MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PIAUÍ 29ª PROMOTORIA DE JUSTIÇA DE TERESINA PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO Nº 297/2011 RECOMENDAÇÃO ADMINISTRATIVA CONSIDERANDO a tramitação, nesta Promotoria de Justiça, do Procedimento Administrativo nº 297/2011, que trata da paralisação de serviços de saúde, no período de 28/11 a 1º/12, por parte dos médicos da Secretaria Estadual da Saúde, e, os prejuízos causados à saúde/vida dos usuários do Sistema Único de Saúde em razão de tal iniciativa; CONSIDERANDO que, até a presente data, não há tratativas de negociação entre o Sindicato dos Médicos do Piauí (SIMEPI) e a Secretaria Estadual de Saúde (SESAPI), com vistas ao restabelecimento dos serviços de saúde da rede pública estadual; CONSIDERANDO que não há “remédio” eficaz para a paralisação do setor de saúde que por mais justa e breve vai sempre gerar um dano grave e deixar seqüelas; CONSIDERANDO ser o Hospital de Urgência de Teresina (HUT) único serviço de urgência para atender a toda a população piauiense e, no qual estão lotados, aproximadamente, 80 (oitenta) médicos vinculados à Secretaria Estadual de Saúde; CONSIDERANDO que o Hospital Getúlio Vargas (HGV) e o Hospital da Polícia Militar (HPM), não obstante estarem habilitados como hospitais gerais, servem de retaguarda para o HUT, vez que, realizam os procedimentos cirúrgicos dali originários; CONSIDERANDO que no mês de setembro foram transferidos 142 pacientes para o HGV e 130 pacientes para o HPM oriundos do HUT para realizarem procedimentos cirúrgicos ortopédicos; MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PIAUÍ 29ª PROMOTORIA DE JUSTIÇA DE TERESINA CONSIDERANDO que desde o início da paralisação o HGV não realiza cirurgias e, hoje, dia 30/11/2011, apenas, 4 (quatro) pacientes foram transferidos para o HPM para serem operados por médicos vinculados à Fundação Municipal de Saúde (FMS); CONSIDERANDO que os casos complexidade, como aneurisma e cirurgia de coluna, só são operados e, ante a paralisação do atendimento médico nesse hospital, acumulando no HUT, expondo, em tese, a vida ou a saúde pacientes a perigo direto ou indireto; de alta no HGV vão se desses CONSIDERANDO que a paralisação dos serviços de saúde dos hospitais estaduais tem resultado no aumento da procura nos hospitais de urgência, notadamente, no HUT, tanto de pacientes que realmente necessitam de um atendimento urgente quanto de pacientes com doenças crônicas em tratamento, (diabetes, insuficiência cardíaca, asma, DPOC, etc) os quais. não tiveram assegurados os atendimentos ambulatoriais; CONSIDERANDO que a demanda de atendimento do HUT é muito superior a sua capacidade de resolutividade, razão pela qual, o HGV e o HPM complementam a assistência aos pacientes, mediante a realização de cirurgias; CONSIDERANDO que a não realização de cirurgias no HGV, quando esgotada a capacidade de atendimento do HUT, previsível e iminente, pode deixar a população piauiense sem assistência médica; CONSIDERANDO que representantes do SIMEPI, em reunião, nesta data, 30/11/2011, na sede da 29ª Promotoria de justiça, declararam que é possível ocorrer nova paralisação por um período mais duradouro do que a atual, caso atendidas as reivindicações da categoria; CONSIDERANDO, que as mortes ou as ofensas à integridade física dos pacientes ou usuários de serviços de saúde públicos, decorrentes de falta de atendimento médico de urgência MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PIAUÍ 29ª PROMOTORIA DE JUSTIÇA DE TERESINA ou emergência na greve podem caracterizar infração respectivamente aos artigos 121 e 129 do Código Penal, na modalidade de dolo eventual (art.18, II, do Código Penal), a partir do momento em que cada médico, ainda que em greve, deixar de prestar, dentro das atribuições de suas ocupações