A mulher com câncer de mama: apoio social e

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Ensino Superior CGC 44.351.146/0001-57
Mudanças – Psicologia da Saúde,
14 (2), jul-dez 2006, 143-150p
A mulher com câncer de mama:
apoio social e espirituralidade
Fernanda Silva Hoffmann*
Marisa Campio Müller **
Rachel Rubin ***
Resumo
O câncer de mama, por sua elevada incidência e mortalidade, está entre as doenças que mais provocam medo e preocupações nas mulheres. O Apoio Social, através das relações familiares, de amizades, de trabalho e comunitárias –
profissionais da saúde e religiosidade, tem demonstrado ser fator importante no auxílio de portadores de enfermidades.
Este artigo teve por objetivo contextualizar o leitor sobre a importância do Apoio Social, destacando o aspecto da
espiritualidade, na vivência e no atendimento da paciente com câncer de mama. Foram encontrados diversos estudos
que sustentam a correlação entre Apoio Social, Bem-Estar Espiritual e a promoção da saúde física e mental.
Descritores: Câncer de Mama; Psicologia Social; Apoio Social; Espiritualidade; Bem-Estar Espiritual.
The woman with breast cancer: social support and spirituality
Abstract
The breast cancer, for its hight occurrence and mortality, is among the illnesses that cases more provoke fear and
concerns in women. The Social Support through family, friends, coworkers, health professional and religious community
has proved to be an important factor in the aid of the diseased. The goal of this article is to put to the reader the
importance of Social Support in the experience and attendance of patients with breast cancer emphasizing the spiritual
aspect. It was found many studies that confirms the correlation between Social Support, Spiritual Well-Being and the
promotion of the physical and mental health.
Index-terms: Breast Cancer; Social Psychology; Social Support; Spirituality; Spiritual Well-Being.
La femme avec cancer de sein : aide sociale et spiritualité
Résumé
Le cancer de sein, par son incidence élevée et mortalité, est entre les maladies qui le plus provoquent la peur et des
préoccupations chez les femmes. L'Aide Sociale, à travers les relations familiales, d'amitiés, de travail et communautaire
– professionnel de la santé et de la religiosité, a démontré être un facteur important dans l’aide aux maladies. Cet article
a eu comme objectif de contextualiser le lecteur sur l'importance de l'Aide Sociale, en détachant l'aspect de la spiritualité,
dans l'expérience et participation de la patiente avec un cancer de sein. On a trouvé diverses études qui soutiennent la
corrélation entre Aide Sociale, Bien-être, Chant religieux et la promotion de la santé physique et mentale.
Mots-clés : Cancer de Sein ; Psychologie Sociale ; Aide Sociale ; Spiritualité ; Bien-être Spirituel.
* Mestre em Psicologia Clínica, PUC do Rio Grande do Sul. E--mail: [email protected].
** Psicóloga, dougora em Psicologia Clínica, Professora Adjunta da Faculdade de Psicologia e do Programa de Pós-graduação em Psicologia, PUCRS.
E-mail: [email protected]
*** Acadêmica de Psicologia, Bolsista de Iniciação Científica, PUCRS. E-mail: [email protected]
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FERNANDA SILVA HOFFMANN, MARISA CAMPIO MÜLLER, RACHEL RUBIN
La mujer con cáncer de mama: apoyo social y espirituralidad
Resumen
El cáncer de mama, por su elevada incidencia y mortalidad, está entre las enfermedades que más provocan miedo y
preocupaciones en las mujeres. El apoyo social, a través de las relaciones familiares, de amistades de trabajo y a nivel
comunitario (profesionales de la salud y religiosidad), han demostrado ser factores importantes en el auxilio de portadores de estas enfermedades. Este artículo tuvo como objetivo contextualizar al lector sobre la importancia del apoyo
social, destacando el aspecto de la espiritualidad, en la vivencia y en la atención de la paciente con cáncer de mama.
Fueron encontrados diversos estudios que sustentan la correlación entre apoyo social, bienestar espiritual y la promoción
de la salud física y mental.
Descriptores: Cáncer de Mama; Psicología Social; Apoyo Social; Espiritualidad; Bienestar Espiritual.
