ILSI EUROPE CONCISE MONOGRAPH SERIES NUTRIÇÃO E IMUNIDADE NO HOMEM International Life Sciences Institute SOBRE O ILSI / ILSI EUROPE Fundado em 1978, o International Life Sciences Institute (ILSI) é uma fundação internacional sem fins lucrativos voltada para promover o bem-estar das pessoas em geral pelo avanço da ciência. Seu objetivo é contribuir para um maior conhecimento das questões científicas relacionadas à nutrição, segurança alimentar, toxicologia, avaliação do risco e meio ambiente. O ILSI é reconhecido no mundo todo pela qualidade das pesquisas que promove, pelos congressos e workshops que patrocina, pelos projetos educacionais que inicia e pelas publicações que produz. É afiliado à Organização Mundial de Saúde (OMS) como uma Organização Não Governamental e goza de status de órgão consultivo especial na Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO). Reunindo cientistas do meio acadêmico, governo, setor produtivo e setor público, o ILSI promove uma busca equilibrada de soluções para problemas de saúde e meio ambiente que preocupam a todos. Sediado em Washington, DC, o instituto realiza seu trabalho por intermédio de uma rede internacional de filiais, do ILSI Health and Environmental Sciences Institute (HESI) e de sua Fundação de Pesquisas. Essas filiais estão atualmente na Argentina, Brasil, Europa, Índia, Japão, Coreia, México, Norte da África e Região do Golfo, América do Norte, Norte Andino, África do Sul, Sul Andino, Sudoeste Asiático e em um Ponto Focal da China. O ILSI Europe foi criado em 1986 com o intuito de identificar e avaliar as questões científicas relacionadas ao parágrafo acima por meio de simpósios, workshops, grupos de especialistas e também publicações, com o propósito de aprofundar a compreensão e a busca de solução para problemas científicos nessas áreas. O ILSI é mantido precipuamente pelos participantes da indústria. Esta publicação se tornou possível com o apoio da Força-Tarefa sobre Nutrição e Imunidade do ILSI Europe, sob os auspícios da Diretoria do ILSI Europe. A política do ILSI determina compulsoriamente que a Diretoria do ILSI e de suas filiais seja composta de no mínimo 50% de cientistas do setor público; os diretores restantes representam as empresas integrantes do instituto. A Diretoria do ILSI Europe e os membros da indústria participantes da Força-Tarefa sobre Nutrição e Imunidade do ILSI Europe estão indicados abaixo. Diretoria do ILSI Europe Membros que não pertencem à indústria Membros da indústria Prof. A. Boobis, Imperial College of London (Reino Unido) Prof. P. Calder, University of Southampton (Reino Unido) Prof. G. Eisenbrand, University of Kaiserslautern (Alemanha) Prof. A. Grynberg, Université Paris Sud - INRA (França) Prof. M. Kovac, Ministro da Agricultura (Coreia do Sul) Prof. em. G. Pascal, National Institute for Agricultural Research - INRA (França) Prof. G. Rechkemmer, Max Rubner-Institut – Federal Research Institute of Nutrition and Food (Alemanha) Dr. J. Schlundt, National Food Institute (Dinamarca) Prof. V. Tutelyan, National Food Institute (Reino Unido) Prof. G. Varela-Moreiras, University San Pablo-CEU de Madri (Espanha) Mr. C. Davis, Kraft Foods Europe (Suíça) Mr. R. Fletcher, Kellogg Europe (Irlanda) Dr. M. Knowles, Coca-Cola Europe (Bélgica) Dr. G. Kozianowski, Südzucker/BENEO Group (Alemanha) Dr. G. Meijer, Unilever (Holanda) Prof. J. O’Brien, Nestlé (Suíça) Prof. C. Shortt, McNeil Nutritionals (Reino Unido) Dr. J. Stowell, Danisco (Reino Unido) Dr. G. Thompson, Danone (França) Dr. P. Weber, DSM (Suíça) Membros da Força-Tarefa sobre Nutrição e Imunidade do ILSI Europe participantes da indústria Danone Institut Mérieux Nestlé Pfizer Consumer Healthcare Royal FrieslandCampina Seven Seas Südzucker/BENEO Group Unilever Yakult Europe NUTRIÇÃO E IMUNIDADE NO HOMEM Sandra Gredel 2ª edição Versão original em inglês © 2011 ILSI Europe Todos os direitos reservados. É proibido reproduzir, armazenar em sistema de recuperação e transmitir qualquer parte desta publicação, independentemente da forma ou meio, seja eletrônico, mecânico, por fotocópia, gravação ou outro, sem a autorização prévia por escrito do detentor dos direitos autorais. O ILSI Europe autoriza a fotocópia de itens para uso interno ou pessoal a bibliotecas e usuários individuais. ILSI®, “A Global Partnership for a Safer, Healthier World.®” e a imagem do logotipo com o microscópio sobre o globo, são marcas registradas do International Life Sciences Institute (ILSI), licenciadas para uso do ILSI Europe. O uso dos nomes e fontes comerciais encontrados no documento se destina exclusivamente à identificação, não implicando endosso por parte do ILSI Europe, assim como as opiniões e conclusões nele expressas são as dos autores, não representando necessariamente o ponto de vista do ILSI Europe ou das empresas que dele fazem parte. Para mais informações sobre o ILSI Europe, entre em contato com: ILSI Europe a.i.s.b.l. Avenue E. Mounier 83, Box 6 B-1200 Bruxelas Bélgica Tel.: (+32) 2 771 00 14 Fax: (+32) 2 762 00 44 e-mail: [email protected] Internet: www.ilsi.eu Impresso no Brasil ISBN 978-85-86126-40-6 ILSI BRASIL INTERNATIONAL LIFE SCIENCES INSTITUTE DO BRASIL Rua Hungria, 664 - conj.113 01455-904 - São Paulo - SP - Brasil Tel./Fax: 55 (11) 3035 5585 e-mail: [email protected] © 2012 ILSI Brasil International Life Sciences Institute do Brasil As ilustrações da capa são reproduzidas com permissão da British Society for Immunology (Sociedade Britânica de Imunologia) (sistema imune) e de Lena Jönsson (capsicum). ÍNDICE PREFÁCIO......................................................................................................................................................................................................1 INTRODUÇÃO.............................................................................................................................................................................................2 1. O SISTEMA IMUNE................................................................................................................................................................................3 1.1 Como funciona o sistema imune..............................................................................................................................................3 1.2 Principais células do sistema imune........................................................................................................................................4 1.3 O sistema imune do intestino...................................................................................................................................................6 1.4 Como se desenvolve o sistema imune.....................................................................................................................................7 2. FATORES DIETÉTICOS QUE ALTERAM A RESPOSTA IMUNE..................................................................................................9 2.1 A quantidade de energia ingerida afeta a resposta imune..................................................................................................9 2.2 A quantidade e a qualidade de gordura na dieta podem influenciar a função imune................................................10 2.3 Deficiências na ingestão de vitaminas e oligoelementos podem comprometer a resposta imune .......................... 12 2.4 Os fitoquímicos podem alterar a resposta imune.................................................................................................................1 2.5 Probióticos, prebióticos e fibra alimentar.............................................................................................................................17 3. REDUÇÃO DO RISCO DE DOENÇAS POR MEIO DE MODIFICAÇÕES NA DIETA QUE INFLUEM NO SISTEMA IMUNE ......................................................................................................................................................................................................19 3.1 Doenças inflamatórias..............................................................................................................................................................19 3.2 Infecções virais e bacterianas .................................................................................................................................................22 3.3 Alergia alimentar .................................................................................................................................................................... 23 3.4Câncer......................................................................................................................................................................................... 24 4. BENEFÍCIOS E RISCOS DA ALTERAÇÃO DA RESPOSTA IMUNE POR MEIOS NUTRICIONAIS................................... 24 5. CONCLUSÕES 6. GLOSSÁRIO........................................................................................................................................................................................... 28 7. LEITURA COMPLEMENTAR..............................................................................................................................................................30 Autora da 1ª edição: Lillian Langseth (EUA) Autora da 2ª edição: Sandra Gredel (Alemanha) Editor Científico: Bernhard Watzl, Max Rubner-Institut (Alemanha) Revisores Científicos: Philip Calder, University of Southampton (Reino Unido), Dirk Haller, Technical University of Munich (Alemanha) Editor da Concise Monograph Series: John Howlett (Reino Unido) Coordenadora: Lena Jönsson, ILSI Europe (Bélgica) Traduzido por: Just Traduções S/S Ltda. Revisor científico da versão em português: Prof. Dr. Beni Olej, D. Sc. Universidade Fluminense Nutrição e Imunidade 1 PREFÁCIO O sistema imune evoluiu como mecanismo de defesa contra infecções e danos aos tecidos, sendo essencial para a manutenção da saúde no dia a dia. É formado por elementos estruturais e celulares espalhados pelo corpo todo. Um desequilíbrio do sistema imunológico pode agravar os danos causados aos tecidos e provocar inflamação crônica e desenvolvimento de doenças alérgicas e autoimunes. O funcionamento mais apropriado da função imune1, portanto, pressupõe um delicado equilíbrio entre destruir os patógenos invasores e impedir a autodestruição. Para manter esse equilíbrio (conhecido como homeostase do sistema imunológico) e poder desempenhar suas funções, o sistema imune precisa de energia, componentes básicos e vitaminas essenciais para a produção de moléculas sinalizadoras, a proliferação celular e a síntese de moléculas efetoras, como os anticorpos. Todos esses processos são muito sensíveis a deficiências de macro e micronutrientes e explicam a conhecida associação entre subnutrição, mau funcionamento do sistema imune e maior susceptibilidade a infecções. Mais recentemente, tornou-se evidente que o sistema imunológico também é sensível a microrganismos e aos constituintes alimentare que interagem com os receptores específicos e as células do sistema imune, e que portanto, modulam suas funções. 1. No texto todo, “função imune” significa “o funcionamento do sistema imunológico”. Nossa compreensão dos mecanismos que regulam a função imune, do impacto da nutrição sobre eles e das consequências para a manutenção da saúde se expandiu em ritmo acelerado na última década. Por isso, é oportuno atualizar a última Monografia Concisa do ILSI Europe, “Nutrition and Immunity in Man”, publicado em 1999. A presente monografia é um panorama geral e atualizado da função imune, abordando elementos recém-descobertos, como as células Treg e Th17, uma síntese dos efeitos de componentes dietéticos específicos sobre a função imune, e o impacto disso tudo sobre a saúde. Nesse aspecto, foram atualizados os efeitos das vitaminas e ácidos graxos sobre a função imune, bem como os efeitos dos pre e probióticos. A monografia se propõe a servir de introdução concisa ao fascinante, porém complexo campo da nutrição e da imunidade. Temos certeza de que ela se tornará um valioso recurso para todos aqueles que se interessam pelo impacto da nutrição sobre a função imune e suas implicações para a saúde. Em nome da Força-Tarefa sobre Nutrição e Imunidade Ruud Albers Unilever 2 Concise Monograph Series INTRODUÇÃO Sabe-se desde o tempo de Hipócrates que a pessoa mal nutrida é mais suscetível a doenças infecciosas. A associação entre fome e epidemias de doenças infecciosas foi observada muitas vezes ao longo da história. A subnutrição compromete o sistema imune suprimindo a função imune, fundamental para a proteção eficiente do corpo contra infecções bacterianas e virais. A consequência desse comprometimento é um aumento tanto na incidência quanto na gravidade das infecções. Alguns vírus, por exemplo, não afetam tão gravemente crianças bem nutridas, embora sejam fatais para as mal nutridas. A ciência já sabe, desde os anos de 1960, que o sistema imune desempenha papel fundamental na relação entre má nutrição e infecção. Essa inter-relação se aplica não apenas a crianças com nutrição inadequada de países em desenvolvimento, como também a pessoas de todas as idades no mundo todo. Entre os especialmente suscetíveis estão os idosos, bebês prematuros, portadores de distúrbios alimentares, alcoólatras e vítimas de doenças debilitantes - todos eles apresentam comprometimento da função imune relacionada a problemas de nutrição. Os efeitos adversos sobre a função imune também estão presentes em alguns casos de “supernutrição” (como a obesidade ou a ingestão muito elevada de gordura total ou de determinados tipos de ácidos graxos), assim como podem estar presentes nas deficiências de micronutrientes e em desequilíbrios nutricionais. Outro foco importante da atual pesquisa é a possibilidade de promoção das funções do sistema imune de pessoas saudáveis por meios nutricionais na esperança de melhorar sua saúde. Alguns cientistas, por exemplo, estão pesquisando a possibilidade da suplementação com alguns nutrientes, como as vitaminas E e C, em concentrações acima das Recomendações Nutricionais (RDA – Recommended Dietary Allowance), ou com alimentos - como probióticos e prebióticos - proporcionar melhoras da função imune em segmentos vulneráveis da população, como os idosos, mas também na população em geral. Alimentos funcionais, que visam a melhorar ou suprimir a função imune, são vistos com cada vez mais frequência nos supermercados. Doenças como alergia, asma e doenças intestinais inflamatórias têm suas raízes em distúrbios do sistema imune, sendo que o sistema imune também está envolvido nas doenças cardiovasculares e no câncer. A evolução de todas essas doenças pode ser alterada por meio de intervenção na dieta. Nutrição e Imunidade 3 O SISTEMA IMUNE FIGURA 1 A distribuição do sistema imune O corpo humano possui um intricado sistema de mecanismos de defesa contra agentes estranhos potencialmente perigosos. Esse complexo sistema de moléculas efetoras, células e tecidos fica disperso pelo corpo todo (Figura 1). O organismo conta com vários mecanismos de defesa não específicos, como a pele e a secreção das mucosas. Quando um organismo consegue transpor essa barreira superficial, ele encontra mais dois níveis de defesa: a resposta imune inata e a resposta imune adquirida. São essas as defesas que abordamos nesta monografia e que, juntamente com suas células e órgãos específicos, costumam ser chamadas sistema imune. 