação do médico na faculdade?
Sergio Simon – No Brasil, a oncologia é ensinada
de forma errática. Tanto que toda oncologia boa no
Brasil está fora da universidade. Diferente do que é
nos Estados Unidos, por exemplo, onde os grandes
centros de oncologia são ligados a escolas de medicina. Hoje, várias faculdades não possuem ainda
em seu currículo a área de oncologia, e a gente sabe
que o câncer vai ser a causa de morte número 1 nos
próximos 20 anos. Provavelmente essa deveria ser
a matéria do primeiro ano de faculdade.
Onco& – Que tipo de reformulação deveria ser
realizada?
Sergio Simon – A oncologia deveria fazer parte da
formação básica nas faculdades. Hoje, algumas escolas já têm essa cadeira, como em São Paulo, mas
a maioria ainda não. A cadeira de oncologia deveria
ser obrigatória, apesar de ser complexa. É uma dis-
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setembro/outubro 2014 Onco&
ciplina que precisa ter muita biologia molecular e
muita clínica médica para que o estudante de medicina entenda a relação da biologia molecular com
os sintomas do paciente. É uma cadeia de eventos
que tem que ter lógica e fazer sentido para o médico.
Onco& – Se o senhor fosse fazer uma comparação do Brasil com outros países, como faria?
Que países fazem coisas interessantes nessa
área?
Sergio Simon – A Índia faz coisas incríveis, como
esse trabalho de câncer de colo do útero. Esse trabalho foi apresentado na sessão plenária do Congresso Anual da Asco e foi ovacionado de pé
durante vários minutos. Nunca vi um trabalho receber tanto aplauso como esse. Nele, um médico indiano demonstrou que com pouquíssimos recursos
conseguiu salvar milhares de vidas. A Índia tem
grandes centros de oncologia, tem o Tata Memorian,
por exemplo, que é um grande hospital, em Mumbai, que faz tratamentos extremamente sofisticados.
Onco& – E o Brasil?
Sergio Simon – No Brasil, é claro, tem de tudo.
Existem centros de excelência como o Albert Einstein, o Sírio-Libanês e alguns hospitais públicos,
como o Icesp, em São Paulo, e o Inca, no Rio de Janeiro, que oferecem tratamento de ponta, muito
bem-feitos. Mas a verdade é que a grande maioria
da população que vai ao sistema público de saúde
não tem acesso fácil a isso. Há demora no diagnóstico, demora no tratamento, tem atraso por espera
de cirurgia, espera de radioterapia. Tudo tem fila de
espera, e isso faz muita diferença.
Onco& – Essas filas são mais resultado de um
diagnóstico feito tardiamente ou pesa mais a
falta de investimentos em novos centros de tratamento e em medicamentos?
Sergio Simon – Na verdade, é tudo. O câncer é
uma corrente que vai desde a detecção precoce até
o tratamento e, eventualmente, até a prevenção
com hábitos que evitem o câncer, como a vacinação
contra HPV, a redução de tabaco etc. São pequenas
coisas que previnem o câncer, mas o Brasil não tem
grandes serviços públicos de prevenção. Só agora
estamos começando a oferecer no serviço público
a vacinação contra o vírus HPV para as meninas.
Mas, além de a gente fazer diagnóstico em fase
muito avançada ainda, esbarramos na pouca disponibilidade de, por exemplo, radioterapia no país. O
governo federal, recentemente, tentou aumentar
bastante a base de radioterapia, mas isso ainda não
foi instalado porque não temos profissionais para
realizar esses tratamentos. Não temos físicos, não
temos técnicos, não temos radioterapeutas treinados no país.
Onco& – Qual a principal diferença nos resul-
“No Norte do país,
o câncer de colo do
útero, que é uma
doença evitável e
curável, ainda não
baixou sua incidência. Em lugares
como Belém do
Pará, por exemplo,
o câncer de colo
do útero é mais
frequente que o
câncer de próstata
ou de mama, e isso
não poderia ser
assim. É um câncer
fácil, com tratamento muito eficaz
e que cura praticamente tudo”
tados obtidos entre uma mulher que se trata no
sistema público e a que procura tratamento em
clínicas e hospitais privados?
Sergio Simon – A mulher que utiliza o sistema privado é diagnosticada mais cedo e, em geral, enfrenta
menos fila de espera para o tratamento. Isso contribui para que ela tenha mais condições de ser tratada
e de maneira mais eficaz. Já a mulher que utiliza o
serviço público normalmente vai buscar ajuda em
estágio mais avançado da doença, além de enfrentar
problemas de acesso ao tratamento. Ela tem de ficar
na fila. Às vezes o município onde ela mora, se for
muito pobre, não dispõe de radioterapia. Com isso,
ela não consegue acesso a um tratamento especializado e, muitas vezes, precisa mudar para outro município para se tratar. Isso tudo contribui para um
resultado ruim do tratamento.
Onco& – Qual a sua avaliação sobre os programas de rastreamento para o combate ao câncer
de mama?
Sergio Simon – Há estados como São Paulo em que
há um rastreamento bom. São Paulo é um estado
que há anos se dedica a fazer rastreamento de câncer
de mama. Mas há estados como o Acre, por exemplo, que tem apenas três tomógrafos, dos quais apenas um funciona. Com isso, é impossível fazer
detecção de câncer no Acre, enquanto em São Paulo
o rastreamento chegou a níveis bem razoáveis.
Onco& – E já há bons resultados desse rastreamento em São Paulo, por exemplo?
Sergio Simon – A gente tem a impressão de que a
mortalidade por câncer de mama nas regiões Sul e
Sudeste está caindo e melhorando num ritmo que
se vê em países adiantados como os Estados Unidos. Mas, no país como um todo, isso não acontece
porque tem regiões inteiras onde não se consegue
baixar a mortalidade por falta de diagnóstico pre-
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setembro/outubro 2014 Onco&
coce e talvez também por dificuldade de acesso a
um tratamento mais eficaz.
Onco& – Na sua avaliação, o que evoluiu no
tratamento de câncer de mama nos últimos
cinco anos?
Sergio Simon – Os tratamentos hoje, que chamamos de sistêmicos como metástases, micrometástases, são mais eficazes. Hoje, a mulher se trata
precocemente. Depois da cirurgia, ela já faz um
tratamento quimioterápico muito mais eficaz do que
o que se fazia 10, 15 ou 20 anos atrás. O caso mais
importante é o câncer de mama HER2+. Hoje, 20%
dos casos de câncer de mama caem nesse grupo, que
é um câncer extremamente agressivo. E o tratamento
que foi introduzido nos últimos dez anos mudou a
história natural da doença. Hoje, a gente consegue
curar um número enorme dessas mulheres, que
morriam invariavelmente dessa doença e até precocemente, porque ela tem uma evolução rápida. Com
cinco anos de acompanhamento dessas mulheres,
92% delas estão sem sequelas. Esse número é muito
superior ao que se tinha dez anos atrás, antes da introdução desses novos tratamentos.
Onco& – A dupla mastectomia realizada pela
atriz Angelina Jolie chamou a atenção para a
oncogenética. Como ela tem ajudado no tratamento de câncer de mama? A mastectomia radical é uma opção preventiva? Em quais casos?
Sergio Simon – Esse caso foi bom para falarmos
mais da doença. No caso da atriz, a dupla mastectomia era uma opção. Esse tipo de procedimento é
indicado para pessoas como ela, que é portadora
do tipo de mutação genética que ela tem. Nesses
casos, o risco de ter câncer de mama é de mais de
80% e, por isso, a mastectomia é correta. A gente
também faz isso aqui no Brasil. É aconselhado para
mulheres portadoras da mutação que considerem
essa opção. Não que seja obrigatório fazer, mas é
uma opção para ela se ver livre do risco ou pelo
menos para baixar muito o risco de ter câncer de
mama. Agora, para mulheres que não têm a mutação, é um absurdo você tirar a mama normal para
não ter câncer no futuro. A decisão da atriz de fazer
a mastectomia e a divulgação do procedimento
foram boas porque chamaram a atenção para o
risco de câncer de mama familiar, um problema que
atinge entre 6% e 8% das mulheres.
Onco& – Na rede pública esse tipo de procedimento é comum
também? Por quais razões?
Sergio Simon – Infelizmente, esses casos são muito pouco diagnosticados na rede pública porque existem poucos centros de oncogenética
na rede pública e muitos mastologistas não estão atentos a isso. Mas o
ideal seria que o próprio governo tivesse interesse em localizar essas
famílias. É mais fácil tratá-las nessa fase profilática do que esperá-las
ter câncer de mama.
Onco& – Qual é a chance de preservação da mama em casos nos
quais a mastectomia é necessária?
Sergio Simon – Depende do estágio do câncer. A preservação da
mama depende do estágio em que a doença é diagnosticada.
Onco& – O senhor acaba de voltar do Congresso da ASCO (Sociedade Norte-Americana de Oncologia Clínica). O que foi destaque
em sua opinião? Quando vamos encontrar no Brasil as terapias
que foram apresentadas no Congresso?
Sergio Simon – O Brasil já tem acesso aos medicamentos e às terapias
apresentadas na ASCO. Um exemplo são as drogas novas para tratar
HER2+.
Onco& – Quais são essas drogas e quais vantagens elas adicionam
conseguiu reverter esse quadro com os pacientes. Hoje eles vivem em
melhores condições e têm mais chances de cura também.
Onco& – O Senhor é um dos fundadores Grupo Brasileiro de Estudos Clínicos em Câncer de Mama (GBECAM). Qual a importância
desses grupos colaborativos?
Sergio Simon – Grupos colaborativos são importantes, primeiramente, para disseminar informação e conhecimento. No GBECAM,
temos conselhos científicos sobre temas como câncer gastrointestinal
e oncologia torácica. São grupos que se dedicam a reunir os especialistas e a disseminar conhecimento, além de melhorar o atendimento
nessas subespecialidades. Eles são importantes porque a gente tenta
fazer pesquisa clínica no Brasil e pouquíssimo se consegue. Infelizmente, fazer pesquisa clínica no Brasil é muito difícil.
Onco& – Por quê? Falta financiamento?
Sergio Simon – Não. O que dificulta são os trâmites burocráticos do
governo. Para se liberar um estudo no Brasil é difícil, os prazos de
aprovação são extremamente longos. Com isso, os estudos internacionais praticamente não vêm mais ao Brasil, porque quando a gente consegue abrir o estudo aqui, a seleção já está terminando lá fora.
ao tratamento?
Sergio Simon – Uma delas é a emtansina, por exemplo. Elas são mais
eficazes que as antigas. O Brasil já tem acesso a drogas bem modernas.
As que não estão no mercado ainda estão chegando. O Brasil, historicamente, sempre está um pouco atrasado na liberação dessas drogas,
mas elas acabam chegando. O problema é que a mulher do sistema
público não tem acesso a essas drogas.
Onco& – Como o senhor vê a evolução dos tratamentos?
Sergio Simon – O que aconteceu na oncologia nesses últimos 30 anos
é uma coisa fascinante. Houve uma reviravolta na especialidade, os resultados são muito superiores, a gente não vê mais pacientes com sofrimentos enormes, com dor, fraturas ósseas espontâneas. A gente
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Onco& – Qual a sua expectativa para daqui a 5, 10, 20 anos?
Sergio Simon – O câncer tem diferentes variáveis, que atacam de formas diversas, dependendo do estilo de vida e da gravidade da doença.
É bem complexo, mas estamos entendendo a doença cada vez mais e
tenho certeza de que, nos próximos 10 a 20 anos, o câncer vai estar
totalmente dominado e equacionado de uma maneira muito melhor
do que hoje. Uma prova disso é que, para alguns casos, a cura é uma
realidade. Tem gente que teve o caso há 50 anos e erradicou totalmente
a doença. E há casos em que a gente consegue prolongar a vida e deixar
a doença num estágio que não atinge o organismo da pessoa e ela consegue ter uma qualidade de vida excelente.
capa
Cinco anos de avanços
Desde a criação da revista Onco&, muita coisa mudou na oncologia,
melhorando a qualidade do tratamento e aumentando as chances
de cura dos pacientes
Por Regiane de Oliveira e Gabriel Ferreira
A
ONCOLOGIA É UMA DAS ÁREAS DA MEDICINA
QUE MAIS TÊM EVOLUÍDO AO LONGO DOS ANOS.
NOVOS EXAMES, TRATAMENTOS E ABORDAGENS
vêm sendo pesquisados e descobertos, levando o
tratamento a patamares que eram impensáveis há
não muito tempo. Com isso, receber o diagnóstico
de câncer deixou de ser a sentença de morte certa
que essa notícia representou no passado. A evolução, porém, não significa que não existam mais desafios a serem vencidos. Médicos e pesquisadores
ainda têm muito a aprender sobre como essa
doença funciona, e certamente muitas outras novidades virão pela frente, mudando ainda mais a cara
da oncologia. Há também o gargalo do diagnóstico. Por mais que
os tratamentos quimioterápicos, radioterápicos e cirúrgicos tenham passado
por pequenas revoluções nos últimos anos,
ainda é a velocidade
do diagnóstico que
pode indicar o grau
de sucesso do tratamento. E essa função, na
maioria das vezes, cabe a médicos das mais diversas especialidades, que não vivem o dia a dia da oncologia,
daí o tamanho do desafio. Por isso, levar informa-
14
setembro/outubro 2014 Onco&
ção à classe médica é tão fundamental quando falamos em combate ao câncer. Essa foi uma das
principais missões que a revista Onco& se impôs há
cinco anos, quando foi criada.
Ao longo de sua história, a Onco& mostrou em
suas páginas o quanto a oncologia evoluiu em seus
mais diversos aspectos durante esse período. Entre
os temas abordados pela publicação, estiveram
questões como o papel da medicina integrativa, os
desafios no cuidado da saúde do homem, os efeitos
do labirinto regulatório que vivemos no Brasil, as
defasagens na formação de médicos no país e diversos outros aspectos fundamentais para o debate
da oncologia brasileira. Além disso, a revista marcou presença em diversas edições da reunião anual
da ASCO, trazendo aos leitores uma visão ampla
de tudo o que havia de mais moderno em termos
de tratamento. Os artigos, escritos sempre por
gente reconhecida por sua larga experiência na
área, se tornaram ferramenta importante na apresentação e consolidação de conhecimentos, tanto
para médicos oncologistas como para os não especialistas em câncer.
Por isso, folhear as 25 edições da Onco& publicadas até hoje significa fazer um passeio pela história
e pelos desafios da oncologia ao longo desses cinco
anos. É ver uma série de avanços na área de medicamentos, a consolidação das cirurgias mais conservadoras e os passos fundamentais dados na prevenção
e no diagnóstico. Para ajudar a entender melhor
todos os avanços no diagnóstico, prevenção e tratamento do câncer nesse período, a Onco& ouviu uma
série de especialistas sobre quais são os grandes destaques da área nos últimos cinco anos. O resultado
é esta reportagem especial que você tem em mãos.
Novos caminhos para a prevenção
Há cinco anos, falar sobre os riscos da obesidade para a saúde significava falar de doenças cardíacas, pressão alta e diabetes. Mas esse repertório
vem mudando. Uma pesquisa publicada em agosto
na revista médica The Lancet mostrou que um alto
índice de massa corpórea (IMC) pode aumentar o
risco de desenvolvimento de dez dos mais comuns
tipos de câncer, de acordo com o estudo envolvendo IMC e câncer feito com uma base inédita de
5 milhões de adultos, no Reino Unido.
Pesquisadores da London School of Hygiene&
Tropical Medicine e do Farr Institute of Health
Informatics estimam que mais de 12 mil casos entre
os tipos de câncer de maior incidência podem ser
atribuídos ao excesso de peso e à obesidade. “O número de pessoas que estão com sobrepeso ou obesidade está aumentando rapidamente tanto no
Reino Unido quanto ao redor do mundo. E já é
bem reconhecido que isso pode levar ao aumento
da diabetes e das doenças cardiovasculares. O que
nossos estudos mostram é que, se essa tendência
continuar, também podemos esperar ver substancialmente mais pessoas com câncer”, afirmou o
líder do estudo, Krishnan Bhaskaran, da London
School of Hygiene & Tropical Medicine, por meio
de nota à imprensa. Segundo os pesquisadores,
caso o IMC médio da população continue a aumentar no ritmo atual, há um potencial para o desenvolvimento de mais 3,5 mil casos extras da doença
a cada ano como resultado.
A estimativa é que o excesso de peso pode ser
responsável por 41% dos casos novos de câncer de
útero e 10% ou mais dos casos de tumores na vesícula, rim, fígado e cólon, no Reino Unido. “As descobertas recentes relacionadas à obesidade afetam a
prática do oncologista, mas principalmente do não
oncologista, que passa a ter que alertar seus pacientes sobre isso ser um fator de risco muito significativo”, afirma Evanius Wiermann, presidente da
Sociedade Brasileira de Oncologia Clínica (SBOC).
É nesse contexto que ganham importância em
diversas partes do mundo os debates em torno de
medidas públicas para conter a epidemia de obesidade. As saídas passam por iniciativas que visem
melhorar a qualidade de vida da população, como
sobretaxar alimentos calóricos ou pobres nutricionalmente, como as bebidas adoçadas com açúcar,
dar subsídios para a produção de alimentos saudáveis e até mesmo mudar o planejamento urbano na
tentativa de incentivar formas de mobilidade que
favoreçam a atividade física, como as ciclovias.
