a persuasão do discurso do personagem macbeth e sua

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A PERSUASÃO DO DISCURSO DO PERSONAGEM MACBETH E SUA
RELAÇÃO COM LADY MACBETH NO CONTEXTO DO REGICÍDIO E SUAS
CONSEQÜÊNCIAS NO CONTEXTO ESCOLAR.
Aparecida de França Villwock1
Prof. Valdomiro Polidório2
Introdução
O presente trabalho visa demonstrar por meio da obra Macbeth de William
Shakespeare a persuasão do discurso do personagem Macbeth, bem como analisar a
relação dos personagens centrais da obra: Macbeth e Lady Macbeth contribuindo para
culminar
na
tragédia
mencionada.
Neste
intuito,
partindo
de
uma
breve
contextualização, pretende-se visualizar e entender os processos que envolvem essa
relação, assim como verificar o tipo de linguagem utilizada na constituição trágica de
frieza do ato mortal. Não deixando de abordar o contexto de tirania que o período nos
proporciona.
No propósito destas questões, visamos abordar o assunto não no sentido de
mostrar minuciosamente todos os detalhes ou desvendar os mistérios que envolvem a
relação, mas no âmbito de destacar, dentre os aspectos que atualmente são mais visíveis
e conhecidos, o que é mais interessante para um estudo didático histórico literário, no
contexto escolar nos primeiros anos do ensino fundamental.
A história trágica de Macbeth de Willian Shakespeare foi escrita no século XI,
período cuja idade média, ou idade das trevas já havia sido superada, porém não
completamente na ideologia da época, pois a igreja que era forte e repressora exercia
forte influência sobre a sociedade que já começava a perder sua hegemonia.
A tragédia de Macbeth acontece na Escócia e é constituída por uma sociedade
patriarcal, nesse sentido a sociedade é orientada e organizada pela figura masculina que
determina um líder para atribuir responsabilidades aos demais numa jurisdição. Esses
patriarcas são designados como defensores políticos do território em que impunham
certas ordens, na qual o restante deveria acatar, aceitar e respeitar.
1
Acadêmica do 4º ano do Curso de Letras Português Inglês da Universidade Estadual do Oeste do Paraná
– UNIOESTE.
2
Valdomiro Polidório, Prof. Ms. Universidade Estadual do Oeste do Paraná – UNIOESTE.
O aspecto geográfico da peça merece uma análise especial, pois Shakespeare faz
da peça com suas minuciosas descrições, um verdadeiro cenário trágico, representado
por atores que merecem respeito tanto quanto o escritor. A respeito da peça e, em
especial do aspecto em que ela é representada, inferimos sobre a figurativa atuação de
Macbeth, homem duro e sagaz que revela na posição humana uma espécie de maldade
ilimitada, pois prefere ser temido do que amado pela sociedade em que conquista.
Muito embora sua atuação deve ser, sem sombra de dúvida, referida a figura
contemplativa de Lady Macbeth, que influência as decisões do marido. Devido a sua
inveja e ambição insaciável de desfrutar do desdenhoso título de rainha, Lady Macbeth
incita o marido a matar o Rei Duncan e tomar posse do castelo, no qual como resultado
teriam pessoas que subordinadas as suas ordens lhes proporcionassem o ócio e o prazer
de gozar sob o supérfluo e sobre o poder de ser respeitado como um verdadeiro tirano.
De acordo com o desenrolar dessa tragédia temos na figura de Macbeth uma
afirmação do mal, que causa a desordem, o medo e o desequilíbrio inesperado à
sociedade escocesa do século XI. Desse modo atribui-se uma grande parcela de culpa as
mulheres, numa esfera em que as três bruxas presentes já no início da peça e Lady
Macbeth desempenham um importante papel diante da trajetória da peça e, também,
relacionada à atitude tomada por Macbeth que culmina no final trágico contado por
Shakespeare.
Ao demonstrar a predominância dos personagens referidos buscar-se-á por meio
da relação de ambos verificar que os seus atos contextualizam a peça e desencadeia a
tragédia. Nesse sentido a ironia, a linguagem habilidosa de Lady Macbeth por meio de
um discurso persuasivo e da sua argumentatividade a fim de alcançar seus objetivos,
delineia toda a obra.
