Revista Brasileira de Meteorologia; 1987; Vol. 2, 107-1 17 CLIMATOLOGIA DINÃMICA DA REGIAO AMAZONICA: MECANISMOS DE PRECIPITAÇAO LUIZ CARLOS BALDICERO MOLION Ministbrio da Ciência e Tecnologia - M C Instituto de Pesquisas Espaciais - INPE C.P. 515 - São Jos6 dos Campos, SP RESUMO São discutidas as configurações da circulação troposférica sobre a Bacia Amazônica e sua relação com a distribuição de precipitação. De uma maneira geral, a precipitação durante o verão está intimamente ligada com a posição de um sistema de alta pressão nos altos níveis da troposfera, que domina a circulação da América do Sul e cujo centro geralmente se forma.sobre a Bolívia. Este sistema se enfraquece e move-se para o norte durante o outono e inverno, e ao mesmo tempo os setores sul e leste da Amazônia experimentam sua estação seca. A variabilidade da precipitação pode ser parcialmente devida a zonas de convergêricia persistentes originadas de ou associadas com sistemas frontais do Hemisfério Sul, que organizam convecção profunda sobre o Brazil tropicai. A brisa marítima, que afeta a costa norte, é um fator importante na organização de linhas de instabilidade. Outra possível origem dessas linhas, especialmente as que se formam durante a noite, é a convergência da brisa terrestre com as perturbações no campo dos ventos alísios. Essas perturbações podem estar sendo causadas por penetrações profundas de sistemas frontais de ambos hemisférios nos subtrópicos. As vezes, essas linhas de instabilidade propagamse continente a dentro, permanecendo ativas por períodos de até 48 horas, durante os quais elas âtravessam a Bacia Amazônica, chegando até aos contrafortes dos Andes. ABSTRACT The tropospheric circulation patterns and i t s relation to rainfall in the Amazonas Basin are discussed. The general pattern of precipitation, during the summer, is closely linked to the position of an upper tropospheric high pressure system which dominates the circulation over South America and whose center generally forms over Bolivia. This system weakens and moves northward during fall and winter while southern and eastern portion of the Amazonas Basin experience a dry season. Variability in the rainfall pattern may be due partially to persistent convergence zones, originating from or associated with Southern Hemisphere frontal systems, which greatly organize convection over tropical Brazil. The sea breeze circulation, which affects the northern coast of Brazil, is an important factor in organising instability lines. Another possible origin of instability lines, especially the ones forrning during the evening, is the convergence of land-breeze and disturbances in the easterlies. These disturbances may be caused by deep penetration in the subtropics of frontal systems from both hemispheres. At times, these lines propagate inland remaining active for up to 48 hours, in which time they cross entire basin, reaching the Andes. O clima de uma região é determinado por fatores, denominados controles climáticos, que atuam tanto na escala global como na regional. Os mais importantes são a circulação geral da atmosfera (CGA), a topografia local, a natureza da cobertura vegetal, o-'ciclo hidrológico e a influência de correntes oceânicas se a região for costeira. A CGA, que 6 uma consequência da distribuição latitudinal da energia solar e da distribuição assirnétrica de continentes e oceanos, impõe as características gerais do clima regional. O ciclo hidrológico nâio só 6 um componente do clima em si, mas também da paisagem biogeofísica. Sua influência no clima não se resume apenas às interações entre a umidade atmosférica, precipitação e escoamento superficial. Devem ser levados em conta, t a m b h , as grandes quantidades de energia que são absorvidas e liberadas durante os processos de mudança de