Redalyc.Incidência de vírus em videiras no Nordeste brasileiro e

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Ciência Rural
ISSN: 0103-8478
[email protected]
Universidade Federal de Santa Maria
Brasil
de Moraes Catarino, Aricléia; Martins Fajardo, Thor Vinícius; Pio-Ribeiro, Gilvan; Eiras, Marcelo;
Nickel, Osmar
Incidência de vírus em videiras no Nordeste brasileiro e caracterização molecular parcial de isolados
virais locais
Ciência Rural, vol. 45, núm. 3, marzo, 2015, pp. 379-385
Universidade Federal de Santa Maria
Santa Maria, Brasil
Disponível em: http://www.redalyc.org/articulo.oa?id=33138344001
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http://dx.doi.org/10.1590/0103-8478cr20140587
Ciência Rural,Incidência
Santa Maria,
v.45, em
n.3,videiras
p.379-385,
mar, 2015brasileiro e caracterização molecular
de vírus
no Nordeste
parcial de isolados virais locais.
379
ISSN 0103-8478
DEFESA FITOSSANITÁRIA
Incidência de vírus em videiras no Nordeste brasileiro e
caracterização molecular parcial de isolados virais locais
Incidence of viruses in grapevines in the Brazilian Northeast
and partial molecular characterization of local virus isolates
Aricléia de Moraes CatarinoI Thor Vinícius Martins FajardoII*
Gilvan Pio-RibeiroI Marcelo EirasIII Osmar NickelII
RESUMO
Os objetivos deste trabalho foram identificar as
espécies virais presentes em vinhedos comerciais de duas regiões
do Nordeste do Brasil e realizar a caracterização molecular
parcial de isolados de três espécies virais. A diagnose foi realizada
por meio de RT-PCR em tempo real para a detecção de Grapevine
rupestris stem pitting-associated virus (GRSPaV), Grapevine virus
A (GVA), Grapevine virus B (GVB), Grapevine leafroll-associated
virus 2, 3 e 4 (GLRaV-2, -3 e -4), Grapevine fleck virus (GFkV),
Grapevine rupestris vein feathering virus (GRVFV) e Grapevine
fanleaf virus (GFLV). Exceto para GFLV, os vírus avaliados estão
amplamente disseminados nas áreas amostradas, frequentemente
em altas incidências e em infecções múltiplas, de até 98% e 76,4%,
na Zona da Mata e no Vale do São Francisco, respectivamente.
Isolados locais de GVA, GVB e GLRaV-3 foram parcialmente
caracterizados com base na sequência completa de nucleotídeos
do gene da proteína capsidial e apresentaram alta porcentagem de
identidade de nucleotídeos com outros isolados brasileiros: 91,2%
(GVA), 99,8% (GVB) e 99,7% (GLRaV-3).
Palavras-chave: proteína capsidial, levantamento, detecção,
variabilidade, Vitis.
ABSTRACT
The objectives of this study were to identify viral
species infecting commercial vineyards in two regions of
Northeastern Brazil and perform partial molecular characterization
of isolates of three virus species. The diagnosis was performed by
real time RT-PCR for detection of GRSPaV, GVA, GVB, GLRaV-2,
GLRaV-3, GLRaV-4, GFkV, GRVFV and GFLV. Except for GFLV,
the evaluated viruses are widespread in the sampled areas, often
in high incidences and in multiple infections, up to 98% and
76.4%, in the Zona da Mata and in the Vale do São Francisco
regions, respectively. Local isolates of GVA, GVB and GLRaV-3,
partially characterized by complete coat protein gene nucleotide
sequencing, showed high percentage of nucleotide identities with
other Brazilian isolates of these viruses: 91.2% (GVA), 99.8%
(GVB) and 99.7% (GLRaV-3).
Key words: coat protein, survey, detection, variability, Vitis.