A análise mais preponderante se dará sob a ótica da argumentatividade do
personagem Macbeth sendo, ou não, influenciado pelas personagens femininas da
tragédia. Com isso o discurso de Macbeth do o início até o final da peça será
evidenciado como objeto de análise para discutir a temática que constitui a peça.
1. Contexto histórico da obra Macbeth
A Escócia é o país onde ocorre a obra, no qual seu ambiente colabora para as
características da peça como ambiente escuro e pesado com crimes, medo e
insegurança. Todos esses fatores culminam na inversão de valores e na desordem,
quando Macbeth em harmonia com a esposa Lady Macbeth assassinam o rei Duncan,
por isso que a atitude de ambos pode ser considerada em toda a obra de modo desleal,
maquiavélica e impiedosa. O contexto de Macbeth é envolto por ambições frustradas e
“ganância”, que impulsionaram a atitude de Macbeth sobre o Rei.
Banquo e Macbeth ao voltar de uma batalha encontram três bruxas que são
consideradas três estranhas irmãs que trazem agouro e má sorte, mas elas dizem coisas
que mexem com o sentimento de Macbeth, o qual recorre à esposa para contar o
acontecido. Nesse sentido podemos observar a fala das três bruxas ao encontrarem-se
com Macbeth. Quando é que vamos nós três encontra-nos outra vez? Com chuva, raio
ou trovão? Terminada a agitação, ganho o combate e perdido. Antes de o sol ter caído.
A charneca é o lugar para Macbeth nos achar. Já vou, Gato Cinzento! O Sapo está
chamando! Estou indo! O bom é o mal, e o mal e o bom. Vamos planar entre a neblina
e a impureza do ar. (Macbeth, Ato I, Cena I)
Desse modo Macbeth e sua mulher tramam minuciosamente para matar o Rei e
se tornarem os novos governantes da Escócia. A princípio Macbeth demonstra
insegurança, medo e arrependimento por ter construído tal projeto. Macbeth tenta
argumentar para a esposa na cena VII, ato I, dizendo que
Se, consumada a ação, tudo findasse, então seria bom agir de pronto,
se o assassínio prendesse em suas malhas todas as conseqüências e
alcançasse pleno sucesso com exterminá-las, se o golpe fosse tudo e o
fim aqui neste banco de areia e no baixio da vida, arriscaríamos a
eternidade. Mas nestes casos julgam-nos aqui, e assim damos tão-só
lições sangrentas que contra que as dá sempre se voltam, com suas
mãos isentas a justiça, aos nossos próprios lábios proporciona o
nosso cálix de mortal conteúdo. Ele está aqui sob dupla segurança:
primeiro sou parente e súdito dele, duas fortes razões contra o
atentado; depois, hospedo-o: devo ao assassino fechar a porta e não
trazer eu próprio a faca.
Lady Macbeth tira a faca das mãos de Macbeth, o qual se encontra com sangue,
então, eles rapidamente as lavam antes de despertar os outros para avisá-los sobre os
assassinatos. Nesse momento é que inicia o processo da consciência atribular a mente de
ambos, pois mesmo lavando as mãos várias vezes, o casal não consegue perder a culpa
do ato. Como esperava Macbeth ele torna-se rei, mas como os conflitos em si e para si
continuam, logo ele começa a temer Banquo, que ouvira as profecias das bruxas. De
acordo com uma tragédia estrategicamente bem trabalhada, inevitavelmente, Macbeth
assassina Banquo, com o intuito de eliminar hipóteses de problemas. No entanto, o
assassinato fica em sua mente e atormenta-o a todo tempo com o fantasma de Banquo
perseguindo-o. Com isso vemos que Macbeth fica cada vez mais nervoso, e a culpa
começa a atormentá-lo, consequentemente suas ações se tornam ainda mais cruéis. Ele
descobre que sua mulher enlouqueceu por não conseguir controlar seus tormentos
psicológicos pelos crimes que havia cometidos e se mata. Macbeth também é morto em
batalha por Macduff.
