da publicação

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UNISAL
AILEN ROSE BALOG DE LIMA
METODOLOGIA DA EDUCAÇÃO MUSICAL:
FAZENDO DA DOCÊNCIA UMA ARTE
AMERICANA
2010
UNISAL
AILEN ROSE BALOG DE LIMA
METODOLOGIA DA EDUCAÇÃO MUSICAL:
FAZENDO DA DOCÊNCIA UMA ARTE
Dissertação apresentada como exigência
parcial para obtenção do grau de Mestre em
Educação à Comissão Julgadora do Centro
Universitário Salesiano, sob a orientação da
Profª. Dra. Norma Silvia Trindade de Lima.
AMERICANA
2010
BANCA EXAMINADORA
_______________________________________________
Profª. Drª. Norma Silvia Trindade de Lima
Orientadora
UNISAL
_______________________________________________
Prof. Dr. Jetro Meira de Oliveira
Membro Externo
UNASP
________________________________________________
Prof. Dr. Luís Antônio Groppo
UNISAL
Dissertação defendida e aprovada em _______________ de 2010
RESUMO
O presente trabalho surgiu da observação do quadro da educação musical no
contexto escolar, associada à proposição da sistematização de uma
metodologia de ensino para futuros professores de educação musical, com o
propósito de auxiliar a docência musical na sua fase inicial, tornando a prática
mais sequencial e prazerosa, contribuindo assim para uma ressignificação do
trabalho musical. Para tanto, foi feito um levantamento do caminho
historicamente percorrido pelo ensino de música na educação brasileira, desde
seu surgimento, passando pelas reformulações feitas ao longo dos séculos e à
luz dos dispositivos legais criados para sustentá-las. Em continuidade à
pesquisa são apresentados os conceitos com detalhes das concepções da
educação musical como ensino-aprendizagem a partir dos estudos feitos pelos
educadores. É feita ainda a apresentação dos principais educadores musicais
do século XX e especificamente alguns educadores no Brasil, que contribuíram
e influenciaram a construção do que hoje se entende por educação musical.
Para finalizar foi apresentada a sistematização de uma metodologia de ensino
a partir das minhas práticas e experiências na educação musical e suas
implicações.
Palavras-chave: Metodologia de ensino. Educação Musical. Formação de
educadores musicais.
ABSTRACT
The present work arose of the observation of the chart of the education musical
education in the school context, associated to the proposition of the
systematization of a methodology of education for future musical education
teachers, with the purpose of helping the musical teaching in his initial phase,
making the practice more sequential and enjoyable, contributing so to a
redefinition of the musical work. For this, there was done a lifting of the way
historically passed by the teaching of music in the Brazilian education, from his
appearance, passing by the reformulations done along the centuries and by the
light of the legal devices created to support them. Continuing the search
concepts are presented with details of the conceptions of music education as
teaching and learning from the studies made by educators. It is still done the
presentation of the principal musical educators of the century XX and
specifically some educators in Brazil, who contributed and influenced the
construction of what today is meant for music education. To finish was
presented the systematization of teaching methodology from my practice and
experience in music education and its implications.
Key-words: Methodology of teaching. Musical education. Formation of musical
educators.
AGRADECIMENTOS
A Deus,
Toda Glória, honra e louvor, pois sem Ele nada seria possível.
À família
Meu esposo Lima, que me acompanhou em todo este período, me apoiando e
incentivando, sempre me ouvindo nos momentos mais difíceis nesta conquista.
Minha filha Liane Rose que mesmo sentindo minha falta, soube entender
minhas ausências.
Aos meus pais que sempre me apoiaram em todos meus estudos e
empreendimentos.
À minha orientadora Profª. Drª. Norma Silvia Trindade de Lima
Especial gratidão, pela motivação, apoio e condução de meus passos por
caminhos antes desconhecidos. Obrigada por tudo.
Aos mestres
Obrigada pelas contribuições e sugestões apresentadas, e em especial ao
Prof. Luis Antonio Groppo pelo estímulo para prosseguir com ideias e
sugestões para desenvolver o trabalho. Ao Prof. Jetro de Oliveira pelas
contribuições e por sua participação na banca.
Aos meus amigos
Que me acompanharam e deram força estando sempre presentes. Tenho
muitos amigos que são especiais, mas quero agradecer especialmente a Ellen,
que mais que uma coordenadora é minha grande amiga, que me deu muita
força para fazer este mestrado compartilhando comigo todos os momentos
desta caminhada e me auxiliando com materiais para que pudesse desenvolver
melhor este trabalho. Muito Obrigada.
Aos meus colegas do mestrado que me acompanharam nestes dois anos
quero agradecer pelo companheirismo, e em especial ao Bibiano que fez todas
as disciplinas e os trabalhos para apresentação comigo. Obrigada pela força.
A Instituição
Agradeço imensamente à direção geral e acadêmica do UNASP (Centro
Universitário Adventista) aonde trabalho há 15 anos, pelo incentivo e apoio
financeiro total neste período. Quero agradecer aos que colaboraram e me
substituíram em minhas ausências, em especial os que trabalham diretamente
comigo, como a Cecília, Adriana, Prof. Vandir, Ester e Luis. Obrigada pelo
apoio.
Alunos e colaboradores
Agradeço aos meus alunos da graduação que me ajudaram na busca de
materiais e imagens.
Enfim, quero agradecer a todos que contribuíram, direta ou indiretamente, para
esta realização.
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO.................................................................................................... 8
1 A FORMAÇÃO DOS PROFESSORES DE MÚSICA PARA UM CONTEXTO
ESCOLAR CONTEMPORÂNEO ............................................................... 12
1.1 A formação inicial de professores de música ....................................... 19
1.2 A formação e opinião dos licenciandos ................................................ 29
2 A EDUCAÇÃO MUSICAL ESCOLAR NO BRASIL NO CONTEXTO DAS
LEGISLAÇÕES E REFORMAS EDUCATIVAS ........................................ 31
2.1 A educação no Brasil conforme os Parâmetros Curriculares Nacionais ..... 31
2.2 História da Educação Musical e tendências das práticas pedagógicas ...... 43
3 CONCEPÇÕES DA EDUCAÇÃO MUSICAL E METODOLOGIAS APLICADAS.. 50
3.1 O sentido e o significado da Educação Musical ................................... 50
3.2 A música no currículo escolar............................................................... 57
3.3 Considerações sobre a Educação Musical: aportes e concepções ...... 60
3.4 Fundamentação teórico-filosófica da Educação Musical ...................... 65
3.5 Contribuição teórica de educadores ..................................................... 72
3.5.1 Educadores musicais e metodologias aplicadas ......................... 81
3.5.2 Métodos ativos em musicalização infantil ................................... 82
3.5.3 As concepções e contribuições de alguns educadores musicais
brasileiros .................................................................................... 89
4 RELATO DE EXPERIÊNCIA: RESSIGNIFICANDO CONCEITOS E
PRÁTICAS PARA O ENSINO DA MÚSICA ............................................... 94
4.1 A Educação Musical no contexto escolar ............................................. 99
4.2 A prática musical a partir de atividades lúdicas e de integração
coletiva ............................................................................................... 100
4.3 Coral: Projeto Musical: “CUCO” na escola ......................................... 123
CONCLUSÃO ................................................................................................. 134
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS .............................................................. 139
8 INTRODUÇÃO
Desde a implantação da Educação Artística na grade curricular do
ensino fundamental, com a promulgação da Lei de Diretrizes e Bases da
Educação de 1971 (Lei nº 5.692/71), a área musical vem, gradativamente,
perdendo o significado na sala de aula. Apesar de incluída no currículo escolar,
foi considerada atividade educativa e não disciplina. Consequentemente
surgiram dificuldades em relação a adaptações do docente, que foi obrigado a
fazer cursos de complementação em artes plásticas, musicais e cênicas,
abrangendo toda a Educação Artística, e a tornar-se polivalente.
Devido a esse contexto acadêmico, foram poucas as escolas que
conseguiram manter uma prática musical constante e efetiva; muitas focaramse em projetos alternativos, que aconteciam conforme a especialidade do
professor. Em consequência, a música tornou-se ausente da maioria das
grades curriculares do ensino fundamental, inviabilizando o acesso de todos os
alunos a ela de maneira democrática.
A partir de 1996 a Arte foi reconhecida pela lei nº 9.394/96 (artigo 26,
parágrafo 2º) como conteúdo obrigatório, e retomou não somente seu espaço
na grade curricular, como se incorporou igualmente a todas as disciplinas
escolares, fator de considerável relevância às distintas áreas de conhecimento.
Porém, quando comparada a outras disciplinas escolares, consideradas “mais
necessárias”, frequentemente o ensino de Arte acaba subjugado a um mero
passatempo decorrente da falta de especialização dos professores em geral.
A Lei 11.769, publicada no Diário Oficial da União (D.O.U.) de 19 de
agosto de 2008 altera a atual Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional,
instituindo a obrigatoriedade do ensino de música nas escolas brasileiras.
A partir de tais parâmetros legais e dada a importância da disciplina de
Arte, cabe conceituar a música como vertente fundamental no contexto
acadêmico. Esta pode significar desde a atividade de cantar em sala de aula,
via métodos tradicionais de educação musical, ou trabalhos desenvolvidos
dentro de uma visão contemporânea. Aqui deve-se levar em consideração não
9 só as diversas maneiras de nos relacionarmos com a música, num verdadeiro
contexto interdisciplinar, como também associarmos a ela os diversos
contextos culturais, por meio de um repertório que tenha significado e que parta
dos alunos, valorizando a vivência das crianças, trazendo benefícios a outras
áreas do currículo. Tal posicionamento possibilita desta forma uma nova
maneira de abordar os conteúdos das outras disciplinas, bem como um
crescente desenvolvimento de memória, concentração e sensibilidade.
O Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil – RCN
(BRASIL, 1998) destaca que a música tende a ficar em segundo plano na visão
acadêmica da escola ou como suporte para atender a vários propósitos, como
a formação de hábitos, atitudes e comportamentos. Além de atividade de apoio
a outras disciplinas, é igualmente associada a datas festivas e cívicas ou, ainda
relacionadas às atividades mecânicas e estereotipadas sem finalidade
educativa definida.
Existem métodos e técnicas de ensino musical que têm alcançado
propósitos relevantes para o aprendizado, porém ainda há uma lacuna no
tocante à criação de uma metodologia própria para o iniciante da docência
musical, direcionada ao público infantil, bem como à valorização desta prática.
Encontram-se dificuldades para harmonizar as metodologias já existentes e, a
partir dessa integração, gerar um novo caminho para o ensino de música, que
tenha a possibilidade de evidenciar práticas eficazes e prazerosas para quem
aprende e para quem ensina, sobretudo os iniciantes.
Há, contudo, algumas preocupações e indagações que devem vir antes
da prática e quero aqui destacá-las. A mesma Lei 11.769/2008 que propõe a
obrigatoriedade do ensino de música na Educação Básica leva o educador
musical a assumir o compromisso com a escola. Qual seria, entretanto, a
função da Educação Musical no contexto atual? Qual é o alcance do ensino
musical nas dimensões cultural, social e humanística? A partir de quais
concepções filosóficas? Quais metodologias devem ser utilizadas ou quais
serviriam, no contexto escolar? De que maneira pode ser feita a Educação
Musical, para que as escolas passem a ter um ensino musical significativo?
Como a Universidade pode contribuir para a implementação de um ensino
musical democrático e transformador? Como pode ser feito para que a música
contribua para uma ressignificação do trabalho nesta área, inclusive com
10 professores capacitados para revitalizarem esta Educação Musical na escola?
Com
base
nessas
interrogativas,
consideradas
como
vetores
de
direcionamento desse trabalho, propomos como principal objetivo ressignificar
a educação musical por meio de uma sistematização da metodologia de ensino
para futuros professores de Educação Musical. Apesar de termos a lei
aprovada, fica uma expectativa sobre como padronizar uma metodologia com
professores capacitados para revitalizar a Educação Musical na escola. É neste
sentido que considero importante fazer, por meio do rastreamento de algumas
teses, dissertações e textos, uma busca de educadores musicais que tenham
desenvolvido trabalhos para facilitar o ensino de música nas escolas. Para
tanto se faz necessária a noção da perspectiva histórica dos momentos pelos
quais já passamos, a definição do conceito de Educação Musical, bem como
uma investigação das principais contribuições metodológicas de educadores
musicais relevantes, desde o século passado até a atualidade.
Analisando as várias formas pelas quais a música se faz presente na
escola, alguns educadores musicais defendem a ideia de que a música tornase necessária para o funcionamento da vida na escola por ser um elemento de
transformação social, e é concebida como um meio para controlar
comportamentos de forma mais amena. Através da música podem ser
desenvolvidas formas de utilização de gestos ou sons que substituem as
palavras. Portanto para superar um caráter funcionalista e utilitarista, torna-se
imprescindível que o professor tenha domínio dos elementos inerentes à
música e disponha de técnicas, metodologias, recursos materiais e espaço
físico adequado.
A importância de trabalhar com atividades lúdicas para um melhor
desempenho no aprendizado dos conteúdos será destacada neste trabalho
citando alguns educadores que acreditam em tal prática pedagógica, pois é
preciso reencontrar caminhos, para que estes sejam usados como uma
espécie de libertação, de desafio. Tomando como parâmetros os autores que
aqui serão abordados, considero importante constatar o papel que a prática
musical proporciona para a aprendizagem como um todo.
Desta
forma
o
trabalho
apresenta
no
primeiro
capítulo
como
preocupação fundamental a formação dos professores de música no contexto
escolar contemporâneo. No segundo capítulo apresenta a Educação Musical
11 escolar no Brasil no contexto das legislações e reformas educativas, mostrando
primeiramente a educação no Brasil conforme os Parâmetros Curriculares
Nacionais - PCN (BRASIL, 1998), e em seguida a história da educação musical
e as tendências das práticas pedagógicas. No terceiro capítulo são
apresentadas as concepções da educação musical com suas metodologias
aplicadas para uma melhor compreensão da Educação Musical, colocando os
aportes filosóficos, considerando os principais educadores musicais do século
XX e, especificamente, brasileiros, que influenciaram a Educação Musical.
No último capítulo 4 apresento um relato a partir da minha experiência
como educadora musical há mais de 20 anos, uma sistematização
metodológica para o ensino de música na escola, e suas implicações.
Espera-se
que
este
trabalho
contribua
para
sistematizar
uma
metodologia do ensino da música direcionada ao educador musical para a
educação básica, e que funcione como apoio para um ensino-aprendizagem
mais eficiente e prazeroso.
12 CAPÍTULO I
A FORMAÇÃO DOS PROFESSORES DE MÚSICA PARA UM
CONTEXTO ESCOLAR CONTEMPORÂNEO
Da mesma forma que muitos, venho atuando como professora de
música há mais de 20 anos, nas escolas específicas de música e no ensino
regular. Durante estes anos pude perceber, na prática, que apenas saber
música não era o suficiente para atuar nos contextos pedagógico-musicais. Isto
está além dos conteúdos musicais, havendo a necessidade de um suporte
teórico-pedagógico
específico.
Sem
esta
preparação
e
com
muitas
dificuldades, entre erros e acertos, fui aprendendo na prática, a complexidade
de ser professor de música.
Defender esta área de conhecimento no contexto escolar, onde se tem a
música como mais uma disciplina no currículo, com finalidades diversas, que
vão desde acalmar os alunos até ensaiá-los para a participação em todos os
eventos festivos da escola, também tem sido uma tarefa árdua. A partir destas
colocações, faço alguns questionamentos: Com o curso de licenciatura em
música, os licenciandos tornam-se aptos para atuar nas escolas de ensino
básico? Que tipo de formação a licenciatura em música proporciona aos
indivíduos?
Esses
questionamentos
instigaram-me
a
buscar
respostas
que
pudessem esclarecer o panorama do ensino de música no Brasil, quanto à
formação de professores. Verificando a literatura da Educação Musical, podese
perceber
que
as
dificuldades
e
questionamentos
também
foram
preocupações de estudiosos da área. Estes temas estão relacionados, de uma
forma direta ou indireta, com a problemática da música nas escolas e a
formação de professores de música.
Apesar da área da Educação Musical no Brasil possuir uma considerável
literatura sobre a formação de professores, ainda carece de teorias que
fundamentem a discussão desta temática. Assim considero importante fazer
13 uma busca de subsídios na literatura da Educação, podendo constatar que a
formação de professores, o papel do professor e a sua profissionalização, para
atuar no mundo contemporâneo com uma nova configuração do contexto
escolar, fazem parte da colocação de acordo com Estrela (2002) alguns
estudiosos, tais como: Marcelo Garcia (1995, 1999); Giroux (1997); Kincheloe
(1997); Nóvoa (1995); Pérez Gómez (1995, 2000a, 2000b); Gimeno Sacristán
(2001); Gimeno Sacristán e Pérez Gómez (2000); Schön (1995, 2000); Young
(1998); e Zeichner (1993, 1994, 1995).
Segundo Estrela (2002), devido às transformações sociais verificadas
nestas últimas décadas, houve reformas de ensino que procuraram
acompanhar e dar respostas às novas demandas da sociedade industrializada.
Neste processo ampliou-se o papel do professor, e este se viu obrigado a
desempenhar papéis cada vez mais complexos para atuar nas escolas.
Atuação que não se esgota nas salas de aula “[...] mas que se estende a toda
escola e à comunidade, configurando uma nova profissionalidade e um novo
profissionalismo, e postulando uma nova formação profissional, iniciada e
continuada” (ESTRELA, 2002, p.5).
Marcelo Garcia (1999) conceitua a formação de professores como uma
[...] área de conhecimento, investigação e de propostas e
teóricas e práticas que, no âmbito da Didática e da
Organização Escolar, estuda os processos através dos quais
os professores – em formação ou em exercício – se implicam
individualmente ou em equipe, em experiências de
aprendizagem através das quais adquirem ou melhoram os
seus conhecimentos, competências e disposições, e que lhes
permite intervir profissionalmente no desenvolvimento do seu
ensino, do currículo e da escola, com o objetivo de melhorar a
qualidade da educação que os alunos recebem (GARCIA,
1999, p. 26).
Para este autor, os professores em formação são aqueles que cursam a
formação inicial de professores em instituições específicas, com profissionais
especializados, as quais apresentam um currículo que estabelece a sequência
e o conteúdo instrucional do programa de formação. No Brasil, a formação
inicial de professores é realizada nos institutos superiores de educação,
faculdades e universidades. Nóvoa (1995) atribui à universidade um papel
fundamental na formação inicial de professores, porque acredita “que a
14 existência de uma carreira docente única e a dignificação da profissão docente
exigem que a formação de todos os professores tenha um estatuto
universitário” (NÓVOA, 1995, p. 26). No caso do professor de música isto se
traduz na necessidade de cursar ou ter cursado a Licenciatura em Música.
Com as alterações que vem acontecendo na legislação trazendo como
obrigatório o ensino de música, veio como uma oportunidade de valorizar e de
legitimar a inclusão da música nos currículos nas escolas. Para tal fato, a
formação de professores de música, que vão atuar nesses contextos, necessita
ser vista sob uma perspectiva mais crítica e com uma concepção mais ampla
do papel do professor de música. Pode-se constatar na literatura da Educação
Musical no Brasil que, nessa última década, dentre as preocupações com a
formação de professores, a formação inicial vem se destacando, visto que esta,
conforme a literatura capacita os indivíduos a exercerem profissional e
legalmente a função de professor.
A LDB, entre outras exigências, introduziu um currículo mais flexibilizado
e procurou respeitar e aceitar as diferenças de perfis das várias instituições e
regiões brasileiras (OLIVEIRA, 1999, p. 22). Devido a este fato, e para melhor
adaptação do ensino superior às demandas da sociedade contemporânea, as
instituições passaram a realizar uma reformulação curricular em seus cursos.
Entretanto, Oliveira (1999), ressalta que, antes de haver uma reformulação
curricular, recomenda-se à instituição realizar um estudo do seu contexto e sua
realidade de forma sistemática.
Essa autora salienta ainda, que quando decisões curriculares são
tomadas através de opiniões tendenciosas e pelo senso comum, trazem sérios
danos posteriores para a instituição. Portanto, tornam-se necessárias mais
investigações sobre a realidade dos diversos contextos educacionais que
possam contribuir no desenvolvimento de propostas curriculares condizentes
com realidades às quais se dirigem.
Uma das formas de conhecer a realidade dos contextos pedagógicomusicais é questionando os indivíduos que fazem parte daqueles cenários,
como alunos, professores, funcionários da administração, entre outros.
Entretanto, são poucos os dados sistematizados que revelam a formação inicial
de professores de música sob a perspectiva dos próprios licenciandos,
daqueles que recebem a formação e, ao mesmo tempo, atuam como
15 professores. Para fundamentar esta questão encontra-se Pérez Gomez (1995),
trazendo pontos convergentes.
Inicialmente, o autor identificou quatro perspectivas de formação de
professores, a saber: perspectiva acadêmica, perspectiva técnica, perspectiva
prática e perspectiva de reconstrução social. Tendo em vista a amplitude do
tema formação de professores, em outro estudo (1995) o autor traz em seu
trabalho mais três enfoques que, na realidade, são as sobreposições das
perspectivas classificadas anteriormente. São eles: o enfoque prático artesanal,
o enfoque técnico-academicista e o enfoque reflexivo (a investigação-ação).
A identificação de perspectivas e enfoques na formação de professores
se torna relevante, levando em consideração que cada modelo de formação de
professores é que objetivará o perfil do professor que se quer formar. Além
disso, essa identificação auxilia na reflexão sobre diferentes abordagens para a
formação de professores em música.
Fica evidente a necessidade de docentes que tenham conhecimento da
fundamentação pedagógica do ensino de música e saibam escolher os
conteúdos adequados, adaptando-os à metodologia apropriada. Entretanto,
analisando a formação de futuros professores tanto no curso de licenciatura em
música como de professores generalistas, observa-se que há uma defasagem
entre esta demanda e a realidade, gerando uma necessidade de materiais que
norteiem e complementem o ensino da música na escola.
É comum encontrarmos recursos didáticos de qualidade, porém estes
nem sempre privilegiam a formação musical da criança de maneira sistemática
e integral. Existe uma liberdade de execução do trabalho do professor em sala
de aula, que pode ser benéfica ou não. Para aquele que não está
adequadamente preparado para o uso destes recursos – quer seja pela
inexperiência de início de carreira, ou por eventuais lacunas em sua formação,
tal liberdade pode gerar insegurança, comprometendo a prática.
A formação de professores de música também tem sido motivo de
reflexão de pesquisadores da área. Del Ben (2007) afirma que a licenciatura
deve formar,
um profissional capaz de assumir – e responder
produtivamente ao: compromisso social, humano e cultural de
atuar em diferentes contextos educativos, além de atender ao
16 compromisso de acolher diferentes músicas, distintas culturas e
as múltiplas funções que a música pode ter na vida social (DEL
BEN, 2007, p. 53).
Nos últimos anos, a ausência da música no currículo das escolas do
ensino básico foi uma preocupação constante dos educadores musicais do
Brasil. Alguns deles, como Alda de Oliveira (2007), Luciana Del Ben (2002),
Liane Hentschke (1994), afirmam que a música teria desaparecido das escolas.
Contudo é importante que seja discutida tal concepção, culminando em um
bom programa de educação musical nas escolas (OLIVEIRA, 2007).
A atual Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional foi alterada,
incluindo a obrigatoriedade das aulas de música em escolas brasileiras,
conforme a lei 11.769, publicada no Diário Oficial da União de 19 de agosto de
2008. Contudo não tem impedido a criação de novos espaços e a perpetuação
de antigos rituais escolares, como a hora Cívica, bandas marciais e, em
especial, o coral. As escolas brasileiras realizavam diversas práticas, com
diferentes modelos e concepções de ensino de música envolvendo algumas
formas de modalidades de organização e de articulação com a comunidade
escolar.
Devido
a
estas
práticas
desenvolvidas
torna-se
importante
a
compreensão de que a música atinge os diversos contextos culturais, por meio
de um repertório significativo que valoriza o cotidiano vivido pelas crianças, e
ganha importância à medida que traz benefícios a outras áreas do currículo de
acordo com Gifford (apud DEL BEN, 2002, p. 121).
Bresler (apud DEL BEN, 2002, p. 28) diz que a música serve como um
tempero para as outras disciplinas curriculares, e que é mais provável que a
referida disciplina, não seja a causa do sucesso para um melhor aprendizado
em outras disciplinas curriculares, mas, de acordo com a forma que seu estudo
é desenvolvido, serão apresentadas melhoras na memória, na concentração e
na sensibilidade.
Ela é concebida como meio e não como fim, sendo utilizada como
ferramenta de apoio para o desenvolvimento de outras disciplinas. Diante deste
quadro, pode-se dizer que a música e todos os seus conteúdos intrínsecos e
extrínsecos não são vistos como algo passível de ser ensinado e apreendido,
até porque os professores que procuram trabalhar com música em sala de aula
17 não possuem domínio e formação específica para desenvolver o ensino nas
escolas.
Devido à falta de preparo dos professores, a música é considerada
suporte para atender as mais diversas situações cotidianas ou como mero
passatempo, tornando as atividades mecânicas e estereotipadas conforme nos
é apresentado no Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil
(BRASIL. RCN, 1998). E neste aspecto a educadora musical afirma:
Os poucos instantes em que se faz música na escola se
resumem a cantar e mais cantar, muitas vezes de maneira
mecânica, sem que o repertório seja trabalhado
adequadamente e de acordo com as possibilidades vocais das
crianças, ou, mesmo, sem explorar a dimensão artística
musical desse repertório (HENTSCHKE, 1995, p. 35).
Friedmann
(1998)
descreve
a
escola
como
um
elemento
de
transformação da sociedade, cuja função é contribuir, junto com outras
instâncias da vida social, para que essas transformações se efetivem. E nesse
sentido a escola deve trabalhar as crianças como seres sociais, no sentido de
que sua integração na sociedade seja construtiva. A educação deve ter a
preocupação de propiciar para todas as crianças um desenvolvimento integral e
dinâmico (cognitivo, afetivo, linguístico, social, moral e físico-motor), de forma a
construir-lhes a autonomia, criatividade, responsabilidade e cooperação.
Almeida (1998) acredita que é preciso reencontrar caminhos para uma
prática pedagógica escolar, como uma espécie de libertação, de desafios,
tendo na educação lúdica uma boa alternativa. Tomando como parâmetros os
autores até aqui abordados fica claro o importante papel que a prática musical
desempenha para a aprendizagem como um todo.
Para tanto é preciso delinear com clareza o que ensinar, para quê e para
quem. Como ensinar para tornar a música viva, seu conteúdo afinado com a
realidade do aluno, e quem deve ensinar. Além da capacidade técnica e da
compreensão do fenômeno musical, a flexibilidade por parte do professor é
essencial, pois ser flexível é fundamental para a necessidade de tomada de
decisões, permitindo críticas às metodologias e às próprias práticas
pedagógicas diante da cultura e da sociedade na qual irá atuar.
18 Neste caso, atenção especial deveria ser dispensada ao ensino de
música no nível da educação básica, principalmente na educação infantil e no
ensino fundamental, pois é nessa etapa que o indivíduo estabelece e pode ter
assegurada sua relação com o conhecimento, operando-o no nível cognitivo,
de sensibilidade e de formação da personalidade. Considera-se a importância
da educação musical na sociedade contemporânea justificada pela função de
promover o desenvolvimento do ser humano, não pelo adestramento ou
alienação, mas pela conscientização da interdependência entre o corpo e a
mente, entre a razão e a sensibilidade, entre a ciência e a estética. É preciso
abrir espaço para a liberdade da criação e da recriação do discurso musical,
por meio da ação própria do sujeito sobre o material sonoro.
A interação entre os homens, tendo a música como mediadora, deve
ocorrer com o propósito de intensificar certas funções de atividade humana
como a linguagem, contribuindo para a formação de um ambiente rico e
saudável, elevando o potencial da comunicação estética.
De acordo com Saviani (2000)
A educação integral do homem é uma educação de caráter
desinteressado que além do conhecimento da natureza e da
cultura envolve as formas estéticas, a apreciação das coisas e
das pessoas pelo que elas são em si mesmas, sem outro
objetivo senão o de relacionar-se com elas. Abre-se aqui todo
um campo para a educação artística para integrar à educação,
que em meu entender, é a educação musical. Com efeito, a
música é um tipo de arte com imenso potencial educativo já
que, a par de manifestação estética por excelência (...)
apresenta-se como um dos recursos mais eficazes na direção
de uma educação voltada para o objetivo de se atingir o
desenvolvimento integral do ser humano (SAVIANI, 2000, p.
40).
Entende-se que o ensino de artes, especialmente da música, deve ser
considerado na educação escolar da mesma forma que outras áreas do
conhecimento, como a matemática, a língua portuguesa, a história e outras.
Porém, por oferecer uma forma de conhecimento específico, deve ser
encarado de modo organizado, coerente, que o situa entre vivência, expressão
e compreensão.
A escola é um instituição na qual esse conhecimento pode ser instituído
e adquirido. A nova LDB vem dar essa garantia na medida em que torna o
19 conhecimento artístico obrigatório no currículo do ensinp fundamental e médio.
O problema começa aí, a partir do momento em que passar do papel e chegar
até as escolas, ser incluído e oferecido aos alunos no horário escolar, requer
um maior interesse por parte dos administradores escolares e dos próprios
docentes, manifestando-se pela sensibilização e pelo valor do ensino da arte
na escola.
1.1 A formação inicial de professores de música
A evolução das novas tecnologias de comunicação, o desenvolvimento
científico e tecnológico e a internacionalização da economia proporcionaram
uma nova forma de relacionamento entre os indivíduos, criando assim novos
interesses nas relações econômicas, políticas e culturais (Garcia, 1999). Surge
um novo tipo de cidadão, com novos hábitos, modo de pensar, sentir, agir, e
consequentemente, ocorrem mudanças na relação entre o trabalho e a
organização de produção (KINCHELOE, 1997; PÉREZ GOMEZ, 2000). “Devido
a esses fatos, surge a preocupação com a formação, que não restringe apenas
ao contexto escolar, mas abrange contextos mais amplos, como o empresarial,
social, político, entre outros” (GARCIA, 1999, p. 11).
Para o indivíduo entender e conviver em uma sociedade com essa nova
configuração é imprescindível ter acesso a uma educação, a uma formação
escolar. A educação não deve ser entendida como especialização, ou apenas
aquisição, difusão e reprodução de conhecimento e cultura, mas também como
diferenciação de uma formação geral de inovação do conhecimento que
envolve toda a personalidade, que se preocupa com o desenvolvimento e bemestar dos indivíduos e o insere nas “atividades sociais produtivas” (GIMENO
SACRISTÁN, 2001, p. 17).
Essa necessidade de formação no contexto escolar legitima a
preocupação com a formação de professores, pois são estes que formarão os
indivíduos dentro dessa nova concepção de educação. Nóvoa (1995) ressalta a
importância da formação do professor, pois
[...] não há ensino de qualidade, nem reforma educativa, nem
inovação pedagógica, sem uma adequada formação de
professores. Esta afirmação é de uma banalidade a toda a
prova. E, no entanto, vale a pena recordá-la num momento em
20 que o ensino e os professores se encontram sob o fogo
cruzado das mais diversas críticas e acusações (NÓVOA,
1995, p. 11).
