UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ INSTITUTO DE CIÊNCIAS DA SAÚDE PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊNCIAS FARMACÊUTICAS RECRISTALIZAÇÃO POR EFEITO ANTI-SOLVENTE DE UMA NOVA MOLÉCULA COM POTENCIAL EFEITO CARDIOTÔNICO UTILIZANDO O GLICOFUROL COMO SOLVENTE ANTONIO TAYLON AGUIAR GOMES BELÉM-PA 2014 UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ INSTITUTO DE CIÊNCIAS DA SAÚDE PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊNCIAS FARMACÊUTICAS RECRISTALIZAÇÃO POR EFEITO ANTI-SOLVENTE DE UMA NOVA MOLÉCULA COM POTENCIAL EFEITO CARDIOTÔNICO UTILIZANDO GLICOFUROL COMO SOLVENTE Autor: Antonio Taylon Aguiar Gomes Orientadora: Profª. Drª. Roseane Maria Ribeiro Costa Co-orientadora: Profª. Drª. Maria Inês Ré Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Ciências Farmacêuticas, área de concentração: Fármacos e Medicamentos, do Instituto de Ciências da Saúde da Universidade Federal do Pará como requisito para a obtenção do título de Mestre em Ciências Farmacêuticas. BELÉM-PA 2014 Dados Internacionais de Catalogação-na-Publicação (CIP) Biblioteca do Instituto de Ciências da Saúde – UFPA Gomes, Antonio Taylon Aguiar Recristalização por efeito anti-solvente de uma nova molécula com potencial efeito cardiotônico utilizando o glicofurol como solvente / Antonio Taylon Aguiar Gomes ; orientadora, Roseane Maria Ribeiro Costa ; co-orientadora, Maria Inês Ré. — 2014 Dissertação (Mestrado) - Programa de Pós- Graduação em Ciências Farmacêuticas – Universidade Federal do Pará, Instituto de Ciências da Saúde (ICS), Belém, 2014. 1. Química farmacêutica. 2. Cristalização. 3. Excipientes farmacêuticos. 4. Dissolução. 5. Tamanho da partícula. I. Título. CDD: 22..ed. : 615.19 FOLHA DE APROVAÇÃO Antonio Taylon Aguiar Gomes Recristalização por efeito anti-solvente de uma nova molécula com potencial efeito cardiotônico utilizando glicofurol como solvente Dissertação apresentada ao Programa de PósGraduação em Ciências Farmacêuticas do Instituto de Ciências da Saúde da Universidade Federal do Pará como requisito para a obtenção do título de Mestre em Ciências Farmacêuticas. Área de concentração: Fármacos e Medicamentos Aprovado em: 30/09/2014 Banca Examinadora Profª. Drª. Roseane Maria Ribeiro Costa Instituição: UFPA/PPGCF Assinatura: Profª. Drª. Jacqueline Resende de Azevedo Instituição: Ecole des Mines d’Albi-Carmaux, France Assinatura: Profª. Drª. Natália de Farias Silva Instituição: UFPA/PPGCF Assinatura: “Quem vive de orgulho morre de saudade” Da Silva, W. O. Resumo A baixa solubilidade em água de muitos fármacos representa um obstáculo para uma adequada biodisponibilidade oral. A redução das partículas de fármacos, entre outras técnicas, tem sido descrita como uma estratégia para contornar esse problema. A redução do tamanho de partícula pode conduzir a um significativo aumento na cinética de dissolução do fármaco, promovendo um aumento substancial na biodisponibilidade. Diante disso, o objetivo do trabalho é a recristalização de uma nova molécula com potencial efeito cardiotônico (identificada como molécula ‘A’), pelo método de cristalização por efeito anti-solvente, afim de reduzir o tamanho de partícula e aumentar a sua cinética de dissolução. Para evitar o uso de solventes orgânicos como os clorados, uma das metas do trabalho é de demonstrar a viabilidade do uso de glicofurol como solvente para a molécula A. A metodologia utilizada envolveu a determinação da solubilidade da molécula A em glicofurol e em mistura glicofurol e água usada como anti-solvente. Ensaios de recristalização foram realizados em misturas de glicofurol e água e o produto recristalizado foi analisado por espectroscopia na região do infravermelho, difração de raios-x, microscopia eletrônica de varredura e dissolução in vitro. Os resultados obtidos mostraram que a molécula recristalizada apresenta a mesma estrutura cristalina da molécula inicial e menor tamanho de partículas. No entanto, evidenciouse o problema de aglomeração das partículas que limitou a cinética de dissolução. Palavras-chaves: Recristalização por efeito anti-solvente, Glicofurol, Redução de tamanho de partículas, Dissolução. Abstract The poor solubility of many drugs in water is an obstacle to an adequate oral bioavailability. The micronization of drugs, among other techniques, has been described as a strategy to solve this problem. The particle size reduction can lead to a significant increase in the dissolution kinetics of a drug, causing a substantial increase in bioavailability. Thus, the aim of this work is the recrystallization of a new molecule with potential cardiotonic effect (identified here as molecule 'A'), by the method of crystallization by anti-solvent, in order to reduce the particle size and increase its dissolution kinetics. To avoid the use of organic solvents such as chlorinated, one of the targets of this study is to demonstrate the feasibility of using glycofurol as a solvent for molecule A. The methodology involved the determination of the solubility of molecule `A` in glycofurol and in the mixture of glycofurol and water (used as anti-solvent). Recrystallization assays were performed in mixtures of water and glycofurol and the recrystallized product was analyzed by infrared spectroscopy, x-ray diffraction, scanning electron microscopy and in vitro dissolution. The results showed that the recrystallized molecule has the same crystal structure of the original molecule and smaller particle size. However, a problem of agglomeration of smaller particles was observed which limited the dissolution kinetics. Keywords: Dissolution. Anti-solvent recrystallization, Glycofurol, Particle size reduction, Lista de ilustrações Figura 1 - Esquema de representação da cela unitária de cristais ............................ 18 Figura 2 - Processo de liberação do fármaco da forma farmacêutica sólida, adaptado de Brown et al. (2004) ............................................................................................... 22 Figura 3 - Cálculo da eficácia de dissolução (COSTA, 2002). .................................. 25 Figura 4 - Esquema do processo de formação de partículas adaptado de Thorat e Dalvi (2012) ............................................................................................................... 30 Figura 5 - Formula molecular do glicofurol. ............................................................... 34 Figura 6 - Esquema básico do funcionamento de um equipamento de CLAE: a reservatório de fase móvel; b - bomba de alta pressão; c - válvula de injeção da amostra; d - fase estacionária (coluna); e - detector; f – registrador ......................... 40 Figura 7 - Espectro de infravermelho da molécula A ................................................. 48 Figura 8 - Forma estrutural da molécula A. ............................................................... 49 Figura 9 - TG e DTA da molécula A .......................................................................... 49 Figura 10 - Microscopia eletrônica de varredura da molécula A em diferentes magnitudes A (121x), B(316x), C(450x), D(1270x). .................................................. 50 Figura 11 - Curva de calibração correlacionado a Área dos picos com a concentração ............................................................................................................. 52 Figura 12 - Cromatogramas do Lauril sulfato de sódio 0,5% (verde), glicofurol a 0,1% (vermelho) e molécula A a 2 µg/mL (azul)................................................................. 52 Figura 13 - Microscopia optica do recristalizado de molécula com água utilizando glicofurol como solvente ............................................................................................ 57 Figura 14 - Gráfico da solubilidade de molécula A em diferentes misturas de glicofurol/água. .......................................................................................................... 58 Figura 15 - Espectros de infravermelho da molécula A (preto) e de seus recristalizados na proporção de 2-1 (vermelho), 1-1 (azul) e 1-2 (rosa) .................... 59 Figura 16 - Difração de raios-x da molécula A (preto) e de seus recristalizado na proporção de 2-1 (vermelho), 1-1 (azul) e 1-2 (rosa) ................................................ 60 Figura 17 - Microscopia eletrônica de varredura do recristalizado na proporção 2-1 nas seguintes magnitudes: A(100x), B(2080x), C (12450x), D (13960x) .................. 61 Figura 18 - Microscopia eletrônica de varredura do recristalizado na proporção 1-1 nas seguintes magnitudes: A(80x), B(3360x), C (1300x), D (10170x) ...................... 61 Figura 19 - Microscopia eletrônica de varredura do recristalizado na proporção 1:2 nas seguintes magnitudes: A(196x), B(621x), C (3870x), D (10710x) ...................... 62 Figura 20 - Microscopia eletrônica de varredura da molécula A original (A) e recristalizada na proporção de 1-1 (B) na magnitude de 1270x. ............................... 62 Figura 21 - Perfil de dissolução da molécula A (vermelho) e de seu recristalizado (azul) usando como meio água ................................................................................. 64 Figura 22 - Perfil de dissolução da Molécula A (azul) e de seu recristalizado (vermelho) usando como meio LSS 0,5%. ................................................................ 65 Figura 23 - Molécula A em LSS 0,5% no modelo Peppas F=k*t^n ............................ 67 Figura 24 - Recristalizado em água no modelo Peppas F=k*t^n ............................... 67 Figura 25 - Recristalizado em LSS 0,5% no modelo Peppas F=k*t^n ....................... 68 Lista de tabelas Tabela 1 - Sistemas cristalinos e a relação de vetores e ângulos ............................. 18 Tabela 2 - Classificação da solubilidade (PORTUGAL, 2002) .................................. 20 Tabela 3 - Sistema de Classificação Biofarmacêutica ............................................... 29 Tabela 4 - Fármacos recristalizados por processo de cristalização por efeito antisolvente usando solventes orgânicos ........................................................................ 33 Tabela 5 - Preparo das soluções para a curva de calibração ................................... 41 Tabela 6 - Preparação das soluções em diferentes proporções de glicofurol/água .. 44 Tabela 7 - Proporção de solução saturada e água para a recristalização. ................ 46 Tabela 8 - Curvas de calibração preparadas em 3 dias diferentes. .......................... 51 Tabela 9 - Repetibilidade do padrão de concetração de 2 µg/mL ............................. 53 Tabela 10 - Resultado da precisão intermediaria ...................................................... 