Variação morfológica na arquitetura de plantas

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VARIAÇÕES MORFOLÓGICAS E ESTRUTURAIS NA ARQUITETURA DE
PLANTAS NO ESTRATO ARBUSTIVO-ARBÓREO EM UM GRADIENTE
VERTICAL NA SERRA DO TEIMOSO, BAHIA
Andrade, M. A. R.1, Andrade, S.C.S.2 & Silva, O.V.3
RESUMO
Características arquitetônicas estruturais das plantas são fixadas geneticamente,
podendo apresentar também certa plasticidade fenotípica em resposta às variações ambientais,
bióticas e abióticas. Foram amostrados indivíduos ao longo de um gradiente de altura a fim de
verificar se há variação na estrutura das unidades de construção (número de folhas, tamanho
de entrenó e de meristema), taxa de herbivoria, epifilia e formação de galhas acompanhando a
estratificação. Foi observada interação positiva entre número de folhas por unidade de
construção e altura, podendo estar relacionado com a maior luminosidade disponível no
dossel.
PALAVRAS-CHAVE: unidades de construção, herbivoria, epifilia, galhas, dossel, Serra do
Teimoso, Mata Atlântica
INTRODUÇÃO
A forma das plantas é primariamente orientada à aquisição de recursos como água,
luz, nutrientes, vetores de pólen ou dispersores, respondendo seu crescimento sensivelmente
ao ambiente e suas variações, de forma que, ao menos parcialmente, reflita as circunstâncias
ambientais às quais esteja a planta sujeita (Waller 1986).
As plantas são limitadas em suas respostas por suas características arquitetônicas
estruturais fixadas geneticamente (Waller 1986), mas que também podem apresentar certa
plasticidade fenotípica, tanto anatômica quanto fisiológica, como no caso de hemiepífitas da
família Araceae (Ray 1992, Mantovani 1999). Tais características podem ser modificadas
pela ação de herbívoros, insetos galhadores, patógenos e minadores (Waller 1986). Estes
1
Pós-Graduação em Biologia Vegetal - Univ. Estadual de Campinas
Pós-graduação em Genética e Evolução - Univ. Estadual de Campinas
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Graduação em Ciências Biológicas - Univ. Estadual de Santa Cruz
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últimos se estabelecem em folhas já desenvolvidas, podendo refletir uma resposta à variação
do tamanho das folhas (Ribeiro e Brown 1999).
Apesar de sua aparência e organização, as subunidades da planta não são todas iguais.
Há uma tendência da planta em organizar o crescimento de forma que suas subunidades não
interfiram umas com as outras mais tarde na vida, assegurando o balanço entre folhas, raízes e
tronco (Waller 1986).
O controle de crescimento das subunidades é local. Ramos que cresçam bem numa
estação, crescerão mais e com mais brotos na próxima, enquanto as subunidades estressadas
morrerão ou permanecerão dormentes (Waller 1986). Essa anatomia de crescimento é
vantajosa, permitindo que a planta responda oportunisticamente às condições ambientais em
patches, enquanto minimiza investimentos em áreas sombreadas ou de outras formas
inapropriadas para o crescimento (Waller 1986). Esse crescimento pode ser indeterminado,
com os meristemas aproveitando oportunidades para crescer até a exaustão (Waller 1986).
O fato que nenhum design domina todos ou a maioria dos ambientes implica em
especialização que acompanha a seleção por eficiência em um ambiente, envolvendo tradeoffs que fazem com que a mesma planta bem adaptada àquele ambiente seja menos
competitiva em outros ambientes.
Características foliares como tamanho e forma, porém, mostram convergência entre
espécies não aparentadas dentro de uma comunidade, estrato na floresta ou de acordo com a
variação ambiental, como umidade ou altitude (Givnish 1984). No entanto, padrões de
ramificação apresentam considerável variação dentro da mesma floresta, não se observando
um padrão único ao longo de gradientes ambientais (Givnish 1984).