Garcia (1999, p. 26) considera a formação de professores como uma
área de “conhecimento e investigação”, a qual enfoca o “estudo do processo”
sistemático e organizado, onde os professores aprendem e desenvolvem
sozinhos ou em grupo, seus conhecimentos e competências profissionais. O
conceito abrange tanto os indivíduos que estudam para serem professores
(formação inicial) como aqueles que já atuam no ensino (formação de
professores principiantes e desenvolvimento profissional dos professores).
Essa formação deve capacitar o professor a trabalhar profissionalmente, não
só em aula, mas almejando uma educação de melhor qualidade.
Devido ao fato deste conceito abranger tanto a formação inicial, quanto a
formação de professores iniciantes e desenvolvimento profissional de
professores, vale delimitar o tema ao qual será dada maior ênfase: a formação
de professores de música. Para Garcia (1999), a formação inicial de
professores ocorre em instituições específicas, onde as aulas são ministradas
por professores especializados e o currículo estabelece a sequência e o
conteúdo de instrução do programa. No caso do Brasil, a formação inicial de
professores de música deverá acontecer nos cursos de licenciatura em música.
Levando em consideração as transformações sociais, o ensino foi-se
adaptando às exigências, e as reformas procuraram acompanhar e dar
repostas às novas demandas da sociedade industrializada. As concepções de
educação, escola e currículo se ampliaram, bem como o papel do professor. A
atuação não se esgotava na sala de aula, mas se estendia a toda a escola e à
comunidade, configurando uma nova profissão e um novo profissionalismo do
professor. Isso demandou uma nova formação profissional do professor, que
abrange a formação inicial e continuada (ESTRELA, 2002, p. 5).
O Brasil também sofreu e sofre influências das modernizações e
transformações sociais e, para acompanhá-las, também foram feitas reformas.
A LDB introduz um currículo mais flexibilizado e procura respeitar e aceitar as
diferenças de perfis das várias instituições e regiões brasileiras (OLIVEIRA,
1999). Surge assim, uma oportunidade para a área valorizar e legitimar as
aulas de música nos currículos escolares.
21 No entanto, ainda é possível constatar que muitos profissionais que
trabalham o ensino das artes nas escolas são vindos do curso de licenciatura
em educação artística. Esses professores, devido à formação polivalente na
área das artes (artes visuais, música e teatro), não conseguem trabalhar de
forma satisfatória todas as modalidades artísticas. Dessa forma, o ensino de
música foi gradativamente desaparecendo do currículo escolar, e quando as
escolas possuem aulas, estas se resumem ao canto nos eventos, às
apreciações musicais, utilizando desenhos ou trabalhos manuais, entre outras.
No caso da apreciação musical da forma descrita, é uma atividade passiva,
com a música servindo “de pano de fundo para outras atividades” (SOUZA;
HENTSCHKE; OLIVEIRA; DEL BEN; MATEIRO, 2002, p. 100).
Considerando esses fatos, surge a necessidade de preparar professores
especialistas em música para atuarem nos contextos pedagógico-musicais
escolares. A preocupação em enfocar com maior ênfase o contexto escolar se
justifica na medida em que há uma grande necessidade, neste momento, de
todos os educadores musicais, fortalecerem o espaço escolar. É preciso formar
e inserir os licenciandos nesses espaços de modo que consigam interagir com
as concepções atuais de educação, de educação musical, de música, de
escola e de currículo. Além disso, devem saber, de forma competente e
fundamentada, defender e valorizar a inserção da música no currículo escolar
em todos os níveis da educação básica; devem também, ter conhecimentos
pedagógico-musicais para proporcionarem aos seus alunos experiências
musicais de maneira completa e significativa.
Segundo Hentschke (1995), alguns autores da educação musical, dentre
eles Swanwick, advogam a necessidade de dar oportunidades, para crianças e
jovens, de uma vivência equilibrada entre a composição, a execução e a
apreciação, fundamentadas no estudo da técnica e literatura musical.
Para isso, os estudiosos da área, cientes da ampliação dos conceitos
(educação, educação musical, música, escola e currículo), discutem a
formação de professores de música, inicial e continuada (ARROYO, 2000;
HENTSCHKE, 2000; SOUZA, 1997, 2000). Nesta temática se vê presente a
preocupação com os programas curriculares dos cursos de licenciatura em
música.
22 Segundo
Hentschke
esses
currículos
se
encontravam
descontextualizados, compartimentados e desatualizados, preocupados em
transmitir conteúdos, sem haver conexão entre eles (HENTSCHKE, 1995,
2000).
Seria
necessário
que
os
cursos
de
licenciatura
em
música
desenvolvessem nos licenciandos capacidades críticas e reflexivas, e não
atitudes passivas de meros consumidores de saberes. Para isso, continua a
autora, é necessário que o professor formador “propicie um debate em sala de
aula para compartilhar experiências profissionais” (HENTSCHKE, 2000, p. 85),
além de ter uma postura sem preconceitos dos fazeres musicais produzidos em
espaços não-escolares.
Na área da Educação Musical, constata-se na literatura brasileira a
existência de poucos estudos, referentes à formação de professores de
música, que trazem dados diretos da realidade do contexto pedagógico-musical
em que estes atuam. Entre estas investigações encontra-se o trabalho de
Beineke (2000), que investigou os conhecimentos práticos de três professoras
de música do ensino fundamental. A autora buscou ouvir as professoras
procurando ressaltar algumas lógicas que sustentam suas ações pedagógicas.
Os resultados sugeriram que “os conhecimentos práticos do educador musical
só podem ser desenvolvidos através de uma formação em que sejam
oportunizadas experiências concretas de ensino” (BEINEKE, 2000, p. 170).
Nessa formação, continua a autora, deverá haver orientação dos processos de
reflexão dos professores sobre suas próprias práticas, levando também em
consideração os conhecimentos musicais e pedagógicos.
Del Ben (2001), por sua vez, investigou como as concepções e ações de
professores de música configuram a prática pedagógico-musical em escolas do
ensino fundamental. A autora constatou poucos dados sobre a educação
musical escolar brasileira provenientes das realidades das salas de aula e, por
esse motivo, buscou “conhecer e compreender o ensino a partir do mundo
concreto e cotidiano das práticas vividas pelos professores de música” ( DEL
BEN, 2001, p. 290). Quanto à formação inicial, a autora sugere uma união
entre “teoria e prática e entre musicologias e pedagogias não somente durante
o estágio supervisionado, mas durante todo o processo de formação” (DEL
BEN, 2001, p. 298).
23 Marques (1999) investigou as articulações entre as dimensões teóricas e
filosóficas e as dimensões práticas das atividades pedagógicas de alunos de
graduação dos cursos de licenciatura em música das instituições públicas e
privadas, em seus estágios supervisionados em Salvador (BA). O pesquisador
observou pouca fundamentação teórica dos estagiários e a desvinculação entre
as dimensões teórico-filosóficas e práticas de suas atividades pedagógicomusicais.
Além da precária fundamentação teórica dos licenciandos, Souza (1997)
observa que na formação inicial não há equilíbrio entre as disciplinas teóricas e
práticas. Entre as dificuldades que os licenciandos enfrentam está a de
ministrar aulas de música, devido aos problemas sociais dos alunos, que
contribuem para gerar conflitos, indisciplina, problemas de grupo, entre outros.
Para os problemas pedagógico-musicais, esta autora sugere que estes
poderão ser solucionados a partir das
[...] competências específicas (domínio técnico através da
prática de um instrumento musical), competência metodológica
(metodologia do ensino da música) e competência social
(conhecimento de fundamentos da Psicologia e Sociologia) [...]
(SOUZA, 1997, p. 16).
Em se tratando do equilíbrio entre a teoria e a prática, Kleber (2000b),
em sua investigação sobre o currículo de formação inicial de professores de
música ressalta que todos os depoimentos de alunos e professores que
entrevistou sugerem a necessidade do estágio supervisionado iniciar mais
cedo. Segundo a autora, desse modo haveria mais tempo para os alunos
integrarem a teoria com a prática, podendo estar preparados para atuarem com
“competência e, sobretudo, para que tenham uma vivência positiva e
significativa” (KLEBER, 2000, p. 196).
Mateiro (2000) realizou uma pesquisa com objetivo de compreender as
condições efetivas do estágio supervisionado, ouvindo as experiências,
vivências e dificuldades dos licenciandos. Com essa investigação a autora
chegou à conclusão de que é confirmada a necessidade de reflexão sobre a
estrutura curricular do curso de licenciatura em música. A autora ainda avaliou
24 [...] a importância e a eficácia do estágio como um componente
fundamental na formação dos professores e buscou refletir
acerca de aspectos essenciais a superar frente à aplicação das
possibilidades das últimas políticas educacionais (MATEIRO,
2000, p. 1).
Para muitos licenciados, o estágio poderá ser o primeiro e/ou o único
acesso a uma sala de aula, onde estes se integram com a realidade do
contexto escolar. Em alguns cursos, os estágios estão sendo realizados em
espaços pedagógico-musicais mais amplos, como, por exemplo, aulas de
música em igrejas, oficinas de música em clubes, nas escolas da prefeitura e
em projetos para crianças carentes. Em outros cursos, os estágios acontecem
obrigatoriamente em espaço escolar, mas não necessariamente dentro da sala
de aula, podendo ocorrer também através de oficinas de música.
A obrigatoriedade do estágio no contexto escolar, por um lado, não tem
aspectos positivos, pois alguns licenciandos têm pouco interesse pelo ensino
da música e pela prática escolar (SOUZA, 1997, p.15). Também são poucos os
licenciandos que afirmam que irão continuar atuando como professor de
música em escolas (MATEIRO, 2002). Por outro lado, a obrigatoriedade do
estágio no contexto escolar pode trazer uma contribuição para sua formação
pedagógico-musical. Esse fato foi verificado na pesquisa de Kleber (2000),
onde a autora constatou que “a escola pública foi um espaço que mais fascinou
e desfrutou os estagiários, tanto no que se refere às suas competências
didático-pedagógico-musicais como no aspecto sócio-político” (KLEBER, 2000,
p. 196). Diante deste contexto o estágio supervisionado, passa acontecer na
segunda metade do curso, e com a duração de 400 horas, para estar coerente
ao novo paradigma das Diretrizes Curriculares e a todas as exigências
profissionais do professor.
Além dos espaços escolares, atualmente estão sendo investigados
outros espaços não-escolares onde acontecem também o ensino e a
aprendizagem musical. Hentschke (2001) observa que esses múltiplos espaços
e possibilidades de atuação não são tão recentes. A constatação da
necessidade de formar profissionais críticos e reflexivos, que saibam atuar nos
espaços escolares e, principalmente, nos espaços não-escolares, é que faz
emergir discussões na área e colocar em pauta os espaços que antes não
eram investigados. A autora ressalta que esta preocupação provavelmente
25 advém da busca de referenciais na área das Ciências Sociais, como da
Antropologia, da Pedagogia, da Sociologia.
Existe um consenso entre os educadores musicais que a área da
Educação Musical, devido ao diálogo com as Ciências Sociais, tem ampliado o
seu campo de estudo. As pesquisas, que antes eram realizadas em espaços
escolares e acadêmicos, agora se preocupam em investigar também os
espaços não-escolares. Para garantir que esse trânsito, entre os espaços
escolares e os não-escolares, sendo realizado de maneira significativa para os
professores de música e alunos, alguns pesquisadores buscam um olhar crítico
e reflexivo na formação dos professores que irão atuar nesses contextos.
De acordo com Souza (2000), a discussão do trânsito da educação
musical entre o escolar e não-escolar,
[...] não pode estar resumido no conteúdo que se ensina ou na
música que pode frequentar a sala de aula, mas deverá
considerar que tipo de formação de professores é necessário e
que modificações são necessárias para poder atuar nos vários
campos emergentes da educação musical (SOUZA, 2000, p.
145-146).
Para a autora, é preciso que na formação de professores haja uma
conscientização de que atualmente há uma ampliação do campo da educação
musical. Neste, estão inseridas todas as práticas musicais que ocorrem nos
espaços escolares e não-escolares, e nos espaços que a autora denomina de
“alternativos” (SOUZA, 2000, p.139).
Kleber (2000) preocupada com a formação de professores de música
críticos e reflexivos que atendam a educação musical com diversas
concepções e práticas, coloca que:
[...] os cursos de licenciatura na área de música devem formar
um profissional que compreenda a diversidade cultural e que
esteja preparado para trabalhar em diferentes situações,
contemplando o saber sistematizado e o saber cotidianamente
construído (KLEBER, 2000, p.155).
No
que
tange
às
competências
profissionais,
verificou-se
“um
descompasso entre o discurso e a prática da educação musical [...] o que
demanda uma urgente reformulação de grande parte dos currículos das
licenciaturas em música” (KLEBER, 2000, p. 156).
26 Mas como fazer uma reformulação dos currículos das licenciaturas em
música se ainda não se conhece quais são esses múltiplos espaços e
possibilidades de atuação no Brasil? Qual a formação inicial do professor de
música para atuar nos espaços emergentes? Qual a concepção e as práticas
da educação musical?
Segundo Hentschke (2001, p. 68), não há uma concepção de Educação
Musical, e sim a coexistência de múltiplas concepções de Educação Musical
“que não são excludentes”. Devido a esse fato, o professor de música
necessita desenvolver competências que ultrapassem os conhecimentos
desenvolvidos atualmente nos cursos de formação de professores. A autora
ressalta ainda que esses cursos apresentam “seus currículos estanques e com
seu baixo impacto social, causado pelo distanciamento entre o currículo
adotado e o contexto de atuação profissional dos futuros professores”
(HENTSCHKE, 2001, p. 69).
Se por um lado, alguns autores defendem que a formação de
professores de música deve ser realizada em instituições, por outro lado, há
aqueles que defendem que a transmissão de conhecimentos e habilidades
musicais pertence a qualquer pessoa que os possua. Para Kraemer (2000), a
educação musical “ocupa-se com as relações entre a(s) música(s) sob os
aspectos de apropriação e de transmissão” O autor atribui à pedagogia da
música a tarefa de: “compreender e interpretar, descrever e esclarecer,
conscientizar e transformar” (KRAEMER, 2000, p. 66).
Nessa concepção, a área de atuação compreende toda a prática
músico-educacional que acontece em espaços escolares e não-escolares, bem
como “toda cultura musical em processo de formação” (KRAEMER, 2000, p.
51). Nesse caso, o conhecimento pedagógico-musical não está só nas
instituições, mas pertence a todas as pessoas que transmitem conhecimentos
e habilidades musicais. Estas podem ser críticos de música (jornalistas e
especialistas), regentes (coros e orquestras), músicos religiosos, músicos
populares, professores particulares de música, entre outros. A área e o espaço
pedagógico-musical se configuram amplos, podendo abranger:
Educação musical escolar e extra-escolar, processo de
impregnação músico-cultural na família, nos jardins de infância,
27 escola de música, escola, escola superior, escola popular,
instituições de formação continuada, aulas particulares, em
corais, conjuntos, organizações comunitárias, através da
influência dos meios de comunicação, dos da mesma idade e
outros (KRAEMER, 2000, p.67).
Essa ideia de educação musical, em que o conhecimento pedagógicomusical pertence a todos os espaços e pode ser “transmitido” por qualquer
pessoa que detenha esses conhecimentos, é muito ampla, podendo produzir,
na realidade brasileira, uma visão equivocada sobre “ser professor de música”.
É possível constatar que, nas escolas regulares, profissionais das mais
diversas formações estão atuando como professores de música. Qualquer
pessoa que sabe música pode ser um educador musical?
De acordo com Hentschke (2001), o papel do professor de música está
sendo questionado. Este deve ter flexibilidade, ser reflexivo, possuir um
conhecimento
pedagógico-musical
fundamentado
na
literatura
e
experimentando na prática, além de ter a competência de perceber e agir em
realidades distintas. É necessário proporcionar aos licenciandos na formação
inicial de professores de música, a capacidade de “saber administrar e
gerenciar o conhecimento dos alunos, capacitando-os a atribuir sentido ao
mundo musical à sua volta” (HENTSCHKE, 2001, p. 72). Essa colocação da
autora parece sugerir que não é qualquer pessoa que saiba música que poderá
ser considerada um educador musical.
Desde o ano de 2000, a ABEM no X Encontro Anual da Associação
Brasileira de Educação Musical, teve como tema e objetivo, promover debates
sobre a configuração do campo da Educação Musical, as demandas
profissionais e as competências necessárias para a atuação do educador
musical. Já se pode observar nos espaços urbanos uma demanda por
profissionais que atuem em projetos culturais e sociais. Segundo Oliveira
(2000), devido aos acontecimentos de mudanças da organização educacional,
ampliam-se possíveis campos de atuação para os educadores musicais, como
consultorias, cursos, voluntariados escolares e comunitários e educação
continuada e de atualização. Entretanto, se questiona a formação que este
educador musical terá para atuar nesses espaços diversificados.
O XI Encontro Anual da ABEM em 2002, teve como principal tema o
debate sobre a necessidade de articulação e diálogo entre a formação de
28 profissionais do ensino de música e pesquisa. Foram realizadas discussões e
reflexões acerca das concepções de formação desses profissionais, bem como
sobre a implementação das Diretrizes Curriculares e os espaços que esses
profissionais ocupam no mercado de trabalho.
Segundo
Oliveira
(2000),
as
Diretrizes
Curriculares
foram
confeccionadas para guiar e orientar o ensino superior de música para uma
formação mais abrangente e aprofundada, flexibilizada. Utilizando-se deste
documento as instituições e professores poderiam construir seus currículos, ou
seja, estabelecendo metas e objetivos, atividades de ensino e avaliação, de
acordo com modelos ou perspectivas de formação de professores que mais se
adaptem à concepção de currículo da instituição ou à de sua região. Seguindo
todos esses requisitos a Comissão de Especialistas de Ensino – Música (CEEMúsica) do MEC confeccionou uma proposta de diretrizes para o curso de
música.
Essa proposta foi finalizada em 1999. No entanto, somente em 2002 o
Conselho Nacional de Educação aprovou as Diretrizes Curriculares Nacionais
para os cursos de graduação em música. Hentschke (2002), em um debate da
ABEM, expôs que nesse documento oficial a proposta para o curso de música
não se encontrava na íntegra. A autora, que participou da CEE-Música na
confecção da proposta de Diretrizes Curriculares para o curso de música,
relatou que houveram adaptações e que algumas partes do texto foram
suprimidas. No entanto, o documento oficial afirma que o parecer “[...]
contempla as orientações das Comissões de Especialistas e as da SESu/Mec,
as quais, na sua grande maioria, foram acolhidas e reproduzidas na sua
totalidade [...]” (BRASIL, 2000, p. 8).
Levando em consideração as Diretrizes Curriculares Nacionais, muitos
cursos de licenciatura estão em processo de reformulação curricular, e outros
já estão implementando suas reformulações. Entretanto, Oliveira (2000)
salienta que seria de grande contribuição se a instituição realizasse um estudo
aprofundado do seu contexto, de maneira sistemática e realista antes de haver
uma reformulação curricular. No entanto a autora coloca que também muitas
decisões curriculares são tomadas através de opiniões tendenciosas e pelo
senso comum, o que pode causar sérios danos posteriores para a instituição.
(OLIVEIRA, 2000, p. 14).
29 Portanto, através das discussões entre os educadores musicais, é
possível observar que ainda se fazem necessárias mais investigações, sobre a
realidade dos diversos contextos educacionais, que possam contribuir no
desenvolvimento de propostas curriculares condizentes às realidades às quais
se dirigem.
1.2 A formação e opinião dos licenciandos
Considera-se importante dar voz aos licenciandos, porque são
considerados sujeitos adultos que pensam e aprendem, e não meros
consumidores e reprodutores de saberes. Para Pereira (1998) o licenciando
deve
[...] ser compreendido como sujeito em formação que traz
consigo uma representação de educação construída durante
sua própria escolarização, que vivencia uma formação superior
fundamentada e que continuará se formando na prática
pedagógica com questões advindas da realidade escola
(PEREIRA, 1998, p. 58).
É importante também a opinião dos licenciandos, pelo fato de estarem
submetido a dois âmbitos, de um lado como aluno na universidade e, de outro,
como professor, pode trazer dados de sua experiência nessas realidades.
Esses dados podem auxiliar na identificação dos espaços em que atuam, quais
os conhecimentos adquiridos na universidade que estão sendo aproveitados na
prática com eficácia e quais são as necessidades para que os novos
conhecimentos venham a ser utilizados nesses contextos de atuação.
Segundo Bireaud (1995), o significado da eficácia no sistema educativo
adquire uma noção ambígua que pode estabelecer falso consenso. A autora
ressalta que a eficácia do curso superior num plano social, visto como setor de
produção semelhante a qualquer outro do setor econômico, é calculada em
relação aos números de diplomas concedidos, tendo-se em conta os custos de
funcionamento do sistema. No entanto, continua a autora, sob a perspectiva
dos licenciandos a eficácia implica outro sentido:
[...] os estudantes avaliam-na, em função do seu projeto
pessoal, que tanto pode implicar a sua inserção profissional
30 como o seu enriquecimento intelectual, que não são
forçosamente medidos, em qualquer dos casos, pela bitola dos
diplomas obtidos [...] (BIREAUD, 1995, p. 14).
Por considerar professores e alunos como importante colaborador para a
pesquisa
em
educação
musical,
faz-se
necessário
trazer
as
duas
possibilidades em uma mesma pessoa: o licenciando. Ele de um lado, é aluno
na universidade, e, de outro, professor nos espaços onde atua. Isto torna o
licenciando um colaborador em potencial nesta pesquisa cujo tema é a
formação dos professores.
Ao discutir sobre a teoria social e a formação de professores, Giroux
(1997) traz à pauta a importância de ouvir os estudantes. O autor observa que
alguns teóricos educacionais de esquerda enfatizam o relacionamento entre as
escolas e o campo econômico a partir de questionamento na identificação e
subjetividade da voz do estudante. Também salienta a intervenção do Estado
no processo econômico gerou “novos discursos simbólicos” e isso pode ser
notado na maneira como o “Estado controla a forma e conteúdo dos programas
de formação de professores através da legislação de exigências de certificação
para futuros professores” (GIROUX, 1997, p. 201).
Segundo o autor,
[...] as questões referentes a como os estudantes produzem
significados e criam suas histórias culturais não podem ser
respondidas recorrendo-se unicamente às discussões de
determinismo econômico e de classe social, mas devem
começar a abordar as formas nas quais a cultura e a
experiência se unem para constituir aspectos poderosamente
dominantes da agência humana (GIROUX, 1997, p. 201).
De acordo com o autor, “silenciar a voz do estudante é torná-lo
impotente, pois compreender sua voz é confrontar a necessidade de fazer
nascer símbolos, linguagem e gesto, nascidos de sua biografia pessoal”
(GIROUX, 1997, p. 201-202). Para ele, os programas de formação de
professores
devem
se
comprometer
em
questões
de
fortalecimento,
combinando conhecimento e análise crítica, com intuito de transformar a
realidade no interesse da sociedade (GIROUX, 1997, p. 202-203).
31 CAPÍTULO II
A EDUCAÇÃO MUSICAL ESCOLAR NO BRASIL NO CONTEXTO
DAS LEGISLAÇÕES E REFORMAS EDUCATIVAS
A partir da perspectiva histórica colocada na primeira parte deste
trabalho, é importante que se destaque o conceito e a história da Educação
Musical, e para que haja uma melhor compreensão desta no Brasil é
importante conhecer primeiramente a trajetória da tradição pedagógica
brasileira. De acordo com os PCN (1997)
[...] até dezembro de 1996 o ensino fundamental esteve
estruturado nos termos previstos pela Lei Federal n. 5.692, de
11 de agosto de 1971. Essa lei, ao definir as diretrizes e bases
da educação nacional, estabeleceu como objetivo geral, tanto
para o ensino fundamental (primeiro grau, com oito anos de
escolaridade obrigatória) quanto para o ensino médio (segundo
grau, não obrigatório), proporcionar aos educandos a formação
necessária ao desenvolvimento de suas potencialidades como
elemento de auto-realização, preparação para o trabalho e
para o exercício consciente da cidadania (BRASIL. PCN, vol. I,
1997, p. 13).
2.1 A Educação no Brasil conforme os Parâmetros Curriculares Nacionais
Coube aos Estados a formulação de propostas curriculares que
serviriam de base às escolas estaduais, municipais e particulares situadas em
seu território, compondo, assim, seus respectivos sistemas de ensino. Essas
propostas foram, na sua maioria, reformuladas durante os anos 80 segundo as
tendências educacionais. Em 1988 o Plano Decenal de Educação, afirma a
necessidade e a obrigação de o Estado elaborar parâmetros claros no campo
curricular capazes de orientar as ações educativas do ensino obrigatório, de
forma a adequá-lo aos ideais democráticos e à busca da melhoria da qualidade
do ensino nas escolas brasileiras.
32 Nesse sentido, ampliam-se as responsabilidades do poder público para
com a educação de todos, ao mesmo tempo em que a Emenda Constitucional
n. 4, de 12 de setembro de 1996, priorizou o ensino fundamental, disciplinando
a participação de Estados e Municípios no tocante ao financiamento desse
nível de ensino. A nova Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei
Federal n. 9.394), aprovada em 20 de dezembro de 1996, consolida e amplia o
dever do poder público para com a educação em geral e em particular para
com o ensino fundamental, que assegurava a todos a formação básica comum
indispensável para o exercício da cidadania, fornecendo meios para
progredirem no trabalho e em estudos posteriores.
O ensino proposto pela LDB está em função do objetivo maior do ensino
fundamental, que é o de propiciar ao sujeito a formação básica para a
cidadania, a partir da criação na escola de condições de aprendizagem para:
[...] I - o desenvolvimento da capacidade de aprender, tendo
como meios básicos o pleno domínio da leitura, da escrita e do
cálculo; II - a compreensão do ambiente natural e social, do
sistema político, da tecnologia, das artes e dos valores em que
se fundamenta a sociedade; III - o desenvolvimento da
capacidade de aprendizagem, tendo em vista a aquisição de
conhecimentos e habilidades e a formação de atitudes e
valores; IV - o fortalecimento dos vínculos de família, dos laços
de solidariedade humana e de tolerância recíproca em que se
assenta a vida social (art. 32) (BRASIL. PCN, vol. I, 1997, p.
15).
Devido a estes fatos se fez necessário organizar uma proposta
educacional que tivesse em vista a qualidade da formação a ser oferecida a
todos os estudantes. Um ensino de qualidade que a sociedade pudesse se
expressar, e com a possibilidade do sistema educacional propor uma prática
educativa adequada às necessidades sociais, políticas, econômicas e culturais
da realidade brasileira, considerando os interesses e as motivações dos alunos
e garantindo as aprendizagens essenciais para a formação de cidadãos
autônomos, críticos e participativos, que fossem capazes de atuar com
competência, dignidade e responsabilidade na sociedade contemporânea. E
para tanto precisariam
[...] dominar a língua falada e escrita, os princípios da reflexão
matemática, as coordenadas espaciais e temporais que
33 organizam a percepção do mundo, os princípios da explicação
científica, as condições de fruição da arte e das mensagens
estéticas, domínios de saber tradicionalmente presentes nas
diferentes concepções do papel da educação no mundo
democrático (BRASIL. PCN, vol. I, 1997, p. 27).
Essas exigências apontavam a relevância de discussões sobre a
dignidade do ser humano, a igualdade de direitos, a recusa categórica de
formas de discriminação, a importância da solidariedade e do respeito. Caberia
ao campo educacional propiciar aos alunos as capacidades de vivenciar as
diferentes formas de inserção sociopolítica e cultural, e apresentar para a
escola, a necessidade de assumir-se como espaço social de construção dos
significados éticos necessários e constitutivos de toda e qualquer ação de
cidadania. Tratava-se de ter em vista a formação dos estudantes em termos de
sua capacitação para a aquisição e o desenvolvimento de novas competências,
em função de novos saberes que iriam produzir e formar um novo tipo de
profissional, preparado para poder lidar com novas tecnologias e linguagens,
capaz de responder a novos ritmos e processos.
De acordo com os PCN (1997) essas novas relações entre
conhecimento e trabalho exigiam capacidade de iniciativa e inovação e, mais
do que nunca, “aprender a aprender”. Isso colocou novas demandas para a
escola. A educação básica passou a ter assim a função de garantir condições
para que o aluno construísse instrumentos que o capacitassem para um
processo de educação permanente. Para tanto, seria necessário que,
[...] no processo de ensino e aprendizagem, fossem
exploradas: a aprendizagem de metodologias capazes de
priorizar a construção de estratégias de verificação e
comprovação de hipóteses na construção do conhecimento, a
construção de argumentação capaz de controlar os resultados
desse processo, o desenvolvimento do espírito crítico capaz de
favorecer a criatividade, a compreensão dos limites e alcances
lógicos das explicações propostas. Além disso, é necessário ter
em conta uma dinâmica de ensino que favoreça não só o
descobrimento das potencialidades do trabalho individual, mas
também, e, sobretudo, do trabalho coletivo. Isso implica o
estímulo à autonomia do sujeito, desenvolvendo o sentimento
de segurança em relação às suas próprias capacidades,
interagindo de modo orgânico e integrado num trabalho de
equipe e, portanto, sendo capaz de atuar em níveis de
interlocução mais complexos e diferenciados (BRASIL. PCN,
vol. I, 1997, p. 28).
34 Behrens (2020) afirma que um dos grandes desafios da educação é
formar cidadãos autônomos, dispostos a promover sua auto-formação ao longo
da vida, mantendo uma atitude de pesquisador responsável pelo próprio
aprendizado. Diante disto, a autora diz que, busca-se por meio de inúmeras
propostas metodológicas, ampliar o eixo da ação docente, tendo como foco
principal o aprender a aprender. Isto pode significar um futuro rico em
possibilidades, pois no lugar de espectadores se formarão investigadores, no
lugar de pessoas passivas e mudas, teremos cidadãos decididos e politizados,
pessoas que saberão que além do acesso as informações, também é
importante saber como analisá-las para então, organizar novos saberes. Neste
contexto os PCN (1997) ressaltam que:
[...] a prática de todo professor, mesmo de forma inconsciente,
sempre pressupõe uma concepção de ensino e aprendizagem
que determina sua compreensão dos papéis de professor e
aluno, da metodologia, da função social da escola e dos
conteúdos a serem trabalhados. A discussão dessas questões
é importante para que se explicitem os pressupostos
pedagógicos que trazem coerência à atividade de ensino, entre
o que se pensa estar fazendo e o que realmente se faz. Tais
práticas se constituem a partir das concepções educativas e
metodologias de ensino que permearam a formação
educacional e o percurso profissional do professor, aí incluídas
suas próprias experiências escolares, suas experiências de
vida, a ideologia compartilhada com seu grupo social e as
tendências pedagógicas que lhe são contemporâneas
(BRASIL. PCN, vol. I, 1997, p. 30).
