36| Sonhos: possíveis ferramentas para vir a ser inteiro em psicoterapia Franciele Engelmann Ano I | número 1 | 2012 CONIUNCTIO Revista Científica de Psicologia e Religião | Ichthys Instituto | Curitiba - PR |37 Sonhos: possíveis ferramentas para vir a ser inteiro em psicoterapia | Franciele Engelmann | 37 - 42 Sonhos: possíveis ferramentas para vir a ser inteiro em psicoterapia Franciele Engelmann* Resumo Os sonhos acompanham a humanidade desde a antiguidade. Constituídos de natureza premonitória e tidos como manifestação de forças ocultas para os egípcios; utilizados nos rituais de cura pelos gregos, os sonhos revelaram-se ao longo da história como ferramentas úteis na relação com a alma. Para Jung, o ser humano é habitado por um impulso que o impele à totalidade. O objetivo deste artigo é abordar a importância dos sonhos no processo psicoterapêutico de vir a ser inteiro. O método utilizado é a revisão de literatura com base na psicologia analítica. O tornar-se inteiro, a individuação, se origina e culmina no si-mesmo, o arquétipo central, promovedor do desenvolvimento humano. Os sonhos, enquanto compensação de unilateralidade da consciência e como manifestação do si-mesmo, configuram-se como possibilidades de uma conexão com a alma, expressões que podem contribuir para encontrar o sentido da vida e realizar a finalidade à qual se é chamado a ser. Palavras-chave: sonhos, psicoterapia, processo de individuação. Abstract Dreams come mankind since antiquity. Consisting of premonitory nature and taken as a manifestation of hidden forces to the Egyptians, used in healing rituals by the Greeks, the dreams have proved throughout history useful tools in relation to the soul. For Jung, the human being is inhabited by an impulse that propels the whole. The aim of this paper is to address the importance of dreams in the psychotherapeutic process of becoming whole. The method used is a literature review on the basis of analytical psychology. Becoming a full-individuation originates and culminates in the Self, the central archetype, promoter of human development. Dreams, while compensation of one-sidedness of consciousness as a manifestation of the Self, configured a possible connection to the soul, words that can help find the meaning of life and achieve the purpose for which it is required to be. Keywords: dreams, psychotherapy, process of individuation. I. Introdução * Psicóloga graduada pela UFPR – Universidade Federal do Paraná. Especialista em psicologia analítica e religião ocidental e oriental pelo ICHTHYS – Instituto de Psicologia e Religião. Companheiros da jornada humana, desde a antiguidade, os sonhos configuraram-se, ao longo da história, como espaço significativo para a compreensão e cumprimento do vir a ser humano. Para os antigos egípcios, os sonhos apresentavam um caráter premonitório, que comumente manifestava a intenção dos deuses e o destino da pessoa. Provavelmente, este povo foi, Ano I | número 1 | 2012 conforme Ramos (1994) o primeiro povo a institucionalizar uma forma de interpretação onírica, nos assim chamados, templos de incubação (apud GALLBACH, 2003). Se os egípcios foram os primeiros a utilizar a interpretação dos sonhos, coube aos gregos aprimorar tais técnicas e inserí-las no diagnóstico e tratamento de doenças. Com base na visão mítica, acreditavam que a doença era a conseqüência da violação de um tabu ou de uma ofen- CONIUNCTIO Revista Científica de Psicologia e Religião | Ichthys Instituto | Curitiba - PR 38| Sonhos: possíveis ferramentas para vir a ser inteiro em psicoterapia | Franciele Engelmann | 37 - 42 sa aos deuses. A cura, segundo RAMOS (1994), gem única para um sujeito único” (GALLBA- somático e o espiritual, buscando-se identificar interioridade humana, tecida