fase sofridos pela substância água. Este trabalho trata das circulaç6es de macro e mesoescalas que atuam na Regiâio Amazônica e os mecanismos dinâmicos que organizam e promovem precipitação naquela drea. 108 Luiz Carlos Baldicem Molion 1. CIRCULAÇAOMÉDIA DE LARGA ESCALA Até recentemente a circulação m6dia da troposfera sobre a Amazônia tinha sido estudada usando dados convencionais de radiossondagens de algumas poucas estações existentes. Por exemplo, Newell et a/., (1972) analisaram os campos de função de corrente para 850 e 200 mb entre 450N e 45% mas suas análises incluem menos de dois anos de dados de Manaus a Belém. Em trabalhos mais recentes foram utilizadas séries mais longas de dados porém ainda algumas poucas estações (e.g. Kayano, 1979;Sobral. 1979). Por outro lado, foi demonstrado que os dados obtidos por satélites geoestacionários (sbrie SMSIGOES), com grande cobertura espacial e alta frequência de imagens, podem ser utilizados para estimar campos de temperatura e umidade e computar campos de vento, através dos deslocamentos das nuvens. Virji (1981) foi o primeiro a utilizar esta tQcnica para estudar a circulação de verão sobre a AmBrica do Sul. Kousky (1983) usou um conjunto de dados do Centro Meteorológico Nacional dos EEUU (NMC/NOAA) para o período 1970-75, que combina dados convencionais e de satélites e revisou cartas médias de função de corrente Figura 1 (e - d) - e) Linhas de função de corrente representendo o escoamento troposf6rico m6dio de Janeiro fver8o) e 850 mb: "A" refere se ao centro de elte pressão. b) Linhas db função de corrente representando o escoamento troposf6rico médio para Janeiro e 250 mb. (Continua. .i . Climatologia dinâmica da região Amaz6nica: mecanismos de precipitação IMJ i70 i60 150 i40 130 120 110 100 90 00 70 40 50 40 10 20 10 O 4II 48 I 446 446 410 4 1.0 17.1 37 I 110 130 2 1.7 28I 242 24 2 196 19.6 148 140 99 99 W 50 50 r3 2 O o -50 -50 -9.9 - 9.9 -148 448 -19.6 -196 - 2+2 442 -28 7 -28 7 -11.0 -UO -17 I -37.1 -41.0 -41 0 -446 4 46 -41.1 4 . 1 LONGITUDE ( W ) - - Figura 1 (a d) C) O mesmo que (a) s6 que para Julho (inverno) a 850 mb. d) O mesmo que íb) só que para Julho a 250 mb. (Kousky, 1983). para dois níveis 850 e 250 mb e para dois meses típicos: Janeiro (verão) e Julho (inverno). Estas cartas estão reproduzidas na Figura 1. Comparando as Figuras l a e I c para o Hemisfkrio Sul, nota-se que ao nível de 850 mb os anticiclones (Al,do Atlântico e Pacífico subtropicais estão presentes em ambas as estações. No inverno, o centro de anticiclone do Pacífico parece estar ligeiramente deslocado, em direção ao equador, de sua posição no verão, enquanto o anticiclone do Atlântico permanece aproximadamente na mesma latitude mas aproxi- ma-se da costa da Ambrica do Sul. Parece, portanto, não haver diferenças significativas no escoamento troposférico mkdio dos baixos nfveis entre o inverno e o verão. Ao nivel de 250 mb, no escoamento médio nota-se uma variação sazonal pronunciada, de movimentos essencialmente meridionais em Janeiro (Figura l b ) para movimentos predominantemente de caráter zonal durante Julho (Figura l d ) . A natureza meridional do escoamento de verão B resultado direto do forte aquecimento da superfície com liberação de calor sensível e de calor latente, este ultimo Luiz Carlos Baldicero Molion devido à condensação de umidade através de toda coluna troposférica. Este aquecimento produz uma célula de circulação direta forçada termicamente com ar quente e úmido subindo (convecção) sobre o continente e ar seco descendo (subsidência) sobre as áreas oceânicas adjacentes. A Figura 2 é uma representação esquemática desta célula de circulação direta. De acordo com Gill (1980). contudo, o ramo leste da componente zonal desta circulação, conhecida como circulação de Walker, pode ser mais extenso