INTRODUÇÃO
O processo infeccioso causado pelos
vírus em videiras (Vitis spp.) resulta em quedas de
rendimento e da qualidade da produção e redução
da vida útil do vinhedo, refletindo na rentabilidade
da cultura. Já foram relatadas, no mundo, cerca de
60 espécies virais na cultura da videira; algumas
apresentam relevância e induzem expressivo impacto
econômico em muitas regiões e países, outras
não se destacam (MARTELLI, 2012). No Brasil,
Grapevine leafroll-associated virus (GLRaV-1,
-2, -3, -5 e -6), Grapevine virus A, B e D (GVA,
GVB e GVD), Grapevine rupestris stem pittingassociated virus (GRSPaV), Grapevine fleck virus
(GFkV) e Grapevine fanleaf virus (GFLV) já
foram detectados em videira (LIMA & FAJARDO,
2012). Recentemente, CATARINO et al. (2013)
identificaram GLRaV-4 e Grapevine rupestris
vein feathering virus (GRVFV) em amostras de
videiras comercialmente introduzidas no Brasil.
A propagação vegetativa da videira facilita
a disseminação e favorece a ocorrência de doenças
complexas pelo acúmulo de diferentes espécies e
estirpes virais em uma mesma planta (MARTELLI,
Departamento de Agronomia, Universidade Federal Rural de Pernambuco (UFRPE), Recife, PE, Brasil.
Embrapa Uva e Vinho, CP 130, 95700-000, Bento Gonçalves, RS, Brasil. E-mail: [email protected]. *Autor para correspondência.
III
Instituto Biológico, Centro de Pesquisa e Desenvolvimento de Sanidade Vegetal, São Paulo, SP, Brasil.
I
II
Recebido 17.04.14
Aprovado 13.08.14
Devolvido pelo autor 09.10.14
CR-2014-0587.R2
Ciência Rural, v.45, n.3, mar, 2015.
380
Catarino et al.
2012). No Nordeste brasileiro, encontram-se áreas
produtoras de uva, destacando-se dois polos: o do
Vale do São Francisco, com cerca de 10.000ha, que
inclui vinhedos situados nos Estados de Pernambuco
e Bahia e o da Zona da Mata, com cerca de 600ha,
que abrange municípios de Pernambuco e da Paraíba,
ambos com grande potencial de expansão da produção
(PROTAS & CAMARGO, 2011).
Em áreas tropicais, a exemplo do Nordeste
do Brasil, onde a videira é cultivada com pequeno
período de repouso para permitir mais de uma safra
por ano, a temperatura normalmente é elevada e
os sintomas característicos das viroses tendem a
estar ausentes ou são pouco evidentes. Estes fatos
dificultam a avaliação visual de campo da ocorrência e
da influência dessas doenças nos parreirais, indicando
maior necessidade de se aplicar testes diagnósticos
com elevada sensibilidade e especificidade para se
conhecer a sanidade do material. Além das condições
ambientais, os sintomas de infecção viral em videira
podem variar em função do estádio fenológico e
da condição nutricional da planta e, também, da
combinação envolvendo a cultivar e/ou espécie da
hospedeira com a estirpe e/ou espécie viral (LIMA
& FAJARDO, 2012). Assim, muitos vírus podem
passar despercebidos por não induzirem sintomas
visualmente perceptíveis ou facilmente distinguíveis.
A disponibilidade de informação sobre
a incidência de vírus em vinhedos no Brasil ainda é
escassa, sobretudo em regiões vitícolas do Nordeste do
País. KUHN et al. (2000) identificaram algumas viroses
em amostras de vinhedos comerciais do Vale do São
Francisco, porém, em alguns casos, sem identificar as
espécies virais envolvidas na infecção. Em relação à
ocorrência de viroses em videiras na Zona da Mata de
Pernambuco e da Paraíba, não há nenhuma informação
disponível. Os objetivos deste trabalho foram determinar
a incidência de viroses em duas regiões vitícolas
localizadas no Nordeste brasileiro, além de caracterizar
alguns isolados virais dessas regiões.