Introdução: o câncer de mama
Segundo o Instituto Nacional do Câncer (INCA,
2005), o câncer de mama é o segundo tipo mais freqüente no mundo e o primeiro entre as mulheres. A
incidência de câncer de mama feminina apresentou um
crescimento contínuo na última década, o que pode ser
resultado de mudanças sociodemográficas e acessibilidade aos serviços de saúde.
Mesmo com os grandes avanços terapêuticos, esse
câncer continua entre as maiores causas de morte entre as
mulheres no mundo, constituindo um sério problema de
saúde pública, seja por sua incidência ou por sua
letalidade (Rodrigues, Melo, Silva & Mamede, 1998;
Garcia, 1999). No Brasil, o câncer de mama é a maior
causa de óbitos por câncer na população feminina, principalmente na faixa etária entre 40 e 69 anos. A taxa bruta
de mortalidade por câncer de mama apresentou uma variação percentual de 76% nas últimas décadas, passando
de 5,77 em 1979, para 10,15 mortes por 100.000 mulheres
em 2002. As Estimativas de Incidência e Mortalidade,
referentes ao ano de 2003, estimaram a ocorrência de
41.610 casos novos e de 9.335 óbitos por câncer de
mama no país, sendo as regiões Sul e Sudeste as áreas
mais afetadas. Um dos fatores que dificultam o tratamento é o estágio avançado em que a doença é descoberta. A
maioria dos casos de câncer de mama, no Brasil, é
diagnosticada em estágios avançados, diminuindo as
chances de sobrevida das pacientes e comprometendo os
resultados do tratamento (INCA, 2005).
Pesquisando sobre o perfil clínico das pacientes com
câncer de mama, Lago, Oliveira, Dondoni e Braga (1998)
constataram que, na maioria dos casos, a detecção da doença foi um achado ocasional (81,03%). O tempo médio
decorrido entre a percepção de alguma alteração até a procura de auxílio médico foi de seis meses, sendo que a paciente que levou menos tempo procurou auxílio em menos
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de um mês e a que levou mais tempo demorou 96 meses
– oito anos. Os pesquisadores concluíram que as pacientes
têm chegado, ainda, em estágio clínico avançado, para o
câncer de mama, podendo o retardamento no diagnóstico
e na aplicação de terapêuticas adequadas interferirem negativamente no prognóstico dessas pacientes.
O câncer de mama se caracteriza pela anormalidade
das células e sua divisão excessiva, sua etiologia é
multifatorial, ou seja, é necessário um conjunto de fatores
(genético, nutricional, ambiental, entre outros) para que a
doença se desenvolva. Dentro dessa perspectiva, muitos
pesquisadores, já há algum tempo, vêm constatando que
os estados emocionais estão envolvidos nos processos de
câncer (Simonton, Simonton & Creighton, 1987; LeShan,
1992; Bizzarri, 2001). Mais recentemente, Cardozo (2002)
refere que perdas anteriores, quando não ressignificadas
e muito sentidas pelo paciente, podem estar associadas ao
aparecimento de doenças crônicas.
A suscetibilidade de contrair certas doenças pode estar
relacionada a processos de estresse psicossocial, que têm o
sistema imunológico como mediador (Moreira, 1992). O
estresse crônico e sentimentos negativos são apontados
como inibidores do sistema imunológico, interferindo, assim,
diretamente no desenvolvimento de doenças.
Há, dessa forma, uma interação entre o estado mental
e o funcionamento dos sistemas nervoso, endócrino e
imunológico. Quando esse eixo funciona desfuncionalmente, costuma favorecer processos patológicos. A visão
interatuante desses sistemas originou a chamada Psicoimunologia ou Psiconeuroimunologia (Roberto, 2004).
Esta área de estudo entende o ser humano como
uma unidade indivisível, onde corpo e mente funcionam
integrados. Assim sendo, é impossível fragmentar a pessoa e cuidar apenas de seu corpo ou só de sua mente. Na
visão atual da medicina, pensa-se primeiramente em preservar a saúde, em segundo lugar em evitar a doença,
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para, por último pensar em tratar a doença. Esses objetivos são alcançados utilizando-se os recursos que atendam
às diversas dimensões do ser humano: a física, a emocional, a mental e a espiritual (Azambuja, 2000).