As tendências pedagógicas que se firmam nas escolas brasileiras,
públicas e privadas, na maioria dos casos não apareciam em forma pura, mas
com características particulares, muitas vezes mesclando aspectos de mais de
uma linha pedagógica. A análise das tendências pedagógicas no Brasil deixava
evidente a influência dos grandes movimentos educacionais internacionais, da
mesma forma que expressavam as especificidades de nossa história política,
social e cultural, a cada período em que eram consideradas. De acordo com
Libâneo (2002) foram identificadas na tradição pedagógica brasileira, a
presença de quatro grandes tendências: a tradicional, a renovada, a tecnicista
e aquelas marcadas centralmente por preocupações sociais e políticas.
A pedagogia tradicional era uma proposta de educação centrada no
professor, cuja função se definia como a de vigiar e aconselhar os alunos,
35 corrigir e ensinar a matéria. A metodologia decorrente de tal concepção
baseava-se na exposição oral dos conteúdos, numa sequência predeterminada
e fixa independentemente do contexto escolar; enfatizava-se a necessidade de
exercícios repetidos para garantir a memorização dos conteúdos, transmitindo
conhecimentos disciplinares para a formação geral do aluno, quando fosse
inserido na sociedade, e no momento de escolher por uma profissão
valorizada.
A pedagogia renovada era uma concepção que incluía várias correntes
que, de uma forma ou de outra, estavam ligadas ao movimento da Escola Nova
ou Escola Ativa, que valorizavam o indivíduo como ser livre, ativo e social. O
centro da atividade escolar não era o professor nem os conteúdos disciplinares,
mas sim o aluno, como ser ativo e curioso. O mais importante não era o ensino,
mas o processo de aprendizagem. Em oposição à Escola Tradicional, a Escola
Nova destacava o princípio da aprendizagem por descoberta e estabelecia que
a atitude de aprendizagem partisse do interesse do aluno, que, por sua vez,
aprendia fundamentalmente pela experiência, pelo que descobriam por si
mesmos.
Nesta escola o professor era visto, então, como facilitador no processo
de busca de conhecimento que deveria partir do aluno. Cabia ao professor
organizar e coordenar as situações de aprendizagem, adaptando suas ações
às
características
individuais
dos
alunos,
para
desenvolverem
suas
capacidades e habilidades intelectuais. Os documentos do PCN (1997) relatam
que essa tendência, “que teve grande penetração no Brasil na década de 30,
no âmbito do ensino pré-escolar (jardim de infância), até hoje influencia muitas
práticas pedagógicas” (BRASIL. PCN, vol. I, 1997, p. 32).
Nos anos 70 apareceu o tecnicismo educacional, inspirado nas teorias
behavioristas da aprendizagem e da abordagem sistêmica do ensino, que
definiu uma prática pedagógica altamente controlada e dirigida pelo professor,
com atividades mecânicas inseridas numa proposta educacional rígida e
passível de ser totalmente programada em detalhes. Houve uma valorização
grande para a tecnologia programada de ensino, trazendo a ideia de que
aprender depende exclusivamente de especialistas e de técnicas, valorizando
nessa perspectiva não o professor, mas a tecnologia. O professor passa a ser
36 um mero especialista na aplicação de manuais e sua criatividade fica restrita
aos limites possíveis e estreitos da técnica utilizada.
A função do aluno foi reduzida a um indivíduo que reagia aos estímulos
de forma a corresponder às respostas esperadas pela escola, para ter êxito e
avançar. Seus interesses e seu processo particular não eram considerados e a
atenção que recebia era para ajustar seu ritmo de aprendizagem ao programa
que o professor deveria programar.
No final dos anos 70 e início dos 80, ocorreu uma mobilização dos
educadores para buscar uma educação crítica a serviço das transformações
sociais, econômicas e políticas, que tivesse em vista a superação das
desigualdades existentes no interior da sociedade. Ao lado das denominadas
teorias crítico-reprodutivistas, firmava-se no meio educacional a presença da
“pedagogia libertadora” e da “pedagogia crítico-social dos conteúdos”,
assumida por educadores de orientação marxista.
A pedagogia libertadora teve suas origens nos movimentos de educação
popular que ocorreram no final dos anos 50 e início dos anos 60, quando foram
interrompidos pelo golpe militar de 1964; teve seu desenvolvimento retomado
no final dos anos 70 e início dos anos 80. Nessa proposta, a atividade escolar
baseava-se em discussões de temas sociais e políticos e em ações sobre a
realidade
social
imediata;
analisavam-se
os
problemas,
seus
fatores
determinantes e organizava-se uma forma de atuação para que pudesse ser
transformada a realidade social e política. O professor era um coordenador de
atividades que organizava e atuava conjuntamente com os alunos.
A pedagogia crítico-social dos conteúdos que surgiu no final dos anos 70
e início dos 80 se colocou como uma reação de alguns educadores que não
aceitava a pouca relevância que a pedagogia libertadora dava ao aprendizado
elaborado, historicamente acumulado, que constituía parte do acervo cultural
da humanidade. A pedagogia crítico-social dos conteúdos entendia que não
bastava ter como conteúdo escolar as questões sociais atuais, mas que era
necessário que se tivesse domínio de conhecimentos, habilidades e
capacidades mais amplas para que os alunos pudessem interpretar suas
experiências de vida e defender seus interesses de classe.
Tavares (2002) diz que as tendências pedagógicas que marcaram a
trajetória educacional brasileira começam trazer contribuições para uma
37 proposta atual que buscasse recuperar aspectos positivos das práticas
anteriores em relação ao desenvolvimento e à aprendizagem, realizando uma
releitura dessas práticas à luz dos avanços ocorridos nas produções teóricas,
nas investigações e em fatos que se tornaram observáveis nas experiências
educativas mais recentes que estavam sendo realizadas em diferentes Estados
e Municípios do Brasil nesta época.
No final dos anos 70, as tendências didáticas tinham um viés mais
psicológico e outras cujo viés era mais sociológico e político.
A partir dos anos 80 surge com maior evidência um movimento
que pretende a integração entre essas abordagens. Se por um
lado não é mais possível deixar de se ter preocupações com o
domínio de conhecimentos formais para a participação crítica
na sociedade, considera-se também que é necessária uma
adequação pedagógica às características de um aluno que
pensa de um professor que sabe e aos conteúdos de valor
social e formativo. Esse momento se caracteriza pelo enfoque
centrado no caráter social do processo de ensino e
aprendizagem e é marcado pela influência da psicologia
genética. O enfoque social dado aos processos de ensino e
aprendizagem traz para a discussão pedagógica aspectos de
extrema relevância, em particular no que se refere à maneira
como se devem entender as relações entre desenvolvimento e
aprendizagem, à importância da relação interpessoal nesse
processo, à relação entre cultura e educação e ao papel da
ação educativa ajustada às situações de aprendizagem e às
características da atividade mental construtiva do aluno em
cada momento de sua escolaridade (BRASIL, PCN, vol. I,
1997, p. 32).
A psicologia genética buscava um aprofundamento sobre o processo de
desenvolvimento
na
construção
do
conhecimento.
Compreender
os
mecanismos pelos quais as crianças construíam representações internas de
conhecimentos construídos socialmente, em uma perspectiva psicogenética,
trazia uma contribuição para além das descrições dos grandes estágios de
desenvolvimento. Em 80 foi revolucionado o ensino da língua escrita no Brasil,
e ao mesmo tempo, provocou-se uma revisão do tratamento dado ao ensino e
à aprendizagem em outras áreas do conhecimento, ou foi muitas vezes
interpretada
como
uma
proposta
de
pedagogia
construtivista
para
alfabetização, transformando a investigação acadêmica em método de ensino.
Com esses equívocos, difundiram-se, sob o rótulo de pedagogia
construtivista, as ideias de que não se deveriam corrigir os erros e de que as
38 crianças aprenderiam fazendo do seu jeito. Essa pedagogia, dita construtivista,
trouxe sérios problemas ao processo de ensino e aprendizagem, pois
desconsiderava a função primordial da escola que é ensinar, intervindo para
que os alunos aprendessem o que, sozinhos, não teriam condições de
aprender.
A
orientação
proposta
nos
Parâmetros
Curriculares
Nacionais
reconhecia a importância da participação construtiva do aluno e, ao mesmo
tempo, da intervenção do professor para a aprendizagem de conteúdos
específicos
que
favorecessem
o
desenvolvimento
das
capacidades
necessárias à formação do indivíduo. Ao contrário de uma concepção de
ensino e aprendizagem como um processo que se desenvolvesse por etapas, o
que se propunha era uma visão complexa e provisória do conhecimento, uma
vez que não era possível chegar de imediato ao conhecimento correto, mas
somente por aproximações sucessivas que permitiam sua reconstrução.
Os Parâmetros Curriculares Nacionais, tanto nos objetivos
educacionais que propõem quanto na conceitualização do
significado das áreas de ensino e dos temas da vida social
contemporânea que devem permeá-las, adotam como eixo o
desenvolvimento de capacidades do aluno, processo em que
os conteúdos curriculares atuam não como fins em si mesmos,
mas como meios para a aquisição e desenvolvimento dessas
capacidades. Nesse sentido, o que se tem em vista é que o
aluno possa ser sujeito de sua própria formação, em um
complexo processo interativo em que também o professor se
veja como sujeito de conhecimento (BRASIL, PCN, vol. I, 1997,
p. 33).
Nesta fase, a importância dada aos conteúdos revelava o compromisso
da instituição escolar com os saberes convencionados pela sociedade, fazendo
com que tudo que fosse ensinado estivesse em consonância com as questões
sociais que marcavam cada época. Isso exigia que a escola fosse um espaço
de formação e informação, em que a aprendizagem de conteúdos deveria
necessariamente favorecer a inserção do aluno no dia-a-dia das questões
sociais marcantes e em um universo cultural maior. A formação escolar
propiciaria o desenvolvimento de capacidades, de modo a favorecer a
compreensão e a intervenção nos fenômenos sociais e culturais, assim como
possibilitar aos alunos usufruir das manifestações culturais nacionais e
universais.
39 Na proposta dos PCN (1997), é colocada a educação escolar como uma
prática que tem possibilidades de criar condições para que todos os alunos
desenvolvam suas capacidades e aprendam os conteúdos necessários para
construir instrumentos de compreensão da realidade e de participação em
relações sociais, políticas e culturais diversificadas e cada vez mais amplas,
condições fundamentais para o exercício da cidadania na construção de uma
sociedade democrática e não excludente.
A prática escolar se diferencia de qualquer outra, por ser uma ação
intencional, sistematizada, planejada e continuada por crianças e jovens
durante um período extenso e contínuo de tempo. A escola tem como objetivo
formar cidadãos para atuar de maneira competente e digna na sociedade,
buscando conteúdos relacionados com as questões sociais que marcam um
momento histórico, cuja sua assimilação são consideradas essenciais para que
os alunos exerçam seus direitos e deveres.
Para tanto ainda é necessário que a instituição escolar garanta
um conjunto de práticas planejadas com o propósito de
contribuir para que os alunos se apropriem dos conteúdos de
maneira crítica e construtiva. A escola, por ser uma instituição
social com propósito explicitamente educativo, tem o
compromisso de intervir efetivamente para promover o
desenvolvimento e a socialização de seus alunos (BRASIL.
PCN, vol. I, 1997, p. 34).
Nos PCN (1997), para esta função socializadora a escola ressalta dois
aspectos que são o desenvolvimento individual e o contexto social e cultural,
podendo compartilhar com outras pessoas seus saberes e a forma de
conhecimento individual, pois como não há desenvolvimento individual para a
sociedade e cultura, é necessário que se tenha um processo de socialização.
Os conhecimentos que se transmitem e se recriam na escola ganham sentido
quando são produtos de uma construção dinâmica que se opera na interação
constante entre o saber escolar e os demais saberes, entre o que o aluno
aprende na escola e o que ele traz para a escola, num processo contínuo e
permanente de aquisição, no qual interferem fatores políticos, sociais, culturais
e psicológicos.
A escola deve se posicionar dando oportunidade para que sejam
trabalhados temas que sejam relevantes para a formação de valores e atitudes
40 do sujeito em relação aos outros. E para que a escola possa exercer sua
função social deve possibilitar aos alunos condições para desenvolver
competência e consciência profissional, possibilitando o cultivo dos bens
culturais e sociais, considerando as expectativas e as necessidades dos
alunos, dos pais, dos membros da comunidade, dos professores, enfim, dos
envolvidos diretamente no processo educativo.
De acordo com os PCN (1997) se o projeto educacional exige
ressignificar o processo de ensino e aprendizagem, este precisa se preocupar
em preservar o desejo de conhecer e de saber como que todas as crianças
chegam à escola. É preciso manter a boa qualidade do vínculo com o
conhecimento e não destruí-lo pelo fracasso reiterado.
[...] mas para garantir experiências de sucesso não é preciso
omitir ou disfarçar o fracasso, é bem ao contrário, significa
conseguir realizar a tarefa a que se propôs. Relaciona-se,
portanto, com propostas e intervenções pedagógicas
adequadas. O professor deve ter propostas claras sobre o que,
quando e como ensinar e avaliar, a fim de possibilitar o
planejamento de atividades de ensino para a aprendizagem de
maneira adequada e coerente com seus objetivos. É a partir
dessas determinações que o professor elabora a programação
diária de sala de aula e organiza sua intervenção de maneira a
propor situações de aprendizagem ajustadas às capacidades
cognitivas dos alunos. Em síntese, não é a aprendizagem que
deve se ajustar ao ensino, mas sim o ensino que deve
potencializar a aprendizagem (BRASIL. PCN, vol. I, 1997, p.
39).
E diante deste contexto da educação no Brasil a partir dos documentos
relatados nos PCN (1997), é enfatizado que o ensino e a aprendizagem de
conteúdos colaboram para a formação do cidadão, buscando igualdade de
participação e compreensão sobre a produção nacional e internacional de arte.
A seleção e a ordenação de conteúdos gerais de Arte têm como pressupostos
a clarificação de alguns critérios, que também encaminham a elaboração dos
conteúdos de Artes Visuais, Música, Teatro e Dança e, no conjunto, procuram
promover a formação artística e estética do aprendiz e a sua participação na
sociedade. É importante que o aluno em sua escolaridade tenha oportunidade
de vivenciar maior número de formas de arte, precisando para isto que cada
modalidade de arte seja desenvolvida e aprofundada.
41 Para que a aprendizagem da música possa ser fundamental na
formação de cidadãos é necessário que todos tenham a
oportunidade de participar ativamente como ouvintes,
intérpretes, compositores e improvisadores, dentro e fora da
sala de aula (BRASIL. PCN, vol. VI, 1997, p. 54).
Os alunos devem sentir que estão “fazendo música” e o quanto é
prazeroso colocar suas personalidades nestas produções, sentir-se inteiros no
processo musical, brincando, se divertindo e aprendendo. Em torno dessa
imagem, que traz significado à prática musical e sentido à vida escolar, é
possível construir novas maneiras de dar aula, elaborando estratégias que
visem a uma produção musical calcada no prazer, no desenvolvimento do
pensamento autônomo dos alunos e no desejo de aprender música na sala de
aula, reformulando constantemente sua prática docente, adequando-a às
necessidades e aos interesses coletivos.
Paulo Freire (1997) nos diz que ensinar e aprender não podem dar-se
fora da procura, da boniteza e da alegria, cabendo aos professores a eterna
busca pelo “gosto da alegria sem a qual a prática educativa perde o sentido, e
que ensinar exige alegria e esperança e que ensinar exige respeito à
autonomia do ser do educando” (FREIRE, 1997, p. 160). Propondo uma
pedagogia das diferenças voltamos a salientar a importância da observação
por parte do professor, quando ele realmente conhece seus alunos e, assim,
escolhe a melhor forma de ajudá-los quanto ao seu desenvolvimento pessoal e
musical. Isso implica a percepção do aluno como uma pessoa – não apenas
um ser que aprende, as uma criança cuja vida, dentro e fora da escola, é objeto
do conhecimento e da atenção da professora.
Na visão de Gainza (1977), “o educador musical que sente a Pedagogia
como uma arte, aspira a ser um intérprete e não um mero repetidor da obra
pedagógica dos diferentes educadores musicais com quem ele tem contato”
(GAINZA, apud JOLY, 2003, p. 122). Esta atitude será tomada, certamente, por
aqueles educadores musicais que realmente acreditam na Educação Musical
como meio efetivo na formação da criança, valorizando a cultura que sustenta
a vida destes alunos dentro e fora da escola, e que é capaz de contaminar a
Educação pela Arte, assim como de possibilitar que o educando se construa e
reconheça como indivíduo e ser social, através dos conhecimentos musicais
adquiridos.
42 As características e as possibilidades até aqui levantadas mediante o
ensino de música nas escolas regulares, veiculam grande relevância à
coletividade, porque em geral, os alunos aprendem muito uns com os outros
nos trabalhos de grupos, nos quais as diferenças e as aptidões individuais
estão postas. Faz-se necessário então, o uso da dialética, das relações desta
diversidade com o eu individual, em que os alunos ora se identificam com os
interesses comuns e ora percebem-se enquanto indivíduos com atitudes,
gostos e conhecimentos próprios. Mais uma vez está nas mãos do professor a
construção de uma projeto que potencialize a participação de todos,
provocando a reflexão e a consequente ação. Ou seja, um processo de ensinar
e de aprender baseado na auto-reflexão e na ponderação conjunta.
A aprendizagem não está limitada à ação de um aluno e do professor,
mas vê-se ampliada para um grupo social com interesses, necessidades e
exigências que vão configurando uma cultura peculiar, na qual o professor
desempenha papel fundamental no processo de ensinar e aprender.
Volto a citar Paulo Freire, por perceber em seu trabalho uma forte
ligação que ele faz quando valoriza a educação pela comunicação, e aponta
para um saber que se constrói a partir da interlocução que busca significados
que são partilhados, controlando as próprias ações e apropriando-se do saber
como um processo social.
Reforçando a importância da comunicação entre os grupos o autor
afirma que os homens, na busca de significados e consensos para os
problemas que afligem a coletividade, podem chegar à transformação social
quando se assumirem como protagonistas e forem capazes de refletir e criticar
em conjunto:
[...] para ambas as partes, a tarefa interpretativa consiste em
incorporar na sua perspectiva, a interpretação da situação
produzida pelo outro, de tal maneira que, na versão revista, o
seu mundo exterior e o meu mundo interior se possam
relativizar – em função da relação entre o nosso mundo vital e
o mundo – gerando uma aproximação suficiente entre as
definições discrepantes que se produzem acerca da situação
(FREIRE, 2000, p. 24).
Com relação ao pensamento de Freire, encontra-se sentido quando se
concorda que o ato educativo deixa, assim, de se basear numa relação em que
o professor, detentor do conhecimento, procura transformar o aluno ignorante,
43 que passa a entender-se como parte de uma comunidade educativa, na qual se
criam as condições para que o currículo seja algo que vai sendo construído
através do diálogo em que todos participam.
Enfim, seja buscando novas formas de atuar na escola, seja construindo
propostas pedagógicas e metodológicas adequadas para esse contexto
educacional musical, seja ainda repensando a formação do professor,
[...] é preciso aprofundar cada vez mais o compromisso com a
educação básica, pois só assim a educação musical pode de
fato pretender o reconhecimento de seu valor e de sua
necessidade na formação de todos os cidadãos. Este é,
portanto, o grande desafio (FREIRE, 2000, p. 36).
A escola pode realizar um ensino de música que esteja ao alcance de
todos, visto ser um espaço de construção e reconstrução do conhecimento. A
ousadia fica por conta das tentativas de democratizar o acesso à arte, de se
projetar nesta tarefa de renovação, reconstrução e, mais ainda, de apoiar as
atividades
pedagógicas
musicais,
considerando-as
qualitativamente
significativas. Se o verdadeiro objetivo é aproximar o aluno da música, levandoo a gostar de ouvi-la, apreciá-la e compreendê-la, é preciso, com urgência,
preencher o vazio musical no cotidiano escolar o qual, ao mesmo tempo, deixase escapar aos nossos sentidos.
Fazendo uma reflexão da educação no Brasil a partir desta preocupação
da formação completa do sujeito para a sociedade contemporânea, e qual a
contribuição da Educação Musical para a Educação Básica. Que conexão é
possível ser feita entre o que a Educação Musical proporciona ao aluno e o que
a Educação Básica visa formar. Para uma melhor compreensão dos benefícios
da Educação Musical na formação do sujeito considero importante uma
reflexão de como vem acontecendo sua trajetória histórica ao longo dos anos.
2.2 História da Educação Musical e tendências das práticas pedagógicas
No Brasil, a Educação Musical passou por uma trajetória lenta e
reformista, observando-se as mais diversas concepções referentes ao ensino
da música. Por exemplo, com a queda do sistema Republicano em 1930,
instalou-se uma política educacional nacionalista e autoritária que utilizou a
44 música para desenvolver a "coletividade", a "disciplina" e o "patriotismo". É
durante esse período que se dá a obrigatoriedade do ensino de música nas
escolas primárias e secundárias (Decreto nº 19891, de 11 de abril de 1931),
refletindo um momento de transformação liderado por Villa-Lobos. A esse
respeito cita-se o pensamento de Souza (1998):
A ideia sobre a educação musical na literatura dos anos trinta é
muito diferenciada e por vezes contraditória. Especialmente
são colocados objetivos sócio-políticos muito gerais como
educação musical a serviço da coletividade e unidade nacional,
o despertar do sentimento de brasilidade ou ainda disciplina
social, que no entanto não são em lugar algum claramente
definidos mas apenas vagamente descritos (SOUZA, 1998,
p.13).
A Educação Musical, do modo como foi concebido no século XIX,
ocupou lugar de destaque em nossa educação, e seu reconhecimento, sua
importância e seus benefícios à elite eram visíveis, uma vez que em nossa
realidade a educação do século XIX foi quase toda preceptoral, ou seja,
trabalhada por preceptores que atendiam as elites. De acordo com Fonterrada
(2005) o educador musical iniciava seus alunos na tradicional cultural musical
européia, com o objetivo de formar músicos, independente de seguirem uma
carreira musical. Ensinava-se nas poucas escolas de elite a alfabetização
musical, o ler e escrever músicas, a fim de serem introduzidos na prática de
instrumentos tradicionais.
Foi um decreto federal de 1854 que regulamentou a Educação Musical
escolar, orientando as atividades docentes. No ano seguinte, uma nova lei
estabeleceu as diretrizes dos concursos públicos para a contratação de
professores de música. A título de ilustração nota-se, conforme comenta Jardim
(2006), que o ensino de canto coral foi instituído no Brasil desde o século XIX,
quando o decreto nº. 27, de 12 de março de 1890, estabelecia tal matéria para
a formação do professor normalista e iniciação musical infantil (crianças de 7 a
10 anos).
Contudo, surgiram no século XX novos métodos de ensino de
aprendizagem pela descoberta, centrados na criança, aprofundando a ideia de
alfabetização musical, visando despertar os “sentimentos” e as “expressões”. O
aluno passava a partir daí a construir seu processo de aquisição do
45 conhecimento. Assim, coube ao educador musical perceber as crianças como
compositoras e inventoras, encorajando-as à auto-expressão. Essa forma de
ensino musical sofreu críticas com relação à exigência e a perspicácia do
educador. O conteúdo e a forma de métodos específicos eram testados na
execução de um instrumento, ficando difícil a avaliação da capacidade criativa
do aluno.
Ainda durante o século XX, cresceu a preocupação de se preservar
determinadas culturas de cada região do país, para não perder sua
originalidade.
Buscou-se,
também,
compreender
a
maneira
como
se
manifestavam as diferentes culturas existentes em nosso país, bem como o
reconhecimento e valorização de cada grupo étnico e o respeito entre esses
grupos.
O enfoque multicultural se contrapõe à ênfase dada anteriormente à
herança européia, ao ensino da notação e aos instrumentos tradicionais.
Assim, esse ensino, sofreu duras críticas e lançou desafios ao educador, que
necessitaria conhecer costumes, práticas, instrumentos musicais que nunca
vira ou estudara, e os estudantes teriam a oportunidade de construir seus
conhecimentos
nas
diferentes
manifestações
musicais
de
diferentes
repertórios, instrumentos, formas de notação e outras.
Na Primeira República, a legislação educacional evoluiu diversamente
em cada estado, fazendo com que em cada região a estrutura e o
funcionamento das escolas adquirissem características muito específicas. Em
São Paulo, por exemplo, a matriz curricular abrangia disciplinas como
educação cívica, leitura de música e canto, exercícios ginásticos e militares e
trabalhos manuais apropriados à idade e sexo (NAGLE, 1985). Nos anos 20,
acompanhando a modernização e a urbanização do país, jovens educadores
como Anísio Teixeira realizaram um ciclo de inovação na pedagogia nacional,
difundindo os ideais da Escola Nova no Brasil. Inspirados nas idéias do norte
americano John Dewey, esses intelectuais propunham uma escola mais
democrática, liberal e concernente aos interesses dos educandos (NAGLE,
1985; FUCCI, 2006; JARDIM, 2008).
De acordo com Fucci (2006), acompanhando tal processo, nos anos 30
foram realizadas reformas educacionais no Distrito Federal, das quais tomaram
parte educadores e artistas, como Cândido Portinari, Cecília Meireles e Villa-
46 Lobos. O maestro, convidado a ser diretor do ensino artístico no Rio de
Janeiro, inseriu a disciplina canto orfeônico no currículo das escolas locais,
medida que foi, pela reforma Capanema, ampliada para todo o território
nacional. Para apoiar tal projeto, Villa-Lobos fundou a Superintendência de
Educação Musical e Artística (SEMA), a qual visava à realização da orientação,
do planejamento e do desenvolvimento do estudo da música nas escolas, em
todos os níveis. Com a evolução do ensino de canto orfeônico em todo o
território nacional, foi criado o Conservatório Nacional de Canto Orfeônico
(CNCO) em 1942, com a finalidade de formar professores capacitados a
ministrar tal matéria (FUCCI, 2006, p. 156).
Depois da Segunda Grande Guerra, surgiu o movimento Música Viva,
liderado por Hans-Joachim Koellreuter, o qual defendia o "combate pela música
que revela o eternamente novo, isto é: por uma arte musical que seja a
expressão real da época e da sociedade" (BRITO, 1998, p. 27).
A organização da música vocal na rede oficial de ensino, durante as
décadas de 30 e 40, permitiu uma maior veiculação da música entre a
população brasileira por muitas gerações, em um processo de democratização
e de valorização cultural. Todavia, em 1961 o Conselho Federal de Educação
instituiu a educação musical, em substituição ao canto orfeônico. A educação
musical transformou-se em disciplina curricular até o início da década de 1970,
quando, com a LDB 5692/71, o Conselho Federal de Educação instituiu o curso
de licenciatura em educação artística, alterando o currículo do curso de
educação musical e criando a figura do professor polivalente. Essa matriz
curricular passou a compor-se de quatro áreas artísticas distintas: música,
artes plásticas, artes cênicas e desenho. Assim, a educação artística foi
instituída como atividade obrigatória no currículo escolar do 1º e 2º graus
(ensino fundamental e médio), em substituição às disciplinas de artes
industriais, música e desenho, passando a ser um componente da área de
comunicação e expressão (FUCCI, 2006, p. 155).
Em 1971, a música passou a fazer parte de um ensino interdisciplinar,
com base no artigo 7º da Lei 5692 de 1971. Com esta reforma, a Educação
Artística foi introduzida nos currículos escolares de I e II Graus, trazendo
problemas para o ensino da música, bem como para as outras artes (artes
plásticas e artes cênicas). De 1971 em diante, o professor de Educação
47 Artística
ficou
responsável
por
uma
prática
pedagógica
polivalente.
Consequentemente, aqueles profissionais que tinham formação na área da
música davam aulas de música e, esporadicamente, pincelavam tentativas com
atividades de artes plásticas e artes cênicas. Entretanto, aqueles professores
que não tinham formação em música acabavam ministrando aulas apenas nas
outras áreas (KATER, 1992).
Com a Lei de Diretrizes e Bases da educação nº 9394, de 1996, a
educação artística foi substituída pela disciplina arte, componente curricular
obrigatório em todos os níveis da educação básica. Com essa resolução,
consolidou-se a desagregação total da prática musical na escola. Grande parte
dos educadores, licenciados em educação artística, mas sem qualquer
qualificação na área de música, não podendo lidar adequadamente com a
educação musical, passaram a utilizar um ensino voltado quase que totalmente
às artes plásticas.
A partir disto a Educação Musical tornou-se, então, privilégio de uns
poucos, pois a maioria das escolas brasileiras aboliu o ensino de música dos
currículos escolares devido a fatores como a não-obrigatoriedade da aula de
música na grade curricular e a falta de profissionais da área, somando-se a
isso os valores culturais e sociais que regem a sociedade brasileira. As raras
instituições de ensino que ainda preservam a música no programa curricular
oferecem uma carga horária mínima e, nessa situação caótica, ainda encontrase a problemática da prática pedagógica da educação musical (BEYER, 1993).
Na grande maioria das vezes, segundo Santos (1994), as aulas
restringem-se ao trabalho de "eventos culturais objetivando culminâncias que,
embora altamente motivadoras, vêm em nome de um produto, sacrificando um
processo" (SANTOS, 1994, p.10). E a autora prossegue mencionando que os
professores aceitam a função de:
[...] festeiro, preparador de hinos; encaram o trabalho artístico e
musical como auxiliar pedagógico para fixação de
conhecimentos de outras disciplinas; justificam o trabalho
artístico e musical como momento de liberação emocional e/ou
relaxamento para o desenvolvimento em processos cognitivos
desenvolvidos em outras disciplinas do currículo (SANTOS,
1994, p.10).
48 De acordo com Del Ben (2007), vive-se em um momento de expectativa
dentre os profissionais da Educação Musical. Tem sido veiculada nos meios
acadêmicos, na imprensa musical, nos diversos contextos em que se pratica a
música, a vitória do projeto de lei nº 330/2006 em dezembro de 2007, quando
este foi aprovado no Senado Federal, após intensos debates com a
participação da Associação Brasileira de Educação Musical (ABEM), do Grupo
de Articulação Parlamentar Pró-Música (GAP), de legisladores e de
representantes de diversas instituições do país. Mais recentemente, em junho
de 2008, o projeto de lei, agora com o número 2732/08, foi aprovado em
caráter conclusivo pela Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania
(CCJ) da Câmara dos Deputados, tendo sido encaminhado para a sanção
presidencial.
Um novo marco para educação musical passa a surgir com a proposição
do projeto de lei 330/2006, que institui a obrigatoriedade do ensino de música
na educação básica, alterando as Leis de Diretrizes e Bases (LDB) 9394/96: a
música deverá ser conteúdo obrigatório, mas não exclusivo, do componente
curricular arte; a educação musical será ministrada por professores com
formação específica na área e os sistemas de ensino terão três anos para se
adaptarem às exigências estabelecidas.