no entrelaçamento consistia em restabelecer a relação entre o plano no sintoma, o aspecto com o qual o indivíduo havia se desconectado e deveria voltar a se re- conectar. As práticas curativas caracterizavamse como verdadeiros rituais, desenvolvidos nos templos dedicados a Esculápio, o deus da medi- CH, 2003, p.13). Esta mensagem se encontra na da história pessoal e coletiva. Nos sonhos, o inconsciente se manifesta mediante símbolos. Em sua obra O homem e seus símbolos, Jung define símbolo como: cina. A atenção e o entendimento dos Sonhos, um termo, um nome ou mesmo uma imagem que zavam-se nesta época, como atividades, median- sua conotações especiais além do seu significado equilíbrio entre psique e corpo (RAMOS, 1994 vaga, desconhecida ou oculta... uma palavra ou ao lado da música, meditação e dieta caracteri- nos pode ser familiar na vida diária, embora pos- te as quais era possível um restabelecimento do evidente e convencional. Implica alguma coisa e MEIER, 1999). imagem é simbólica quando implica alguma coi- Estudos e curiosidades acerca da vida oní- rica estenderam-se ao longo da história, permeando culturas e presentificando-se em diferentes âmbitos do conhecimento e no trilhar dos diferentes caminhos de realização da alma. O que são os sonhos? De onde provêm? Expressarão eles algum significado, sentido para a vida do sonhador? sa além do seu significado manifesto e imediato. Esta palavra ou esta imagem tem um aspecto “inconsciente” mais amplo, que nunca é precisamente definido ou de todo explicado. Por existirem inúmeras coisas fora do alcance da compreensão humana, é que frequentemente utilizamos termos simbólicos como representação de conceitos que não podemos definir ou compreender integralmente... Mas este uso consciente que fazemos de símbolos é apenas um aspecto de um fato psico- II. O sonho como manifestação simbólica do inconsciente O sonho surge espontaneamente durante o sono como fruto de um “processo involuntário que ocorre num estado de consciência relaxado e não focalizado” (GALLBACH, 2003, p. 17). Segundo Jung (1971), suas raízes estão no inconsciente. Conforme Gallbach (2003), o sonho não apresenta um caráter de inconsciência total, uma vez que ocorre num estado limiar em que há um resíduo de consciência e percepção. Para Jung (1971), o sonho é expressão simbólica do inconsciente. Expressão esta que pode se dar mediante ideias, sensações, emoções, imagens e situações que, ao serem desencadeadas no processo onírico, podem envolver de forma mais intensa, ou não, o sonhador. O sonho traz um sentido ( JUNG, 1971) para a vida do sonhador. Articula uma “mensaAno I | número 1 | 2012 lógico de grande importância: o homem também produz símbolos, inconsciente e espontaneamente, na forma de sonhos (1964, p. 20-21). A manifestação do símbolo no sonho pode se dar de diferentes formas: apresentar um caráter claro, estranho, obscuro ao sonhador. Em suas mais variadas expressões, o símbolo articula um significado, um sentido, os quais por sua vez po- dem estar ocultos, sob determinadas imagens, pensamentos, emoções, à espera de vir a serem descobertos, compreendidos e assimilados pelo sonhador. Ao abordar o conceito de sentido nos sonhos, Jung situa os mesmos no contexto de finalidade, destacando que esta designa a “tensão psicológica imanente dirigida a um objetivo futuro” (1971, p. 181). Além de considerar o as- pecto causal, Jung destaca a importância de se considerar o porquê do sonho. Ao falar sobre as assimilações que sucessivamente acontecem em CONIUNCTIO Revista Científica de Psicologia e Religião | Ichthys Instituto | Curitiba - PR |39 Sonhos: possíveis ferramentas para vir a ser inteiro em psicoterapia | Franciele Engelmann | 37 - 42 1| Neste escrito, Jung identifica o processo