1.1 Como funciona o sistema imune O sistema imune pode ser subdividido em imunidade inata e adquirida (ou adaptativa). A imunidade inata é uma primeira linha de defesa e uma resposta genérica, enquanto a adquirida é específica e requer adaptações contínuas a agentes estranhos. A principal distinção entre as duas está no tipo de célula, receptores e mecanismos envolvidos nas respostas imunes. A comunicação interna entre imunidade inata e adquirida através de receptores e mediadores específicos é a responsável pela eficiência do nosso sistema de defesa. Para realizar a tarefa de defender o organismo contra as infecções, o sistema imune conta com três recursos extraordinários: • A capacidade de distinção entre os componentes do próprio organismo e componentes invasores estranhos (muitas vezes chamada de capacidade de distinguir entre “próprio” e “não próprio”) • A capacidade de reconhecer e responder, de maneiras adenoide amígdala timo Placas de Peyer no intestino delgado apêndice vasos linfáticos baço linfonodo medula óssea O timo e a medula óssea são os tecidos de maturação das células imunes. Os linfócitos T amadurecem no timo e os linfócitos B na medula óssea. Os linfócitos migram através do sistema sanguíneo para outros tecidos imunes, como o baço, os linfonodos e os tecidos linfoides associados ao intestino (as placas de Peyer, por exemplo, encontradas no intestino delgado). específicas, a um número essencialmente ilimitado de moléculas diferentes • A capacidade exclusiva de emitir uma resposta acelerada e aperfeiçoada diante da reexposição a agentes estranhos já encontrados (ou seja, o sistema tem “memória”). 4 Concise Monograph Series FIGURA 2 Medula óssea Principais células do sistema imune Célula-tronco Sangue e linfonodos Célula T Célula B Célula exterminadora natural Tecido e linfonodos Célula dendrítica Sangue Monócito Precursor desconhecido Neutrófilo Tecido Macrófago O reconhecimento do que é próprio se dá por meio de um elaborado sistema de moléculas específicas presentes nas superfícies de todas as células do organismo. Em circunstâncias normais, as células do sistema imune não atacam as que têm esse marcador distintivo que denotam o próprio, mas qualquer encontro com determinadas moléculas marcadoras estranhas (denominadas antígenos, termo que provém de ANTIbody GENerator (gerador de anticorpos) ativa as células do sistema imune, fazendo-as subir de nível em sua resposta defensiva. Durante essa resposta, os patógenos são destruídos e seus antígenos são apresentados a células imunes imaturas, que são assim estimuladas a se diferenciar em células especializadas, equipadas com estruturas receptoras específicas que as habilita a reconhecer e interagir com seus alvos individualmente. Umas poucas dessas células especializadas, chamadas células de memória, conservam sua funcionalidade mesmo depois de terminada a resposta diante de um agente estranho e com isso, na vez seguinte em que o sistema imune encontra o mesmo antígeno, ele consegue responder de forma rápida e eficiente. Mastócitos 1.2 Principais células do sistema imune Os principais “soldados” de defesa do sistema imune são uma classe de glóbulos brancos móveis denominados leucócitos. Existem dois tipos distintos de leucócitos: fagócitos, que englobam os macrófagos, neutrófilos e células dendríticas; e os linfócitos, que englobam as células B, células T e células exterminadoras naturais (Figura 2). Os fagócitos engolfam e destroem micróbios e outras partículas. Fazem parte do sistema imune inato e englobam os monócitos/macrófagos, neutrófilos e células dendríticas. Os monócitos circulam no sangue como precursores dos macrófagos e se diferenciam em macrófagos depois de deixar a circulação e migrar para tecidos do corpo todo. Os macrófagos e os neutrófilos expressam receptores chamados Toll-like, que os auxiliam no reconhecimento de constituintes comuns a muitos patógenos (ver Quadro 1). Algumas moléculas com especificidade para patógenos se ligam a esses receptores e ativam células imunes, Nutrição e Imunidade 5 QUADRO 1 Receptores que reconhecem estruturas moleculares “estranhas” A tarefa primordial do sistema imune inato não é reconhecer todos os antígenos possíveis, mas identificar umas poucas estruturas moleculares altamente conservadas que são características de todos os microrganismos e que são reconhecidas por receptores específicos chamados receptores de reconhecimento de padrões (PRR). A estrutura desses receptores é invariável, ao contrário das estruturas extremamente diversificadas dos receptores das células B e T. Os PRRs reconhecem padrões característicos, encontrados exclusivamente em patógenos microbianos, denominados padrões moleculares associados a patógenos (PAMP), que precisam cumprir três requisitos muito importantes: • Ser expressos exclusivamente por patógenos e não por seu hospedeiro • Ser compartilhados por classes inteiras de patógenos • Ser essenciais para a sobrevivência ou patogenicidade de microrganismos Uma classe importante de PRRs é a família de receptores Tolllike. Eles reconhecem os PAMPs, como os lipopolissacarídeos encontrados em todas as bactérias Gram-negativas, no RNA de fita dupla dos vírus e em muitas outras estruturas. Assim que o PRR identifica um PAMP específico, as células efetoras corretas são lançadas para desempenhar imediatamente suas funções efetoras. Os PRRs do tipo Toll-like são um importante elo entre os sinais imunológicos e a regulação da expressão gênica associada a nutrientes, promovendo uma defesa antimicrobiana aumentada (caso da vitamina D, por exemplo). que engolfam e matam os patógenos, além de induzir a secreção de mediadores químicos, as citocinas e as quimiocinas pelos fagócitos (ver Quadro 2). Certos nutrientes, como, por exemplo, a vitamina D, mediam a ativação do receptor Toll-like pela indução da síntese de peptídeos antibacterianos dentro dos macrófagos. Células dendríticas são células de amostragem antigênica do tecido periférico, equipadas para a captura, processamento e apresentação dos antígenos às células T, que então se diferenciam em células T ativas, imunogênicas. Por causa de suas propriedades funcionais, as células dendríticas ficam situadas ao longo das superfícies corporais que demarcam a fronteira entre o corpo e o meio ambiente, como a pele e a mucosa dos tratos respiratório e gastrointestinal. QUADRO 2 Citocinas As citocinas são proteínas produzidas por vários tipos de célula, tanto imunes quanto não imunes, e afetam o comportamento de outras células. Cada citocina exerce efeitos variados sobre os diferentes tipos de célula. As citocinas produzidas por leucócitos e que exercem efeito principalmente sobre outros leucócitos são denominadas interleucinas (IL). As citocinas agem seletivamente através de seus receptores específicos situados nas células que elas afetam. A ligação com o receptor induz atividades na célula, como crescimento, diferenciação ou morte. As citocinas produzidas no início da resposta imune agem sobre outras células imunes, determinando, assim, o tipo de resposta imune desenvolvida (inflamação, produção de anticorpos). Os diferentes subgrupos dos linfócitos T em particular contribuem para a imunorregulação através de seu perfil de segregação de citocinas: • Thelper 1 (Th1): IL-2 e interferon-γ (estimulação de processos inflamatórios) • Thelper 2 (Th2): IL-4, IL-5, IL-9 e IL-13 (estimulação de produção de anticorpos) • Thelper 17 (Th17): IL-17 (mediador nas doenças inflamatórias e autoimunes) • T regulatory (Treg): IL-10, fator de crescimento-β transformante (inibição de processos inflamatórios) Quase todas as citocinas agem em concerto com outras para provocar seus efeitos fisiológicos. Além das células imunes, as citocinas também podem afetar células não imunes de tecidos, tais como os do cérebro e do fígado. As quimiocinas fazem parte da família de citocinas. Agem como proteínas quimioatraentes e estimulam a migração e a ativação de células, sobretudo fagócitos e linfócitos. Desempenham um papel fundamental nos processos inflamatórios 6 Concise Monograph Series QUADRO 3 Mais sobre células B e T Cada célula B é programada para produzir um anticorpo específico capaz de reagir com um antígeno específico, do mesmo modo que uma chave em sua respectiva fechadura. Quando encontra seu antígeno disparador, a célula B dá origem a um grande número de células filhas, que fabricam e secretam grandes quantidades do anticorpo específico que se “casa” com o antígeno. Os anticorpos se ligam às moléculas do antígeno e os processam por eliminação. Coletivamente, as células B são capazes de produzir os milhares de tipos diferentes de anticorpos que um indivíduo precisa para contra-atacar a enorme variedade de antígenos que poderá ser encontrada ao longo da vida. As células B expressam anticorpos que se ligam à membrana de sua superfície como receptores antígênicos, permitindo, assim, sua proliferação depois da interação com antígenos. Quando um determinado antígeno é encontrado pela primeira vez, as células B, que produzem o anticorpo específico, são preparadas e ativadas. Se o mesmo antígeno é encontrado de novo, as células B (células de memória) são capazes de responder produzindo grandes quantidades do anticorpo necessário com grande rapidez. As células T são outro subconjunto de linfócitos. Caracterizadas por sua capacidade de produzir citocinas ativadoras ou supressoras, elas se subdividem em células T (p.ex.: Th0, Th1, Th2, Th17) e células T reguladoras (ver Quadro 4). Um terceiro grupo de células T, as T citotóxicas, é bem equipado para matar células infectadas com vírus. Assim como as células B, as células T reagem a antígenos específicos. Sabem reconhecer antígenos através de receptores localizados em sua superfície, os receptores de células T. Parte do receptor da célula T é uma molécula específica para antígeno que se comporta como anticorpo, ligando-se ao antígeno específico. Quando o antígeno se liga, a célula T é ativada, desencadeando a cascata de reações imunes. A ativação das células Th2, por exemplo, controla a proliferação e a diferenciação das células B que se ligaram ao mesmo antígeno. As células B são uma classe de linfócitos e se originam na medula óssea. Ao serem estimuladas pelos antígenos, as células B se transformam em células produtoras de anticorpos, que por sua vez são proteínas complexas chamadas imunoglobulinas. Cada célula B produz um tipo de anticorpo, que reage especificamente com uma única variedade de antígeno. Os antígenos que estimulam as células B são normalmente moléculas proteicas (ver Quadro 3). Certas atividades das células B estão sob o controle das células T. Assim como as células B, as células T se originam na medula óssea, mas passam por importantes estágios de desenvolvimento dentro de um órgão chamado timo. Sinais específicos fazem as células T não diferenciadas se transformar em tipos funcionalmente diferentes de células T (ver Quadro 4). As células exterminadoras naturais conseguem reconhecer e exterminar rapidamente as células alvo, entre as quais se incluem células infectadas por vírus e células tumorais. Nem o reconhecimento das células alvo nem a subsequente função exterminadora das células exterminadoras naturais são regulados por mecanismos dependentes de antígenos, e sim por receptores inibidores e ativadores presentes nessas células. Os receptores são lançados pelo contato com células consideradas como células-alvo. 1.3 Sistema imune do intestino O sistema imune do intestino, ou do tecido linfoide associado ao intestino (GALT) é uma parte muito importante de nossa capacidade imunológica total. O GALT impede a passagem de bactérias e antígenos alimentares que vêm do lúmen gastrointestinal pelo epitélio da mucosa intestinal, porém, a título de informações imunológicas importantes, permite o deslocamento de quantidades mínimas de bactérias viáveis e mortas para o sistema imune sistêmico. As células imunes do intestino ficam organizadas dentro de compartimentos distintos: linfonodos, folículos linfáticos e placas de Peyer (Figura 3). Nutrição e Imunidade 7 Algumas células imunes isoladas ficam distribuídas dentro da mucosa intestinal e entre as células epiteliais. Para poder enfrentar desafios tão variados, o GALT desenvolveu pelo menos duas estratégias. A primeira é a que favorece a exclusão imune pela secreção de anticorpos que vão inibir a colonização de bactérias causadoras de doenças e evitar infecções na mucosa. A segunda é lançar mão de mecanismos que evitam a reação exagerada em relação a substâncias inócuas das superfícies mucosas. O terceiro fenômeno se chama tolerância oral e explica em grande parte por que a maioria das pessoas não apresenta reação imune adversa diante daquilo que come. Em algumas pessoas, no entanto, o sistema imune inicia uma resposta imune imprópria e exagerada diante dos alimentos, que é o que se conhece como “alergia alimentar” (ver Monografias Concisas do ILSI Europe “Food Allergy”). As bactérias inerentes também podem contribuir para a proteção das superfícies mucosais, o que se dá pela criação de um “efeito barreira” contra os patógenos, conhecido como resistência à colonização. Esse “efeito barreira” envolve diversos mecanismos, entre eles a competição por receptores e substratos metabólicos nas superfícies mucosas e a produção de fatores reguladores, como ácidos graxos de cadeia curta e bacteriocinas (proteínas antibióticas produzidas por bactérias). 