De acordo com Del Ben (2007), o manifesto pela implantação do ensino
musical nas escolas reconhece a discrepância entre os concursos para a
contratação de professores polivalentes - que continuam ocorrendo - e o fato
das universidades oferecerem candidatados qualificados em cada área artística
específica.
Diante desse quadro, ressalta-se a importância do professor ter a
garantia de um espaço legal para o ensino da música nas escolas de educação
básica, a implementação gradativa do ensino de música nestas escolas, a
elaboração de concursos públicos com mais vagas específicas na área de
música, tendo em vista que resultados de trabalhos realizados em diferentes
estados do país sugerem que são escassos os professores de música nas
escolas de educação básica, bem como práticas sistematizadas de ensino
musical, e a construção de projetos de formação musical e pedagógico-musical
continuada para os professores em serviço na educação básica.
49 Penna (2008) ressalta que esses desafios exigem novas reflexões e
uma outra formação, com base em uma concepção de música bastante ampla.
A autora ainda insiste na questão da educação básica, por entender ser este o
espaço em que o ensino de música pode ter um maior alcance social, atuando
efetivamente para a democratização no acesso à arte e à música. No entanto
são múltiplos os espaços de atuação para o educador musical, pela
diversidade de contextos educativos, escolares ou extra-escolares, incluindo os
projetos sociais e as escolas especializadas em música.
Para tanto, a formação do professor não se esgota apenas no domínio
da linguagem musical, sendo indispensável uma perspectiva pedagógica que o
prepare para compreender a especificidade de cada contexto educativo e lhe
dê recursos para a sua atuação docente e para a construção de alternativas
metodológicas.
O fato é que toda construção do novo é difícil, colocando em jogo não
apenas romper a inércia e os padrões estabelecidos, mas também enfrentar o
desconhecido e criar condições para mudanças que não sejam apenas de
nomes e de discursos, mas sim transformações efetivas de práticas, de
posturas e de concepções.
Afinal, de acordo com Penna (2008) o trabalho com música não é
somente uma sequência de disciplinas e suas ementas, mas envolve
concepções de música, de educação, assim como do papel político e social da
escola, que o professor deve estar comprometido com a mudança, e com a
educação buscando caminhos para a democratização no acesso à arte e à
música. Somente desta maneira os professores de música poderão ocupar
com competência e com práticas significativas os possíveis espaços
educativos, e em especial a escola regular de educação básica, reconhecendo
assim o valor social da educação musical.
Neste sentido serão abordadas no próximo capítulo as concepções da
educação musical, bem como a sua fundamentação teórica.
50 CAPÍTULO III
CONCEPÇÕES DA EDUCAÇÃO MUSICAL
E METODOLOGIAS APLICADAS
Para uma melhor compreensão da Educação musical é necessário uma
reflexão sobre o ensino de música, pois engloba campos de conhecimento
diversos e a valorização da educação e da música. Para isto se faz necessária
uma visão histórica dentro de uma perspectiva psicológica das teorias de
ensino e aprendizagem bem como das funções social e filosófica da escola e
da música, pois a Educação Musical “é um fundamento importante para a
construção de uma proposta de ensino que auxilia na compreensão do sistema
de crenças e valores: a forma como é percebido o mundo e o que é definido
como importante” (BEINEKE, 1999, p. 117).
A seguir serão apresentadas definições dos termos que serão usados
com os significados pertinentes a esta pesquisa, pois achei necessário
caracterizá-los dentro de uma concepção educacional.
3.1 O sentido e o significado da Educação Musical
A Educação Musical, entendida como ciência ou área de conhecimento,
não escapa de conviver e de se defrontar com constantes situações
problemáticas que são peculiares ao atual momento. Diferentes práticas,
espalhadas pelo país, são propostas com a intenção de amenizar as
necessidades
pedagógicas
musicais
decorrentes
da
diversidade
de
concepções de conhecimento e de mundo.
De acordo com Loureiro (2003), mesmo que o ensino de música nas
escolas de ensino regular esteja diluído em práticas metodológicas diversas,
muitas vezes por falta de fundamentação teórica consistente ou por formação
inadequada do educador musical, a Educação Musical envolvida no contexto
mais amplo do fenômeno educação não pode negligenciar-se a entender que a
51 “pluralidade não significa renunciar à identidade e não pode, em caso algum,
justificar a dispersão, a falta de rigor ou a superficialidade científica” (Pimenta,
apud Souza 1996, p. 12).
São muitos os problemas enfrentados pela área de educação musical, e
dentre eles, é considerado como os de maior importância “a falta de
sistematização do ensino de música nas escolas de ensino fundamental e o
desconhecimento do valor da educação musical como disciplina integrante do
currículo escolar” (LOUREIRO, 2003, p 109). Para o professor Koellreutter,
[...] a função da arte varia de acordo com as intenções da
sociedade. Porque o sistema social, o sistema de convivência
inter-humana, é governado pelo esquema de condições
econômicas. Na sociedade, o conceito de “arte representativa”,
como objeto de ornamentação de uma classe social
privilegiada, como um “status-símbolo” na vida privada de uma
elite social não envolvente, não é mais relevante
(KOELLREUTTER, 1990, pp. 40-41).
Loureiro (2003) considera importante na era tecnológica, que a arte se
deve ao fato de ser um elemento essencial de integração do homem na
sociedade,
surgindo
como
um
instrumento
de
desenvolvimento
da
personalidade, de libertação, de estímulo à criatividade, meio indispensável de
educação. Nessa perspectiva, segundo Koellreutter,
A arte torna-se essencial à existência e transforma-se em
instrumento de um sistema cultura que enlaça todos os setores
deste mundo construído pelo homem contribuindo para dar
forma a estes setores. A arte torna-se fator preponderante de
estética
de
humanização
do
processo
civilizador
(KOELLREUTTER, 1990, p. 40).
Tourinho (1996) afirma que as questões relacionadas a valores da
música ou das outras artes sempre foram objetos de contínuo debate e
especulação tanto filosófica, quanto histórica ou sociológica. Não são questões
generalizáveis, pois situações como tempos, espaços e culturas diferentes
tiveram, têm e terão concepções variadas sobre música, suas funções, práticas
e, portanto, valores atribuídos ou ligados a ela. A autora afirma que muitas
questões podem ser propostas no intuito de reforçar a necessidade de uma
reflexão crítica para aprofundamento do valor e da natureza da música e de
suas implicações estéticas, psicológicas, históricas, culturais e sociais na vida
52 do indivíduo. Tal reflexão para reconhecerem os valores atribuídos à música
deve partir da própria prática pedagógica, possibilitando à sociedade tomar
consciência das relações entre educação formal, educação musical, indivíduo e
sociedade.
Hentschke (1993) identifica pelo menos, cinco valores sobre os quais a
prática de educação musical tem sido fundamentada ao longo dos anos. A
autora aponta os valores “social, estético, multicultural, psicológico e
tradicional” como valores e crenças que, através dos tempos, foram apontados
por diversas correntes de pensamento, fundamentados em áreas diversas de
conhecimento e que viriam refletir uma concepção de vida, de homem e de
arte, dentre elas, a música. Segundo a autora,
Faz-se necessário considerar que em toda prática educacional
estão refletidos os valores e crenças de seus agentes. Neste
sentido, se esses valores e crenças não estiverem
fundamentados, eles poderão facilmente ser transformados ou
subjugados a pressões externas. A convicção e clareza com
que determinados valores são estabelecidos e assumidos são
de fundamental importância, pois, com base neles, de modo
consciente ou inconsciente, as práticas educacionais são
efetivadas. Portanto, subscrever um valor falso para a
Educação Musical como, por exemplo, transformando-a em
algo lúdico e passageiro, pode não só trazer prejuízo ao
educando como também para a própria Educação Musical
(HENTSCHKE, 1993, p. 56).
Loureiro (2003) se refere à música, e à educação pela música, dentro
dessa nova sociedade em fase de desenvolvimento sociocultural, em que
sistemas ligados à comunicação de massa, ao desenvolvimento acelerado da
tecnologia dominam o cenário nacional, surge a necessidade de fazê-la
interagir com este mundo globalizado, numa tentativa de torná-la mais próxima
do homem, prevenindo, dessa forma, o declínio de sua importância social. A
música, como qualquer conhecimento, entendida como uma linguagem
artística, organizada e fundamentada culturalmente, é uma prática social, pois
nela estão inseridos valores e significados atribuídos aos indivíduos e à
sociedade que a constrói e que dela se ocupam.
De acordo com Fonterrada
O aprendizado da música envolve a constituição do sujeito
musical, a partir da constituição da linguagem da música. O
53 uso dessa linguagem irá transformar esse sujeito, tanto no que
se refere a seus modos de perceber, suas formas de ação e
pensamento, quanto em seus aspectos subjetivos. Em
consequência, transformará também o mundo deste sujeito,
que adquirirá novos sentidos e significados, modificando
também a própria linguagem musical (FONTERRADA, 2005, p.
41).
Koellreutter (1990) acredita que somente um tipo de educação musical é
capaz de reverter o quadro pelo qual passa o ensino musical: o
desenvolvimento da criatividade, do senso crítico e de responsabilidade, da
sensibilidade de valores e de memória, e principalmente o desenvolvimento do
processo de conscientização com base no raciocínio e da reflexão. É um tipo
de Educação Musical que aceita “como função da educação nas escolas a
tarefa de transformar critérios e ideias artísticas em uma nova realidade,
resultante de mudanças sociais, colocando o homem como objeto da educação
musical” (KOELLREUTTER, 1990, p. 6).
Por isso Souza (1998) afirma que “a aula de música só pode ter êxito se
transformada numa ação significativa, o que pressupõe uma permanente
abertura para o novo num diálogo permanente com a realidade sociocultural”
(SOUZA, 1998, p. 82). Uma concepção educativa que valoriza a inclusão das
disciplinas artísticas, e a música é uma delas, deve estar convencionada e
preocupada em desenvolver no indivíduo o interesse pela criação e pela
apreciação estética, podendo compreender e até mesmo contestar, ao mesmo
tempo em que busca desenvolver sua imaginação e disposição para novas
atividades artísticas.
Snyders (1994), apesar de reconhecer as dificuldades e as carências
que o ensino da música enfrenta no espaço escolar, principalmente quando se
propõe a levar aos alunos a apreciação e a experiência do belo, procura
apontar caminhos que levem a superar reações adversas e indesejáveis. Para
o autor
O drama efetivo e cotidiano do ensino da música é que dispõe
de muito pouca, verdadeiramente muito pouca, utilidade para o
futuro da imensa maioria dos alunos: é preciso lembrar aqui
que ele não tem muita influência em seu futuro profissional,
nem mesmo em seu futuro escolar, notadamente na passagem
para uma classe mais adiantada. Sonho com um ensino de
música que responda a estas acusações dizendo que o que
54 propõe não ter por finalidade favorecer um desempenho melhor
“em seguida” e que nem pretende ser um modelo reduzido de
tudo o que se passará “em seguida” na vida adulta, quando a
juventude acabar. A vida se desenvolveria no presente, seria
dado valor á existência presente dos alunos. O ensino de
música tem, então, um papel exemplar: precisamente porque
não visa ao futuro, ao sucesso futuro, só existe e se justifica
pela alegria cultural que oferece aos alunos em sua vida de
alunos (SNYDERS, 1994, p. 133).
Nem todos os alunos são tocados pelas mesmas alegrias, e por isso a
importância de mostrar alegrias diferentes, focalizando a escuta de obras de
natureza diferente, esperando que em alguma o aluno encontre o que lhe
agrade, e que a partir desta que gostou passe a gostar de outras. Nessa
perspectiva é sempre importante considerar o interesse do aluno, abrindo
espaços para que possa colocar suas ideias sem medo, onde suas vivências
passam a colaborar com o crescimento do grupo e tornar mais interessante o
momento musical. Nesse aspecto é indiscutível a importância do educador
musical. Segundo Reis,
Um professor de educação musical que consiga levar seus
alunos a um nível verdadeiramente elevado de percepção
artística, estará preparando o seu senso crítico para perceber,
com maior clareza, as mazelas da sociedade. O
esclarecimento tem que ocorrer em todos os níveis e em todas
as disciplinas do currículo, mas através da Educação Artística,
o aprofundamento ocorre de uma forma especial, atingindo de
início, prazerosamente, a sensibilidade e daí partindo, de modo
evolutivo – envolvendo sensibilidade, razão, imaginação e a
própria “expressão” estética do aluno – num reforço produtivo
altamente motivado e gratificante, para uma reflexão cada vez
mais ampla, elevada e profunda. Nesta se inclui a descoberta
feita pelo próprio educando de seu potencial expressivo e
criador, como indivíduo capaz de transformar o mundo,
dominar a natureza e influir na alteração do rumo dos
acontecimentos (REIS, 1996, p. 89).
O essencial é entrar em contato com a própria música, de modo
prazeroso e interessante para o aluno, e que o professor de música esteja
preparado para descobertas e improvisos. É fundamental o papel da escola no
estudo da cultura musical, pois nela poderão ocorrer as trocas de experiências
pessoais, intuitivas e diferenciadas. Daí a necessidades de não se perder de
vista as práticas musicais que respondem a movimentos sociais e culturais que
55 vão além dos muros da escola, mas que refletem, mais cedo ou mais tarde, no
interior da sala de aula.
Loureiro (2003) considera o Brasil rico em diversidade e manifestação
musical, e é difícil de entender e aceitar que o ensino da música nas escolas
não se encontra ainda disseminado. Se vivemos numa sociedade urbana e
industrial,
em
crescente
progresso
de
desenvolvimento,
onde
várias
manifestações culturais se propagam de modo bastante intenso, rápido e
diversificado, “não seria exagero imaginar que nossos alunos estariam imersos
e que teriam à sua disposição uma variedade musical imensa e rica, formada
por músicas de vários estilos, formas e épocas” (LOUREIRO, 2003, p. 122). No
entanto as possibilidades não estão ao alcance de todos e isso mostra um
quadro que está presente nas escolas, e vem para confirmar que a função da
escola continua sendo a de transmitir conteúdos de caráter extenso e
elaborado, com conteúdos musicais específicos como, por exemplo, a música
clássica.
Diante dessa situação, Penna (1996) coloca que o principal desafio do
sistema educacional brasileiro continua sendo
[...] o de promover um real acesso ao saber, à cultura e à arte.
Encarando este desafio, a educação musical precisa buscar,
como objetivo último, promover uma participação mais ampla
na cultura socialmente produzida, preparando o aluno para que
se torne capaz de aprender criticamente as várias
manifestações musicais disponíveis em seu ambiente (PENNA,
1996, p. 23).
Mas como a finalidade dos PCN está na configuração de uma nova
proposta de ensino, seus objetivos só serão atingidos se um novo modelo de
escola vier a proporcionar maiores espaços para a convivência e a interação
humanas, buscando a compreensão dos aspectos dinâmicos da cultura, e
consequentemente, a valorização da cidadania plural e real, que são
necessários para uma prática curricular dentro de uma perspectiva crítica e
desafiadora. Hentschke (1993) observa, em relação ao valor tradicional da
Educação Musical, a tendência de se desenvolver em algumas habilidades
específicas em música, como também a concentração na aprendizagem de
história da música e outros, deixando o ensino ficar exclusivo para os que
56 possuem dom ou ouvido musical para estas práticas. Isto gerou uma exclusão
indiscriminada das pessoas, e um distanciamento em relação à prática musical.
A autora destaca o valor psicológico da música como um valor que em
razão da natureza do seu objeto, torna-se inevitável para a prática de educação
musical. A ênfase volta-se para o desenvolvimento da criança, onde os
princípios educacionais serviram de base para os propósitos da teoria
progressiva, encontrando na música seguidores tais como Dalcroze, Orff e.
mais tarde, Paynter e Shaffer. Os princípios desta teoria cujo métodos
priorizam a aprendizagem por meio da descoberta, em que o aluno deixa de
ser um simples receptor de informações, para ser como construtor do seu
próprio conhecimento, se tornando um aluno descobridor ou criador.
A preocupação volta-se para o aspecto cognitivo da experiência musical,
onde a psicologia vem buscando conhecer o pensamento humano e ampliando
a compreensão do desenvolvimento e do comportamento, relacionando com as
emoções, linguagem e habilidades. Segundo Mársico (1985),
O desenvolvimento musical, como todo desenvolvimento
humano, parte de experiências concretas e aos poucos se
orienta para o crescimento abstrato da linguagem musical. Os
conceitos musicais não são adquiridos definitivamente num
determinado momento. São primeiro apreendidos vagamente e
depois progressivamente compreendidos e interpretados, cada
vez com maior precisão (MÁRSICO, 1985, p. 22).
Isso significa que diferenças individuais existem e que nem todas as
crianças atingem, ao mesmo tempo, o mesmo nível de desenvolvimento. O
processo de integração e amadurecimento envolve circunstâncias exteriores
que irão se modificando no decorrer dos desenvolvimentos afetivo, psicomotor,
cognitivo e musical. Loureiro (2003) diz que a educação musical tem uma
função socializadora e que vem contribuir no desenvolvimento e na formação
integral do indivíduo. “A importância do ensino de música na escola reside na
possibilidade de despertar habilidades e condutas na criança, levando-a a
sentir-se sensibilizada pela música, valendo-se da criação e da livre expressão”
(LOUREIRO, 2003, p. 127).
Considerando que a música desempenha um papel ativo dentro da
educação geral do indivíduo, o conhecimento progressivo da linguagem
musical deve ser dirigido no sentido de valorizar a percepção e a expressão de
57 elementos sonoros musicais. O processo de ensino musical não é portanto,
simplesmente intelectual, mas deve ocorrer pela mediação entre a realidade
musical e o sujeito. O uso e o domínio da linguagem musical modificam e
transformam o sujeito e, conforme for sua vivência em um ambiente musical
rico, organizado e estimulante, o levará ao domínio espontâneo e progressivo
de habilidades, podendo ampliar o sentir e o fazer musicais, que serão muito
benéficos culturalmente.
De acordo com Loureiro (2003), encarar a música como uma linguagem
tão
importante
desenvolvimento
quanto
amplo
outra
do
qualquer,
indivíduo,
capaz
é
um
de
contribuir
problema
que
para
o
envolve
conhecimento e compreensão musical. “É ter a consciência de que a
especificidade da música está no seu entendimento como linguagem, como um
sistema de sinais que pode ser vivenciado e compartilhado” (LOUREIRO, 2003,
p. 134). Entretanto, o uso e o significado que hoje atribuem à música no âmbito
escolar evidenciam uma distorção e, consequentemente, uma insatisfação.
Porém, o desenvolvimento das potencialidades torna-se evidente no fazer
musical, sendo relevante na medida em que mesmo antes de ser desenvolvida
a musicalidade da criança, é preciso trabalhar para se adquirir a disciplina e o
relaxamento que são necessários para o bom andamento da aula, pois a
música é considerada como facilitadora no processo de aprendizagem.
3.2 A música no currículo escolar
Para uma melhor compreensão da palavra currículo, Saviani (2000)
define:
Currículo é entendido comumente como a relação das
disciplinas que compõem um curso ou a relação dos assuntos
que constituem uma disciplina, no que ele coincide com o
termo programa. Entretanto, no âmbito dos especialistas nessa
matéria tem prevalecido a tendência a se considerar o currículo
como sendo o conjunto das atividades (incluído o material
físico e humano a elas destinado) que se cumprem com vistas
a determinado fim. Este pode ser considerado o conceito
ampliado de currículo, pois, no que toca à escola, abrange
todos os elementos a ela relacionados. Poderíamos dizer que,
assim como o método procura responder à pergunta: como se
deve fazer para atingir determinado objetivo, o currículo
procura responder à pergunta: o que se deve fazer para atingir
determinado objetivo? Diz respeito, pois, ao conteúdo da
58 educação e sua distribuição no tempo e espaço que lhes são
destinados (SAVIANI, 2000, p. 33).
Loureiro (2003) considera a importância da educação musical na
sociedade
contemporânea
justificada
pela
função
de
promover
o
desenvolvimento do ser humano, não por meio do adestramento e da
alienação, mas por meio da conscientização da interdependência entre o corpo
e a mente, entre a razão e a sensibilidade, entre a ciência e a estética. O
ensino da arte, especialmente a música, deve ser considerado na educação
escolar da mesma forma que outras áreas do conhecimento, como matemática,
a língua portuguesa, a história e outras. Mas como oferece uma forma de
conhecimento específico deve ser visto de modo organizado, coerente, que o
situa entre vivência, expressão e compreensão.
No entanto esse conhecimento pode ser instituído e adquirido também
na instituição escolar, e com a nova lei, torna-se esse conhecimento artístico
obrigatório no currículo, aparecendo assim um problema para ser resolvido a
partir do momento que sair do papel e chegar até as escolas, para ser incluído
no currículo e oferecido aos alunos no horário escolar. Com isso terá que
ocorrer um maior interesse por parte dos administradores escolares e dos
próprios docentes, para uma maior sensibilização e pela valorização do ensino
da arte na escola.
O ensino da música vem lutando pelo seu espaço no contexto
institucionalizado. Esta prática continua sendo privilégio de uma minoria que
dispõe de recursos materiais e financeiros para sustentar um ensino
desenvolvido em poucas escolas especializadas. A estruturação curricular da
disciplina música vem gerando, ao longo dos anos, questões e debates quanto
à sua constituição como disciplina escolar bem como quanto à sua
programação como prática pedagógica no interior das salas de aula. Diante
disso Hentschke (1996) colocava já nesta época que
Os problemas que enfrentamos na área da educação musical
vão desde a falta de institucionalização e reconhecimento do
valor da educação musical como disciplina integrante do
currículo escolar até a falta de sistematização do ensino da
música, seja este como parte do ensino formal, bem como em
muitas escolas de música. Em qualquer sistema educacional
há um reconhecimento no nível do senso comum a respeito do
valor de determinados conteúdos na formação dos indivíduos.
59 Estes são englobados pelas disciplinas chamadas “centrais”,
ou do núcleo comum, e que são consideradas como
“indispensáveis” para a formação de uma sociedade produtora
e consumidora do estado atual (HENTSCHKE, 1996, p. 50).
O momento requer a valorização da instituição, da criatividade e da livre
expressão do aluno, para que possa se envolver com as diversas situações do
seu cotidiano e consiga lidar com elas dentro ou fora do contexto escolar. Além
disso, é importante a busca por um currículo inovador que requer motivação no
investimento de novos projetos, novas propostas e motivação na realização de
atividades e atitudes que possam recuperar o gosto e o senso crítico-musical
dos alunos.
Resgatar o ensino da música no currículo escolar é defendê-lo como
uma área de conhecimento sério e dotada de valor e significado. É acreditar
que a escola possa aumentar a alegria dos alunos e dos que com eles
convivem. Loureiro (2003) coloca que o ensino da música requer uma proposta
curricular que “considere as diferenças culturais, o respeito à individualidade e
às experiências de cada aluno e, principalmente, as vivências musicais que os
alunos levam para dentro do espaço escolar” (LOUREIRO, 2003, p. 150).
O ensino da música no contexto escolar busca alargar horizontes,
encontrar concepções didáticas que se apóiam no cotidiano do aluno, tirando o
foco de um ensino academicista, compartimentado e arbitrário para equilibrar o
conhecimento e a práxis. Mais do que transmitir conteúdos prefixados,
distribuídos em planejamentos desvinculados da realidade da escola e do
aluno
É necessário ensinar-lhes a serem construtores ativos de um
conhecimento crítico e transferível a outras situações e
problemas, não necessariamente artísticos e, de maneira
especial, que lhes ajude a interpretar e agir no mundo em que
vivem e em suas próprias vidas (HERNÁNDEZ, 2000, p. 88).
Para tanto é importante perceber que se quisermos a música inserida no
contexto curricular da escola fundamental, será preciso rever valores e
reavaliar o verdadeiro papel da música e sua real finalidade educativa, pois
sem isto esta prática estará propensa a ficar do lado de fora da escola.
60 3.3 Considerações sobre a Educação Musical: aportes e concepções
A valorização do pensamento lógico, com o desenvolvimento do
raciocínio e da capacidade de estabelecer pela mente relações que resultem
em estruturações do pensamento humano, é a tendência que a educação está
desenvolvendo, fragmentando a estrutura do ser. De acordo com Read (apud
CAMPOS, 2000), o que está errado no sistema educacional é o hábito de se
estabelecer territórios separados, explorando mais a lógica e diminuindo a
atividade imaginativa e o prazer sensível.
Campos (2000) fala que é da percepção e da sensibilidade que resultam
imagens e sentimentos, matérias elementares com que concebemos o mundo
e edificamos nosso comportamento diante dele. Pois a educação por
intermédio da arte não só dá à criança uma consciência em que a imagem e o
conceito, a sensação e o pensamento se relacionam e estão unidos, como
também, simultaneamente, propicia um conhecimento instintivo, que se
aproveita da espontaneidade da criança, sua imaginação e sensibilidade
expressas pela arte.
Fusari (1993) coloca que a educação através da arte é um movimento
educativo e cultural que busca formar um ser humano integral, valorizando os
aspectos intelectuais, morais, estéticos, procurando despertar a consciência
individual e harmonizada ao grupo social que pertence. A autora ressalta as
palavras da professora Noêmia Varela como:
O espaço da arte-educação é essencial à educação numa
dimensão muito mais ampla, em todos os seus níveis e formas
de ensino. Não é um campo de atividade, conteúdos e
pesquisas de pouco significado. Muito menos está voltado
apenas para as atividades artísticas. É território que pede
presença de muitos, tem sentido profundo, desempenha papel
integrador plural e interdisciplinar no processo formal e nãoformal da educação. Sob este ponto de vista, o arte-educador
poderia exercer um papel de agente transformador na escola e
na sociedade (VARELA apud FUSARI, 1993, p. 20-21).
É importante revalorizar o ensino por meio da busca de novas
metodologias de ensino e aprendizagem de arte nas escolas, para garantir que
os alunos conheçam e vivenciem aspectos técnicos, inventivos, que
61 representem e se expressem em música, artes visuais, desenho, teatro, dança
e artes audiovisuais.
A partir destes elementos o conhecimento é ampliado, e com a arte
podem ser anexadas ações como ver, ouvir, mover-se, sentir, pensar,
descobrir, exprimir, fazer, e se forem seguidos de uma conexão com os
elementos da natureza e da cultura, poderão assim analisar, refletir, formar e
transformá-los, pois a arte é expressão humana, que todo mundo pode usufruir,
mas, somente será arte quando se expressar com inteligência.
Arte é um conjunto de palavras, ou de sons, ou de cores, ou de
formas, ou de movimentos, ou de fatos, ou de qualquer outra
matéria de sua construção, organizado de forma inteligente a
ponto de atrair ou de fascinar o ser humano (RICHERME,
2007, p. 58).
Por isso Fusari (1993) fala que o professor de arte, junto com os demais
professores e com um trabalho formativo e informativo, tem a possibilidade de
“construir para a preparação de indivíduos que percebam melhor o mundo em
que vivem, e saibam compreendê-lo e nele possam atuar” (FUSARI, 1993, p.
24).
Para tanto é importante entender o significado e a conotação de
educação que embasa esta pesquisa na visão dos seguintes educadores.
Pagano (1965) define a educação:
como um processo de transmissão de valores culturais que se
realiza por meio de uma relação social entre o educador e o
educando. Educar é ajudar alguém a ter valor dentro da esfera
cultural, seja na música ou em outra matéria (PAGANO, 1965,
p. 7).
A autora acredita que a educação é o conhecimento que o indivíduo
adquire, e que permite contemplar melhor o que há de belo e bom.
Paulo Freire (1983) fala que a educação é um encontro entre
interlocutores, que procuram no ato de conhecer a significação da realidade e
na práxis o poder de transformação. Entende-se por pedagogia em Freire, a
ação que pode e deve ser muito mais que um processo de treinamento ou
domesticação, um processo que nasce da observação e da reflexão e culmina
na ação transformadora, e nesta visão, o autor critica os educandos serem
62 qualificados como recipientes aonde são colocadas informações que são
conduzidas a uma memorização mecânica sem nenhuma vivência. Ele acredita
que sem “criatividade, sem participação, não haverá transformação e nem
aprendizado” (FREIRE, 1983, p. 36).
Outro comentário é que:
A educação está presente no contato do dia-a-dia, na
observação do outro e de cada um no outro. Há um aprender
contínuo na percepção aguda dos mínimos contatos, um
transformar que absorve gradualmente mudanças que
associam novidades à vontade de aprender (CAMPOS, 2000,
p. 19).
Campos (2000) ressalta que na vida nada se ensina. Só se aprende
conforme o grau de interesse e necessidade, e para tanto a educação deverá
oferecer instrumentos e condições que ajudem o aluno a aprender a pensar, a
conviver e a amar. Outro autor diz que a educação “é um processo contínuo,
que começa nas origens do ser humano e se estende até a morte” (BRANDÃO,
1981, p. 45).
Para Aurobindo (apud CAMPOS, 2000) a educação significa aprender a
lutar, aprender a intensificar a existência e a cumpri-la com decisão e
consciência. Educar, basicamente, é ajudar a assumir a vida, é levar o ser a
perceber a grande possibilidade que a vida é.
Paulo Freire (1983) coloca outro aspecto da educação: todos deveriam
participar do processo ensino-aprendizagem, e valorizar a música, em especial
a voz, participando de um coral, e desta forma se expressando socialmente. E
Penna (2008) completa dizendo que a função do ensino de música na escola é
justamente ampliar o universo musical do aluno, dando-lhe acesso à maior
diversidade possível de manifestações musicais, “pois a música é um
patrimônio cultural capaz de enriquecer a vida de cada um, ampliando a sua
experiência expressiva e significativa” (PENNA, 2008, p. 25).
E para uma melhor compreensão da discussão de música, destaco
alguns autores como: Andrade (1995), Schafer (1991), Moraes (1983) e Aronoff
(apud PENNA, 2008), que definem a música como a organização de sons,
ritmos e melodias com a intenção de ser ouvida e que pode nos fazer rir, cantar
e dançar, tornando-se uma experiência humana. É considerada uma arte dos
63 sons em movimento e sintética por excelência, fazendo uma ligação do
psicológico e do fisiológico.
Portanto, de acordo com Sekeff (2002) para pontuar música na
educação é preciso defender a necessidade de sua prática em nossas escolas,
[...] auxiliar o educando a concretizar sentimentos em formas
expressivas; é auxiliá-lo a interpretar sua posição no mundo; é
possibilitar-lhe a compreensão de suas vivências, é conferir
sentido e significado à sua condição de indivíduo e cidadão
(SEKEFF, 2002, p. 120).
Mas como toda comunicação envolve conflito, o educando precisa
aprender a lidar com esses valores com competência e autonomia, e aparece a
possibilidade da música como agente mediador, que poderá auxiliar na
construção de um diálogo com a realidade.
Para tanto é importante perceber que de outra maneira a musicalização
desenvolve nos educandos “um processo educacional orientado que se destina
a todos que, na situação escolar, necessitam desenvolver ou aprimorar seus
esquemas de apreensão da linguagem musical” (PENNA, 2008, p. 41). Com
isso, pode-se levar o aluno a se expressar criativamente através de elementos
sonoros.