que o ramo oeste. Portanto, a subsidência ocorre sobre grande área a leste do centro de ascensão. No caso da América do Sul, o movimento subsidente estende-se desde o este da Amazônia at6 o oeste da Africa, incluindo a parte do Nordeste do Brasil. O ramo ascendente desta circulação de Walker provoca desenvolvimento intenso de nuvens convectivas e altas precipitações pluviométricas, enquanto o ramo descetldente inibe a formação de nuvens e precipitação. Esta configuração é evidente na distribuição m6dia da precipitação global apresentada na Figura 3: mais de 6 mm-dia-' sobre a Bacia Amazônica (ramo ascendente) e menos de lmm-dia-' sobre os oceanos subtropicais (ramo descendente). A circulação termicamente forçada sobre a região aquecida induz convergência de ar e baixa pressão atmosférica nos baixos niveis e divergência de ar e alta pressão nos altos níveis (Alta da Bolívia). A variabilidade sazonal da Alta Bolívia, tanto em intensidade como em posição, está diretamente relacionada com a distribuição espacial e temporal da precipitação (Kousky e Kayano, 1981). Quando a Alta se enfraquece e se move para o norte no inverno (Figuras l b e l d ) , os setores sul e leste da Amazônia experimentam sua estação seca, conforme pode ser visto nos mapas de brilho médio de imagens visíveis de satélite (Figura 4). O noroeste da América do Sul não apresenta estação seca. Por volta de outubro, a Alta começa a se mover de volta para sua posição média de verão e a estação seca vai terminando no sentido Brasil central para leste da Amazônia. Outro elemento de circulação geral relacionado com precipitação na costa nordeste da Amazônia 15 a Zona de Convergência Intertropical (ZCIT) sobre o Atlântico equatorial. A ZCIT é formada pela confluhcia dos ventos alísios do Hemisfério Norte e os ventos alísio do Hemisfério Sul. Hastenrath e Lamb (1977) mostraram que, sobre o Atlântico, a ZCIT move-se progressivamente para o sul, de sua posição limite-norte em Agosto, e alcança sua posição limite-sul no final do verão do Hemisfério Sul (Março). A ZCIT é responsável pelas precipitações sobre as áreas costeiras da Amazônia e do NE brasileiro. Alguns autores (e.g. Trewartha, 1961; Ratisbona, 1976). mencionam a existência de uma ZCIT continental durante o verão. A Figura 5 mostra uma região de máximo de precipitação na costa, próximo a foz do Amazonas, mas o outro máximo ocorre no interior do continente orientado de centrosul para noroeste com um mínimo apreciável entre os dois. As imagens médias de satélite não apresentam evidência de uma banda de nuvens no sentido leste-oeste sobre o continente, como ocorre sobre o Atlântico (Figura 4). Sobre o continente, o escoamento na baixa troposfera, afluentes de ambos hemisférios, podem estar se misturando 'lateralmente e verticalmente, devido à grande atividade convectiva, sem manter uma zona de confluência nítida (Taljaard, 1972). As perturbações transientes podem ser classificadas de acordo com sua escala de tempo, variando na convecção local de microescala que tem um tempo de vida de minutos e algumas horas, até grandes aglomerados de cúmulonimbos de mesoescala, que são organizados por sistemas troposféricos extratropicais da macroescala e que podem durar até vários dias. Nesta seção serão tratados primeiro as perturbações de mesoescala e depois aquelas associadas a circulação de escala sinóptica. CONV Figura 2. Diagrama esquemarico representando a circulação que resulta do aquecimento diferencial entre o continente e os oceanos no verão. Climatologia din8mica da região Amaz6niw: memnismos de precipita@ i I 1 1 I I I I I I I I I 111 I I I i Figura 3. Distribuição da precipitaçso média global (rnm.dia-' i. Mapa preparado no GLAS com base nos dados de Jaeger (1976). Assetas indicam a direção do deslocamento dos mdximos de precipitação