Material e métodos
O levantamento de vírus foi realizado em
vinhedos comerciais de duas regiões vitícolas, Zona
da Mata (municípios de São Vicente Férrer-PE e
Natuba-PB) e Vale do São Francisco (municípios de
Petrolina-PE, Lagoa Grande-PE e Casa Nova-BA),
entre setembro de 2012 e março de 2013. Na Zona da
Mata, foram coletadas 50 amostras de videiras com 4
a 40 anos, da cv. ‘Isabel’ (V. labrusca), plantadas em
pé franco ou sobre os porta-enxertos IAC (313, 572),
em seis propriedades. No Vale do São Francisco,
foram coletadas 51 amostras de videiras (V. vinifera)
com 2 a 11 anos, das cvs. ‘Christmas Rose’,
Sugraone, ‘Crimson Seedless’, ‘Red Globe’, ‘Sable’,
Italia, Thompson Seedless, Midnight Beauty, Shiraz,
Tempranillo, Barbera, Cabernet Sauvignon, Petite
Shiraz e Ruby Cabernet, enxertadas sobre os portaenxertos IAC (313, 572, 766), Harmony, P1103, SO4
e Richter, em dez propriedades. As amostras foram
avaliadas quanto à presença de Foveavirus: GRSPaV;
Vitivirus: GVA, GVB; Closterovirus: GLRaV-2;
Ampelovirus: GLRaV-3, GLRaV-4; Maculavirus:
GFkV; Marafivirus: GRVFV e Nepovirus: GFLV por
RT-PCR em tempo real (TaqMan).
A extração de RNA total, a partir de 100
mg de fragmentos do lenho de ramos maduros de
videiras, foi realizada triturando-se o tecido vegetal
em nitrogênio líquido, e seguindo o protocolo
definido no método de adsorção em sílica (Rott
& Jelkmann, 2001). Videira comprovadamente
sadia foi utilizada como controle negativo e, como
controle positivo das reações, foi utilizado RNA
extraído de videiras mantidas em casa de vegetação,
infectadas com isolados das espécies virais avaliadas.
Os oligonucleotídeos e as sondas
utilizados nas reações de RT-PCR em tempo real
foram desenhados com base em trabalhos publicados:
GRSPaV, GVA, GVB (Osman & Rowhani,
2008); GLRaV-2, GLRaV-3, GLRaV-4 (Osman et
al., 2007); GFkV e GFLV (Dubiela et al., 2013).
Para o GRVFV, estes reagentes foram definidos neste
trabalho para a amplificação de fragmentos de 104
pb, referentes à porção genômica correspondente à
proteína capsidial (CP) do GRVFV: oligonucleotídeos
104F (5’AAgAAgCTgACggATCCTTTCCgC3’),
104R (5’ACgCAgTggAgggTgACAggATTg3’)
e sonda 104P(5’CgAAATCACCCAgCTggAggT
ggTTCTCATgCC3’).
Todas as sondas foram marcadas na
extremidade 5’ com os fluoróforos 6-FAM ou VIC
para permitir a detecção simultânea de dois vírus
na mesma amostra e com TAMRA, fluoróforo que
funciona como bloqueador, na extremidade 3’. As
condições das reações de RT-PCR em tempo real
foram descritas previamente (Dubiela et al., 2013),
consistindo em ensaios do tipo presença/ausência,
utilizando-se o kit TaqMan Master Mix One-Step RTPCR e o termociclador StepOnePlus Real-time PCR
System (Applied Biosystems). Os dados das reações
foram analisados quantitativamente e graficamente,
utilizando-se o StepOne Software v2.3 (Applied
Biosystems), pela determinação do Cq (ciclo
quantitativo). Valores de Cq abaixo de 35 representam
resultados positivos, sendo que, quanto maior a
concentração viral na amostra, menor será o valor do Cq.