2. A relação de Macbeth com Lady Macbeth e suas conseqüências.
A relação de Macbeth e Lady Macbeth na obra é uma relação de amor e
cumplicidade. O casal utiliza de artimanhas para matar o rei Duncan e assim, apoderarse do trono. Macbeth muitas vezes pôs-se a refletir e até mesmo tentando argumentar
para desistir do plano, porém Lady Macbeth provoca-o incessantemente mexendo com
sua masculinidade, revelando sua frieza em relação à morte, articula seus atos, os quais
influenciam na opinião do marido, como salienta Lady Macbeth no ato I da cena VII
A Esperança com a qual vós trajáveis estava bêbada? Dormiu depois
e acorda agora para olhar, tão pálida e verde, o que ela fez sem ser
forçada? Teu amor crê-lo-ei também volúvel de ora em diante.
Receia ser o mesmo, em ato e destemor, o que és em vontade?
Quisera ter o que tu mesmo julgas, o ornamento da vida, mas vivendo
como um covarde no teu próprio juízo, seguindo um “desejara” com
um “não ouso”, como o mísero gato do provérbio?
Lady Macbeth mergulha em seu imaginário vigoroso e sem medo de percorrer
fronteiras, ela com uma maneira particular de conduzir o marido é companheira no
intuito de atingir sua meta. Com linguagem persuasiva e habilidosa o qual percorre toda
peça, Lady Macbeth busca por meio de suas qualidades impulsionadoras mostrar a
Macbeth que ele está se acovardando diante dos fatos e do que esta combinado.
Ducrot (1987 p. 16) chama a atenção para a argumentação evidenciando que
“Ela é usada como forma de manipular pontos de vista, de produzir uma constituição
pessoal e ideológica, visando atingir seus objetivos”. Na relação de Macbeth e Lady
Macbeth conseguimos, a partir de seus discursos, refletir sobre a “pragmática
lingüística” denominada por Ducrot, pois ele acredita que a argumentação esta na
língua, isto é, que as conclusões tiradas dos enunciados pelos interlocutores devem ser
captadas nos recursos lingüísticos presentes.
A linguagem de Lady Macbeth traz marcas formais de um processo
argumentativo que leva o interlocutor a certas conclusões sobre o assunto abordado.
Assim ressalta POLIDÓRIO (2007, p. 4 ) “de que a tragédia consegue abordar de uma
maneira muito profunda questões do bem e do mal. Percebermos isso através dos atos
dos personagens que, ao longo da peça vão sendo construídos, bem como as falas que
vão caracterizando cada personagem”.
Em Shakespeare os personagens não se revelam, mas se desenvolvem e o fazem
porque têm a capacidade de se auto-recriarem. Às vezes, isso ocorre porque,
involuntariamente, escutam a própria voz, falando consigo mesmo ou com terceiros.
Para tais personagens escutar a si mesmo constitui o nobre caminho da individuação, e
nenhum outro autor, antes ou depois de Shakespeare realizou tão bem o verdadeiro
milagre de criar vozes, a um só tempo, tão distintas, e tão internamente coerentes, para
seus personagens principais. (BLOOM, 2000, p. 19)
Nessa intrínseca relação é possível observar que as tragédias de Shakespeare são
embebidas dos aspectos humanos, ou seja, apesar do período ser, predominantemente,
constituído pela força opressora da igreja, nesse sentido, vemos que as tragédias
shakespeareanas abordam temáticas inerentes aos homens e não aos deuses, o que faz
com que inove o gênero do teatro, pois coloca o homem no centro das atenções: o palco.
O que faz-nos inferir sobre Shakespeare como “um profundo conhecedor da alma
humana” (POLIDÒRIO, 2007, p. 7).
Bárbara Heliodora (1997) remete-se a Shakespeare de forma preocupada, ela
“fala” de Shakespeare com determinação e essa firmeza de expressão é visível, pois
envolve suas análises e percepções, que surgem com sua dedicação sistemática de
pesquisadora, porque ela consegue compreender o jogo psicológico de poder entre os
personagens, que culmina na dialética do ser humano existir.