Segundo Deitos e Gaspary (1997), estudos em
psiconeuroimunologia têm demonstrado que o câncer
desencadeia um processo adaptativo com relação às incertezas que tendem a aparecer com a doença: dúvidas sobre
a gravidade da situação, sobre os tratamentos e sobre o
próprio futuro. Se a adaptação exceder os limiares
psicodinâmicos e biopsicossociais de cada indivíduo, bem
como de seus familiares, criam-se fatores indiretos com
efeitos potencialmente supressivos que, via interação
psiconeuroimunológica, interagem com o desenvolvimento e até com o prognóstico da doença. Dentre esses fatores estão a baixa auto-estima, a auto-avaliação negativa, o
efeito do estigma e o inadequado suporte social, todos
estes com potenciais imunossupressores.
As repercussões psicossociais
O câncer ainda está entre as doenças que mais provocam medo e preocupações na população. Para Medeiros
(2001), o fato de trazer consigo a idéia de doença fatal e
incurável, cria uma imagem extremamente aversiva e associada à morte. O diagnóstico de câncer é, freqüentemente,
percebido como vergonhoso, incapacitante e sem cura,
sendo uma doença tradicionalmente temida pela sociedade.
Venâncio (2004) acredita que tanto o diagnóstico como
todo o processo da doença são vividos pelo paciente e por
sua família como um momento de intensa ansiedade e
sofrimento; não é de se estranhar, então, que cause tanto
sofrimento para o portador e para seus familiares.
A angústia e a incerteza quanto ao futuro ou a certeza de que somos seres que evoluímos fatalmente para a
morte, na vigência de uma doença grave, desencadeia um
processo de dor física, objetiva e subjetiva, na pessoa
doente e nos familiares (Bittencourt, & Cadete, 2002).
Já o câncer de mama, por ser um órgão símbolo de
feminilidade, sexualidade e maternidade, representa, para a
maioria das mulheres, um importante trauma psicológico.
Spiegel (1990) demonstrou que o grau de depressão em
portadoras de câncer de mama independe da malignidade
do tumor. Assim, só a suspeita de estar com um câncer já
pode trazer abalos significativos à vida da mulher.
Durante o período de investigação para o diagnóstico do câncer de mama, as reações e os sentimentos das
mulheres podem variar muito. As pacientes manifestam
sinais de ansiedade, angústia e desamparo, podendo o
tempo de espera ser preenchido com pensamentos de
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morte e pânico (Bergamasco & Ângelo, 2001). O período
do diagnóstico pode ser bastante traumático, principalmente se é prolongado ou termina com a confirmação de
uma doença ameaçadora da vida.
A doença recebe um significado próprio para cada
pessoa e o câncer pode afetar as emoções de diversas maneiras. Pesquisas apontam a depressão e a ansiedade como os
problemas psicológicos mais freqüentes entre as pacientes
com câncer. Ramirez, Richards, Jarrett e Fentiman (1995)
verificaram que de 20% a 30% das pacientes com câncer de
mama têm ansiedade, depressão e baixa auto-estima em algum momento após o diagnóstico. Carrol (2000) acrescentou que essas comorbidades podem ocorrer durante todo
tratamento e mesmo após o seu término.
Além da presença aterrorizante do nódulo, os sentimentos e as emoções vivenciadas pelas pacientes podem
ainda estar relacionados às dificuldades e à demora do
atendimento nos serviços de saúde, decorrentes da burocracia e da falta de recursos. Recentemente no Canadá,
dez mil mulheres, portadoras de câncer de mama, iniciaram um grande movimento de processos jurídicos contra
doze Hospitais de Quebec. As pacientes reclamam da
demora para iniciarem o tratamento (radioterapia) após
terem recebido o diagnóstico. O prazo que muitas tiveram que aguardar ultrapassou o período que a Corte Superior de Quebec estabeleceu como adequado: de oito a
doze semanas (Spurgeon, 2004). Esta realidade espanta,
vinda de um país desenvolvido como o Canadá.