entre o verflo e o inverno (cortesia de Dr. C.A. Nobre, INPE). i;' Figura 4. Nebulosidade média sobre a América do Sul. Mosaico preparado com imagens dos sat6lites de órbita polar (14:OO hs horbrio local) para o período 1967-70 (Miller e Feddes, 1971i . Luiz Carlos Baldicero Molion Climatologia dinâmica da região AmazGniw: mewnismos de precipitação 113 2.1. Sistemas Tropicais de Mesoescala Um número significativo de estudos sobre o comportamento e estrutura de sistemas tropicais de mesoescala ou escala subsinóptica já foram realizados (veja e.g. Hastenrath, 1985), principalmente com dados coletados durante o GATE. Para a Amazônia, porém, não existe ainda um conjunto de dados adequados. A única fonte disponível para estudar a formação e propagação de sistemas de nuvens tem sido os sinais de satélites associados com os esparsos dados de superfície. Johnson ( 1970) observou a presenca de grande número de aglomerados de nuvens que se formavam e se dissipavam diariamente. O desenvolvimento das células convectivas normalmente começa durante as horas da manhã, caso não haja forçante de escala maior. Estas células sofrem um processo de seleção através do qual, algumas crescem formando aglomerados ou linhas, enquanto as menores são dissipadas. A formação de uma linha ou aglomerado depende do escoamento troposférico médio conforme mostrado esquematicamente na Figura 6. Com um campo de vento moderado, as novas células convectivas formam-se B jusante da célula original. As correntes descendentes da célula original funcionam como um rnini-sistema frontal levantando, assim, o ar quente e úmido a sua frente. Estas novas células formam uma linha arqueada (Figura 6a). Quando o vento é muito fraco, as novas células circundam a célula original em decaimentos formando um anel, com uma região de subsidência no centro ou então dão origem a um aglomerado que continua a crescer às expensas das correntes descendentes ( Figura 6b). Figura 6. Diagrama esquemático mostrando a formação de linhas de instabilidade e aglomerados de cúmulos. Cavalcanti (1982) demonstrou que a circulação de brisa marítima organiza convecção sobre toda a costa próxima à foz do Amazonas. As linhas convectivas formam-se na costa, ou fora dela, devido a convergência da brisa e se deslocam para o interior, chegando a Belérn a tarde e dissipando-se após o por do sol, em conSèquência da redução do contraste térmico. Existem ocasiões. porém, em que essas linhas de instabilidades permanecem ativas por mais de 48 hs e se propagam para leste, i.e. para o interior do continente, alcançando muitas vezes a Cordilheira dos Andes. Em menores proporções, elas podem ser compara- Figura 7. Mosaico de imagens de satélites geostacionário mostrando a propagaçzo de linhas de instabilidade (diagonais brancas) na Amazônia. (Kousky, 1983). Veja texto para detalhes. Luiz C$rlos Baldicero.Molion - 80 - 60 - 40 -20 O 20 f lgurr 8. Isolinhat de desvios do total m6dio de precipitaçso para estação chuvosa (Fev-Mai) de 1958; os desvios foram normalizados com relaçgo ao desvibpadflo da s6rie (Moura e Kayano, 1983). Grandes reduções nos totais anuais de precipitação parecem estar relacionadas com a ocorrência de eventos fortes de El Nino-Oscilação do Sul (ENOS). Possível associgão entre ENOS e secas ou redução de precipitação foram explicadas por Kousky et a/., (1984). Convecção mais intensa que o normal .estabelece-sesobre as águas anomalamente quentes do Pacífico equatorial leste. O ramo ascendente da circulação de Walker, que normalmente se apresenta sobre o oeste da Amazônia é deslocado para oeste sobre as águas mais quentes e intensificado pela forte convecção. O ramo descendente cobre praticamente toda a Amazônia e chega até a costa da África, causando reduções notáveis da precipitação. Moura e Kayano (1983) estudaram