Para alguns críticos os personagens Macbeth e Lady Macbeth são cruéis por
natureza, sendo os dois parceiros e, ao mesmo tempo maldosos e com isso a parceria
ganha forças necessárias para obter o êxito desejado, que é tomar o caminho direto para
o trono.
De acordo com a psicóloga e professora Lídia Rosenberg Aratangy que
desenvolve estudos a partir da relação estabelecida entre casais, dependendo do tipo da
relação, há conseqüências drásticas. Um acontecimento gera outro e assim
sucessivamente desencadeiam-se novos acontecimentos, mais fortes e marcantes para o
casal. Com o passar dos anos e das experiências vivenciadas a pessoa não é mais a
mesma, aquele ingênuo ser humano que se propôs dividir sua vida com outra pessoa
muda, pois acontecem mudanças e evoluções que caracterizam o novo ser diante o
matrimônio. Macbeth e Lady Macbeth ficam procurando as afinidades e negando as
diferenças, principalmente quando decidem ir em frente com o plano mortal, é esse o
momento em que observamos a estreita faixa de interesses comuns. As mulheres, em
geral, estão mais dispostas a abdicar do que gostam e terminam virando reflexo do
marido, porém em Macbeth acontece o contrário, apesar do personagem ter
personalidade forte e ser um homem valoroso, ele é subordinado por Lady Macbeth, e
vive a sua sombra, espera as argumentações de Lady, muito embora tente durante o
período anterior ao assassinato contra-argumentar a esposa para não executar a ação, a
qual foi muito bem articulada por Ela.
A subordinação de Macbeth não é estranha aos olhos do leitor, pois a mulher
possui qualidades e habilidades suficientes para conduzir o homem. Não podemos
esquecer que os homens foram educados por mulheres. Aliás, eles deveriam usar isso
em sua defesa com mais freqüência. O filhote humano é mergulhado num caldo de
progesterona desde que nasce até pelo menos a adolescência, com mãe, avó, tia, babá,
professora, um conjunto de mulheres que, em geral, falam mais do que deveriam.
Enquanto perdurar esse esquema, vamos ter homens com dificuldade de falar sobre
sentimentos e mulheres se sentindo vitimizadas, sacrificadas enquanto que os homens
serão, em sua grande maioria, subordinados. Podemos verificar a linguagem persuasiva
de Lady Macbeth na Cena VII do Ato I,
Então que bruto vos levou a falar-me desta empresa? Quando
ousáveis faze-la é que éreis homem, e, sendo mais do que éreis, vós
ainda sereis mais homem. Nem lugar nem tempo eram então
propícios e contudo, querieis criar os dois: os dois se criaram e são
propícios, e isso vos abate. Já amamentei e sei que doce coisa é amar
a criança que se aleite enquanto ela sorrisse diante de meu rosto, eu
tirar-lhe ia o bicho do meu seio, da boquinha sem dentes e far-lhe-ia
saltar os miolos, dado que eu houvesse jurado agir, tal como vós
fizestes.
Torna-se possível verificar no contexto dessa relação, o poder de sedução
presente na linguagem, bem como nas estratégias utilizadas. Consideramos, entretanto,
que a palavra proferida pelo personagem torna-se legítima para o momento, servindo,
no entanto para reforçar idéias, direcionar opiniões, contrastar elementos e por fim
mascarar a realidade, “Que animo fraco! Daí-me cá os punhais. Os que dormem e os
mortos não são mais do que retratos, é o olhar da infância que receia a pintura de um
demônio. Se ele sangrar, eu dourarei de sangue o rosto dos rapazes, pois a culpa
precisa parecer que é deles”. (Macbeth, Ato II cena II)
A condição de Lady Macbeth é representada como superior a Macbeth, o qual
precisa ser submisso, embora no início da obra Macbeth não conseguisse aceitar sua
proposta, mas foi condicionado a aceitar. Com o desenrolar da peça e a tirana posição
de Macbeth, Lady Macbeth percebe, ao mesmo tempo em que o marido, que a vida
passa não ter sentido, as imaginações e as lembranças são mais fortes em si que a
posição de poder que lhe é dado. Com o psicológico abalado Lady Macbeth mostra sua
insensatez referindo-se as mãos,
Fora, mancha maldita! Fora estou dizendo! – Uma, duas: ora, então é
tempo de faze-lo. – O inferno é escuro. – Que vergonha, meu senhor,
que vergonha! Um soldado e com medo? – Por que precisamos temer
quem sabia, quando ninguém pode chamar a contas nossa autoridade?