1.4 Como se desenvolve o sistema imune O sistema imune não é constante e sim sujeito a várias alterações ao longo da vida da pessoa, que são induzidas por inúmeros fatores ambientais (Figura 4), ocorrendo as principais na infância e na adolescência. Como o embrião FIGURA 3 Reprodução extraída do artigo: “Modulating the intestinal immune system: the role of lymphotoxin and GALT organs”. Spahn, T.W., Kucharzik, T. 53:456-465, 2004, com permissão do BMJ Publishing Group Ltd. Tecido linfoide associado ao intestino Célula epitelial intestinal (IEC) Linfócito intraepitelial (IEL) Vasos linfáticos Lúmen intestinal Células dendríticas (DC) Linfócitos da lâmina própria Criptoplacas (CP) Células M Placa de Peyer (PP) Domo Vasos linfáticos Áreas de células T Lâmina própria Folículo linfoide isolado (ILF) Folículos de células B Linfonodo mesentérico (MLN) 8 Concise Monograph Series FIGURA 4 Fontes de variação da função imune Status do nutriente Dieta Flora intestinal Obesidade Eventos precoces da vida Genética Sexo Consumo de álcool Função imune Exercício – agudo – crônico Idade Status hormonal Fumo Exposição a patógenos (infecções) – presença – histórico em geral não se confronta com antígenos enquanto está no útero, certos aspectos do sistema imune inato e do adquirido não estão completamente amadurecidos no nascimento. A concentração de imunoglobulina no recém-nascido é baixa (com exceção da imunoglobulina G, que é transferida para o feto pela placenta) e suas células T produzem uma grande variedade de citocinas onde predominam as citocinas específicas dos linfócitos Thelper 2 (Th2), que aumentam a produção de anticorpos pelas células B. Durante o primeiro ano de vida, o padrão da citocina muda e a proporção entre citocinas Thelper 1 (Th1)/Th2 fica mais equilibrada, propiciando uma melhor resposta imune celular e a eliminação de patógenos intracelulares. Um desequilíbrio entre as citocinas Th1 e Th2 aumentaria o risco de reações autoimunes e alérgicas. Além disso, a função de barreira da mucosa intestinal e a tolerância oral contra antígenos alimentares se desenvolvem com o tempo. Nos primeiros sete anos de vida, os órgãos do sistema linfoide crescem mais depressa Histórico de vacinação Estresse – ambiental – fisiológico – psicológico do que todo o resto do corpo e depois seu tamanho relativo vai diminuindo até ficar mais ou menos como o do adulto, aproximadamente na idade de 12 anos. O sistema imune do idoso se caracteriza muitas vezes por um desequilíbrio das respostas imunes, que podem apresentar redução, deixando a pessoa mais suscetível a infecções. Por outro lado, a produção de anticorpos no idoso saudável se compara à do adulto jovem, muito embora um comprometimento na imunocompetência no idoso não se deva necessariamente a um declínio primário da função imune e sim a déficits nutricionais latentes. Por isso, o desequilíbrio nas respostas imunes do idoso pode estar associado a processos imunes cumulativos da vida toda e quaisquer alterações em termos de nutrição, atividade física e saúde em geral (Figura 4) podem contribuir ainda mais para isso. Nutrição e Imunidade 9 QUADRO 4 2. FATORES DIETÉTICOS QUE ALTERAM A RESPOSTA IMUNE Por que a resposta imune tem que ser regulada? O mesmo mecanismo de supressão imune, porém, poderia em outra situação suprimir a resposta imune necessária contra células tumorais, que também mostram propriedades em comum com as células do próprio corpo. As Recomendações Nutricionais (RDA) de cada nutriente indicam a ingestão dietética diária média considerada suficiente para atender às necessidades de praticamente todas (97-98%) as pessoas saudáveis. Para a maioria dos nutrientes, no entanto, seu papel de contribuir para uma resposta imune mais adequada não foi considerado na definição das RDA e com isso, as RDA de um nutriente específico podem não corresponder à concentração que favorece a melhor resposta imune. Consequentemente, ainda não se sabe, no caso de muitos nutrientes, se sua ingestão em concentração mais alta do que as RDA melhoraria a resposta imune. Ou, o que acontece quando frações de proteína dietética atravessam a parede intestinal e entram em contato com leucócitos intestinais? Sem mecanismos reguladores e a indução da tolerância oral, ocorreria a indução da alergia alimentar, uma resposta imune contra alimentos inofensivos. 2.1 Um consumo alto ou baixo de energia compromete a resposta imune Supõe-se que a resposta imune não pode ser forte demais. O que queremos não é matar e eliminar patógenos nocivos da maneira mais rápida e eficiente possível? Não exatamente. O que acontece quando uma célula T helper autorreativa, que escapou da eliminação no timo, entra na circulação e ataca células do corpo saudáveis? Sem a adequada supressão imune, ela proliferaria e provocaria uma resposta autoimune direcionada contra as células do próprio corpo. As células imunes que desempenham papel mais importante no controle da intensidade e da duração de uma resposta imune apropriada são as células T reguladoras, que podem ser identificadas por marcadores de superfície distintos e por um padrão específico de secreção de citocinas. A imunorregulação é um equilíbrio contínuo entre estímulo e supressão de células efetoras imunes. Há outras células que também podem estar implicadas na regulação imune, como as células B que produzem anticorpos IgA específicos para antígenos alimentares no intestino dos mamíferos. É fato conhecido que a desnutrição grave, sobretudo a desnutrição infantil debilitante, compromete fortemente a função imune. Essa desnutrição, problema que afeta principalmente os países em desenvolvimentos, aumenta substancialmente o risco de mortalidade infantil por infecção. A carência de energia de origem proteica costuma vir acompanhada da deficiência de micronutrientes, como vitamina A, vitamina E, vitamina B6, vitamina C, folato, zinco, ferro, cobre e selênio. Na desnutrição, a maioria dos mecanismos de defesa fica comprometida, mesmo que a deficiência nutricional seja apenas de gravidade moderada. Normalmente de proliferação rápida, as células T que respondem a patógenos ficam especialmente afetadas e sua quantidade sofre uma queda acentuada. A desnutrição grave e crônica leva à atrofia do timo e outros órgãos linfoides. Tanto a obesidade quanto seu tratamento parecem ter 10 Concise Monograph Series efeitos claros, mas não ainda precisamente definidos, sobre a resposta imune. Os obesos são mais sujeitos do que pessoas de peso normal a desenvolver diferentes tipos de infecção e a obesidade está associada a um maior risco de vários tipos de câncer. Além disso, moléculas produzidas especificamente no tecido adiposo (adipocinas) geram um ambiente pró-inflamatório em diferentes tecidos do corpo, o que aumenta o risco de desenvolver doenças inflamatórias crônicas. Apesar de observarmos sinais patentes do efeito prejudicial da obesidade sobre o sistema imune, não dispomos ainda de dados experimentais claros obtidos com estudos realizados com seres humanos. Alguns estudos relataram deficiência nas funções imunológicas básicas, entre elas proliferação de linfócitos, hipersensibilidade do tipo tardia e/ou impacto na maturação e na capacidade bactericida dos macrófagos. Há estudos, porém, que demonstraram não haver diferenças entre obesos e pessoas de peso normal. Assim, continuamos sem saber se a relação entre obesidade e infecção é causal ou simplesmente uma associação gerada por fatores confundidores (como o diabetes mellitus). Determinadas estratégias de redução de peso provocam alterações na capacidade do organismo de processar a resposta imune. Não temos no momento uma imagem clara das consequências da redução de peso nessas pessoas, já que existem relatos tanto de efeitos supressivos quanto estimulantes sobre várias respostas imunes. A solução dessa questão encontra ainda outro empecilho que é o número limitado de estudos e estudos com falhas de concepção (exemplo: falta de sujeitos de controle, heterogeneidade entre os diferentes métodos de perda de peso). Como a obesidade e os programas de perda de peso afetam um número cada vez maior de pessoas de sociedades abastadas e desenvolvidas, o esperado é que o impacto da obesidade e da perda intencional de peso sobre a resposta imune se acentue ainda mais no futuro. 2.2 A quantidade e a qualidade de gordura na dieta podem influenciar a função imune O alvo de grande parte da pesquisa sobre como a gordura na dieta influencia o funcionamento do sistema imune tem sido alguns tipos específicos de ácidos graxos, mas pode ser que a ingestão total de gordura também seja importante. Nos países ocidentais, a gordura normalmente contribui para 35 a 40% da ingestão total de energia. Os ácidos graxos têm várias funções nas células imunes (ver Tabela 1) e toda alteração no consumo total de gordura pode influenciar a resposta imune no homem. Um exemplo: a redução de 36% para 25% na ingestão de gordura aumenta a capacidade de resposta linfocitária e a capacidade das células exterminadoras naturais de destruir células tumorais. A gordura também é um dos principais constituintes das membranas. Os ácidos graxos se subdividem em famílias distintas que diferem entre si em termos de estrutura e origem na dieta: os saturados e os insaturados. Na estrutura dos ácidos graxos saturados (SFA) não existem ligações duplas carbono-carbono. Os que têm ligações duplas são chamados insaturados: monoinsaturados, se houver uma ligação dupla carbono-carbono, e poliinsaturados, se houver duas ou mais ligações duplas. Os poliinsaturados (PUFA) podem ainda ser classificados em duas famílias, dependendo da posição da dupla ligação: n-3 (ômega-3) e n-6 (ômega-6). Os PUFA n-3 e n-6 originais, respectivamente, ácido a-linolênico e ácido linoleico, não podem ser sintetizados pelo homem e têm de ser supridos pela dieta, sendo, portanto, considerados ácidos graxos essenciais. O PUFA n-6 original, ácido linoleico, é encontrado basicamente nos óleos vegetais, como o óleo de milho e o óleo de girassol, enquanto o ácido a-linolênico, o PUFA n-3 original, é encontrado nos óleos de linhaça, canola e soja. Para influenciar o sistema imune, os compostos originais Nutrição e Imunidade 11 Tabela 1 Quadro 5 Papel dos ácidos graxos nas células imunes Eicosanoides Ácidos graxos: • São precursores dos eicosanoides e outros mediadores de lipídeos Os eicosanoides pertencem a uma família de hormônios derivados de ácidos graxos poliinsaturados de cadeia longa associados à membrana celular (LCPUFA) e são formados, por exemplo, por prostaglandinas e leucotrienos. O tipo de ácido graxo poliinsaturado (PUFA) da membrana celular é influenciado pela gordura na dieta. Grande variedade de atividades biológicas foi atribuída aos eicosanoides, como a modulação da intensidade e da duração das respostas inflamatórias imunes. têm de ser convertidos em derivados de cadeia longa (LCPUFA): ácido araquidônico (AA), da família n-6, e ácidos eicosapentaenoico (EPA) e docosa-hexaenoico (DHA), da família n-3. O principal precursor dos eicosanoides é o LCPUFA n-6, ácido araquidônico, mas as duas classes de LCPUFA, n-6 e n-3, competem na formação dos eicosanoides, resultando em diferentes famílias de prostaglandinas, leucotrienos e outros hormônios que atuam sobre os tecidos. O PUFA n-3 suprime ainda a produção dos eicosanoides derivados do PUFA n-6. • Fornecem energia às células imunes • São componentes dos fosfolipídios da membrana celular e afetam a estrutura e o funcionamento da membrana • Regulam a expressão gênica, por exemplo, por meio de processos de sinalização O ácido linoleico dietético é rapidamente convertido em AA, mas a conversão do ácido a-linolênico em EPA e DHA é limitada. Existem, porém, boas fontes dietéticas de EPA e DHA pré-formados, como o óleo de peixe. As prostaglandinas derivadas do LCFUFA n-6 (p.ex.: prostaglandina E2) parecem exercer funções reguladoras decisivas sobre vários tipos de células imunes. Em concentração baixa, acredita-se que a prostaglandina E2 seja necessária para certos aspectos da imunidade, mas em concentração mais alta, várias funções das células imunes são suprimidas. O conteúdo desses precursores da prostaglandina nas membranas celulares pode ser modificado pela alteração da composição de PUFA na dieta, influenciando assim a quantidade de prostaglandina E2 produzida. Uma vez incorporado à membrana das células imunes, o LCPUFA pode ser convertido em hormônios que agem sobre os tecidos, denominados eicosanoides, uma família de reguladores biológicos que engloba as prostaglandinas e os leucotrienos (ver Quadro 5). Dependendo do tipo de PUFA presente na dieta, principalmente da quantidade de LCPUFA n-3, as células imunes produzem diferentes quantidades e espécies de eicosanoides, que exercem efeitos muito diferentes sobre a resposta imune. Além disso, os LCPUFAs parecem ser ligantes naturais de uma certa classe de fatores da transcrição antiinflamatória chamados receptores de peroxissoma ativados por proliferadores. Os ácidos graxos são importantes para o funcionamento do sistema imune porque também afetam a fluidez das membranas, que diminui com o comprimento da cadeia e aumenta com o grau de insaturação dos ácidos graxos incorporados. A fluidez é importante para a expressão das estruturas da superfície celular, como os receptores, que desempenham papel fundamental na função imune. Em geral, dietas ricas em PUFA n-3 acabam inibindo o excesso de resposta imune associado a doenças inflamatórias crônicas, como a artrite reumatoide. No entanto, as respostas imunes necessárias para a proteção contra os patógenos parecem não ser prejudicadas. A dieta rica em PUFA n-6 exerce efeitos diversos sobre as respostas imunes, entre elas respostas pró- e anti-inflamatórias. 