profissionais, a assistência que lhe cabe, assumindo assim o risco de produzir o resultado; CONSIDERANDO que o direito de greve é indiscutível ante a previsão do art.9º da Constituição Federal e da Lei Federal nº 7783/89, cabendo, apenas, refletir sobre a conveniência e eficácia deste instrumento de reajuste pecuniário à luz dos interesses soberanos da sociedade usuária e da característica especial do serviço público prestador da assistência à saúde; CONSIDERANDO ser o sistema público de saúde bem essencial da sociedade, não apenas pela relevância do serviço prestado, mas, sobretudo pela falta de acesso da população em geral ao setor privado de saúde; CONSIDERANDO que o art. 9º da Lei Federal nº 7.783/89 estabelece ser obrigação do sindicato ou comissão de negociação manter durante a greve equipes de empregados para assegurar os serviços cuja paralisação resultar em prejuízo irreparável; CONSIDERANDO que pela mesma lei são serviços essenciais assistência médica e hospitalar (art. 10, II); CONSIDERANDO que, prevê o art. 11 da multicitada Lei, que “ nos serviços ou atividades essenciais, os sindicatos, os empregadores e os trabalhadores ficam obrigados, de comum acordo, a garantir, durante a greve, a prestação dos serviços indispensáveis ao atendimento das necessidades inadiáveis da comunidade” e, que, “são necessidades inadiáveis, da comunidade aquelas que, não atendidas, coloquem em perigo iminente a sobrevivência, a saúde ou a segurança da população’. Por fim, o artigo 12 explicita que, “ no caso de inobservância do disposto no artigo anterior, o Poder Público assegurará a prestação dos serviços indispensáveis”, ou seja, o Poder Público é obrigado a garantir durante o período de greve a prestação dos serviços indispensáveis às necessidades inadiáveis da comunidade, sendo estas consideradas aquelas que, não atendidas, coloquem em perigo a saúde da população; MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PIAUÍ 29ª PROMOTORIA DE JUSTIÇA DE TERESINA CONSIDERANDO que o artigo 196 da Constituição Federal expressa que “a saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação”; CONSIDERANDO que a Lei Federal n.º 8080/90 (LOS), em seu artigo 2.º, preconiza que “a saúde é um direito fundamental do ser humano, devendo o Estado prover as condições indispensáveis ao seu pleno exercício”; CONSIDERANDO que, segundo o artigo 7.º, inciso XII, da LOS, uma das diretrizes do SUS é a “capacidade de resolução dos serviços em todos os níveis de assistência”; CONSIDERANDO, então, o disposto no artigo 27, parágrafo único, inciso IV, da Lei Federal nº 8.625, de 12 de fevereiro de 1993, de que cabe ao Ministério Público expedir recomendação administrativa; CONSIDERANDO o contido no artigo 127, da Constituição Federal que dispõe que “o Ministério Público é instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis”; CONSIDERANDO o art. 15, da Resolução nº23/07, do Conselho Nacional do Ministério Público que dispõe que “o Ministério Público, nos autos do inquérito civil ou do procedimento preparatório, poderá expedir recomendações devidamente fundamentadas, visando à melhoria dos serviços públicos e de relevância pública, bem como aos demais interesses, direitos e bens cuja defesa lhe caiba promover”; o MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PIAUÍ, ora representado pela Promotora de Justiça Cláudia Pessoa Marques da Rocha Seabra, no uso de suas atribuições legais, resolve: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PIAUÍ 29ª PROMOTORIA DE JUSTIÇA DE TERESINA RECOMENDAR à senhora Secretária Estadual de Saúde, LÍLIAN DE ALMEIDA VELOSO NUNES MARTINS, diante da paralisação dos médicos vinculados à SESAPI: a) que busque o entendimento com o SIMEPI, na pessoa de sua presidente Dra. Lúcia Maria de Sousa Aguiar Santos, visando restabelecer o