– Mas quem haveria de imaginar que o velho tivesse tanto sangue?
(Ato V, cena I)
O remorso inibe-os, mas o problema está na circunstância de que sangue atrai
sangue, ou seja, morte atrai mais mortes, como se uma nova morte o alimentasse, o
fortalecesse e resolvesse seus problemas. Começa, portanto, seu declínio psicológico e
moral. A seguir, o remorso enlouquece-os, conduzindo Lady Macbeth ao suicídio e
Macbeth ao combate mortal.
3. O discurso de Macbeth como objeto de investigação.
O personagem Macbeth na peça é um guerreiro poderoso, bom e fiel ao rei. “O
serviço e a lealdade que vos devo encontram paga ao se fazerem ato. Compete-vos,
Alteza, receber nossas obrigações, obrigações que para vosso trono e vosso estado são
filhos e são servos, e estes fazem apenas o que devem, ao fazerem quanto podem por
vosso afeto e glória”. (Macbeth, Ato I, Cena III).
Mas com o desenrolar da história, ele torna-se um homem dominado pela
esposa, e também por sua própria ambição. Por ele ter personalidade forte e ser
respeitado, Macbeth não conseguia conviver com a submissão delegada pela esposa. No
início da obra há evidência sobre sua personalidade, Macbeth é irônico ao visualizar as
três bruxas e assim inferi sobre elas: “No ar. O que nos parecia corpo, no vento se
fundiu, tal como um sopro. Por que é que não ficaram? Bom seria!”(Ato I Cena II)
São notáveis as estratégias discursivas usadas para a construção do sujeito
histórico, contudo o personagem busca por meio de seu discurso tentar convencer Lady
Macbeth a mudar seu posicionamento “não vamos prosseguir nessa empreitada: ainda
a pouco ele cobriu-me de honras e entre todas as classes de pessoas vim a adquirir
reputação de ouro: devo envergá-la no seu novo lustre e não po-la de lado assim tão
cedo”. (Cena VII, ato I). Mas ele se encontra com o discurso sólido de Lady que
provoca-o insistentemente, com objetivo de chegar ao trono. Porém Macbeth continua a
discursar na esperança que a esposa desista do projeto “Quieta, eu te peço. Atrevo-me a
fazer o que se ajuste a um homem; quem se atreve a mais homem não é, e se
falharmos?” (Cena VII, ato I). Porém, com a argumentação de Lady Macbeth ele
convence-se de que é, realmente, um homem mal.
De acordo com Hobbes (1999, p. 141) “O verdadeiro e o falso são atributos da
linguagem, não das coisas. E onde não há linguagem, não há verdade nem falsidade”,
pois para Hobbes o homem é lobo do homem, porque conforme a necessidade um come
o outro, sem mesmo refletir sobre as conseqüências. Diz Macbeth (Cena VII, Ato I)
Já resolvi: acham-se retesadas todas as faculdades de meu corpo,
prontas para o terrível feito. Vamos! Que um belo aspecto engane
todo mundo! Esconda um ar fingido a intenção nutrida pelo falso
coração.
Após a decisão tomada pelas palavras de Macbeth, notamos no desenrolar da
peça que as conseqüências já começam a surgir, pois por meio do psicológico
conturbado ele já começa a construir a cena do crime “é um punhal que vejo em minha
frente, voltado ao cabo a minha mão? Pois vamos que eu te empunhe. Não te pego, mas
continuo a ver-te.” (Macbeth, Cena I, Ato II)
Na noite da visita do rei, Macbeth mata-o, o ato que de acordo com alguns
críticos não é visto pela platéia, deixa-o tão abalado que Lady Macbeth tem que assumir
o controle da situação. De acordo com o seu plano, ela incrimina os criados de Duncan,
adormecidos por causa da bebedeira da noite anterior, colocando punhais sujos de
sangue em meio a eles. O personagem de Macbeth no momento do assassinato faz uma
escolha, ele opta pelo mal, volta-se para o que há de pior em sua natureza e sente-se
orgulhoso por ter coragem de decidir, ao fato que corre até Lady Macbeth para contar o
feito “já consumei a ação. Não ouviste um barulho? Agora”. (Cena II, Ato II). Porém
Macbeth tinha consciência do mal e do bem, agiu por ganância e por obtenção do poder,
mas sabia perfeitamente, a força de seu ato, tanto que em um diálogo com Lady
Macbeth ele a questiona da seguinte maneira: “Por que não consegui dizer “Amém”?