A educadora musical Gainza (1988) diz que o objetivo específico da
educação musical é musicalizar, ou seja, tornar o indivíduo sensível e receptivo
ao fenômeno sonoro, promovendo nele, ao mesmo tempo, respostas de índole
musical. Também afirma que:
Corresponde à educação musical instrumentalizar com eficácia
os processos espontâneos e naturais necessários para que a
relação homem-música se estabeleça de maneira direta e
efetiva. Uma vez assegurado o vínculo, a música fará, por si
só, grande parte do trabalho de musicalização, penetrando no
homem, rompendo barreiras de todo o tipo, abrindo canais de
expressão e comunicação a nível psicofísico, induzindo,
através de suas próprias estruturas internas, modificações
significantes no aparelho mental dos seres humanos (GAINZA,
1988, p. 42).
Alguns educadores usam o termo musicalização ora com o sentido de
alfabetizar musicalmente, ora com o sentido de desenvolver a vivência musical
sem priorizar o aprendizado de notação. Existem autores que incorporam os
dois sentidos acima que é “o de iniciar o indivíduo no universo da música,
64 conservando ao mesmo tempo, os objetivos amplos da sensibilização para os
fenômenos musicais” (JOLY, 2003, p. 48). Tal concepção extrapola o fato de
apenas introduzir o indivíduo na linguagem musical.
Cauduro (1989) acredita que a musicalização infantil não se resume a
aulas de teoria ou aprendizagem técnica de um instrumento e seus objetivos
não se extinguem no simples ato de cantar por cantar. Eles são amplos e suas
metas almejam extrapolar a educação puramente musical, influindo também na
formação geral da criança. A iniciação musical para este autor tem por
finalidade aproximar a criança da música, levando-a progressivamente a gostar
de ouvi-la, a desfrutar o prazer de cantar, de ritmar com as mãos e pés, de
dançar e se movimentar ao som da música.
Para Feres (1989), a palavra musicalização tem também um sentido
bem mais amplo do que ensinar noções de leitura e escrita musical. Dizer que
uma pessoa é musicalizada é dizer que ela possui sensibilidade para os
fenômenos musicais e que sabe expressar-se por meio da música, quer
cantando, assobiando ou tocando um instrumento. Essa forma atual de
conceber a musicalização tem origem no pensamento e concepção de
educadores musicais, que nas primeiras décadas do século passado
contribuíram para uma série de transformações que constituem uma verdadeira
revolução no campo das ideias e da prática pedagógico-musical. Feres (1989)
diz a partir daí tratou-se então, de recuperar a educação musical das crianças,
por meio da atividade e da experiência da vivência musical, que se havia
extraviado para um caminho mecânico e formal do intelectualismo.
Musicalizar para Brito (1998) é educar pela música, com o objetivo de
contribuir na formação e desenvolvimento da personalidade do indivíduo, pela
ampliação da cultura, enriquecimento da inteligência e a vibração da
sensibilidade musical. A autora diz que é educar formando um público
esclarecido e sensível capaz de ouvir e apreciar obras de arte sonora de todas
as épocas e origens, favorecendo o despertar de aptidões musicais. Com a
reunião e desenvolvimento dos métodos é que se busca atender musicalmente
as vivências das crianças, por meio de sua participação criadora, de acordo
com Fontanari (1997).
Pelo aproveitamento das capacidades humanas (audição, criação,
instinto rítmico) é que se consegue introduzir não só em atividades musicais ou
65 nas formas de expressão, mas também na aprendizagem musical e na
aquisição de conhecimentos básicos. Efetua-se dessa forma, “a musicalização
através da atividade intuitiva, que cria um estado mental intelectual favorável à
aquisição de conhecimentos musicais” (FONTANARI, 1997, p. 22).
No entanto é importante a compreensão de que a musicalização e
Educação Musical não se sobrepõem. Embora a musicalização seja uma forma
de educação musical, entende-se que ela é mais ampla, podendo passar por
várias etapas de desenvolvimento que ultrapassam a musicalização. E Arroyo
(2000) coloca que:
O termo "Educação Musical" abrange muito mais do que a
iniciação musical formal, isto é, é educação musical aquela
introdução ao estudo formal da música e todo o processo
acadêmico que o segue, incluindo a graduação e pósgraduação; é educação musical o ensino e aprendizagem
instrumental e outros focos; é educação musical o ensino e
aprendizagem informal de música (ARROYO, 2000, p.77).
E a partir destes pressupostos colocados, a musicalização é concebida
como:
[...] um processo educacional orientado, que, visando promover
uma participação mais ampla na cultura socialmente produzida,
efetua o desenvolvimento dos instrumentos de percepção,
expressão e pensamento necessários à apreensão da
linguagem musical, de modo que o indivíduo se torne capaz de
apropriar-se criticamente das várias manifestações musicais
disponíveis em seu ambiente, que é inserir-se em seu meio
sociocultural de modo crítico e participante (PENNA, 2008, p.
47).
Após a definição destes termos da Educação Musical que serão
utilizados no desenvolvimento desta pesquisa, serão apresentados alguns
autores que fundamentam a essência da Educação Musical no Brasil.
3.4 Fundamentação teórico-filosófica da Educação Musical
Pensar sobre os fundamentos da Educação Musical nos remete à tarefa
de buscar compreender as bases em que se apoia esta atividade, pois
fundamental no processo da arte é aquilo que é essencial. O autor Borges
(2007) fala que os fundamentos, por sua vez, vão ser aqueles elementos
66 indispensáveis que constituem as bases do agir, do refletir, do interagir, enfim,
do “ser e do estar em”.
A justificativa para a existência de uma filosofia da Educação Musical,
para Reimer (2009), faz menção ao seu impacto na sociedade, que será maior
ou menor conforme a qualidade do entendimento oferecido às pessoas. O
teórico aponta que “a estética sempre foi usada por educadores musicais para
diferentes propósitos e sempre foi considerada secundária” (REIMER, 2009, p.
125). Para este, a estética adotada precisa considerar os maiores aspectos da
Educação Musical, suficientemente focados para que possa ser um guia para a
ação e a reflexão do educador musical, sendo também pertinente para a arte
musical e, ao mesmo tempo, capaz de explicar a natureza de todas as artes.
Deve conter forte implicação com a educação e ser relevante para esta e para
a sociedade em que vivemos.
Para Borges (2007), o ensino de arte deve buscar a educação dos
sentimentos. Para tanto, procura desconstruir a noção de arte como linguagem.
O autor afirma que vivemos em uma sociedade predominantemente
conceitualizadora. Neste aspecto, a Educação Musical é importante porque
valoriza não apenas a cognição conceitual, mas também a afetiva, a subjetiva,
a criativa e outras. Reimer (2009) define conceito como um conhecimento
"sobre", enquanto arte é um conhecimento "de".
A questão central da filosofia proposta por Reimer (apud BEINEKE,
1999, p. 122) é a capacidade da Educação Musical ser também estética.
Reimer (apud BORGES, 2007) enumera duas categorias de experiências com
música: estéticas musicais e estéticas não musicais.
Experiências não estéticas podem ser funcionais, referenciais
ou acontecerem ao nível técnico crítico. Funcionais são as que
se referem ao caráter utilitário da experiência estética, ou seja,
o uso prático, religioso, terapêutico, moral, político, comercial,
entre outros, da arte. Referenciais são as que não focam a
experiência musical em si. O nível técnico-crítico difere das
experiências referenciais, por ser pré-estético e faz referência
aos aspectos técnicos da obra (REIMER, apud, BORGES,
2007, p. 7).
Depois desta argumentação, ressalta a importância da contribuição da
filosofia na constituição de um currículo para a Educação Musical. O ponto
67 central da proposta de Reimer (2009, p. 127) está assentado na audição de
obras e defende claramente o programa geral de música, pois o objetivo final
da Educação Musical é fazer com que o aluno sinta e reaja, por meio da
percepção estética e da música. A audição é parte importante da criação e esta
deve ser encorajada e sensibilizada pelo desempenho, composição e
improvisação.
De acordo com Reimer (2009, p. 239) a natureza e o valor da Educação
Musical são determinados pela natureza e valor da música. Com base nesta
premissa inicial o autor estabelece argumentos para afirmar a necessidade de
uma filosofia para Educação Musical. A qualidade da compreensão sobre uma
atividade profissional está relacionada ao impacto na sociedade que esta
profissão pode obter. Assim, a Educação Musical só deixaria a “periferia da
cultura humana” quando houvesse maior entendimento profissional do valor da
Educação Musical.
Para Hentschke (1996) a música não está no rol das “disciplinas sérias”
por causa do “uso que se tem feito dessa área de conhecimento e da atividade
profissional decorrente dela” (HENTSCHKE, 1996, p. 37). Para modificar este
panorama, é preciso uma tomada de consciência dos profissionais que estão
atuando no campo da pedagogia musical. Reimer (apud HENTSCHKE, 1996,
p. 37) entende que o profissional consciente do valor de sua profissão, mais
que um elo na comunidade pedagógica, é alguém que tem a visão modificada
a respeito da natureza e do valor de sua vida pessoal.
As bases para a valorização da Educação Musical exigem a
configuração de uma filosofia. No entanto, seus efeitos serão mais produtivos
se essa filosofia estiver em desenvolvimento durante a formação do educador
musical, pois a música é uma disciplina do conhecimento que também constitui
caminho para se entender a realidade.
Reimer (2009, p. 237) afirma que o aluno que entende a natureza real da
música pode partilhar as visões da realidade que a música oferece. O problema
nessa questão é o contraste entre o ensino da disciplina e a prática da mesma
na escola. Enquanto em suas atividades extra-escolares o aluno se conecta
com uma vasta gama de opções musicais e trafega por diversos contextos
culturais, como a internet, TV, espaços públicos e outros, na escola ele
68 costuma ter contato com expressões musicais que pouco ou nada tem a ver
com a realidade sonora que vivencia diariamente.
Em contrapartida, David J. Elliot (1995) discorda radicalmente das
opiniões expressas por Reimer e outros pensadores que formularam filosofias
a respeito da Educação Musical partindo de uma abordagem estética. Opondose a este tipo de pensamento, propõe a criação de uma outra filosofia, a qual
denomina Filosofia Praxial da Educação Musical. Para este autor, o termo
estética sugere contemplação e não “ação” sobre. (ELLIOT apud BORGES,
2007, p. 12). O autor argumenta no sentido de comprovar a ligação entre o
surgimento da concepção estética da arte e do pensamento burguês e aponta
que estética não é sinônimo de Filosofia da Arte.
Elliott (1995) escreve que, assim como a experiência musical é geradora
de integração e auto-estima, a Educação Musical é proporcionadora de valores
como
crescimento
individual
e
auto-conhecimento.
Na
sua
visão,
o
desenvolvimento da musicalidade permite a participação construtiva no
complexo de expressões/impressões do próprio aluno e dos outros. Elliott diz
também que a escola que nega a educação musical sistemática, está negando
ao aluno as chaves cognitivas para uma fonte maior de valores fundamentais
da vida (ELLIOT apud BORGES, 2007, p. 12). Mais interessado na educação
musical integradora do fazer/ouvir música criativamente, o autor confronta o
conceito de educação estética proposto por Reimer que tem a música como
objeto. Para Elliott, o conceito de educação estética transforma a música em
mero objeto de apreciação.
As consequências seriam a desvalorização do desempenho e da
criatividade do aluno, ênfase no consumo musical e não no fazer musical ativo
e artístico e, ainda, separação entre apreciação e produção de música.
Segundo Elliott (1995), a música não deve ser uma coleção de objetos
estéticos independentes e o desempenho deve estar no centro da educação
musical envolvendo um tipo especial de aprendizagem (ELLIOT apud
BORGES, 2007, p. 33). Este ponto já nos revela um problema que atinge
diretamente as escolas brasileiras, no caso, as que não são de música, visto
que também são orientadas pelos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN) e
dão ênfase à apreciação musical e à escuta “em detrimento da prática artística”
(FONTERRADA, 2005, p. 38).
69 Para Elliot (1995), faltou providenciar uma explicação racional para a
natureza do fazer musical, uma vez que esta importante dimensão da
musicalidade tem estado restrita à habilidade e técnica. O autor acredita que
todas as formas do fazer musical envolvem um tipo de pensamento
multidimensional. A imposição de um método uniforme para todos os tempos é
oposto ao que é observável sobre a produção e a experiência musical, pois
esta é diversa.
Resumidamente, música não é um objeto, mas sim uma atividade
humana intencional, a qual engloba: "um fazedor, algum tipo de feito, apenas o
fazer em si e um contexto onde o fazedor produz aquilo que faz” (ELLIOTT,
1995, p. 40). O autor cria uma expressão para a qual inventaríamos um verbo
para a Língua Portuguesa, tal como “musicar”. Musicar, no sentido de
desempenho musical, é um tipo particular de ação humana intencional.
Envolve, além de desempenho, a improvisação, a composição, o arranjo e a
regência. A audição musical liga-se organicamente ao ato do fazer musical.
Estas não estão apenas interligadas. Música e audiência são dimensões
mutuamente definidas e reforçadas. Elliot (apud, BEINEKE, 1999, p. 123),
considera que as ações dos que desempenham e improvisam não são naturais
ou inatas. Elas são culturais.
A Educação Musical deve empenhar-se em desenvolver a musicalidade
do estudante tendo como centro o seu desempenho, que a musicalidade,
desenvolve por indução. Estudantes começam a entrar e fazer parte da cultura
musical e então começam a aprender.
O processo de aprendizagem musical é promovido por um contexto
educacional no qual avanços individuais são observados em estudantes que
procuram ser, e este contexto inclui o próprio estudante, um autêntico fazedor
musical.
De acordo com o ponto de vista colocado por Reimer para a filosofia da
Educação Musical de que a música não é um objeto, pode-se perceber que:
Reimer requer uma filosofia da Educação Musical baseada na
perspectiva da compreensão da obra musical enquanto “objeto
estético”. Por sua vez, Elliot busca “atualizar” filosoficamente a
Educação Musical e preconiza uma crítica ao que chama de
“Educação Musical enquanto Educação Estética”, propondo o
que denominou Filosofia Praxial e que está embasada numa
70 perspectiva multicultural. Adorno contribui com a busca da
elucidação das relações que estabelecem as contradições
existentes no entendimento sobre música em nossa sociedade
(FONTERRADA, 2005, p. 110).
Para Swanwick (1997), Elliott fundamenta sua crítica em uma caricatura
da teoria proposta por Reimer e confunde a perspectiva estética com o
formalismo musical. Swanwick, inclusive, critica o formalismo por conceber a
experiência musical enquanto dissociada das demais experiências:
“O problema é que isto falha em conectar a experiência musical com
outra experiência em alguma forma direta. A música está sendo novamente
removida da vida, transformada em um tipo de jogo” (SWANWICK, 1997, p. 9).
A partir de Reimer (1989) e Elliott (1995), que são exatamente da
Educação Musical, percebe-se a necessidade de os Educadores Musicais
buscarem conhecimentos sobre outras áreas que possam contribuir no
processo de crescimento musical e pessoal próprio e dos estudantes.
Elliot (1995) enfatiza o aspecto social da música e nesse sentido, o seu
processo de aculturação é sempre intercedido pelo mestre. Para a filosofia
praxial, a aculturação se relaciona com a apropriação de um código específico,
que é o musical. Isto acontece em um tipo de ambiente musical propício e em
uma comunidade que engloba desde aprendizes ao mais desenvolvidos.
De acordo com Fonterrada (2005), é extremamente difícil exigir uma
verdade sobre a natureza e o ato da Educação Musical. A dúvida faz parte do
processo para que se ampliem as concepções. Não se concebe uma educação
fechada em suas bases, e nem sem horizontes para se ampliar. Não se
concebe a Educação Musical enquanto desatada da vida, sem cor ou
movimento. Não se concebe uma Educação Musical apática à dúvida e
afastada de uma efetiva prática. Não se concebe uma Educação Musical que
não considera o tempo e o espaço atual do estudante enquanto sujeito e da
sociedade enquanto estrutura.
Não é possível compreender uma Educação Musical que não busque o
melhor para o estudante, que não pretenda levá-lo a um ponto diferente da
partida, que não é digna de suscitar o gosto do estudante pelo conhecimento.
Não se concebe uma Educação Musical que não seja “sonora”.
71 A musicalidade é acertadamente o objeto com o qual lida o
Educador Musical e é com este que devemos operacionalizar o
trabalho. Possuímos limitações para entender uma Educação
Musical descontextualizada, sem inserção no Projeto PolíticoPedagógico da escola ou que não planeja com seus pares de
outras áreas e, mesmo, de outras manifestações artísticas
(BORGES, 2007, p. 56).
Por outro lado, o autor partilha da ideia de música enquanto parte
essencial da formação do sujeito social capaz de interagir, de compreender e
até de modificar a conjuntura. Compreendemos as dificuldades encontradas
nas escolas, em todos os níveis e modalidades, mas é importante lembrar que
as críticas devem ser colocadas, pois o acesso à educação é direito de todos.
É neste sentido que contribuir musicalmente para a formação integral dos
sujeitos é garantir a estes o acesso a um tipo de conhecimento específico que
pode lhes ajudar a formular um projeto de vida onde a música desempenhe o
seu papel de forma mais consciente.
Fonterrada (2005) considera fundamental repetir que a importância da
existência da música no currículo das escolas é uma forma de assegurar o
acesso dos estudantes a este tipo de manifestação cultural específica. Neste
sentido é imprescindível à sociedade cobrar a oferta deste tipo de
conhecimento
dos
condutores
das
políticas
públicas.
É
importante
conscientizar a necessidade do surgimento de experiências de educação
musical nas escolas e, ampliando estes horizontes, em redes de ensino, tanto
privadas quanto públicas, e também lembrar que “música é objeto de estudo
sério sim, e também necessário para a compreensão e assimilação por parte
dos indivíduos, de qualquer sociedade” (COSTA, 2004, p. 95).
Não se concebe um profissional educador musical que não seja um
contínuo pesquisador de seu tema de trabalho. Fazer, estudar e ensinar
música são atividades interligadas. Neste sentido, o ideal é sonhar com uma
Educação Musical atenta à realidade que está cercada, sempre discutindo um
aspecto importantíssimo desta atividade artística que é a transformação.
Música transforma o indivíduo. A experiência musical nunca
nos devolve inteiros ao marco inicial. Somos transpassados por
esta experiência. Transforma-se o indivíduo, pode por extensão
contribuir positivamente também para transformações na
sociedade (BORGES, 2007, p. 59).
72 Para complementar este estudo da parte filosófica, busco respaldo
teórico nas propostas de ensino-aprendizagem de John Dewey (1949, 1974),
Jerome S. Bruner (1975), Howard Gardner (1993) e Keith Swanwick (1991,
1999) para uma melhor compreensão da trajetória do ensino da música e o
desenvolvimento do aprendizado musical da criança.
3.5 Contribuição teórica de educadores
O pensamento de cada um dos autores citados no tópico anterior é
relevante para essa discussão. Se para John Dewey (1979) a relação entre a
vida social e a escolar deve ser interativa, o que faz da educação uma contínua
reconstrução da experiência, e resulta em um aprendizado centrado no aluno,
Jerome S. Bruner (1975), embora não compartilhe dessa convicção, tem como
hipótese que qualquer assunto pode ser ensinado com eficiência a quem quer
que seja, em qualquer idade, desde que o indivíduo esteja em condição de
aprender e o tema seja apresentado de forma apropriada e desperte o
interesse. Tais informações têm implicações importantes, posto que a
informação influencie diretamente a prática dos educadores de modo geral e,
obviamente, os da Educação Musical.
A pedagogia de Dewey, por exemplo, se baseia nas experiências de
atividades nas quais a educação deve consistir em uma reconstrução ativa pela
criança da experiência humana. Ele desenvolveu um esquema em cinco
passos que são: Uma atividade espontânea escolhida pela criança de acordo
com o seu interesse, tendo o professor o papel de interferir no ambiente do
ensino, em segundo lugar o problema que pode surgir no desenvolvimento da
atividade como um obstáculo que a criança não consegue resolver sozinha. É
preciso formular uma questão para ser investigada. Como terceiro passo vem
os dados onde a criança vai buscar informações para ajudar a responder a
questão estabelecida, e o professor deverá sugerir alguns locais de
informações para os problemas que surgirem. E no quarto passo tem a
hipótese, que depois de recolherem os dados, as crianças formularão
hipóteses para tentarem achar a solução do problema. Como último passo vem
a experimentação que com o processo completo poderá produzir uma resposta
adequada.
73 Para Dewey (1979) o ensino realizado na forma deste esquema busca
reproduzir as etapas do método científico. Ele acredita que a educação é um
processo de vida, é um processo social, e um processo de reconstrução, de
reorganização da experiência. O fundamental na educação para Dewey é a
relação que se estabelece entre a imaturidade da criança e a experiência do
adulto. O educando deve estar sempre buscando e com disposição para
aprender. Deve ser responsável e desenvolver o hábito de pensar e investigar.
O conceito central do pensamento de Dewey consiste por um lado em
experimentar e por outro, em provar. Com base nas experiências testadas é
que a educação torna para a criança uma forma de reconstrução constante.
Bruner, em sua posição, coloca os aspectos relevantes sobre o ensinoaprendizagem que serão considerados nesta pesquisa, tendo o aprendizado
como um processo ativo, por meio do qual o aluno é capaz de aprender como
as coisas se relacionam e de como pode aplicá-las. Para ele o currículo deve
ser construído em torno de grandes temas, princípios e valores, a serem
reexaminados e cujas ideias básicas devem ser trazidas de volta, repetidas
vezes, valendo-se do currículo espiral (BRUNER, 1975).
O principal objeto de estudo de Jerome Bruner é a aquisição dos
processos cognitivos pelo ser humano. Em suas pesquisas ele confere uma
nítida ênfase à linguagem como o principal meio de representação simbólica da
realidade, tanto concreta quanto abstrata, ao afirmar que o homem constrói o
conceito que adquire do mundo através dos símbolos linguísticos. Não
obstante, estabelece uma relação intrínseca entre o modo de representação
visual, com o conceito da representação linguística. Ele observa que a
representação visual, um desenho, por exemplo, é uma das primeiras formas
de comunicação utilizada pela criança, juntamente com as representações
ativas.
As representações ativas feitas pelas crianças em seus primeiros
estágios de desenvolvimento, por sua vez, corresponde à tentativa de
representação de determinadas realidades, através da supressão do estágio de
representação lingüística. Como por exemplo, podemos citar a criança que
quando ouve a palavra buraco, lhe vem imediatamente na cabeça o ato de
cavar; quando ouve a palavra água, igualmente, lhe passa pela mente a ação
de beber água, propriamente dita, e, daí por diante, a criança vai elaborando
74 inúmeras representações ativas que objetivam substituir a linguagem ainda mal
formada e em processo de desenvolvimento (BRUNER, 1975).
Segundo o autor, na tentativa de adquirir conhecimentos básicos para
decifrar o meio em que está inserido, o homem acaba por discernir estratégias
sistemáticas de comportamento, reconhecendo, continuamente, regularidades
dentro da complexidade dos fenômenos do mundo que o cerca. A partir daí, ele
começa a formar conceitos estratégicos que, com o passar do tempo,
devidamente assimilados e sedimentados, irão permitir a influência sobre o
meio, com o poder de moldá-lo e transformá-lo.
Bruner relaciona, basicamente, o comportamento do indivíduo com a
aquisição de conhecimentos pelo mesmo. É a educação, encarada como um
processo sistemático ou não, que servirá de instrumento para que o homem
possa dominar o meio em que vive. Ele observou, igualmente, que a eficiência
na aquisição dos processos cognitivos e seu posterior desenvolvimento não se
davam, de forma alguma, de maneira igual de pessoa para pessoa. Portanto,
pode-se observar, na prática, que cada indivíduo assimila informação em
tempos e ritmos diferentes, de acordo com seus respectivos potenciais e
capacidades. O autor ressalta que:
Há uma diferença entre o comportamento que enfrenta as
exigências de um problema e aquele que procura defender-se
de qualquer participação (...). A última forma não é uma visão
distorcida da primeira; é uma posição diversa com objetivos e
necessidades diferentes (BRUNER, 1975, p. 10).
Há visível preocupação em relação ao comportamento do ser humano
frente ao processo de aprendizagem. Para ele, tanto o comportamento quanto
a interação do homem com o mesmo, representou, em todo decorrer de seu
trabalho, variáveis de suma importância para a elaboração dos conceitos sobre
os processos de aquisição do conhecimento.
Neste sentido, as pesquisas e as colocações desses dois autores
parecem apontar na mesma direção. Ambos os autores apresentam a
educação como processo a se desenvolver ao longo da vida e que implica
efetiva participação dos atores nele envolvidos. Para Bruner verdadeira
construção de conceitos pela criança é um processo que leva algum tempo
para amadurecer em sua plenitude. Primeiramente, o que de fato ocorre, de
75 acordo com Bruner é a captação, pela criança, de níveis de representação do
mundo menos complexo, a conseqüente assimilação e construção de conceitos
elementares pela mesma, até que um nível de representação superior da
realidade possa ser atingido e dominado pela criança.
Bruner
(1975)
estudou,
com
profundidade,
a
natureza
do
desenvolvimento intelectual humano, tendo estabelecido algumas referências:
em primeiro lugar se caracteriza por independência crescente da resposta, em
relação à natureza imediata do estímulo. É possível prever o comportamento
da criança conhecendo os estímulos que nelas agem, durante e imediatamente
antes da resposta. Em segundo lugar o desenvolvimento intelectual baseia-se
em absorver eventos em um sistema de armazenamento que corresponde ao
meio-ambiente. É tal sistema que permite à criança aptidão progressiva para ir
além da informação encontrada em uma única ocasião. Ela faz previsões e
extrapolações, partindo do modelo armazenado do universo. E em terceiro
lugar o desenvolvimento intelectual entende uma capacidade crescente de
afirmar, a si mesmo, e aos outros, por palavras ou símbolos, o que alguém fez
ou o que alguém fará. Essa prestação de contas ou consciência própria
possibilita a transição de um comportamento chamado lógico.
O autor ainda ressalta que o desenvolvimento intelectual baseia-se
numa interação sistemática e contingente, entre um professor e um aluno, no
qual o docente, amplamente equipado com técnicas anteriormente inventadas,
ensina à criança. O professor, para Bruner, é importante para a manutenção e
perpetuação da cultura e conhecimento. O autor acredita que o ensino é
altamente facilitado por meio da linguagem que acaba sendo, não apenas meio
de comunicação, mas o instrumento que o estudante pode usar para ordenar o
meio-ambiente. A natureza da língua e suas funções devem fazer parte de
qualquer teoria do desenvolvimento cognitivo.
O autor (1975) destaca nitidamente a importância crucial da aquisição e
do domínio da representação simbólica do mundo, que é a linguagem, a
comunicação, seja ela oral ou escrita. Logo, a linguagem é o principal
instrumento de captação da realidade do meio pelo aluno. E por fim diz que o
desenvolvimento intelectual é caracterizado por crescente capacidade para
lidar com alternativas e, simultaneamente, atender a várias sequências, ao
mesmo tempo, e distribuir tempo e atenção, de maneira apropriada, a todas
76 essas demandas múltiplas. Há, naturalmente, grande distância entre a mente
singela de uma criancinha e a aptidão de um menino de dez anos para
enfrentar um mundo extremamente complexo.
Embora as escolas privilegiem o pensamento analítico, que se
caracteriza por caminhar passo a passo, com plena consciência da informação,
para o ensino da música o pensamento intuitivo deverá ser altamente
valorizado. Na visão de Bruner (1975) o pensamento intuitivo é fortalecido pelo
desenvolvimento da autoconfiança e da coragem do aluno, pois pode-se
acertar ou errar através da intuição. O professor precisa ser sensível e deve
permitir que os alunos arrisquem palpites e respeitem as sugestões dos outros.
Resguardadas as diferenças na forma de ver o desenvolvimento do
processo educativo, uma terceira voz se soma às dos autores anteriormente
citados, Howard Gardner. Uma das principais contribuições de Gardner (1995)
para esta pesquisa é reforçar a importância da concepção da música como um
campo intelectual autônomo. Seu livro, no capítulo “Inteligência Musical”,
apresenta uma análise do desenvolvimento da competência musical, a partir
dos primeiros anos de vida, quando bebês balbuciam e cantam, passando
pelos vários estágios de crescimento, com forte fundamentação em Piaget.
Outra afirmação de Gardner que interessa muito aos educadores musicais é a
de que, apesar da bagagem genética ser um elemento muito importante no
campo da música, as realizações nesta área são muito suscetíveis ao estímulo
cultural (GARDNER, 1995).
Ele desenvolveu uma proposta mais revolucionária que se entende por
inteligência “a capacidade para resolver problemas ou elaborar produtos que
sejam valorizados em um ou mais ambientes culturais ou comunitários"
(GARDNER, 1995, p. 14). O destaque dentro da teoria de Gardner é considerála como possuindo várias facetas, que na verdade são talentos, capacidades e
habilidades mentais que são chamadas de inteligências na teoria das
Inteligências Múltiplas, como o próprio nome explicita, refutando a ideia
tradicional de inteligência como uma capacidade ou potencial geral que se
possui em maior ou menor extensão.
De acordo com Sekeff (2002) Gardner questiona os testes de medição
utilizados e considera que para envolver adequadamente o sistema de
cognição humano é necessário incluir um conjunto muito mais amplo de
77 competências, já que a inteligência não é uma propriedade única de nossa
mente, como sempre se acreditou.
Embora a ideia do currículo espiral em música seja largamente
difundida, percebe-se a falta de aplicação e entendimento dos conceitos
apresentados para o desenvolvimento do ensino musical. Considera-se
importante que a construção de um currículo musical na escola que não leve
em conta apenas aspectos teóricos, estruturais e históricos, mas, que “de
maneira sequencial [respeite]... a capacidade da criança no processo de
aquisição do conhecimento através das três atividades – composição,
execução e apreciação” (HENTSCHKE, 1996, p. 69).
A autora Sekeff (2002) diz que o exercício da música desenvolve a
chamada inteligência musical e esta, por sua vez, colabora no desenvolvimento
de todo o sistema cognitivo do educando. Esses elementos comprovam a
ênfase na necessidade da música nas escolas, aonde o educador deve abrir
espaço para o repertório variado.
Embora possam parecer distantes umas das outras, é na somatória
dessas vozes que o ensino musical tem se apoiado na consecução de seus
objetivos. As pesquisas dos autores já citados anteriormente neste trabalho
encontram eco particularmente na voz de Swanwick, quando evidencia que no
ensino musical o professor é o facilitador do aprendizado, e deve estimular,
aconselhar, perguntar e ajudar, mais do que dar informações. Para esse autor,
a grande virtude dessa teoria é “promover a criatividade e a individualidade de
cada aluno, cabendo ao professor a tarefa de ver e escutar com maior atenção
esse fazer musical” (SWANWICK, 2003, p. 18).