No Brasil, onde o Sistema de Saúde enfrenta sérias
dificuldades econômicas e sociais, a realidade imposta às
portadoras de câncer de mama mostra-se ainda mais séria.
Bergamasco e Ângelo (2001) verificaram que as mulheres
referem os serviços de saúde como mais uma dificuldade
a ser enfrentada, percebendo-se dependentes e/ou impotentes diante dos mesmos. Os sentimentos de incerteza e
desconfiança quanto à resposta para sua suspeita, podem,
então, ser agravados quando a queixa da mulher não é
tratada com a seriedade devida.
Se deparar com a fragilidade e dependência humanas,
num processo de adoecimento, já é situação suficiente para
a mulher se sentir desamparada e emocionalmente abalada.
O apoio e a orientação médica se faz inerente. Contudo,
mesmo após a confirmação do diagnóstico, Gellert,
Maxwell e Siegel (1993) identificaram que, muitas vezes, os
médicos, intencionalmente, receiam fornecer informações
sobre o câncer a suas pacientes por acreditarem que essas
não estão preparadas para o enfrentamento da doença, ou
para algum procedimento como a mastectomia, ou ainda
porque parentes pedem que a paciente não seja informada.
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Entretanto, espera-se que a equipe médica seja capaz de
preparar a paciente, e seus familiares, para enfrentar a
doença e os tratamentos. A valorização da relação médicopaciente e familiares está alicerçada na maior participação
da pessoa em seu plano terapêutico.
São várias as modalidades terapêuticas disponíveis
para o câncer atualmente, incluindo cirurgias, quimioterapia, radioterapia e hormonioterapia. Freqüentemente,
o tratamento requer a combinação de mais de um método
terapêutico (INCA, 2005).
Cada pessoa reage de forma única ao tratamento
devido as suas características de personalidade, entretanto,
os efeitos psicológicos da doença podem ser entendidos
como uma reação a perdas. Parkes (1998) considera que
a reação à perda de um órgão ou uma parte do corpo,
assim como o luto pela morte de uma pessoa querida,
passa por três etapas importantes: (1) a reação traumática,
que consiste em uma reação de alarme, raiva, culpa e
transtorno de estresse pós-traumático, (2) a resposta de
pesar, referente à necessidade de procurar e encontrar o
objeto perdido, e (3) a transição psicossocial, caracterizada
pela sensação de deslocamento entre o mundo real e o
idealizado, percepção de mutilação e vazio, através do
qual o indivíduo enlutado transita da negação e evitação
do reconhecimento da perda para a aceitação, adotando
um novo modelo interno de mundo.
Ao longo do tratamento, o paciente oncológico passa por diferentes tipos de perdas. Barraclough (1994)
refere que a imagem de um corpo saudável e a sensação
de bem estar já não existem, pois ocorrem mudanças na
aparência e nas funções do organismo; o paciente se torna dependente, sentindo-se culpado ou preocupado por
se achar um fardo para seus familiares; as relações interpessoais se tornam restritas; em alguns casos, a expectativa de vida é alterada, o que pode causar profunda tristeza ou raiva.
Simpson, Carlson, Beck e Patten (2002) observaram
um índice relevante, de 25% a 30%, de transtornos de
ajustamento (ansiedade, depressão) em pacientes com
câncer de mama. Identificaram ainda que o sofrimento
psíquico dessas mulheres está relacionado ao apoio social
referido por elas durante a fase de tratamento da doença.
Em situações de crise, como é o caso do diagnóstico
e do tratamento para o câncer, Lugton (1997) afirma que
as pessoas necessitam ter assegurado o amor e o apoio
emocional daqueles que estão próximos, no sentido de
manter a própria identidade. Essas pessoas próximas, que
fornecem o apoio necessário num momento difícil, configuram a chamada Rede de Apoio Social.
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O apoio social e o processo
saúde-doença
A Rede de Apoio é constituída pelo ser humano
desde o início de sua vida. Pode ser considerada uma
trama interpessoal que, tanto modela, como é modelada
pelas pessoas. Esta trama é composta, primeiramente,
pela família e, à medida que o indivíduo cresce, integram
os amigos, colegas de trabalho, profissionais da saúde,
entre outros (Sluzki, 1996).