12 Concise Monograph Series QUADRO 6 Avaliação da situação imune De modo geral, os estudos realizados até agora sobre função imune e nutrição humana se concentraram quase que exclusivamente nas células imunes que circulam no sangue. A desvantagem é que elas só correspondem a 2% do total de células imunes e, portanto, podem não oferecer uma imagem inteiramente representativa do quadro, sem contar que as células imunes associadas ao intestino normalmente não ficam acessíveis no homem. Atualmente, não há um marcador único que permita tirar conclusões sobre o funcionamento do sistema imune como um todo. Marcadores selecionados podem ser indicativos de aspectos específicos da função imune (p.ex., resposta a vacinas para conferir resistência a infecções), mas a avaliação global das alterações introduzidas pela dieta sobre o funcionamento do sistema imune requer uma metodologia extremamente cuidadosa, voltada para um espectro de marcadores. Teoricamente, as medidas imunes usadas como biomarcadores deveriam ser biologicamente relevantes e sensíveis, além de viáveis sob condições normais de estudo. Com base nesses critérios, um grupo de especialistas recentemente classificou os marcadores imunológicos em três categorias: Alta conformidade: Os marcadores dessa categoria são considerados altamente convenientes porque medem uma resposta in vivo integrada diante de um desafio imune. Os marcadores que pertencem a essa categoria são a produção de anticorpos séricos específicos das vacinas, a resposta de hipersensibilidade de tipo tardia, a concentração de imunoglobulina secretora A (sIgA) em fluidos relevantes e a resposta a patógenos atenuados. Média conformidade: Quando não é possível a aplicação de marcadores de categoria “alta”, existem diversos marcadores ex vivo à disposição, que permitem a compreensão mecanicista do efeito de uma intervenção. Os marcadores abrangem atividade das células exterminadoras naturais e explosão oxidativa do fagócito. A combinação de proliferação de células T, expressão de marcadores da ativação das células T e produção de citocinas chave pode ser aplicada na avaliação da função do linfócito T. A medida da produção do anticorpo antígeno-específico serve para avaliar a função das células B. Baixa conformidade: Alguns marcadores ex vivo são considerados de baixa conveniência, em grande parte por causa da falta de uma associação clara entre uma alteração no marcador e uma alteração na susceptibilidade a infecções. A combinação de marcadores de alta e média estabilidade é atualmente a melhor maneira de medir a imunomodulação nos estudos de intervenção de nutrição humana. 2.3 Uma deficiência na ingestão de vitaminas e microminerais pode comprometer a resposta imune Está demonstrado que a deficiência de vários micronutrientes reduz a resposta imune, conforme sintetizado na Tabela 2. Alguns métodos usados para medir respostas no sistema imune são discutidos no Quadro 6. Vitamina A A vitamina A da dieta ocorre principalmente no fígado, na gema do ovo e no leite. Certos carotenoides (ver Seção 2.4) encontrados nas verduras, legumes e frutas podem ser convertidos no organismo em vitamina A. A deficiência de vitamina A é rara nas sociedades ocidentais, mas constitui um importante problema de saúde pública em muitas partes dos países em desenvolvimento. Médicos e cientistas sabem há centenas de anos que o distúrbio do “olho seco”, causado por deficiência de vitamina A, está ligado à alta morbidade e mortalidade em virtude de doenças infecciosas. Mais recentemente, testes clínicos feitos em países em desenvolvimento mostraram que a suplementação com essa vitamina reduz a mortalidade infantil em 30%, consistindo em uma das intervenções de melhor relação custo/benefício para a melhoria da saúde pública. Tais testes indicaram ainda que a suplementação com vitamina A reduz a gravidade das doenças diarreicas na infância. Porém, testes clínicos feitos com suplementação com vitamina A em crianças com infecção respiratória viral mostraram resultados duvidosos e deveriam ser melhor investigados. É importante também considerar a toxicidade da vitamina A quando dada como suplemento. É muito mais seguro aumentar o consumo de alimentos ricos nessa vitamina. Para poder se desenvolver normalmente e para o bom funcionamento de seus muitos tipos de células sanguíneas, entre elas os linfócitos, o organismo precisa de um suprimento adequado de vitamina A. Na deficiência de vitamina A, a quantidade dessas células pode cair, provo- Nutrição e Imunidade 13 Tabela 2 Efeitos da deficiência ou insuficiência de micronutrientes ou substâncias fitoquímicas sobre a resposta imune Micronutriente Efeitos da deficiência ou insuficiência Vitamina A Perda da função de barreira da mucosa epitelial Comprometimento da função dos neutrófilos e macrófagos Diminuição na quantidade de células exterminadoras naturais e da atividade lítica Vitamina D Diminuição da resposta dos anticorpos Diminuição da produção de peptídeos bacterianos Vitamina E Comprometimento da imunidade mediada por células B e T Vitamina B6 Aumento no dano oxidativo na membrana de células imunes Diminuição da capacidade de resposta dos linfócitos Vitamina C Comprometimento da produção de anticorpos Diminuição da resistência a infecções Zinco Comprometimento da proliferação de células T Comprometimento do desenvolvimento das células T Comprometimento da capacidade de resposta dos linfócitos Selênio Diminuição da resistência a infecções Aumento do dano oxidativo na membrana das células imunes Diminuição da produção de citocinas Diminuição da resistência a vírus Carotenoides Diminuição da produção de anticorpos Diminuição da atividade das células exterminadoras naturais Diminuição da produção de citocinases Flavonoides Comprometimento da função dos fagócitos Efeitos imunomoduladores cando anormalidades em seu funcionamento. Em períodos de deficiência de vitamina A, pode ocorrer também alteração nas redes de citocinas, que influenciam respostas imunes, com possível modificação da resposta dos anticorpos diante dos antígenos. Outras consequências da deficiência de vitamina A são o comprometimento da integridade do revestimento dos tratos pulmonar, gastrointestinal e urinário, ficando assim mais fácil para as bactérias patogênicas penetrar a barreira epitelial e provocar infecções mais graves e inflamações mais exacerbadas. Um exemplo: a suplementação com vitamina A limita a diarreia, restaurando a integridade intestinal. Foi demonstrado recentemente que o ácido retinoico, um metabólito da vitamina A, é produzido exclusivamente por células imunes intestinais, mas não do mesmo tipo de célula imune de outros órgãos linfoides. Esse ácido direciona a migração de células T antígeno-específicas da periferia de volta para o intestino, onde encontraram seu antígeno pela primeira vez. São, portanto, dados que confirmam a importância de uma ingestão adequada de vitamina A para a regulação dos processos imunes que ocorrem no intestino. 14 Concise Monograph Series Vitamina D A vitamina D é um hormônio e seu precursor pode ser sintetizado na pele pela exposição à luz solar. Esse precursor é metabolizado primeiramente no fígado e depois no rim, onde adquire a forma biologicamente ativa de vitamina D, mas fatores como latitude, estação do ano, pigmentação da pele, envelhecimento e protetor solar contribuem para diminuir a produção de vitamina D cutânea. Algumas fontes dietéticas do precursor da vitamina D são óleo de peixe, óleo de fígado de bacalhau e gema de ovo. Estima-se que um bilhão de pessoas no mundo todo tenham deficiência ou insuficiência de vitamina D. Nas últimas décadas, observações acumuladas indicaram que quem tem deficiência de vitamina D sofre com infecções respiratórias mais frequentes e mais graves do que quem tem concentração adequada de vitamina D no plasma. A incidência frequente de infecções respiratórias no inverno pode ser causada por uma deficiência de vitamina D, já que a radiação solar em latitudes acima de 45° é consideravelmente mais baixa no inverno do que no verão. A vitamina D é um importante regulador do sistema imune. Seus receptores ocorrem na maioria das células do corpo, inclusive nas células imunes. As células do fígado e do rim e os macrófagos possuem a capacidade enzimática de sintetizar a forma biologicamente ativa de vitamina D. O interessante é que a estimulação de receptores Toll-like nos macrófagos promove a conversão do precursor da vitamina D para a forma ativa e a expressão do receptor da vitamina D. A vitamina D dos macrófagos regula a produção de um antibiótico endógeno chamado catelicidina e modula o padrão de secreção de citocinas. Ambas, catelicidina e citocinas aumentam a defesa contra patógenos. Obviamente, a vitamina D é um elo chave entre a ativação do receptor Toll-like e as respostas antibacterianas da imunidade inata. Alguns resultados de estudos epidemiológicos e clínicos sugerem ainda um menor risco de determinados tipos de doença autoimune quando o status de vitamina D sérica é mais alto. Depois muitos estudos voltados para determinar se as RDA da vitamina D eram adequadas para a população em geral, o Institute of Medicine acabou aumentando o valor para 600 UI no fim de 2010. Vitamina E A vitamina E ocorre em grande variedade de alimentos de origem vegetal. Alguns óleos vegetais, como os de germe de trigo, de milho e de soja são especialmente ricos em vitamina E. Há estudos experimentais mostrando que a deficiência de vitamina E compromete vários aspectos da resposta imune, entre eles a imunidade mediada por células B e T. Uma característica pouco comum da vitamina E é que ela é um dos poucos nutrientes para os quais a suplementação em concentração muito acima da recomendada contribui positivamente para certos aspectos da função imune. Levando em conta apenas testes controlados realizados com humanos, a vitamina E em concentração alta parece melhorar a resposta imune celular e diminuir a produção da prostaglandina E2 nos idosos. Uma vez que concentrações muito altas de prostaglandina E2 inibem a função e a proliferação das células T, esse fato, aliado à prevenção do dano oxidativo da membrana das células imunes, poderia ser uma explicação mecanicista para o aumento da função imune com suplementação de vitamina E nos idosos. No entanto, os efeitos da suplementação com vitamina E se mostraram variáveis e dependentes do nível de ingestão de vitamina E, da dose, da idade, fumo, condições de moradia etc. Talvez por essa a razão não tenha sido possível demonstrar o efeito protetor da vitamina E contra infecções no trato respiratório nos idosos em testes controlados randomizados. Vitamina B6 A vitamina B6 está amplamente distribuída nos alimentos, sendo suas fontes mais ricas as aves, peixes, fígado, cereais e grãos de leguminosas. Sabe-se desde a década de 1940 que deficiências de vitamina B6 debilitam a função imune. Esse efeito não surpreende, já que a vitamina B6 é essencial para grande variedade de reações necessárias para a síntese e o metabolismo de aminoácidos (componentes Nutrição e Imunidade 15 unitários das proteínas) e, durante a resposta imune, a necessidade de síntese proteica é maior. Estudos feitos com seres humanos demonstram que a defi­ ciência de vitamina B6 compromete a produção de anticorpos e a atividade das células T. O crescimento e a maturação dos linfócitos também sofrem alteração, assim como cai a atividade das células exterminadoras naturais. Embora a suplementação de vitamina B6 corrija tanto a deficiência quanto essa queda de imunidade, doses acima das RDA não produzem benefícios a mais em adultos saudáveis. Vitamina C As principais fontes dietéticas de vitamina C são frutas, legumes e verduras. Assim como a vitamina E, a vitamina C é um antioxidante, mas ao contrário da vitamina E, a vitamina C é uma substância solúvel em água encontrada nos líquidos do corpo, e não nos lipídios e membrana celulares. A vitamina C age como principal antioxidante da fase aquosa e reforça os efeitos de outros antioxidantes, como a vitamina E, pela regeneração de suas formas ativas depois de reagirem com radicais livres. Os mecanismos pelos quais a vitamina C afeta o sistema imune não estão bem esclarecidos. Devido à sua atividade antioxidante, pode ser que ela proteja as células imunes do dano oxidativo e que alguns órgãos apresentem concentração de vitamina C muito mais elevada do que a do sangue. Um desses órgãos é o timo, que desempenha papel crucial na imunidade mediada pelas ações dos linfócitos T. A vitamina C também é encontrada em elevada concentração nas células imunes, mas essa concentração cai rapidamente durante as infecções. Ela modula as funções dos fagócitos, a proliferação de linfócitos T, a produção de