Embora eu precisasse de uma benção, o “Amém” ficou-me preso na garganta”. (Cena
II, Ato II). Essa fala de Macbeth evidencia o fato de ele saber a força da palavra e que a
mesma se remetia às forças do bem, o que contraria o seu perfil como homem.
O personagem se torna alienado da consciência ao passo que não conseguia
dormir, ou seja, além de ter assassinado o rei, ele acabara com sua paz, assassinou,
desse modo seu sono também.
Escutei uma voz bradar, acho eu: “Não durmas mais! Macbeth trucida o
sono” – o sono cheio de inocência, o sono que cirze a emaranhada teia da
inquietude, o fim da vida de qualquer dos dias, o banho do trabalho
cansativo, bálsamos dos espíritos feridos, prato número dois da Natureza,
manjar mais forte no festim da Vida. (Cena II, Ato II)
Nesse contexto da peça Macbeth já está sendo tomado pelos seus pensamentos,
pois o sentimento de culpa está vindo a tona e o seu discurso acaba sendo simples
prescrição de seus pensamentos deliberados de covardia e de medo, a medida em que
torna-se perceptível que Lady Macbeth é muito mais forte físico e psicologicamente
que ele, pois mediante seu discurso ele evidencia o arrependimento, ao passo que ela
não. A menção que Macbeth faz, demonstra seu posicionamento,
Eu teria vivido um doce tempo, caso houvesse morrido uma hora
antes, na sorte humana desde esse momento, nada existe que tenha
algum valor; mortes bondades e fama, tudo é palha: está esgotado o
vinho da existência, e nesta adega só restou a borra. (Cena III, Ato II)
Muitos acreditam que a peça é "amaldiçoada", e nem mesmo mencionam seu
nome em voz alta, referindo-se a ela como "The Scottish play” ("A peça escocesa").
Shakespeare certamente objetivava apresentar uma situação com o intuito de despertar o
sentimento no público, pois quando há tragédias de qualquer aspecto o público opina
apontando os culpados. Vemos, entretanto que apesar do arrependimento de Macbeth
ele não conseguia, a partir de seu ato, enxergar a beleza da vida, não valorizando o que
ele havia conquistado, vemos essa menção em sua fala na Cena I do Ato III,
Nada é ser Rei, a menos que tenhamos segurança: nosso temor de
Banquo fere fundo, e reina em sua régia natureza aquilo que é preciso
ser temido. Ele ousa muito, e a corajosa têmpera de sua alma
acrescenta a sensatez que faz o seu valor agir seguro. Pessoa alguma
eu temo, a não ser ele, diante de quem meu gênio se intimida como
ante Cézar o de Marco Antônio conta-se.
Macbeth articula seu personagem demonstrando não ser ele o verdadeiro
assassino do rei, de forma que podemos analisar a reação humana diante do poder, das
relações sociais e do seu reconhecimento diante da fatalidade da vida. Macbeth mascara
seu discurso, que faz de forma muito bem argumentada, inferindo sobre o assassinato.
(Macbeth, Cena I, Ato III)
Fiz isso e fui mais longe, e isso é agora o objeto deste novo encontro
nosso. Domina a tolerância em nossa índole, que podeis suportar
coisa assim? Achai-vos imbuídos do Evangelho a ponto de rezar pelo
bom homem e sua prole? Com a pesada mão ele não vos vergou para
o sepulcro e empobreceu os vossos para sempre?