de individuação com o desenvolvimento da personalidade, donde os termos individuação e personalidade, serem utilizados como sinônimos. relação ao sonho, ressalta que elas conduzem a 2| No contexto deste trabalho, o si-mesmo (Self) será abordado como centro ordenador da personalidade. Em Memórias, sonhos e reflexões, Jung o define como: “arquétipo central da ordem, da totalidade... é uma realidade ‘sobre-ordenada’ ao eu consciente. Abrange a psique consciente e a inconsciente, constituindo por esse fato uma personalidade mais ampla, que também somos... É também a meta da vida, pois é a expressão mais completa dessas combinações do destino que se chama indivíduo” (1963, p. 358). todo médico deveria estar consciente do fato de uma meta; para o além do aqui e agora da vida do sonhador, conduzem “à plena realização do homem inteiro, à individuação” (2008, p. 31). No tocante à prática psicoterapêutica, assim escreve: que qualquer intervenção psicoterapêutica, e, em especial, a analítica, irrompe dentro de um processo e numa continuidade já orientados para um determinado fim, e vai desvendando, ora aqui, ora acolá, fases isoladas do mesmo, que à primeira vista podem até parecer contraditórias. Cada análise individual mostra apenas uma parte ou um aspecto do processo fundamental (Id., 2008, p. 31). mesmo tempo germe (designação) e meta (unidade, totalidade) da Individuação. Os sonhos constituem-se como um dos espaços para o dar-se conta desta a ação do si- mesmo na vida. Para Sanford (2007), originamse no centro da personalidade, constituindo-se o elo de ligação entre a realidade menor do ego e a maior do si-mesmo. Von Franz, assim se expressa: Os sonhos não nos protegem das vicissitudes, doenças e eventos dolorosos da existência. Mas eles nos fornecem uma linha mestra de como lidar com esses aspectos, como encontrar um sentido em nossa vida, como cumprir nosso próprio destino, como seguir nossa própria estrela, por assim dizer, a fim de realizar o potencial de vida que há em nós (1988, p. 25). III. Sonhos, individuação e psicoterapia Para esta realização, é preciso uma busca a Em seu ensaio1 Da Formação da Personali- dade, Jung (1998) salienta que, além dos aspectos de necessidade e decisão, há a designação que, perpassando o eu, o convoca a individuar- fim de se compreender o significado, a mensa- gem que o Self envia a cada noite, sob a forma de símbolos. No tocante à prática psicoterapêutica, Jung se. Esta é definida como: “um fator irracional (2008, 1964) ressalta que os sonhos são a forma da massa gregária e de seus caminhos desgas- a consciência. Seus conteúdos podem exprimir traçado pelo destino que impele a emancipar-se tados pelo uso” ( JUNG, 1998, p.181). A ideia vinculada no conceito de designação remete ao 2 si-mesmo (Self ), que enquanto instância maior, promove a individuação. Aceitar a designação, a ação do si-mesmo na vida, implica em “fidelidade à sua própria lei” (Id. p. 179). A noção de destino expressa no conceito específica de o inconsciente se comunicar com fatos passados, desenfreadas fantasias, planos, antecipações, visões telepáticas ( JUNG, 1971); vincular-se a realidades problemáticas ou confli- tantes do presente, bem como manifestar com- ponentes da personalidade do sonhador (Id., 2008). Considerando que os sonhos são mani- de designação não pode ser tomada como pre- festações do inconsciente, é importante lembrar te na vida do indivíduo é uma possibilidade de cientes que simbolicamente são personificados determinação: o Self enquanto arquétipo laten- vir a ser. Possibilidade esta que assume, segundo Fogel, o caráter de destino, numa perspectiva de circularidade: no sentido de ser um envio de si para si, uma “possibilidade de possibilidade” (1999, p. 152). A individuação, como