Os objetivos deste estudo são comparar a arquitetura das subunidades que constituem
a copas das plantas, avaliando também a forma e área foliar ao longo de um gradiente vertical
solo-dossel na comunidade, assim como o grau de herbivoria e de formação de galhas nestas
folhas.
MATERIAIS E MÉTODOS
Este estudo foi desenvolvido na Reserva do Particular do Patrimônio Natural da Serra
do Teimoso, localizada no município de Jussari (15°12’S e 39° 29’W), Bahia. A área pode
ser caracterizada como transição entre floresta úmida nos topos de morros e semidecídua para
a base.
Escaladores tiveram acesso a quatro árvores de cerca de 30 m de altura. O acesso à
copa foi feito com métodos de escalada, adaptados ao trabalho em dossel. Ramos foram
coletados com tesoura de poda e podão, em um raio de cerca de 3,20 m do tronco da árvore
escalada, totalizando 70 amostras. Do chão, cerca de 10 amostras de indivíduos diferentes
foram coletados de forma aleatória ao redor da árvore escalada, totalizando 47 amostras
abaixo de 3 m de altura. Para a amostragem de galhas, mais 60 amostras abaixo de 3 m foram
coletadas. Em todos os ramos coletados foi anotada a altura de coleta, sendo que de cada
indivíduo foram coletados dois ramos, um na camada inferior da copa e outro na camada
superior, formando pares de amostras (com diferenças de altura variando de 0 a 10,20 m).
Dos ramos coletados foi quantificado o número de folhas maduras, folhas novas,
folhas que sofreram herbivoria, epifilia ou formação de galhas. A partir de cinco unidades de
construção, definidas como uma ramificação e sua gema apical, quantificamos o número de
folhas produzidas por esta unidade (folhas presentes e as cicatrizes de folhas caducas), o
tamanho do último entrenó, o tamanho do meristema e avaliado sua condição (novo ou
velho). Foi obtida uma média destes valores da unidade de construção para cada indivíduo.
O material coletado foi prensado e seco posteriormente em estufa, para análise
morfológica, de área foliar e de taxa de herbivoria a serem feitas no Departamento de
Fisiologia Vegetal da Universidade Estadual de Campinas, São Paulo.
Os dados de proporção de folhas novas, folhas com herbivoria ou epifilia foram
transformados (cf. Zar 1984) pelo método de raiz quadrada
X’ = (X+0,5)1/2
para sua a normalização. Para o restante dos dados foi feita a transformação
logarítmica em base natural com a mesma finalidade.
As galhas foram analisadas segundo sua densidade por folhas de cada amostra, sendo
as amostras agrupadas em sete classes de altura, a intervalos de quatro metros no estrato
vertical, e morfotipadas.
RESULTADOS
Não houve diferença significativa entre os pares de amostras de cada indivíduo para os
dados de unidade de construção e de galhas (folhas: t=-1,014; p= 0,316; entrenó: t= -0,962;
p= 0,341; meristema: t= -0,610; p= 0,545; galha; t= 1,393; p= 0,170), utilizando-se as médias
destas variáveis por indivíduo nas análises.
Não houve forte correlação significativa entre altura e as variáveis: proporção de
folhas novas (r= 0,022; p= 0,819; gl= 109), proporção de folhas com herbivoria (r= 0,073; p=
0,445; gl= 109), proporção de folhas com epifilia (r= 0,381; p= 0; gl= 109) e densidade de
galhas por folhas (r= 0,103; p= 0,142; gl= 168) (Figura 1).
A análise de covariância entre altura e as variáveis da unidade de construção
apresentou forte correlação. No entanto, apenas a correlação entre a altura e o número de
folhas foi significativa (r= 0,859; p= 0,002; gl= 46), não o sendo para as demais variáveis:
comprimento de entrenó (r= 0,836; p= 0,191; gl= 47) e do meristema (r= 0,822; p= 0,260; gl=
47).