Ciência Rural, v.45, n.3, mar, 2015.
Incidência de vírus em videiras no Nordeste brasileiro e caracterização molecular parcial de isolados virais locais.
A caracterização molecular parcial foi
desenvolvida por meio da análise da sequência de
nucleotídeos de três importantes espécies virais
(GVA, GVB e GLRaV-3), cujos isolados foram
detectados no levantamento. Os oligonucleotídeos
para a amplificação por RT-PCR convencional
foram definidos com base em trabalhos anteriores
ou definidos neste trabalho: GVA-v1 (F)
(5’ATggCACACTACgCCAAgAggg3’) e C1197
(R) para GVA (Fajardo et al., 2003); GVB6445 (F) e GVB-7038 (R) para GVB (Nickel
et al., 2002) e LR3-8504 (F) e LR3-9445 (R) para
GLRaV-3 (Fajardo et al., 2007). A síntese do
cDNA e as reações de PCR foram conduzidas
conforme metodologia descrita por Fajardo et al.
(2003). Os produtos da RT-PCR foram analisados
em géis de agarose 1,2%, preparados em tampão
TBE pH 8,0, corados com brometo de etídeo e
visualizados em transiluminador de luz UV. As
bandas observadas, correspondentes a fragmentos
de tamanhos esperados, foram recortadas dos géis
e eluídas com a utilização do kit Wizard SV Gel and
PCR Clean-Up System (Promega).
Os fragmentos de DNA eluídos foram
ligados aos vetores pGEM-T Easy (Promega) ou
pCR2.1 (Invitrogen). A seguir, as ligações foram
utilizadas na transformação de células competentes
de Escherichia coli DH5α por meio de choque
térmico. O DNA plasmidial das colônias bacterianas
transformadas foi extraído utilizando-se o kit
Wizard Plus SV Minipreps DNA Purification System
(Promega). A confirmação da presença dos fragmentos
virais clonados nos plasmídeos recombinantes foi
realizada por digestão com a enzima de restrição
EcoRI (SAMBROOK & RUSSEL, 2001). Procedeuse ao sequenciamento automático de nucleotídeos
de dois clones por isolado viral caracterizado. As
sequências de nucleotídeos obtidas foram traduzidas
com auxílio de recurso disponibilizado pelo ExPASy
Bioinformatics Resource Portal <http://web.expasy.
org/translate/>. Os alinhamentos múltiplos das
sequências de nucleotídeos (nt) e de aminoácidos
deduzidos (aad) e a geração das matrizes de
identidades (de nt e aad) foram realizados com auxílio
dos programas Clustal X 1.8 (THOMPSON et al.,
1997) e BioEdit 7.1.11. Nas análises, foram incluídas
as sequências completas da proteína capsidial
(CP) do isolado caracterizado e outros isolados,
da mesma espécie viral (GVA, GVB ou GLRaV-3)
caracterizados no Brasil, além das sequências do gene
CP do isolado-tipo de cada espécie viral, disponíveis
no banco de dados GenBank.
381
Resultados e discussão
Foram realizadas análises de RT-PCR
em tempo real em 101 amostras de videiras. Os
resultados
indicam a frequente ocorrência de
infecções múltiplas na Zona da Mata (ZM) e no Vale
do São Francisco (VSF), com incidências de 0%,
2% e 98% (ZM) e 3,9%, 19,7% e 76,4% (VSF) nas
amostras, respectivamente, sadias, infectadas com
um vírus e infectadas com mais de um vírus. Em
geral, os vírus avaliados encontravam-se amplamente
disseminados nas duas regiões amostradas, ZM e
VSF, respectivamente, GRSPaV, 80% e 35%; GVA,
100% e 61%; GVB, 2% e 4%; GLRaV-2, 12% e 2%;
GLRaV-3, 62% e 37%; GLRaV-4, 90% e 61%; GFkV,
32% e 59%; GRVFV, 0% e 47% e GFLV, 0% em ambas
regiões. Estes resultados expandem o conhecimento
sobre a incidência e a distribuição de vírus em
videiras no Brasil, fornecendo relevante informação
para o desenvolvimento de estratégias de controle e
manejo destas doenças, com ênfase na importância
da utilização de material propagativo de videira
livre de vírus na implantação de novos vinhedos.