Há evidências de que a presença de uma doença, a
exemplo do câncer, pode deteriorar a qualidade das relações sociais de uma pessoa. O tratamento do câncer,
muitas vezes, é longo, o que gera um grande desgaste
emocional e físico, requerendo persistência e esperança
do paciente e de sua família (Motta, 1998).
O significado da doença, para Sluzki (1996), é um
constructo psicossocial, visto que:
A família e o paciente chegam a um acordo em termos
psicológicos e/ou organizacionais, com as mudanças permanentes apresentadas por uma doença crônica e desenvolvem um adequado modus operandi. Portanto, a tarefa
chave deste período é a capacidade da família manter uma
aparência de vida normal na presença anormal de uma enfermidade crônica e de uma incerteza aumentada. (p. 378)
O autor complementa ainda que as fronteiras de um
sistema significativo de um indivíduo não se limitam à
família, mas incluem todo o conjunto de vínculos interpessoais do sujeito. Sendo assim, pode-se discriminar as
redes micro e macro social do sujeito, o que demonstra a
complexidade dos sistemas da rede social.
Qualquer indivíduo faz parte de um imenso universo
relacional, o qual abrange os contextos culturais, históricos, políticos, econômicos, religiosos e outros. Em um
nível mais microscópico, o autor define a rede social
pessoal como a soma de todas as relações que um indivíduo percebe como significativas e diferenciadas da massa
anônima da sociedade e que inclui todos os indivíduos
com quem uma determinada pessoa relaciona-se em sua
vida. Podemos sistematizar essa rede em quatro quadrantes: família; amizades; relações de trabalho/escolares
e relações comunitárias, de serviço – de saúde e de religião. Através dessa rede o indivíduo se reconhece e obtém uma imagem de si próprio (Sluzki, 1996).
Historicamente, a década de 70 foi de grande importância para a popularidade do conceito do apoio social.
Diversos autores (Cassel, 1976; Cobb, 1976), na tentativa
de encontrar uma forma de evitar os comprovados
A MULHER COM CÂNCER DE MAMA: APOIO SOCIAL E ESPIRITURALIDADE
malefícios do estresse e de explicar como algumas pessoas
parecem capazes de evitar esses malefícios, exaltaram as
virtudes desse constructo.
Embora referências ao impacto positivo das relações
interpessoais tenham sido alvo de amplo debate na literatura científica, durante várias décadas houve divergências
a respeito da forma como deveria ser definido metodologicamente (Kessler, Price, & Wortman, 1985). Atualmente, parece ser consensual que o apoio social deve ser
compreendido como uma experiência pessoal e não como
um conjunto objetivo de interações e trocas, sendo reconhecido o papel da intensidade com que o indivíduo se
sente envolvido.
O Apoio Social, segundo definição reconhecida de
Kahn e Antonucci (1980), é fornecido por transações
interpessoais. Essas transações incluiriam três componentes: o afeto (positivo de uma pessoa em relação à outra), a
afirmação (de outras pessoas sobre os comportamentos e
percepções) e a ajuda (simbólica ou material para o outro).
Algumas hipóteses explicativas dos efeitos do apoio
social na saúde e nas doenças têm sido discutidas nomeadamente: (1) a hipótese de o apoio social ter efeitos nas
respostas neuroendócrinas, diminuindo a ansiedade e,
logo, a tensão muscular; (2) ter efeitos na auto-estima,
aumentando-a; (3) ter efeitos na depressão, diminuindoa e levando as pessoas a avaliarem os estressores como
menos graves, o que diminuiria a ansiedade e aumentaria
a capacidade da pessoa para lidar com as situações
estressantes (Seeman & McEwen, 1996).