Swanwick é um educador musical que se empenhou em estudar como
se dá o desenvolvimento musical no ser humano, buscando solucionar
questões curriculares nos cursos oficiais de música ingleses. Seu trabalho não
é pioneiro, mas vem acrescentar às teorias de desenvolvimento clássicas,
ideias originais, elaboradas a partir de constatações fundamentadas em sua
prática docente e em sua pesquisa de campo. A teoria sintetiza conhecimentos
advindos da pedagogia, psicologia e psicologia da música, levando em
consideração
as
características
e
necessidades
de
cada
fase
do
desenvolvimento humano em relação aos processos musicais. Toda a “Teoria
78 Espiral”, criada por ele, está baseada nas ideias de Piaget, ou seja, de que o
conhecimento se dá por etapas sucessivas e é construído pelo indivíduo.
De acordo com Del Ben (2002, p.77), o aprendizado musical, assim
como qualquer outro ramo do conhecimento, deve obedecer etapas
sucessivas, consoantes com o nível de amadurecimento psicológico do
indivíduo. Swanwick fez um mapeamento do progresso desse conhecimento,
estudando um grupo de estudantes na faixa entre os 3 e os 14 anos. Essas
crianças, todas alunas de três escolas em Londres, eram procedentes de
diversos grupos étnicos e culturais (crianças de origens asiáticas, antilhanas,
africanas e sul e norte européias).
Durante quatro anos, Swanwick fez gravações de composições feitas por
elas, em um total de 745 composições de um universo de 48 estudantes. É
importante frisar que esse estudo foi feito dentro da ótica das oficinas de
música, priorizando uma visão chamada por seus defensores de linha criativa
do ensino musical. Dentro dessa ótica, defendida por muitos educadores
contemporâneos, tais como John Paynter e Murray Schafer, o professor deve
buscar desenvolver a criatividade e a improvisação, utilizando para isso todo e
qualquer material sonoro disponível.
A partir de seu estudo, Swanwick (2003) elaborou sua Teoria Espiral de
Desenvolvimento Musical. Para representá-la, ele elaborou um gráfico em
forma
de
espiral.
Através
dele,
Swanwick
mostrou
os
níveis
de
desenvolvimento, relacionados com a idade das crianças compositoras
estudadas. O primeiro nível, o material, ele dividiu em dois níveis: o sensorial e
o manipulativo e diz respeito às crianças de 0 a 4 anos. O segundo desses
níveis é o da expressão, que compreende crianças na faixa dos 5 aos 9 anos
mais ou menos. O terceiro, o da forma, ele dividiu em: especulativo e
idiomático, e diz respeito às crianças de 10 a 15 anos. O quarto e último nível,
o do valor, ele dividiu em: simbólico e sistemático, e diz respeito às crianças de
15 anos ou mais.
A partir dessa teoria, Swanwick (2003) propôs um processo de
aprendizagem baseado em um modelo que ele batizou de “CLASP”, que em
português foi traduzido para modelo “TECLA”. O modelo consiste em trabalhar
os
conteúdos
de
maneira
vinculada,
para
justamente
favorecer
o
desenvolvimento cognitivo de forma integral e não fragmentada. Sua intenção é
79 que as fases não estejam dissociadas, mas sim, mantenham um elo contínuo
entre elas.
Dessa forma, para uma boa educação musical o professor deve, no
entender de Swanwick, estar atento para não priorizar e nem desprezar
qualquer dos elementos abaixo, resumidos na sigla TECLA, sendo o T- Técnica
que é a manipulação do instrumento, notação simbólica, audição, o E- que é a
execução, o tocar e o cantar, o C- é a composição, que envolve a criação,
improvisação. O L- envolve a literatura com a história da Música, e o A é a
apreciação com o reconhecimento de Estilos/ Forma/ Tonalidade/ Graus.
Apesar de trabalhar em uma linha conhecida como oficinas de música,
que prioriza a livre experimentação de materiais sonoros, Swanwick
compreende a importância do universo sociocultural e afetivo do educando,
deixando claro que a criança deve ser estimulada com músicas que estejam no
seu dia-a-dia e dentro dos padrões musicais de sua cultura. Isso não significa
dizer que não devemos ampliar esse repertório, mostrando outros universos
sonoros.
A Teoria Espiral pode ser considerada a primeira sequência de
desenvolvimento fundamentada na natureza da experiência musical, e de
acordo com Henstschke (1996),
Esta teoria oferece subsídios aos educadores musicais para a
construção de um currículo em música, que não só levaria em
conta as dimensões de criticismo musical, como as colocaria
de maneira sequencial respeitando assim a capacidade da
criança no processo de aquisição do conhecimento através das
três atividades que são: composição, execução e apreciação
(HENSTSCHKE, 1996, p. 45).
Em uma sociedade de constantes mudanças e muitas diferenças sócioculturais, é fundamental que o professor esteja aberto ao discurso musical do
aluno. Daí a importância dos princípios apresentados por Swanwick para
assegurar a “qualidade da experiência musical durante as interações
educacionais” (RUNFOLA, SWANWICK, 2002, p. 393). Por isso é essencial
manter essas relações em mente no momento da elaboração do currículo. É
importante ressaltar, que esses processos desencadeiam o que chamamos de
educação “para” e educação “pela” música, onde os indivíduos, em contato
com as atividades artísticas (coral, musicalização, instrumentos musicais,
80 dança) desenvolvem demais atributos como comunicação, sociabilidade,
concentração, sensibilidade, senso crítico-criativo, auto-estima, ao mesmo
tempo em que adquire uma habilidade artística.
Portanto, a contribuição do autor será decisiva no embasamento deste
trabalho e seus princípios de Educação Musical irão nortear a elaboração de
nosso projeto.
Para tanto, uma breve e concisa apresentação desses princípios faz-se
necessária. O primeiro princípio é considerar a música como discurso, que
demonstra como é importante que o professor de música busque um “forte
senso de intenção musical relacionado com propósitos educacionais: as
técnicas são usadas para fins musicais, o conhecimento de fatos informa a
compreensão musical” (SWANWICK, 2003, p. 58). Em segundo lugar, é
fundamental que o professor leve em consideração o discurso musical dos
alunos, pois “cada aluno traz consigo um domínio de compreensão musical.
Não os introduzimos na música; eles são bem familiarizados com ela”
(SWANWICK, 2003, pp. 66 e 67).
O autor ainda menciona o desenvolvimento da autonomia do aluno, e
citando Bruner coloca “as energias naturais que sustentam a aprendizagem
espontânea, que são a curiosidade, desejo de ser competente, querer imitar
outros, necessidade de interagir socialmente” (SWANWICK, 2003, p. 67). O
terceiro princípio enfatiza a fluência musical como o objetivo primordial,
precedendo a leitura e escrita musical. Como afirma o autor, “ensinar música
musicalmente pode somente ser feito por aqueles que se preocupam e
compreendem que a atividade humana que chamamos música é uma rica
forma de discurso” (SWANWICK, 2003, p. 116).
Após esta trajetória pela história da educação musical com a sua
fundamentação teórica e filosófica, e a compreensão dos termos ArteEducação, Música, Educação Musical e de Musicalização Infantil, considera-se
importante um estudo sobre alguns educadores musicais e suas metodologias.
Para tanto, serão destacados alguns educadores musicais do Brasil e de outros
países, que desenvolveram métodos ativos de musicalização infantil,
selecionados cronologicamente desde o final do século XIX e XX até a
atualidade.
81 3.5.1 Educadores Musicais e metodologias aplicadas
Após uma trajetória das concepções da educação, e da musicalização,
de sua importância e benefícios, serão apresentados os métodos ativos em
Educação Musical, que surgiram no início do século XX, respondendo a uma
série de desafios provocados pelas grandes mudanças ocorridas na sociedade
ocidental, na virada do século XIX para o XX. Contudo, nem todos os
chamados métodos ativos podem na verdade ser considerados métodos, mas
abordagens ou propostas.
Fonterrada (2005) coloca que nas décadas de 1950 e 1960, muitos
métodos foram introduzidos no Brasil, nos grandes centros urbanos e escolas
especializadas de música. No entanto, em razão de uma série de
circunstâncias - entre as quais a exclusão da disciplina “Música” dos currículos
escolares, substituída pela educação artística, desde 1971 - muitas dessas
abordagens foram esquecidas, limitando-se a poucos seguidores, que
pertenciam a segmentos educacionais alternativos.
Conforme a autora, as escolas de música parecem não dar conta da sua
importância, permanecendo, muitas delas, no antigo esquema de iniciar as
crianças e jovens diretamente no instrumento, e colocando-os em classe de
teoria da música para completar a formação exigida pela aula prática. São
poucas as instituições que sistematicamente adotam um trabalho apoiado nos
métodos ativos para o aprendizado musical, e mesmo aquelas que investem
em aulas de musicalização, é comum que o façam de maneira pouco
consistente, ocorrendo, muitas vezes, mais uma recreação do que fonte de
conhecimento.
No entanto é preciso registrar o esquecimento dos métodos
ativos de educação musical em muitos dos espaços, vem
sendo danoso ao ensino de música no país, provocando duas
posturas opostas: a que adota um dos métodos acriticamente e
de
maneira
descontextualizada
descartando
outras
possibilidades, e a que ignora seus procedimentos e investe
em propostas pessoais, geralmente não acompanhadas de
reflexão, e baseadas em ensaio-e-erro, que em geral
privilegiam a diversão, dentro do pressuposto de que a música
é lazer (FONTERRADA, 2005, p. 122).
82 Por isso a educadora musical ressalta que se a ideia é fortalecer a área
da Educação Musical, é importante que os educadores musicais pioneiros
sejam revisitados cuidadosamente, não para serem adotados tal como se
apresentam em suas propostas originais, mas como fonte da qual se podem
extrair subsídios para propostas educacionais adequadas ao contexto da
escola e da cultura brasileira atuais.
Durante muito tempo confundiu-se ensinar com transmitir e, nesse
contexto, o aluno era um agente passivo da aprendizagem e o professor um
transmissor não necessariamente presente nas necessidades do aluno. Sabese, atualmente, que não ocorre ensino sem a aprendizagem, e esta não
acontece senão pela transformação, pela ação de mediação do professor, do
processo de busca do conhecimento, que deve sempre partir da criança. Em
função destas necessidades, criadas a partir de um momento e ambiente
determinados pela atualidade, é que se pretende, através deste trabalho, a
elaboração de caminhos para aprendizagem musical, com embasamento na
interdisciplinaridade das diversas artes. Este seria o resultado de uma busca
constante do máximo de possibilidades para o envolvimento e estimulação das
crianças na arte musical.
Ao proporem-se meios diversificados para o trabalho da Educação
Musical, será importante a análise de algumas relações da criança, como
sendo o público alvo bem como o interessado na presente pesquisa. Estas
relações são da criança com a arte, criança com o jogo, os sons e a música.
Também será imprescindível o destaque dos aspectos em que a musicalização
virá sanar e preencher as necessidades solicitadas pelo perfil do novo
ambiente e comportamento social resultante de uma nova era. Estes destaques
enfocam a relevância da Educação Musical na formação da criança, como ser
global que se desenvolve de maneira surpreendente.
3.5.2 Métodos ativos em musicalização infantil
Alguns educadores musicais desenvolveram os elementos musicais,
transformando-os em atividades lúdicas, que envolviam o esquema corporal e
auditivo em vivências contínuas, e que foram chamados de métodos ativos. A
sucinta apresentação que se faz nos tópicos seguintes sobre tais autores e
83 seus respectivos métodos é justamente em função da relevância do professor
conhecer as condições históricas e o contexto em que o ensino de música se
dá em nossos dias, para que proceda tanto à avaliação crítica quanto às
necessárias adaptações, e se aproveite efetivamente das contribuições que
esses métodos podem trazer ao ensino da música no Brasil.
O primeiro dos referidos métodos que aqui se apresenta é o de Émile
Jaques Dalcroze. Artista e pedagogo, considerava a importância do equilíbrio
do sistema nervoso na execução dos movimentos rítmicos. Segundo Dalcroze
(1976), a ginástica rítmica é uma disciplina no sentido rítmico muscular; ela
converte o corpo em um instrumento onde vibra o ritmo. Supõe então, o cultivo
simultâneo do corpo e do ouvido (eurritmia- o ensino da música por meio de
movimentos rítmicos).
O método de Dalcroze visa desenvolver a comunicação entre ouvidos
que escutam com a mente que analisa sensações orais, e o corpo que atua
para produzir e interpretar os sons e sentimentos do ritmo musical. A autora
Paz (2000) destaca a descoberta de Dalcroze: os alunos eram incapazes de
sentir e expressar música; possuíam conhecimento mecânico, não musical. Ele
quis convergir conhecimento mecânico, em entendimento musical. Os
discentes desenvolveram habilidade para sentir, ouvir, inventar, imaginar,
conceituar, relembrar, ler e escrever; apresentar e interpretar música. Com as
descobertas de Dalcroze foram abaladas as bases tradicionais do ensino e
aprendizagem do ritmo musical e da música em geral.
Greif (1994) esclarece que as ideias de Dalcroze estavam em
conformidade com o pensamento pedagógico da época, apoiado na biologia e
na psicologia. Mostra ainda, a questão da experiência em educação, que está
presente na filosofia de John Dewey, e de como esta se reflete em Dalcroze.
“Seu objetivo era o experimentar ao invés do saber, como elemento detonador
de um desejo de se expressar” (PAZ, 2000, p. 256).
Dalcroze “explicita a funcionalidade do método mostrando que os
exercícios rítmicos têm a função de auxiliar no reconhecimento da altura de
sons e nos intervalos entre sons, na percepção dos sons harmônicos, na
audição de cada nota dos acordes” (GREIF, 1994, p. 38).
Paz (2000) coloca que para Dalcroze o ritmo é o elemento que mais
afeta a sensibilidade infantil, e que a prática do método é revestida de grande
84 prazer, concentração, criatividade, além da vivência da música propriamente
dita. A autora enfatiza alguns aspectos que são desenvolvidos como o cultivo
de atenção, a preparação e cultura do corpo, o desenvolvimento do ouvido e
preparação para a música, os exercícios em conjunto, apreciação de espaço e
disciplina grupal, e os exercícios de expressão individual espontânea musical e
plástica.
A influência de Dalcroze e de sua forma peculiar de lidar com o ensino
musical gerou discípulos, como Edgar Willems, que também valorizou a ação
corporal na concepção de seu método. Ele considerou que o verdadeiro ritmo
está presente em todo o ser humano, está implícito em ações como andar,
respirar, o pulsar do sistema circulatório e movimentos sutis causados pela
emoção ou por pensamentos. O método Willems:
É um método ativo de educação musical que tem 3 princípios
básicos que são as relações psicológicas estabelecidas entre a
música e o ser humano, a não utilização de recursos extra
musicais dentro do ensino de música e enfatizava a
necessidade do trabalho prático antes do ensino musical
propriamente dito (WILLEMS, 1968, p. 16).
Ele construiu seu método de trabalho a partir de bases que descobriu no
pensamento científico do século XIX e na psicologia, que lhe fornece as bases
para a compreensão do ser humano. Fonterrada coloca que Willems
compreendia que a música não estaria nos sons, mas entre os sons, que seria
como a música está nos intervalos, pois, nos fenômenos sonoros da natureza,
estão presentes intervalos de todos os tipos.
Os elementos fundamentais da música – ritmo, melodia e
harmonia, não existem apenas em função do ser humano, mas
são parte intrínseca do universo, onde os diferentes reinos
estão harmonicamente conjugados. Essa é a razão que
encontra entre a música e o ser humano, e entre música e vida
(FONTERRADA, 2005, p. 96).
Por esse motivo, Willems não dedica somente a ele o mérito de ter
criado um sistema de ensino. O que propõe é uma ordenação construtiva,
capaz de presidir a atividade musical criativa em estreita semelhança com a
vida e com as leis que regem o universo. A sensibilidade musical procurada por
Willems deveria ser buscada na própria música, não como um apelo a um
85 caráter subjetivo mais ligado a valores como o bem e o mal, por exemplo, mas
na compreensão da obra artística como plena de qualidades estéticas, o que
poderia ser feito em qualquer estágio de desenvolvimento musical do aluno, do
iniciante ao avançado.
Rocha (1998) fala que Willems enfatizou o desenvolvimento auditivo e
psicológico da música, ou seja, a ligação entre os elementos musicais e o ser
humano que é o ritmo ligado à motricidade (primitivo), a melodia ligada à
afetividade (emoção), a harmonia ligada à inteligência (complexidade), e
introdução à leitura musical padrão com representação global dos sons.
Os objetivos da Musicalização Infantil, para Willems de acordo com Paz
(2000) são fazer com que as crianças amem a música e prepará-las para que
realizem com alegria musical, vocal e instrumental, proporcionar a criança,
mediante
recursos
pedagógicos
vivos
e
adequados,
o
máximo
de
possibilidades para que aprenda música, ainda que não seja particularmente
dotada, e acreditava que o professor deveria ser profundamente humano no
trato com os pequenos, e favorecer mediante a música viva, o desenvolvimento
integral da criança.
A autora ainda ressalta que Willems se preocupava com o início da
Educação Musical, com a preparação filosófica, psicológica e pedagógica que
o professor necessita ter para poder assentar sua prática em princípios
corretos e que “possam, através da música, estimular o desenvolvimento da
criança como um todo, integrando-a de forma ativa e prazenteira no seu
ambiente social” (PAZ, 2000, p. 250).
Ainda nessa linha de pensamento do uso do corpo no ensino musical
encontra-se Murray Schafer. Ele é diferente de Dalcroze e Willems, pois tem
uma intenção pedagógico-musical do corpo muito mais voltada para a
integração dos sentidos e a revivificação dos sensos-receptores no fazer
musical. Ele não trabalha o movimento corporal sob uma perspectiva
eminentemente rítmica. No livro O Ouvido Pensante, afirma que o movimento
corporal na música pode funcionar como uma ferramenta eficaz para se
desenvolver uma boa percepção e coordenação motora:
A prática de música pode ajudar a criança na coordenação
motora dos ritmos do corpo. [...] A música pode também correr,
saltar, claudicar, balançar. Pode ser sincronizada com bolas
86 que pulam, com ondas do mar, com galopes de cavalos e com
centenas de outros ritmos cíclicos ou regenerativos, tanto da
natureza quanto do corpo. Cantar é respirar.[...] Justificar a
música fundamentalmente em bases que não sejam de sua
importância para a estimulação e coordenação intelectual,
muscular e nervosa leva a problemas que só podem ser
resolvidos a longo prazo, por meios não musicais (SCHAFER,
1991, p. 295).
A citação que se segue demonstra a importância de integrarmos todos
sentidos no aprendizado musical: “O corpo todo é um ouvido” (SCHAFER,
1991, p. 333). Ele considera que na atualidade os nossos sensos-receptores
estão atrofiados. Podemos vislumbrar esse cenário nas crianças, jovens e
adultos, que modernamente levam uma vida sedentária, por estarem
intimamente ligados ao mundo tecnológico, como os computadores, internet,
vídeo games e automóveis. Cabe aos educadores ativá-los para que tenham
melhor consciência corporal.
Ao empregar a expressão a unidade primitiva dos sentidos, Schafer
(1991) reporta-se à integração de todos os sentidos, diferentemente de uma
análise particularizada de cada um deles, que foi necessária para que se
processe um estudo setorizado de cada um deles, mas não para o fazer
musical. O autor admite que a especialização dos diferentes tipos de
percepção aumentou o conhecimento sobre cada um dos cinco sentidos, mas
também gerou uma segmentação entre a audição, a visão, o olfato, o paladar e
o tato, fato que impede uma visão global dos sentidos do ser humano.
Embora Dalcroze, Willems, e Schafer tenham utilizado o corpo de
maneira diferenciada no processo de ensino/aprendizagem musical, se
evidencia a importância de um trabalho corporal nos processos de
sensibilização musical. Ele ajuda o desenvolvimento da percepção rítmica, a
coordenação motora, a criatividade e a expressividade.
Murray Schafer, inventor do termo, “paisagem sonora” é que trabalha
com o ambiente sonoro.
Tecnicamente, qualquer porção do ambiente sonoro vista como
um campo de estudos. O termo pode referir-se a ambientes
reais ou a construções abstratas, como composições musicais
e montagens de fitas, em particular quando consideradas como
um ambiente (FUBINI, 1999, p. 208).
87 Schafer encabeçou o projeto Paisagem Sonora Mundial, do qual
participavam músicos, cientistas sociais, arquitetos, engenheiros, físicos e
profissionais de várias outras áreas. O projeto surgiu naqueles anos 70 com o
objetivo de fazer um levantamento das diversas paisagens sonoras através do
mundo e da história e desenvolver um projeto acústico para a humanidade.
A melhor forma de entender o que quero dizer com projeto
acústico é considerar a paisagem sonora mundial como uma
imensa composição musical desdobrando-se incessantemente
à nossa volta. Somos simultaneamente seu público, seus
executantes e seus compositores (FONTERRADA, 2005, p.
50).
O trabalho proposto por Schafer (1991) possibilita a exploração do
ambiente sonoro no qual está imersa a criança. A proposta de Schaffer é
particularmente possível para o Brasil, e não só dirigida para alunos
especialmente dotados, mas para toda população, independentemente de
talento, faixa etária, ou classe social. Além disso, Schafer preocupa-se em
particular com os elementos mais simples, com as observações mais
corriqueiras como:
... de quantos modos diferentes pode-se fazer soar uma folha
de papel? Ou as cadeiras de uma sala de aula? Como
sonorizar uma história de modo a torná-la reconhecível apenas
pelos seus sons? Como construir uma estrutura sonora?
(SCHAFER, 1991, p. 298).
Através da proposta de Schafer é possível conhecer melhor a criança,
suas possibilidades e o ambiente que a cerca: e a partir daí, promover o seu
desenvolvimento através de suas preferências, tornando então o ensino
agradável e estimulante.
Embora se trate aqui da concepção dos métodos ativos e isso possa
implicar intencionalidade, nem todos foram concebidos como intenção primeira
de seu criador, como no caso de Willems e Dalcroze. Guest (apud PAZ, 2000,
p. 262) declara, por exemplo que a prioridade de Kodály não foi fazer um
método, mas o levantamento e sistematização do folclore húngaro. Sua
finalidade era a preservação das tradições.
“No método Kodály não é importante que o lá tenha 440 ciclo, mas que
ele é o VI grau da escala maior. A música não é feita de notas e sim de sons,
88 formando intervalos” (ÁVILA, 1998, p. 42). A autora ainda coloca que Kodály
combinou várias técnicas pré-existentes e desenvolveu-as: Tônica solfa,
sílabas rítmicas, cantando com as mãos. Sua filosofia baseia-se em que todas
as pessoas capazes de aprender e serem alfabetizadas também são capazes
de desenvolver a linguagem musical, e que o cantar é o melhor fundamento
para a musicalidade. Para Ávila (1998) Kodály tinha como base para seu
método que:
Quanto mais cedo se educa a criança musicalmente, mais
efetiva será sua educação. As canções folclóricas familiares às
crianças constituem a base para o aprendizado, mas somente
devem ser usadas no ensino, músicas folclóricas e compostas
com alta qualidade e valor artístico. A música deve ser o coração
do currículo, o assunto central, usada como base para a
educação (ÁVILA, 1998, p. 61).
Para Yepes (1968) o método de Kodály tem como objetivos, desenvolver
a musicalidade em cada criança, que ela conheça a linguagem musical, sendo
capaz de ler, escrever, criar. Através de pesquisas junto ao folclore húngaro,
chegou a recolher mais de 3.500 melodias folclóricas, a partir das quais
desenvolveu vários estudos na área. Utilizou o folclore húngaro não só em
suas composições, mas também em sua obra pedagógica. Ávila (1998) afirma
que Kodaly generalizou o ensino musical em seu país, do Jardim de Infância ao
Secundário, aplicando o poder educativo do folclore musical. O método Kodály
consta de 15 cadernos organizados progressivamente, desde os mais simples
e elementares exercícios de entoação, até as mais difíceis partituras a uma,
duas e a três vozes.
Os princípios metodológicos de Kodály de acordo com Domonkos,
(1969) basearam-se em solfejo relativo proposto por Guido D’Arezzo (ano 1000
d.C). O solfejo relativo, não considera a altura fixa das notas, mas sim sua
função na estrutura sonora. “Utiliza a manossolfa que é o processo inspirado
na “mão guidoneana”, uma estratégia de Guido D’Arezzo para leitura dos
intervalos musicais com sinais das mãos para representar as notas musicais”
(FONTERRADA, 2005, p. 69).
O Objetivo do método de educação musical de Kodály é ensinar o
espírito do canto a todas as pessoas, além da alfabetização musical para
89 todos, trazendo a música para o cotidiano, nos lares e nas atividades de lazer,
de modo a enriquecer a vida de maneira criativa e humanizada, por meio de
música. Para Kodály, proporcionar a alfabetização musical para todos é o
primeiro passo em direção a esse ideal.
Ainda como princípio metodológico criou o solfejo silábico substituído por
número proposto na França por Émile-Josefh Chevé (1804-1864), e os nomes
rítmicos, (ti, titi tá) e a eurritmia, que é o ensino da música por meio de
movimentos rítmicos, desenvolvido pelo suíço Dalcroze, mas sempre
associado à canção.
No Brasil, o sistema Kodály é difundido pela Sociedade Kodály do Brasil,
em São Paulo, que oferece cursos regulares e de curta duração, e trabalha no
sentido de encontrar equivalências às canções húngaras, no folclore brasileiro.
Para Kodaly, "O bom educador é aquele que ensina mais do que sabe, e
através do ensino, aprende mais do que ensinou" (KODALY, 1974, apud
ÁVILA, 1998).
3.5.3 As concepções e contribuições de alguns educadores musicais
brasileiros
A partir de educadores musicais que se destacaram em alguns países,
começam surgir propostas desenvolvidas por educadores musicais brasileiros.
Mediante estudos feitos dos métodos ativos criados por estes educadores já
citados, começam a se destacar no Brasil no final do século XIX para o século
XX alguns em especial.
Heitor Villa-Lobos, certamente o precursor desse tipo de iniciativa no
Brasil, tentou formalizar e implantar aqui, na década de 30 um trabalho de
natureza similar ao dos educadores musicais europeus na área de educação
musical. Ele dizia que a receita para educar musicalmente as pessoas era
através do canto orfeônico. De acordo com Mariz (1989) Villa-Lobos acreditava
ser essencial educar as crianças desde pequenas desenvolvendo o senso
estético. O canto orfeônico tal como ele entendia, deveria, na realidade,
chamar-se educação social pela música.
90 O canto orfeônico é o elemento educativo destinado a
despertar o bom gosto musical, formando elites, concorrendo
para o levantamento do nível intelectual do povo e
desenvolvendo o interesse pelos efeitos artísticos nacionais. É
o melhor fator de educação cívica, moral e artística. O canto
orfeônico nas escolas tem como principal finalidade colaborar
com os educadores para obter-se a disciplina espontânea dos
alunos, despertando, ao mesmo tempo, na mocidade um são
interesse pelas artes em geral (VILLA-LOBOS, 1988, p. 65).
A música para Villa-Lobos era considerada um elemento básico e
insubstituível na formação. A música, através do canto orfeônico, deveria
participar da vida cotidiana da escola, onde o ensino de música seria
proveitoso para complementar a educação da criança não só para a formação
de uma consciência musical, mas também para a motivação do civismo e da
disciplina social coletiva. O alvo do canto orfeônico era desenvolver os
principais objetivos, que segundo Villa-Lobos era desenvolver em ordem de
importância, a disciplina, o civismo e a Educação Artística.
Usou como metodologia difundir o Canto Orfeônico no Brasil, o qual
tinha a característica de prática com conjuntos heterogêneos de vozes e
tamanho
muito
variável.
Nessa
metodologia
não
era
necessário
o
conhecimento musical ou qualquer treinamento vocal, o que é indispensável
para a prática de coral ou outros grupos eruditos. E a autora Paz fala que:
O Canto orfeônico consistia no ensino do ritmo, seguido pela
entonação das notas, depois a consciência do timbre, por meio
da prática dos sons com diferentes vogais e depois a
consciência de dinâmica, e acreditava ter como benefícios o
desenvolvimento da coordenação motora, o raciocínio lógico, a
percepção dos sons, e o gosto pela música (PAZ, 2000, p. 13).
Paralelo ao canto orfeônico desenvolvia-se outra importante metodologia
musical – a iniciação musical. Essas duas modalidades foram idealizadas por
músicos modernistas. De um lado Villa Lobos, com o canto orfeônico e, de
outro, as metodologias aplicadas por Antônio de Sá Pereira e Liddy Chiaffarelli
Mignone que lideravam a Educação Musical. Os três músicos foram ligados ao
movimento modernista.
O trabalho desses educadores e musicistas que se preocuparam em
sistematizar métodos de ensino, sejam os europeus, como Dalcroze, Willems,
e Schafer, sejam brasileiros como Villa-Lobos, encontram eco e tem
91 prosseguimento, modernamente, no trabalho de pessoas como a francesa
Nicole Jeandot, de quem tive o privilégio de ser aluna no Bacharelado em
Música entre os anos 1986 e 1988. Como professora, era muito responsável; e
pontuava suas crenças sobre Educação Musical, o que redundou na obra
Explorando o Universo da Música, de 1990. Neste livro ela narra sua trajetória
de vida, trabalho e metodologia. Hoje, está com 83 anos, sendo 48 deles
vividos no Brasil.
No livro Jeandot (1990) apresenta de maneira progressiva, aspectos
referentes à definição dos sons e como surgiram bem como o conceito e
origem da música, e a relação da mesma com a criança, instrumentos
tradicionais e confecção de instrumentos. A autora acredita em uma
metodologia que deve-se usar muitos jogos envolvendo música, explorando
sons e silêncio, ritmos, movimento, exercícios de percepção, atenção,
coordenação motora e memória, interpretação, improvisação e expressão, e
temas musicais. Os estudos, livros e pesquisas desenvolvidos pela autora são
importantes para a educação musical porque ela considera a música “como
uma força capaz de promover a comunicação entre o ser humano e seu
ambiente além de auxiliar nos processos de reequilíbrio de crianças
desajustadas” (JEANDOT, 1990, p. 9).
Há muitos outros músicos pedagogos brasileiros que estão preocupados
com a Educação Musical no Brasil e que têm publicado algumas obras que
relatam sua preocupação e oferecem seu apoio didático através de livros que
trazem grande contribuição para o professor e pesquisador e que tem interesse
em trabalhar através da educação musical na escola, dentre os quais inclui-se
a educadora e autora Leda Osório Mársico que publicou materiais na área de
Educação Musical, dentre os quais: “A Criança e a Música”, e “Introdução à
Leitura e à Grafia Musical”; Teca Brito cuja proposta para o trabalho com
música na educação infantil vem se desenvolvendo há 20 anos na carreira de
educadora musical, tendo realizado pesquisas sobre o assunto, colaborando na
elaboração dos Referenciais Curriculares de Iniciação Musical do MEC, e em
cujo livro Música na Educação Infantil, nos mostra uma visão desta não como
um objeto funcional, mas como elemento importante para a formação do
homem, que deixa de ser só entretenimento, e passa a agir como elemento
para o aprendizado, estímulo da percepção e desenvolvimento das linguagens.