citocinas e a expressão gênica das moléculas de adesão dos monócitos. Alguns estudos feitos com animais indicam que, na deficiência de vitamina C, as respostas imunes são anormais diante de infecções. De modo particular, a vitamina C desempenha um papel muito importante na função dos fagócitos e, quando esse funcionamento fica debilitado, o mesmo acontece com a resposta às infecções. Por isso, a possibilidade de que altas doses de vitamina C (1 g/dia ou mais) de fato previnam alguns tipos de infecção, sobretudo respiratórias, atrai grande interesse, que se deve, principalmente, à propagação da alta ingestão de vitamina C por Linus Pauling. Já se realizou um grande número de testes controlados com pessoas voluntárias para avaliar o efeito da vitamina C no resfriado e eles mostram que quem consome regularmente 200 mg/dia ou mais de vitamina C costuma sofrer um pouco menos com resfriados (cerca de 10%) do que quem não consome. A suplementação com vitamina C, porém, não afeta a incidência de resfriados na população normal; a redução na incidência de resfriados pela suplementação com vitamina C é observada apenas nas pessoas que praticam atividades físicas muito extenuantes (maratonistas, por exemplo) ou expostas a ambientes subárticos. Zinco As principais fontes dietéticas de zinco são a carne, os laticínios, frutos do mar e cereais. As células do sistema imune contêm um grande número de enzimas que precisam de zinco para funcionar e não admira que a deficiência de zinco afete profundamente a função imune. A deficiência de zinco é muito comum em muitas partes do mundo. Nessas populações, sua suplementação diminui a morbidade e a mortalidade infantil, diminuindo seu risco de contrair diarreia e infecções respiratórias agudas. No homem, a deficiência moderada de zinco induzida experimentalmente afetou as funções das células T e provocou um desequilíbrio entre as subpopulações de células T, queda na produção de citocinas (interleucina-2, interferon-γ) e atenuação na atividade das células exterminadoras naturais. A deficiência de zinco nos idosos também está associada a uma debilitação na resposta imune, que pode ser restaurada pela suplementação de zinco. Por outro lado, uma análise sistemática de testes clínicos publicados concluiu que atualmente não há sinais convincentes de que o zinco seja eficaz no tratamento do resfriado. 16 Concise Monograph Series Existem várias maneiras pelas quais a deficiência e a suplementação de zinco afetam o sistema imune. Em primeiro lugar, o zinco é necessário para a atividade biológica da timulina, um hormônio específico do timo que promove as funções das células T, como a citotoxicidade e a produção de citocinas. Em segundo lugar, o zinco afeta as vias de transdução do sinal que controla a expressão gênica de várias citocinas imunorreguladoras. Por último, o zinco é um cofator de várias enzimas envolvidas nas respostas antioxidantes que contribuem para um menor dano oxidativo nas células imunes. É fato conhecido que a ingestão de zinco duas vezes maior que a recomendada por dia não exerce efeitos negativos sobre o sistema imune de adultos saudáveis, mas em quantidade superior a essa, o zinco pode comprometer a imunidade. Selênio O selênio dietético ocorre em alimentos ricos em proteína, como carne, peixe, frutas secas e sementes. Trata-se de um elemento essencial para a resposta imune mais adequada e que influencia tanto o sistema imune inato quanto o adquirido, desempenhando papel fundamental no equilíbrio de oxidação-redução, inclusive na proteção do DNA. O selênio é também importante cofator de um grupo de enzimas que contribuem para proteger as células de dano oxidativo. Como os fagócitos geram grandes quantidades de espécies de oxigênio reativo, o selênio pode ser um fator na proteção dos fagócitos contra o excesso desses oxidantes. Porém, a avaliação dos efeitos diretos do selênio é difícil por causa das interações entre o selênio e outro antioxidante, a vitamina E. Foi feito um estudo com homens saudáveis, com ingestão baixa de selênio, que receberam selênio suplementar durante várias semanas. Essa suplementação de selênio (50 e 100 μg/dia) melhorou a resposta imune celular, sem alteração das respostas imunes humorais, e provocou também uma eliminação mais rápida da vacina contra pólio com vírus vivos atenuados. Os dados apresentados sugerem que uma ingestão mais alta de selênio contribuiria para uma melhora da função imune, com redução da morbidade e mortalidade causadas por várias infecções virais. São exemplos o HIV, a pólio e a doença de Keshan (que afeta o músculo cardíaco). A última é endêmica em algumas partes da China e parece se dever a uma conjugação de infecção pelo vírus Coxsackie e deficiência de selênio e vitamina E na dieta. A doença foi praticamente erradicada na China por suplementação de selênio, muito embora o vírus presumivelmente ainda esteja presente no meio ambiente. Outros sais minerais Além do zinco e do selênio, outros sais minerais e oligoelementos são importantes para o funcionamento normal do sistema imune, tais como o ferro, cobre, magnésio e manganês. O ferro é um exemplo de nutriente que não é necessário apenas para uma resposta imune adequada, mas também para o crescimento ótimo dos patógenos. Se a função imune não estiver sendo afetada pela deficiência de ferro, a suplementação desse elemento só chegará a beneficiar as bactérias patogênicas, devendo ser considerada apenas caso a caso. 2.4 Os fitoquímicos podem alterar a resposta imune O progresso da pesquisa em nutrição na última década sugere claramente que, além dos nutrientes essenciais, alguns constituintes não nutritivos, como os fitoquímicos, têm forte impacto sobre a saúde humana. Essas substâncias fitoquímicas são representadas por inúmeras substâncias diferentes entre si do ponto de vista químico. Até agora se investigou principalmente o potencial imunomodulador dos carotenoides e flavonoides. Carotenoides Os carotenoides são compostos amarelos, alaranjados e vermelhos encontrados nas frutas, verduras e legumes. São exemplos o β-caroteno, amplamente distribuído Nutrição e Imunidade 17 nos vegetais, e o licopeno, um carotenoide encontrado no tomate. Da mesma forma que as vitaminas C e E, os carotenoides são antioxidantes e, além disso, o β-caroteno é um precursor da vitamina A. Apesar de alguns estudos com animais terem demonstrado claramente um efeito positivo do β-caroteno sobre o sistema imune, os resultados obtidos com estudos realizados com humanos são inconsistentes. Há estudos epidemiológicos sugerindo que dietas ricas em carotenoides reduzem o risco de infecções respiratórias. A ingestão dietética elevada de carotenoide está ainda inversamente associada a marcadores inflamatórios, sugerindo que os carotenoides têm atividade anti-inflamatória. Existem estudos demonstrando que a suplementação de β-caroteno pode ser benéfica para quem está com o sistema imune comprometido. Em particular, observou-se que a atividade diminuída de células exterminadoras naturais em idosos se recuperou e voltou ao normal depois da suplementação do β-caroteno. E em voluntários com baixa ingestão de carotenoides, uma alimentação rica em β-caroteno ou carotenoides promoveu a melhora de várias respostas imunes. Por outro lado, em adultos saudáveis com ingestão adequada de carotenoides e respostas imunes normais, a suplementação com alimentação rica em carotenoides não melhorou a modulação das respostas imunes. O mais importante é que, embora os mecanismos secundários não sejam ainda conhecidos, os carotenoides podem exercer efeitos imunomoduladores no homem. E a quantidade adequada para ingestão e as diferenças no potencial imunomodulador dos vários carotenoides também não são ainda conhecidos. Flavonoides Os flavonoides ocorrem em todos os alimentos de origem vegetal e englobam milhares de compostos com estruturas químicas bem definidas. São responsáveis pelas cores vermelha e azul de todos esses alimentos e também pelo sabor característico de alguns vegetais. Os dados experimentais e clínicos até agora são muito raros e o interessante é que a maioria dos estudos in vitro sugere que os flavonoides provocam efeitos imunossupressores. Os dados clínicos de um teste de intervenção humana sugeriram que um subgrupo dos flavonoides, as antocianinas, possui atividade antiinflamatória em doses dietéticas relevantes (equivalentes à ingestão de 100 g de mirtilo). Alguns estudos moleculares indicaram que os flavonoides interferem na transdução do sinal de células imunes, mas é importante saber que, nesses testes, eles são aplicados em concentração com muito pouca probabilidade de ser atingida no corpo humano depois de uma refeição rica em flavonoides. Mesmo assim, essas substâncias fitoquímicas têm grande potencial para modular respostas imunes e merecem ser mais estudados em seres humanos. 2.5 Probióticos, prebióticos e fibra alimentar As bactérias do intestino desempenham papel importante em várias funções relacionadas à digestão dos alimentos e o estabelecimento e manutenção da barreira da defesa imune do intestino. Elas são o primeiro estímulo do sistema imune intestinal e são necessárias para o desenvolvimento imune normal. Quando o equilíbrio dos organismos que habitam o intestino é perturbado ou alterado por doença ou pelo uso de antibióticos, as defesas imunes locais ficam debilitadas. Por definição, probiótico é um microrganismo vivo que, quando administrado em quantidade correta, confere benefícios em termos de saúde ao hospedeiro. Outras opções complementares aos probióticos que vêm sendo investigadas são os prebióticos e os simbióticos. O prebiótico é um constituinte alimentar fermentável seletivamente não digerível que afeta o hospedeiro pela estimulação seletiva do crescimento e/ou atividade de alguma ou de um número limitado de bactérias do intestino grosso, conferindo benefícios para o bem-estar 18 Concise Monograph Series e saúde do hospedeiro. O simbiótico é uma mistura de probióticos e prebióticos cuja finalidade é estabelecer e aumentar a sobrevida de bactérias que fazem bem à saúde. Probióticos Os organismos probióticos são encontrados em alimentos fermentados, entre os quais os iogurtes e os novos tipos de leite fermentado elaborados especificamente para conter bactérias benéficas para a saúde. Os organismos incluídos nos probióticos comerciais são, principalmente, bactérias ácido láticas dos gêneros Lactobacillus e Bifidobacteria. Pelo fato de esses organismos só colonizarem tempo­ra­ riamente o trato intestinal, seu consumo regular pode ser necessário. Tanto a resposta imune inata quanto a adquirida podem ser moduladas por probióticos de maneira dependente da cepa e da dose. Há várias maneiras pelas quais os probióticos afetam o sistema de defesa de seu hospedeiro. Uma é contribuindo para o “efeito barreira” das bactérias intestinais, o que cria um ambiente hostil para certas bactérias patogênicas. Uma outra está relacionada aos produtos metabólicos secretados pelas bactérias ácido láticas, como as bacteriocinas e o próprio ácido lático, que inibe o crescimento de organismos patogênicos. Determinadas cepas probióticas também aderem à parede epitelial do intestino, impedindo assim as bactérias patogênicas de aderir aos mesmos receptores, ou então competindo com os patógenos por nutrientes de oferta limitada. Existe ainda uma outra maneira pela qual os probióticos promovem a saúde, que é alterando o sistema imune no local (intestino) e no nível sistêmico. A interação direta entre probióticos e células imunes parece ser mediada via sinalização de receptor Toll-like (Quadro 1). Já foi relatada com frequência em vários sistemas experimentais uma alteração da função imune depois da ingestão de alguns probióticos específicos. Exemplo: os probióticos podem contrabalançar o aumento da permeabilidade do intestino que ocorreria depois da exposição a antígenos estranhos, como os vírus. Foram também observados efeitos imunomoduladores cepa-específicos em seres humanos. Em cada cepa, estão presentes diferentes subclasses com atividades imunomoduladoras específicas. Entre os marcadores imunológicos que respondem a probióticos estão a fagocitose e a produção de anticorpos, mas não foram estudados os efeitos de longo prazo da suplementação de probióticos. Os probióticos podem ser de grande valor na prevenção e tratamento de vários quadros clínicos que envolvem populações anormais de micróbios do intestino e mau funcionamento de respostas imunes. São exemplos de situações nas quais os probióticos podem ser benéficos: a diarreia aguda causada por rotavírus, doenças intestinais inflamatórias e doenças alérgicas, caso em que um número limitado de probióticos demonstrou exercer efeito benéfico em subpopulações específicas de sujeitos alérgicos. Em suma, o potencial imunomodulador de probióticos específicos está agora demonstrado com clareza. Porém, ainda não se sabe se e como as alterações observadas na função imune estão relacionadas a efeitos de saúde. Em muitos estudos, só foram medidos os sintomas e pouco se sabe sobre os mecanismos imunológicos que estão por trás deles. É importante lembrar que, assim como as diferentes vitaminas não provocam os mesmos efeitos, os efeitos das diferentes cepas probióticas também são diferentes, e essa é a razão pela qual conclusões gerais sobre os probióticos não são muito significativas. A natureza das interações entre probióticos individuais e células e tecidos imunes no intestino continua sendo assunto de intenso debate. Prebióticos e fibra alimentar Os prebióticos estão presentes na dieta normal e costumam ser ingeridos na concentração de 2 a 10 g/ dia, consistindo na inulina, frutooligossacarídeos, galactooligossacarídeos e lactulose. Eles alteram a Nutrição e Imunidade 19 composição da microbiota intestinal, aumentando nelas a proporção de bifidobactérias e lactobacilos. O termo fibra alimentar se refere a constituintes como a celulose e o amido resistente, e inclui alguns prebióticos. O que os prebióticos e as fibras alimentares têm em comum é o fato de não serem hidrolisados no intestino delgado e chegarem ao cólon. Lá, servem de fonte de energia e carbono para a microbiota colônica, aumentando assim a massa bacteriana do intestino. Certos ácidos graxos de cadeia curta, como por exemplo o butirato, são subprodutos da fermentação bacteriana no intestino e provocam um efeito benéfico sobre as células intestinais. Em alta concentração, melhoram os sintomas de doenças intestinais inflamatórias, inibindo, por exemplo, a produção de citocinas pró-inflamatórias. Há estudos, tanto com animais como com pessoas, segundo os quais os prebióticos aumentam especi­ficamente o número de microrganismos do cólon intestinal. Juntamente com essas alterações, os prebióticos melhoram as respostas imunes contra patógenos e reduzem as respostas inflamatórias em modelos animais de doenças intestinais inflamatórias. Eles porém afetam principalmente o sistema imune associado ao intestino, que é difícil de estudar no ser humano. Foi demonstrado que uma mistura de prebióticos diminui muito a incidência de dermatite de contato em bebês atópicos, sugerindo que esses prebióticos alteram o desenvolvimento imune pós-natal. A mesma mistura de prebióticos também aumentou a concentração fecal de anticorpos em crianças alimentadas com leite em pó. Resumindo: a composição e a atividade da microbiota intestinal pode ser alterada pela ingestão de probióticos, prebióticos e fibra alimentar. Basicamente, pode-se esperar um aumento no número de lactobacilos e bifidobactérias, aumentando a imunidade do intestino e afetando todo o sistema imune. Além desses efeitos indiretos, pode ser que os probióticos, prebióticos e seus produtos de degradação afetem diretamente o sistema imune. 