Duas hipóteses sobre os efeitos do apoio social,
ainda podem ser destacadas: a hipótese do efeito indireto
e do direto. No primeiro caso, pressupõe-se que a pessoa
beneficiada com fortes sistemas de apoio social, quando
experimenta um acontecimento de vida estressante, tem
efeitos negativos menores em sua saúde e no seu bemestar, ou mesmo não os tem, em comparação aos indivíduos, para os quais o apoio social é pequeno ou inexistente. No caso do efeito direto, pressupõe-se que as
relações sociais promovam a saúde e o bem-estar independentemente do nível de stress do indivíduo
(Vilhjalmsson, 1994; Salovey, Rothman, Detweiler, &
Steward, 2000). Os autores consideram que ambas as
hipóteses são possíveis e que, nos dois casos, a relação
entre o apoio social e a saúde pode ser mediada, em parte, por mudanças na experiência emocional da pessoa.
Há uma série de trabalhos que sugerem a existência
da correlação entre apoio social e uma variedade de medidas dependentes, que são: a saúde, percepção de bemestar (Pierce, Sarason, & Sarason, 1992; Emmons &
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Colby, 1995; Ramos, 2002; Fuhrer & Stansfeld, 2002);
redução do mal-estar (Sarason, Sarason, Potter III &
Antoni, 1985); satisfação com a vida (Sarason, Levine,
Basham, & Sarason, 1983); resistência a doenças (Cohen,
1988); menor índice de psicopatologia (Kessler et al.,
1985; Simpson et al., 2002) e; redução do risco de suicídio
(Gaspari & Botega, 2002).
Northouse, já em 1989, descreve que as principais
fontes de apoio para mulheres com câncer de mama, são
os maridos e os membros da família, sendo também citados médicos e enfermeiras, principalmente no período de
uma hospitalização. Mulheres com o mesmo diagnóstico
são referidas como de grande ajuda na superação do sentimento de solidão e isolamento; a crença religiosa e a fé
são apontadas ainda como importante fonte de apoio.
Matsukura, Marturano e Oishi (2002), mais recentemente, pesquisando o suporte social de 113 mulheresmães, encontraram resultados semelhantes: os maridos
são os mais freqüentemente citados como fonte de suporte, seguidos por amigos(as) (19%) e filhos(as) (18%). As
demais fontes são distribuídas entre pessoas da família
(tios, sogros, avós, entre outros), profissionais especializados (terapeuta, advogado, diretor da escola) e conselheiros religiosos.
O apoio fornecido pela religiosidade/fé tem merecido destaque em estudos atuais. Inúmeras pesquisas têm
demonstrado a forte correlação entre espiritualidade e
saúde física-mental-social (Sousa, Tillmann, Horta, Oliveira & 2001; Volcan, Sousa, Mari & Horta, 2003).
A espiritualidade e o bem-estar espiritual
Durante séculos, religião e ciência ocuparam domínios separados no entendimento do homem e da vida.
Essa oposição vem sofrendo abalos significativos, desde
a virada do milênio, e o que se percebe é um interesse
mútuo de aproximação (Sousa et al., 2001).
A Organização Mundial de Saúde (1998) cada vez
mais vem reconhecendo a importância da dimensão espiritual em seu conceito de saúde, tendo incluído esse aspecto em seu Glossário de Promoção de Saúde.
Espiritualidade pode ser definida como um sistema
de crenças que enfoca elementos intangíveis, que transmite vitalidade e significado a eventos da vida. Tal crença
pode mobilizar energias e iniciativas extremamente positivas, com potencial ilimitado para melhorar a qualidade
de vida da pessoa (Saad, Masiero & Battistella, 2001).
Pode ainda ser compreendida através de um sentido
de vida, não se limitando a qualquer tipo específico de
crença ou prática religiosa. Para Solomon (2003)
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espiritualidade é uma maneira de experimentar o mundo,
de viver, de interagir com outras pessoas e com o mundo.
Envolve um conjunto de práticas e rituais, não necessariamente prece, cultos, meditação ou rituais prescritos.
A questão da espiritualidade é bastante ampla e de
mensuração complexa, sendo o bem-estar espiritual um
dos possíveis aspectos de avaliação. Por bem-estar espiritual entende-se a percepção subjetiva de bem-estar da
pessoa em relação a sua crença (Volcan et al., 2003).