a distribuição de precipitação de 1958 quando ocorreu um evento forte de El Nino. A Figura 8 desse trabalho mostra as isolinhas dos desvios com relação à média, normalizados pelo desviopadrão da série, para o período de Fevereiro-Maio. Sobre partes do oeste da AmazBnia, NE do Brasil, Africa Central e Sul, notam-se desvios negativos excedendo - 1.8 desvios padrões. Viírios autores estudaram o evento de 1982183, caracterizado com o El Nino mais forte do século (e.g. Kousky et a/., 1984; Nobre e Rennó, 1985; Moura e Kayano, 1986), com relação à variabilidade da precipitação na Amazônia. Para o período Janeiro-Maio de 1983, Kousky e t a/., (1984) indicam que a precipitação, para algumas estações selecionadas, foi 30% abaixo da normal; Nobre e Rennó (1985) utilizando todas as estaçaes disponlveis, concluem que para o período Janeiro-Fevereiro de 83, a precipitação foi 70% abaixo da normal e Fevereiro de 83 foi o mês mais seco dentre os últimos 50 anos. Outros mecanismos dinamicos podem causar variabilidade na precipitação como, por exemplo, a intensificação da circulação de Hadley quando a ZCIT permanece mais ao norte de sua posição normal. Moura e Shukla (1981) mostram que quando a temperatura de superfície do mar (TSM) no Atlântico Norte subtropical está mais alta que a normal e ao mesmo tempo as TSM do Atlântico Sul subtropical mais baixas, o ramo descendente da célula de Hadley é intensificado, causando fortes movimentos subsidentes sobre a Amazônia central e leste e bloqueios no escoamento troposfbrico. Conforme foi mencionado anteriormente, sistemas frontais do Hemisfério Sul que penetram profundamente nos subtrópicos organizam convecção sobre a Amazônia. Esta penetração é afetada pelos bloqueios troposféricos que ocorrem sobre o continente e áreas adjacentes do Pacífico. Em anos com alta frequdncia de bloqueios, um número menor de sistemas frontais alcançam a Amazônia e a precipitação é reduzida. 4. CONSIDERAÇÕES FINAIS As condições meteorológicas na AmazBnia são afetadas por um amplo espectro de fenomenos que variam desde a escala de convecção-cúmulo at6 as configurações da circulação de escala global. Linhas de instabilidade associadas com brisa marítima e perturbações nos ventos allsios, causados por penetraçaes profundas de sistemas frontais nas regiaes subtropicais bem como a convecção organizada por sistemas frontais do Hemisfbrio Sul, posicionados na costa em torno de 200s e orientados NW-SE, parecem Climatologia dinsmica da região Amai6niw: mecanismos de precipitaação das a sistemas frontais extratropicais. O ar atrás da frente é originário das correntes descendentes dos cúmulonimbos que formam a linha e tem características termodinâmicas distintas do ar quente e úmido na vanguarda do sistema; esse ar será levantado pelo sistema, propiciando a forma: ção de novas células. Com a aproximação das linhas, o vento também muda de direção, passando a soprar do quadrante SE-SW e, após sua passagem, torna-se novamente do quadrante leste. Durante à noite, elas apresentam-se menos ativas, mas no dia seguinte intensificam-se devido ao forte aquecimento superficial. Essas linhas podem se propagar com velocidades de cerca de 100 de longitude por dia. A Figura 7 (Lousky, 1983). que mostra um exernplo dessas linhas, foi construída usando a técnica descrita por Wallace (1970). O mosaico é composto de setores de imagens do satélite geoestacionário GOES, estendendo-se de 50N a 50s de latitude, começando às 03:18TMG do dia 21 de Janeiro de 1980 e terminando às 21:18TMG do dia 25 de Janeiro, com intervalo de 3 horas entre cada imagem. A propagação das linhas de instabilidadesé indicada pela banda branca em diagonal formada pela nebulosidade. Estas linhas podem atingir comprimentos superiores a 1000 km, enquanto aquelas formadas pelo processo