O papel do rastreamento
Não faz muito tempo, a luta contra o tabagismo
era o principal aspecto da prevenção de novos casos
de câncer de pulmão. Hoje em dia, no entanto,
dados recentes mostram a necessidade de criação
de programas de rastreamento mais efetivos. Em
artigo publicado na Onco& 24, Ricardo Sales dos
Santos, líder do ProPulmão – Programa de rastreamento do câncer de pulmão no Brasil, afirma que
dados recentes mostram a efetividade da tomografia
do tórax de baixa dose no rastreamento do câncer
de pulmão, com potencial superior ao rastreamento
para tumores de mama e cólon, por mamografia ou
colonoscopia, respectivamente. “Estima-se que são
necessários 320 exames para salvar uma vida no
rastreamento do câncer de pulmão, ou 219 exames
considerando outros agravos do tórax; no caso da
mamografia são estimados 570 exames (idade
acima dos 50 anos), enquanto para o câncer do
cólon são necessários 871 exames para salvar uma
vida”, avalia.
O desafio, porém, é financiar esse rastreamento
mais detalhado. “Ainda não tem dinheiro que
pague esse tipo de programa, nem tomógrafos. Mas
o mundo está se debruçando sobre essa questão”,
afirma Rafael Kaliks, diretor científico do Instituto
Oncoguia. Enquanto perdura essa dificuldade,
cerca de 27 mil pessoas no Brasil morrem por causa
do câncer de pulmão todos os anos, sendo que, em
mais de 90% dos casos, trata-se de uma doença incurável ou em estágio onde o tratamento tem pouco
efeito na sobrevida global.
Se por um lado o rastreamento de algumas
doenças avança, em outras questões, que eram tidas
como básicas, passa a sofrer alguns questionamentos. É o caso do uso do antígeno prostático específico, mais conhecido como PSA, uma prova
química útil como complemento no diagnóstico do
câncer de próstata. Sua eficácia no rastreamento
Entre os avanços em
prevenção mais
comemorados dos
últimos 5 anos está
a decisão do governo
federal brasileiro de
incluir a vacina do
HPV (papiloma vírus
humano) no
Programa Nacional
de Imunizações
(PNI)
Onco& setembro/outubro 2014
15
desse tipo de tumor, porém, foi colocada em xeque nos últimos cinco
anos. Há dois anos uma série de estudos afirmou que o teste para indivíduos de risco não apresentava melhores resultados que o exame
de toque. Em 2012, a Força-Tarefa de Saúde Preventiva que norteia
as ações do governo norte-americano soltou uma nova diretriz sobre
o rastreamento de câncer de próstata, em que afirmava que, com base
em levantamento feito com 1 milhão de pacientes, homens com menos
de 75 anos, saudáveis, não precisam fazer o PSA, uma vez que o exame
daria muitos falso-positivos, fazendo com que os pacientes fossem submetidos a procedimentos desnecessários. De acordo com a diretriz, o
exame de toque retal seria tão ou mais eficiente que o PSA. No Brasil,
o Instituto Nacional de Câncer (Inca) segue as mesmas orientações.
O avanço da vacinação
Entre os avanços em prevenção mais comemorados dos últimos
cinco anos está a decisão do governo federal brasileiro de incluir a vacina do HPV (papiloma vírus humano) no Programa Nacional de Imunizações (PNI). De acordo com dados da Organização Mundial da
Saúde (OMS), o vírus, que infecta cerca de 75% da população mundial
ao longo da vida, é responsável por 90% dos casos de câncer de colo
do útero – segunda neoplasia mais comum entre as mulheres, atrás
apenas do câncer de mama –, além de ser o causador de câncer de
ânus, vagina, pênis e cavidade oral. Só neste ano, o Inca estima o surgimento de 15 mil novos casos – dos quais cerca de 4,8 mil são atribuídos ao câncer de colo de útero. Por enquanto, a duração da
imunidade da vacina ainda levanta dúvidas, visto que só começou a
ser comercializada no mundo há cerca de dois anos. Porém, a expectativa é que o produto garanta cinco anos de proteção.
A campanha para imunizar meninas de 11 a 13 anos contra o HPV
no Sistema Único de Saúde (SUS) foi lançada em 2014. A vacina aplicada no Brasil é a quadrivalente, recomendada pela OMS, com eficácia
de 98%, protegendo o indivíduo dos tipos 6, 11, 16 e 18 da doença.
A adesão à vacina tem superado as expectativas. Dados do Ministério
da Saúde, divulgados em junho deste ano, mostram que em cerca de
três meses de mobilização mais de 4,1 milhões de meninas receberam
a primeira dose da vacina contra HPV. O número representa 84,5%
do público-alvo, formado por 4,9 milhões de adolescentes na faixa
etária de 11 a 13 anos. A partir de setembro, as meninas receberão a
segunda dose.
Paralelamente ao trabalho de prevenção, Kaliks afirma que é obrigatório que os programas de rastreamento e detecção precoce do câncer de colo do útero avancem na rede pública. “Ninguém deveria
morrer em um país que tem programa de Papanicolau, mas justamente
os países onde temos maior incidência de HPV são aqueles onde o sistema de saúde não faz adequadamente a prevenção”, afirma Kaliks.
“O SUS tenta fazer um rastreamento, mas a aderência das mulheres é
baixa e a qualidade dos exames também não é boa, especialmente em
regiões de grande vulnerabilidade, como a Amazônica.”
Kaliks defende que o governo deveria olhar de forma distinta para
16
setembro/outubro 2014 Onco&
regiões com alta incidência de câncer do útero e ser mais complacente
com o limite de idade, ampliando nessas áreas para as jovens e mulheres com mais de 13 anos.
A ascensão da oncogenética
“Estes últimos cinco anos foram sensacionais para a oncogenética.”
Essa constatação é da geneticista Maria Isabel Waddington Achatz, do
A.C. Camargo. “Tivemos um avanço de inovação importante, no qual
passamos da disponibilização de testes genéticos por sequenciamento
para os painéis de next generation, com custo cada vez mais reduzido.”
Os primeiros painéis de next generation começaram a ficar prontos
nos Estados Unidos em 2012. Eles são importantes especialmente no
caso de famílias com vários tipos de câncer e sobreposição de diagnóstico, uma vez que a nova geração consiste no sequenciamento, de
forma massiva e paralela, de milhões de sequências-molde de DNA.
“Nosso desafio é como analisar os resultados, de forma a oferecer, em
meio a tanta informação, os dados que realmente interessam aos pacientes”, afirma a geneticista.
O custo desse tipo de tecnologia ainda é alto, mas vem diminuindo. “O painel de next generation custava em 2013 cerca de
R$ 12 mil. Mas já é possível encontrá-los no mercado por R$ 5,3 mil.”
A geneticista lembra que, quando começou a trabalhar com testes genéticos, no início dos anos 2000, o preço chegava a R$ 15 mil.
Esses testes já começam a ser autorizados pelos planos de saúde
no Brasil. O Rol de Procedimentos e Eventos em Saúde anunciado pela
Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) em janeiro de 2014
evidenciou esta tendência irreversível na luta contra o câncer: a incorporação de testes. A ANS definiu 22 critérios para o uso de tecnologia
no rastreamento e tratamento de 29 doenças genéticas, como pesquisa
do gene BRCA1/BRCA2 (que ficou famoso por conta da atriz Angelina
Jolie, que fez mastectomia preventiva por causa da mutação genética),
hemocromatose hereditária, hemofilia A e B, síndrome de WilliamsBeuren e síndrome de Lynch.
“Hoje em dia, é indissociável a moderna prática oncológica da genética. E a tendência que vemos nos portfólios das grandes empresas
de medicamentos é que elas serão dirigidas para a pesquisa genética.
Afinal, as terapias hoje em dia são personalizadas”, afirma João Bosco
Oliveira, diretor executivo do laboratório Genomika.
Infelizmente, o SUS ainda não tem acesso a esse tipo de tratamento. “Há sempre um atraso, nem as drogas mais modernas estão na
rede pública”, afirma Oliveira. “O que temos na esfera pública são projetos, financiados pelo CNPq e pela Fapesp, por iniciativa de alguns
pesquisadores, mas que, por serem testes no âmbito de pesquisa, não
oferecem o controle de qualidade de grandes laboratórios”, lembra
Maria Isabel Achatz.
O avanço da imunoterapia
Na primeira edição da Onco&, uma reportagem sobre os principais
destaques da reunião anual da ASCO daquele ano comentava a apre-
sentação de pesquisas muito promissoras sobre o uso do anticorpo monoclonal ipilumumabe no tratamento do melanoma. Na época, falar
de imunoterapia era coisa para poucos e ainda era impossível prever
qual seria o impacto desse tipo de tratamento na oncologia. “A evolução
do conhecimento sobre as interações do sistema imunológico no combate ao câncer foi enorme nesses cinco anos”, afirma Fabio Nasser, oncologista clínico do Hospital A.C. Camargo. “Até trabalhávamos com
isso antes, mas de forma muito mais limitada, com eficácia moderada.”
De forma geral, os conhecimentos sobre os tratamentos imunoterápicos estão mais avançados no combate ao melanoma. “Mas temos
tido descobertas importantes também em doenças que até pouco tempo
atrás nem eram sabidamente relacionadas ao sistema imunológico, sobretudo os tumores de pulmão”, afirma Daniel Tabak, diretor médico
do Centro de Tratamento Oncológico (Centron). Por mais que ainda
haja muito a descobrir e que boa parte dos estudos esteja longe de ser
concluída, a imunoterapia no tratamento do câncer foi apontada como
o breakthrough de 2013 pela revista Science. “Isso demonstra o peso que
essa estratégia tende a adquirir”, diz Tabak. Como todo tratamento
muito inovador, porém, um dos desafios da imunoterapia ainda é a
questão do preço. “Essa é uma questão global, porque os tratamentos
avançam, mas é preciso discutir o custeio disso”, conclui Tabak.
Questões de custo à parte, a imunoterapia segue avançando – e
deve se beneficiar muito das evoluções em outras áreas, como a oncogenética. “Com o tempo e a evolução de técnicas como a identificação
dos biomarcadores, vamos ter uma evolução ainda mais significativa.
A tendência é que a imunoterapia cresça ainda mais em importância
no tratamento de muitos tipos de tumor”, diz Nasser. Apesar dos avanços, Tabak lembra que não existe uma resposta definitiva quando o
assunto é oncologia. “Hoje já sabemos que não existe uma panaceia,
um tratamento igual para todos. Saber disso é o primeiro passo para
obtermos melhores resultados.”
Evolução e desafios na radioterapia
Um dos grandes nortes na busca por novos tratamentos do câncer
são o aumento da segurança e a redução dos efeitos colaterais para os
pacientes. Nesse sentido, uma das áreas do combate à doença que mais
evoluíram nos últimos anos foi a radioterapia. Do lançamento da
Onco& para cá, o uso das técnicas mais avançadas, como a radioterapia
de intensidade modulada do feixe (IMRT), se consolidou no Brasil –
ao menos nos serviços privados, já que o atendimento público ainda
tem muito a evoluir nessa questão (ver quadro na página 18). “A rede
privada está no mesmo nível de grandes centros internacionais, mas
ainda há uma defasagem muito grande quando olhamos para o Brasil
como um todo”, afirma Robson Ferrigno, presidente da Sociedade Brasileira de Radioterapia.
Na visão de João Victor Salvajoli, radioterapeuta de importantes
instituições, como o Instituto do Câncer do Estado de São Paulo
(Icesp) e o Hospital do Coração (HCor), boa parte do avanço da área
nos últimos anos está relacionada à evolução dos exames de imagem.
“Hoje conseguimos entregar a dose no lugar certo, com muito mais
precisão. Além disso, os equipamentos conseguem identificar movimentos do órgão e corrigir o que for necessário, dando muito mais segurança ao paciente”, diz ele.
Em paralelo, aconteceram importantes avanços na questão da multidisciplinaridade do tratamento. “Hoje o tratamento radioterápico está
muito mais integrado ao uso de quimioterápicos e a cirurgias”, diz Salvajoli. “No passado isso era algo muito restrito a alguns tipos de tumor,
mas hoje temos essa abordagem de forma mais generalizada, sendo uma
possibilidade para muitos pacientes.” Para Ferrigno, as evoluções obtidas pela radioterapia ao longo dos últimos anos fizeram com que a técnica atingisse um nível de excelência bastante significativo. “Com o
avanço das técnicas, a radioterapia atingiu um nível de eficiência muito
grande, havendo muito pouco a evoluir nessa questão de agora em
diante. O que precisamos é avançar em outras áreas, como novas drogas, que, combinadas com a rádio, resultarão em melhores resultados.”
Cirurgias mais tecnológicas
A ideia de passar por uma operação para a retirada de um tumor
sempre foi assustadora para muita gente. Ao longo dos últimos anos,
porém, a evolução das tecnologias permitiu que a cirurgia oncológica
chegasse a um novo patamar. Com isso, os procedimentos se tornaram
muito menos invasivos, permitindo que os cirurgiões conservem uma
parte muito maior dos órgãos. “Nos últimos cinco anos não houve tantas
evoluções em termos de técnicas cirúrgicas, mas isso não significa que
a área não tenha evoluído”, afirma Riad Younes, coordenador cirúrgico
do Centro Oncológico Antônio Ermírio de Moraes, da Beneficência Portuguesa de São Paulo. Para ele, a evolução na área se reflete em diversos
tratamentos, como o de câncer de pulmão. “O procedimento era retirar
o que fosse possível, porque tínhamos pouca opção. Muitas vezes acabávamos retirando até metade do pulmão. Hoje fazemos uma cirurgia
muito menos extensa e até com maior chance de cura.”
Esses procedimentos mais conservadores são uma espécie de reflexo do que aconteceu com as cirurgias de mama, que costumavam
ser muito mais agressivas do que as adotadas hoje em dia. “A evolução
registrada no tratamento do câncer de mama é muito grande. Acredito
que ficará cada vez mais restrita e que existe até a possibilidade de acabarmos com a necessidade de cirurgia para esse tipo de tumor no
médio prazo”, afirma Ademar Lopes, cirurgião oncologista e vice-presidente do A.C.Camargo Cancer Center. A previsão de Lopes é consequência da evolução dos tratamentos mais personalizados, que
permitem que o tumor seja combatido com mais precisão a partir de
medicamentos. “Provavelmente com o tempo será necessário realizar
apenas uma biópsia.”
Para os procedimentos que ainda requerem grandes cirurgias, a
tecnologia tem sido um grande apoio ao cirurgião. Nos últimos anos,
técnicas de cirurgia robotizada se consolidaram como uma realidade
nos grandes hospitais de todo o país. “Há cinco anos ainda parecia
algo distante, mas agora já temos equipamentos e gente preparada para
Onco& setembro/outubro 2014
17
operá-los”, diz Younes. Esse tipo de procedimento traz uma série de
vantagens, tanto ao hospital como ao paciente, como redução de
tempo de permanência e menos complicações pós-cirúrgicas. “Hoje,
o grande desafio é o custo, mas isso deve melhorar conforme as patentes desses equipamentos forem vencendo em um futuro próximo”,
afirma Lopes.
Avanço em políticas públicas
Apoio à pesquisa
Do ponto de vista regulatório, nos últimos cinco anos, o governo brasileiro foi bastante pressionado por entidades civis a tratar
o câncer como assunto de política pública. E apresentou soluções
para alguns dos mais graves problemas que dificultam o atendimento adequado ao paciente com câncer: a falta de equipamentos,
as filas e o subfinanciamento de pesquisas.
No final de 2013, o Ministério da Saúde anunciou a compra de
80 aceleradores lineares, a serem distribuídos para 63 municípios,
localizados em 22 estados e no Distrito Federal. Atualmente, o SUS
conta com 248 equipamentos de radioterapia distribuídos em 155
serviços, que são responsáveis por 9,6 milhões de sessões de radioterapia por ano. O objetivo é que, com a nova aquisição, a população
conte com 328 equipamentos e 196 serviços, com capacidade para
a realização de 13 milhões de sessões por ano. “Vivemos um quadro
de defasagem muito grande. As novas máquinas ainda não são o
ideal, mas já são bastante compatíveis com as necessidades básicas”,
afirma Robson Ferrigno, da Sociedade Brasileira de Radioterapia.
Outro avanço importante em políticas públicas foi a lei dos 60
dias para atendimento de pacientes com câncer. O Ministério da
Saúde alterou a Portaria MS/GM nº 876/13, reconhecendo que o
prazo máximo de 60 dias para início do primeiro tratamento oncológico no SUS começa a contar a partir da data da assinatura do
laudo patológico. Até então, contrariamente à lei, a portaria do Ministério da Saúde previa que o início do tratamento deveria ser contado a partir da data do registro do diagnóstico no prontuário do
paciente, que pode ocorrer dias ou até meses da assinatura do laudo.
Isso gerou uma grande polêmica entre as entidades de defesa de
pacientes, que, em parceria com o Ministério Público e pressões na
imprensa, conseguiram reverter a situação. “A Lei dos 60 dias é
muito importante, mas só ela não basta. Ela não ataca nosso principal gargalo, que é o diagnóstico. Não adianta você querer que o
paciente seja tratado em 60 dias se você não descobre que ele está
doente. Em muitos lugares, demora um ano para a pessoa conseguir
fazer o exame que vai revelar se ela tem câncer”, afirma Evanius
Wiermann, da Sociedade Brasileira de Oncologia Clínica (SBOC).
Para ele, é preciso fazer uma análise e descobrir as regiões em que
há mais carência de equipamentos e profissionais para fazer o diagnóstico e criar as soluções conforme a necessidade.
Lançado em 2013, o Programa Nacional de Apoio à Atenção
Oncológica (Pronon) visa ampliar os serviços de saúde prestados à
população e estimular a pesquisa científica nas áreas de oncologia
com recursos oriundos de deduções fiscais. No primeiro ano, foram
admitidos 26 projetos de 20 instituições que já atuam na assistência
oncológica, somando cerca de R$ 118,9 milhões.