Os protagonistas da peça vão sendo imbuídos pelos pensamentos, à medida que
Lady Macbeth começa a arrepender-se pelo feito. Embora que para manter-se no poder
foi preciso continuar matando, momento em que nos encontramos novamente com as
concepções de Hobbes (1983) que se refere sobre a natureza humana e sobre a
necessidade de se tornar mais forte e mais inteligente em um contexto em que ele já não
pode mais ser amado, então, ele precisa ao menos ser temido e quando alguns direitos se
tornam escassos surge, então, uma guerra de todos contra todos, durante a qual Macbeth
é morto.
4. O uso de textos literários em aulas de língua inglesa no Ensino Fundamental.
O presente estudo argumenta em relação ao uso da obra de Shakespeare –
Macbeth nas séries iniciais do ensino fundamental, com o intuito de trabalhar a
Literatura Inglesa. Essa possibilidade se amplia por se tratar de uma temática trágica de
frieza e mortes desencadeadas pela persuasão da figura feminina de Lady Macbeth,
torna-se possível desenvolver dentro dessa perspectiva literária shakespeareana um
amplo conhecimento histórico por meio da linguagem literária. De acordo com
POLIDÓRIO (2007, p. 70) o uso de textos Literários contribui no sentido de
ampliar os horizontes dos alunos ao trabalharem com clássicos da
literatura, melhorar a consciência cultural dos alunos, estimular a
imaginação e criatividade literária dos alunos e desenvolver seu gosto
pela literatura, proporcionar ao aluno o contato com obras das
literaturas britânica e norte-americana como uma experiência
educativa e adicionar conhecimento de mundo ao conhecimento já
adquirido.
Percebemos, entretanto, quando se menciona sobre obras literárias aos alunos,
que a questão “aceitação” é relevante. E quando nos referimos a Shakespeare sob a
ótica de peças teatrais com textos curtos a aceitação torna-se preponderante, porém ao
adentrar na análise das falas dos personagens e do contexto do período nos deparamos
com obras que possuem vasta profundidade. Assim afirma POLIDÓRIO (2007, p. 70)
que
Em relação às reações dos alunos, os resultados mostraram que o
gênero literário mais efetivo para ajudá-los a desenvolver suas
habilidades lingüísticas e consciência cultural era o romance. O
gênero literário drama foi considerado pelos alunos como sendo
relevante para auxiliá-los a melhorar suas expressões orais e a obter
autoconfiança, ao usar essas expressões. Já, a poesia e os contos não
foram considerados importantes para desenvolver habilidades
lingüísticas.
Desse modo o professor é o principal responsável em selecionar e enfatizar as
obras literárias no contexto escolar. POLIDÓRIO (2007, p. 71) lembra que “essa
seleção está diretamente ligada aos objetivos e resultados esperados pelo professor que
se propõe a fazer uso de textos literários nas aulas de língua inglesa”. Por isso torna-se
possível inferir que as temáticas shakespeareanas requerem um “certo cuidado” ao
adentrá-las, para não correr o risco de abordar o seu conteúdo de maneira simplória, ou
como pretexto para o ensino, devido à profundidade de suas abordagens. Com o uso da
literatura é possível fazer com que o aluno tenha possibilidade de contextualizar o
período em que a obra foi escrita, bem como os aspectos mais importantes ressaltados
na sociedade destacada, trabalhando literatura e história de forma íntima. De acordo
com OTTONELLI, (2008, p.4) “pelo texto literário é possível, muitas vezes, apreenderse muito mais sobre a História de um povo, pelas diferentes perspectivas com que esta
pode enfocar os eventos do passado, do que em muitos textos oficiais, contidos em
livros da disciplina específica”.
O ensino de literatura nas séries iniciais do ensino fundamental requer
aprofundar reflexões relacionadas ao contexto social dos alunos e discutir temáticas
importantes para o desenvolvimento reflexivo dos alunos como sujeitos ativos e
construtores da história. Para POLIDÓRIO (2007, p. 73) “um texto riquíssimo como o
literário deveria ser mais utilizado pelos professores, pois através do enredo e das
temáticas diversas que podem ser trabalhadas e discutidas com os alunos, a aula pode
ficar mais dinâmica”.