representado na Figura 6a raras vezes excedem essa marca. A convergência da brisa marítima pode não ser o único mecanismo dinâmico a propiciar a formação destas pertulbações transientes. Foi observado que algumas dessas linhas formam-se ao longo da costa durante a noite. Tais linhas parecem estar associadas a penetrações profundas nos subtrópicos, próximos ao equador, de sistemas frontais extratropicais provenientes de ambos os hemisférios. Essas penetrações profundas causam perturbações no campo dos alísios, que se propagam para oeste e encontram a brisa terrestre, criando, então, zonas de convergência e de convecção profunda ao longo da costa. Essas penetrações profundas parecem ocorrer preferencialmente no período Dezembro-Abril, na ausência de bloqueios atmosféricos. Em outras ocasiões, observou-se a formação de linhas de instabilidade já no interior da Amazônia. Este tipo de linha psde estar associado a intrusões de ar frio, proveniente do Hemisfério Norte, semelhantes às que causam os "Nortes" na America Central e no Caribe, descritas em Hastenrath (1985). zando a convecção local e influenciando na precipitação. Kousky (1979), por exemplo, reporta um estudo de caso de um sistema frontal em Janeiro que, movimentando-se ao longo da costa do Brasil em direção ao equador, provocou o deslocamento do máximo de precipitação de sua posição média na Amazônia central para o leste da.Amaz6nia e NE do Brasil. A precipitação no oeste da Amazônia foi reduzida pelo movimento subsidente compensatório, que inibiu a convecção. Recentemente, Oliveira (1986) inspecionando imagens de satélites geoestacionários, mostrou que muitos sistemas frontais se deslocam ao longo da costa brasileira, às vezes até latitudes subtropicais, sobretudo durante.0 verão do Hemisfério Sul, organizando e intensificando a convecção na Amazônia. Em geral, esses sistemas frontais posicionamse entre 15%-250S, orientados no sentido NW-SE. Existem anos em que esses sistemas frontais permanecem quase-estacionários nessa posição, resultando em grandes quantidades de precipitação sobre a região dos afluentes da margem direita do Amazonas que apresentam, então, grandes cheias. Não se conhece muito bem a causa da persistência dos sistemas frontais estacionários. Aparentemente, parece estar relacionado com bloqueios no escoamento troposf6rico do Hemisfério Sul sobre o Pacífico entre 30-400s de latitude e 90-1000W de longitude. Esta situação está ligada com o fortalecimento do jato subtropical sobre a costa leste do Brasil, em torno de 20% de latitude, que por sua vez, auxilia na manutenção dos bloqueios. É provável, então, que o máximo secundário de precipitaçãd que ocorre na Amazônia Central (Figura 5) esteja associado à convecção resultante desses sistemas frontais. possível, também, que sistemas frontais do Hemisfério Norte influenciem diretamente na precipitação da Amazônia. Molion et al., (1987) apresentaram um estudo de caso para Fevereiro de 1980 em que a passagem de sucessivos sistemas frontais sobre o Atlântico subtropical norte propiciaram penetrações de ar relativamente' mais frio daquele hemisfério no norte da AmBrica do Sul. O ar frio contribuiu para organização de banda de nuvens convectivas, no sentido leste-oeste, em torno de 70s de latitude, que foi intensificada pelos sistemas frontais provenientes do sul do continente. Esses eventos ocasionaram grandes precipitações na Amazônia, Centro Oeste e NE do Brasil. 