Neste ano, o Ministério da Saúde liberou recursos de até R$ 1,3
bilhão em deduções fiscais para cidadãos comuns ou empresas que
fizerem doações para projetos de entidades privadas sem fins lucrativos que atuam no campo da oncologia e da pessoa com deficiência. O valor é o dobro do liberado no ano passado. “O Pronon,
conceitualmente, foi um grande avanço. O problema é o grau de
auditoria e regulamentação exigido para evitar falcatruas, o que o
torna um pesadelo do ponto de vista burocrático”, avalia Kaliks.
As exigências das agências reguladoras para aprovar estudos clínicos e a entrada de novos medicamentos têm deixado frustrados
muitos profissionais que trabalham com pesquisa oncológica. “A burocracia impede que o Brasil consiga ter maior destaque nas pesquisas
internacionais e atrapalha a criação de um ambiente de pesquisa nacional também”, afirma Wiermann. Uma das consequências mais visíveis dessa dificuldade regulatória são os problemas que o Brasil
enfrenta para recrutar pacientes para estudos internacionais. “Por
mais que tenhamos um potencial gigantesco de recrutamento, muitas
vezes não conseguimos inscrever nossos pacientes a tempo.
Kalics aponta como exemplo a classificação molecular dos cânceres de mama, que, desde 2001, começaram a ser identificados em
subtipos moleculares de carcinomas mamários, que englobam os mais
de 20 subtipos morfológicos conhecidos. “Vemos hoje que câncer de
mama não é tudo igual e ainda pode ser subdividido em grupos menores. O problema é que, para estudos clínicos, a Anvisa exige estudo
de fase 3 randomizado com duplo-cego, mas, para algumas doenças
raras, como câncer de pulmão de mutação do ALK, muitas vezes o
melhor dado é um medicamento de estudo de fase 2 para darmos registro. E isso vale para drogas e testes novos”, afirma Kaliks.
Ele cita o teste genético Oncotype DX, que avalia 21 genes relacionados ao crescimento e à disseminação do câncer de mama.
“Se incorporássemos algo desse tipo no Brasil, conseguiríamos poupar 50% das pacientes de uma quimioterapia desnecessária.”
18
setembro/outubro 2014 Onco&
ginecologia
Abordagem inicial para preservação da
fertilidade em pacientes oncológicos
O
INSTITUTO NACIONAL DE CÂNCER (INCA),
MINISTÉRIO DA SAÚDE DO BRASIL
ÓRGÃO DO
Arquivo pessoal
VOLTADO A AÇÕES NACIONAIS INTEGRADAS PARA
Pedro Monteleone
*Diretor da Clínica Monteleone e
coordenador técnico do Centro de
Reprodução Humana do Hospital
das Clínicas de São Paulo
Contato:
[email protected]
20
o controle e a prevenção da neoplasia, estimava que
a partir de 2010 aproximadamente 500 mil novos
casos de câncer seriam diagnosticados no Brasil. Em
2012, foram 14,1 milhões, podendo atingir 21 milhões de casos em 2030. Só nos Estados Unidos,
mais de 100 mil pessoas ao ano são diagnosticadas
com câncer antes dos 45 anos de idade e até 2030
é provável que esse número dobre. Aproximadamente 1 em cada 400 adultos será sobrevivente de
câncer devido aos diagnósticos cada vez mais precoces e à evolução dos diversos tipos de terapia, aumentando as taxas de cura e de sobrevida.
A qualidade de vida dessas pessoas não só durante como também após o tratamento oncológico
é cada vez mais relevante. Por isso, entre tantas coisas, a preservação da fertilidade deve ser considerada e incentivada para todos os pacientes. Segundo
a Associação Americana de Oncologia Clínica
(ASCO), a necessidade de métodos para a preservação da fertilidade deve ser abordada sempre que
um tratamento com potencial de afetar a fertilidade
do indivíduo for indicada. Em 2013, na atualização
do seu manual de condutas, a ASCO orientou que
a abordagem exige uma integração multidisciplinar
e completa das opções disponíveis para os pacientes
em risco de comprometer sua fertilidade com
algum tipo de tratamento oncológico. O foco na
doença releva o risco de a eventual disfunção reprodutiva, ou atraso no início do tratamento, piorar
a doença. Esses são obstáculos a serem enfrentados
e esclarecidos aos portadores desse infortúnio, até
porque em homens não há nenhum atraso no tratamento oncológico e, em mulheres, um tempo máximo de 30 dias de espera, uma vez que esses
setembro/outubro 2014 Onco&
procedimentos já não dependem mais da fase do
ciclo menstrual para serem iniciados.
Os métodos de preservação da fertilidade não
prejudicam o sucesso do tratamento oncológico e
não há evidências de que causem qualquer efeito
adverso ou aumentem o risco materno ou fetal
numa possível gestação futura. Ao contrário, pode
ocorrer redução de 30% a 50% na probabilidade de
um paciente que sobreviveu a um câncer ter um
filho, devido aos tratamentos e ao aumento de estado metabólico e disfunção hipotalâmica.
Como não há terapia ideal que garanta a fertilidade após o tratamento oncológico, várias modalidades devem ser avaliadas e combinadas, de acordo
com o tipo de doença, o tipo de tratamento, a idade
do paciente, a presença e a opinião do parceiro e se
o tratamento pode ou não ser adiado. Há maior
risco de infertilidade – superior a 80% – após o tratamento de tumores pélvicos e testiculares por
radioterapia, linfoma de Hodgkin em estágios avançados com acometimento pélvico, quimioterapia
pós-BMT e irradiação total do corpo. Já o menor
risco de infertilidade – inferior a 20% – é observado
em tumores de Wilms, linfoma de Hodgkin em seus
estágios iniciais e tumores cerebrais tratados com
dose de radioterapia menor que 24 Gy. São considerados de médio risco os linfomas não Hodgkin,
osteossarcoma, sarcoma de Ewing não metastático,
neuroblastoma, linfoma de Hodgkin em estágios
avançados, leucemia mieloide aguda e tumores cerebrais submetidos a radioterapia superior a 24 Gy.
No diagnóstico de um tumor maligno, o médico deve esclarecer o paciente quanto ao impacto
da doença sobre a sua qualidade de vida e sobre o
prejuízo à fertilidade. Expor as possíveis intervenções e opções disponíveis para a preservação da
função reprodutiva é essencial. A fertilidade pode
Número limitado de óvulos pode ser
armazenado no tempo disponível
Necessita de procedimento cirúrgico
que pode ser utilizada em situações especiais, quando não há tempo
ou opções para o tratamento. O mais importante é que a abordagem
deve ser multidisciplinar por envolver diversas alternativas e, normalmente, o indivíduo não está nem apto nem preparado para debatê-las.
A função do médico oncologista é fundamental para informar a possibilidade da preservação da fertilidade, em um momento agudo
quando o paciente está mais preocupado com a sua sobrevivência do
que com o futuro da sua vida. Ao médico especialista nos tratamentos
de fertilidade cabe informar de forma clara as estratégias possíveis que
podem ser adotadas. Os profissionais de apoio, como enfermagem, assistentes sociais e psicólogos, também exercem papel fundamental para
o esclarecimento e o suporte da pessoa a ser tratada.
O conceito de reserva folicular ovariana é responsável por refletir
o potencial número de óvulos que a estimulação ovariana é capaz de
produzir e, portanto, criopreservar, sendo esse o alicerce para o planejamento dos protocolos de indução a ser implantados. O hormônio
anti-mülleriano (AMH), que surge na puberdade e é produzido pelas
células da granulosa dos folículos pré-antrais e antrais, pode ser um
excelente preditor da reserva folicular ovariana, tanto antes do tratamento quando depois, para monitorar a função reprodutiva após o
tratamento. A contagem dos folículos antrais ao ultrassom transvaginal
é capaz de informar a atividade ovariana do momento, no ciclo atual,
e tem um íntima relação com a resposta à estimulação ovariana.
Quando há interesse em discutir a preservação da fertilidade, a
abordagem deve ser feita antes do início do tratamento. Com isso, os
pacientes podem ser encaminhados aos especialistas em reprodução
humana para a discussão das possibilidades o mais cedo possível. As
discussões sobre uma eventual gravidez futura devem ser documentadas no prontuário médico para que essas informações possam ser utilizadas no momento oportuno.
Casos de criopreservação do tecido
ovariano
Pacientes homens
ser preservada através da criopreservação de tecidos, gametas ou embriões. Para o combate dos efeitos deletérios dos homens em fase reprodutiva, basta a presença de espermatozoide no sêmen ejaculado
para criopreservação do material, com facilidade técnica e prognóstico
favorável para obtenção de gravidez futura.
A fisiologia reprodutiva das mulheres é mais complexa e as opções
para preservação são várias, com resultado não tão satisfatório e definido quanto para os homens. As opções envolvem o congelamento de
embriões, técnica bem estabelecida mas limitada pela necessidade de
uma união estável; o congelamento de óvulos, também bem estabelecida mas com resultados ainda incertos devido ao pouco tempo da implementação da técnica como prática clínica usual; e o congelamento
de tecido ovariano, que teria a vantagem de restabelecer a atividade
reprodutiva da mulher de uma forma mais duradoura e eventualmente
até mais efetiva, porém os resultados obtidos tanto pelo enxerto desse
tecido como a produção de óvulos a partir dele estão longe de garantir
resultados satisfatórios.
Comparação das três técnicas de
preservação de fertilidade na mulher
Técnica
Vantagens
Criopreservação
Técnica estabelecida
do embrião
Desvantagens
Pode demorar
Necessário esperma: parceiro ou doador
Potencial fixo para futura fertilidade
Pode demorar
Não recomendado para criança
Criopreservação
Não necessita de esperma pré-puberal
do oócito
Demora mínima
Sem limite mínimo de
idade
Criopreservação
Permite a concepção
do tecido
espontânea e repetida
ovariano
Maior possibilidade
de aproveitar desenvolvimentos futuros
Necessita de procedimento cirúrgico
Casos de contaminacao por células
malignas impedem a reimplantação
O crescimento do folículo in vitro não
estará disponível ainda por muitos anos
Prof. Jacques Donnes, Brussels, 2012
Essas técnicas podem ser oferecidas uma a uma ou em conjunto,
e é possível até mesmo a realização de todas num mesmo caso. A indicação passará pelo tipo de tumor, estratégia de tratamento, fase da
vida reprodutiva do paciente e, principalmente, pela opção da pessoa
a ser tratada.
Existe ainda a opção química com o bloqueio da atividade ovariana
A criopreservação de sêmen é um método eficaz, oferecido ao
homem adulto a ser submetido a tratamentos que afetem sua fertilidade. A proteção gonadal hormonal é ineficaz para preservar a fertilidade, não sendo recomendada nessas situações. Outros métodos,
como a criopreservação de tecido testicular e reimplante ou enxerto,
devem ser abordados em ensaios clínicos e protocolos experimentais.
Antes de iniciar a quimioterapia, os homens devem ser avisados
sobre o risco do comprometimento da sua fertilidade. Deve haver a
recomendação da coleta de material antes do início do tratamento
oncológico, tanto em virtude da preservação da qualidade como da
integridade do DNA. Isso porque, mesmo que não haja um comprometimento da contagem e da mobilidade dos espermatozoides, o
sêmen após o início do tratamento oncológico não apresentará a
mesma qualidade.
Onco& setembro/outubro 2014
21
Pacientes mulheres
Como não há terapia
ideal que garanta a
fertilidade após o
tratamento oncológico, várias modalidades devem ser
avaliadas e combinadas, de acordo com o
tipo de doença, de
tratamento, a idade
do paciente, a
presença e a opinião
do parceiro e se o
tratamento pode ou
não ser adiado
22
setembro/outubro 2014 Onco&
A criopreservação de embriões é bem estabelecida e tem sido rotineiramente usada para armazenar os embriões excedentes após a fertilização in
vitro. Porém, a necessidade de união estável possibilita sua execução em um número restrito de casos.
A criopreservação de oócitos não fertilizados é uma
opção, especialmente para as pacientes que não têm
um parceiro e não desejam usar doador de esperma,
mas as objeções religiosas ou éticas para congelamento podem também ser uma barreira frequente.
A sua realização exige centros com vasta experiência.
Esse procedimento deixou de ser considerado experimental pela Sociedade Americana de Medicina Reprodutiva em outubro de 2012.
Protocolos de estimulação ovariana mais flexíveis para a coleta de óvulos já estão disponíveis. O
tempo desses procedimentos já não depende da
fase do ciclo menstrual. Na maioria dos casos, a estimulação pode ser iniciada em qualquer fase do
ciclo, diferentemente de modelos antigos, em que
o estímulo ovariano começava obrigatoriamente no
início do fluxo menstrual. Agora é possível programar a coleta dos óvulos para a finalidade de criopreservação independentemente do dia do ciclo.
A transposição do ovário, ooforopexia, deve ser
sugerida nas situações em que a radiação pélvica é
o tratamento, mas as pacientes devem estar cientes
de que nem sempre é bem-sucedida. O procedimento, que envolve uma cirurgia laparoscópica ginecológica, deve ser realizado próximo ao período
do tratamento radioterápico.
A supressão do ovário com análogos de hormônio liberador de gonadotrofina (GnRHa) tem eficácia não comprovada, normalmente é como um
método de preservação de fertilidade com ressalvas.
A seu favor estão a praticidade e a pouca invasibilidade, além de outros benefícios clínicos, como a
redução de sangramento vaginal, que pode aumentar em função da plaquetopenia pós-QT. Os riscos
possíveis da sua utilização envolvem a perda óssea
e clinicamente as ondas de calor, fogachos, próprios
da inatividade ovariana, assim como eventuais interferências na resposta da quimioterapia em tumores sensíveis ao estrogênio.
A criopreservação de tecido ovariano e com
posterior enxertia não requer a estimulação do ovário ou a maturidade sexual, portanto, pode ser o
único método disponível nas meninas antes da menacme. É uma técnica experimental e deve ser realizada apenas em centros capacitados, com
protocolos rígidos e linha de pesquisa aprovados
pelos comitês pertinentes.
Considerações especiais
O tema é tão complexo que é importante fazer
outras considerações de preocupação especial. Tumores de mama e ginecológico costumam ser neoplasias sensíveis ao estrogênio, e o aumento de seus
níveis, inclusive na gravidez, pode aumentar o risco
de recorrência da doença. Os protocolos de estimulação do ovário alternativos, usando inibidores da
aromatase, são mais seguros, não havendo evidência de aumento do risco da recidiva do câncer.
É importante ainda ressaltar que toda a equipe
deve estar apta para discutir a infertilidade e o risco
potencial da terapia. A abordagem deve ser precoce
e clara em cada etapa. Os pacientes devem estar alocados nos registros e estudos clínicos, desde que
consintam. É fundamental o breve direcionamento
do paciente a um especialista em reprodução e, nos
momentos em que o assunto for tratado com desinteresse, é recomendada a sugestão de uma avaliação psicológica.
A equipe deve sugerir métodos estabelecidos
de preservação da fertilidade (do sêmen ou criopreservação dos óvulos) para crianças menores
pós-puberdade, com consentimento do paciente e
dos pais ou responsáveis. Para as crianças prépúberes as únicas opções de preservação da fertilidade seriam a criopreservação ovariana e testicular, que estão em fase de pesquisa avançada mas
não estão disponíveis na prática, e portanto devem
ser gerenciados exclusivamente nos centros de
pesquisa.
Desde a publicação em 2006 das orientações da
ASCO voltadas para os profissionais de saúde que
cuidam de pacientes adultos e pediátricos com câncer – ou seja, os médicos oncologistas, os radioterapeutas, os oncologistas ginecológicos, os
urologistas, os hematologistas, os oncologistas pediátricos, os cirurgiões, além de todo o grupo de
apoio –, o número de novos agentes e classes de
agentes terapêuticos tem se expandido significativamente. Ainda há pouca informação disponível
sobre o impacto dessas pessoas sobre a fertilidade
em qualquer nível de evidência para a grande maioria dessas modalidades. Nenhum paciente deve ser excluído, por qualquer motivo, incluindo idade, prognóstico, status socioeconômico ou paridade. A
preservação da fertilidade deve ser considerada e incentivada para
todos esses pacientes, independentemente das fronteiras financeiras
ou de seguros de saúde.
Para saber mais sobre o tema, veja íntegra do protocolo da ASCO
no link: www.asco.org/guidelines.
Referências bibliográficas:
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Fertility preservation in girls during
Childhood: is it feasible, eficiente and safe and to whom should it be proposed? Pascale Jadoul, Marie-Madaleine Dolmans, Jacques Donnez
Introduction Fertility preservation, from câncer to benign disease to social reasons: the challenge of the presebt decade Jacques Donnez Fertility and Sterility,
vol 99, issue 6, p 1467-1468 May 2013
Fertility preservation in patients with câncer: American Society of Clinical Oncology Guideline Update published online before print May 28, 2013, doi:
2013.49.2678 Alison W.Loren, Pamela B. Mangu, Lindsay Nohr Beck, Lawrence Brennan, Antony J. Magdalinski, Ann H. Partridge, Gwendolyn Quinn, W.