92 A autora descreve em seu livro “Koellreutter Educador” as questões
essenciais à pedagogia musical. Coloca os princípios pedagógicos que
orientam a sua postura como educador e que hoje ela segue como discípula
que tem sido. E Brito tem como objetivo “divulgar a metodologia usada por
Koellreutter, seu pensamento e ação pedagógico-musical, visando ampliar e
enriquecer a formação musical, cultural e humanista de nossa gente” (BRITO,
2001, p. 21).
Seja especificamente no Brasil, seja no mundo, particularmente Europa,
foi nas primeiras décadas do século XX que a pedagogia musical começou a
se ocupar de transformações na prática pedagógico-musical, resgatando a
vivência perdida em maneiras mecânicas de ensinar. Todos os educadores
citados contribuíram na criação de novos métodos de ensino. Tais fatos levam
à oportunidade de modificação da transmissão mecânica e impessoal de
conhecimentos, para um intercâmbio de experiências através do jogo musical e
da prática criativa e prazerosa.
Muitas foram as personalidades que decidiram e orientaram a reforma
educativa musical, e dentre as mais representativas destacam-se o pedagogo
suíço Émilie Jaques Dalcroze, que com suas descobertas abalou as bases
tradicionais do ensino e aprendizagem dos ritmos e da música em geral; o
compositor alemão Carl Orff, que contribuiu grandemente no campo do ritmo,
da criatividade, dos instrumentos didáticos e da integração das diferentes
manifestações artísticas e expressivas; Maurice Martenot, compositor francês,
inventor do instrumento de ondas que leva seu nome, e que incorpora
importantes recursos para o ensino do canto e da iniciação musical, baseados
na psicopedagogia infantil e nas técnicas de concentração e relaxamento
corporal; o compositor e pedagogo húngaro Zoltán Kodaly, que conseguiu
generalizar o ensino da música para crianças em seu país, aplicando a
extraordinária vitalidade e o poder educativo do folclore; o filósofo e
psicopedagogo musical Edgar Willems, que desenvolveu na Suíça suas bases
psicológicas da educação musical, hoje amplamente difundidas.
Muito ainda poderia ser dito sobre autores e métodos implementados,
neste sentido, no Brasil e no mundo, mas, as informações mais relevantes para
a construção dessa dissertação, e que certamente não encerram o tema, estão
aí postas. É justamente a partir de todas as informações registradas nos
93 capítulos anteriores, que será apresentada, no próximo capítulo, uma
sistematização da metodologia para desenvolver práticas pedagógicas
musicais que auxiliem na aprendizagem dos alunos e dos docentes iniciantes,
realizando assim uma melhor implantação das aulas de música nas escolas. A
metodologia a ser aqui apresentada é fruto de minha experiência, ou vivência
de um trabalho de mais de 20 anos, dentro de uma metodologia que desenvolvi
a partir de estudos feitos por estes educadores citados anteriormente, e que
poderá servir para uma melhor implantação das aulas de música nas escolas.
94 CAPÍTULO IV
RELATO DE EXPERIÊNCIA: RESSIGNIFICANDO CONCEITOS
E PRÁTICAS PARA O ENSINO DA MÚSICA
Neste capítulo será apresentado um relato da experiência desenvolvida
e trabalhada por mim durante estes últimos 20 anos na educação musical. A
minha formação na faculdade foi Bacharelado em Piano e depois a
Licenciatura em Educação Artística com especialização em Música.
Trabalhei em algumas escolas particulares nos últimos 20 anos, e em
especial com as crianças da Educação Infantil ao Ensino Fundamental I. Logo
no início desenvolvia um trabalho de Coral e aulas de música para
simplesmente ter música na escola e poder mostrar para os pais e fazer a
divulgação do que acontecia durante o ano. A maneira como eram feitas as
aulas de música era totalmente diferente da proposta que estava começando a
conhecer nos cursos que vinha fazendo. Tudo era baseado em datas
comemorativas. Eu era obrigada a ensaiar com todas as turmas músicas que
fossem adequadas para os eventos que eram solicitados pelo calendário
escolar. As aulas todas eram somente cantar para realizar os eventos. Mas
esta ideia começou a me incomodar porque não conseguia ver propósito em
aulas de música desta forma. Era muito desgastante ensaiar um coral enorme,
sozinha, pois só eu tocava e regia ao mesmo tempo.
Aos poucos fazendo mais cursos, comprando materiais sobre a
musicalização infantil para escolas e procurando estudar mais sobre como
adaptar isto para as escolas, comecei a desenvolver uma forma de trabalho na
escola que trabalhava em São Paulo, e as crianças foram gostando muito mais,
pois era divertido, com muito material visual e com uma participação maior.
Eles podiam tocar flauta doce, participar da bandinha e desenvolver-se mais
musicalmente.
Esta situação gerou um conflito com a direção e com as outras escolas
que eram da mesma rede, porque pedi para a coordenação destas escolas que
as aulas de música fossem modificadas. Foi um trabalho de muita
95 perseverança, porque não havia profissionais aptos para realizar este trabalho,
e como eu estava cursando a faculdade não poderia atender muitas escolas.
Aos poucos consegui convencer a direção da escola que trabalhava para ter
este trabalho diferenciado com meus alunos, mesmo ainda não conseguindo
me desvencilhar dos eventos e apresentações. Eu tinha que conciliar tudo, mas
se tornou um trabalho mais interessante.
Trabalhava através de jogos, instrumentos de percussão, rodas e
brincadeiras, buscando um desenvolvimento da percepção auditiva, rítmica,
expressão corporal e a socialização das crianças, e estimulava-os a
experimentar, improvisar e criar. Tudo isto realizado de forma lúdica.
Tive muita persistência e me esforcei bastante como defensora das
aulas de música na escola, e a partir da década de 1990 começaram a nascer
vários projetos diretamente ligados à educação musical com propostas que
envolvem música e comunidade. Havia um grupo pequeno de educadores
conscientes
do
valor
educativo
da
música,
que
discutiam
questões
relacionadas com arte-educação, fazendo pesquisas e propondo uma
metodologia diferente, se destacando na capacidade educativa e formativa do
indivíduo. Nesta mesma década começou então a implantação de alguns
projetos de utilização da música em sua área de atuação, com uma nova
tendência no ensino e que será sentida apenas depois dos anos 1990.
Com estas pequenas transformações e realizando um trabalho
diferenciado nas classes com os alunos e a mostra de que estava sendo muito
proveitoso, fui convidada para voltar para o colégio aonde estudei desde
pequena, para trabalhar no Conservatório Musical com aulas de Musicalização
Infantil e Piano. Desta forma eu pude ter um trabalho específico com uma sala
especial e apropriada para as aulas de musicalização. Um espaço amplo, bem
decorado, sem carteiras, com carpete onde todos se sentavam no chão em
círculo para fazer as atividades, com muitos instrumentos e materiais diversos.
Este trabalho era feito sempre com duas professoras, que tivessem uma
integração entre tocar, andar, e fazer as atividades junto com as crianças. Foi
uma fase muito boa. Fiz muitos cursos de musicalização com educadores
musicais que traziam novidades de métodos e educadores musicais da Europa.
Foi quando conheci melhor o método Kodaly, que é o nome de um educador
96 húngaro citado em capítulo anterior, que desenvolveu uma metodologia para
ensinar a música para as crianças nas escolas da Hungria.
Estes cursos foram realizados nas férias de julho e eram intensivos com
toda a metodologia e com a parte prática. Na mesma época destes cursos, nós
as professoras de musicalização do Conservatório já pudemos oferecer cursos
para os professores de música das escolas que estivessem interessados em
aprender esta maneira nova e criativa de ensinar música, porque se percebia
que o ensino da música nas escolas brasileiras passou, nos século XX e XXI,
por várias denominações e concepções, ocasionadas pelas mudanças nas leis
nacionais, deixando os professores sem saber o rumo a tomar.
Em 20/12/96, a Lei 9.394-96 fixou novas diretrizes e bases para a
Educação Musical. Os novos Parâmetros Curriculares Nacionais enfatizavam o
ensino e a aprendizagem de conteúdos que colaboram para o desenvolvimento
integral do ser humano e comentam que a música é “fundamental para a
formação de cidadãos”. Enfatizam que a música sempre esteve associada às
tradições e às culturas de cada época. Os Parâmetros Curriculares Nacionais
relatam que “não estão definidas aqui as modalidades artísticas a serem
trabalhadas a cada ciclo”, mas é citado que “serão oferecidas condições para
que as diversas equipes possam definir em suas escolas os projetos
curriculares” (BRASIL. PCN, vol. 6, 1998, p. 55).
Com esta nova lei e com os novos PCN os professores de música
começaram a entender que precisariam mudar a maneira de trabalhar, mas
ainda não sabiam como. Foi quando comecei junto com minhas colegas a
atender professores em cursos de verão em duas semanas de janeiro para os
que estavam querendo se atualizar e também fazer parte desta mudança.
Continuei me especializando mais a cada ano que passava, com cursos
e metodologias novas na área de musicalização e estudando as diferenças
entre eles e adaptando para a minha realidade na escola e mesmo para o
Brasil. Apesar de tudo, ainda era muito difícil as pessoas entenderem como
fazer estas modificações para a escola.
Em 2002 fiz uma Pós Graduação em Docência do Ensino Superior, com
uma monografia relacionada à importância das aulas de música nas escolas.
Neste trabalho pude observar algumas escolas da região que moro que diziam
ter aulas de música, e detectei que esta prática não acontecia nas mesmas.
97 Eles consideravam “aula de música” cantar com todos os alunos juntos na hora
da entrada em fila, e isso quando a escola tinha algum professor que gostava
de cantar. Foi daí que surgiu a ideia de fazer uma parceria da Instituição que
trabalho com as prefeituras das cidades de Artur Nogueira e Engenheiro
Coelho, para que os alunos que faziam a graduação em música pudessem
fazer seus estágios nas escolas da prefeitura, e aproveitando seria interessante
para as crianças terem este benefício. Foram escolhidas algumas escolas
pelas secretarias de educação das cidades aonde seriam desenvolvidas estas
aulas.
Há cinco anos estou envolvida com este trabalho junto à prefeitura e ele
tem sido muito positivo tanto para os alunos da graduação como para as
crianças.
Atualmente
as
aulas
desenvolvidas
nas
escolas
são
de
musicalização, flauta doce, violão, coral e fanfarra. Ainda temos um trabalho de
alfabetização e música com um grupo da 3ª idade, na cidade de Engenheiro
Coelho.
Este trabalho tem sido de uma experiência muito rica tanto para mim,
que sou a coordenadora dos estágios, como para os alunos do UNASP (Centro
Universitário Adventista – Campus Engenheiro Coelho), que estão podendo
treinar a cada semana o que lhes confere alguma experiência profissional.
Como educadora quero fazer com que estes futuros professores entendam que
musicalizar é permitir que a criança seja sensibilizada pela música de forma
dinâmica e lúdica. É o despertar musical na educação infantil, dando
oportunidade para a criança fazer música e ter prazer em ouvi-la.
Procuro destacar que musicalizar é tornar a música acessível a todos. É
fazer com que as crianças amem a música, preparando-as para realizar com
alegria esta prática musical. É importante construir o conhecimento com o
objetivo de despertar e desenvolver o gosto musical através do estímulo, e
assim contribuir para a formação global da criança.
Esta é uma das partes do meu trabalho atualmente. Incentivar esse
processo de Educação Musical adaptando-o a realidade social, respeitando as
fases evolutivas da criança, sendo multidisciplinar, com objetivos claros e
precisos, preparando seres humanos capazes de criar, realizar e vivenciar
emoções.
98 Como trabalho em um Centro Universitário é sempre preciso estar
conectado com as inovações que surgem no meio musical acadêmico. E por
causa disto tenho que participar de muitos cursos, fóruns, seminários e
congressos como ouvinte e também como participante com apresentações de
trabalhos, pôsteres e comunicações.
Nos últimos anos tenho participado do Congresso da ABEM (Associação
Brasileira de Educação Musical) que acontece em várias cidades do Brasil.
Neste congresso, que é o maior da Educação Musical no Brasil, são realizadas
mesas redondas com temas atuais que são apresentados e discutidos por
educadores musicais que têm se destacado nos últimos dez anos. São feitos
também grupos de trabalho para que as pessoas que se inscreveram possam
apresentar seus trabalhos e pesquisas, podendo ouvir e sugerir para uma
melhora na educação musical. Ainda faz parte da programação deste evento,
assistir a recitais, concertos com grupos folclóricos, com crianças, orquestras e
bandas, e outros profissionais.
Outro evento que é importante participar é a ANPPOM (Associação
Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Música), pois se direciona a
trabalhos específicos para as pesquisas feitas em Educação Musical,
desenvolvendo a discussão no país sobre a formação musical brasileira em
todos os seus níveis. A ANPPOM é comprometida com a prática musical na
formação educacional no nível de Ensino Básico, e com o desenvolvimento do
pensamento científico sobre Música. Por estar ligada a uma faculdade de
música é importante a participação neste evento para poder acompanhar de
perto como estão se desenvolvendo as pesquisas nesta área de música.
Atualmente realizo meu trabalho no Centro Universitário Adventista
(UNASP) na Licenciatura em música com as disciplinas de Prática Pedagógica
Musical, Aspectos Teóricos e Práticos da Aprendizagem, Musicalização Infantil
e Inclusa e a coordenação dos Estágios Supervisionados nos três últimos
semestres do curso. Desenvolvo também um trabalho diferenciado de
Musicalização Infantil, com 12 turmas na Escola de Artes no UNASP que vão
desde os bebês de seis meses até crianças de 11 anos.
Paralelo a isto, no currículo do Colégio UNASP, existe aulas de
musicalização desde a Educação Infantil até o Ensino Fundamental. Parte do
trabalho é realizada por alunos do curso de Licenciatura em Música do UNASP,
99 e as mesmas crianças por eles atendidas fazem parte do Coral que dirijo com
mais uma professora. É a partir destas experiências que colocarei como
desenvolvo esta prática da Educação Musical no contexto escolar, mostrando
como sistematizar a metodologia de ensino da educação musical tanto para o
curso de Licenciatura em Educação Artística – Música, como para auxiliar a
docência musical na sua fase inicial, a partir de uma formação ideal dos
professores, tornando a prática mais sequencial e prazerosa, contribuindo
assim para uma ressignificação do trabalho musical nas escolas. Esta é parte
da minha história de vida pessoal, acadêmica e profissional colocada para
contextualizar este estudo.
4.1 A Educação Musical no contexto escolar
De
acordo
com
Maruhn,
“a
educação
intelectual
deve
ser
complementada por métodos que levem em conta uma variedade de
possibilidades de expressão e exteriorização” (MARUHN apud HENTSCHKE,
2003, p. 117). Nesse sentido, é importante que a educação musical seja
incentivada e desenvolvida desde os níveis mais elementares da escolarização
de crianças, e sua inclusão no currículo escolar poderia contribuir para a
formação geral do cidadão.
Existe, no entanto, um número pequeno de pessoas que possuem um
conhecimento exato do que vem a ser Educação Musical e qual seu papel na
educação formal dos indivíduos, pois ainda existe um preconceito com relação
ao que é fazer música, decorrente da ideia de que o acesso ao conhecimento
musical estaria restrito aos talentosos e aos economicamente privilegiados,
excluindo desta forma muitas pessoas do acesso à aprendizagem musical. No
entanto, é possível perceber que da mesma forma que existem pessoas com
maior predisposição para a matemática ou outros idiomas, existem pessoas
com maior ou menor predisposição para a aprendizagem da música, mas todos
são capazes de aprender a se expressar por meio da linguagem musical, não
havendo justificativa para crianças e adultos serem excluídos dessa atividade.
É importante considerar o potencial educativo do ensino de música para a
formação integral do aluno.
100 Hentschke (2003) questiona o papel da Educação Musical na escola
fazendo a seguinte pergunta: “por que surgem questões como: a educação
musical tem que formar profissionais, e para as outras disciplinas como história
ou ciência não fazem estes questionamentos?” A partir disso, a autora coloca
algumas razões importantes para justificar a inserção da educação musical no
currículo escolar. Entre elas, está proporcionar à criança o desenvolvimento
das suas sensibilidades estéticas e artísticas, a imaginação e o potencial
criativo. Desenvolver um sentido histórico da herança cultural, o cognitivo,
afetivo e psicomotor, e ainda o desenvolvimento da comunicação não-verbal.
Devido a estes fatores é necessário inserir a Educação Musical como
uma disciplina pertencente ao currículo escolar, e não simplesmente ser uma
atividade musical, que está à disposição dos aspectos promocionais das
escolas, com o objetivo de preparar um repertório musical para ser
apresentado em comemorações cívicas e religiosas, fazendo com que esta
aprendizagem musical se tornasse enfadonha e sem significado para as
crianças.
Esta situação apresentada acima está relacionada ao problema da
formação musical dos profissionais, que incorporam a música no cotidiano
escolar, mas não possuem um conhecimento adequado acerca do processo de
desenvolvimento musical das crianças, aonde podem perceber as diferentes
sonorizações ao tocar ou cantar. É importante atentar para esses aspectos de
forma que a música esteja presente na escola como um dos elementos
formadores do indivíduo. Para que isso aconteça, é importante que o professor
seja capaz de observar as necessidades de seus alunos e identificar, dentro de
uma programação de atividades musicais, aquelas que realmente poderão
suprir as necessidades de formação desses alunos.
4.2 A prática musical a partir de atividades lúdicas e de integração
coletiva
A música é um elemento importante na rotina diária de uma sala de aula.
O contato com ela pode enriquecer a experiência da criança de inúmeras
formas. Se o professor tocar ou cantar diversas músicas em diferentes
situações durante todo o dia escolar, a criança assimila outras situações de
101 aprendizagem, tais como habilidades sociais e estruturas de linguagem. As
crianças são sempre aprendizes por inteiro, elas aprendem um pouco de cada
coisa cada vez que têm a oportunidade. Assim como assimilam os sons vindos
do processo de aprendizagem da linguagem, elas também aprendem os sons
musicais experimentando-os como parte do ambiente onde estão.
Ouvir os sons da sala de aula, do pátio, da rua, de casa, das lojas e dos
diferentes espaços desses lugares pode ser um exercício importante para
tornar o aluno atento a tudo que acontece à sua volta e desenvolver o senso
crítico para aquilo que lhe diz respeito ou não. As atividades de tocar, cantar e
dançar no início e no fim do dia de trabalho na escola, em situações de
relaxamento, em preparação para momentos específicos da rotina de aula ou
ainda em jogos interativos no pátio, podem auxiliar o professor a conhecer
melhor seus alunos e desvendar o ambiente sonoro no qual seus alunos estão
imersos, facilitando a comunicação e a cumplicidade entre professor e alunos,
o que é um fator importante para o desenvolvimento da aprendizagem.
O professor também pode desenvolver uma pesquisa de sons e
diferentes tipos de música, compartilhando as culturas dos alunos e sons que
estão a sua volta, motivando uma movimentação enquanto ouvem determinado
tipo de música, e o professor poderá aproveitar para fazer o seu aluno se
expressar musicalmente por meio dos movimentos corporais.
Pode ainda se utilizar dos livros sobre música, levando o aluno a se
interessar pelo assunto, como os livros sobre a vida dos compositores, sobre
os instrumentos musicais e a cultura musical dos diferentes países, o que pode
gerar uma interdisciplinaridade da música com outras disciplinas, tais como a
geografia, história, a linguagem, teatro, entre outras. Da mesma forma que os
livros, vídeos, CDs e DVDs podem estar na biblioteca da escola
disponibilizando um conhecimento musical para o aluno.
Outras maneiras para o professor encorajar seu aluno a vivenciar
música é cantar junto com os alunos, ouvir e gravar as canções executadas por
eles. É possível se movimentar ou andar com a criança enquanto está ouvindo
música, ou ainda tocar um instrumento para acompanhar as atividades delas
enquanto se movimentam, brincam, escrevem ou desenham. Canções,
histórias, jogos e movimentações auxiliam o amadurecimento social,
emocional, físico e cognitivo da criança, pois a música também é um meio de
102 fazê-la participar das atividades de grupo, e de incluir crianças com diferentes
graus de desenvolvimento, aproveitando no grupo o potencial de cada uma.
A partir destas colocações sobre como deve ser a música na escola, vou
expor a minha experiência na prática durante estes anos com as crianças nas
aulas de musicalização e de coral na educação básica. Para uma melhor
fundamentação do trabalho, é importante buscar referências em alguns
educadores que desenvolveram métodos para o processo de ensinar crianças
e que foram resgatados para o ensino de música infantil. É importante valorizar
a natureza do afeto, caráter individual e interesses espontâneos da criança. “As
canções devem ser simples e não dramáticas, e seu objetivo é assegurar
flexibilidade, sonoridade e igualdade às vozes. Propor ações que não incluam a
leitura musical, que só deverá ocorrer anos mais tarde” (FONTERRADA, 2005,
p. 51).
Buscar uma educação mais voltada à prática e que seja apropriada para
crianças de acordo com o seu entendimento. Beyer (1999) coloca: “no que se
refere à educação musical, as crianças não teriam que aprender a teoria, mas
cantavam um amplo repertório de canções de roda e de jogos musicados”
(BEYER, 1999, p. 27).
No século passado, educadores musicais como Emile Dalcroze (18651950), Zoltán Kodaly (1882-1967), Edgar Willems (1890-1978) e Carl Orff
(1895-1982) buscaram uma experiência musical na qual as crianças pudessem
sentir e experimentar a música de forma lúdica e espontânea, por meio do
canto, do uso do corpo e da sensibilidade auditiva, tornando a música
prazerosa.
Como já vimos, musicalizar é permitir que a criança seja sensibilizada
pela música de forma dinâmica e lúdica. É o despertar musical na educação
infantil, dando oportunidade para a criança fazer música e ter prazer em ouvila. Musicalizar é tornar a música acessível a todos, usando a música elementar
que está inserida no movimento e na palavra. É fazer com que as crianças
amem a música, preparando-as para realizar com alegria a prática musical. É
construir o conhecimento com o objetivo de despertar e desenvolver o gosto
musical através do estímulo, e assim contribuir para a formação global da
criança. Esse processo de educação musical deve ser adaptado a realidade
social, respeitando as fases evolutivas da criança, sendo multidisciplinar, com
103 objetivos claros e precisos, preparando seres humanos capazes de criar,
realizar e vivenciar emoções.
A metodologia que desenvolvo nas aulas de música, está alicerçada em
cinco pontos que acredito que são essenciais para o desenvolvimento musical
da criança: 1) apreciação musical, 2) senso rítmico, 3) melódico, 4) voz e 5)
execução instrumental. Muitos destes aspectos se interligam e não podem ser
separados, mas apenas para uma sistematização da ideia estarão por tópicos.
Na apreciação musical é necessário desenvolver a percepção e
discriminação sonora. Procura-se desenvolver a audibilização, que é o conjunto
das funções relacionadas à Audição: percepção, discriminação, memória,
figura/fundo e análise/síntese.
AUDIBILIZAÇÃO
Figura 1: Ouvir os sons e relacionar com as figuras
Para Mársico (2003) é necessário desenvolver na criança o hábito de
ouvir capacitando-a para ouvir com discernimento e propósito, pois a partir
disto melhora a sua atenção, imobilidade e concentração.
A percepção auditiva refere-se essencialmente à apreensão de
sons e esta descoberta de ruídos e sons do seu entorno é uma
das atividades que melhor proporciona o desenvolvimento
104 delas. Desde os bebês, ouve-se música pelo puro prazer que
produz o som musical (MÁRSICO, 2003, p. 147).
Ouvir, escutar, sentir e perceber são os fatores mais importantes para se
fazer música, principalmente na fase da sensibilização. No senso rítmico
busca-se a base no movimento e na palavra. As rimas são empregadas desde
as primeiras aulas, usando gestos, movimentos corporais, instrumentos
musicais e diferenciação de altura.
ANDAR COM A MÚSICA
Figura 2: Andar na pulsação com a música
RIMAS NA PULSAÇÃO
Figura 3: Eco das rimas com martelinhos sonoros
De acordo com Orff apud Mársico (2003, p. 50), o ritmo verbal deve ser
o começo para o estímulo musical infantil. O movimento é a condição principal
da vida da criança, e este está presente em todo o tempo na música elementar.
Para o desenvolvimento da leitura rítmica associa-se o texto das rimas com as
105 figuras grandes e pequenas conforme proposto por Kodaly, apud Ávila (1998).
No entanto não se usam as palavras rítmicas (ta e titi) mas buscou-se uma
adaptação de palavras para estes ritmos, (vou, vou-e) que facilita a dicção para
a língua portuguesa e o movimento da ação. Usa-se os movimentos
fundamentais de locomoção baseados em Stokoe apud Mársico (2003, p.59)
que são explorados com canções dirigidas e movimentos livres de locomoção.
RIMAS: Relacionadas com as palavras rítmicas – vou vou Adolecá lepeti letomá.
Réu réu vai pro céu,
Vai buscar o meu chapéu,
Se for novo traga o cá,
Se for velho deixa lá.
106 A galinha do vizinho,
Bota ovo amarelinho,
Bota um, bota dois,
Bota três, bota dez.
Tico, tico, no fubá,
Tico tico vai voar,
Tico vem pra cá,
Tico tico vai pra lá.
Caracol, caracol,
Roda, roda , caracol.
107 Uni duni tê,
Salame mínguê ,
Um sorvete colorê,
O escolhido foi você.
LEITURA RÍTMICA
108 TRANSFERÊNCIA DOS CARTÕES PARA OS IMÃS
109 Figura 4 e 5: Leitura dos ritmos dos cartões para imãs
TRANSFERÊNCIA PARA PALITOS - Relacionar os palitos com o ritmo
TRANSFERÊNCIA DOS CARTÕES PARA PALITOS
110 LEITURA DOS RITMOS COM AS PALAVRAS – VOU, VOU E
ACRESCENTAR OUTROS RITMOS
111 LEITURA DOS RITMOS COM A FLAUTA
Figura 6: Flauta com ritmos
O senso melódico é desenvolvido a partir do movimento sonoro e altura
do som conforme Willems (1966). São usados movimentos da mão e do corpo,
bem como gráficos elaborados pelos alunos e feito pelos professores sendo
cantados ou tocados pela flauta de êmbolo.
MOVIMENTO DO SOM
Figura 7: Andar com o movimento do som
Após ampla exploração sonora, trabalha-se com a entonação do
intervalo de 3ª menor usando as rimas previamente trabalhadas e com nomes
das crianças, frutas, flores, animais, cores e outros. Esses sons podem ser
representados com uma criança sentada e outra em pé, colocando a mão na
testa e no queixo, degrau de escada, desenhos de gangorra e outros.
112 MOVIMENTO DO SOM COM AS MÃOS - CARTÕES MELÓDICOS
Figura 8: Movimento do som com a mão
O trabalho com a voz começa com a imitação. As professoras e pais
cantam e as crianças balbuciam e progressivamente fazem os gestos e emitem
sons silábicos de acordo com a idade. É importante explorar a experimentação
vocal por meio de canto espontâneo de sons, imitação dos sons de animais,
balbuciar musical, experimentação livre com canções buscando “desenvolver a
musicalidade da criança e ajudá-la a cantar com precisão de afinação e ritmo”.
(Mársico, 2003, p.84).
113 IMITAÇÃO DOS SONS
Figura 9: Repetição da canção de saudação
Feres (1989) enfatiza que desde os bebês a execução instrumental é
utilizada. Primeiramente de forma exploratória e livre com instrumentos leves e
pequenos, com formas e cores atrativas. Gradualmente eles vão conhecendo
instrumentos de percussão diferentes e tocando de forma livre com canções e
brincadeiras musicais.
É importante buscar uma educação mais voltada à prática e que seja
apropriada para crianças de acordo com o seu entendimento. Beyer (1999)
coloca: “no que se refere à educação musical, as crianças não teriam que
aprender a teoria, mas cantavam um amplo repertório de canções de roda e de
jogos musicados” (BEYER, 1999, p. 27).
Apresento sugestões como ideias de algumas músicas que uso em
minhas aulas. É necessário que o professor tenha muitas canções em seu
repertório.
A primeira é uma canção que trabalha o tônus muscular, onde a criança
imita os movimentos da letra, fazendo o corpo rígido no primeiro verso como
um boneco de pau e todo flácido, mole no segundo verso. Para iniciar, todos
inclinam a cabeça, levam a mão direita nas costas e giram, como se
estivessem dando corda.
114 Música: Meu Boneco de Pau - Carmen Rocha
A seguir apresentamos uma canção que trabalha o movimento de
pernas e pés, direito e esquerdo, giro, bem como a questão afetiva, abraço e
abano. Pode ser feito em roda e o professor deve estar atento para que todos
comecem com o pé direito, enfatizando a lateralidade.
Música: Movimentar o pé – Carmen Rocha
A próxima canção relembra as locomotivas de antigamente, que
possuíam o pistão. Sempre é interessante explicar para os alunos o movimento
do pistão, e como será feito com o braço, alternando direito e esquerdo, para
frente e para trás. O início é cantado bem devagar, gradualmente vai ficando
mais rápido e no final todos saem correndo. É interessante fazer uma fila
indiana, e sempre mudar o condutor, para fazer diferentes trajetos.
115 Música: É o Pistão – Autor desconhecido
Geralmente antes de cantar esta canção, gosto de falar um pouquinho
do circo e contar uma história de que o palhacinho ficou doente, e que para o
circo não fechar, todos precisam fingir que são o palhaço. É interessante deixar
que as crianças dêem ideias sobre que outros movimentos podem fazer como
dormir, beijar, arrastar o pé e outros.
Música: Pula, Pula Palhacinho – Josette Feres
A próxima canção é de Carmen Rocha e pode ser usada para ensinar ou
revisar conteúdos musicais ou da escola, como por exemplo, formas
geométricas, números, tabuada, cores, letras, instrumentos. O professor
espalha no chão as figuras de acordo com os conteúdos que deseja ensinar.
Por exemplo: Espalha quadrados, triângulos e círculos nas cores vermelha,
amarela e azul. Quando chega a parte na música “pode já pegar”, o professor
dá a ordem “círculos”, ou “círculos azuis” ou “azul”, e enquanto cantam lá, lá, lá,
as crianças pegam as figuras especificadas.
116 Música: Quem viu um igual? – Carmen Rocha
Na música do grilo, é interessante imitar um grilo, ou ter um de pelúcia.
Apresento na aula um grilo de pilha que se mexe e faz barulho que as crianças
apreciam muito. Depois na hora do canto, quando canta o “cri, cri”, as crianças
podem usar martelinhos sonoros, clavas ou palmas. É uma forma de introduzir
a prática instrumental de forma específica.
Para encerrar a aula, é sempre recomendável fazer um relaxamento, e a
música da “Joaninha” de Josette feres é muito apropriada para isto. Com os
menores, recomenda-se que a professora tenha uma luva imitando uma
joaninha e faça massagem nas costas, cabeça e pés das crianças.