3. REDUÇÃO DO RISCO DE DOENÇAS POR MEIO DE MODIFICAÇÕES NA DIETA QUE INFLUEM NO SISTEMA IMUNE Tem-se pesquisado ativamente como modificações dietéticas que influenciam o sistema imune podem contribuir pra reduzir o risco ou melhorar o controle de várias doenças, como vários quadros inflamatórios, infecções virais e bacterianas e alergias alimentares. 3.1 Doenças inflamatórias Muitas doenças são originalmente causadas ou acompanhadas de inflamação crônica. As mais comuns estão na Tabela 3. Existem evidências de que a dieta afeta a patogênese dessas doenças e os candidatos mais promissores são os LCPUFA n-3, boas fontes dos quais são o óleo de peixe e peixes oleosos, como a cavala, o arenque, o salmão e o atum fresco. O LCPUFA da membrana da célula pode servir de fonte dos hormônios tissulares, como as prostaglandinas e os leucotrienos. Quando derivados do LCPUFA n-3, exercem efeito antiinflamatório, além de mudar o padrão de moléculas de sinalização como as citocinas, envolvidas na patogênese de doenças inflamatórias crônicas. Padrões alimentares com alta ingestão de verduras, legumes e frutas também estão inversamente associados ao risco de inflamação crônica, fora o fato de existirem ainda indícios apontando para o potencial anti-inflamatório da vitamina C, vitamina E, selênio e flavonoides. Uma baixa concentração sérica desses nutrientes está correlacionada a um maior risco de doença cardíaca, asma e artrite reumatoide. 20 Concise Monograph Series Tabela 3 Exemplos de doenças de fundo inflamatório Doenças Características Obesidade/síndrome metabólica Aterosclerose Produção de citocinas pró-inflamatórias, como a TNF-α e a IL-6, pelo tecido adiposo Asma Inflamação crônica da mucosa pulmonar acompanhada de contração da musculatura lisa nos brônquios Doença inflamatória das artérias que ocasiona a deposição arterial de placas Dermatite de contato e psoríase Doenças cutâneas inflamatórias caracterizadas por diferenciação das células T em direção ao fenótipo Th2 (dermatite de contato) ou falência dos processos regulatórios durante a inflamação (psoríase) Artrite reumatoide Doença autoimune caracterizada por inflamação crônica da membrana sinovial das articulações Doença de Crohn e colite ulcerativa Doenças intestinais inflamatórias caracterizadas por inflamação aguda ou crônica do intestino Doença cardíaca Inúmeros fatores ligados a dietas foram correlacionados ao aumento ou diminuição do risco de doença cardíaca. A aterosclerose é a principal causa de mortalidade causada por doença cardíaca. É uma doença inflamatória das artérias que ocasiona a deposição de placas arteriais. O sistema imune está envolvido na patogênese da aterosclerose pela interação entre seus glóbulos brancos (monócitos e macrófagos) e células da parede arterial. Fatores ligados à dieta influenciam os processos imunológicos envolvidos na patogênese da aterosclerose. Alguns estudos epidemiológicos e clínicos indicaram que o risco de doença cardíaca diminui com uma maior ingestão de PUFA e antioxidantes dietéticos (vitamina C, vitamina E). O LCPUFA n-3 pode inibir o desenvolvimento de aterosclerose pelo bloqueio da produção de citocinas, as quais promovem a inflamação (ver Quadro 7), e de outras substâncias que têm participação no complexo processo da inflamação local e da lesão arterial que leva à formação de placas. Embora os antioxidantes suplementares, como a vitamina E, melhorem a resposta imune em subgrupos de idosos, estudos controlados randomizados mostram que os suplementos de vitamina E não diminuem o risco de doença cardíaca. Indícios fornecidos por estudos populacionais revelaram que uma ingestão muito alta de legumes, verduras e frutas está inversamente associada ao risco de doença cardíaca. Junto com esse padrão alimentar, um número menor de marcadores da inflamação foi observado nesses estudos. Nutrição e Imunidade 21 QUADRO 7 A resposta inflamatória A inflamação é a resposta do corpo diante da entrada de agentes infecciosos, de lesão física ou do contato com antígenos (alérgenos na pele, por exemplo). O aporte de sangue para o local aumenta, permitindo que as células imunes e outras substâncias protetoras acessem melhor a área atingida. A inflamação aguda é um meio apropriado e eficaz de combate à infecção. A inflamação crônica, contudo, se caracteriza por uma perda de autotolerância e regulação, podendo causar danos graves aos tecidos. Eis alguns dos fatores das resposta inflamatória: Células: Os principais tipos de célula envolvidas na resposta inflamatória aguda são os fagócitos, sobretudo neutrófilos, portanto também conhecidos como células inflamatórias. Na inflamação crônica, também contribuem para o processo inflamatório as células T ativadas e os macrófagos. Mediadores: Na resposta inflamatória aguda que se segue a uma lesão ou infecção no corpo, os fagócitos liberam mediadores químicos como citocinas e prostaglandinas. Os efeitos locais conjugados desses mediadores atraem células inflamatórias para a área, provocando a resposta inflamatória. Na inflamação crônica, as células T e os macrófagos liberam mediadores que promovem a cura dos tecidos. Sintomas: Celsus, no século I, disse que os sinais da inflamação são “rubor et tumor, cum calore et dolore”, que significa vermelhidão e inchaço, calor e dor - tudo isso reflete as atividades das citocinas e outros mediadores. Doenças inflamatórias intestinais A doença de Crohn e a colite ulcerativa são as formas mais comuns de doença inflamatória intestinal (IBD). A primeira se caracteriza por placas de tecido inflamado que se aprofundam em toda a parede intestinal, ao passo que a segunda se concentra basicamente na mucosa do cólon. A causa das duas é desconhecida, mas a hereditariedade e a microbiota intestinal parecem estar envolvidas no processo das inflamações agudas ocasionais (infecções por salmonela ou rotavírus, por exemplo), que sem o devido tratamento, podem tornar-se crônicas. Nas áreas inflamadas da mucosa intestinal, a concentração de vitamina C cai e o dano oxidativo dos lipídios aumenta. Em estudo feito com portadores da doença de Crohn, a suplementação com uma combinação de vitamina C, vitamina E, óleo de peixe e β-caroteno reduziu a produção de proteínas inflamatórias por monócitos do sangue. O LCPUFA n-3 de óleo de peixe talvez tenha sido o componente mais eficaz da combinação aplicada. Vários estudos confirmaram que o uso de corticosteroides nesses pacientes pode diminuir se eles receberem suplementação com LCPUFA n-3. Pelo fato de a microbiota intestinal estar envolvida na etiologia das IBDs, o reequilíbrio da flora intestinal provocado pelo aumento do número de lactobacilos e de bifidobactérias pode ser benéfico. Na verdade, o uso de prebióticos e probióticos parece ser atualmente o meio mais promissor de promover a melhora dos sintomas das IBDs pela dieta. Na colite ulcerativa, por exemplo, os pacientes tratados com um simbiótico apresentaram redução nos marcadores da inflamação intestinal com regeneração do tecido inflamado. Em outro estudo, pacientes vítimas de colite ulcerativa apresentaram remissão mais rápida quando tomaram prebiótico. Mais pesquisas são necessárias, no entanto, para confirmar esses resultados e definir as cepas e os prebióticos - e combinações deles - mais eficazes (ver Quadro 8). Asma Alguns estudos sugeriram que a ingestão de grupos específicos de alimentos modula o risco da asma. A ingestão de peixe, principalmente óleo de peixe contendo LCPUFA n-3, pode ter efeito protetor contra a asma. Levantou-se a hipótese, embora não comprovada, de que uma ingestão elevada de PUFA n-6 e, sobretudo, uma ingestão baixa de PUFA n-3, contribuam para a maior prevalência da asma. Acredita-se que a produção de mediadores envolvidos nas respostas alérgicas seja afetada pelo balanço entre os dois tipos de PUFA. 22 Concise Monograph Series QUADRO 8 Alimentos funcionais para “modulação imune” Na última década, a indústria alimentícia desenvolveu o conceito de alimentos funcionais (ver Monografias Concisas do ILSI “Concepts of Functional Foods”). Os alimentos funcionais beneficiam uma ou mais das funções pretendidas do corpo, proporcionando efeitos que vão além dos nutricionais. Esse efeito específico precisa ser comprovado em estudos bem delineados, realizados com humanos. Os alimentos funcionais têm que melhorar o estado de saúde ou bem-estar e/ou diminuir o risco de doenças. É preciso definir muito bem os marcadores das funções visadas e das respostas biológicas. Relacionados ao sistema imune, esses marcadores englobam “resposta de vacinação” ou “atividade citotóxica de células exterminadoras naturais” (ver Quadro 6), e podem ser melhorados ou suprimidos. Dependendo da situação de imunidade da pessoa, pode ser conveniente um ou outro efeito. Os alimentos funcionais com potencial para melhorar o sistema imune são valiosos para quem apresenta deficiência marginal em nutrientes específicos ou para quem consome nutrientes imunossuppressores (gordura, p.ex.) em excesso. Mas há pessoas que apresentam um bom padrão nutricional e que mesmo assim estão interessadas em reforçar seu sistema imune pelo aumento da ingestão de nutrientes específicos. São exemplos de alimentos funcionais os iogurtes que são suplementados com probióticos imunomoduladores. Como o sistema imune é um sistema complexo e de regulagem muito delicada, é preciso tomar muito cuidado para não perturbar esse equilíbrio. São necessárias mais pesquisas para entender como simples nutrientes - assim como combinações deles em doses acima dos níveis de ingestão dietética recomendados - afetam o sistema imune em pessoas saudáveis com funcionamento normal do sistema imune. São também necessárias mais informações sobre a variação das respostas imunes em pessoas saudáveis e como isso afeta a susceptibilidade a infecções. Além de tudo isso, falta ainda investigar em maior profundidade o efeito do genótipo, do sexo e da idade sobre a sensibilidade do sistema imune diante de intervenções na dieta. Só assim teremos uma compreensão mais ampla de se e como as respostas imunes através dos alimentos funcionais se traduzem em uma melhor imunocompetência. Os sinais dados pelos estudos clínicos em adultos com LCPUFA n-3, porém, não são conclusivos, embora exista um possível benefício em crianças. O alto consumo de legumes, verduras e frutas (principalmente maçã) parece de fato reduzir o risco de asma. Os constituintes benéficos desses alimentos são as substâncias fitoquímicas, entre as quais os flavonoides. 