designação, requer que a pessoa se empenhe na tarefa de dar-se conta do movimento do próprio Self em sua vida, pois, na perspectiva de destino, enquanto movimento de circularidade, o Self é ao Ano I | número 1 | 2012 que Jung identificou quatro conteúdos inconsnos sonhos:sombra, anima, animus e self. Em função da brevidade deste artigo, não se abordará aqui o trabalho com tais elementos; reme- temos o leitor aos escritos de Marie-Louise Von Franz: O Caminho dos Sonhos (1988) e O Processo de Individuação – contido na obra de Jung: O Homem e seus Símbolos (1964), nos quais a au- tora discorre ampla e profundamente sobre tais conteúdos. CONIUNCTIO Revista Científica de Psicologia e Religião | Ichthys Instituto | Curitiba - PR 40| Sonhos: possíveis ferramentas para vir a ser inteiro em psicoterapia | Franciele Engelmann | 37 - 42 Ao se buscar compreender um sonho, é to e o do objeto. A interpretação a nível do sujeito 1971). Faz-se necessário, ainda, conhecer as si- personificações da personalidade do sonhador. preciso a colaboração do sonhador ( JUNG, tuações concretas nas quais o indivíduo está inserido, pois o sonho, conforme Jung: “não é um acontecimento isolado, inteiramente dissociado do cotidiano e do caráter do mesmo” (2008, p. 25). identifica as diferentes imagens do sonho como Nesta perspectiva, a elaboração apresenta um caráter essencialmente subjetivo: “o sonhador funciona, ao mesmo tempo, como cena, ator, ponto, contra-regra, autor, público e crítico” (Id., p. 205). Já, em nível de objeto, a interpretação con- Com base nas experiências dos primitivos, cebe as diferentes figuras como representações quenos sonhos. Estes últimos, também denomi- inserido. Para orientar-se por uma interpretação diários, derivam da dimensão subjetiva e pessoal, se levar em conta as especificidades de cada caso, sonhos, também chamados de significativos/ nante; se uma imagem é reproduzida por causa relacionam-se a temas arquetípicos, mitológicos, plo, uma relação de importância vital é o conte- com base nas experiências que acompanharam ficado subjetivo – ou quando, por exemplo, uma Normalmente, ocorrem em momentos cruciais às etapas do próprio processo psicoterapêutico, da vida, ficando frequentemente gravados na uma criança. Jung (1971) distingue entre grandes sonhos e pe- do mundo concreto, no qual o sonhador está nados banais, articulam significados ordinários, ou outra, Jung (1971) ressalta a necessidade de vindo a ser esquecidos facilmente. Os grandes buscando identificar qual é o aspecto predomi- importantes, brotam do inconsciente coletivo, de seu significado objetivo – quando, por exem- cujo significado principal se encontra intrínseco, údo e a causa do conflito – ou devido ao signi- a humanidade nas diferentes épocas e culturas. imagem se relaciona à dinâmica do indivíduo ou da existência: na infância, puberdade e no meio como no caso de se sonhar com o nascimento de memória por toda a vida, vindo a configurar eta- Para a psicologia analítica, os sonhos pas do processo da individuação. são manifestações do Self. Têm a função de Jung (1971) destaca ainda que há uma compensar atitudes unilaterais da consciência, apresenta, normalmente, quatro fases, as quais se psíquico ou ameaçar necessidades vitais do indi- predominância de sonhos médios, cuja dinâmica as quais podem estar em desacordo com o todo assemelham à estrutura do drama. A exposição víduo ( JUNG, 1964, 1971, 2004, 2008). refere-se à situação inicial que esboça a temática ou problemática; contextualiza, no tempo e no espaço, o cenário no qual os personagens atuam. A segunda fase, a do desenvolvimento da ação, apresenta o desenrolar da problemática, mani- festando a complicação e a tensão da situação, sem saber no que dela vai resultar. A