54 Tabela 11 - Dados da recuperação do método ......................................................... 54 Tabela 12 - Adição de molécula A em glicofurol. ...................................................... 55 Tabela 13 - Solubilidade da molécula A em misturas de glicofurol e água. .............. 56 Tabela 14 - Quantificação da molécula A em diferentes meios saturados ................ 56 Tabela 15 - Cálculo do rendimento da produção de cristais ..................................... 58 Tabela 16 - Perfil de dissolução da molécula A em água e em LSS 0,5% ................ 63 Tabela 17 - Cálculo da eficácia de dissolução .......................................................... 66 Tabela 18 - Cálculo dos r² de alguns modelos matemáticos ..................................... 66 Lista de abreviaturas e siglas As CLAE Cs Área Superficial do Fármaco Cromatografia Líquida de Alta Eficiência Solubilidade máxima no meio de dissolução Ct CV% D dC/dt DL50 DP DRX DTA ED% f1 f2 FT-IR H IC k Kdd Concentração do fármaco no tempo t Coeficiente de variação Coeficiente de difusão Taxa de Dissolução Dose Letal para 50% dos indivíduos Desvio padrão Difração de Raio-X Análise térmica diferencial Eficácia de dissolução Fator de diferença Fator de similaridade Infravermelho com transformadas de Fourier Espessura da camada de difusão Inclinação da reta Coeficiente de dissolução ou transferência de massa Velocidade de desintegração da formulação Kdi LD LQ LSS MEV PBS PEG pH R Rdt rpm SCB SM T TG V Velocidade de dissolução intrínseca do fármaco Limite de detecção Limite de quantificação Lauril sulfato de sódio Microscopia Eletrônica de Varredura Fosfato de Sódio Monobásico Polietileno glicol Potencial hidrogeniônico Recuperação Rendimento Rotação por minuto Sistema de classificação biofarmacêutica Solução mãe Tempo Termogravimetria Volume do meio de dissolução Lista de símbolos e unidades °C µg µm Au Br Cu g K Kg KV mA mg mL mm mv/s nm Graus célsius Micrograma Micrometros Ouro Bromo Cobre Grama Potássio Quilograma Quilovolts Miliampere Miligrama Mililitros Milímetros Milivolts por segundo Nanômetros SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO .......................................................................................... 15 2 REFERENCIAL TEÓRICO........................................................................ 17 2.1 Propriedades físico-químicas do fármaco .................................................... 17 Estrutura cristalina ........................................................................ 17 Tamanho da partícula................................................................... 19 Solubilidade .................................................................................. 19 Dissolução .................................................................................... 21 Ensaios de dissolução .................................................................. 23 2.2 Técnicas para melhorar a biodisponibilidade ............................................... 29 Sistema de classificação biofarmacêutica. ................................... 29 Cristalização por efeito anti-solvente ............................................ 30 Escolha do solvente e anti-solvente ............................................. 32 Glicofurol ...................................................................................... 33 3 OBJETIVOS .............................................................................................. 36 3.1 Objetivo Geral: ............................................................................................. 36 3.2 Objetivos Específicos: .................................................................................. 36 4 MATERIAL E MÉTODOS.......................................................................... 37 4.1 Caracterização da molécula A ..................................................................... 37 Espectroscopia na região do infravermelho com transformadas de Fourier (FT-IR) ................................................................................................... 37 Análise Térmica ............................................................................ 37 Microscopia eletrônica de varredura ............................................ 38 Difração de raios-X ....................................................................... 39 4.2 Estudo da solubilidade ................................................................................. 39 Validação de um método de quantificação da molécula A em solução por cromatografia liquida de alta eficiência (CLAE) .............................. 39 Solubilidade aparente da molécula A em glicofurol e em misturas de glicofurol/água ............................................................................................... 44 Solubilidade “real” da molécula A em glicofurol e em misturas de glicofurol/água .................................................................................................... 45 4.3 Preparação de cristais através da preciptação por anti-solvente ................. 45 Ensaio preliminar de cristalização ................................................ 45 Preparação dos cristais ................................................................ 45 Determinação da melhor proporção água/glicofurol para a recristalização da molécula A............................................................................. 46 4.4 Caracterização do produto recristalizado ..................................................... 47 Perfil de dissolução ...................................................................... 47 5 RESULTADOS E DISCUSSÃO ................................................................ 48 5.1 Caracterização da molécula A ..................................................................... 48 Espectrometria de infravermelho com transformadas de fourier (FT-IR) 48 Análise térmica ............................................................................. 49 Microscopia eletrônica de varredura ............................................ 50 5.2 Estudo da solubilidade ................................................................................. 51 Validação do mÉtodo de quantificação da molÉcula A por CLAE 51 Solubilidade aparente ................................................................... 55 Solubilidade real da molécula A em misturas de glicofurol/água.. 56 5.3 Preparação de cristais através da cristalização da molécula A em mistura glicofurol/água ....................................................................................................... 57 Ensaio de cristalização ................................................................. 57 Determinação da melhor proporção glicofurol/água para a recristalização da molécula A............................................................................. 58 5.4 Caracterização da molécula A e de seus recristalizados ............................. 59 Infravermelho com Tranformada de Fourier ................................. 59 Difração de Raio-X ....................................................................... 60 Microscopia Eletrônica de Varredura ........................................... 60 Dissolução .................................................................................... 63 6 CONCLUSÃO ........................................................................................... 69 7 PERSPECTIVAS E SUGESTÃO DE CONTINUIDADE ............................ 70 8 REFERÊNCIAS ........................................................................................ 71 15 1 INTRODUÇÃO A molécula A, um fármaco em desenvolvimento industrial, é um derivado Nacilidrazônico com um potente efeito cardiotônico. Este novo fármaco tem a capacidade de contrair o músculo cardíaco e promover vasodilatação através de um mecanismo diferente dos glicosídeos cardíacos. Isso torna esse fármaco interessante, por que os glicosídeos apresentam muitos efeitos que podem causar arritmia e possuem baixo índice terapêutico (AZEVEDO, 2014a; BARREIRO, 2002). Esse novo fármaco, assim como 70% dos medicamentos em desenvolvimento, apresenta uma baixa solubilidade em meio aquoso. Essa propriedade causa uma dissolução lenta que compromete a biodisponibilidade da molécula (MOU et al., 2011). Para contornar este tipo de problema, diferentes rotas tecnológicas têm sido desenvolvidas para alterar a solubilidade e/ou a cinética de dissolução destes fármacos tais como complexação, alteração da composição do solvente, modificações químicas ou físicas (KAWABATA et al., 2011). Uma das modificações físicas para o aumento da cinética de dissolução é a redução do tamanho das partículas do fármaco (JINNO et al., 2006). Essa transformação pode ser obtida por processos do tipo “top-down” (fragmentação de partículas maiores até o tamanho desejado) ou do tipo “bottom-up” (formação de cristais a partir de moléculas associadas via cristalização ou precipitação). Processos do tipo “bottom-up” consomem menos energia e permitem, através do controle do processo de formação do sólido, melhor manipular a morfologia e a dispersão de tamanho do mesmo. Daí a importância de explorar esta rota para a redução do tamanho das partículas (VERMA; GOKHALE; BURGESS, 2009). Dentre as técnicas do tipo “bottom-up” a recristalização por efeito antisolvente é uma técnica de fácil aplicação e apresenta bons resultados (THORAT; DALVI, 2012). Ela baseia-se na adição de um solvente em que o fármaco é insolúvel (geralmente água, no caso de fármacos com baixa solubilidade) a uma solução onde o fármaco encontra-se dissolvido em um bom solvente para o mesmo. A incorporação de um anti-solvente à solução contendo o fármaco dissolvido em um solvente mais adequado reduz a solubilidade do fármaco na mistura 16 resultante solvente/anti-solvente. Ao ser atingida a saturação inicia-se a formação de pequenos núcleos (nucleação) seguida do crescimento destes núcleos (cristais). Uma vez formados, estes cristais podem mudar de tamanho por aglomeração ou quebra. A formação dos cristais por cristalização por efeito anti-solvente requer a identificação de um solvente para o fármaco em questão, assim como o conhecimento de sua solubilidade neste solvente e a variação da solubilidade na mistura de solvente com o anti-solvente. O controle das características do sólido gerado depende do controle da velocidade de nucleação do sistema, da cinética de crescimento e de aglomeração dos cristais formados (ROSSMANN et al., 2012). Os principais desafios do ponto de vista tecnológico para o desenvolvimento de um produto de interesse farmacêutico através de um processo de cristalização por efeito anti-solvente são: O controle da forma sólida formada (amorfa x cristalina); O controle da cinética de nucleação para formação dos cristais; O entendimento e o controle da cinética de crescimento e aglomeração para controle do tamanho final destes cristais; Controle da aglomeração dos cristais em suspensão e controle da estabilidade física destes sistemas (no caso de nanosuspensões). O solvente escolhido para a solubilização do molécula A foi o glicofurol que é um solvente atóxico e cujo potencial em solubilizar outras moléculas de baixa solubilidade em água tem sido demonstrada (ALLHENN; LAMPRECHT, 2011; AUBERT-POUËSSEL et al., 2004; BOONGIRD et al., 2011; BURY et al., 1984; VIEHOF et al., 2013). Com base neste estado da arte, avaliou-se neste trabalho, a capacidade do glicofurol em solubilizar a molécula A e de seu uso como solvente para uma recristalização da molécula em presença de água como anti-solvente. 