Ao analisarmos as tragédias de William Shakespeare, temos que
considerar todos os aspectos relevantes na construção dos
personagens. Como se trata do gênero drama, as falas das
personagens nos fornecem todo o material de análise que
necessitamos. Ao analisar um texto em prosa sofremos a influência
do narrador, porém quando analisamos uma tragédia shakespeareana,
não temos um narrador, e sim as falas, as quais são muito ricas.
(POLIDÓRIO, 2007, p. 3)
O uso da literatura por meio das peças teatrais de Shakespeare nas séries iniciais
do ensino Fundamental é relevante, porque “o teatro shakespeariano inovou toda uma
cultura dramática, pois agora o homem estava no centro do palco. Shakespeare explorou
conflitos do homem e não de deuses”. (POLIDÓRIO, 2007, p. 5) É devido a isso que
suas temáticas são consideradas altamente reflexivas e, portanto, consagradas e
importantes “para a representação da vida em sua crua realidade” (MORAIS, 2005, p.
19 apud POLIDÓRIO, 2007, p. 5), ou seja, para conseguir representar a vida é preciso
conhecer suficientemente bem o seu objeto de análise: o homem. De acordo com o
próprio (SHAKESPEARE, 1981, p. 315) “conhecer bem um homem, seria conhecer-se
a si mesmo”.
Considerações finais
O presente artigo se baseia na obra de William Shakespeare “Macbeth” e o
discurso dos personagens. A partir desse pressuposto torna-se possível perceber que
relatando o contexto histórico literário da peça aflora nos alunos sentimentos inerentes
as suas práticas reais, deixando-os sensíveis a sentimentos profundos.
Na realidade, o que se percebe é que o homem se vê mergulhado num mundo
onde tudo parece muito óbvio e técnico, onde o mais importante é fazer, criar e ter. Os
meios e os instrumentos materiais passam a ser mais importantes do que os próprios
valores humanos, pois muitas vezes são colocados em segundo plano. De modo que as
relações humanas estão se tornando cada vez mais mecânicas e os sentimentos de
solidariedade e cooperação estão menos predominantes em nosso meio.
Bloom (2001) em suas considerações define Macbeth como a fantasia, a crença
no fantástico: ele crê tão profundamente na profecia das bruxas, que passa a definir
todos os seus atos baseados na sua imaginação. É demasiada toda sua fé. Desse modo
Lady Macbeth sustenta a trajetória de Macbeth, porque a princípio ela imaginava-se
forte o suficiente para arcar com as conseqüências do ato mortal, pois ela de fato quer o
reino e não mede esforços persuasivos para consegui-lo através das mãos sanguinárias
do marido. Ela usa no início da peça os mais sórdidos argumentos para incitar Macbeth
e obtém resultados satisfatórios. Shakespeare explora a ambição desmedida e os
escrúpulos aristocráticos e é exatamente essa ambição assassina que faz o público se
comover com a exposição dessa faceta.
Analisar Shakespeare é realmente muito difícil, pois torna-se necessário
conhecer um pouco de si, o seu jogo lingüístico e principalmente sua astuta inteligência
em mexer com o sentimento do público. Shakespeare consegue desenvolver um tema
dentro de um contexto social pertinente para a época e consegue inculcar seus valores
por meio da sua linguagem determinantemente persuasiva.
Desse modo, com a fundamentação teórica abordada é possível afirmar que o
texto literário é relevante no ensino de língua inglesa na escola, bem como a inserção
em temáticas inerentes a vida cotidiana dos alunos.
Assim como educador consciente da importância dos seres humanos formadores
e críticos, buscamos mostrar a importância da literatura e as temáticas por ela
apresentadas, principalmente porque vivemos em um mundo capitalista e individualista,
e precisamos cada vez mais nos sociabilizar para reformular as reflexões pertinentes aos
seres pertencentes a essa sociedade.
Referências:
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José Roberto O´Shea)
DUCROT, O. O dizer e o dito. Campinas: Pontes, 1987.
HELIODORA, B. Falando de Shakespeare. São Paulo e Rio de Janeiro: Perspectiva,
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HOBBES, T. O Leviatã ou matéria, forma e poder de um estado eclesiástico e civil.
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