Em diversos países vitícolas, já foram
realizados levantamentos de vírus em videiras, por
exemplo, na Argentina (VOLPE et al., 2010), no Chile
(FIORE et al., 2011), na China (LIU et al., 2013) e
nos Estados Unidos (SHARMA et al., 2011). Nestes
levantamentos e em outros, a incidência de vírus é
bastante variável, dependendo da espécie viral, da
cultivar de videira e da região amostrada, entretanto,
invariavelmente, atingem expressivos índices,
situação semelhante à verificada no levantamento
conduzido neste trabalho.
Os sintomas normalmente associados
à infecção viral em videira são: perda contínua
e gradual do vigor da planta, produção reduzida,
coloração (avermelhamento ou amarelecimento)
anormal das folhas, folhas com aparência atípica
(bordos enrolados, textura rugosa e bolhas na
superfície do limbo foliar), brotação, engrossamento
e amadurecimento irregulares dos ramos, presença de
caneluras no lenho (ranhuras sob a casca do tronco)
e casca do tronco com aparência alterada (espessa e
com rachaduras), além do amadurecimento irregular
da uva, que possui menor teor de açúcares. Sintomas
como os relatados foram verificados em muitas das
videiras amostradas, indicativos da presença de
três importantes viroses: o enrolamento da folha
(GLRaV-2, GLRaV-3, GLRaV-4), o lenho rugoso
da videira (GVA, GVB, GRSPaV) e a mancha
das nervuras (GFkV) e outros vírus associados a
essa virose (GRVFV). O único vírus não detectado
Ciência Rural, v.45, n.3, mar, 2015.
382
Catarino et al.
no levantamento foi o GFLV, que, normalmente,
apresenta baixa incidência no Brasil (LIMA &
FAJARDO, 2012).
Nem sempre a videira infectada por
vírus exibirá sintomas perceptíveis, pois a infecção
pode ser latente em algumas cultivares comerciais;
entretanto, mesmo nestes casos, a presença do
vírus poderá causar prejuízos. Embora os danos
provocados por vírus não tenham sido avaliados nos
vinhedos amostrados, provavelmente, eles existissem,
conforme determinado por outros autores. BASSO et
al. (2010) observaram que uvas colhidas de videiras
infectadas por vírus apresentaram redução de sólidos
solúveis totais de cerca de 3,0 graus Brix, quando
comparadas às uvas colhidas de plantas sadias.
GLRaV-3, GLRaV-4, GVA e GVB
são transmitidos de maneira semipersistente por
cochonilhas, enquanto o GFLV é transmitido por
nematoides e GRSPaV, GLRaV-2, GFkV e GRVFV
ainda não têm vetores conhecidos. Todos estes vírus
são transmitidos por meio da enxertia de material
propagativo infectado (Martelli, 2012). Em
determinados casos, os meios de transmissão podem
explicar as incidências obtidas, em outros casos, não há
correlação. Por exemplo, foi constatada alta incidência
do GRSPaV, entretanto, este vírus não possui vetor
conhecido, assim, é provável que sua disseminação
tenha se dado pelo uso de material propagativo
infectado na formação dos vinhedos amostrados.
A técnica de diagnose, RT-PCR em tempo
real, empregada neste trabalho, é extremamente
sensível e capaz de superar limitações apresentadas
por outras técnicas convencionais de detecção viral.