2.2. Influênciasde Escala Sinóptica 3. VARIABILIDADE INTERANUAL DA PRECIPITAÇAO Vários autores têm descrito os efeitos de penetrações de sistemas frontais do Hemisfério Sul durante o inverno desse hemisfério (e.g. Trewartha, 1961; Brinkman et al., 1971; Parmenter, 1976; Ratisbona, 1976). A maior parte dessas descrições enfatizam os rápidos decr6scimos de 15-200C na temperatura, que duram' de 3 5 dias, e suas consequências para o ambiente. Tais fendmenos são denominados localmente de "friagem". Ocorre, porém, que esses sistemas frontais podem penetrar na Amazbnia em qualquer Bpoca do ano, organi- Nos trópicos, o parâmetro climatológico mais importante é a precipitação. As causas físicas de sua variabilidade interanual na Amazania ainda não são bem conhecidas mas certamente estão ligadas às flutuações de macroescala, principalmente as da intensidade da circulação de HadleyWalker. Estas flutuações. por sua vez, estão relacionadas com a intensidade e a variabilidade, tanto espacial como temporal, das fontes de calor latente nas regiões equatoriais. Luiz Carlos Baldicero Molion explicar os máximos e minimos alternados, característicos da distribuição da precipitação rnédia anual. As interações entre essa gama de processos são importantes na determinação da distribuição da precipitação e sua variabilidade anual. Uma das principais preocup~õesno que se refere às mudanças climáticas é o papel do homem em transformar inadvertidamente a superfície de grandes áreas continentais através da remoção de vegetação natural. Um desmatamento em grande escala na Região Amazônica pode interferir com o clima regional e possivelmente com o clima do globo. É provável que o desmatamento reduza a evaporação local conforme indicam experimentos numéricos (e.g. HendersonSellers and Gornitz, 1984). Considerando que na Amazônia a fonte local de umidade para o processo de precipitação é da mesma magnitude que a umidade advectada, a redução da evaporação mudaria o ciclo hidrológico reduzindo, provavelmente, a precipitação. A floresta, composta de várias camadas de copas e camada de serrapilheira, intercepta cerca de 20% da precipitação anual. A precipitação interceptada é reciclada diretamente sem participar do ciclo de umidade do solo. Quando a cobertura florestal for removida, a chuva que anteriormente era interceptada estará disponível para aumentar o escorrimento superficial, mudando drasticamente sua distribuição média mensal, BRINKMANN, W.L.; WEINMAN, J.A. and RIBEIRO, M.N.G., 1971. Air temperatures in central Amazonia. I. Acta Amazon. 1, 51-56, CAVALCANTI. I.F.A., 1982. Um estudo sobre interações entre sistemas de circulação de escala sinótica e circulações locais. Tese MSc, INPE-2494-TDLl097, Sáo JosB dos Campos, São Paulo. GI LL, A.E., 1980. Some simple solutions for heat-induced tropical circulation Quart. J. Roy: Meteor. Soe., 106, 447-462. HASTENRATH, S., 1985. Climate and Circulation of the Tropics. D. Reidel Pub. Co. Boston, 455pp. and LAMB, P., 1977. Climate Atlas of the Tropical Atlantic and Eastern Pacific Oceans. University of Wisconsin Press, Madison, WI. HENDERSON-SELLERS, A. and GORN ITZ, V.. 1984. 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Este trabalho foi baseado em um -Relatório Técnico do INPE (INPE-2030-RP11050) escrito por V.E. Kousky e L.C.B. Molion. KAYANO, M.T. and CAVALCANTI, I.F.A., 1984. A review of the southern oscillation: Oceanic atmospheric circulation changes and related rainfall anomalies. Tellus, 36A, 490504. MILLER, D.B. and FEDDES. R.G. 1971. Global Atlas of Relative Cloud Cover 1967-1970, U.S. Air Force (AWS) Department of Commerce, NOAA, Washington, DC. MOLION, L.C.B.;CAVALCANTI, 1.F.A.e FERREIRA, M.E., 1987. Influbncia da Circulação do Hernisf6rio Norte na Precipitação pluviom6trica da Amazonia: Um estudo de caso (no prelo). and KAYANO. M.T., 1983. Teleconnections between South America and Western Africa as revealed by monthly precipitation analysis. First International Conference on Southern Hemisphere Meteorology. Sao Jose dos Campos, SE0 Paulo. Brasil, pp. 120-122, American Meteorologiwl Society, Boston, MA. and KAYANO. M.T. 1986. 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