3.2 Infecções virais e bacterianas Sarampo A vitamina A tem sido usada com eficácia no tratamento do sarampo em crianças que apresentam deficiência dessa substância. Trata-se de um exemplo de melhora nutricional do sistema imune que se tornou parte da prática médica padrão. Certos testes realizados em países em desenvolvimento demonstraram forte diminuição na pneumonia e na mortalidade infantil associadas ao sarampo em crianças que receberam suplementos de vitamina A, na comparação com quem recebeu placebo. Com esses achados, a Organização Mundial de Saúde passou a recomendar tratamento com vitamina A para crianças com sarampo nos países em desenvolvimento. Os benefícios da vitamina A, porém, não parecem limitar-se a populações carentes. Mesmo nos EUA, onde a deficiência de vitamina A é muito pouco considerada, muitas crianças demonstram sinais bioquímicos de deficiência de vitamina A durante a infecção do sarampo. Em hospitais norte-americanos, as crianças com sarampo tratadas com vitamina A apresentaram uma duração menor e doença menos grave. Esses achados levaram a Academia Americana de Pediatria a recomendar tratamento com vitamina A para crianças hospitalizadas em decorrência de sarampo muito grave. HIV e AIDS Existem fortes indícios de que o estado nutricional é um importante determinante da sobrevivência de pessoas infectadas com o vírus da imunodeficiência (HIV). Nos últimos estágios da doença, é muito comum a desnutrição grave, e a emaciação é uma das características mais Nutrição e Imunidade 23 proeminentes da doença avançada. As deficiências nutricionais observadas em pessoas infectadas com HIV, sobretudo em termos das vitaminas A, B6 e B12, foram associadas a déficits da função imune (presença de células T helper em concentração muito baixa) e avanço acelerado da doença. Algumas pesquisas mais recentes indicam que a deficiência de selênio pode ser um importante previsor da menor sobrevida de portadores da síndrome da imunodeficiência adquirida (AIDS). Segundo certos estudos de intervenção, a mortalidade de portadores de AIDS com contagem baixa de células T helper caiu quando eles passaram a receber suplementos vitamínicos e/ou elementos traços, muito embora outros estudos não tenham encontrado efeito algum da suplementação com micronutrientes. Nos países em desenvolvimento, porém, a vitamina A parece diminuir a mortalidade, melhorar o crescimento e reduzir a diarreia em crianças infectadas com o HIV. Infecções respiratórias Diversos micronutrientes estão associados a infecções respiratórias, conforme já discutido: vitaminas A, C, D e E, selênio e zinco. A vitamina A restaura a integridade da mucosa no trato pulmonar e a vitamina D promove a produção do antibiótico endógeno catelicidina - dois mecanismos que protegem o organismo da colonização e proliferação de patógenos. De acordo com alguns estudos clínicos, a baixa concentração de vitamina D sérica nos países do hemisfério norte está associada a infecções agudas no trato respiratório. A vitamina E e o selênio protegem as células imunes de dano oxidativo e, com isso, diminuiriam o risco de contração de infecções respiratórias ou aliviariam seus sintomas. Os resultados de um estudo controlado randomizado com voluntários saudáveis demonstrou que a suplementação com selênio promove a eliminação de poliovírus e estimula as respostas celulares imunes. A suplementação com zinco reduz a incidência de infecções respiratórias em quem apresenta deficiência de zinco, principalmente nos países em desenvolvimento. Como dissemos antes, a vitamina C é um antioxidante sem efeito sobre a incidência do resfriado em pessoas com padrão de nutrição normal, mas a duração da infecção apresentou uma leve redução com a ingestão de vitamina C suplementar na dose de 200 mg/dia ou mais. Em pessoas com deficiência de vitamina C submetidas a forte estresse físico ou ao frio intenso, a vitamina C fez cair a incidência de resfriados. Diarreia Várias revisões sistemáticas de estudos, tanto de países desenvolvidos quanto em desenvolvimento, mostram que certos probióticos encurtaram bastante a duração da diarreia em crianças pequenas. Na maioria dos estudos, os efeitos clínicos foram acompanhados de aumento na resposta imune. Os lactobacilos, por exemplo, reduziram a frequência da defecação e a duração da diarreia na criança. Esse efeito é dose-dependente, ou seja, quanto mais altas as doses de probióticos, mas eficiente é a redução na diarreia. A vitamina A promove a regeneração do epitélio danificado da mucosa e a atividade fagocítica dos neutrófilos e macrófagos. Além disso, restaura a capacidade das células imunes do intestino de produzir anticorpos (IgA e IgG) contra toxinas bacterianas, que mostram comprometimento na deficiência de vitamina A. Estudos clínicos confirmam a visão de que doses baixas de suplementação com vitamina A reduzem a incidência e a duração de episódios de diarreia, principalmente em crianças mal nutridas. 3.3 Alergia alimentar Hereditariedade e fatores ambientais são os maiores predisponentes da alergia. A chance de uma pessoa geneticamente suscetível desenvolver sensibilidade a proteínas alimentares depende de muitos fatores, entre os quais a exposição a possíveis alérgenos alimentares ingeridos pela alimentação e um episódio antecedente de gastroenterite viral (ver Monografias Concisas do ILSI Europe “Food Allergy”). 24 Concise Monograph Series Os probióticos são um recurso na prevenção e tratamento da alergia alimentar, por sua capacidade de promover a tolerância oral e os mecanismos de barreira endógenos, de aliviar a inflamação intestinal e de afetar beneficamente a composição da microbiota intestinal. Alguns estudos clínicos iniciais em crianças com doenças atópicas sugerem um efeito benéfico dos Lactobacillus rhamnosus GG, mas estudos mais recentes apresentaram resultados conflitantes. Está claro que a demonstração dos efeitos benéficos dos probióticos depende de doses e cepas probióticas definidas, assim como da situação clínica (diferenças nos grupos alvo, países, esquemas de intervenção, critérios de definição de doenças atópicas). 3.4 Câncer Acredita-se há muito tempo que o sistema imune desempenha um papel no modo como o organismo reconhece e reage a tumores. A partir dos anos de 1980, vários estudos revelaram que o risco de câncer é maior em quem apresenta baixa atividade das células exterminadoras naturais. Fora isso, a maior incidência de certos tipos de câncer em pessoas infectadas com HIV sugere haver relação entre a imunodepressão e o desenvolvimento de certos tumores. Uma hipótese atualmente propõe que o sistema imune e as células cancerígenas interajam de três maneiras. Na primeira, o sistema imune reconhece as células cancerígenas e as elimina (imunovigilância tumoral). Na segunda, a proliferação de células cancerígenas é mantida sob controle pelo sistema imune (equilíbrio). E na terceira, as células cancerígenas com imunogenicidade amortecida não são reconhecidas pelo sistema imune e se desenvolvem mais facilmente em cânceres clinicamente aparentes (escape). Principalmente em virtude de razões metodológicas, não existem até agora indícios em estudos clínicos feitos com pessoas de que a melhora na função imune pela alimentação reduza o risco de determinados tumores. 4. BENEFÍCIOS E RISCOS DA ALTERAÇÃO DA RESPOSTA IMUNE POR MEIOS NUTRICIONAIS Do ponto de vista nutricional, uma dieta bem balanceada deve servir de base para a função imune e o conceito de promoção da saúde ou tratamento de doenças por alteração da resposta imune pela dieta parece muito promissor. Muitas perguntas, no entanto, ainda precisam ser respondidas sobre a ingestão mais adequada de nutrientes e sobre se de fato as respostas imunes se traduzem em maior resistência a infecções. Algumas abordagens possivelmente benéficas seriam a redução da ingestão de gordura total, a melhor qualidade da gordura na dieta (diminuição da proporção entre SFA e PUFA), a compensação da deficiência de micronutrientes em alguns idosos e o uso de probióticos e prebióticos. Os benefícios potenciais dessas abordagens precisam ser pesados contra os riscos potenciais. O maior risco resultante da modulação dietética da resposta imune estaria associado a intervenções nutricionais em pessoas com sistema imune super-reativo (quem tem alergia, doenças inflamatórias crônicas, doenças autoimunes) na ausência da devida supervisão médica). Em algumas abordagens, os riscos tendem a ser desprezíveis e isso é especialmente verdadeiro na correção de deficiências nutricionais. Espera-se, por exemplo, que a eliminação da desnutrição em crianças de países em desenvolvimento aumente muito sua resistência a doenças infecciosas, não sendo esperado o surgimento de qualquer resultado negativo. O uso de uma dose alta única de vitamina A no tratamento de crianças com sarampo é um bom exemplo disso. Em outros casos, porém, a correção da deficiência de um nutriente pode ser nociva. Nutrição e Imunidade 25 QUADRO 9 Regulamentação das alegações de saúde ligados à função imune O Regulamento (EC) nº 1924/2006 harmoniza as alegações em termos de nutrição e saúde oferecidas por produtos alimentícios dentro da Comunidade Europeia. A Autoridade Europeia para Segurança Alimentar (EFSA) avalia a totalidade das provas científicas disponíveis e aconselha a Comunidade Europeia sobre a admissibilidade de alegações de saúde específicas. A avaliação é estabelecida caso a caso, porque o tipo, nível etc. das provas científicas necessárias dependem do contexto das alegações especificamente. A EFSA elaborou um roteiro de orientação preliminar para as exigências científicas aplicáveis às alegações de saúde no âmbito do intestino e da função imune e o documento foi discutido com cientistas especializados em simpósio ocorrido em dezembro de 2010. A partir dos exemplos fornecidos, ficou óbvio que as alegações precisam definir com clareza a natureza dos aspectos do sistema imune especificamente envolvidos na alegação, ou seja, defesa contra patógenos ou resposta a alérgenos e, além disso, uma mera alteração em marcadores da função imune não é necessariamente considerada efeito benéfico sobre a saúde. Seriam exceções a prevenção da supressão induzida por UV da imunidade da pele e a melhor resposta à vacinação. Contudo, de modo geral, falta ser demonstrado que alterações na função imune contribuem para resultados de saúde benéficos, como infecções ou episódios de diarreia menos frequentes ou menos graves. Ao mesmo tempo, as leis aplicáveis a alimentos não permitem alegações de prevenção ou tratamento de doenças, uma vez que essas são atribuições dos medicamentos. Com isso, as alegações de saúde dos produtos alimentícios devem basear-se nos efeitos sobre fatores de risco ou biomarcadores, não apenas no resultados das doenças, muito embora estes possam contribuir para estabelecer a relevância dos efeitos sobre fatores de risco ou biomarcadores. Para conhecer o parecer da EFSA sobre alegações de saúde específicas e orientações mais atualizadas quanto à substanciação de alegações relacionadas à função imune, consulte o site da EFSA: http://www.efsa.europa.eu/en/ndatopics/topic/nutrition.htm A suplementação de ferro em regiões onde há malária pode aumentar a incidência e provocar um curso mais grave da doença. A melhora na resposta imune observada em idosos suplementados com uma dose baixa de vitaminas e sais minerais também pouco provavelmente será acompanhada de efeitos adversos. Os efeitos benéficos da suplementação em dose baixa se devem, provavelmente, à correção de deficiências sutis e as doses dos nutrientes nos suplementos multivitamínicos e multiminerais estão dentro da faixa de segurança. Até hoje, a maioria dos estudos mostra que os suplementos não melhoram a resposta imune em adultos saudáveis e bem nutridos nem em idosos praticantes de um nível normal de atividade física, mas que são benéficos para pessoas mal nutridas e praticantes de atividades física muito extenuantes. O que se notou foi um reforço na resposta imune, que atingiu níveis vistos em pessoas normais. Nesses grupos de risco, os benefícios superam claramente os possíveis riscos. Em pessoas normais, praticamente não há benefícios e, no caso da maioria dos nutrientes, também não há riscos. Porém, são necessários mais estudos para confirmar essa suposição. A vitamina E é considerada, de modo geral, um dos nutrientes mais seguros, mesmo quando administrada em doses maiores do que as normalmente consumidas. Um estudo controlado de suplementação com vitamina E em idosos demonstrou que a melhora no sistema imune provocada por uma dose comparativamente alta de vitamina E (200 mg/dia) foi superior à obtida tanto com doses mais baixas quanto mais altas (60 ou 800 mg/ dia, respectivamente). Todas as doses desse estudo foram mais altas do que a ingestão normal de vitamina E pela alimentação. O interessante é que a ingestão de vitamina E em doses de 400 mg/dia ou mais estão associadas a um aumento na mortalidade. Portanto, no caso da vitamina E, assim como para outros nutrientes, deve haver um nível mais apropriado de ingestão, que provocará os melhores 26 Concise Monograph Series efeitos possíveis sobre a resposta imune e sobre a saúde como um todo, mas esse nível não foi definido ainda. Em relação à vitamina D, os dados atuais indicam que boa parte da população nos países ocidentais a ingere em quantidade insuficiente. Uma quantidade maior de vitamina D talvez contribuísse para uma melhora na resistência a infecções e nos processos imunorreguladores em geral. Muitos sais minerais, entre eles os que influenciam a resposta imune, apresentam faixa estreita de segurança. Enquanto pequenos aumentos na ingestão desses minerais podem provocar efeitos benéficos sobre a imunidade, aumentos maiores podem acabar sendo nocivos. Existem, por exemplo, muitos indícios de que uma baixa ingestão de zinco compromete a função imune e de que deficiências discretas de zinco sejam relativamente comuns, mesmo nas sociedades industrializadas. Seria, portanto, natural esperar que a suplementação com zinco fosse benéfica. No entanto, o consumo prolongado de quantidades elevadas de zinco (mais do dobro das RDA de 12 a 15 mg/dia) pode comprometer a resposta imune e interferir na nutrição do cobre. Existe uma preocupação maior em relação aos tratamentos que envolvem o uso prolongado de doses altas de suplementos nutricionais ou padrões de alimentação pouco comuns com o objetivo de alterar respostas imunes. Nesses casos, a possibilidade de manifestação de efeitos adversos - seja sobre a resposta imune em si ou sobre outras funções fisiológicas - deve ser pesada contra os possíveis benefícios. O consumo de alimentos suplementados com probióticos tem pouca probabilidade de risco, conforme confirmado por grande número de estudos com pessoas saudáveis. 