Tais limitações, comumente observadas em videiras,
decorrem da distribuição desuniforme do vírus na
hospedeira e das expressivas variações do título viral,
tanto ao longo do ciclo da planta, quanto nos diferentes
tipos de tecidos vegetais (Dubiela et al., 2013).
O emprego dos oligonucleotídeos GVA-v1/
C1197 permitiu a amplificação de fragmentos de DNA
com 625bp contendo o gene da CP do GVA. O gene
completo da proteína capsidial do GVA, isolado IT-BA,
com 597 nucleotídeos (198 aminoácidos deduzidos,
aad), foi amplificado por RT-PCR a partir da amostra
no 91 da cv. ‘Italia’ de Casa Nova-BA. A sequência
de nucleotídeos deste isolado (acesso GenBank
KF667501) apresentou identidade entre 89,6-91,2%
quando comparada a outros isolados brasileiros do
mesmo vírus (AF494187 do RS e AY340581 de
SP) e com o isolado-tipo do GVA (NC_003604). A
identidade de aad entre os isolados de GVA analisados
foi de 94,9% a 98,9% (Tabela 1). De modo geral, os
critérios para a definição de espécies virais nas famílias
Tabela 1 - Identidade (%) das sequências de nucleotídeos (abaixo
da diagonal) e de aminoácidos deduzidos (acima da
diagonal) do gene completo (597 pb, 198 aad) da
proteína capsidial entre diferentes isolados brasileiros
de Grapevine virus A.
Isolados
IT-BA
“GVA-RS”
“GVA-SP”
Is151
IT-BA
“GVA-RS”
“GVA-SP”
Is 151
--89,6
91,2
89,7
95,4
--89,3
90,8
98,9
94,9
--91,9
96,9
95,4
96,4
---
Nome do isolado (código de nucleotídeos / código de aad do
isolado no GenBank, País, Estado): IT-BA (KF667501 /
AGX27424, Brasil, BA), “GVA-RS” (AF494187 / AAM14605,
Brasil, RS), “GVA-SP” (AY340581/ AAQ19964, Brasil, SP),
isolado-tipo do GVA: Is151 (NC_003604 / NP_619665, Itália).
Em negrito, informação do isolado caracterizado neste trabalho.
Betaflexiviridae e Closteroviridae estabelecem que a
sequência de aminoácidos deduzidos das principais
ORFs apresente diferença superior a 10%, sendo a
sequência do gene da proteína capsidial amplamente
utilizada na taxonomia (KING et al., 2012).
O gene completo da proteína capsidial do
GVB, isolado IS-SVF, com 594 nucleotídeos (197
aad), foi amplificado por RT-PCR a partir da amostra
nº 15 da cv. ‘Isabel’ de São Vicente Férrer-PE. A
sequência de nucleotídeos deste isolado (acesso
GenBank KF040332) apresentou identidade entre
92,7-99,8% com os isolados brasileiros do mesmo
vírus (KF040331 e AY340583 de SP, KF040333
e AF438410 do RS) e de 81,3-82,7%, quando
comparado com os isolados AY340582, de SP, e com
o isolado-tipo do GVB (NC_003602). A identidade
de aad entre todos os isolados de GVB analisados
variou de 95,4% a 100% (Tabela 2). Variabilidade
entre isolados de GVA e GVB já havia sido verificada
(MOREIRA et al., 2004a; MOREIRA et al., 2004b;
Nickel et al., 2002; Fajardo et al., 2003),
entretanto, sem considerar isolados provenientes do
Nordeste brasileiro, identificados posteriormente.