Música: Joaninha – Josette Feres
117 Para Mársico (2003) é necessário desenvolver na criança o hábito de
ouvir capacitando-a para ouvir com discernimento e propósito, pois a partir
disto melhora a sua atenção, imobilidade e concentração.
A percepção auditiva refere-se essencialmente à apreensão de
sons e esta descoberta de ruídos e sons do seu entorno é uma
das atividades que melhor proporciona o desenvolvimento
delas. Desde os bebês, ouve-se música pelo puro prazer que
produz o som musical (MÁRSICO, 2003, p. 147).
Ouvir, escutar, sentir e perceber são os fatores mais importantes para
se fazer música, principalmente na fase da sensibilização. No senso rítmico
busca-se a base no movimento e na palavra. As rimas são empregadas desde
as primeiras aulas, usando gestos, movimentos corporais, instrumentos
musicais e diferenciação de altura.
BRINCADEIRAS MUSICAIS
Figura 10 e 11: Canções com movimentação
118 LEITURA DOS CARTÕES COM RITMO E MELODIA – SOL E MI
LEITURA MELÓDICA COM MANOSSOLFA
Figura 12 e 13: Leitura dos cartões com sol e mi com a manossolfa
119 TRANSFERÊNCIA PARA A PAUTA – DO RITMO E MELODIA
Partindo dessas premissas, busca-se trabalhar com a musicalização
infantil tendo como objetivos: desenvolver o prazer de ouvir, reproduzir e criar
música proporcionando à criança oportunidade de compreender a realidade
sonora que a circunda; focalizar o trabalho com rimas, parlendas, canções
folclóricas e brincadeiras tradicionais infantis resgatando o repertório tradicional
e cultural do Brasil; obter uma consciência sonora e ampliar a percepção
auditiva, trabalhando com as qualidades do som como altura, duração,
intensidade e timbre; estimular a criança a expressar-se de maneira criativa por
meio de elementos sonoros; estimular na criança a autodisciplina para
desenvolver a atenção e respeito ao próximo ajudando-os na convivência
social.
A partir deste trabalho de musicalização infantil, pode-se perceber o
desenvolvimento global das crianças no que se refere à compreensão da
linguagem musical bem como ao melhor desempenho na aprendizagem de
conceitos e melhor socialização. A grande maioria dos alunos que fazem parte
destas aulas sistematizadas pode participar de grupos instrumentais como
orquestras e bandas. Percebe-se que o ensino musical desde a Educação
Infantil favorece o envolvimento nas atividades vocais e instrumentais que são
oferecidas pela escola.
120 O ideal é iniciar o ensino da música cedo. Quanto antes o bebê tem
contato sistemático com a exploração sonora e a voz cantada, melhor a
apreensão da linguagem musical. É de suma importância que haja um
equilíbrio entre o ensino musical exploratório e o sistematizado, pois ambos
têm suas funções e características que precisam ser trabalhadas com as
crianças. Feres (1989) diz que o professor de musicalização infantil precisa
usar os vários recursos didáticos e pedagógicos disponíveis, conhecendo
materiais e técnicas de ensino e aprendizagem que irão favorecer a percepção
e a execução musicais do aluno. Todas as atividades realizadas na aula
precisam ser desenvolvidas por meio do lúdico, buscando o prazer e a alegria
de fazer música resgatando e preparando as crianças para a cidadania plena.
Algumas atividades práticas que são utilizadas dentro da metodologia
aplicada nas minhas aulas são desenvolvidas nas brincadeiras em rodas,
canções folclóricas, canções com movimentos corporais, faciais e gestuais,
enfatizando as partes do corpo.
BRINCADEIRAS DE RODA
Figura 14: A classe cantando na roda
A utilização dos instrumentos da bandinha e de percussão, ouvir e
conhecer os timbres dos instrumentos, bem com as famílias de cada um.
Schafer (1991) fala da importância de trabalhar com as paisagens sonoras por
meio de músicas de vários estilos, e ainda explorar as atividades com
manossolfa que facilitam aprender as notas musicais e intervalos.
121 INSTRUMENTOS DE PERCUSSÃO
Figura 15: Instrumentos – site da JOG
O trabalho de musicalização é enriquecido com o andar nas diferentes
pulsações e de diversas formas, bem como desenvolver a partir de materiais
confeccionados uma leitura com cartões de rimas e ritmos. É de suma
importância utilizar os jogos pedagógicos musicais, para uma melhor
compreensão e fixação dos conteúdos aplicados nas aulas, bem como
aproveitar para desenvolver a dramatização com histórias sonorizadas com o
próprio corpo, instrumentos musicais ou outros objetos sonoros.
JOGOS E ATIVIDADES MUSICAIS
Figuras 16 e 17 – Jogos do site Menestrel
Figura 18 - Jogo do site Menestrel
122 BINGO MUSICAL
Figura 19: Jogo Bingo
DOMINÓ DAS FIGURAS MUSICAIS
Figuras 20
Figuras 16 a 20 dos jogos: Site da Menestrel
FAMÍLIA DOS INSTRUMENTOS
Os instrumentos podem ser classificados em instrumentos de: sopro,
corda, percussão e eletrônicos.
123 Instrumentos de sopro:
DE METAL-Trompete, trompa, trombone, tuba, bombardino etc...
DE MADEIRA – Flauta transversal, flautim, flauta doce, saxofone, oboé,
clarinete, clarone, fagote, saxofone, corn-inglês e outros.
Em conjunto com o processo e atividades desenvolvidas nas aulas de
musicalização, faz parte do estudo sistemático também a aula de Coral que
favorece e estimula as diversas áreas do conhecimento.
4.3 Coral: Projeto Musical: “CUCO” NA ESCOLA
Com a experiência de mais de 20 anos em ambiente escolar na área da
educação musical, realizei muitos corais nas escolas que trabalhei, e tinham
como objetivo principal, sempre ensaiarem para apresentações em datas
124 comemorativas ou eventos realizados pelas instituições. Mas com o passar do
tempo e mediante alguns estudos e cursos que participei, pude observar que
seria necessária uma mudança para estas aulas.
Passei a desenvolver um novo conceito para as aulas de coral, e em
complemento às atividades na Educação Musical em parceria com as aulas de
musicalização
sistematizadas
e
estruturadas
em
classe
individuais,
organizando um trabalho em grupo com todos os alunos de jardim ao 5º ano
com duas divisões por faixa etária, que é o Canto Coral. Um grupo é formado
pelos alunos de jardim ao 2º ano, e outro grupo para os alunos de 3º ao 5º ano,
e temos um projeto especial que chama “CUCO” na Escola com o objetivo de
“Educar para incluir através do Canto Coral”. É um projeto desenvolvido na
educação musical pelo canto coral integrando os conteúdos musicais ao
currículo escolar de forma interdisciplinar, utilizando os temas transversais em
uma única intersecção de aprendizagem.
O projeto “CUCO na Escola” teve início a partir de um grupo de estudo
sobre educação musical pela Musicalização Infantil e Canto Coral do UNASP
campus Engenheiro Coelho, criado em Outubro de 2003. Este grupo era
composto por alunos de pós-graduação de mestrado em educação, lato-sensu
em Educação Musical e Regência, e professores da graduação. As propostas
estudadas teoricamente embasavam o “Projeto CUCO (Currículo Coral) na
Escola”, sendo colocadas em prática a partir de fevereiro de 2004 utilizando o
ensino fundamental I do Colégio UNASP como laboratório. Dentro da proposta
curricular, foi feita a seguinte divisão: 1o grupo: educação infantil, 1º e 2º anos e
o 2o grupo: 3º, 4º e 5º anos.
Para prover um embasamento filosófico e teórico foram trabalhados
alguns objetivos para a prática curricular do canto coral e musicalização na
escola. Os principais objetivos são: desenvolver currículos de ensino para a
prática da musicalização e canto coral na escola; bem como selecionar,
organizar, adaptar e elaborar material didático para a prática curricular de
musicalização e canto coral na escola; e por fim oferecer subsídio teóricoprático para a formação do docente em Educação Musical, e para os alunos de
Licenciatura em Educação Artística - Música;
Este currículo inclui aspectos musicais e interdisciplinares, privilegiando
a exploração dos temas transversais. Alguns aspectos musicais estudados são:
125 técnica vocal, relaxamento e expressão corporal, leitura musical pela
manossolfa, bem como partitura tradicional. Conteúdos dos planejamentos das
diversas séries foram selecionados e trabalhados no Canto Coral como
proposta interdisciplinar.
Esta proposta de trabalho permite a conceitualização teórica, a aplicação
prática, a avaliação reflexiva da prática e uma reestruturação das ações
pedagógicas. Cada membro do grupo de estudo contribuiu com pesquisa em
aspectos específicos do tema geral. Periodicamente o grupo se reunia para
analisar as pesquisas individuais e sistematizar a elaboração da práxis.
No primeiro semestre de atividade, em 2004 o “Projeto CUCO na
Escola” promoveu uma reestruturação do programa coral do Colégio UNASP,
que possuía uma atividade de canto coral com alunos de educação infantil ao
5º ano em um único grupo. Mesmo neste curto espaço de tempo, resultados
palpáveis puderam ser observados.
aspectos
de
performance
musical
Uma considerável melhora em vários
se
fez
presente,
assim
como
o
desenvolvimento de um ambiente agradável e positivo de ensino e
aprendizagem,
aonde
espontaneamente.
a
alegria
do
fazer
musical
se
manifesta
Houve uma expansão de repertório, permitindo a
exploração de peças apropriadas para cada grupo, como também um
aprofundamento na busca de conhecimento musical e cultural.
Apesar de sete anos que o projeto foi iniciado, ainda é um processo de
construção do conhecimento, que tem como objetivo despertar e desenvolver o
gosto musical, favorecendo o desenvolvimento da sensibilidade, criatividade,
senso rítmico, de prazer de ouvir música, da imaginação, memória,
concentração, atenção, autodisciplina, do respeito ao próximo, da socialização
e afetividade, também contribuindo para uma efetiva consciência corporal e de
movimentação. As atividades do coral permitem que a criança conheça melhor
a si mesma, desenvolvendo sua noção de esquema corporal, e também
permitem a comunicação com o outro a partir de atividades lúdicas.
A partir destas atividades realizadas pode-se observar a contribuição
para o desenvolvimento da criança, da seguinte forma: desenvolvimento
cognitivo/linguístico, desenvolvimento psicomotor e desenvolvimento sócioafetivo.
126 É importante desenvolver a escuta sensível e ativa nas crianças. Por
isso, é fundamental fazer uso das atividades de musicalização e de canto coral,
que explorem o universo sonoro, levando as crianças a ouvir com atenção,
analisando, comparando os sons e buscando identificar as diferentes fontes
sonoras. Isso irá desenvolver sua capacidade auditiva, exercitar a atenção,
concentração e a capacidade de análise e seleção de sons, sendo as
atividades de exploração sonora a partir do ambiente familiar da criança,
passando depois para ambientes diferentes.
Snyders (1994) comenta que a função mais evidente da escola é
preparar os jovens para o futuro, para a vida adulta e suas responsabilidades.
Mas ela pode parecer aos alunos como um remédio amargo que eles precisam
engolir para assegurar, num futuro bastante indeterminado, uma felicidade
bastante incerta. A música pode contribuir para tornar esse ambiente mais
alegre e favorável à aprendizagem, afinal
propiciar uma alegria que seja vivida no presente é a dimensão
essencial da pedagogia, e é preciso que os esforços dos
alunos sejam estimulados, compensados e recompensados por
uma alegria que possa ser vivida no momento presente
(SNYDERS, 1994, p. 14).
Além de contribuir para deixar o ambiente escolar mais alegre, pode ser
usada para proporcionar uma atmosfera mais receptiva à chegada dos alunos,
oferecendo um efeito calmante após períodos de atividade física e reduzindo a
tensão em momentos de avaliação, a música também pode ser usada como
um recurso no aprendizado de diversas disciplinas. Mas é importante que seja
estudada como matéria em si, como linguagem artística, forma de expressão e
um bem cultural. A escola deve ampliar o conhecimento musical do aluno,
oportunizando a convivência com os diferentes gêneros, apresentando novos
estilos, proporcionando uma análise reflexiva do que lhe é apresentado,
permitindo que o aluno se torne mais crítico. “Uma das tarefas primordiais da
escola é assegurar a igualdade de chances, para que toda criança possa ter
acesso à música e possa educar-se musicalmente, qualquer que seja o
ambiente sócio-cultural de que provenha” (MÁRSICO, 1985, p. 148).
As atividades musicais realizadas na escola não visam a formação de
músicos, e sim, através da vivência e compreensão da linguagem musical,
127 propiciar a abertura de canais sensoriais, que facilitem a expressão de
emoções, ampliando a cultura geral e contribuindo para a formação integral do
ser. Cantar é uma atividade que exige controle e uso total da respiração,
proporcionando relaxamento e energização. O canto desenvolve a respiração,
aumenta a proporção de oxigênio que rega o cérebro e, portanto, modifica a
consciência do emissor. A prática do relaxamento traz muitos benefícios,
contribuindo para a saúde física e mental. De acordo com Barreto e Silva
(2004, p. 64): “O relaxamento propicia o controle da mente e o uso da
imaginação, dá descanso, ensina a eliminar as tensões e leva à expansão da
nossa mente”.
1 - RELAXAMENTO DO CORAL
2 - RESPIRAÇÃO
Figuras 21 – 22 – 23 – Arquivo do Colégio UNASP
128 Assim como as atividades de musicalização, a prática do canto também
traz benefícios para a aprendizagem, por isso deveria ser mais explorada na
escola. Bréscia (2003) afirma que cantar pode ser um excelente companheiro
de aprendizagem, contribui com a socialização, na aprendizagem de conceitos
e descoberta do mundo. Tanto no ensino das matérias quanto nos recreios,
cantar pode ser um veículo de compreensão, memorização ou expressão das
emoções. Além disso, o canto também pode ser utilizado como instrumento
para pessoas aprenderem a lidar com a agressividade.
As atividades relacionadas à música também servem de estímulo para
crianças com dificuldades de aprendizagem e contribuem para a inclusão de
crianças
portadoras
de
necessidades
especiais.
As
atividades
de
musicalização, por exemplo, servem com estímulo à realização e ao controle
de movimentos específicos, contribuem na organização do pensamento, e as
atividades em grupo favorecem a cooperação e a comunicação. Além disso, a
criança fica envolvida numa atividade cujo objetivo é ela mesma, onde o
importante é o fazer, participar, não existe cobrança de rendimento, sua forma
de expressão é respeitada, sua ação é valorizada, a através do sentimento de
realização ele desenvolve a auto-estima.
Nas aulas de coral depois do relaxamento corporal e respiração é feito um
aquecimento vocal de forma lúdica com canções simples, histórias dramatizadas e
gestos, podendo utilizar também a Manossolfa desenvolvida por Kodaly na
Hungria para facilitar o aprendizado das notas e intervalos. São feitos sinais com
as mãos com movimentação para cima e para baixo. É um sistema para orientar o
solfejo, isto é, determinar a altura dos sons, não por meio das notas na pauta, e
sim, por gestos com disposições diversas dos dedos e das mãos.
Posições de cada nota com a Manossolfa
Figura 24: Arquivo pessoal
129 3 - AQUECIMENTO
a) Respiração – fazer o sons de S, abelhinha, mosquito, ambulância, e outros.
b) Vocalizes com canções lúdicas com gestos
Vocalize: Ruth Costa
A Lili: Autor desconhecido
130 Cantar subindo de tom nas vocalizes, podendo usar a manossolfa, e
fazer movimentos corporais com palmas e pés. Pode-se ainda utilizar
diferentes andamentos (rápido, lento) e a dinâmica (forte, fraco). É importante
cantar explorando diferentes maneiras, (triste, alegre, imitando um robô, nenê
chorando) e cantar devagar como aquecimento, subindo de tom somente a
primeira frase, usando a manossolfa.
MANOSSOLFA
Figura 24 – Arquivo do Colégio UNASP
Após o relaxamento, respiração e aquecimento vocal, é possível
continuar a aula começando o aprendizado do repertório. Em primeiro lugar é
preciso falar a letra no ritmo e batendo palmas. Em seguida as crianças fecham
os olhos e escutam a melodia e letra de cada frase, abrindo os olhos para
repetir o que ouviram. Neste processo de repetição dos trechos por frases, as
crianças aprendem a música e decoram com mais rapidez.
Sadie apud Bréscia (2003, p. 50) afirma que crianças mentalmente
deficientes e autistas geralmente reagem à música, quando tudo o mais falhou.
A música é um veículo expressivo para o alívio da tensão emocional,
superando dificuldades de fala e de linguagem. A terapia musical foi dada para
melhorar a coordenação motora nos casos de paralisia cerebral e distrofia
muscular. Também é usada para ensinar o controle da respiração e da dicção
nos casos em que existe distúrbio da fala. Se a música pode trazer tantos
benefícios para a saúde física e mental, por que a escola não a utiliza mais?
Incluí-la no cotidiano escolar certamente trará benefícios tanto para professores
quanto para alunos. Os educadores encontram nela mais um recurso, e os
alunos se sentirão motivados, se desenvolvendo de forma lúdica e prazerosa.
131 Como foi comentado anteriormente, a música ajuda a equilibrar as
energias, desenvolve a criatividade, a memória, a concentração, autodisciplina,
socialização, além de contribuir para a higiene mental, reduzindo a ansiedade e
promovendo vínculos (BARRETO e SILVA, 2004). Ao atender diferentes
aspectos do desenvolvimento físico, mental, social, emocional e espiritual, a
música pode ser considerada um agente facilitador do processo educacional.
Nesse sentido, faz-se necessária a sensibilização dos educadores para
despertar a conscientização quanto às possibilidades da música para favorecer
o bem-estar e o crescimento das potencialidades dos alunos. Pois ela fala
diretamente ao corpo, à mente e às emoções.
A presença da música na educação auxilia a percepção, estimula a
memória e a inteligência, relacionando-se ainda com habilidades linguísticas e
lógico-matemáticas ao desenvolver procedimentos que ajudam o educando a
se reconhecer e a se orientar melhor no mundo. Além disso, a música também
vem sendo utilizada como fator de bem estar no trabalho e em diversas
atividades terapêuticas, como elemento auxiliar na manutenção e recuperação
da saúde. As atividades de música também favorecem a inclusão de crianças
portadoras de necessidades especiais. Pelo seu caráter lúdico e de livre
expressão, não apresentam pressões nem cobranças de resultados, são uma
forma de aliviar e relaxar a criança, auxiliando na desinibição, contribuindo para
o envolvimento social, despertando noções de respeito e consideração pelo
outro, e abrindo espaço para outras aprendizagens (BARRETO e SILVA,
2004).
Incluir é possível e desejável por muitas crianças e suas famílias. O
importante é a escola não ter medo de começar a buscar ajuda e cooperação
para construir uma prática pedagógica e social melhor. Devido a estes fatores
que desenvolvo este trabalho inclui também as crianças especiais. Eles
participam ativamente de todo o processo da aula, dos ensaios e das
apresentações.
132 APRESENTAÇÃO DO CORAL DE JARDIM AO 5º ANO
Figura 25 – Arquivo do Colégio UNASP
Diante destas colocações de parte da minha experiência coloco de
forma geral, breves sugestões para o ensino da música na escola regular.
Snyders (1994) afirma que a escola é um mundo feito para acolher a criança e
responder à sua necessidade de alegria. Isso nem sempre é evidente e fácil.
No entanto, é importante que professores e alunos mantenham vivo o objetivo
de conservar a alegria, o interesse, a curiosidade e a cumplicidade em cada um
dos momentos da aprendizagem.
O ensino da música dispõe de condições exemplares para difundir a
alegria cultural, e considerando que a mesma é um fator preponderante no
processo de ensino e aprendizagem, alguns fatores podem ser considerados
importantes para o sucesso do professor. Vou encerrar este capítulo
apresentando alguns itens que considero essenciais: a aula deve ser iniciada
com atividades simples e pequenas. Uma pequena canção, uma dança ou
atividade rítmica podem auxiliar o professor a organizar a sua sala de aula e
tornar o ambiente alegre e propício para outras atividades musicais ou não.
Realizar uma atividade que esteja ao alcance da criança pode aumentar a sua
133 auto-estima e ser um fator importante para a construção da confiança em si
mesma e na escola.
Repetir frequentemente cada atividade e apresentar um conceito de
diferentes maneiras e estilos poderá ampliar as chances de compreensão do
aluno. O silêncio deve ser valorizado sempre, e o professor deverá usar todos
os materiais trazidos para a classe, de forma a não criar expectativas e
frustrações para a criança. Ao desenvolver as atividades e jogos, as instruções
devem ser repetidas para uma melhor compreensão.
O professor deve utilizar de alguns recursos criativos para dinamizar e
alegrar mais a aula, como cantar em vez de falar, fazer gestos para se
comunicar, e usar dramatizações e expressões faciais, como por exemplo, usar
os comandos sonoros para pedir silêncio. A criança aprende melhor quando há
alegria envolvida no processo. A utilização de materiais variados de diferentes
texturas e coloridos podem ser manipulados. Desta forma facilitam o contato
com eles, envolvendo em alguns tipos de sensações.
Para um planejamento ser completo, deve ser incluído capacidades
específicas de cada um dos alunos, para que sejam encorajadas sua
independência e criatividade. O professor deve participar das atividades com
os alunos para que se criem vínculos afetivos, lembrando que com esta prática
está aprendendo junto com eles. No planejamento deve constar mais
atividades que o necessário, para poder ter uma flexibilidade nos conteúdos e
preferências dos alunos. Deve fazer parte também a dança, o canto e o
instrumento que são elementos que deveriam sempre estar presentes no
planejamento do professor.
É essencial que o professor sempre busque uma renovação de seu
repertório musical, aos métodos e materiais didáticos que têm disponíveis. É
importante lembrar que o contato com a música seja sempre renovado por
meio de um ensino criativo, dinâmico e atual. Finalmente é importante registrar
que as atividades musicais oferecem oportunidades raras de resgate do prazer
e da alegria na sala de aula, tanto para o grupo de alunos como para o
professor.
134 CONCLUSÃO
O ensino da música no Brasil passou por períodos de grande
empolgação, que foi interrompido por momentos de silêncio. Na medida em
que se aprofunda a reflexão sobre o ensino da música como prática escolar,
esses momentos tornam-se esclarecedores para o entendimento da função
atribuída à música como disciplina escolar. Nessa trajetória, marcada por
transformações culturais, sociais e políticas, o ensino da música refletiu a
influência de diversas concepções pedagógicas – das concepções tradicional,
progressista e, mais recentemente, da concepção interacionista.
Devido os meios científicos e acadêmicos terem o ensino da música
reconhecido, não é o que está sendo visto na realidade das escolas
atualmente. Em algumas poucas instituições há professor e carga horária
específica para música; em outras, só há o ensino da música na educação
infantil, mesmo assim como função recreativa. Tem escolas que a aula de
música se resume a formar e a ensaiar uma banda ou um coral, porém, tais
práticas envolvem apenas alguns alunos, deixando a maioria excluída. Sendo
assim, se visamos uma educação musical que atenda a todos os alunos, a
constituição de pequenos grupos, como o coral ou a banda, não atenderia ao
propósito de uma educação ampla e democrática.
Na maioria das vezes o que pode ser observado é que o espaço
reservado para a música está incluído no da Educação Artística, disciplina que
ainda tem as suas atenções voltadas para as artes plásticas ou cênicas,
deixando o professor de Educação Artística, a se tornar polivalente ou com
formação abrangente que por conta desta situação, não encontra meios para
desenvolver objetivos propriamente musicais.
São inúmeros os desafios para serem concretizados os ideais para a
educação musical nas escolas brasileiras, mas com a implantação da nova lei
é possível estimular as mudanças, buscando e divulgando novas práticas
pedagógicas, experiências de sucesso, saberes adquiridos em estudos
desenvolvidos no cotidiano escolar. O essencial, é que se façam investimentos
na educação brasileira, reconhecendo e valorizando os professores de
Educação Musical.
135 Estou convicta de que este trabalho me trouxe novas perspectivas sobre
a educação musical nas escolas, e de como deve ser a formação dos
professores nesta área. Acredito que sem mudanças nada se faz na vida, no
entanto é importante pensar sempre nas possibilidades fascinantes que nos
oferece cada recomeço. Por outro lado penso que muitas das atitudes
negativas por parte de professores/educadores, se devem não só a falta de
formação inicial e contínua, mas também as exigências que se impõe para que
a música apareça como meio de divulgação e entretenimento para a escola, e
não como educação como um todo.
Neste trabalho busco mostrar alguns aspectos sobre os espaços
escolares, pois tenho a preocupação de trazer à discussão a preparação dos
professores de música para atuarem neste contexto. De acordo com a nova lei
o Ensino de Música foi inserido no currículo da Educação Básica como
obrigatório, mas faz-se necessário formar um profissional dentro da perspectiva
atual de formação de professores.
De acordo com estas perspectivas, o professor deve ser um profissional
autônomo que reflete criticamente sobre a prática para compreender as
características dos processos de ensino aprendizagem em música, levando em
consideração o contexto, e deve saber dialogar com a “diversidade de
vivências musicais não escolares que a sociedade atual propicia” (ARROYO,
2000, p.78). Deve também ser um intelectual transformador, com compromisso
de provocar a formação da consciência dos indivíduos para uma educação
musical para todos, de uma maneira mais justa. Acredito que estando dentro
do contexto escolar o professor de música poderá atuar nesta perspectiva, no
que se refere a abranger um maior número de alunos.
Após a apresentação no capítulo 2 da educação musical escolar no
Brasil no contexto das legislações e reformas educativas, que mostrou
primeiramente a educação no Brasil conforme os Parâmetros Curriculares
Nacionais - PCN (BRASIL, 1998), e em seguida a história da educação musical
e as tendências das práticas pedagógicas, percebe-se que a educação musical
está diante de um desafio que, sem dúvida, apresenta-se como primordial para
uma prática efetiva e consistente do ensino de música. É preciso promover, de
modo mais amplo e democrático, uma educação musical de qualidade para a
escola de ensino fundamental. Concepções e práticas musicais adotadas
136 nessas escolas refletem, em sua maioria, o modelo conservador de ensino de
música. Ocorre que o pouco investimento na Licenciatura em Música e,
consequentemente, a prioridade depositada no Bacharelado, faz com que
bacharéis em música, por falta de opções no mercado de trabalho, tendam a
optar pelo magistério.
Esta prática acaba sendo desastrosa, uma vez que esses profissionais
não tiveram uma formação adequada em que tivesse ocorrido a reflexão e a
discussão das questões específicas do ensino da música. E estas dificuldades
que estão dentro da realidade escolar são por demais desafiadoras e, muitas
vezes, desestimulantes. Diante desta situação a tendência, na grande maioria,
é de adotar as concepções, modelos e práticas de sua própria formação, longe
das prioridades e necessidades da escola e de sua clientela.
Nesse contexto, o método tradicional torna-se para o professor seu
principal aliado no processo educacional, passando a ensinar conforme
aprendeu, priorizando e considerando apenas o seu próprio conhecimento e a
sua própria experiência musical, ignorando a música apreciada pelos jovens e
suas vivências. Trabalha com conteúdos fragmentados, desatualizados,
abstratos, deixando o ensino da música sem propósito e fora do desafio de
levar a educação musical de qualidade para a escola.
O fato é que se há música como disciplina escolar, pouco tempo é
reservado para a sua prática, a não ser como recreação ou como recurso
didático, dando suporte para a promoção de festas escolares ou para minimizar
as dificuldades no processo de ensino e de aprendizagem. Na maioria das
escolas onde há o ensino de música, os professores continuam reduzindo essa
disciplina à realização de atividades lúdicas, com aspectos agradáveis, em que
o produto final é mais importante do que o processo de aprendizagem que
busca, como objetivo, a aquisição de um novo conhecimento.
A música como atividade educativa, quando inserida no contexto
escolar, encontra ainda, uma série de limitações, tais como carência de
material músico-pedagógico, salas inadequadas, tempo disponível reduzido,
além de turmas numerosas e heterogêneas. Outro limite que se impõe à
educação musical escolar diz respeito à ausência de um método atrativo e
realista que, em concordância com o desenvolvimento integral do aluno, lhe
137 possibilite um aprendizado prazeroso, acessível e voltado para o seu
crescimento pessoal.
São raras as escolas que dispõem de um trabalho musical bem
orientado e metodologicamente estruturado, com possibilidades de garantir a
sua continuidade. O processo de ensino-aprendizagem requer constante
adequação e renovação de atividades e de materiais musicais pedagógicos,
conhecimento e disponibilização de recursos metodológicos que possam
promover as condições necessárias como forma de assegurar a apreensão do
conhecimento musical, o constante interesse do aluno podendo, assim,
devolver a alegria musical.
Contudo, é preciso dar à educação musical um caráter progressivo, que
deve acompanhar a criança ao longo de seu processo de desenvolvimento
escolar. É preciso ter consciência e clareza para introduzir o aluno no domínio
do conhecimento musical. Desacertos são cometidos no ensino da música em
decorrência do desconhecimento da natureza dos elementos fundamentais
como o som, o ritmo, a melodia, o ouvido musical, a harmonia e a inspiração no
momento do fazer musical. Para isso, é necessário considerar bases novas,
mais amplas, que nos possibilitem libertarmo-nos das ideias preconcebidas que
com o passar do tempo se incorporaram ao ensino de música. Não é
necessário rejeitar os valores tradicionais. O que importa é entender que existe
hoje uma diversidade de formas de pensar, de lidar e de gostar de música
revelada no cotidiano escolar que devem ser considerados na articulação e no
entrelaçamento da construção do conhecimento musical. Entendemos que é
preciso romper com os mecanismos que fazem com que a escola
simplesmente tome para si a postura de reafirmar a familiaridade musical dada
a alguns por seu meio sociocultural.
Se atualmente, são raras as escolas que se propõem a realizar um
trabalho bem orientado e metodologicamente estruturado para o ensino da
música, também é rara a presença do professor especializado para dispor-se a
um trabalho dinâmico e de qualidade. Esses parecem ser os maiores
obstáculos para a inclusão da música na escola de ensino fundamental do
país. Todavia, ainda precisamos fortalecer a prática docente dos profissionais
que já atuam no universo das escolas e, nesse sentido, a formação continuada,
138 pensada de forma abrangente, deve ser considerada com uma ação
fundamental.
É preciso, em nome do resgate da alegria escolar, tomarmos
consciência das verdadeiras carências pedagógicas no domínio do ensino
musical e projetar um plano estratégico, transparente e inovador, que tenha
objetivos claros e bem definidos que possam ser efetivados no cotidiano da
vida escolar. Se o verdadeiro objetivo é aproximar o aluno da música, levandoo a gostar de ouvi-la, apreciá-la e compreendê-la, é preciso, com urgência,
preencher o vazio musical no cotidiano escolar. Não podemos permitir que a
música se cale nas escolas brasileiras.
Acredito que este trabalho poderá contribuir para dar continuidade a
outros estudos mais específicos sobre a formação dos professores de música e
para uma sistematização da metodologia adequada para que as aulas de
música sejam vivenciadas na escola com alegria.
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