17 2 2.1 REFERENCIAL TEÓRICO Propriedades físico-químicas do fármaco Toda substância tem um conjunto de propriedades que as caracteriza. As propriedades químicas são aquelas observadas quando a substância sofre uma alteração e converte-se em uma ou mais substâncias. As propriedades físicas são as propriedades que podem ser medidas sem alterar a identidade química da substância. Como exemplo dessas propriedades tem-se a densidade, ponto de fusão, solubilidade e a cor (MASTERTON; SLOWINSKI; STANITSKI, 1990). Essas propriedades são importantes para o desenvolvimento de um medicamento, pois elas podem afetar tanto a formulação do produto como o seu comportamento no organismo (ATTWOOD; FLORENCE, 2003). O tamanho das partículas, a existência de polimorfos e a higroscopicidade são exemplos de características do fármaco que podem alterar a absorção do medicamento (STORPIRTIS; MARCOLONGO, 2004). Diante disso, faz-se necessário realizar o estudo de pré-formulação durante a concepção de um novo medicamento. O estudo de pré-formulação consiste nessa etapa de pesquisa das propriedades físico-químicas de um fármaco isolado ou composto e sua compatibilidade com excipientes (ALVES-SILVA; SÁ-BARRETO, 2014; DURIG; FASSIHI, 1991). As principais áreas a serem investigadas na pré-fomulação de um fármaco sólido é a caracterização do sólido (como pesquisa de polimorfos), análise da solubilidade e a análise da estabilidade (LACHMAN; LIEBERMAN; KANIG, 2001). ESTRUTURA CRISTALINA Um fármaco pode existir em diferentes formas cristalinas. Esta habilidade do sólido é chamada polimorfismo (ARAUJO; JR, 2012). Além de diferentes polimorfos, o fármaco pode apresentar-se como amorfo (não apresenta nenhuma estrutura cristalina definida) ou como solvatos (quando apresenta solventes adsorvidos em sua estrutura). Quando o solvente adsorvido é a água esse solvatos comumente são chamados de hidratos (RAW et al., 2004). Diferentes polimorfos da mesma 18 substância podem apresentar diferentes características física e químicas e isso pode alterar a tanto a estabilidade do fármaco como a sua biodisponibilidade (XIE et al., 2008). Em geral, a forma amorfa do fármaco é mais solúvel facilitando a biodisponibilidade, porém é menos estável que a forma cristalina dificultando a armazenagem do fármaco (GUO; SHALAEV; SMITH, 2013). Dessa maneira o conhecimento das formas cristalinas é uma ferramenta muito importante para o estudo da pré-formulação. Quando na forma de cristais as moléculas do fármaco se agrupam de maneira organizada, onde a menor célula de organização é chamada de cela unitária (Figura 1) e é definida pelos vetores de translacionais a, b e c e os ângulos α,β e ɣ formando sete sistemas cristalinos (Tabela 1): cúbico, tetragonal, ortorrômbico, romboédrico ou trigonal, hexagonal, monoclínico e triclínico (ARAUJO; JR, 2012). Figura 1 - Esquema de representação da cela unitária de cristais Tabela 1 - Sistemas cristalinos e a relação de vetores e ângulos Sistema Vetores Cubico a=b=c Tetragonal a=b≠c Ortorrômbico a≠b≠c Romboédrico a=b=c Hexagonal a=b≠c Monoclínico a≠b≠c Triclínico a≠b≠c Ângulos α=β=ɣ=90° α=β=ɣ=90° α=β=ɣ=90° α=β=ɣ≠90° α=β=90° e ɣ=120° α=ɣ=90°≠β α≠β≠ɣ≠90° 19 As principais técnicas para o estudo do polimorfismo de um fármaco são a difração de raios-X, termogravimetria, calorimetria exploratória diferencial, espectroscopia Raman e na região do infravermelho e microscopia polarizada (ZHANG et al., 2004). TAMANHO DA PARTÍCULA O tamanho da partícula influencia inversamente a dissolução do medicamento, ou seja, quanto menor o tamanho da partícula maior será a dissolução. Isso ocorre por que quanto menor o tamanho da partícula maior será a superfície de contato do medicamento para interagir com o meio. Em certos casos a redução de fármacos lipossolúveis pode diminuir a dissolução por formar agregados (BRANDÃO, 2003). A estabilidade do fármaco também é alterada quando se diminui o tamanho das partículas pois ele fica mais reativo, podendo alterar a aparência do medicamento e a uniformidade (MINÉ; MORAIS, 2013). SOLUBILIDADE A solubilidade é um parâmetro termodinâmico que representa a concentração da solução de uma substância em equilíbrio com o soluto a uma dada temperatura. Pode ser determinada através da adição de um excesso de fármaco ao meio, sob agitação até que o equilíbrio seja atingido, seguido de filtração e quantificação do fármaco dissolvido. A solubilidade pode ser afetada pela natureza do solvente, do soluto e da temperatura. É o fator que mais afeta a velocidade de dissolução (VIÇOSA et al., 2012). As farmacopeias brasileira (BRASIL, 2010a), portuguesa (PORTUGAL, 2002) e britânica (PHARMACOPOEIA, 2009) classificam a solubilidade das substâncias em muito solúvel, facilmente solúvel, solúvel, ligeiramente solúvel, pouco solúvel, muito pouco solúvel e praticamente insolúvel através do número de partes (quantidade de mililitros) necessário para solubilizar 1g da substância. A Tabela 2 20 mostra a classificação da solubilidade segundo a farmacopeia portuguesa (PORTUGAL, 2002). Tabela 2 - Classificação da solubilidade (PORTUGAL, 2002) Descrição Quantidade de solvente em mililitros para 1 grama da substância Muito solúvel menos de 1 Facilmente solúvel De 1 a 10 Solúvel De 10 a 30 Ligeiramente solúvel De 30 a 100 Pouco solúvel De 100 a 1000 Muito pouco solúvel De 1000 a 10000 mais de 10000 Praticamente insolúvel Um dos primeiros fatores a serem estudados durante o desenvolvimento de um novo fármaco é a solubilidade (MOTA et al., 2011). No organismo ela pode variar em função de parâmetros fisiológicos, como o pH do trato gastrintestinal (SHARGEL; YU, 1999). A solubilidade de um fármaco é um critério chave nos estudos de préformulação, ou seja, na etapa de investigação na qual se identificam as propriedades físicas e químicas de fármacos e excipientes que podem influenciar a formulação, a forma farmacêutica, o processo produtivo e as propriedades farmacocinéticas do medicamento. Há duas décadas atrás, os fármacos insolúveis em água eram rejeitados devido à falta de técnicas para a sua formulação. Entretanto, cerca de 70% dos novos fármacos são insolúveis em água (KAWABATA et al., 2011). Atualmente a farmacotécnica obteve avanços importantes na preparação de medicamentos possibilitando a formulação desses fármacos insolúveis, necessitando apenas que esses estejam solubilizados em um solvente orgânico (LIU, 2008). 21 Para a solubilização de fármacos com baixa solubilidade em água existem algumas tecnologias como: micronização, formação de nanocristal por moinho de bola ou tecnologia de gás denso, solução sólida (incorporada em polímeros), soluções lipídicas, emulsões e sistema de surfactante e co-solvente (POUTON, 2006). DISSOLUÇÃO Em sistemas biológicos, a dissolução de medicamentos pode ser definida como o processo pelo qual um fármaco é liberado de sua forma farmacêutica, tornando-se disponível para ser absorvido pelo organismo (MISRA et al., 2012). A dissolução dependerá das propriedades do fármaco (ex: pKa, solubilidade, tamanho das partículas) e das propriedades do trato gastrointestinal (ex: volume e pH dos fluidos, taxa de fluxo, taxa de cisalhamento)(MUDIE; AMIDON; AMIDON, 2010). Nas formas farmacêuticas sólidas, o medicamento tem que se solubilizar e atravessar várias barreiras do organismo para chegar ao seu sítio de ação. Assim, o estudo da dissolução do fármaco é de fundamental importância para se entender como será seu comportamento no organismo (SIEPMANN; SIEPMANN, 2013). Os processos relacionados à liberação do fármaco de formas farmacêuticas sólidas estão relacionados na Figura 2, como proposto na literatura (BROWN et al., 2004), onde Kdd representa a velocidade de desintegração da formulação e Kdi a velocidade de dissolução intrínseca do fármaco. 22 Farmaco na formulação Kdi Kdd Farmaco em particulas Farmaco na solução Figura 2 - Processo de liberação do fármaco da forma farmacêutica sólida, adaptado de Brown et al. (2004) Constata-se que quando Kdd é maior que Kdi, a dissolução é controlada pela dissolução intrínseca dos ativos, sendo suas propriedades físico-químicas consideradas importantes. Já quando Kdd é menor que Kdi, a dissolução é controlada pela desintegração, sendo esta influenciada pelas propriedades coesivas da formulação (BROWN et al., 2004). A absorção sistêmica geralmente é limitada para fármacos com baixa solubilidade em água que se dissolvem a partir da forma farmacêutica, intacta ou desintegrada, no trato gastrintestinal. Para estes fármacos, a etapa de dissolução atua como um limitante que determina, consequentemente, a velocidade de absorção e a quantidade absorvida, o que se traduz em valores incorretos de absorção (WONG; KELLAWAY; MURDAN, 2006). Um dos desafios mais relevantes na rotina de desenvolvimento de formulações de liberação imediata contendo fármacos pouco solúveis concentra-se no controle da velocidade de dissolução e liberação do ativo disponível. 23 ENSAIOS DE DISSOLUÇÃO Os testes in vitro são de fundamental importância para se predizer o que ocorrerá com o fármaco nos testes in vivo (KOVAČIČ et al., 2014). Cada fármaco e cada uma das suas formas farmacêuticas apresentam um tipo de teste de dissolução utilizando um determinado aparato e uma especifica quantidade de meio (USP, 2006). Um aparelho de dissolução apresenta três partes: as cubas (um cilindro aberto com fundo hemisférico); as hastes de aço inoxidável (que, em geral, pode ser no formato de uma cesta ou de uma pá); e um motor (promotor da rotação das hastes). Para o teste utiliza-se um meio de dissolução e que é determinado de acordo com o material a ser analisado, a temperatura deve ser de 37°C ± 0,5°C. A velocidade de rotação das hastes, a quantidade de amostra de respeitar a condição “sink” (até 20% da concentração de saturação) e o tempo da dissolução é especifico para cada fármaco (BRASIL, 2010a) (MANADAS; PINA; VEIGA, 2002). 