O gene completo da proteína capsidial do
GLRaV-3, isolado RC-PE, com 942 nucleotídeos e
313 aminoácidos deduzidos, foi amplificado por RTPCR a partir da amostra nº 101 da cv. ‘Ruby Cabernet’
de Petrolina-PE. A sequência de nucleotídeos deste
isolado (acesso GenBank KJ704369) apresentou
identidade entre 99,2-99,7%, com os isolados
brasileiros do mesmo vírus (DQ680141, DQ680142,
DQ062152 de PE) e com o isolado-tipo do GLRaV-3
(NC_004667) e 92,9-93,4%, quando comparado com
os outros isolados brasileiros Pet-4 (AY753208 de
PE) e IS2 (HM059034 do RS). A identidade de aad
entre todos os isolados de GLRaV-3 analisados foi de
Ciência Rural, v.45, n.3, mar, 2015.
Incidência de vírus em videiras no Nordeste brasileiro e caracterização molecular parcial de isolados virais locais.
383
Tabela 2 - Identidade (%) das sequências de nucleotídeos (abaixo da diagonal) e de aminoácidos deduzidos (acima da diagonal) do gene
completo (594 pb, 197 aad) da proteína capsidial entre diferentes isolados brasileiros de Grapevine virus B.
Isolados
IS-SVF
CO
CS
BR1
Common
Italia
“GVB-italiano”
IS-SVF
CO
CS
BR1
Common
Italia
“GVB-italiano”
--99,8
99,8
99,8
82,7
92,7
81,3
100
--100
100
82,5
92,6
81,2
100
100
--100
82,5
92,6
81,3
100
100
100
--82,5
92,6
81,3
97,5
97,5
97,5
97,5
--83,7
98,6
96,4
96,4
96,4
96,4
95,4
--82,5
97,5
97,5
97,5
97,5
98,9
95,4
---
Nome do isolado (código de nucleotídeos / código de aad do isolado no GenBank, País, Estado): IS-SVF (KF040332 / AGO86377, Brasil,
PE), CO (KF040331 / AGO86376, Brasil, SP), CS (KF040333 / AGO86378, Brasil, RS), BR1 (AF438410 / AAL40797, Brasil, RS),
Common (AY340582/ AAQ19965, Brasil, SP), Italia (AY340583/ AAQ19966, Brasil, SP), isolado-tipo do GVB: “GVB-italiano”
(NC_003602 / NP_619657, Itália). Em negrito, informação do isolado caracterizado neste trabalho.
94,9% a 100% (Tabela 3). Variabilidade entre isolados
de GLRaV-3 já havia sido verificada (FAJARDO et
al., 2007), inclusive considerando alguns isolados
provenientes do Nordeste brasileiro.
Apesar das variações mais acentuadas
terem sido verificadas nas sequências de nucleotídeos,
as sequências de aminoácidos deduzidos das proteínas
capsidiais tendem a apresentar menor variação entre
os isolados de regiões geográficas distintas (Tabelas 1,
2 e 3). A proteína capsidial é uma proteína estrutural,
assim, fatores evolutivos poderiam restringir as
variações que seriam deletérias para as três espécies
virais. Alterações nas proteínas capsidiais poderiam,
por exemplo, resultar na perda da capacidade de
interação com vetores ou fatores da planta hospedeira
e o fato do GVA, GVB e GLRaV-3 terem como única
hospedeira natural a videira, poderia restringir ainda
mais essas alterações (MOREIRA et al., 2004b).
A videira é uma planta exótica no Brasil.
Assim, as espécies virais encontradas infectando,
localmente, esta hospedeira, foram originalmente
introduzidas com a planta, em um passado distante, ou
introduzidas via importação de mudas, em processo
mais recente. A viticultura brasileira é resultado da
introdução de cultivares de copa e de porta-enxerto
oriundas dos Estados Unidos (cultivares e híbridos
de Vitis labrusca, por ex., cv. ‘Isabel’) e de países
europeus, como França e Itália (principalmente
cultivares de V. vinifera). Também, ao longo do
tempo, ocorreu grande redistribuição de material
propagativo e mudas de videiras entre regiões
geográficas do Brasil, podendo isto ter contribuído
para a redistribuição dos patógenos virais incidentes
(MOREIRA et al., 2004b; PROTAS & CAMARGO,
2011). Assim sendo, os vírus constatados nas duas
regiões amostradas no Nordeste brasileiro teriam
chegado até estas regiões pelas vias mencionadas.