Hamish Wallace, Kutluk Oklay
Onco& setembro/outubro 2014
23
Divulgação
odontologia
Cuidados ondontológicos em
pacientes oncológicos
Levy Anderson
*Cirurgião-dentista, doutorando
em ciências odontológicas –
Departamento de Ortodontia e
Odontopediatria – Faculdade de
Odontologia – Universidade de São
Paulo; diretor executivo do departamento de Odontologia da Sociedade de Cardiologia do Estado de
São Paulo (SOCESP); professor do
Curso de Cirurgia Oral com ênfase
em pacientes com comprometimento sistêmico – APCD Vila
Mariana – SP; preceptor no Grupo
de Estudos e Atendimento em Pacientes Especiais (GEAPE) – FOUSP
O
Contato:
[email protected]
Frederico Buhatem Medeiros
*Cirurgião-dentista, doutorando
em patologia bucal – Faculdade de
Odontologia – Universidade de São
Paulo; diretor científico do Departamento de Odontologia da Sociedade de Cardiologia do Estado de
São Paulo (SOCESP); professor e
coordenador do Curso de Cirurgia
Oral com ênfase em pacientes com
comprometimento sistêmico –
APCD Vila Mariana – SP; preceptor
no Centro de Atendimento a
Pacientes Especiais (CAPE)
Ana Lidia Ciamponi
*Cirurgiã-dentista, professora doutora do Departamento de Ortodontia e Odontopediatria – Faculdade
de Odontologia – Universidade de
São Paulo; coordenadora do Grupo
de Estudos e Atendimento em Pacientes Especiais (GEAPE) – FOUSP
24
setembro/outubro 2014 Onco&
S CUIDADOS RELACIONADOS COM A SAÚDE
BUCAL SÃO DE GRANDE IMPORTÂNCIA NOS PE-
RÍODOS PRÉ, TRANS E PÓS-TRATAMENTO ONCO-
lógico. O ideal para os pacientes oncológicos em
geral é que eles sejam examinados pelo cirurgiãodentista (CD) tão logo tenham sua doença diagnosticada, para que o tratamento odontológico,
preferencialmente, anteceda o oncológico1. Esse tratamento, sobretudo nos casos dos tumores de cabeça e pescoço, pode trazer implicações sérias em
termos de saúde bucal2. Portanto, durante a fase
aguda da doença sugere-se que o atendimento seja
realizado em ambiente hospitalar. Nos períodos de
remissão e doença assintomática, o atendimento
poderá ser realizado em nível ambulatorial1.
Antunes e colaboradores3 sugerem que o planejamento do tratamento odontológico deve priorizar
a orientação e o treinamento em higiene bucal para
um melhor controle de possíveis lesões bucais e controle das funções estomatognáticas. Algumas características são comuns entre os pacientes que estão
submetidos ao tratamento oncológico, e enquanto o
estadiamento e a realização de exames complementares estão acontecendo, devemos realizar o tratamento odontológico com o objetivo de eliminar
fontes de traumas, tais como aparelhos ortodônticos,
dentes e/ou restaurações fraturadas e dentes decíduos em fase de esfoliação, evitando-se, assim, infecções de origem endodôntica e da mucosa bucal.
No tocante à dieta, principalmente em pacientes pediátricos, é importante a orientação sobre alimentos cariogênicos, já que algumas crianças
voltam a se alimentar por mamadeiras em função
de inapetência, limitações na deglutição ou até
mesmo devido a regressões emocionais1.
As drogas quimioterápicas atuam de forma mais
intensa em células que apresentam alto índice mitótico, como células da mucosa bucal e do tubo digestivo, ou seja, sítios de maior citotoxicidade2. Os
protocolos mais modernos para terapia antineoplásica incluem várias medicações quimioterápicas que
são altamente bioativas. Esses fármacos apresentam
amplo espectro de efeitos biológicos, como supressão da medula óssea, epitélio da cavidade oral e
glândulas salivares4.
Um estudo comparativo entre pacientes que
receberam quimioterapia e aqueles que foram submetidos à radioterapia ou ao tratamento dual quimio-radioterapia, mostrou uma maior prevalência de
cárie no primeiro grupo. No entanto, essa discrepância foi atribuída às diferenças entre os protocolos de
atendimento realizados antes e após os tratamentos
oncológicos4
Barker (1999)5 mencionou que vários estudos
mostram haver relação entre episódios sépticos em
pacientes com quadro de neutropenia e a microbiota da cavidade bucal. Logo, a intervenção odontológica precoce pode levar a uma diminuição da
frequência e da severidade das manifestações bucais
decorrentes da terapia antineoplásica.
As complicações bucais presentes no paciente
oncológico podem ser consequência do tratamento
ou até mesmo da mielossupressão resultante desse
tratamento. Uma revisão sistemática6 publicada em
2010 relatou, por exemplo, uma prevalência de 50%
de xerostomia em pacientes submetidos à quimioterapia. Além da xerostomia, os fármacos quimioterápicos e o tratamento radioterápico podem desencadear diversos outros efeitos na cavidade bucal.
Entre eles, podemos citar mucosa mais eritematosa
e com aspecto brilhante, ulcerações, infecções, hemorragias, mucosite, alterações de paladar2,7.
Alguns relatos mostram que esses problemas
são frequentemente tratados de forma inadequada4
e, assim, podem desencadear dificuldades nutricionais8,9, levar ao comprometimento das atividades
sociais dos indivíduos e afetar severamente sua qualidade de vida10,11. Vale ressaltar que os aspectos
emocionais e sociais também são amplamente dependentes da integridade funcional e estrutural dos órgãos acometidos pela doença12. Consequentemente, esses pacientes requerem atendimento integrado entre
a área médica e a odontológica, a fim de se ter prevenção, diagnóstico
e tratamento adequados e realizados em momento oportuno.
O preparo odontológico do paciente não deve gerar qualquer interferência no tratamento médico proposto, mas sim contribuir e se
adequar a cada caso. O tratamento eletivo deverá ser realizado apenas
no paciente com condições clínicas e laboratoriais favoráveis1. Previamente ao tratamento odontológico, é importante que se faça contato
com o médico do paciente, principalmente nos casos de alterações
hematológicas, já que quadros de trombocitopenia podem levar a episódios de hemorragia e, diante de situações neutropênicas ou imunossupressivas, há maior propensão a quadros infecciosos.
Tratamento do paciente com complicações bucais da
radioterapia e da quimioterapia
Para pacientes portadores de cateter venoso central, deve-se seguir
o protocolo de profilaxia antibiótica proposto pela American Heart
Association (AHA) previamente a procedimentos que podem desencadear quadros de bacteremia1. A opção por realizar ou não a profilaxia
antibiótica deverá ser discutida com o médico responsável pelo paciente.
A realização de radiografia panorâmica é recomendável, entretanto,
quando necessário, a complementação com radiografias periapicais e
interproximais (bitewings) deve ser solicitada para a visualização de
estruturas dentárias e ósseas13.
O tratamento das lesões de cárie pode ser realizado por meio de ART
(Atraumatic Restorative Treatment), ou seja, remoção de tecido cariado
por meio de curetas e colocação de cimentos ionoméricos14. O amálgama
é contraindicado como material restaurador, pois é fonte secundária de
radiação quando o paciente é submetido à radioterapia em região de cabeça e pescoço. Além disso, pode também desenvolver reação liquenoide
por contato, envolvendo a mucosa diretamente em contato com o material restaurador2,1. Nos casos de lesões de cárie avançada, demonstrando possível comprometimento pulpar, o tratamento endodôntico é
recomendado para dentes permanentes. Já para dentes decíduos recomendamos a exodontia dos elementos dentários envolvidos. Havendo
presença de infecção, a antibioticoterapia deverá ser realizada.
Nos casos de comprometimento periodontal, o tratamento de raspagem e alisamento radicular é indicado. Entretanto, dentes apresentando bolsa periodontal (≥ 6 mm) e/ou mobilidade excessiva podem
ser extraídos, pois, além de serem fontes infecciosas, podem ser fatores
complicadores caso seja necessária a realização de exodontia após a
radioterapia, em função do risco de osteorradionecrose15,16.
A mucosite oral pode ter início nas primeiras semanas de tratamento, dependendo do tipo de terapêutica oncológica utilizada, e
ainda permanecer ao longo do tratamento. Apesar de diversos estudos
serem realizados em busca do melhor tratamento para a mucosite, o
que temos proposto na literatura ainda é paliativo2. Deve-se eliminar
a infecção e os agentes irritantes, fazer uso de clorexidina 0,12% e, se
necessário, prescrever agentes anti-inflamatórios, além de fornecer
orientação quanto à dieta e manter a hidratação. Nos casos mais graves,
considerar o uso de antimicrobianos tópicos e sistêmicos13. O tratamento com laser de baixa potência também foi relatado como eficiente
na diminuição da severidade e duração das mucosites em pacientes
que foram irradiados ou submetidos ao tratamento quimioterápico17.
Quanto à xerostomia, recomenda-se estimular o fluxo salivar por
meio de gomas de mascar sem açúcar, uso de fluoretos (gel ou solução)
e reposição de líquidos. O uso de saliva artificial contendo íons essenciais, componentes com mucina e pH entre 6 e 7 pode também ser
sugerido. No entanto, nem todos os pacientes são receptivos a essa
conduta e preferem a ingestão periódica de líquidos2,13. A amifostina
tem sido sugerida como protetor celular. Ela é defosforilada nos tecidos
por ação da fosfatase alcalina de membrana, formando um thiol livre,
que neutraliza produtos reativos dos organoplatinos e agentes alquilantes. Esse metabólito previne a formação de conjugados de DNA com
quimioterápico e tem a capacidade de reverter os conjugados que
eventualmente tenham sido formados18. No entanto, a alta toxicidade
e o custo são fatores limitadores para uso. Há também outros procedimentos sugeridos na literatura, como a transferência da glândula salivar para o espaço submentual – assim, ela estará fora do campo de
radiação cervicofacial1. O uso de sialogogos sistêmicos também pode
ser recomendado, como o cloridrato de prilocarpina, mas é importante
avaliar suas contraindicações19.
Durante a rádio e a quimioterapia os pacientes também estão propensos a algumas infecções secundárias. Isso pode ocorrer como consequência da diminuição do fluxo salivar e alterações na composição da
saliva. O microrganismo mais frequente associado a essas infecções é a
Candida albicans. Essas infecções podem causar dor, queimação, alterações de paladar e intolerância a alguns tipos de alimento. A candidose
pode variar de eritematosa a hiperplásica, porém, o tipo mais comum
durante o tratamento oncológico é a candidose pseudomembranosa, que
se apresenta como placas brancas que podem ser destacadas facilmente.
O tratamento pode ser feito por meio da administração de antifúngicos
tópicos orais (por exemplo, nistatina 100.000 UImL-1, 4 a 5x /dia)13.
A complicação mais severa consequente da radioterapia para câncer de cabeça e pescoço é a osteorradionecrose (ORN), uma condição
inflamatória resultante da radiação ionizante sobre o tecido ósseo. Essa
radiação resulta em situações irreversíveis aos osteócitos e ao sistema
microvascular, com diminuição progressiva da microvascularização.
Não existe padrão de tratamento para a ORN, já que cada paciente deverá ser avaliado, a fim de se estabelecer o tratamento mais adequado2.
O tratamento conservador consiste de irrigações, decortificações e sequestrectomias, sendo indicado para exposições mais crônicas e consideradas de pequena extensão. A oxigenação hiperbárica também é
recomendada como opção terapêutica. Mais recentemente, estudos baOnco& setembro/outubro 2014
25
seados na teoria fibroatrófica citam o uso de fármacos antioxidantes e
antifibróticas como outra opção de tratamento. A pentoxifilina (derivado da metixantina) leva à diminuição da viscosidade sanguínea, aumenta os níveis de oxigenação tecidual e inibe o processo de fibrose.
No entanto, mais estudos que corroborem essas propriedades são necessários20,21.
Considerações finais
A presença do cirurgião-dentista na equipe transdisciplinar é de
fundamental importância na prevenção das complicações do tratamento oncológico, realizando o exame físico extra e intrabucal, removendo focos de infecções, realizando intervenções odontológicas antes
do início do tratamento e no controle dos efeitos colaterais bucais agudos da químio e da radioterapia. É importante também que o profissional tenha conhecimento do protocolo de tratamento que será
utilizado pela equipe médica, a fim de avaliar o risco de alterações na
cavidade bucal e as condutas propostas para o atendimento odontológico, já que ele será individualizado.
Tornam-se cada vez mais relevantes a condução e a otimização de
estudos que não sejam apenas propostas de tratamento paliativo, por
meio de estratégias que minimizem os efeitos adversos dos fármacos antineoplásicos, conduzam à identificação de metabólitos e/ou biomarcadores que estejam relacionados à doença, ou até mesmo fatores que
possam potencializar seus efeitos sobre a cavidade bucal.
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26
setembro/outubro 2014 Onco&
especial câncer infantil
A promessa das terapias-alvo no tratamento de crianças e jovens
Por Regiane de Oliveira
O
CÂNCER INFANTOJUVENIL (0 A 19 ANOS) É CONSIDERADO UMA DOENÇA
RARA, POIS CORRESPONDE A ALGO ENTRE 1% E 3% DE TODOS OS TU-
MORES MALIGNOS REGISTRADOS NA MAIORIA DAS POPULAÇÕES.
ALÉM
de ter características histopatológicas próprias, o que faz com que seja
estudado separadamente, o câncer infantojuvenil é um dos melhores
exemplos na medicina de como a pesquisa e a cooperação podem impactar positivamente um tratamento.
“Tendo como exemplo a leucemia linfoide aguda na infância
(LLA), esta era uma doença incurável há 50 anos, e hoje cerca de 80%
das crianças com LLA podem ser curadas”, afirma Cláudio Galvão de
Castro Jr., diretor da Sociedade Brasileira de Oncologia Pediátrica (Sobope) e oncopediatra do Hospital Israelita Albert Einstein.
Castro afirma que os avanços caminham por duas vias complementares. Uma é a melhoria das técnicas de diagnóstico, que faz com
que os pacientes sejam divididos por risco. “Assim, doenças mais graves recebem tratamentos mais intensos, enquanto doenças menos
agressivas passam por tratamentos mais breves.” Outra questão é a
forma de uso e o tipo de fármaco mais adequados a cada tratamento.
“Fazemos um uso mais racional dos quimioterápicos e temos tido a
paulatina descoberta de novos medicamentos.”
Castro acredita que, num breve futuro, os tratamentos poderão ser
individualizados, com base no perfil genético de cada paciente, uma
vez que a corrida por novas ferramentas diagnósticas, capazes de caracterizar melhor os tumores, está avançada. O problema é que, no
Brasil, há um atraso significativo na liberação pelos órgãos reguladores
de novos medicamentos.
“Usamos em pacientes, no Brasil, drogas como o rituximabe para
alguns linfomas CD 20 positivos. Todavia, não há um financiamento
específico do SUS e mesmo dos convênios. Na prática, o uso é discutido caso a caso.”
Outro anticorpo interessante que está disponível no Brasil é o nimotuzumabe, usado nos gliomas de tronco cerebral. “Embora as respostas sejam modestas, este foi o primeiro medicamento a mostrar um
efeito nessa doença tão agressiva. E, embora essa indicação conste em
bula, sua disponibilização depende de discussão caso a caso, pois não
existe um financiamento específico do SUS”, afirma o oncopediatra,
ressaltando que esse medicamento foi usado em algumas instituições
em um estudo clínico patrocinado pela indústria.
O oncopediatra Renato Melaragno, do Hospital Santa Marcelina,
também destaca o refinamento do diagnóstico como uma das principais ferramentas para o tratamento do câncer infantojuvenil. “O futuro
é a terapia-alvo. Há quatro, cinco anos não tínhamos autorização para
utilizar o imatinibe em crianças”, lembra o especialista. O imatinibe
foi a primeira droga-alvo para a tirosina quinase BCR-ABL e se tornou
o tratamento padrão para pacientes com leucemia mieloide crônica.
“A burocracia é grande para a autorização de novos medicamentos
para jovens e crianças. No Santa Marcelina, por exemplo, usamos o
rituximabe, mas off label, já que não é terapia padrão para câncer infantil.” O rituximabe foi o medicamento usado pela presidente Dilma
Rousseff para o tratamento de câncer linfático, em 2009.
Segundo a oncologista pediátrica Teresa Cristina Cardoso Fonseca, do Grupo de Apoio à Criança com Câncer (GACC Sul da Bahia),
o câncer infantil não é o mais rentável, pois, para a liberação de um
medicamento para criança, ele tem que estar muito bem estabelecido
no adulto. E as terapias-alvo começaram a ser liberadas no ano passado para o tratamento em crianças. “O grande avanço é que começamos com a experiência do adulto para usar determinadas drogas
na criança, mas, em geral, conseguimos resultados melhores nas
crianças, especialmente os tratamentos com protocolos bem definidos”, afirma.
A Sobope vem avançando muito no trabalho da constituição de
protocolos nacionais. “Trabalhamos mostrando que os pacientes dentro de protocolos têm resultado melhor de cura, pois eles não visam
apenas a administração das drogas, mas sim o acompanhamento desde
o diagnóstico ao acompanhamento pós-cura”, afirma Teresa Fonseca.
Atualmente, 1.603 pacientes participam de protocolos para o tratamento de osteossarcoma (2006), sarcoma de Ewing (2006), meduloblastoma (2006), tumores de células germinativas TCG (2008), retinoblastoma (2009) e rabdomiossarcoma (2009) e do Protocolo do
Grupo Brasileiro para Tratamento das Leucemias na Infância. Outros
dois protocolos estão em fase de estruturação: tumor de Wilms e linfoma não Hodgkin.
“A vantagem de um protocolo brasileiro é ter um olhar mais de
perto sobre como estão reagindo ao tratamento as crianças brasileiras,
qual a sobrevida, qual a toxicidade. Hoje queremos curar, mas não a
qualquer custo, queremos que essas crianças tenham menos sequelas
e sejam adultos com melhor qualidade de vida.”
Melaragno garante que os protocolos são muito bem-feitos, porém,
o problema é a sua implantação em nível nacional. “É difícil acompanhar na ponta. Ainda hoje existem serviços que nem são pediátricos
e que atendem crianças.”
A formação mais adequada é a aposta de Teresa Fonseca para qualificar os profissionais. “Temos um trabalho na Universidade Estadual
de Santa Cruz (UESC), na Bahia, em que passar pela oncologia é obrigatório para os alunos do 5º e 6º anos de medicina. Temos um grupo
de estudos de oncologia pediátrica no qual eles se capacitam.”