2.1.5.1 Teoria da dissolução de fármacos Em 1897, Noyes e Whitney estabeleceram uma Equação (1), com base na segunda lei de difusão de Fick, relacionando a velocidade de dissolução com a solubilidade máxima do soluto (ou constante de saturação) e a concentração ao tempo t (MANADAS; PINA; VEIGA, 2002): (1) Onde, dC/dt é a taxa de dissolução, K o coeficiente de dissolução ou de transferência de massa, Cs a solubilidade máxima no meio de dissolução, Ct a concentração do fármaco na solução no tempo t; e (Cs – Ct) o gradiente de concentração. Em 1904, Nernst e Brunner modificaram a equação de Noyes e Whitney formando a Equação (2), tendo incluído como parâmetros influentes no processo o 24 coeficiente de difusão (D), a área superficial do fármaco (As), a espessura da camada de difusão (h) e o volume do meio de dissolução (V) (MANADAS; PINA; VEIGA, 2002): (2) A Equação 2 demonstra que a dissolução é influenciada pelas características físico-químicas da substância ativa, pelo solvente e pela formulação, englobando a natureza dos excipientes e o processo produtivo. Contudo, em relação à disponibilidade do fármaco no organismo, particularmente do trato gastrintestinal, fatores como a permeabilidade através da membrana do epitélio e o coeficiente de partição também irão afetar a capacidade do fármaco em ser absorvido (SHARGEL; YU, 1999). Para aumentar a velocidade de dissolução a partir da equação de Nernst e Brunner as principais rotas possíveis são o aumento de As pela redução do tamanho de partículas do fármaco. Um aumento na área As aumenta a velocidade de dissolução. 2.1.5.2 Modelos cinéticos Existem 3 tipos de testes de dissolução: ensaio de dissolução de um único ponto, ensaio de dissolução de 2 pontos e perfil de dissolução. O perfil de dissolução é o teste mais completo pois fornece a porcentagem do fármaco dissolvido em diferentes pontos da dissolução (CHORILLI; SOUZA, 2010). Para a avaliação do perfil de dissolução podem ser utilizadas 3 tipos de analises: método baseado na análise de variância, método modelo independente e método modelo dependente (SERRA; STORPIRTIS, 2007). Método análise de variância O método de análise de variância utiliza os dados na sua forma nativa, não necessitando a plotagem de gráficos. Após a aplicação do teste estatístico ANOVA frequentemente faz-se um pós-teste para esclarecer quais grupos diferem, já que a ANOVA não faz essa distinção. Os teste estatísticos mais comuns utilizados no pós- 25 testes são: Turkey, Bonferroni, Newman-Keuls e Dunnet (RODRIGUES; SILVA, 2005). Modelos independentes Eficácia de dissolução (ED%) A eficácia de dissolução é um cálculo que mostra quanto do fármaco foi solubilizado na solução através da área que ele forma no gráfico do perfil de dissolução. Esse cálculo (Figura 3) não esclarece o comportamento da dissolução do fármaco, mas evidência sua performance em comparação a outro perfil de dissolução (COSTA, 2002). Figura 3 - Cálculo da eficácia de dissolução (COSTA, 2002). Fator de diferença (f1) e fator de similaridade (f2) O fator de diferença e o fator de similaridade são usados para comparação entre perfis de dissolução. Utilizando a equação do fator de diferença pode-se dizer que os perfis de dissolução são iguais quando estão próximos a 0 e são aceitáveis valores que variam de 0 a 15. Para o fator de similaridade afirma-se que os perfis de dissolução são iguais quando próximo a 100 e são aceitáveis valores que variam de 50 a 100 (COSTA, 2002, 2001; COSTA; SOUSA LOBO, 2001). Para o cálculo do f1 utiliza-se a Equação (3) e para o cálculo do f2 a Equação (4). 26 (3) (4) Onde, Rj= quantidade de molécula A dissolvida no tempo J Tj= quantidade de recristalizado dissolvido no tempo j N= número de recolhas Modelos dependentes (mecanismo de liberação) O comportamento cinético da dissolução dos fármacos pode ser determinado através de equações matemáticas. A escolha do modelo cinético pode ser feita utilizando a correlação de Pearson (r2), ou seja, o modelo que mais se adequa aquela curva é aquele em que os pontos estão mais próximos aos da equação, assim quanto mais próximo de 1 for o r2 maior será a adequação do perfil de dissolução a aquele modelo cinético proposto (SCHESHOWITSCH; PEREIRA, 2007). Primeira ordem Este modelo descreve medicamentos que liberam fármacos de forma proporcional a quantidade que está em seu interior, de modo que ao passar do tempo a quantidade de liberação vai diminuindo. Fármacos hidrossolúveis em matrizes porosas é um exemplo de medicamento que se comporta nesse modelo (MANADAS; PINA; VEIGA, 2002). (5) 27 A Equação 5 descreve modelo cinético de primeira ordem onde, Qt é a quantidade de fármaco dissolvida no tempo t, Q 0 é a quantidade do fármaco inicial na solução. Higuchi O modelo de Higuchi foi desenvolvido para descrever fármacos solúveis e pouco solúveis incorporados em matrizes solidas e/ou semissólidas. Este modelo tem sido muito utilizado para descrever fármacos de liberação controlada (COSTA, 2002; PAUL, 2011). (6) Equação 6, onde KH é a constante de Higuchi baseada na lei de Fick (MANADAS; PINA; VEIGA, 2002). Hixon e Crowell A equação de Hixon e Crowell é baseada na premissa de que a superfície do fármaco é proporcional a raiz cúbica do seu volume. A diminuição da superfície de contato ocorre de forma proporcional a que o fármaco vai se solubilizando e assim vai mantendo sua geometria até completa solubilização. Medicamentos que estão ligados a esse modelo tem sua velocidade de liberação do fármaco limitada pela velocidade de dissolução do fármaco (SINGHVI; SINGH, 2011). (7) Equação 7, onde Q0 é a quantidade de fármaco no medicamento, Q t é a quantidade de fármaco presente no medicamento no tempo t e K hc é a constante de Hixon e Crowell. 28 Peppas Este modelo é utilizado para descrever liberação de medicamentos sob a forma farmacêutica poliméricas, quando o mecanismo de liberação não é conhecido ou existe mais de um mecanismo envolvido na liberação do fármaco (COSTA, 2002). (8) Equação 8, onde a é uma constante que leva em consideração as características estruturais e geométricas da forma farmacêutica, n é o expoente de liberação determinado pelo mecanismo de liberação (MANADAS; PINA; VEIGA, 2002). Baker e Lonsdale Com base na equação do modelo de Higuchi foi desenvolvida essa equação que descreve fármacos de liberação controlada na forma de matriz esférica (COSTA; SOUSA LOBO, 2001). A equação de Baker e Lonsdale (Equação 9) onde, Mt é a quantidade de fármaco no medicamento no tempo t, M∞ é a quantidade de fármaco no medicamento no tempo infinito, Dm é o coeficiente de dissolução, Cms é a solubilidade do fármaco na matriz, r0 é o raio da esfera da matriz e C0 é a concentração inicial do fármaco na matriz. (9) 29 2.2 Técnicas para melhorar a biodisponibilidade SISTEMA DE CLASSIFICAÇÃO BIOFARMACÊUTICA. O sistema de classificação biofarmacêutica (SCB) introduzido por Amidon et al. (1995) permite predizer a absorção dos fármacos segundo a sua solubilidade em meio aquoso e permeabilidade biológica. Segundo os critérios adotados, um fármaco pode ser classificado de acordo com a Tabela 3: Tabela 3 - Sistema de Classificação Biofarmacêutica Classe 1 Classe 2 Classe 3 Classe 4 Solubilidade Alta Baixa Alta Baixa Permeabilidade Alta Alta Baixa Baixa A classificação SCB é de extrema importância, uma vez que mais de 80% do mercado farmacêutico mundial é representado por formulações administradas por via oral, sendo ainda a exigência de uma biodisponibilidade adequada, pré-requisito legal em quase todo o mundo, inclusive no Brasil (BRASIL, 2010b). Os fármacos da classe 1 tem uma boa biodisponibilidade via oral. Os fármacos da classe 3 e 4, devido à baixa permeabilidade, geralmente sofrem uma modificação química em suas estruturas para melhorar a sua biodisponibilidade (POUTON, 2006). Os da classe 2 são fármacos que precisam melhorar a sua solubilidade. Nesse último caso, diferentes técnicas têm sido aplicadas para contornar esse problema, dentre elas (KAWABATA et al., 2011): Modificações nos cristais Diminuição do tamanho da partícula Amorfização Complexação com ciclodextrina Auto-emulsificação Modificações no pH 30 A equação de Noyes-Whitney mostra que quanto maior a superfície de contato maior será a razão de dissolução do fármaco. Assim, através da diminuição do tamanho da partícula, pode-se aumentar a dissolução do fármaco por causa do aumento da área de superfície de contato. Uma das técnicas para diminuir o tamanho das partículas é a cristalização por anti-solvente (JINNO et al., 2006). CRISTALIZAÇÃO POR EFEITO ANTI-SOLVENTE A cristalização por efeito anti-solvente baseia-se na mudança da supersaturação causada pela mistura da solução com um anti-solvente. Ela ocorre através das etapas: mistura da solução com o anti-solvente, produção da supersaturação, formação de núcleos cristalinos e crescimento a partir dos núcleos formados e, em alguns casos, aglomeração (Figura 4). Figura 4 - Esquema do processo de formação de partículas adaptado de Thorat e Dalvi (2012) A supersaturação é definida como a força matriz da cristalização que depende da concentração de saturação (Cs) e da concentração do fármaco na solução (Ct) Equação (10) (KAKRAN et al., 2012). 31 (10) A nucleação compreende a etapa de aparecimento dos novos cristais na solução, os quais conduzem a formação de germes ou núcleos que irão crescer. Existem 2 tipos de nucleação: a primária e a secundária. A nucleação primária ocorre sem a presença de um material cristalino e pode ser dividida em homogênea (quando a nucleação ocorre de forma espontânea a partir da união das moléculas) ou heterogênea (quando a nucleação é induzida por materiais estranhos como poeira). A nucleação secundária ocorre com a presença de cristais na solução (AALTONEN et al., 2009). Logo que os núcleos são formados, eles começam a crescer através da incorporação de moléculas de soluto na interface sólido-líquido. Ao contrário da nucleação e crescimento, a aglomeração não ocorre em todos os processos de cristalização. Ela depende das condições do sistema e do processo de cristalização. Tendo em vista, que a formação de cristais se produz imediatamente graças à rápida desolvatação da molécula, após a mistura da solução com o anti-solvente, considera-se que o ponto chave na produção de partículas ultrafinas por precipitação anti-solvente é criar condições que favoreçam a formação rápida das partículas (nucleação) e pouco ou nenhum crescimento dos núcleos formados, evitando problemas de aglomeração (THIERING; DEHGHANI; FOSTER, 2001). De acordo com a literatura, inúmeros fatores podem influenciar as propriedades dos cristais formados, dentre eles: modo de mistura, concentração da solução, proporção solvente/anti-solvente, temperatura e velocidade de agitação. O efeito da concentração do fármaco na obtenção de cristais foi descrito por Dong et al. (2009). Nesse estudo, o tamanho de partícula foi reduzido com o aumento da concentração do