atendimento médico na rede pública de saúde do Estado e evitar nova paralisação; b) que adote as providências necessárias, inclusive, se cabível, em caráter cautelar, visando à continuidade do adequado atendimento aos pacientes do Sistema Único de Saúde no Hospital Getúlio Vargas e no Hospital da Polícia Militar para o atendimento da demanda excedente de pacientes do HUT, durante o período de greve dos médicos e em nova paralisação, se houver, garantindo a prestação ininterrupta dos serviços de saúde de urgência, observando-se a universalidade e integralidade da atenção, independentemente da contratação ou não de novos profissionais e/ou serviços; c) que adote as medidas administrativas relativas a não prestação dos serviços médicos dos profissionais vinculados ao Estado do Piauí com serventia no HUT, sob pena de prevaricação ( art.319, Código Penal) d) que informe aos médicos vinculados a rede de saúde do Estado que atuam no HUT e, mesmo no HGV e HPM, a respeito das conseqüências de recusa no atendimento, que pode acarretar responsabilização criminal, civil, administrativa e ética daqueles que obstarem, recusarem ou omitirem, de qualquer forma, o imediato tratamento médico da pessoa em risco iminente de vida ou sofrimento intenso. à Presidente do Sindicato dos Médicos do Piauí, Dra. LÚCIA MARIA DE SOUSA AGUIAR DOS SANTOS: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PIAUÍ 29ª PROMOTORIA DE JUSTIÇA DE TERESINA a) que busque o entendimento com a senhora Secretária Estadual de Saúde e o senhor Governador do Estado visando restabelecer o atendimento médico na rede pública de saúde do Estado e evitar nova paralisação; b) que informe aos médicos vinculados a rede de saúde do Estado que atuam no HUT e, mesmo no HGV e HPM, pois, ambos servem de retaguarda para a realização de cirurgias emanadas do HUT, a respeito das conseqüências de recusa no atendimento, que pode acarretar responsabilização criminal1, civil, administrativa e ética daqueles que obstarem, recusarem ou omitirem, de qualquer forma, o imediato tratamento médico da pessoa em risco iminente de vida ou sofrimento intenso. ao Presidente da Fundação Municipal de Saúde, Dr. PEDRO LEOPOLDINO FERREIRA FILHO que: a) determine à Diretora Geral do HUT informar, por escrito, com urgência, à 29ª Promotoria de Justiça, sobre todos os procedimentos médicos de urgência ou emergência que deixarem de ser realizados em virtude da atual greve dos médicos, vinculados ao Estado e lotados no HUT, indicando o nome e endereço do paciente e a natureza do procedimento. Informar, ainda, os óbitos ocorridos, no período da greve, dos pacientes que aguardavam os procedimentos médicos. 1 As mortes ou as ofensas à integridade física dos pacientes, decorrentes de falta de atendimento médico de urgência ou emergência na greve, podem caracterizar infração respectivamente aos artigos 121 e 129 do Código Penal, na modalidade de dolo eventual (art. 18, II, do Código Penal), a partir do momento em que cada médico do HGV e HPM, por serem a retaguarda do HUT, ainda que em greve, deixar de prestar, dentro das atribuições de suas ocupações profissionais, a assistência que lhe cabe, assumindo assim o risco de produzir o resultado. MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PIAUÍ 29ª PROMOTORIA DE JUSTIÇA DE TERESINA Em vista da grave situação anunciada, fica estabelecido o prazo de 48 ( quarenta e oito) horas, a partir do recebimento desta, para manifestação dos destinatários acerca das medidas adotadas em face da presente Recomendação. Encaminhe-se cópia da presente ao Conselho Estadual e Municipal de Saúde, Conselho Regional de Medicina, bem como ao Sindicato dos Médicos do Estado do Piauí. Teresina, 30 de novembro de 2011. CLÁUDIA PESSOA MARQUES DA ROCHA SEABRA Promotora de Justiça em exercício na 29ª PJ/Saúde Pública