Onco& setembro/outubro 2014
29
especial câncer infantil
Situação atual da oncologia
pediátrica no Brasil
G
LOBALMENTE, ESTIMA-SE QUE O NÚMERO DE
Divulgação
NOVOS CASOS DE CÂNCER EM TODAS AS IDADES
Carla Renata Donato Macedo
*Presidente da Sociedade
Brasileira de Oncologia Pediátrica
(Sobope). É médica do Grupo
de Apoio ao Adolescente e
à Criança com Câncer
e do Hospital Alvorada
Contato:
[email protected]
30
setembro/outubro 2014 Onco&
óbitos decorrentes de causas externas.
Os RCBP fornecem dados para a elaboração de
coeficientes de incidência que permitem avaliar o
impacto do câncer em uma determinada população. Os registros têm diferentes objetivos, diferentes
fontes de coleta de dados e os seus resultados são
utilizados para fins diferentes.
Os registros de base hospitalar estão voltados
ao aprimoramento da assistência ao paciente e são
excelentes para a avaliação de estratégias para gestão, pesquisa e epidemiologia clínica. São atualmente exigidos nos centros de alta complexidade
em oncologia (CACON).
Os registros de base populacional fornecem informações úteis para definir e modificar as políticas
de saúde pública e são essenciais para estudos epidemiológicos. Seu principal objetivo é avaliar o impacto do câncer em uma determinada população.
Segundos dados da Agência Internacional de
Investigação do Câncer (IARC), o percentual da po-
AUMENTE DE 10 MILHÕES EM 2000 PARA 15
milhões em 2020 e para 24 milhões em 2050. O
crescimento populacional contínuo e o aumento da
expectativa de vida da população contribuem para
esse fato. Daí a importância de investimentos na
área de prevenção e tratamento em oncologia, principalmente em países menos desenvolvidos.
O câncer infantil não é uma exceção. Estima-se
mais de 200 mil casos novos de câncer, a cada ano,
em crianças e adolescentes. Desse total, 80% vivem
em países com recursos limitados, contribuindo
com mais de 90% das mortes por câncer na infância.
O Instituto Nacional de Câncer (INCA) estima,
para o ano de 2014, 394.450 casos novos de câncer, não contabilizados os tumores de pele não melanoma. Considerando o percentual mediano dos
tumores pediátricos, observado nos registros de
câncer de base populacional (RCBP) brasileiros,
próximo de 3%, deverão ocorrer
Distribuição dos tipos de câncer por faixa etária
cerca de 11.840 casos novos de
câncer em crianças e adolescentes até os 19 anos.
Adolescentes/adulto jovem
Adultos
As regiões Sudeste e Nordeste
apresentaram os maiores númeCarcionomas
Aerodigestivo
Linfoma de Hodgkin
ros de casos novos diagnosticaGeniturinário
Leucemias
Mama
Osteossarcoma
dos, (5.600 e 2.790, respectivaCrianças
Pele
Osteossarcoma
etc.
mente), seguidas pelas regiões Incidência
Sarcoma de Ewing
Sistema nervoso central
relativa
Sul (1.350), Centro-Oeste (1.280)
Sarcoma de partes moles
LLA
(não-rabdomiossarcoma)
e Norte (820).
LNH
Carcinomas selecionados
SNC
No Brasil, em 2011, ocorreCa Testicular
Tu Wilms
Ca Ovário
Neuroblastoma
ram 2.812 óbitos por câncer, em
Ca
células
hepáticas
Retinoblastoma
crianças e adolescentes, ocupando
Rabdomiossarcoma
Idade
a segunda posição (7%), sendo a
(anos)
Nascimento
10
20
40
primeira posição ocupada por
Entretanto, esses registros no Brasil ainda não apresentam cobertura suficiente para definirmos e modificarmos as políticas de saúde
pública na oncologia pediátrica.
A etiologia do câncer infantil é desconhecida, portanto sendo extremamente importante a realização de estudos descritivos, principalmente os de base populacional. Somente uma minoria de fatores de
risco é identificada em crianças e adolescentes com câncer. Com isso,
existe um potencial limitado para intervenções preventivas.
Os estudos epidemiológicos exploratórios se dividem em abordagens que levam em conta fatores pré-natal e pós-natal. A idade preSituação atual dos Registros de Câncer de Base Popula- coce do acometimento do câncer na infância leva a supor de
cional (RCBP) e dos Registros Hospitalares de Câncer influência de exposições maternas durante a gravidez. Espera-se que
estudos que associem o câncer infantil e outras características ao
(RHC) no Brasil.
nascimento possam sugerir futuros estudos de rastreamento e a
• 31 RCBP implantados
identificação de fatores biológicos relacionados. Há evidências que
• 27 RCBP ativos ou em fase de implantação
afirmam que certas características sociodemográficas maternas, ges• 253 RHC em atividade operacional em CACON/ UNACON nas 27 UF
tacionais e perinatais estão relacionadas a determinados tipos de
• 21 hospitais voluntários com RHC
neoplasias infantis. A neoplasia pediátrica mais estudada é a leuce-
pulação com câncer coberta por registros é de 90% na América do
Norte e na Oceania, 60% na Europa, 21% na América Central e do
Sul, 11% na África e 8% na Ásia.
Entretanto, muitos registros apresentam dados inconsistentes de
mortalidade, de dados populacionais, de diagnóstico e de tratamento,
migrações populacionais, resultando em um registro incompleto e uma
subestimativa da incidência do câncer.
Desde a década de 80, o INCA apoia a implantação e a manutenção dos registros de câncer no Brasil.
mia aguda. Existem inúmeros estudos caso-controle em leucemias
abordando hipóteses biológicas incluindo fatores ambientais e fatores
que interagem com o sistema imune. As exposições ambientais mais
estudadas são: contato com pesticidas, radiação ionizante, campos eletromagnéticos, contato com animais, consumo de fumo, de álcool e
medicações durante a gravidez. Fatores perinatais como peso ao nascimento, presença de anomalias congênitas, ordem do nascimento,
idade materna e paterna têm sido explorados. Não há um único fator
responsável. Acredita-se que seja multifatorial e multicausal e provavelmente exposições a diversos fatores são necessários.
O tratamento da criança com câncer é um dos maiores exemplos de
sucesso nas últimas décadas. A melhora é atribuída aos avanços terapêuticos e aos métodos de diagnóstico precoce, principalmente os registrados durante a década de 70. Existem diversos fatores que podem
influenciar o prognóstico: hospedeiro (sexo, idade, raça, comorbidade,
fatores socioeconômicos), tumor (extensão, local primário, morfologia
e biologia) e o sistema de saúde, (rastreamento, facilidades de diagnóstico e tratamento, qualidade do tratamento e acompanhamento).
Atualmente, com o uso de poliquimioterapia intensiva, estabelecida através de protocolos cooperativos terapêuticos prospectivos,
avanços na terapia de suporte, avanços nos exames radiológicos, maior
sofisticação nos exames de anatomia patológica e genética molecular,
de 70% a 80% das crianças são curadas.
A interação multidisciplinar possibilitou ensaios clínicos que geraram padrões de atendimento baseados em evidências clínicas.
Os grandes centros nacionais apresentam taxas de sobrevida semelhantes aos grandes centros internacionais. Centros com maior atendimento são mais equipados, têm maior experiência e consequente
sobrevida maior. Exemplo disso ocorreu em uma instituição de referência em Recife, onde a sobrevida global passou de 32%, no período
de 1980 a 1989, para 63%, no período de 1997 a 2002. Cabe salientar
que os principais motivos para a baixa sobrevida no primeiro período
foram abandono de tratamento, morte por infecção, hemorragia e recidiva da doença.
A Sociedade Brasileira de Oncologia Pediátrica (Sobope) coordena
vários ensaios clínicos através da formação de grupos cooperativos, os
quais podem ter contribuído para melhorar significativamente a sobrevida.
O Grupo Cooperativo Brasileiro para Tratamento da Leucemia Linfática aguda (GCBTLA) demonstrou uma sobrevida global de 92,5%
em crianças portadoras de LLA de baixo risco.
Pacientes portadores de osteossarcoma participando do protocolo
do Grupo Brasileiro (GBTTO) apresentaram 60% de sobrevida global.
Crianças e adolescentes portadores de tumores de células germinativas (TCG) inscritos no protocolo TCG 1991 apresentaram uma sobrevida global em cinco anos de 88,9%.
Vários grupos cooperativos para o tratamento do tumor de Wilms
32
setembro/outubro 2014 Onco&
se uniram em um grupo internacional para o tratamento de tumores
renais, do qual a Sociedade Internacional de Oncologia Pediátrica
(SIOP) e a Sobope fazem parte. O objetivo é identificar fatores prognósticos e diminuir a morbidade do tratamento. O primeiro estudo
(1994) do Grupo Brasileiro para o Tratamento do Tumor de Wilms
(GCBTTW) demonstrou que a sobrevida para as crianças brasileiras
está em torno de 75%.
Oncologistas pediátricos, nos últimos 30-40 anos, tentam aumentar as taxas de cura e minimizar os efeitos colaterais do tratamento. A
intensificação da quimioterapia, por exemplo, é utilizada para diminuir
ou eliminar a necessidade de radioterapia, especialmente para o sistema nervoso central, que pode afetar o desenvolvimento neurológico
dessas crianças e levar a cânceres secundários. Novas técnicas de radioterapia e cirurgia associadas a exames de imagens com maior precisão poupam tecidos normais expostos a esses tratamentos.
Apesar desses esforços, mais de 60% de todos os sobreviventes têm
pelo menos um problema crônico de saúde, e quase 30% têm uma
grave doença com risco de vida. Mesmo diante desses números expressivos, em muitos países o foco nas questões dos sobreviventes e
dos efeitos tardios é fragmentado ou ausente. Devemos quantificar os
riscos associados aos tratamentos atuais e gerenciar proativamente e
antecipadamente os futuros problemas de saúde desses pacientes.
Pesquisas e estratégias que levem em conta os diferentes subtipos
do câncer infantil são necessárias para garantir a alta qualidade e as
inovações nos cuidados de forma segura e eficaz, com acesso equitativo
sempre que possível.
No entanto, notamos um insuficiente desenvolvimento de novos
medicamentos oncológicos para crianças, e são cada vez mais complexos e restritivos os processos regulatórios para pesquisa clínica.
Devemos lembrar que o sucesso do projeto genoma humano, que
tem suportado tantos avanços na biologia do câncer e no seu tratamento, apenas foi possível por meio de um esforço internacional e de
um espírito de colaboração. A abordagem de pesquisa específica para
a biologia do câncer pediátrico é necessária.
Medicina personalizada deve ser desenvolvida através da implementação de novas tecnologias e algoritmos baseados em grupos de risco. O
desenvolvimento de medicamentos para o câncer do adulto tem progredido de regimes citotóxicos a agentes molecularmente direcionados.
Novos conhecimentos moleculares, agentes específicos e a definição de
biomarcadores estão moldando e direcionando a oncologia do adulto e
agora começando a ser aplicados em alguns tipos de câncer pediátrico,
previamente definidos apenas anatomicamente. Atualmente, biomarcadores estão sendo utilizados para meduloblastoma e neuroblastoma.
Precisamos desenvolver tratamentos inovadores, eficazes e seguros
com o objetivo de aumentar as taxas de cura e diminuir os efeitos tóxicos agudos e crônicos associados aos tratamentos existentes. Esses
tratamentos inovadores virão de uma variedade de abordagens.
pediatria
Radioterapia pediátrica: condições
para implantação e estratégias para
o aprimoramento da assistência
O
CÂNCER INFANTIL CORRESPONDE DE
2% A 3%
DE TODOS OS TUMORES NO BRASIL E, NA AMÉ-
LATINA, REPRESENTA DE 0,5% A 3% DO
total de todas as neoplasias malignas. As estimativas
de incidência realizadas pelo Instituto Nacional de
Câncer José Alencar Gomes da Silva (INCA) para
2014 apontam a ocorrência de 11.840 casos novos
de câncer em crianças e adolescentes no país1.
Deste grupo, cerca de 40% serão submetidos à radioterapia, requerendo recursos e cuidados específicos que contemplem as peculiaridades das diferentes faixas etárias.
Radioterapia pediátrica é uma atividade especializada dentro da área de radioterapia. Serviços
integralmente voltados à atenção em radioterapia
pediátrica são raros no Brasil e no mundo. As crianças, em geral, recebem tratamento em unidades
destinadas fundamentalmente à atenção de pacientes adultos, com diferentes níveis de adaptação ao
atendimento em pediatria.
Entretanto, o número crescente de casos de câncer infantil, o aumento progressivo das taxas de cura
ao longo dos anos e a necessidade, cada vez mais
presente, de reduzir os efeitos colaterais do tratamento com a melhora constante da qualidade da sobrevida tornam necessário o desenvolvimento de
estratégias e de ferramentas que aprimorem a atenção nessa área e levem à criação e ao desenvolvimento de unidades especializadas em radioterapia
oncológica pediátrica, notadamente em grandes centros e instituições de grande movimento assistencial.
As normas e orientações nacionais2 e internacionais3,4 que definem as bases e ditam as sugestões
Divulgação
RICA
Paulo Eduardo R. S. Novaes
*Especialista em radioterapia pela
SBRT-AMB-CNEN; mestre e doutor
em medicina pela Universidade de
São Paulo; professor da Faculdade
de Medicina da UNIMES (Santos);
radioterapeuta do Hospital Vitória
(Santos)
Contato:
[email protected]
34
setembro/outubro 2014 Onco&
para a implantação de serviços de radioterapia não
contemplam especificamente a pediatria, havendo
enorme carência na literatura de informação nesse
setor. Além disso, muitos dos números aceitos e adotados como normas encontram-se defasados e necessitam ser revistos, pois não levam em conta as novas
tecnologias e a mudança no perfil da atividade da
equipe profissional (médicos, físicos, enfermeiros,
técnicos e outros), diante das necessidades da radioterapia contemporânea e em particular em pediatria.
A radioterapia de última geração, que emprega
técnicas sofisticadas de administração da dose,
requer um tempo bastante longo dos profissionais
para a análise dos planos terapêuticos elaborados à
luz dos novos recursos tecnológicos e o desenvolvimento de rígidos programas de controle de qualidade. Isso faz com que 50% da jornada de trabalho
do radioterapeuta, por exemplo, seja desenvolvida em
frente aos computadores e aparelhos, reduzindo seu
tempo de atuação clínica presencial em consultório.
Por outro lado, o desenvolvimento de Programas de Atenção aos Efeitos Tardios de sobreviventes
de câncer de infância tratados com radioterapia
agrega uma atividade clínica adicional ao especialista, que precisa fazer parte e estar integrado ao
acompanhamento de pacientes curados5.
Poucas instituições especializadas divulgam seus
números e estratégias, de forma que a informação
sobre a implantação de unidades voltadas à radioterapia pediátrica é rara e dispersa. A análise crítica da
população de pacientes candidatos a radioterapia, a
seleção das técnicas e equipamentos, o desenvolvimento da infraestrutura operacional e a implantação
de atividades clínicas e de pesquisa são fundamentais para o aprimoramento da atenção, aliando experiência, tecnologia, integração e humanização.
O objetivo deste documento é fazer uma
breve revisão dos processos envolvidos na criação
de um Serviço de Radioterapia de Alta Tecnologia
voltado ao atendimento de crianças. Esses aspectos incluem: perfil assistencial, pessoal técnico,
área física, equipamentos, integração terapêutica
e sustentabilidade.
tesiados, conferindo a um serviço dedicado a radioterapia pediátrica a capacidade de atenção de cerca
de 40 pacientes por dia.
Cabe destacar que alguns procedimentos específicos em radioterapia pediátrica – como TBI (Total
Body Irradiation, para transplante de medula
óssea), radiocirurgia e radioterapia estereotáxica
(para lesões intra e extracranianas) – são menos frequentes na rotina diária, demandam mais tempo,
requerem condições especiais e devem estar contemplados da definição do perfil assistencial.
Perfil assistencial
Dados do Registro de Câncer de Base Populacional (RCBP) do Município de São Paulo, relativo
ao período de 1998 a 2002, revelaram uma incidência bruta de 3.395 casos de câncer até os 18
anos5. Destes, 950 casos (28%) ocorreram abaixo
dos 5 anos, representados fundamentalmente por
leucemias, linfomas, tumores do SNC, retinoblastomas e neuroblastomas.
Esses números são particularmente importantes
no planejamento de um serviço de radioterapia pediátrica, pois mostram que há uma parcela de pacientes candidatos a radioterapia que irão requerer
anestesia diária para a aplicação, em um período
total de tratamento não inferior a quatro semanas.
Pacientes anestesiados necessitam de pelo
menos três vezes mais tempo para ser atendidos no
aparelho do que aqueles que não utilizam anestesia,
reduzindo o fluxo assistencial no equipamento.
Serviços dotados de tecnologia moderna, baseada em planejamentos tridimensionais (obrigatórios em crianças), trabalham com um fluxo diário
de quatro pacientes por hora, totalizando uma capacidade assistencial de não mais de 50 pacientes
em 12 horas de atividade. Se projetarmos que 15%
dos pacientes irão requerer anestesia, em torno de
seis pacientes serão anestesiados diariamente, necessitando de pelo menos, 30-40 minutos cada um
para o atendimento, preenchendo um período de
três a quatro horas do funcionamento do setor.
Os pacientes maiores são habitualmente atendidos em fluxo assistencial similar ao de adultos
(4 pacientes/hora), preenchendo as oito horas restantes. Dessa maneira, três a quatro horas são suficientes para dar vazão à demanda assistencial sob
anestesia (6-8 pacientes) e as oito horas restantes
permitirão o atendimento de 32 pacientes não anes-
Pessoal técnico
O grupo técnico deverá contar com profissionais (médicos, físicos, enfermeiros, tecnólogos e
técnicos) com características adequadas ao atendimento em pediatria, que se integrem ao trinômio
paciente – família – cuidador.