fármaco na solução. Zhang et al. (2009) também descreveram esse comportamento quando a concentração foi modificada de 20 mg/mL para 60 mg/mL. No entanto, quando a concentração foi aumentada para 80 mg/mL notou-se a formação de aglomerados. Os resultados descritos estão relacionados com o grau de supersaturação. O efeito da proporção solvente/anti-solvente foi descrito por Zhang et al. (2006) e Zhao et al. (2007). Nos dois casos, o tamanho de partícula foi 32 reduzido com o aumento da proporção de anti-solvente na mistura. Isto foi explicado pela diminuição da solubilidade à medida que a quantidade de anti-solvente na mistura aumenta (aumento da supersaturação). A cristalização por efeito anti-solvente pode proporcionar uma flexibilidade maior para o controle de formas amorfas e cristalinas do fármaco e é uma técnica de fácil implementação. Esta técnica já foi testada com sucesso para produção de partículas ultrafinas de fármacos pouco solúveis em água como a budesonida (RASENACK; HARTENHAUER; MÜLLER, 2003), danazol (ZHAO et al., 2007), dipropionato de beclometasona (WANG; CHEN; LE, 2007), predinisolona (LI et al., 2007), diclofenaco (LAI; SINICO; ENNAS, 2009), griseofulvina e fenofibrato (MENG; CHEN; CHOWDHURY, 2009). ESCOLHA DO SOLVENTE E ANTI-SOLVENTE Apesar da cristalização por efeito anti-solvente ser investigada com bastante interesse na área científica, ela apresenta algumas desvantagens que limitam o interesse e a exploração industrial como o uso de solventes orgânicos voláteis (acetona, DMSO, dentre outros) na solubilização dos fármacos, como mostra a Tabela 4. Como limitações para a utilização de solventes na precipitação por efeito antisolvente pode-se mencionar: Adição, na maioria dos casos, de um solvente inflamável e poluente em meio aquoso; Necessidade de separação posterior de solventes por destilação de alto custo; Caso o solvente seja tóxico, há a preocupação com a remoção do solvente no produto acabado, que após secagem, deve conter solventes em níveis limites aceitáveis, pois muitos solventes orgânicos são tóxicos e de uso limitado na área farmacêutica (DHIRENDRA et al., 2009). 33 Tabela 4 - Fármacos recristalizados por processo de cristalização por efeito antisolvente usando solventes orgânicos Fármaco Fase orgânica Fase aquosa Estabilizante Autor Cefuroxima axetil Acetato de etila/ Cloridrato de metileno/ Cloroformio/ Acido fórmico/ éter isopropilico/ acetona Eter isopropílico/ água X (ZHANG et al., 2006) Itraconazol Tetrahidrofurano Poly/ P407 X (MATTEUCCI et al., 2006) Espirolactona Bicalutamida Itraconazol Odanacatib Metanol/ etanol/ isopropanol/ acetona Água Etanol/ DMSO Água Tween 80/ SDS/ Pluronic F127/ álcool polivinil/ HPMC X Tetrahidrofuran Água PS-b/ PEO Água SLS/ PVPK30/ Pluronic F-127/ Tween 80/ HPMC Ibuprofeno Acetona (DONG et al., 2009) (LE et al., 2009) (KUMAR; WANG; RIEBE, 2009) (VERMA; GOKHALE; BURGESS, 2009) GLICOFUROL O glicofurol a-[(Tetrahydro-2-furanyl)methyl]-o-hydroxy-poly(oxy-1,2-ethanediyl) é um solvente orgânico límpido, incolor, quase sem odor e produz uma sensação de ardência na língua. É miscível em água e não é tóxico, onde apresenta uma DL50=3,5 mL/Kg. Sua fórmula molecular é C9H18O4 e apresenta a formula estrutural de acordo com a Figura 5 (ROWE; SHESKEY, 2006). A toxicidade do glicofurol foi estudada por Boongird et al. (2011) após à injeção de glicofurol no cérebro de ratos com a injeção de solução de tampão fosfato. Todos os ratos sobreviveram e não houve uma significante perda de massa. Nenhuma anomalia neurológica foi observada. Sendo assim, os autores concluíram que o glicofurol é um solvente biocompatível. 34 Figura 5 - Formula molecular do glicofurol. Tauboll et al. (1990) estudaram a solubilização da carbamazepina em glicofurol para uso parenteral. Nos experimentos a carbamazepina apresentou uma solubilidade de 100 mg/mL em glicofurol e de 150 mg/mL na mistura glicofurol:álcool benzílico (1:1) à temperatura ambiente. As soluções permaneceram estáveis por mais de 14 dias e em animais mostraram que carbamazepina em glicofurol mantiveram a atividade farmacológica. O glicofurol também foi utilizado em formulações injetáveis contendo fármacos insolúveis, tais como: diazepam e fenitoína (IVATURI et al., 2009), genes (ELIAZ; SZOKA, 2002) e proteínas (BAGGER; NIELSEN; BECHGAARD, 2001). Além de injetável esse solvente também foi utilizado como promotor da penetração de fármacos em uso tópico, solvente para soluções intranasal e retais (BOONGIRD et al., 2011) A utilização de glicofurol como solvente também foi descrita na preparação de microesferas. Aubert-Pouessel et al. (2004) utilizaram esse solvente na obtenção de microesferas de lisozima através da emulsificação. As micropartículas tiveram diâmetros em torno de 10 µm. Allhenn E Lamprecht (2011) descreveram a preparação de microesferas de fármacos insolúveis como ibuprofeno, ritonavir e lopinavir. A utilização do glicofurol como solvente justificou-se pelo fato da técnica de preparação de microesferas por evaporação de solvente frequentemente apresentava resquícios do solvente utilizado, que geralmente era tóxico, ao contrário do glicofurol que é um solvente atóxico. Os resultados demonstraram que a utilização de glicofurol como solvente na preparação de microesferas desses fármacos insolúveis é uma alternativa satisfatória. Outro estudo descreveu o uso do glicofurol como co-solvente na preparação de um gel de naproxeno (BARAKAT, 2010). O naproxeno é um anti-inflamatório com 35 baixa solubilidade em água, assim é inviável a preparação de um hidrogel para a sua administração. Porém, utilizando o glicofurol para a solubilização do fármaco e o carbopol para introduzir as características de gel, o autor conseguiu um produto com boa permeabilidade, adesividade e espalhabilidade. Viehof et al. (2013) prepararam nanopartículas de insulina utilizando como solvente o glicofurol e polietileno glicol (PEG). Além de serem atóxicos esses solventes não desnaturam a proteína como ocorre na preparação com acetona, tetrahidrofurano ou etanol. O tipo de solvente não influenciou as propriedades das partículas ou a estabilidade da insulina, mas modificou significativamente a liberação in vivo em ratos. As nanopartículas preparadas com glicofurol apresentaram maior biodisponibilidade após administração oral que as obtidas com PEG 300. Os autores concluíram que os métodos apresentados para preparação de nanopartículas de insulina são promissores para encapsulação de outros fármacos sensíveis. Dessa forma, a utilização do glicofurol como solvente alternativo para solubilização da molécula A é justificada pela sua baixa toxicidade e pela sua capacidade de solubilizar fármacos insolúveis. Além disso, devido a sua miscibilidade com agua, este solvente é adequado para uso em processos de recristalização, onde a água é utilizada como anti-solvente. 36 3 3.1 OBJETIVOS Objetivo Geral: Recristalizar uma nova molécula com potencial efeito cardiotônico, denominada molécula A, pela técnica de cristalização por efeito anti-solvente em presença de glicofurol, afim de melhorar sua cinética de dissolução. 3.2 Objetivos Específicos: Caracterizar físico-quimicamente a molécula A; Desenvolver um método de quantificação da molécula A em solução por cromatografia liquida de alta eficiência; Determinar a solubilidade da molécula A em glicofurol e em misturas de glicofurol/água; Recristalizar a molécula A utilizando o glicofurol como solvente e água como anti-solvente; Caracterizar os cristais obtidos e comparar com os da molécula inicial. 37 4 4.1 MATERIAL E MÉTODOS Caracterização da molécula A ESPECTROSCOPIA NA REGIÃO DO INFRAVERMELHO COM TRANSFORMADAS DE FOURIER (FT-IR) A espectroscopia é uma técnica baseada na energia absorvida após interação da radiação com a matéria. Tal interação produz movimento dos átomos que constituem as moléculas, resultando em rotações e vibrações moleculares. Basicamente, as vibrações moleculares podem ser classificadas em dois tipos: vibrações de deformação axial e de deformação angular. As deformações axiais, ou estiramento, são oscilações radiais das distâncias entre os núcleos enquanto as deformações angulares envolvem mudanças dos ângulos entre as ligações ou, como no modo de deformação assimétrica fora do plano, alterações do ângulo entre o plano que contém as ligações e um plano de referência. Como as ligações químicas das substâncias possuem frequências de vibração especificas, é possível identificar uma substancia por tal técnica (SILVERSTEIN; WEBSTER; KIEMLE, 2006). Assim, essa análise foi realizada com o objetivo de avaliar possíveis modificações químicas após a recristalização. A molécula A foi caracterizada na forma original e recristalizada. Todas as amostras foram compactadas com Brometo de Potássio (KBr), formando pastilhas (99 mg KBr:1 mg molécula). Em seguida, submeteram-se as pastilhas à análise em um espectrofotômetro da Shimadzu (modelo IRprestige21) na região de 4000-400 cm-1, 20 varreduras, com resolução de 2 cm-1 na temperatura ambiente. ANÁLISE TÉRMICA A análises térmica compreende um grupo de técnicas na qual uma propriedade física de uma substancia e, ou seus produtos de reação é medida, enquanto a amostra é submetida a uma programação de temperatura. Dentre as 38 técnicas, encontram-se: a termogravimetria (TG) e a análise térmica diferencial (DTA). A TG é uma análise que mede a massa de uma amostra em função da temperatura (IONASHIRO; GIOLITO, 1980). A DTA é uma técnica na qual o equipamento registra a diferença de temperatura entre uma amostra e uma substância referência em função da temperatura. Através do DTA é possível detectar processos que envolvem eventos exotérmicos e endotérmicos (MARTÍNEZ et al., 2013). A caracterização por TG e DTA foi realizada para identificação de propriedades térmicas da molécula A original, como sua temperatura de fusão. As medidas foram efetuadas em uma termobalança DTG-60 da Shimadzu, em cadinho de alumínio, massas em torno de 10 mg, na faixa de temperatura de 25°C a 600°C com a razão de aquecimento de 10°C.min-1 sob atmosfera dinâmica de nitrogênio. MICROSCOPIA ELETRÔNICA DE VARREDURA A microscopia eletrônica de varredura (MEV) é uma técnica que possibilita visualizar a superfície de pequenas partículas através de um aumento de 30000 vezes. O equipamento emite um feixe de elétrons sob a superfície da partícula a ser analisada. Esses elétrons são retroespalhados ou a superfície do material emite outros elétrons. O equipamento analisa esses elétrons secundários ou retroespalhados e forma uma imagem, em tons de cinza, da superfície do material (DEDAVID; GOMES; MACHADO, 2007; DUARTE; JUCHEM; PULZ, 2003). A morfologia da molécula A na forma original e recristalizada foi analisada por MEV. As imagens foram obtidas no Laboratório Institucional de Microscopia