culminação ou peripécia evidencia o auge do desenvolvimen- to dramático em sua dinâmica oposta; nesta, algo decisivo acontece ou a situação se altera inteiramente. A quarta fase, a lise, mostra a si- tuação final, apresenta a solução e a conclusão esboçada pelo sonho. No que concerne à interpretação oníri- ca, Jung (1971) estabelece dois níveis: o do sujeiAno I | número 1 | 2012 Para Jung (2008), a teoria das compen- sações é a regra básica do comportamento psí- quico: a insuficiência num aspecto cria excesso em outro aspecto. Cada sonho é, então, uma ten- tativa da própria natureza psíquica de centrar o indivíduo. Justifica-se, desta forma, a importância de se considerar o contexto de vida e os as- pectos da personalidade do sonhador no ato de compreensão de um sonho. A autorregulação do equilíbrio psíquico, realizada mediante a compensação do sonho, vincula-se em uma perspec- tiva mais profunda e mais ampla à individuação ( JUNG, 2008). Decorre daí a importância que o autor atribui para a análise e interpretação de um sonho no contexto de uma série de sonhos. CONIUNCTIO Revista Científica de Psicologia e Religião | Ichthys Instituto | Curitiba - PR |41 Sonhos: possíveis ferramentas para vir a ser inteiro em psicoterapia | Franciele Engelmann | 37 - 42 Em sua obra A prática da psicoterapia, ao autor, a palavra consciência deriva dos termos la- o importante papel da consciência na compre- ber”, vindo a significar “saber com” “outro”, sen- falar da individuação, Jung (2004) discorre sobre ensão dos símbolos compensatórios produzidos em sonho pelo inconsciente: “Um sonho não compreendido não passa de um simples episó- dio, mas a sua compreensão faz dele uma vivência” (Id., p. 117). do que este outro pode ser uma pessoa, alguma parte de si ou o próprio Deus. Para Jaffe (2002), a consciência integra cabeça e coração, sendo sua base formada pelo conhecimento animado pelo coração. Isso converge com o que Jung escreve Com base no fenômeno da compen- acerca do processo psicoterapêutico: “O paciente podem favorecer grandemente o processo de assim fizermos, estaremos nos dirigindo apenas gem analítica junguiana, exprime, segundo Gu- dade. Assim, atingiremos o seu coração. Isso o alemão a ele correspondente: heilen – cura total. p. 18). Registrar, pintar, refletir afetivamente so- totalidade, do si-mesmo. Donde temos um dos a consciência participar da individuação. sação, JUNG (1971) reconhece que os sonhos não deve ser instruído acerca de uma verdade. Se cura. Convém destacar que cura, numa aborda- à sua cabeça. Ele tem que evoluir para esta ver- ggenbühl-Craig (1983), o significado do termo toca mais fundo e age mais intensamente” (2008, A cura configura-se, assim, como uma busca da bre as imagens oníricas são formas concretas de propósitos da psicoterapia: curar, vir, a ser in- Considerações finais teiro, total, consciente da ação do Self na vida ( JUNG, 2004). Segundo Jaffe (2002), a consciência de- sempenha um componente essencial no individuar-se: o próprio eu se esforça para integrar as forças desconhecidas surgidas durante o caminho e contribui para a ativação da cura, para a totalidade psíquica se instalar. A consciência exerce, pois, uma influência estimuladora sobre o inconsciente, uma vez que se esforça para com- preender as mensagens que este lhe apresenta. Assim, escreve Sanford: “... O potencial total de 3| Segundo CHEVALIER e GHEERBRANT, tememos é uma palavra grega, que tem a mesma origem do radical indu-europeu tem: cortar, delimitar, dividir, e “significava o local reservado aos deuses,o recinto sagrado que cercava um santuário e que era um lugar intocável”((2008, p. 874). tinos “con”, que expressa “com”, e “sciere”, “sa- Diferentes visões e abordagens teóricas surgiram, no decorrer