5. SUMÁRIO As relações entre nutrição e infecção foram observadas já na antiguidade e o papel do sistema imune nessas relações vem sendo estudado desde a década de 1960. Os efeitos clinicamente significativos da nutrição sobre a função imune não se limitam a crianças desnutridas nos países em desenvolvimento; podem ser observados em pessoas de todas as idades, do mundo inteiro. O sistema imune consiste em um intricado arranjo de mecanismos de defesa que protegem o organismo contra agentes estranhos perigosos. Fatores nutricionais podem influenciar o funcionamento imune de muitas maneiras e em vários níveis, sendo, portanto, importante considerar a relevância imunológica dos efeitos observados. Algumas medidas in vivo específicas, como a da resposta a vacinas, podem, por exemplo, indicar maior resistência a infecções, mas em virtude da complexidade do sistema, nenhum teste ou marcador individualmente permite tirar conclusões sobre o funcionamento do sistema imune como um todo. Com isso, foram estabelecidos pelos cientistas critérios para a determinação de biomarcadores relevantes, que quando combinados, dão informações sobre a importância imunológica de vários fatores dietéticos. Entre eles, os que influenciam a resposta imune estão a ingestão total de energia (mesmo quando relacionada à desnutrição ou à obesidade e a alguma dieta seguida), a ingestão total de gordura, os tipos de ácidos graxos (principalmente LCPUFA n-3), várias vitaminas (sobretudo as vitaminas A, D, E, B6 e C), carotenoides, flavonoides, microminerais (sobretudo zinco e selênio), prebióticos e probióticos. Há pesquisas sugerindo que a alteração da resposta imune por meio da alimentação pode contribuir para a diminuição do risco e/ou tratamento de grande variedade de distúrbios, entre os quais doenças inflamatórias, cardíacas, infecções virais e bacterianas, asma e alergias alimentares e câncer. Alguns desses tratamentos, como Nutrição e Imunidade 27 o uso de vitamina A no tratamento do sarampo, já se tornaram uma parte aceita da prática médica moderna, mas para a maior parte dos fatores dietéticos, essa linha de ação ainda está sendo investigada. Os possíveis benefícios da modulação dietética da resposta imune devem ser pesados contra os riscos para a saúde eventualmente associados a padrões de alimentação pouco comuns ou ao uso prolongado de suplementos em alta concentração. Mesmo assim, pode ser que determinadas intervenções na dieta voltadas para a modificação da resposta imune acabem um dia provando seu valor tanto para a manutenção da saúde quanto para o tratamento de doenças. 28 Concise Monograph Series 6. GLOSSÁRIO Ácido graxo: Ácido orgânico com uma cadeia de hidrocarbonetos que pode variar de tamanho; são constituintes das gorduras, mais especificamente os triacilglicerois e respectivos compostos. Ácido graxo poliinsaturado (PUFA): Ácido graxo que tem duas ou mais duplas ligações em sua cadeia carbônica. Alérgeno: Antígeno (ver abaixo) que provoca reação alérgica. Alimento funcional: Alimento designado para exercer um benefício a mais para a saúde, além daquele de suprir as necessidades nutricionais básicas. Anticorpo: Molécula de proteína (imunoglobulina) produzida e secretada pelos linfócitos B em resposta a um antígeno, e que é capaz de se ligar a um antígeno específico. Há cinco classes de anticorpos: IgM, IgG, IgE, IgA e IgD. Antígeno: Substância que provoca uma resposta imune. Antioxidante: Substancia que retarda ou inibe a oxidação. Aterosclerose: Doença degenerativa das artérias em que ocorre um espessamento causado pelo acúmulo de material (placa) abaixo do revestimento interno e que com o tempo acaba restringindo o fluxo sanguíneo. A placa característica contém colesterol e macrófagos. Células B (ou linfócitos B): Subconjunto de linfócitos capazes de desenvolver-se e transformar-se em células produtoras de anticorpos. Células T (ou linfócitos T): Subconjunto de linfócitos definidos por seu desenvolvimento no timo. As células T induzem e regulam algumas respostas imunes específicas depois da estimulação por antígenos específicos. Doença autoimune: Doença em que as defesas imunes do organismo reagem diante de células do próprio organismo (autoantígenos) como se elas fossem estranhas, provocando efeitos destrutivos. Estudo epidemiológico: Estudo conduzido para avaliar fatores de risco para doenças (cardíaca, por exemplo). Os investigadores procuram diferenças em termos de estilo de vida, como moradia, estresse, alimentação, atividade física ou tabagismo entre portadores de uma doença específica e pessoas que não têm a doença. Um estudo epidemiológico pode ser conduzido prospectivamente (os fatores relativos ao estilo de vida do grupo estudado são registrados e a incidência da doença é observada durante o curso do estudo) ou retrospectivamente (pessoas com e sem aquela doença especificamente são admitidas no estudo e entrevistadas sobre seu estilo de vida passado). Fagócitos/Células fagocíticas: Célula que tem a capacidade de ingerir outras células, materiais estranhos ou bactérias. Hormônios tissulares: Ao contrário dos hormônios, que são produzidos em um órgão e atuam sistemicamente, os hormônios de tecido são produzidos localmente e depois agem nos órgãos específicos. Inflamação: Termo geral para a reação dos tecidos diante de uma lesão ou infecção ou, por vezes, de uma resposta imune localizada; caracteriza-se clinicamente por calor, vermelhidão, inchaço e dor. Leucócitos: Família de glóbulos brancos que abrange os linfócitos, monócitos/macrófagos e neutrófilos. Leucotrienos: Hormônio tissular derivado de PUFA de cadeia longa e que possui diversas funções biológicas no sistema imune. Nutrição e Imunidade 29 Linfócitos: Classe de glóbulos brancos antígenoespecíficos que abrange as células B, as células C e as células exterminadoras naturais. Macrófago: Tipo de célula fagocítica presente nos tecidos. Monócito: Classe de glóbulos brancos precursores dos macrófagos. Morbidade: Condição de estar doente. Neutrófilos: Glóbulos brancos (50 a 60% dos leucócitos circulantes), também chamados granulócitos. Placas de Peyer: Estruturas que se assemelham a linfonodos e que estão distribuídas em intervalos logo abaixo do epitélio do intestino delgado. Prostaglandina: Hormônio de tecido derivado de PUFA de cadeia longa e que possui diversas funções biológicas no sistema imune. PUFA n-3: Ácidos graxos poliinsaturados que têm a primeira dupla ligação entre o terceiro e o quarto átomo de carbono contando a partir da extremidade metila; são encontrados em óleos vegetais, como o óleo de canola; os PUFA n-3 de cadeia longa (LC) são encontrados em peixes oleosos e no óleo de peixe. PUFA n-6: Ácidos graxos poliinsaturados que têm a primeira dupla ligação entre o sexto e o sétimo átomo de carbono, contando a partir da extremidade metila; os PUFA n-6 são encontrados nos óleos vegetais, como o óleo de soja. Recomendações Nutricionais (RDA): Ingestão diária média recomendada de um nutriente, especificada em concentração apropriada para manter a boa saúde. Resposta imune celular: Resposta imune interativa que envolve células T e outras células imunes. Respostas imunes humorais: Resposta imune que é mediada por anticorpos secretados. Teste controlado: Estudo que investiga o efeito de uma substância teste. Os participantes são designados aleatoriamente para diferentes grupos. Um grupo recebe a substância teste e o outro (grupo de controle) recebe placebo inativo. Teoricamente, o tratamento deve ser duplo-cego, ou seja, durante o teste, nem os pesquisadores nem os participantes sabem a que grupo a pessoa pertence. 30 Concise Monograph Series 7. LEITURA COMPLEMENTAR Galli, C., Calder, P.C. Effects of fat and fatty acid intake on inflammatory and immune responses: a critical review. Annals of Nutrition and Metabolism 55:123-139, 2009. A relação completa das referências usadas na compilação desta monografia concisa pode ser encontrada no ILSI Europe. E informações mais detalhadas sobre o assunto podem ser encontradas nos textos abaixo. Gill, H., Prasad, J. Probiotics, immunomodulation, and health benefits. Advances in Experimental Medicine and Biology 606:423-454, 2008. Adams, J.S., Hewison, M. Unexpected actions of vitamin D: new perspectives on the regulation of innate and adaptive immunity. Nature Clinical Practice Endocrinology & Metabolism 4:80-90, 2008. Albers, R., Antoine, J.M., Bourdet-Sicard, R., Calder, P.C., Gleeson, M., Lesourd, B., Samartin, S., Sanderson, I.R., Van Loo, J., Vas Dias, F.W., Watzl, B. Markers to measure immunomodulation in human nutrition intervention studies. British Journal of Nutrition 94:452-481, 2005. Calder, P. n-3 Polyunsaturated fatty acids, inflammation, and inflammatory diseases. American Journal of Clinical Nutrition 83:1505S-1519S, 2006. Calder, P., Albers, R., Antoine, J-M., Blum, S., BourdetSicard, R., Ferns, G.A., Folkerts, G., Friedmann, P.S., Frost, S.G., Guarner, F., Lovik, M., Macfarlane, S., Meyer, P.D., M’Rabet, L., Serafini, M., van Eden, W., van Loo, J., Vas Dias, W., Vidry, S., Winklhofer-Roob, B.M., Zhao, J. Inflammatory disease processes and interaction with nutrition. British Journal of Nutrition 101:S1-S45, 2009. 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Outras Publicações do ILSI Europe Monografias Concisas •Alcohol - Health Issues Related to Alcohol Consumption •A Simple Guide to Understanding and Applying the Hazard Analysis Critical Control Point Concept •Calcium in Nutrition •Carbohydrates: Nutritional and Health Aspects •Caries Preventive Strategies •Concepts of Functional Foods •Dietary Fibre •Food Allergy •Food Biotechnology - An Introduction •Functional Foods - From Science to Health and Claims •Genetic Modification Technology and Food - Consumer Health and Safety •Healthy Lifestyles - Nutrition and Physical Activity •Microwave Ovens •Nutrition and Genetics - Mapping Individual Health •Nutrition and Immunity in Man •Nutritional and Health Aspects of Sugars - Evaluation of New Findings •Nutritional Epidemiology, Possibilities and Limitations •Oral and Dental Health - Prevention of Dental Caries, Erosion, Gingivitis and Periodontitis •Oxidants, Antioxidants, and Disease Prevention •Principles of Risk Assessment of Food and Drinking Water Related to Human Health •The Acceptable Daily Intake - A Tool for Ensuring Food Safety •Threshold of Toxicological Concern (TTC) •Type 2 Diabetes - Prevention and Management Relatórios •3-MCPD Esters in Food Products Summary Report •Addition of Nutrients to Food: Nutritional and Safety Considerations •An Evaluation of the Budget Method for Screening Food Additive Intake •Animal-Borne Viruses of Relevance to the Food Industry •Antioxidants: Scientific Basis, Regulatory Aspects and Industry Perspectives •Applicability of the ADI to Infants and Children •Application of the Margin of Exposure Approach to Compounds in Food which are both Genotoxic and Carcinogenic •Approach to the Control of Enterohaemorrhagic Escherichia coli (EHEC) •Assessing and Controlling Industrial Impacts on the Aquatic Environment with Reference to Food processing •Assessing Health Risks from Environmental Exposure to Chemicals: The Example of Drinking Water •Beyond PASSCLAIM - Guidance to Substantiate Health Claims on Foods •Campylobacters as Zoonotic Pathogens: A Food Production Perspective •Considering Water Quality for Use in the Food Industry •Consumer Understanding of Health Claims •Detection Methods for Novel Foods Derived from Genetically Modified Organisms •Emerging Technologies for Efficacy Demonstration •Evaluation of Agronomic Practices for Mitigation of Natural Toxins •Evaluation of the Risks Posed in Europe by Unintended Mixing of Food Crops Developed for Food Use and Food Crops Developed for Non-Food Uses •Exposure from Food Contact Materials •Foodborne Protozoan Parasites •Foodborne Viruses: An Emerging Problem •Food Consumption and Packaging Usage Factors •Food Safety Management Tools •Food Safety Objectives - Role in Microbiological Food Safety Management •Functional Foods in Europe International Developments in Science and Health Claims •Functional Foods - Scientific and Global Perspectives •Guidance for the Safety Assessment of Botanicals and Botanical Preparations for Use in Food and Food Supplements •Impact of Microbial Distributions on Food Safety •Markers of Oxidative Damage and Antioxidant Protection: Current status and relevance to disease •Method Development in Relation to Regulatory Requirements for the Detection of GMOs in the Food Chain •Micronutrient Landscape of Europe: Comparison of Intakes and Methodologies with Particular Regard to Higher Consumption •Mycobacterium avium subsp. paratuberculosis (MAP) and the Food Chain •Nutrition in Children and Adolescents in Europe: What is the Scientific Basis? •Overview of the Health Issues Related to Alcohol Consumption •Overweight and Obesity in European Children and Adolescents: Causes and Consequences - Prevention and Treatment •Packaging Materials: 1. Polyethylene Terephthalate (PET) for Food Packaging Applications •Packaging Materials: 2. Polystyrene for Food Packaging Applications •Packaging Materials: 3. Polypropylene as a Packaging Material for Foods and Beverages •Packaging Materials: 4. Polyethylene for Food Packaging Applications •Packaging Materials: 5. Polyvinyl Chloride (PVC) for Food Packaging Applications •Packaging Materials: 6. Paper and Board for Food Packaging Applications •Packaging Materials: 7. Metal Packaging for Foodstuffs •Recontamination as a Source of Pathogens in Processed Foods - A Literature Review •Recycling of Plastics for Food Contact Use •Safety Assessment of Viable Genetically Modified Micro-organisms Used in Food •Safety Considerations of DNA in Foods •Salmonella Typhimurium definitive type (DT) 104: A multi-resistant Salmonella •Significance of Excursions of Intake above the Acceptable Daily Intake (ADI) •The Safety Assessment of Novel Foods and Concepts to Determine their Safety in use •Threshold of Toxicological Concern for Chemical Substances Present in the Diet •Transmissible Spongiform Encephalopathy as a Zoonotic Disease •Trichothecenes with a Special Focus on DON •Using Microbiological Risk Assessment (MRA) in Food Safety Management •Validation and Verification of HACCP Endereço para Pedidos ILSI Europe a.i.s.b.l. 83 Avenue E. 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