Experiência é necessária. Paciência é indispensável. Sorrir é fundamental!
O domínio das novas tecnologias, a familiaridade
com as diferentes situações do dia a dia, a capacidade
de interação multiprofissional, a disponibilidade permanente para cuidar, ensinar, aprender, pesquisar,
enfrentar desafios e partilhar atividades fazem o
grande diferencial na atenção, conferindo qualidade,
agilidade e humanismo à assistência.
É imprescindível a participação de pessoas que
gostem de lidar com crianças e detenham experiência em radioterapia de alta tecnologia. Nem sempre
a técnica mais sofisticada é a melhor. A seleção do
programa terapêutico ideal passa por judicioso julgamento clínico-técnico.
A utilização de alta tecnologia é impossível de
ser executada sem a presença constante e ativa do
físico médico, que deve estar familiarizado com as
diferentes possibilidades do equipamento, desenvolver programas regulares de controle de qualidade e aprimoramento da assistência e estar
engajado em atividades de ensino e pesquisa. São
eles fundamentais para o desenvolvimento dos programas de obediência as normas técnicas, autorizações de agentes reguladores, aceitação e controle de
qualidade dos equipamentos, gerenciamento e capacitação técnica.
O tecnólogo dosimetrista é cada dia mais necessário nos serviços de alta tecnologia, encurtando o
tempo de espera para o início do tratamento e apri-
A radioterapia de
última geração, que
emprega técnicas
sofisticadas de
administração da
dose, requer um
tempo bastante
longo dos profissionais para a análise
dos planos terapêuticos elaborados à
luz dos novos
recursos e o desenvolvimento de
rígidos programas
de controle de
qualidade
Onco& setembro/outubro 2014
35
morando a assistência e a integração multidisciplinar. Exerce importante papel no auxílio ao planejamento, pela confecção do acessório
de imobilização mais adequado, obtenção das imagens tomográficas,
delineamento das estruturas normais, facilitação do planejamento físico, além da elaboração da agenda de tratamento e da promoção do
relacionamento com os pais e a equipe técnica.
Também o enfermeiro de um serviço de radioterapia pediátrica requer características especiais. A capacidade de interação com o paciente e a família, respeitando as peculiaridades das faixas etárias, o
desenvolvimento de atividades lúdicas e de socialização, a familiaridade com os procedimentos anestésicos, com o manuseio de sondas,
cateteres, curativos, com a administração de fármacos e infusões, o conhecimento dos efeitos colaterais agudos e tardios e o domínio dos
princípios que norteiam a aplicação das novas tecnologias constituem
um diferencial na assistência especializada. Cada vez mais o enfermeiro
participa de várias ações: administrativas, consultivas, educacionais,
de pesquisa.
As aplicações diárias de radioterapia são realizadas por técnicos especializados habilitados a trabalhar com os equipamentos. São eles,
em última análise, que executam o que foi planejado, promovendo o
posicionamento adequado do paciente e a exata administração da
dose, garantindo qualidade, agilidade e precisão à aplicação. A par dessas características, eles necessitam, além do conhecimento de informática, paciência e sensibilidade adicionais para lidar com a ansiedade
da família e deter experiência e aguçado senso clínico para detectar
variações nas condições físicas e emocionais do pequeno paciente, alertando a equipe quando algo “fora dos padrões” for percebido.
Área física
É necessária a integração permanente das equipes médicas e de engenharia discutindo e buscando soluções que facilitem o acesso ao serviço, a relação entre os diferentes setores do hospital e a expansão
assistencial futura.
Um Serviço de Radioterapia Pediátrica de Alta Tecnologia deve prever, entre outros, alguns detalhes:
1. Instalação para anestesia e recuperação anestésica.
2. Casamata com dimensões suficientes para a realização de TBI.
3. Acesso fácil ao Serviço de Imagem (em especial simulação com
tomografia computadorizada).
4. Instalação para confecção de máscaras e acessórios.
5. Ambientação adequada ao atendimento pediátrico (contemplando as diferentes faixas etárias).
6. Instalações que permitam privacidade e conforto para pacientes
e familiares em condições especiais.
A possibilidade de contar com um espaço reservado à família, dotado de circuito interno de TV, que permita o acompanhamento da assistência diária e o desenrolar das sessões de radioterapia externa, pode
se constituir um diferencial no cuidar.
36
setembro/outubro 2014 Onco&
Pais e familiares demonstram uma curiosidade natural pela radioterapia e enorme ansiedade pelo fato de a criança permanecer sozinha
para receber a aplicação, mesmo sabendo da segurança do tratamento.
O fato de eles poderem acompanhar as aplicações com os mesmos recursos dos monitores técnicos reduz a angústia e aumenta a confiança.
A utilização de vídeos educativos é um recurso que deve ser explorado
no preparo do paciente e dos familiares para o tratamento.
7. Central de enfermagem, dotada de unidade de emergência, suporte clínico para pacientes em condições especiais, atividades lúdicas, coordenação assistencial e administrativa.
8. Núcleo de Planejamento Multidisciplinar.
A integração de outros profissionais ao planejamento (radiologistas,
neurologistas, cirurgiões) é bem-vinda, frequentemente necessária e
deve ser estimulada, pois pode contribuir para a melhor definição do
alvo e proteção dos órgãos normais. O planejamento computadorizado
gera imagens que demonstram a qualidade técnica, além de constituir
conjunto de rara beleza pela multiplicidade de cores e formas. Elas revelam atualidade, modernidade e são pouco conhecidas pelos médicos
não especialistas e outros profissionais de saúde. A possibilidade de
exibi-las em monitores grandes aumenta a visibilidade do serviço, facilita o ensino, a discussão clínica e auxilia na divulgação das atividades
técnicas e assistenciais.
Equipamentos
Constituem a base da atenção em radioterapia, aliados à equipe
profissional (“Machines don’t cure patients, doctors do”).
A cada dia, novos equipamentos são colocados à disposição no
mercado, aliando recursos tecnológicos, possibilidade de realização de
procedimentos mais complexos, com facilidade, precisão, segurança.
O inconveniente é o consequente aumento de preço, não só para a
aquisição quanto para a manutenção.
Nos dias de hoje, um Serviço de Radioterapia Pediátrica de Alta
Tecnologia deve ter como ponto de partida:
1. Acelerador linear com duas energias de fótons (6 e 10MeV –
eventualmente 4MeV) e elétrons de energias múltiplas, dotado de
colimador de multilâminas (80 a 120 lâminas), sistema integrado
de registro de imagem (portal vision), capacitado a realizar RTC3D
(radioterapia conformada tridimensional), IMRT (radioterapia de
intensidade modulada) estática e dinâmica, IGRT (radioterapia
guiada por imagem) e técnicas 4D (que incorporam o movimento
fisiológico dos órgãos internos).
2. Acessórios que permitam a realização de radiocirurgia e radioterapia estereotáxica fracionada (técnicas particularmente interessantes
para a atenção a pacientes com lesões cerebrais e medulares).
3. Sistemas de gerenciamento e de planejamento 3D, com software
de fusão de imagens, IMRT, IGRT, integrados entre si e a outros
setores do hospital. A possibilidade de permitir a exportação das
imagens geradas no planejamento deve ser considerada.
4. CT simulador dedicado (ou acesso a simulação com tomografia computadorizada).
5. Possibilidade de planejamento, reparo, manutenção técnica e transferência de dados à
distância.
6. Material de dosimetria, proteção radiológica
e controle de qualidade.
7. Deve ser contemplada a possibilidade do desenvolvimento de dosimetria “in vivo” notadamente nos programas que envolvam IMRT e TBI.
8. Máscaras termoplásticas, imobilizadores a
vácuo e outros acessórios para radioterapia.
Essa infraestrutura de equipamentos, operada
por uma equipe técnica especializada, permitirá a
realização de todos os procedimentos necessários
para a mais completa e atualizada atenção em radioterapia pediátrica.
Integração terapêutica
Radioterapia pediátrica é uma atividade multidisciplinar, que deve ser desenvolvida sob a orientação de protocolos terapêuticos, ditados por
instituições nacionais e internacionais.
A integração do radioterapeuta às diretrizes protocolares permite a definição clara do momento e da
forma de atuação para cada tipo de tumor e para cada
situação clínica, garantindo os melhores resultados.
É importante a participação em reuniões de discussão clínica e em ambulatórios multidisciplinares. A troca permanente de experiências entre os
vários profissionais possibilitará que cada arma terapêutica seja utilizada na sua plenitude, no momento oportuno e de forma individualizada.
A implantação de um Programa de Atenção aos
Efeitos Tardios da Radioterapia ministrada na Infância e Adolescência também se reveste de enorme
importância. Deve constituir atividade obrigatória
e um diferencial nos serviços dedicados a radioterapia pediátrica.
Cerca de 75% das crianças com câncer serão
curadas com a abordagem terapêutica multidisciplinar. Quando acompanhamos os sobreviventes irradiados no passado, vemos que muitas das
sequelas da irradiação são severas, fruto das limitações tecnológicas e da escassez de conhecimento
sobre a ação das radiações ionizantes nos tecidos
normais. As novas tecnologias permitem aumentar
a precisão da liberação da dose, poupar os órgãos
normais de dose excessiva e reduzir os efeitos colaterais. A pediatria (e também a geriatria) é a área
que mais se beneficia do emprego de tecnologia
avançada de radioterapia. É bem possível que as sequelas hoje observadas nos sobreviventes irradiados
não sejam mais vistas daqui a 20-30 anos.
Sustentabilidade
Tradicionalmente, os serviços de radioterapia
do país operam 12 horas diárias. Por maiores que
sejam os esforços na captação de crianças para radioterapia, é muito provável que somente o universo pediátrico não seja suficiente para manter o
funcionamento do serviço por 12 horas.
Dentro da carência de serviços de radioterapia
dotados de alta tecnologia no Brasil, notadamente
voltados para a atenção aos pacientes do SUS, a captação de pacientes pediátricos de outros centros será
bem-vinda e deverá ser estimulada, aumentando a
demanda assistencial.
Da mesma forma, o serviço terá toda a condição
de ofertar radioterapia de vanguarda, também para
pacientes adultos selecionados. Se do ponto de vista
assistencial podemos implementar ações para garantir a atividade diária do serviço por 12 horas, as
perspectivas do ponto de vista financeiro são preocupantes. Expandir uma parte do horário de assistência para pacientes adultos que requeiram
procedimentos especiais é uma opção a ser considerada e envolve praticamente nenhum incremento
em infraestrutura operacional.
A remuneração da radioterapia pelo SUS (maior
fonte pagadora da radioterapia nacional) e pela
maioria dos planos de saúde é deficiente, as tabelas
de procedimentos estão desatualizadas, não existe
estímulo à incorporação das novas tecnologias e os
serviços enfrentam dificuldades para garantir sustentabilidade.
Um serviço de radioterapia pediátrica será deficitário economicamente se não lançar mão de
alternativas que garantam o pagamento dos procedimentos relacionados a alta tecnologia, cada vez
mais utilizados em crianças.
A integração de
outros profissionais
ao planejamento
(radiologistas,
neurologistas,
cirurgiões) é
bem-vinda,
frequentemente
necessária e deve
ser estimulada, pois
pode contribuir
para a melhor
definição do alvo
e proteção dos
órgãos normais
Considerações finais
É cada vez mais necessário que os serviços de
oncologia pediátrica também possam oferecer radioterapia a seus pacientes em unidades especializadas.
Onco& setembro/outubro 2014
37
A assistência integral se torna facilitada e humanizada, com observância rígida dos protocolos terapêuticos, maior integração e troca de experiência entre os diferentes profissionais e entidades similares,
acompanhamento dos efeitos colaterais agudos e tardios do tratamento
e adoção de medidas para minimizá-los, treinamento de futuros pro-
fissionais, desenvolvimento de pesquisa e estudos clínicos etc.
A implantação de Radioterapia Pediátrica de Alta Tecnologia é
missão que envolve a atuação de vários atores – profissionais, empresas, entidades científicas, governo, organizações não governamentais
e sociedade organizada
Referencias bibliográficas:
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11. Novaes PE. Humanização da Radioterapia na Infância. Caderno 2. Jornal da Imagem: 303, 2003.
12. Novaes PERS. Prefácio em Enfermagem em Radioterapia. Denardi UA e cols. LEMAR – Livraria e Editora Marina, São Paulo, 2008.
38
setembro/outubro 2014 Onco&
políticas públicas
Forte apelo do câncer infantil
garante mobilização
Sem regras específicas, rede informal amplia recursos disponíveis
e melhora a estrutura voltada à oncologia pediátrica
Por Jiane Carvalho
O
BRASIL,
EM QUE PESE A ESTRUTURA FÍSICA E ORGANIZACIONAL DISTANTE DA IDEAL, VAI BEM QUANDO
comparado ao câncer em adultos e chega a atingir,
nos centros de excelência, níveis de cura dentro dos
padrões internacionais, perto dos 70%. Os motivos
para o sucesso no diagnóstico e tratamento do câncer infantil estão mais ligados ao poder de mobilização imposto pela patologia do que à existência de
uma política pública específica e eficaz para esse
grupo de pacientes. Entre as deficiências apontadas
estão distribuição desigual da rede, morosidade no
encaminhamento dos pacientes e recursos insuficientes para alguns tratamentos medicamentosos,
pontos sanados pelo forte apelo da doença que mobiliza hospitais e a sociedade.
Divulgação
TRATAMENTO DO CÂNCER INFANTIL NO
No geral, as avaliações sobre a eficácia do tratamento oncológico infantil no Brasil são muito positivas. “O câncer em crianças, do ponto de vista
qualitativo, goza de excelência que não há, chego
a dizer, em nenhuma outra moléstia no país, muito
melhor do que a rede para o câncer em adultos”,
comenta Vicente Odone Filho, diretor clínico do
Instituto de Tratamento do Câncer Infantil (Itaci),
lembrando que os problemas existentes são mais
quantitativos.
O ponto mais crítico da rede, segundo avaliação
de especialistas, é a desigualdade na distribuição
dos centros de referência. Para Hiram Silveira
Lucas, diretor do Hospital Mário Kröeff, no Rio de
Janeiro, a má distribuição dos serviços acaba sobrecarregando alguns hospitais. “A rede não tem a capilaridade necessária, com o agravante de que hoje
já não se constroem mais hospitais filantrópicos”,
comenta. Segundo Carla Donato Macedo, presidente da Sociedade Brasileira de Oncologia Pediátrica (Sobope), o atendimento de excelência nos
grandes centros está longe do ideal em áreas distantes por falta de serviços em quantidade. “Regiões carentes como o Norte, em que há apenas o Hospital
de Manaus, sofrem com a concentração. Em alguns
estados, muitas vezes o atendimento é feito por
equipes em hospitais que não têm a qualidade esperada, o que é inadequado.”
O Ministério da Saúde, responsável pela organização dos serviços de atendimento oncológico no
país, tem uma visão diferente. A coordenadora da
Onco& setembro/outubro 2014
39
A falta de recursos
financeiros para
cobrir 100% dos
custos nos centros
de tratamento de
câncer infantil que
atendem pelo SUS
tem sido compensada com a adoção
de campanhas de
arrecadação. No
Graacc, dos
R$ 80 milhões do
orçamento para este
ano, R$ 60 milhões
vêm de doações
40
setembro/outubro 2014 Onco&
Área de Doenças Crônicas Não Transmissíveis do
Ministério, Patrícia Sampaio Chueiri, defende a tese
de que concentrar o atendimento traz benefícios,
como a maior especialização dos serviços. “Não
queremos ter ociosidade, a ideia é sim concentrar
o tratamento nos centros de maior complexidade
porque, dessa forma, eles ganham qualidade e mais
casos de referência.”
O movimento mais recente do Ministério vai na
direção de centralizar o atendimento nos centros já
existentes. A Portaria nº 140, publicada em fevereiro deste ano, eleva o número de novos atendimentos de 75 para 100 como o mínimo para que
um hospital seja considerado Unidade de Assistência de Alta Complexidade em Oncologia (Unacon)
ou Centro de Assistência de Alta Complexidade em
Oncologia (Cacon), que gozam de uma tabela de
pagamento diferenciada, desde que cumpram uma
série de exigências.
Hoje, o país tem 281 Unacons e Cacons, sendo
70 com atendimento pediátrico, distribuídos em 21
estados. “É verdade que a maioria se concentra no
Sul, no Sudeste e no Nordeste, mas no Norte, por
exemplo, a quantidade de casos não justifica um
outro hospital além do que já existe em Manaus”,
explica Patrícia. “Estes centros, principalmente
quando falamos em tratamento infantil, precisam
contar com inúmeros serviços, como um espaço
para acolhimento às famílias, tratamento multidisciplinar, leito com isolamento, entre outros. O que
buscamos é melhorar internamente os centros que
já existem e a concentração neste caso ajuda.”
Dados do Instituto Nacional de Câncer (Inca)
apontam uma correlação entre o número de casos
de câncer infantil e a distribuição da rede. Estimamse para o Brasil, neste ano, 11.840 novos casos de
câncer em crianças e adolescentes até 19 anos, 3%
do total previsto. As regiões Sudeste e Nordeste apresentarão os maiores números de novos casos, 5.600
e 2.790, respectivamente, seguidas pelas regiões Sul
(1.350), Centro-Oeste (1.280) e Norte (820).
Um dos principais problemas da concentração
dos serviços de oncologia infantil é a necessidade
de deslocamento dos pacientes. A verba para o Tratamento Fora de Domicílio (TFD) vem do Ministério da Saúde, mas a responsabilidade do transporte
é das prefeituras e dos estados. A lentidão dos processos tem um impacto maior no tratamento do
câncer infantil, pelas características da doença, de
fácil propagação. “O TFD ajuda, sim, mas em muitas situações ligadas à oncologia pediátrica não tem
como esperar e, nesses casos, a rede informal organizada pelos próprios hospitais entra em ação”, comenta Carla Macedo, da Sobope.