Eletrônica de Varredura do Museu Paraense Emílio Goeldi, utilizando-se um microscópio eletrônico LEO modelo 1450VP. As amostras foram fixadas em fita dupla face de carbono contidas em um suporte de alumínio de 12 mm de diâmetro. Em seguida, a fim de se tornarem condutivas, foram metalizadas com Au por 2':30'', o que deposita sobre a amostra uma película com espessura média de 15 nm. As imagens foram geradas por detecção de elétrons secundários, utilizando-se aceleração de voltagem entre 12,5 e 15 kV e distâncias de trabalho variáveis entre 10 e 15 mm. 39 DIFRAÇÃO DE RAIOS-X A difração de raios-X permite a determinação da estrutura cristalina do sólido. O sólido é analisado por um feixe de raios-X. A interação dos raios incidentes com a amostra produz uma interferência construtiva (difração de raios-X). Os raios difratados são detectados e tratados. A conversão dos picos permite a obtenção de um espectro de difração (ALBERS; MELCHIADES; MACHADO, 2002). Essa análise foi realizada para detecção de possíveis mudanças de estado físico e fases cristalinas após a cristalização. A caracterização da molécula na forma original foi realizada por Azevedo (2014a). A caracterização das amostras da molécula na forma recristalizada foi realizada utilizando o difratômetro X PERT-PRO (modelo PW3050 da PANanalytical), locado no Laboratório de Caracterização Mineral (Instituto de Geociências–UFPA), (λ = 1,5406 Å) equipado com anodo de Cu, tempo de contagem 20s, 2θ (5° -75°), corrente de 30 mA e tensão de 40 kV. 4.2 Estudo da solubilidade O estudo de solubilidade de uma nova molécula é investigado para se determinar a quantidade da substância que irá se dissolver em dado solvente, tornando-se como limite o equilíbrio da saturação. Para quantificação real do analito em estudo foi necessário desenvolver e validar um método analítico por cromatografia líquida de alta eficiência. Assim, a etapa de validação foi realizada neste trabalho para garantir a segurança e confiabilidade dos resultados VALIDAÇÃO DE UM MÉTODO DE QUANTIFICAÇÃO DA MOLÉCULA A EM SOLUÇÃO POR CROMATOGRAFIA LIQUIDA DE ALTA EFICIÊNCIA (CLAE) A cromatografia é um método de separação, onde os componentes da mistura migram de acordo com a interação com a fase estacionária e a fase móvel. A CLAE se diferência das outras técnicas cromatográficas por utilizar um líquido 40 como fase móvel e por usar uma bomba de alta pressão para eluir a fase móvel pela fase estacionária. A Figura 6 esquematiza o funcionamento de um cromatógrafo. Esta técnica é bastante utilizada para separação, identificação e quantificação de substâncias (DEGANI; CASS; VIEIRA, 2011). Figura 6 - Esquema básico do funcionamento de um equipamento de CLAE: a reservatório de fase móvel; b - bomba de alta pressão; c - válvula de injeção da amostra; d - fase estacionária (coluna); e - detector; f – registrador Para realização das análises o sistema cromatográfico utilizado foi composto por um cromatógrafo liquido de alta eficiência Varian®, acoplado com uma bomba isocrática prostar 300, injetor manual reodyne com um detector de canal duplo de ultravioleta-visível prostar 220 e um sistema de software Star Varian 6.0. As condições cromatográficas utilizadas foram: coluna Xterra RP18 5 µm (4,6x150mm); fase móvel composta de uma mistura de acetonitrila:água (1:1); fluxo de 1 mL/min e volume de injeção de 10µL; comprimento de onda de detecção de 318nm e o tempo de retenção de 8 minutos. 41 Determinação dos parâmetros de validação a) Linearidade É a capacidade da metodologia que mostra o quanto os resultados da técnica são diretamente proporcionais a concentração do analito em uma determinada faixa de concentração. A ANVISA (2003) recomenda o uso de pelo menos 5 concentrações diferentes e é considerado linear a metodologia que apresentar, no mínimo, o coeficiente de correção (r) igual a 0,99. A linearidade foi avaliada a partir de uma solução estoque feita de 10 mg da molécula A solubilizada com acetonitrila em um balão de 100 mL, formando uma solução de concentração igual a 100 µg/mL, chamada de solução mãe (SM). A partir dessa solução foi preparada as soluções padrões como mostra a Tabela 5 para a construção de uma curva de calibração. Tabela 5 - Preparo das soluções para a curva de calibração Concentração Volume da Volume do diluente Volume (µg/mL) SM (mL) (mL) final (mL) 1 0,25 0,025 9,975 10 2 0,5 0,050 9,95 10 3 1 0,020 1,98 2 4 2 0,040 1,96 2 5 4 0,080 1,92 2 6 8 0,160 1,84 2 Ponto Cada ponto foi injetado no sistema cromatográfico e os resultados obtidos foram plotados em um gráfico da concentração da solução em função da área do pico. As curvas foram efetuadas em triplicata (n=3), onde obtém-se a curva média e o seu coeficiente de correlação foi calculado. 42 b) Seletividade Seletividade é a capacidade da metodologia de medir com exatidão o analito mesmo na presença de outras substâncias como impurezas, produtos da degradação e componentes da matriz da amostra em análise (ANVISA, 2003). Para a dissolução os únicos interferentes na análise foram o glicofurol e o lauril sulfato de sódio (LSS). Assim a seletividade do método foi avaliada mediante as leituras de uma solução de glicofurol 0,1% diluído na fase móvel (acetonitrila/água 1:1) e uma solução de lauril sulfato de sódio 0,5% diluído em água destilada. Cada solução foi analisada por CLAE e seus cromatogramas foram comparados com o da solução padrão de 2 µg/mL de molécula A. c) Precisão A precisão é a capacidade dos métodos terem resultados próximos em uma série de medidas de uma amostragem múltipla da mesma amostra. Entre os tipos de precisão tem-se: a precisão intermediária que é a concordâncias dos resultados no mesmo laboratório, mas em dias diferente e analistas diferentes; e a repetibilidade que é a concordância dos resultados no mesmo dia, pelo menos analista. A precisão pode ser expressa pelo coeficiente de variação (CV%) e seu valor não pode ser superior a 5% (ANVISA, 2003). Para avaliar a precisão foi realizado a repetibilidade e a precisão intermediária. A repetibilidade foi analisada a partir de seis determinações de igual concentração teórica de 2 µg/mL. Na precisão intermediária avaliou-se as seguintes concentrações: 0,5 µg/mL, 2 µg/mL e 8 µg/mL. Cada ponto foi analisado em triplicata, por 2 analistas diferentes e em 2 dias diferentes. Os resultados do parâmetro de precisão foram expressos através do coeficiente de variação (Equação 11). 𝐶𝑉 (%) = 𝐷𝑒𝑠𝑣𝑖𝑜 𝑝𝑎𝑑𝑟ã𝑜 𝑥100 𝐶𝑜𝑛𝑐𝑒𝑛𝑡𝑟𝑎çã𝑜 𝑚é𝑑𝑖𝑎 𝑑𝑒𝑡𝑒𝑟𝑚𝑖𝑛𝑎𝑑𝑎 (11) 43 d) Exatidão A exatidão é a capacidade do método ter seus resultados próximos ao valor real. Para a análise da exatidão é necessário realizar no mínimo 9 determinações: 3 de uma concentração baixa; 3 de uma média e 3 de uma alta (ANVISA, 2003). Foram analisadas 3 concentrações: 0,5 µg/mL, 2 µg/mL e 8 µg/mL. De cada ponto foi realizada uma triplicata e calculada a média desses valores. Com a média foi possível calcular a recuperação (R) através da Equação 12. Segundo a ANVISA (2003) esse valor não pode ser menor que 95%. 𝑅(%) = 𝐶𝑜𝑛𝑐𝑒𝑛𝑡𝑟𝑎çã𝑜 𝑚é𝑑𝑖𝑎 𝑒𝑥𝑝𝑒𝑟𝑖𝑚𝑒𝑛𝑡𝑎𝑙 𝑥 100 𝐶𝑜𝑛𝑐𝑒𝑛𝑡𝑟𝑎çã𝑜 𝑡𝑒ó𝑟𝑖𝑐𝑎 (12) e) Limite de detecção e de quantificação O limite de detecção é o menor valor do analito que pode ser detectado pela metodologia e o limite de quantificação é o menor valor do analito que pode ser quantificado com exatidão e precisão (ANVISA, 2003). Os limites de detecção (LD) e de quantificação (LQ) foram calculados através das Equações 13 e 14 respectivamente. 𝐿𝐷 = 𝐿𝑄 = 𝐷𝑃𝑎 𝑥 3 𝐼𝐶 𝐷𝑃𝑎 𝑥 10 𝐼𝐶 (13) (14) Onde, DPa é o desvio padrão do intercepto do eixo y em 3 curvas de calibração e IC é a inclinação da curva de calibração. 44 SOLUBILIDADE APARENTE DA MOLÉCULA A EM GLICOFUROL E EM MISTURAS DE GLICOFUROL/ÁGUA Em um Becker de 25 mL foi adicionado 10 mL de glicofurol e em outros 3 béckeres foram preparadas 3 misturas de glicofurol/água em diferentes proporções como mostra a Tabela 6. Em seguida, sob agitação magnética, foram adicionadas amostras de massas conhecidas de molécula A nas soluções. Foram realizadas as adições até que a solução estivesse viscosa o suficiente que não permitisse a adição de mais sólido. Tabela 6 - Preparação das soluções em diferentes proporções de glicofurol/água Volume de glicofurol Volume de água Volume final Glicofurol/água (1:2) 5 mL 10 mL 15 mL Glicofurol/água (1:1) 7,5 mL 7,5 mL 15 mL Glicofurol/água (2:1) 10 mL 5 mL 15 mL Ao término da adição de sólido nas soluções, os quatro béckeres foram colocados em banho-maria a 25°C por 72 horas. Cada dia os béckeres foram retirados do banho e submetidos a agitação magnética. Este procedimento foi realizado três vezes a cada dia. Posteriormente as misturas foram centrifugadas sendo o sobrenadante coletado para a quantificação em CLAE da molécula A que ficou solúvel. A parte solida (não solúvel) do ensaio foi colocado em uma placa de petri e posto em estufa a 120°C, após 24 horas o material foi levado ao dessecador para esfriar até temperatura ambiente e ser pesado em balança analítica, voltando para a estufa novamente. O procedimento foi repetido até a amostra atingir peso constante. Através da determinação do peso final, tem-se a massa de molécula A não solubilizada e pela subtração do total que foi utilizado, calcula-se o quanto de molécula A foi solubilizada, o que corresponde à sua solubilidade aparente. 45 Esta análise não mostra um valor exato da solubilidade da molécula A, mas ela possibilita o cálculo do fator de diluição para outras análises como a cromatografia líquida de alta eficiência também usada nesse trabalho. SOLUBILIDADE “REAL” DA MOLÉCULA A EM GLICOFUROL E EM MISTURAS DE GLICOFUROL/ÁGUA Após a validação da metodologia de quantificação por CLAE foi possível quantificar a massa real de molécula A solubilizada em glicofurol e nas misturas de glicofurol/água. 4.3 Preparação de cristais através da preciptação por anti-solvente ENSAIO PRELIMINAR DE CRISTALIZAÇÃO Em um tubo cônico contendo 0,5 mL de água ultra pura foram gotejados em 0,5 mL de solução saturada de molécula A com o auxílio de uma pipeta de pasteur. A cada duas gotas, a solução foi agitada em um agitador tipo vortex. A mistura ficou em repouso por 24 horas para a formação dos cristais. Os cristais foram coletados com auxilio de uma pipeta de pasteur e analisados em um microscópio óptico comum, nas objetivas de 4x, 10x e 40x. PREPARAÇÃO DOS CRISTAIS Depois do teste preliminar de recristalização, novos testes foram realizados utilizando-se diferentes quantidades de anti-solvente (água) em relação à quantidade de solução de molécula A em glicofurol, como mostra a Tabela 7. 