Foram encontrados seis morfotipos de galhas. Na Figura 2, pode-se observar que o
morfotipo 1 está presente em diferentes classes de altura, enquanto outros morfotipos foram
específicos de apenas uma das classes.
DISCUSSÃO
As amostras tomadas em diferentes alturas de um mesmo indivíduo são similares
quanto às medidas analisadas, ou seja, o crescimento das subunidades aparentemente foi
homogêneo mesmo em diferentes estratos arbóreos. Provavelmente, as condições de
luminosidade (e de outros fatores abióticos) foram as mesmas para as duas alturas amostradas
ou a diferença de altura dos pares não foi o suficiente para que fosse detectada variação no
efeito dos fatores supracitados, uma vez que se espera que diferentes alturas apresentem
distintos graus de sombreamento conforme sugerido por Waller (1986).
Também não foi observada correlação entre altura de coleta e número de folhas
novas, proporção de folhas com epifilia, herbivoria e densidade galhas (Figura 1). Se a altura
tem um importante papel sobre estas variáveis, a variação estudada (de 0,5 a 27 m) pode não
ter sido o suficiente para que o efeito da mesma fosse notado.
A interação positiva entre o número de folhas e a altura pode ser uma resposta à maior
disponibilidade de luz fotossinteticamente ativa nos estratos superiores, levando à uma maior
produção de folhas nas unidades de construção que ali se encontram, como sugerido para
patches de luz por Waller (1986).
A maior riqueza e abundância de morfotipos de galhas foram observadas na primeira
classe de altura (0 a 4 m). Este resultado pode ter sido reflexo do maior esforço amostral nesta
classe em relação às demais. As análises de forma, área foliar e taxa de herbivoria constituem
a próxima etapa deste estudo.
AGRADECIMENTOS
Aos proprietários da Reserva Particular do Patrimônio Natural - RPPN Serra do Teimoso
Henrique e Lucélia Berbert; aos financiadores Global Canopy Programme-International
Canopy Network e Fundação Boticário de Proteção a Natureza; às equipes de escaladores das
empresas Soluções Verticais e Jardins Suspensos - Jardinagem Vertical; ao monitor em
escalada Marcial C.Jorge; e aos organizadores do curso Talita Fontoura e Flavio Santos.
LITERATURA CITADA
GIVNISH, T. J. 1984. Leaf and canopy adaptation in Tropical forests. In E. Medina; H. A.
Mooney and C. Vázquez-Yánes (eds.). Physiological Ecology of Plants of the wet
tropics, pp. 51-84. W. Junk Publishers
MANTOVANI, A. 1999. Leaf morpho-physiology and distribution of epiphytic aroids along
a vertical gradient in a brazilian rain forest. Selbyana 20: 241-249.
PORTER, J. R. 1990. Modules, models and meristems in plant architecture. In G. Russell, B.
Mashall & P. G. Jarvis (eds.). Plant canopies: their growth, form and function, pp. 143159. Society for Experimental Biology Seminar series: 31. Cambridge University Press,
Cambridge.
RAY, T. S. 1992. Foraging behaviour in tropical herbaceous climbers (Araceae). Journal of
Ecology 80: 189-203.
RIBEIRO, S. P. & BROWN, V. K. 1999. Insect herbivores in tree crowns of Tabebuia aurea
an T. ochraceae (Bignoniaceae) in Brazil: contrasting the cerrado with the “Pantanal
Matogorssense”. Selbyana 20: 159-170.
WALLER, D. M. 1986. The dynamics of growth and form. In M. J. Crawley (ed.). Plant
Ecology, pp. 291-320. Blackwell Scientic Publications, Oxford.
ZAR, J. H. 1984. Biostatistical Analysis. 2a edição. Prentice Hall. New Jersey.
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