O bem-estar espiritual foi identificado como um
fator de proteção, estando relacionado a atitudes positivas
de combate à enfermidade, em pacientes idosos com câncer (Fehring, Miller & Shaw, 1997).
Diversas pesquisas vêm apontando que o fortalecimento do bem-estar espiritual pode auxiliar na redução da angústia relacionada a doenças, bem como na promoção da saúde
mental. Num amplo estudo com mais de 34 mil participantes, Myers (2000) evidenciou uma nítida correlação entre
estado de felicidade e freqüência de prática religiosa.
Estudando a relação entre religiosidade e tempo de
internação, Koenig, George e Peterson (1998) constataram que pacientes deprimidos religiosos permaneceram
menos tempo internados, em relação aos não religiosos.
Luskin (2000) demonstrou que a freqüência em cultos
religiosos funciona como fator protetor para uma vasta
gama de desfechos clínicos: que vão desde tuberculose,
enfisema, suicídio até fatores de risco para câncer e nível
de dor relacionado ao câncer e a morte.
A pesquisadora e antropóloga Rabelo (1993) observou que a religiosidade tem a capacidade de dar um novo
sentido à experiência da doença, modificando a maneira
pela qual o doente e a comunidade percebem o problema,
promovendo maior alívio da dor e da aflição.
Com isso, não se está desconsiderando a importância
das religiões, que podem favorecer e estimular um estado
espiritual, mas ressaltar que o termo espiritualidade se reserva
ao lado mais elevado e sublime da vida, sendo um potencial
humano cultivado pelas pessoas, independentemente de
pertencerem ou não a uma dada religião (Roberto, 2004).
Considerações finais e conclusões
De acordo com a revisão bibliográfica, a incidência do câncer de mama mostra-se elevada, sendo a
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busca pelo diagnóstico e início de tratamento médico,
muitas vezes, prolongada e repleta de interferências e
dificuldades. Neste contexto, vê-se a necessidade real
de auxiliar a mulher com câncer de mama em seu processo de saúde-doença.
A neoplasia mamária promove uma desconcertante
alteração física, psíquica e social, sendo a adaptação à
doença e ao tratamento, muitas vezes, longa e difícil. O
seio, enquanto órgão símbolo da feminilidade, quando
alterado, pode prejudicar a percepção de identidade da
paciente. Os efeitos colaterais variam de acordo com cada
tipo de tratamento, mas pode-se perder os cabelos, sofrer
náuseas e indisposições constantes, apresentar cansaço
excessivo e, quando necessária a cirurgia, sofrer mutilação
do órgão. A mulher tende a se deparar com: o temor da
morte, a degradação da auto-imagem, problemas em relação à sexualidade e ao convívio social.
A percepção de que outras pessoas estão próximas, disponíveis a ajudar e oferecer apoio, entretanto,
pode auxiliar a paciente a enfrentar situações de
estresse. Familiares e amigos são mais freqüentemente
citados nas pesquisas como fonte de apoio significativa, mas a equipe de saúde também aparece como recurso importante para fortalecer a rede de apoio social.
Dessa forma, os profissionais de saúde precisam estar
cientes da responsabilidade sobre o acolhimento continente às pacientes com câncer de mama, compreendendo-as como um ser integral, em seus aspectos
biopsicossocial e espiritual. O entendimento de que a
paciente se apresenta em todas as suas dimensões, por
mais que a queixa, geralmente, esteja relacionada somente ao físico, facilita a criação de um vínculo coeso
entre profissional da saúde, paciente e familiares. Este
relacionamento adequado e consistente pode estimular
a participação da paciente em seu processo de adoecimento, tratamento e restabelecimento da saúde, aumentando a consciência das mulheres sobre suas vidas. Pesquisas vêm avaliando e constatando a existência
de fortes correlações entre apoio social, espiritualidade
e saúde. O entendimento desses aspectos, identificando
e incentivando as relações de apoio e ajuda, poderá refletir no atendimento mais integrado às mulheres com
câncer de mama.
A MULHER COM CÂNCER DE MAMA: APOIO SOCIAL E ESPIRITURALIDADE
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Recebido e aprovado pela Comissão Editorial em 25/6/2006 e aprovado para
publicação em 1/12/2006.
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