46 Tabela 7 - Proporção de solução saturada e água para a recristalização. Proporção Volume de Solução Volume Volume final Saturada (mL) de água Solução/água (1:2) 5 10 15 Solução/água (1:1) 7,5 7,5 15 Solução/água (2:1) 10 5 15 Para cada uma das preparações procedeu-se da seguinte forma: Um becker com água permanecia em um agitador magnético com velocidade de 300 rpm; Com o auxílio de uma pipeta de pasteur gotejava-se lentamente a solução de molécula A. Em seguida, a mistura era filtrada e lavada com água para a retirada do excesso de solvente. A parte sólida era separada e colocada para secar na estufa a 120°C. DETERMINAÇÃO DA MELHOR PROPORÇÃO ÁGUA/GLICOFUROL PARA A RECRISTALIZAÇÃO DA MOLÉCULA A Com base na solubilidade da molécula A em glicofurol e em misturas de glicofurol e água pode-se calcular o rendimento em produto (massa de cristais formados). Para calcular o rendimento da produção de cristais aplicou-se a Equação 15. Rdt 1 Srx(1 Rx) Sgly (15) Onde, Rdt é o rendimento, Srx é a solubilidade (g/mL) da molécula A na mistura de glicofurol/água em análise, Sgly é a solubilidade de molécula A (g/mL) em glicofurol, Rx é a razão da quantidade de água por glicofurol na mistura em análise. 47 4.4 Caracterização do produto recristalizado Os cristais obtidos produto recristalizado foi analisado por FT-IR, DRX e MEV, em comparação à molécula original. PERFIL DE DISSOLUÇÃO Os perfis de dissolução da molécula original e dos produtos recristalizados foram determinados utilizando-se o dissolutor SOTAX® AT 7smart Manual. Dois meios de dissolução foram testados : - Água destilada com pH=7 ; - Solução aquosa contendo LSS 0,5%, pH=7,4. Quando a solubilidade do fármaco em água é baixa recomenda-se utilizar o LSS como meio alternativo (FDA, 1997). Foram utilizadas 3 cubas para cada meio. Em cada uma delas, colocou-se 14 mg da amostra em teste para um volume de meio de 900 mL. As demais condições mantidas : rotação das pás de 50 rpm; temperatura de 37°C; tempos de coleta da amostra de 1, 5, 10, 20, 30 e 60 minutos. A quantificação foi realizada por CLAE. Os dados foram tratados no software sigmaplot procurando o melhor modelo cinético para representar o perfil de dissolução. Os modelos testados foram: Primeira ordem ; Higuchi ; Hixon e Crowell ; Peppas ; e Baker e Londsdale. Os perfis de dissolução da molécula A e de seu recristalizado foram comparados através do calculo da eficácia de dissolução, do fator de similaridade e do fator de diferença. 48 5 5.1 RESULTADOS E DISCUSSÃO Caracterização da molécula A ESPECTROMETRIA DE INFRAVERMELHO COM TRANSFORMADAS DE FOURIER (FT-IR) A Figura 7 mostra o espectro FT-IR da molécula A. Observa-se um pico em 3178 cm-1 atribuido a associação de amida com amina. Em 3019 cm -1 tem-se um pico característico de deformação axial de C-H aromático. Em 1654 cm-1 há um pico forte que corresponde a carbonila de amida. Na região de 1133 cm-1 evidencia-se uma deformação axial assimétrica de C-O-C. Na faixa de 1250-1020 cm-1 existem picos caracteristicos da absorção de grupos tiocarbonila (C=S). Uma banda larga na faixa de 800-666 cm-1 (693 cm-1) é causada pela deformação angular simétrica fora do plano do grupo N-H (SILVERSTEIN; WEBSTER; KIEMLE, 2006). Figura 7 - Espectro de infravermelho da molécula A 49 Os grupos funcionais que foram evidenciados pela avaliação da FT-IR corroboram com a estrutura do cardiotônico em estudo como mostra a Figura 8. A molécula A de acordo com a nomenclatura IUPAC corresponde à N-[(E)-thiophen-2ylmethylidene]-1,3-benzodioxole-5-carbohydrazide. Figura 8 - Forma estrutural da molécula A. ANALISE TÉRMICA A análise térmica da molécula A mostra um pico endotérmico à temperatura onset de 205,4°C (Figura 9). Picos endotérmicos são causados por fusão, vaporização, sublimação, dessorção, absorção, transição de cristal líquido, entre outros (BERNAL et al., 2002). Como este foi o único evento térmico observado, supõe-se que seja o ponto de fusão da molécula A. Figura 9 - TG e DTA da molécula A 50 Azevedo (2014b), em seu estudo, utilizou 2 mg de molécula a e encontrou o valor de 205°C como ponto de fusão. Apesar de se ter usado 10 mg o ponto de fusão não apresentou variação, mostrando que o calor se distribuiu uniformemente na amostra (BERNAL et al., 2002). MICROSCOPIA ELETRÔNICA DE VARREDURA A Figura 10 apresenta uma fotomicrografias obtida por MEV da molécula A. Observa-se que a molécula A na sua forma original apresenta-se em forma de cristais de tamanhos variados. Esta micrografia será utilizada para estudo comparativo da molécula A com seus recristalizados. Figura 10 - Microscopia eletrônica de varredura da molécula A em diferentes magnitudes A (121x), B(316x), C(450x), D(1270x). 51 5.2 Estudo da solubilidade VALIDAÇÃO DO MÉTODO DE QUANTIFICAÇÃO DA MOLÉCULA A POR CLAE a) Linearidade A linearidade do método analítico foi analisada através da média das curvas analíticas (Tabela 8). O gráfico plotado concentração versus área obteve um coeficiente de correlação linear de 0,9996, significando 99,96% da variação total em torno da média (Figura 11). O critério mínimo aceitável para o coeficiente de correlação deve ser igual a 0,99 (ANVISA, 2003). Tabela 8 - Curvas de calibração preparadas em 3 dias diferentes. Concentração Curva 1 Curva 2 Curva 3 (µg/mL) (mV/s2) (mV/s2) (mV/s2) 0,25 5,52 6,80 0,50 16,40 1 Média Desvio Padrão 9,55 7,29 2,06 15,70 18,10 16,73 1,23 46,90 37,80 44,80 43,17 4,76 2 81,00 86,30 84,20 83,83 2,67 4 199,00 169,00 177,00 181,67 15,53 8 338,00 364,00 367,00 356,33 15,95 r² 0,9902 0,9991 0,9995 0,9996 Área (mV/s2) 52 400 350 300 250 200 150 100 50 0 0,00 y = 45,252x - 3,949 R² = 0,9996 2,00 4,00 6,00 8,00 Concentração (µg/mL) 10,00 Figura 11 - Curva de calibração correlacionado a Área dos picos com a concentração b) Seletividade A seletividade foi avaliada para observar o grau de interferência das soluções na determinação da molécula A. A Figura 12 apresenta o cromatograma do LSS (0,5%) e do glicofurol (1%), comparados com a molécula A (2 µg/mL), a qual ilustra que não houve interferência das soluções de LSS e glicofurol, o que garante o pico de resposta exclusivo da molécula A no tempo de retenção próximo a 4,7 minutos. Figura 12 - Cromatogramas do Lauril sulfato de sódio 0,5% (verde), glicofurol a 0,1% (vermelho) e molécula A a 2 µg/mL (azul) 53 c) Precisão Repetibilidade A repetibilidade foi determinada através de seis análises da amostra de concentração 2 µg/mL (Tabela 9). O Coeficiente de variação foi de 2,59% mostrando que o método é preciso e está dentro da faixa que é preconizado pela ANVISA (2003), que determina o coeficiente de variação menor que 5%. Tabela 9 - Repetibilidade do padrão de concetração de 2 µg/mL Área Concentração (mV/s2) (µg/mL) 93,5 88,2 2,07 1,95 88,0 1,95 90,6 2,01 93,2 2,06 91,7 2,03 Média 2,01 Desvio padrão 0,05 Coeficiente de variação (%) 2,59 Precisão intermediária Os efeitos das variações do método dentro do mesmo laboratório foram observados através da precisão intermediária. A Tabela 10 apresenta os valores da precisão intermediária e seu coeficiente de variação. Todos os coeficientes estão abaixo dos 5%, valor aceito pela ANVISA (2003), mostrando que o método é preciso. 54 Tabela 10 - Resultado da precisão intermediaria dia1 0,5 2 8 0,55 2,18 8,67 0,54 2,06 7,88 0,52 2,11 8,31 0,54 2,12 8,29 0,02 0,06 0,39 Coeficiente de variação 2,93 2,82 4,75 dia 2 0,5 2 8 0,55 2,30 8,89 0,54 2,31 8,26 0,59 2,38 8,40 0,56 2,33 8,52 0,03 0,04 0,33 4,38 1,82 3,89 dia 1 0,5 2 8 0,55 2,42 8,62 0,58 2,38 8,94 0,58 2,28 8,53 0,57 2,36 8,70 0,02 0,07 0,21 2,87 2,96 2,44 dia 2 0,5 2 8 0,53 2,24 8,02 0,52 2,11 8,20 0,55 2,15 7,99 0,53 2,17 8,07 0,01 0,07 0,11 2,54 3,27 1,37 Concentração (µg/mL) Média Desvio padrão Analista 1 Analista 2 d) Exatidão Através da exatidão calculou-se o grau de concordância entre os resultados experimentais e o valor teórico aceito como referência. A Tabela 11 mostra os valores encontrados das análises em CLAE para as concentrações baixa, média e alta, junto com o resultado das recuperações. Os valores estão dentro do determinado pela ANVISA (2003) mostrando que o método é exato. Tabela 11 - Dados da recuperação do método 0,5 µg/mL 2 µg/mL 8 µg/mL 0,51 2,12 6,51 0,55 2,06 8,82 0,51 2,02 7,79 Média 0,52 2,07 7,71 Recuperação (%) 103,68 103,43 96,35 55 e) Limite de detecção e Limite de quantificação Os interceptos do eixo Y das 3 curvas foram: 0,1072; -7,5692; e -2,6139. O desvio padrão (DPa) é 3,892. A inclinação da curva (IC), retirada da equação da curva de calibração usada na linearidade, é de 45,252. Usando as formulas apresentadas na metodologia o limite de detecção é de 0,258 µg/mL e o limite de quantificação é de 0,86 µg/mL. SOLUBILIDADE APARENTE A solubilidade aparente da molécula A em glicofurol foi realizada através de 4 adições do sólido em 10 mL (10625,3 mg) do solvente, sob agitação. A Tabela 12 apresenta os valores adicionados. Tabela 12 - Adição de molécula A em glicofurol. Número de adições 1 2 3 4 Total Molécula A (mg) 100,1 105,3 97,0 128,5 430,9 Depois da 4° adição, formou-se um corpo de fundo e esse foi separado por centrifugação como proposto pela metodologia. A parte não solubilizada teve uma massa de 135,2 mg. Dessa forma, a massa de molécula A presente em 10625,3 mg glicofurol foi de 295,3 mg e a solubilidade aparente da molécula A em glicofurol é de 27,83 mg de molécula A a cada 1000 mg de glicofurol. A solubilidade da molécula A em misturas de glicofurol e água foi determinada de forma similar à calculada para a solubilidade em glicofurol. Os dados da solubilidade aparente da molécula A em diferentes misturas de glicofurol e água estão apresentados na Tabela 13. 56 Tabela 13 - Solubilidade da molécula A em misturas de glicofurol e água. Massa de molécula A (mg) Proporção Concentração (mg/mL) solubilizada em 15 mL Glicofurol/água (1:2) 105 7 Glicofurol/água (1:1) 99,5 6,6 Glicofurol/água (2:1) 198,7 13,2 SOLUBILIDADE REAL DA MOLÉCULA A EM MISTURAS DE GLICOFUROL/ÁGUA Uma vez validada a metodologia de quantificação por CLAE, foi possível determinar a solubilidade "real" da molécula A em glicofurol e nas misturas de glicofurol/água. Os resultados são apresentados na tabela abaixo: Tabela 14 - Quantificação da molécula A em diferentes meios saturados Proporção solvente Concentração(mg/mL) Glicofurol 32,31 Glicofurol/água (1:2) 0,45 Glicofurol/água (1:1) 1,43 Glicofurol/água (2:1) 8,60 De acordo com resultados apresentados na Tabela 14, a solubilidade da molécula A em glicofurol foi de cerca de 32 mg/mL. Essa solubilidade é da mesma ordem de grandeza da solubilidade de outras moléculas farmacêuticas em glicofurol, como a carbamazepina (100 mg/mL) (Tauboll et al, 1990). O uso do glicofurol neste estudo de recristalização da molécula A justifica-se por causa da sua baixa toxicidade (ALLHENN; LAMPRECHT, 2011). 