Em Recife, o Instituto de Medicina Integral Professor Fernando Figueira (Imip), entidade filantrópica que tem as designações de Cacon e Unacon,
ajuda no transporte dos pacientes em situação limite do interior de Pernambuco. “No geral, o TFD
funciona bem, mas para o câncer infantil o tempo
é imperativo e em várias situações nós mesmos resgatamos o paciente”, explica Francisco Pedrosa, diretor médico do Centro de Tratamento do Câncer
Infantil do Imip. Para agilizar o atendimento,
quando um médico do interior encaminha um paciente ao Imip, o hospital conclui o diagnóstico,
inicia o tratamento, retorna o paciente para sua cidade e só depois transfere a responsabilidade para
o poder público, para a realização das demais sessões. “Damos um jeito para que o tratamento seja
iniciado o mais rapidamente possível.”
A superintendente do Ministério da Saúde reconhece que o TFD é um dos pontos que precisam ser
melhorados para o atendimento mais célere dos pacientes. “A questão do transporte para os centros de
referência é uma carência real. Os recursos são do
Ministério, mas compete aos governos estaduais e
municiais garantir que o TFD funcione”, explica Patrícia. A solução, segundo a superintendente do Ministério, pode vir com Programa Nacional de Apoio
à Atenção Oncológica (Pronon), lançado em 2013
com o objetivo de ampliar as possibilidades de
novas fontes de financiamento na área de oncologia.
“É uma espécie de Lei Rouanet, que garante isenção
de IR para quem apoiar projetos na área de saúde”,
comenta. “Estamos aguardando projetos para serem
aprovados e seriam muito bem-vindas propostas na
área de transporte.” Só em 2014, o limite de isenção
do Pronon chega a R$ 674 milhões. “Alguns projetos já foram aprovados, mas nenhum deles é voltado
à melhoria da locomoção dos pacientes”, diz.
Outra mudança promovida pela Portaria nº 140
busca definir de forma mais clara a área de responsabilidade dos hospitais especializados no tratamento do câncer. Eles têm até fevereiro do ano que
vem para se recadastrar e apontar quais as regiões
que estão sob sua alçada. A organização da nova rede de atendimento
oncológico, que inclui também o atendimento pediátrico, segundo informa a superintendente do Ministério, ficou a cargo das prefeituras e
estados que participaram das discussões prévias.
Todas as diretrizes referentes ao tratamento do câncer infantil estão
incluídas nas regras gerais do atendimento oncológico, não havendo
nada específico. A presidente da Sobope acredita que uma política própria para a oncologia pediátrica seria o ideal, dadas as características
particulares da moléstia em crianças, marcada de um lado pela velocidade de propagação da doença e, de outro, pela rápida resposta do paciente. “O prazo definido como limite máximo para atendimento
oncológico geral no país, de até 60 dias, não é ideal nem para o câncer
no adulto, No caso de uma criança, é totalmente inadequado. A orientação é ignorar”, diz Carla Macedo, lembrando que em alguns tipos
de câncer, como linfomas não-Hodgkin, o atendimento tem de ser imediato. O mesmo ocorre com o linfoma de Burkitt ou a leucemia linfoide aguda. “Eles podem dobrar de tamanho em apenas 48 horas, não
dá para esperar.”
Sobre o prazo para o início do tratamento, o Ministério considera
que os índices atuais já são “bastante adequados”. Dados fornecidos
pela pasta apontam que 61% dos casos de câncer infantil são atendidos
em até 15 dias a partir da consulta, 14,4% entre 15 e 30 dias e 13,9%
entre 30 e 60% dias. “Os profissionais da saúde sabem que o câncer
infantil necessita de agilidade no início do tratamento. Pode melhorar,
sim, mas já é um índice elevado”, comenta Patrícia Chueiri.
Mesmo no estado de São Paulo, um dos mais bem assistidos em
termos de tratamento do câncer, a distribuição mais equânime dos
centros de referência ainda é perseguida, na tentativa de evitar que
muitos pacientes sejam encaminhados para a capital e sobrecarreguem
o atendimento. São Paulo tem uma rede oncológica robusta, com 74
unidades que atendem tanto adultos quanto crianças, mas já foram
detectados alguns pontos cegos, muitas vezes ligados a um serviço específico, como radioterapia.
Para sanar algumas dessas fragilidades, em 2011 foi criado um comitê com 14 Cacons cujo objetivo era debater os problemas e propor
ações efetivas. O comitê conta com uma equipe com foco no câncer
infantil. “Trabalhamos muito com o olhar para a detecção precoce da
doença para esse grupo, que é fundamental”, explica Marisa Madi, diretora executiva do Icesp e integrante do comitê que aprovou nove
projetos para receber parte dos R$ 100 milhões de recursos públicos.
“No Graacc, o comitê deu parecer favorável a investimentos no serviço
de radioterapia.”
Além da desigualdade na distribuição dos serviços de referência no
câncer infantil e da demora no transporte dos pacientes, outra queixa
dos hospitais que atendem pacientes do SUS se refere aos valores pagos,
que não cobrem integralmente os custos, principalmente quando é necessária a prescrição de alguns medicamentos de ponta. Hoje, o pagamento é pelo sistema APAC – Autorização para Procedimentos de Alta
Complexidade. “O valor mensal, por criança, para alguns procedimentos é de R$ 1,3 mil, independentemente da medicação usada. É um
valor fechado e, dependendo dos procedimentos utilizados, a conta não
fecha”, explica Flora Watanabe, chefe do serviço oncológico do Hospital
Pequeno Príncipe, de Curitiba.
A médica cita como exemplo o Temodal, um agente antitumoral
indicado para o tratamento de formas específicas de tumores cerebrais,
ao custo de R$ 400 o comprimido. “Quando não há um substituto
adequado, a associação mantenedora do hospital compra a medicação
para a criança. Damos um jeito.” O Hospital Pequeno Príncipe é um
dos primeiros a se beneficiar do Pronon e já teve seu projeto aprovado,
incluindo a ampliação do laboratório e a compra de equipamentos
para o programa de medula óssea. O Hospital de Curitiba também assume a responsabilidade para buscar as crianças do interior do Paraná
que precisam de um atendimento especializado. “Não esperamos a
TFD porque demora, nós mesmo buscamos o paciente”, explica Flora.
A responsável pelo Hospital Pequeno Príncipe é muito crítica em
relação à demora no diagnóstico e no encaminhamento das crianças,
citando que em apenas três meses já pode haver uma metástase, como
no osteossarcoma, que pode atingir o pulmão rapidamente. Outro
tumor, o de Wilms, que afeta o rim, quando diagnosticado rapidamente exige um tratamento que vai de 6 a 8 semanas, mas se passar
do estágio 1 para 2 já demora 1,5 ano em tratamento. “Perde a criança
e também o sistema pelo custo maior daquele paciente. Todo o esforço
deveria ser para reduzir ainda mais os diagnósticos e o início do tratamento”, afirma Flora Watanabe.
A falta de recursos financeiros para cobrir 100% dos custos nos centros de tratamento de câncer infantil que atendem pelo SUS tem sido
compensada com a adoção de campanhas de arrecadação. No Graacc,
centro de referência especializado em câncer infantil que atende 80%
de pacientes do SUS, as campanhas garantem a continuidade do serviço. “Atendemos crianças do país todo com índice de cura de 70%, o
que é muito, mas os recursos repassados pelo SUS são insuficientes”,
explica Tammy Allersdorfer, gerente-geral institucional do Graacc. Do
orçamento para este ano, de R$ 80 milhões, só R$ 20 milhões são
oriundos do governo. Os outros R$ 60 milhões vêm via doação. De
cada dez crianças atendidas, oito são encaminhadas pelo SUS. O mesmo
ocorre no Hospital Pequeno Príncipe, de Curitiba. “É mais fácil captar
recursos para a causa do câncer infantil. Tem forte apelo. A sociedade
toda ajuda o hospital”, comenta Flora Watanabe.
Onco& setembro/outubro 2014
41
do bem
Parceria hospital-escola
Durante o tratamento de câncer, o professor tem papel
fundamental para estimular qualidade de vida da criança
e seu futuro promissor
Por Viviane Gomes
C
AMILLE DA
SILVA SOUZA, 18 ANOS, SE AFASTOU
DA ESCOLA, EM SÃO VICENTE, LITORAL PAULISTA,
Murilo Constantino/Onco&
PARA TRATAR DE UM CÂNCER NA MEDULA ESPI-
42
nhal (xantoastrocitoma), o que não a impediu de
concluir o técnico em informática. O apoio pedagógico da Escolinha da Pediatria do Hospital
A.C. Camargo Cancer Center, na capital
paulista, foi fundamental para sua conquista. “Em setembro do ano passado,
quando recebi o diagnóstico, estava no
último trimestre do curso. As professoras daqui são maravilhosas. Deram bastante atenção e me ajudaram nos
trabalhos escolares, mesmo quando não
podia sair do quarto”, conta a menina.
Ela relata outros benefícios da classe hospitalar: “Nas longas internações, é uma forma
de não ficar isolada, de interagir e fazer
amizade. Prestei até vestibular aqui”. Na
opinião de sua mãe, Maria Aparecida
Moura Silva Souza, a Escolinha do A.C.
Camargo é essencial para a filha ocupar
o tempo ocioso de forma produtiva, o
que contribui para melhorar sua saúde.
“As professoras são muito carinhosas. Todo hospital deveria ter classe hospitalar, inclusive para adulto. Quando
soube dessa escola, achei que era só para distrair, mas percebi que elas auxiliam demais”,
compartilha a mãe, sorridente, por comemoMaria Aparecida e Camille, mãe
e filha no espaço de educação
rar a redução de 50% do tumor da filha.
do A.C.Camargo Center
O nome oficial na unidade de ensino é Escola Especializada Schwester Heine, em hosetembro/outubro 2014 Onco&
menagem a uma enfermeira alemã. A unidade
existe desde 1987 e é uma das primeiras escolas
brasileiras instaladas num hospital oncológico, que
oferece continuidade do estudo ao aluno com internação prolongada devido à parceria pedagógica
com sua escola de origem.
A gerente educacional Ana Maria Kuninari diz
que a meta é promover o desenvolvimento integral
do paciente de 0 a 21 anos com câncer. A escola
atende 700 alunos por ano. Integra 14 professoras
das Secretarias de Educação (do Estado e prefeitura
de São Paulo).
De acordo com sua vontade e condição clínica,
o aluno recebe acompanhamento escolar no ambulatório, ala de internação, leitos de Unidade de Terapia Intensiva (UTI), quimioterapia e radioterapia.
A equipe identifica as dificuldades de aprendizagem do aluno e atua para superá-las. E organiza atividades educativas e lúdicas para diminuir a
ansiedade do doente e aumentar sua adesão ao tratamento médico.
“Usamos jogos, tablet e notebook (com internet)
e aparelhos de som, que colaboram para entretenimento, focos de atenção, atualização de informações
e fortalecem a aderência ao tratamento”, informa a
educadora.
Sensibilizar-se diante do delicado momento do
paciente e conhecer a doença para entender certas
limitações no atendimento são os principais desafios
do educador. Incorporar conhecimentos ligados à
área da saúde torna esse profissional completo,
capaz de efetivar o elo entre educação e saúde, comenta a gerente.
Desde 2009, o Centro de Ensino do A.C. Camargo oferece curso
de Extensão em Pedagogia Hospitalar. Neste ano, a capacitação será
em novembro e as inscrições começam em setembro. “Oferecido a
todos os profissionais da educação, o curso é gratuito aos professores
da rede pública. Aos interessados, teremos estágio observacional de
quatro horas na classe hospitalar”.
Garantir vitórias na vida
Manter o vínculo do aluno com a escola durante o tratamento oncológico é a principal meta do Centro Infantil Boldrini, hospital filantrópico de Campinas, no interior paulista, ao oferecer apoio
pedagógico a seus pacientes em idade escolar. “Como o tratamento de
câncer é longo, investimos na qualidade de vida da criança. Se abrirmos mão da escolaridade nesse período, o resultado será incerteza de
seu futuro”, avalia a coordenadora pedagógica Luciana Assunção
Ramos Silva de Mello, referindo-se à iniciativa criada há 36 anos.
Pela parceria com a Secretaria de Educação de Campinas, o trabalho conta com quatro pedagogas. Durante a permanência no hospital
para consulta, exame ou outro procedimento, o paciente é convidado
a participar da ludoteca e da sala de apoio pedagógico.
Coordenada por pedagogas, a ludoteca alia brincadeiras e aprendizagem. Quebra-cabeças, jogos educativos, pinturas e colagens atraem
500 pacientes por mês, entre bebês, crianças pré-alfabetizadas, alunos
de ensino fundamental e médio. Já a sala de apoio pedagógico integra
20 professores voluntários. No espaço são realizados 200 atendimentos
por mês, quase sempre individuais.
Os educadores atuam quatro horas semanais e recebem treinamento
anual da equipe pedagógica, que inclui orientação escolar e características da doença de cada aluno. “Para participarem, eles devem se identificar com o perfil do hospital oncológico”, observa Luciana Ramos.
A pedagogia contata a escola de origem do aluno e solicita a programação do ano letivo para abordagem no hospital. “Enquanto o paciente não puder frequentar seu colégio, faz as lições e provas aqui,
enviadas à unidade de ensino para avaliação de desempenho”, explica.
Uma das dificuldades da classe hospitalar é a falta de conhecimento
da sociedade sobre o tratamento do câncer. “Em algumas escolas ainda
há a visão de que primeiro deve-se cuidar da saúde e depois pensar
em estudar”, avalia a coordenadora pedagógica do Boldrini. Para
mudar esse estigma, desde 2006 o Boldrini promove cursos para educadores e para a população sobre a importância da parceria da escola
com o hospital.
“Já percebemos impactos positivos do esclarecimento. Um paciente
chegou ao Boldrini com mochila por indicação de sua professora, que
participou do curso e recomendou a classe hospitalar. Isso para nós
foi o máximo”, relembra Luciana Ramos.
A informação rende outros frutos. Desde 2008, pacientes oncológicos do Boldrini prestam vestibular e exame nacional do ensino
médio (Enem) no próprio hospital. “Estamos orgulhosos com essas
vitórias porque enfrentamos barreiras burocráticas. Nossa maior rea-
lização é a normalidade da vida dos pacientes após a alta médica. Eles
namoram, prestam vestibular, trabalham e traçam mil planos futuros”,
declara a pedagoga.
Estreitar vínculos
Há 14 anos, o Grupo de Apoio ao Adolescente e à Criança com
Câncer (GRAAC) mantém a Escola Móvel, programa de assistência escolar da educação infantil ao ensino médio, no próprio hospital, disponível enquanto o paciente faz tratamento oncológico.
“Na escola regular, o professor programa as aulas do bimestre pensando no grupo. Aqui, o planejamento é individual. O educador vai à
aula com um tema, mas o ritmo de sua exposição dependerá do momento pedagógico do paciente”, compara Amália Covic, coordenadora
da Escola Móvel. Por exemplo, se ele é recém-operado, sua receptividade
poderá ser diferente de um aluno em outra fase da assistência médica.
Desde o ano 2000, mais de 3 mil pacientes de 4 a 23 anos já passaram pela Escola Móvel, que funciona das 8 às 16 horas e é conduzida
por 19 profissionais, entre professores, coordenadores e orientadores
escolares. O GRAAC criou o programa por constatar que 50% das
crianças e adolescentes em tratamento de câncer não estavam matriculados em unidades de ensino ou haviam desistido de estudar. Hoje,
o índice de desistência é menos de 5%.
Assim que a criança ou adolescente inicia o tratamento, a equipe
pedagógica faz uma entrevista para saber sua expectativa quanto à continuidade dos estudos no hospital. “Dificilmente ele nega”, garante a
coordenadora. Os educadores também conversam com o responsável
do aluno e lhe apresentam a Escola Móvel.
A escola regular do paciente é parceira da iniciativa, pois encaminha
os conteúdos do ano letivo. A coordenadora diz que o principal receio
da instituição é que os professores do hospital não tenham formação:
“Explicamos que nossos educadores são especialistas, mestres ou doutores em áreas como português, matemática e história”. Em parceria
com a Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), esses educadores
participam de curso na área, que também aborda características dos
tipos de câncer.
Na sua avaliação, a equipe pedagógica estreita vínculos com o paciente e com a própria escola. “Oferecemos os conteúdos direcionados
a cada um. O desafio da professora é abordar o tema de acordo com
as peculiaridades da região de origem do aluno”, comenta. Quarenta
por cento dos pacientes do GRAAC vêm de outros estados.
O GRAAC envia relatórios à escola para avaliar notas e evolução
de aprendizagem. Amália dá exemplos da importância da continuidade
dos estudos no hospital: há o caso de um estudante com deficiências
no ensino médio que não desistiu dos estudos devido ao apoio dos
educadores e concluiu o curso de Direito.
“Lembro-me de uma criança alfabetizada aqui que só chegou à escola regular no 3º ano do ensino fundamental e acompanhou o curso
de forma satisfatória. Quanto mais conhecimento de métodos de ensino e de oncologia, melhor será o atendimento ao aluno”, finaliza.