dos tempos, acerca dos sonhos. Para alguns, são imagens desprovidas de sentido; para outros, resíduos de memória ativados; para esotéricos e adivinhos, indicam caminhos e apontam soluções para diferentes problemas; para místicos e crentes religiosos, exprimem a vontade divina; para a psicologia analítica, configuram-se como possibilidades do vir a ser humano. Enquanto mensagens do Self, da totalida- cura contido em nossos sonhos não se atualiza- de psíquica maior, os sonhos personificam dife- mento e desenvolvimento da consciência” (2007, bem como elementos essenciais com os quais sonhos constitui, segundo o autor, uma possibi- ticulado no sonho – trama de relações, cenário, inconsciente, bem como participar do fluxo de uma composição mais ampla, revela vivências, rá a não ser que seja acompanhado pelo cresci- rentes aspectos da vida e da busca do indivíduo, p. 49). O hábito de registrar e refletir sobre os este pode ter se desconectado. Todo drama ar- lidade de a consciência trazer à luz aspectos do protagonistas, plateia... – fala do indivíduo em energia que dele emana. O próprio Jung (2008) afetos e atitudes indispensáveis para a vivência orientava seus pacientes a efetuarem tais procedimentos. da individuação. Se os antigos rituais de cura ofereciam um Em sua conceituação mais simples, a espaço simbólico para restaurar ofensas, integrar cesso permanente e contínuo de tornar-se um ta-se, atualmente, que a psicoterapia constitui-se individuação, conforme Jaffe, consiste no proindivíduo consciente (2002, p. 27). Segundo o Ano I | número 1 | 2012 conteúdos e religar o humano ao divino, consta- como um novo temenos3, onde se pode integrar CONIUNCTIO Revista Científica de Psicologia e Religião | Ichthys Instituto | Curitiba - PR 42| Sonhos: possíveis ferramentas para vir a ser inteiro em psicoterapia | Franciele Engelmann | 37 - 42 diferentes aspectos da vida e estabelecer uma re- lação viva com o Self. Com base na revisão de literatura desenvolvida neste trabalho, identificou-se que as mensagens simbólicas enviadas pelo Self à noite, configuram-se como ferramentas significativas na busca de sentido e na desco- berta dos caminhos que conduzem à realização do vir a ser da totalidade humana. JUNG, C. G. O homem e seus símbolos. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1964. JUNG, C. G. A natureza da psique. Petrópolis: Vozes, 1971. Obras Completas: Vol. VIII/2. JUNG, C. G. O desenvolvimento da persona- lidade. Petrópolis: Vozes, 1998. Obras Completas: Vol. XVII. JUNG, C. G. A prática da psicoterapia. Pe- trópolis: Vozes, 2004. Obras Completas: Vol. Referências XVI/1. CHEVALIER, J.; GHEERBRANT, A. Dicio- nário de símbolos. 22ª ed. Rio de Janeiro: José JUNG, C. G. Ab-reação, análise dos sonhos, transferência. Petrópolis: Vozes, 2008. Obras Olympio, 2008. Completas: Vol. XVI/2. FOGEL, G. Da solidão perfeita. Petrópolis: MEIER, C. A. Sonho e ritual de cura: incuba- Vozes, 1999. ção antiga e psicoterapia moderna. São Paulo: GALLBACH, M. R. Aprendendo com os so- Paulus, 1999. GUGGENBÜHL-CRAIG. O arquétipo do ensão simbólica da doença. São Paulo: Sum- guiana - Revista da Sociedade Brasileira de Psi- SANFORD, J. A. Os sonhos e a cura da alma. JAFFE. L. W. A alma celebra: preparação para VON FRANZ. O caminho dos sonhos. São nhos. 2ª ed. São Paulo: Paulus, 2003. RAMOS, D. G. Psique e corpo, uma compre- inválido e os limites da cura, in: Revista Jun- mus, 1994. cologia Analítica, n. 1, 1983. 4ª ed. São Paulo: Paulus, 2007. uma nova religião. São Paulo: Paulus, 2002. Paulo: Cultrix, 1988. JUNG, C. G. Memórias, sonhos e reflexões. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1963. Ano I | número 1 | 2012 CONIUNCTIO Revista Científica de Psicologia e Religião | Ichthys Instituto | Curitiba - PR