57 5.3 Preparação de cristais através da cristalização da molécula A em mistura glicofurol/água ENSAIO DE CRISTALIZAÇÃO A microscopia óptica (Figura 13) mostra que ocorreu a formação de cristais quando a solução foi adicionada na água, o que justifica que ela pode ser utilizada para a preparação de cristais através da técnica de recristalização por anti-solvente. . Figura 13 - Microscopia optica do recristalizado de molécula com água utilizando glicofurol como solvente 58 DETERMINAÇÃO DA MELHOR PROPORÇÃO GLICOFUROL/ÁGUA PARA A RECRISTALIZAÇÃO DA MOLÉCULA A A Tabela 15 mostra os valores de solubilidade da molécula A em diferentes misturas de glicofurol e água (Srx), a razão da quantidade de água por glicofurol (Rx) e o rendimento da produção de cristais (Rdt) calculada, sabendo que a solubilidade de molécula A me glicofurol (Rgly) é 32,31 mg/mL. Solubilidade (mg/mL) Tabela 15 - Cálculo do rendimento da produção de cristais Proporção Srx (g/mL) Rx Rdt (%) Glicofurol/água (1:2) 0,45 2 95,82 Glicofurol/água (1:1) 1,43 1 91,16 Glicofurol/água (2:1) 8,60 0,5 60,43 10 9 8 7 6 5 4 3 2 1 0 0,5 1 Razão água/glycofurol 2 Figura 14 - Gráfico da solubilidade de molécula A em diferentes misturas de glicofurol/água. 59 Através da Figura 14 observa-se que quanto maior a quantidade de água (anti-solvente) menor é a solubilidade da molécula A e isso é comprovado no cálculo do rendimento onde a proporção de quantidade de água (proporção 1-2) é a de maior rendimento. Assim, essa é a melhor proporção utilizada para a produção de cristais. 5.4 Caracterização da molécula A e de seus recristalizados INFRAVERMELHO COM TRANFORMADA DE FOURIER A molécula A e seus recristalizados apresentam o mesmo espectro de infravemelho como mostra a Figura 15. Este resultado evidencia que o processo de recristalização estudado não alterou a estrutura química da molécula A. Figura 15 - Espectros de infravermelho da molécula A (preto) e de seus recristalizados na proporção de 2-1 (vermelho), 1-1 (azul) e 1-2 (rosa) 60 DIFRAÇÃO DE RAIO-X Através da difração de raio-x (Figura 16) observa-se que tanto a molécula A como seus recristalizados apresentam picos ao longo de todo o difratograma confirmando suas estruturas cristalinas. Observa-se também não houve a formação de novas formas cristalinas (não aparecimento de novos picos). Figura 16 - Difração de raios-x da molécula A (preto) e de seus recristalizado na proporção de 2-1 (vermelho), 1-1 (azul) e 1-2 (rosa) MICROSCOPIA ELETRÔNICA DE VARREDURA As imagens obtidas da molécula A na forma recristalizada, na proporção de 21, 1-1 e 1-2 são mostradas respectivamente nas Figura 17, Figura 18 e Figura 19. 61 Figura 17 - Microscopia eletrônica de varredura do recristalizado na proporção 2-1 nas seguintes magnitudes: A(100x), B(2080x), C (12450x), D (13960x) . Figura 18 - Microscopia eletrônica de varredura do recristalizado na proporção 1-1 nas seguintes magnitudes: A(80x), B(3360x), C (1300x), D (10170x) 62 Figura 19 - Microscopia eletrônica de varredura do recristalizado na proporção 1:2 nas seguintes magnitudes: A(196x), B(621x), C (3870x), D (10710x) Através das imagens, nota-se que os recristalizados encontram-se bastante agregados e apresentam pequenos cristais em torno de 3 µm. Essa redução de tamanho e modificação de morfologia (cristais mais finos e alongados) pode ser comprovada na Figura 20 que compara os cristais da molécula A forma original e recristalizada na magnitude de 1270x. Figura 20 - Microscopia eletrônica de varredura da molécula A original (A) e recristalizada na proporção de 1-1 (B) na magnitude de 1270x. 63 DISSOLUÇÃO Realizou-se a dissolução in vitro da molécula A na forma original e recristalizada na proporção 1-2 (ensaio que apresentou melhor rendimento). Os dados obtidos são apresentados na Tabela 16, para os dois diferentes meios de dissolução utilizados. Através dos perfis de dissolução, testou-se 5 modelos cinéticos. De acordo com as equações matemáticas, o modelo que melhor explica o perfil de dissolução é aquele onde o coeficiente de correlação de Pearson (r2) mais se aproxima de 1. O modelo cinético que melhor explicaria o perfil de dissolução da molécula A em água é o modelo de Hixon e Crowell (dissolução de cristais com variação de área superficial), porém seu r² foi muito baixo não sendo o suficiente para explicar o perfil cinético do fármaco. Isso ocorreu pelo fato de apenas ter sido possível quantificar por CLAE a concentração do fármaco dissolvido após 60 minutos de ensaio (último ponto de amostragem, Tabela 16). Tabela 16 - Perfil de dissolução da molécula A em água e em LSS 0,5% Quantidade dissolvida da Molécula Quantidade dissolvida da Molécula Tempo A na forma original A na forma recristalizada (min) (% ± DP) (% ± DP) Agua LSS Agua LSS 1 0,00 6,63 ± 0,12 0,00 4,22 ± 0,26 5 0,00 17,30 ± 0,24 0,00 7,40 ± 0,16 10 0,00 27,74 ± 0,63 0,00 8,12 ± 0,4 20 0,00 44,56 ± 1,77 0,00 13,46 ± 0,03 30 0,00 58,79 ± 2,02 0,18 ± 0 14,18 ± 0,3 60 1,63±0,03 68,43 ± 2,27 2,00 ± 0,02 19,77 ± 0,38 64 Utilizando os valores da Tabela 16 pode-se comparar a performance em dissolução da molécula A na forma original e recristalizada. Como mostra a Figura 21, os valores de dissolução em água foram muito baixos. Concentação (%) 2,5 2,0 1,5 1,0 0,5 0,0 0 10 20 30 40 Tempo (minutos) Molecula A em agua 50 60 70 Recristalizado em água Figura 21 - Perfil de dissolução da molécula A (vermelho) e de seu recristalizado (azul) usando como meio água A Figura 22 apresenta o perfil de dissolução da molécula A e de seu recristalizado utilizando LSS como meio de dissolução. Pode-se observar que a molécula A possui uma melhor performance do que seu recristalizado. Para comprovar isso foram realizados os cálculos de fator de semelhança e de similaridade, para saber se os perfis são diferentes, e eficácia de dissolução, para saber qual possui a melhor performance. 65 Concentração (%) 80 70 60 50 40 30 20 10 0 0 10 20 30 40 Tempo minutos Molecula A em LSS 50 60 70 Recristalizado em LSS Figura 22 - Perfil de dissolução da Molécula A (azul) e de seu recristalizado (vermelho) usando como meio LSS 0,5%. O resultado encontrado para F1 foi de 69,95 e o F2 foi de 25,33. Para se ter semelhança, o F1 tem que ser próximo a 1 sendo aceitável valores menores que 15 e o F2 tem que ser próximo a 100 sendo aceitável valores acima de 50. Nesse caso Como o F1 foi mais de 15 e o F2 menor que 50, as curvas são diferentes. Através da eficácia de dissolução (Tabela 17) pode-se observar que a molécula A apresenta uma melhor performance para a dissolução que o seu recristalizado. O recristalizado, por possuir partículas menores deveria ter uma melhor eficácia de dissolução, porém a existência de aglomerados parece ter dificultado a dissolução do recristalizado (YOUN et al., 2011). Para contornar esse problema alguns autores utilizam sufactantes como a lactose (ALLAHHAM; STEWART; DAS, 2013; STEWART; ZHAO, 2005) ou então, para diminuir a agregação das partículas, seca-se os cristais por “spray drying” ao invés de uma secagem em estufa que favorece a aglomeração (POUTON, 2006). 66 Tabela 17 - Cálculo da eficácia de dissolução Área total Área da curva ED (%) Molécula A em LSS 6000 2,946.89 49.11 Recristalizado em LSS 6000 817.35 13.62 Os cálculos dos r2 dos modelos matemáticos das dissoluções são apresentados na Tabela 18. Os modelos que melhor explicaram o perfil cinético do Molécula A em LSS 0,5% foram o modelo de Higuchi, modelo de baker e lonsdale e o modelo de Peppas. Para a molécula na forma recristalizada, o modelo cinético que melhor se aplicou foi o de Peppas (Tabela 18). No primeiro caso a dissolução ocorre apenas pela difusão por isso os 3 modelos justificam a curva, porém no segundo caso além da difusão ocorre também a desagregação das partículas por isso o modelo de Peppas é o que mais justifica a curva pois é um modelo aplicado quando a dissolução ocorre por mais de um tipo de liberação (COSTA, 2002). Nas Figuras 23, 24 e 25 podendo ser observados o perfil de dissolução da molécula A em LSS 0,5%, do recristalizado em água e do recristalizado em LSS 0,5% com a linha de tendência do modelo matemático de Peppas, respectivamente. Tabela 18 - Cálculo dos r² de alguns modelos matemáticos Hixon e Higuchi Molécula A em água 0,66 0,37 0,66 -- 0,37 Molécula A em LSS 0,93 0,96 0,86 0,96 0,96 Recristalizado em água 0,72 0,42 0,72 1,00 0,42 Recristalizado em LSS 0,40 0,95 0,37 0,98 0,96 Crowell Peppas Baker e 1° ordem Lonsdale 67 Molecula A em LSS 0,5% no modelo Peppas F=k*t^n 70 60 Concentração (%) 50 40 30 20 10 0 0 20 40 60 Tempo (min) Recristalizado em LSS no modelo Peppas Figura 23 - Molécula A em LSS 0,5%0,5% no modelo Peppas F=k*t^n F=k*t^n 2,5 Concentração (%) 2,0 1,5 1,0 0,5 0,0 0 20 40 60 Tempo (min) Figura 24 - Recristalizado em água no modelo Peppas F=k*t^n 68 Recristalizado em LSS 0,5% no modelo Peppas F=k*t^n 22 20 18 Concentração (%) 16 14 12 10 8 6 4 2 0 20 40 60 Tempo (min) Figura 25 - Recristalizado em LSS 0,5% no modelo Peppas F=k*t^n 69 6 CONCLUSÃO Através de uma técnica de recristalização por anti-solvente foi possível preparar cristais da molécula A utilizando-se o glicofurol como solvente e água como anti-solvente. O método de doseamento por cromatografia líquida de alta eficiência desenvolvido mostrou-se seletivo, linear, preciso e exato segundo as especificações da ANVISA (2003) para determinação da concentração da molécula em solução. O trabalho também necessitou da realização de uma etapa de caracterização físicoquímica da molécula, cujas propriedades ainda são pouco conhecidas e não estão disponiveis na literatura. Os cristais obtidos da molécula A, através da tecnologia proposta, apresentaram a mesma estrutura cristalina e foram menores que os cristais da molécula na forma original. Entretanto, o efeito esperado para otimizar a cinética de dissolução da molécula não foi verificado, devido a aglomeração dos cristais obtidos. Embora esses resultados não tenham satisfatórios neste estudo, o processo de cristalização usando o glicofurol, solvente de baixa toxicidade, mostrouse interessante por manter a forma cristalina do fármaco e, assim, ele pode continuar sendo uma alternativa para cristalização de outros tipos de fármacos de baixa solubilidade. 70 7 PERSPECTIVAS E SUGESTÃO DE CONTINUIDADE Algumas sugestões para continuidade do trabalho: - Aprofundar o estudo experimental do processo, introduzindo novas variáveis de estudo, como por exemplo o modo de mistura da solução com o anti-solvente, afim de reduzir o problema da aglomeração dos cristais formados e evidenciar o efeito positivo da redução do tamanho do produto recristalizado; - Introduzir aditivos no anti-solvente (tensoativos ou polímeros hidrofílicos como HPMC) ou melhorar o método de secagem (secagem por spray drying); - Estudar o efeito dessas novas variáveis na cinética de dissolução; - Aprofundar à análise dos modelos cinéticos afim de propor um mecanismo de dissolução para os cristais formados. 71 8 REFERÊNCIAS AALTONEN, J. et al. 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