Onco& setembro/outubro 2014
43
campanhas
Fique por dentro das ações sobre câncer que ganharam destaque na mídia e nas redes sociais
Outubro Rosa completa seis anos
Uma das campanhas contra o câncer mais tradicionais no Brasil é o
Outubro Rosa, que visa alertar sobre os riscos do câncer de mama. Organizada no país pela Federação Brasileira de Instituições Filantrópicas de
Apoio à Saúde da Mama (Femama) desde 2008, a campanha já promoveu ações marcantes, como a iluminação rosa de pontos turísticos importantes, a exemplo do Cristo Redentor e do Congresso Nacional. A
ideia é atrair a atenção para o tema, estimulando o diagnóstico precoce e
desmistificando o tratamento. “É muito importante nos reunirmos nesse
grande movimento para fortalecer as políticas públicas para o controle da doença”,
afirma Maira Caleffi, médica mastologista e presidente voluntária da Femama.
“O câncer de mama pode ter até 95% de chance de cura se detectado precocemente.”
O Outubro Rosa começou nos Estados Unidos como uma forma de dar certa
unidade às diversas ações que aconteciam de forma isolada por todo o país. A escolha
pela cor rosa foi uma forma de reforçar o símbolo do laço rosa, criado na década de
1990 pela Fundação Susang G. Komen for The Cure, a principal entidade de apoio
às pacientes de câncer de mama no mundo.
Um dos atos mais tradicionais do Outubro Rosa é a organização de corridas
em apoio à causa. Os eventos, chamados de Corrida pela Cura, têm o valor de inscrição revertido para entidades de pesquisa e de apoio a pacientes e costumam reunir milhares de pessoas em cidades de todo o mundo, inclusive do Brasil.
Ações deste ano incluem pressão pela Lei dos 60 dias
A Femama e as diversas empresas e instituições que atuam no Outubro
Rosa estão preparando uma série de ações para a campanha deste ano.
Um dos focos apontados é fazer com que os órgãos públicos se comprometam com o cumprimento da Lei 12.732/12, conhecida popularmente
como a Lei dos 60 Dias. A lei prevê que o início do tratamento de pacientes
com câncer no sistema público de saúde aconteça em, no máximo, dois meses.
Além das tradicionais ações, como a iluminação de pontos públicos e a organização
de corridas e caminhadas, a Femama prepara o lançamento de um relatório com a
consolidação dos dados sobre o funcionamento da lei em seu primeiro ano de vigência. Com o relatório, a ideia é ajudar o poder público e a população a identificar
os pontos que têm funcionado bem e os que ainda precisam ser melhorados. “Aprovar a Lei dos 60 Dias foi uma conquista. Agora que ela está em vigor, vamos lutar
para que seja cumprida, por meio de campanhas e denunciando os casos de não
atendimento dentro do prazo estabelecido”, afirma Maira Caleffi. “Nosso objetivo
principal é fazer com que todos os responsáveis assumam o compromisso de mudar
a realidade dos pacientes com câncer.”
44
setembro/outubro 2014 Onco&
curtas
Salomão Zoppi oferece exames
genéticos de segunda geração
O SalomãoZoppi Diagnósticos passa a oferecer aos oncologistas
uma nova modalidade de exames de sequenciamento genético de segunda geração, utilizados para o diagnóstico e a orientação terapêutica
de diversos tipos de câncer. Os painéis multigênicos OncoScreen acrescentam um conjunto de sequenciamentos genéticos em um único
exame, permitindo ao médico uma visão mais ampla e precisa da unicidade do tumor e dos genes que favorecem ou dificultam a terapia
individualizada com as drogas-alvo. Antes do sequenciamento de
segunda geração, o sequenciamento genético era menos amplo e profundo e com menor grau de automação, consumindo maior tempo de
investigação. A nova tecnologia existe há apenas dois anos nos Estados
Unidos. “Embora não tenhamos ainda evidências científicas, pelo
pouco tempo de existência dessa modalidade de exame, empiricamente
sabemos que, se o diagnóstico é mais preciso, ágil e o tratamento mais
bem direcionado, o paciente será beneficiado com melhor qualidade
de vida ou maior sobrevida livre de doença”, comenta o gerente de produto do SalomãoZoppi, Alcimar Fernandes. Os painéis multigênicos
OncoScreen disponíveis são voltados para o diagnóstico de câncer de
pulmão, mama, estômago (GIST) e cólon. De acordo com os dados do
Ministério da Saúde, no Brasil o câncer de mama é o de maior incidência entre as mulheres e o de pulmão é o de segunda maior incidência
entre os homens (o primeiro é o câncer de próstata).
Brasília ganha unidade
modelo de assistência
oncológica
O Grupo Acreditar, empresa que integra o Grupo Oncologia D’Or, inaugurou mais uma clínica em Brasília.
Com mais de 500m², a unidade modelo é a terceira da
bandeira na capital federal. O lançamento do Grupo
Acreditar faz parte de um rol de esforços e investimentos
para ampliar a capacidade de atendimento. De acordo
com o diretor-presidente do Acreditar, Rodrigo de Abreu
e Lima, a abertura da unidade visa garantir cuidados integrais ao paciente que enfrenta o diagnóstico e o tratamento do câncer, bem como aos familiares que o acompanham. “Com recursos humanos especializados e compromisso com protocolos empregados mundialmente,
damos mais um passo em direção à nossa missão”, completa o executivo.
Descoberta brasileira abre caminhos a novas alternativas terapêuticas
para o tumor de Wilms
Estudo publicado na Nature Communications destaca um conjunto de mutações relacionadas com o desenvolvimento do tumor de
Wilms, ampliando as perspectivas para o diagnóstico precoce e novas formas de tratamento. Atualmente, o tumor de Wilms é diagnosticado
quando já há uma massa tumoral palpável, resultando em tratamentos mais agressivos.
Uma pesquisa liderada pelo A.C.Camargo Center, em São Paulo, apresenta um painel inédito de mutações genéticas relevantes para
o entendimento de como se dá o desenvolvimento do tumor de Wilms, o tipo de câncer renal mais comum em crianças. O estudo conta
com colaboradores de outras instituições como Hospital Sírio-Libanês, The Hospital for Sick Children (Canadá), Cancer Control Alberta
(Canadá) e o INCA. A pesquisa contou com o apoio da Fapesp.
O objetivo desse estudo, liderado pela cientista e coordenadora do Laboratório de Genômica e Biologia Molecular do A.C.Camargo,
Dirce Maria Carraro, era encontrar novas mutações somáticas relacionadas à doença. O grupo realizou o sequenciamento completo do
exoma (parte do genoma onde estão os genes codificadores de proteínas) do tumor de um paciente. Também foram sequenciados o exoma
dos leucócitos do sangue da criança e o dos pais. “O prognóstico costuma ser bom, com taxas de cura em torno de 80%. Mas muitos pacientes sofrem com os efeitos tardios do tratamento. Os mais comuns são distúrbios cardíacos, perturbações musculoesqueléticas e desenvolvimento de um segundo tumor”, conta Dirce.
“Uma das estratégias que pretendemos testar no futuro é a possibilidade de detectar na urina de pacientes mutações nesses genes e
em outros avaliados neste trabalho, que em conjunto compreenderam mais de 60% das amostras de Wilms. Isso abriria perspectivas de
diagnóstico precoce, antes de manifestação clínica, de forma simples e de baixo custo”, afirma.
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setembro/outubro 2014 Onco&
Novartis reúne especialistas em oncologia em sessão para a imprensa
Com a presença de especialistas renomados como Gilberto de Lima, diretor de Oncologia do HCor e diretor científico da Oncoclínicas,
Carlos Barrios, diretor executivo do Latin American Cooperative Oncology Group (Lacog), e Maria José Delgado Fagundes, diretora de
Inovação e Responsabilidade Social da Interfarma, a Novartis realizou um workshop em que foi apresentado um amplo desenho do quadro
atual dos tratamentos e pesquisas ligadas à oncologia no Brasil e no mundo.
Um dos assuntos da atualidade, a terapia personalizada para tratamento do câncer, foi desenvolvido por Carlos Barrios. O especialista
chama a atenção para um dos benefícios da terapia alvo, que é atacar diretamente o tumor e preservar o restante do organismo. As drogas
personalizadas estão em processo de desenvolvimento e tendem a elevar os índices de cura e sobrevida dos pacientes.
Uma das terapias personalizadas em estudo, a CTL019 da Novartis Oncologia, tem como alvo o tratamento de leucemia linfoblástica
aguda recidiva em adultos e crianças. A base dessa terapia é a extração de células de defesa do tipo T do paciente e sua modificação em
laboratório. Essas células modificadas são administradas ao paciente e combatem as células cancerígenas. De acordo com o FDA, a classificação da CTL019 como terapia revolucionária se destina a acelerar o desenvolvimento e a revisão de novos medicamentos que tratam
doenças graves.
Onco& setembro/outubro 2014
47
mundo virtual
Onco& recomenda
Sites e aplicativos sobre oncologia voltados tanto para médicos, com novidades e informações
sobre a área, como para pacientes, com dicas de prevenção e assistência ao doente
Apoio na palma da mão
Aplicativos para tablets e smartphones que ajudam médicos a se manter sempre atualizados e no melhor
caminho para o diagnóstico e tratamento de seus pacientes
MedPage Today
Radiology 2.0
Esta é a versão móvel de um dos mais conhecidos centros de informação sobre novidades médicas. Com o aplicativo, é possível
ter acesso a toda cobertura feita pela equipe
do MedPage Today, que acompanha mais de
30 especialidades médicas. Além de informações referentes a novidades da indústria farmacêutica e a novos estudos que podem alterar a prática clínica, o aplicativo traz informações em tempo real sobre mais de 60
importantes reuniões e simpósios médicos ao longo do ano. O app
pode ser baixado gratuitamente e está disponível para tablets e
smartphones com sistemas operacionais iOS e Android.
Desenvolvido pelo médico americano
Daniel Cornfield, este aplicativo busca, através de exemplos práticos, se tornar um importante aliado do médico no treinamento da
leitura de exames de imagem. O aplicativo é
uma evolução do site “One night in the ED”,
criado por Cornfield há dez anos. Em vez da
simples apresentação de imagens e explicações, o programa traz discussão de casos e
interatividade. Médicos de qualquer especialidade interessados em
ganhar mais prática no diagnóstico a partir de exames de imagem
podem se beneficiar dessa aplicação. Disponível gratuitamente para
aparelhos que operem com o sistema iOS.
inPractice Oncology
Chat with the Experts
O objetivo deste aplicativo é reunir uma
série de informações úteis para profissionais
de saúde que lidem com pacientes com câncer. Voltado tanto para oncologistas como
para médicos de outras especialidades, o
programa contempla trabalhos de referência
com uma base de dados de drogas como guidelines internacionais. Para facilitar o manuseio, inPractice conta com ferramentas que
permitem salvar os artigos de maior interesse e retornar a eles mais
tarde, além da possibilidade de compartilhar informações com colegas. A aplicação é gratuita e está disponível nas lojas dos sistemas
operacionais da Apple e do Google.
O Chat with the Experts é
um ciclo de palestras promovido pela farmacêutica Roche
em seu site Diálogo Roche. As
palestras são transmitidas ao
vivo pela página e podem
contar com perguntas feitas pelo público e traduzidas simultaneamente. A próxima edição será realizada em 14 de outubro, das 20
às 21 horas. O especialista convidado é o canadense Sunil Verma,
participante dos estudos Emilia e Cleopatra. Verma irá discutir o
manejo do câncer de mama metastático HER2+. A participação é
gratuita, bastando acessar o site www.dialogoroche.com.br no horário indicado para assistir à apresentação e enviar suas questões.
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48
setembro/outubro 2014 Onco&
acontece
Fique por dentro dos congressos, simpósios, encontros de atualização e outros tantos eventos
do mundo da oncologia. Confira aqui os principais eventos dos próximos meses
Todos juntos contra o câncer
Mais de 50 entidades de apoio a pacientes com câncer irão se unir nos dias 24 e 25 de setembro, em São Paulo, para discutir
políticas públicas na área da saúde. Batizado de Todos Juntos Contra o Câncer, o evento pretende construir um plano de ação
que envolva todos os setores interessados no aumento da eficácia do sistema. “Com ele, temos o objetivo de reunir líderes e
provocar um olhar visionário nos envolvidos e engajados em prol do tratamento do câncer no Brasil”, afirma Merula Steagall,
presidente da Associação Brasileira de Linfoma e Leucemia (Abrale), organizadora do evento. Mais informações podem ser obtidas
no site www.todosjuntoscontraocancer.org.br.
VIII Congresso Franco-Brasileiro de Oncologia
Entre os dias 9 e 11 de outubro será realizado, no Rio de Janeiro, a oitava edição do Congresso Franco-Brasileiro de Oncologia.
O evento, que contará com uma série de palestrantes nacionais e internacionais, discutirá as inovações terapêuticas no tratamento
dos mais diversos tipos de câncer. Em paralelo ao Congresso será organizada uma série de outros eventos, como o IV Fórum de
Oncologia Molecular e a V Jornada Franco-Brasileira de Psicologia Oncológica. As inscrições devem ser realizadas pela internet,
na página da Sociedade Franco-Brasileira de Oncologia.
ESMO
A edição de 2014 da reunião anual da Sociedade Europeia de Oncologia será realizada em Madrid entre os dias 26 e 30 de
setembro. O evento é um dos mais importante da oncologia mundial e contará com a apresentação de pesquisas em áreas que
têm sido muito debatidas ao longo dos últimos anos, como o uso de hormônios nos tratamentos e imunoterapia. O tema do encontro será “Medicina de Precisão no Cuidado do Câncer”, demonstrando uma preocupação da entidade com o avanço dos
tratamentos cada vez mais personalizados. Para outras informações, acesso o site www.esmo.org.
Simpósio de Oncologia UpToDate NE 2014
Em sua primeira edição, o Simpósio de Oncologia UpToDate NE pretende reunir vários dos mais renomados especialistas
brasileiros para debater os principais avanços da área. O evento será realizado em João Pessoa, no dia 17 de outubro. Entre os
enfoques, estão questões como prevenção precoce, tratamento eficaz e paliação ativa. A programação inclui discussões sobre
tumores gastrointestinais, de pulmão, ginecológicos, de mama, de cabeça e pescoço e geniturinários. Os detalhes e a ficha de
inscrição podem ser acessados no site www.oncologiane2014.com.br.
Onco& setembro/outubro 2014
49
calendário 2014
Evento
Data
Local
Informações
XI Congresso Brasileiro de Dor
3 a 6 de setembro
São Paulo, SP
http://www.dor.org.br/
Breast Cancer Symposium
4 a 6 de setembro
San Francisco, EUA
http://breastcasym.org/
II Simpósio Internacional de Melanoma
5 e 6 de setembro
São Paulo, SP
http://rvmais.com.br/simposio-melanoma/
III Congresso Internacional de Cirurgia Robótica
e Minimamente Invasiva
5 e 6 de setembro
São Paulo, SP
einstein.br/ensino/eventos
XII ONCOCESP – Encontro de Oncologia
do Centro-Oeste Paulista
12 de setembro
Barretos, SP
www.hcancerbarretos.com.br/oncoeventos
Câncer de Laringe
12 e 13 de setembro
Belo Horizonte, MG
http://www.sboc.org.br/wp-content/uploads
/2014/08/foldercancerdelaringe2.pdf
The Best of ASCO 2014 – Porto Alegre
13 de setembro
Porto Alegre, RS
[email protected]
ASTRO’s 56th Annual Meeting
14 a 17 de setembro
São Francisco, EUA
www.astro.org/Meetings-and-Events/
Index.aspx
Simpósio de Nutrição em Oncologia
18 de setembro
São Paulo, SP
http://www.accamargo.org.br/eventos/
VI Board Review – Curso de Revisão
em Oncologia Clínica
18 a 20 de setembro
São Paulo, SP
einstein.br/ensino/eventos
IV International Symposium on Translational
Oncology
19 de setembro
Barretos, SP
www.hcancerbarretos.com.br/oncoeventos
Carcinoma ductal in situ
25 de setembro
São Paulo, SP
http://web.szd.com.br/site/ReunioesCientificas-Eventos
XIII Jornada Norte e Nordeste de Cirurgia
de Cabeça e Pescoço
25 a 27 de setembro
Belém, PA
http://www.sbccp.org.br/
XV Simpósio Internacional de Hemoterapia e
VIII Jornada de Imuno-hematologia
25 a 27 de setembro
São Paulo, SP
http://www.hospitalsiriolibanes.org.br/iep
ESMO
26 a 30 de setembro
Madri, Espanha
www.esmo.org
VIII Congresso Franco-Brasileiro de Oncologia
9 a 11 de outubro
Rio de Janeiro, RJ
www.sfbo.com.br
II Congresso Multidisciplinar em
Oncologia Clínica
10 e 11 de outubro
Porto Alegre, RS
www.maededeus.com.br
I Congresso Paulista de Fisioterapia
em Oncologia
16 a 18 de outubro
São Paulo, SP
http://www.fisioterapianocancerde
mama.com.br/
Simpósio de Oncologia UpToDate NE 2014
17 de outubro
João Pessoa, PB
http://www.oncologiane2014.com.br/
Câncer de Mama Inicial
23 de outubro
São Paulo, SP
http://web.szd.com.br/site/ReunioesCientificas-Eventos
XIV Curso de Radioterapia de Última Geração e
Curso de Braquiterapia da Próstata
23 a 25 de outubro
São Paulo, SP
http://www.hospitalsiriolibanes.org.br/iep
Simpósio Internacional de Imagem em Oncologia
24 e 25 de outubro
São Paulo, SP
http://www.accamargo.org.br/eventos/
Todos Juntos Contra o Câncer
24 e 25 de setembro
São Paulo, SP
www.todosjuntoscontraocancer.org.br
V Congresso Internacional de
Ginecologia Oncológica
24 e 25 de outubro
São Paulo, SP
http://rvmais.com.br/congresso-ginecologia/
XVII Congresso Mineiro de Urologia
30 de outubro a 1º de novembro Belo Horizonte, MG
http://rvmais.com.br/congresso-mineiro/
Calendário de eventos de 2014 completo e atualizado:
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setembro/outubro 2014 Onco&
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