Em relação à variabilidade genética dos três vírus
estudados, foi possível verificar elevados níveis de
identidade de aminoácidos deduzidos (94,5% a 100%)
Tabela 3 - Identidade (%) das sequências de nucleotídeos (abaixo da diagonal) e de aminoácidos deduzidos (acima da diagonal) do gene
completo (942 pb, 313 aad) da proteína capsidial entre diferentes isolados brasileiros de Grapevine leafroll-associated virus 3.
Isolados
RC-PE
Pet-1
Pet-2
Pet-3
Pet-4
IS2
NY1
RC-PE
Pet-1
Pet-2
Pet-3
Pet-4
IS2
NY1
--99,7
99,6
99,5
93,4
92,9
99,2
100
--99,8
99,7
93,4
92,8
99,4
99,6
99,6
--99,6
93,3
92,7
99,3
99,6
99,6
99,3
--93,2
92,6
99,2
95,8
95,8
95,5
95,5
--97,7
92,8
94,9
94,8
94,5
94,5
96,4
--92,3
99,0
99,0
98,7
98,7
94,8
93,9
---
Nome do isolado (código de nucleotídeos / código de aad do isolado no GenBank, País, Estado): RC-PE (KJ704369 / AID53088, Brasil, PE),
Pet-1 (DQ680141 / ABG76780, Brasil, PE), Pet-2 (DQ680142 / ABG76781, Brasil, PE), Pet-3 (DQ062152 / AAY62364, Brasil, PE), Pet-4
(AY753208 / AAV27299, Brasil, PE), IS2 (HM059034 / ADG57581, Brasil, RS), isolado-tipo do GLRaV-3: NY1 (NC_004667 /
NP_813801, EUA). Em negrito, informação do isolado caracterizado neste trabalho.
Ciência Rural, v.45, n.3, mar, 2015.
384
Catarino et al.
com outros isolados, previamente caracterizados no
Brasil, enfatizando a validade das informações sobre
possíveis origens comuns dos materiais propagativos
infectados de videira.
A compreensão da diversidade genética da
população viral e a determinação da incidência das
espécies virais em uma região podem viabilizar a
diagnose focada em testes diagnósticos “universais”,
capazes de detectar um maior número de isolados
e estirpes de uma espécie viral, favorecendo a
implementação de determinadas práticas de manejo
e controle de viroses, além de possibilitarem a
realização de estudos epidemiológicos.
Brasileira, v.32, p.335-340, 2007. Disponível em: <http://dx.doi.
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2014. doi: 10.1590/S0100-41582007000400008.
CONCLUSÃO
LIMA, M.F.; FAJARDO, T.V.M. Doenças causadas por vírus. In:
LIMA, M.F.; MOREIRA, F.R.B. Uva de mesa - Fitossanidade.
Série Frutas do Brasil 14. 2.ed. Brasília: Embrapa, 2012. p.43-58.
A determinação da incidência de vírus em
duas regiões vitícolas situadas no Nordeste brasileiro; a
identificação, caracterização e estudo da variabilidade
genética de três isolados virais locais e a robustez
demonstrada pelo teste RT-PCR em tempo real para a
detecção dos isolados locais, em conjunto, aprofundam
o conhecimento de viroses nas regiões estudadas e
contribuem para o desenvolvimento de ferramentas
de diagnóstico viral mais específicas e sensíveis.
Agradecimentos
Ao Marcos F. Vanni (Embrapa Uva e Vinho), Maria
Angélica G. Barbosa (Embrapa Semiárido), Selma C. C. H. Tavares
(Embrapa Solos) e Genira P. Andrade (UFRPE), pela colaboração
em diferentes etapas deste trabalho.
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