CONAMET/SAM-SIMPOSIO MATERIA 2002 “ESTUDO COMPARATIVO DOS AÇOS AISI 316L E DUPLEX SUBMETIDOS À FAIXA DE TEMPERATURA DE 380°C A 480°C USADO EM TROCADOR DE CALOR” A. J. Souza1, R.T. Rego1, G.J.A Perez2 e H.F.G. Abreu 1 1- Universidade Federal do Ceará, Departamento de Engenharia Mecânica, Campus do Pici Bl 714, Fortaleza, Ceará Brasil. 2- Lubrificantes do Nordeste -Lubnor- Petrobrás, Fortaleza, Ceará Brasil e-mail: [email protected], [email protected] . RESUMO Aços inoxidáveis austeníticos e os duplex apresentam boas propriedades mecânicas e resistência à corrosão quando submetidos à elevadas temperaturas e meios corrosivos. Entretanto, tubos de aço inoxidável austenítico AISI-316L usados em trocadores de calor da unidade de reformagem a vapor de uma refinaria, operando na faixa de temperatura de 380°C a 480°C, tem apresentado trincas em períodos de até 6 meses. Uma tentativa para a correção do problema foi a substituição do aço AISI-316L pelo aço inoxidável duplex (austenítico-ferrítico). Esse trabalho tem como objetivo comparar a performance destes aços quando submetidos às mesmas condições de trabalho. Para tanto, foram utilizadas amostras dos tubos de aços inoxidáveis austeníticos AISI -316L e tubos de aço duplex que estiveram em operação num trocador de calor durante 6 meses. Os tubos de AISI 316L situados na região superior do trocador apresentaram trincas. Tubos de aço duplex colocados na mesma região não apresentaram trincas. O trabalho apresenta uma análise das trincas presentes no aço AISI 316L, uma análise da microestrutura dos aço duplex submetidos na mesma condição de operação. As análises levaram a conclusão que a performance do aço duplex foi superior a do aço austenítico AISI 316L que sofreu um processo de corrosão sob tensão. Palavras chaves: Aços inoxidáveis, corrosão sob tensão, trocado de calor. 1. INTRODUÇÃO 1000 100 Tempo de falha (h) 1.1. Corrosão sob tensão em aços inoxidáveis Corrosão sob tensão é um termo em engenharia usado para descrever um processo de propagação de trinca induzido por um determinado meio. A propagação da trinca é resultado da combinação de uma tensão mecânica e de uma reação de corrosão [1]. Um meio bastante comum onde ocorre o processo de corrosão sob tensão é uma solução aquosa rica em cloretos. Além da presença de tensão e do meio a existência de temperatura elevada (>60o C) é normalmente requerida para a ocorrência de corrosão sob tensão em aços inoxidáveis. Os aços inoxidáveis austeníticos são sujeitos a corrosão sob tensão que podem ser induzidas não só por ácidos clorídricos mas também por ácidos fluorídricos ou ácidos politiônicos. Este último acontece se a superfície estiver sensitizada. O risco de corrosão sob tensão em aços inoxidáveis é afetado pela presença de níquel e pela microestrutura. Conteúdo elevado e baixo de níquel, conforme apresentado na figura 1, fornecem ao aço inoxidável uma maior resistência a corrosão sob tensão. 10 1 0,1 0 10 20 30 40 50 Conteúdo de Ni (%) Figura 1- Corrosão sob tensão em função do conteúdo de Ni em uma atmosfera de Mg2Cl2.[2] Os aços com baixo conteúdo de Ni possuem uma estrutura ferrítica ou austenítica-ferrítica (aços duplex). A fase ferrítica em aços inoxidáveis tem excelente resistência a corrosão sob tensão. Os materiais com alto teor de Ni são ligas, por exemplo, da família Sanicro da Sandvik. Vale salientar que o percentual de Ni não é o único fator que influencia a resistência a corrosão sob tensão. O percentual de Mo também tem efetiva influencia na resistência a corrosão sob tensão. Percentuais superiores a 4% são necessários para determinar um efetivo aumento na resistência a corrosão sob tensão. - 1.2. Aços Inoxidáveis duplex A classe de aços inoxidáveis dúplex contém uma mistura de grãos de ferrita e austenita. Uma microestrutura completamente ferrítica é formada durante a solidificação. A transformação parcial para austenita ocorre durante o resfriamento, com a precipitação de austenita na matriz ferrítica. Durante a laminação a quente e recozimento, a microestrutura conserva -se dentro do campo bifásico do diagrama de fases Fe -Cr-Ni, constituindo -se de lamelas alternadas de ferrita e austenita. Os aços inoxidáveis dúplex são processados por laminação a quente ou forjamento e laminação a frio seguido por um recozimento de recristalização conveniente, e têmpera para equalizar a proporção das duas fases [3]. A figura 2 apresenta uma microestrutura típica de um aço inoxidável dúplex. - Melhor ductilidade e tenacidade do que os aços inoxidáveis ferríticos. Melhor soldabilidade do que os ferriticos, pelo menos no que diz respeito ao crescimento de grãos na ZTA e no metal de base. O aço duplex quando submetido a temperat uras em torno de 475o C estão sujeitos a uma decomposição espinoidal onde é formada uma fase rica em cromo e bastante frágil. 2.0 Materiais e Métodos Num sistema de troca de calor em uma refinaria de petróleo foi realizada a substituição nas tubulações de aço inoxidável AISI 304L de ¾” de diâmetro de uma unidade de gás de reforma. Os tubos utilizados no reparo foram de AISI 316L, porém alguns tubos de Aço Duplex SAF 2205 foram instalados com o objetivo de analisar o comportamento. A tabela I apresenta composição química típica dos dois aços utilizados no reparo. Tabela I – Composição típica dos aços AISI 316L e SAF 2205. AISI 316L 2205 C 0,04 0,02 Cr 17 22 Ni 12 5 Mo 2,7 3 N 0,06 0,17 Figura 2 Microestrutura de um aço inoxidável dúplex UNS S31803: a ferríta é a fase escura e a austenita é a fase clara [4]. A montagem dos tubos no espelho do trocador foi efetuada após uma operação de mandrilhamento nas extremidades de modo a permitir o encaixe com interferência no espelho. Decorridos seis meses do reparo os tubos de AISI 316L apresentaram vazamento devido a trincas na região mais próxima do espelho. Os tubos foram retirados e classificados de acordo com a posição no trocador. Foram analisadas as trincas utilizando-se microscópio ótico e eletrônico de varredura. Foram feitas análises de micro -dureza Vickers nas amostras de AISI 316L e de SAF 2205. Há dois grandes grupos de aços inoxidáveis dúplex: as ligas forjadas e as ligas fundidas. Tabela 2.2. Composição de alguns aços inoxidáveis dúplex fundidos [5]. Como principais características, os aços inoxidáveis dúplex apresentam: Excelente resistência a corrosão, conferida pelas adições de Mo e N e pela elevação do teor de Cr. Esses elementos aumentam a resistência a corrosão por pites. Além disso, por conter cerca de 50% de ferrita, os aços inoxidáveis dúplex possuem melhor resistência a corrosão sob tensão do que os aços inoxidáveis austeníticos. Resistência mecânica superior a dos aços inoxidáveis austeníticos e ferríticos, devido ao efeito de refino de grão obtido pela estrutura bifásica e ao endurecimento por solução sólida. 3.0 Resultados e Discussão Ao ser aberto para reparo, o trocador de calor que apresentou vazamento, verificou-se que todos os tubos de AISI 316L da parte superior do trocador apresentavam trinca na região mais próxima do espelho. Os tubos da parte inferior, durante a operação, estão sempre molhados, isto é, sempre submersos na água. Os tubos da parte superior porém, são submetidos a temperaturas mais elevadas por falta de resfriamento ou por vaporização na região. A figura 3 apresenta aspecto de uma trinca circunferencial na região limite à que sofreu o processo de mandrilhamento. Os tubos no trocador são engastados no espelho. Esta região próxima ao engastamento é a de maior nível de tensão aolongo de todo tubo. Na análise da trinca observou-se que ela acontecia da região interna do tubo para a região externa. trinca transgranular intergranular. Figura 3- Aspecto macroscópico da trinca circunferencial em tubo AISI 316L com ¾’’ de diâmetro. A figura 4 apresenta o aspecto metalográfico da trinca. A metalografia foi obtida em microscópio eletrônico de varredura (MEV) com um aumento de 150 vezes. Observa-se na figura o aspecto retilíneo da trinca caracterizando ser predominante de uma trinca transgranular. Na figura 5 pode-se observar em detalhe a característica transgranular da trinca. e outras com aspecto Figura 6- Aspecto da micrografia da trinca apresentando características transgranular e intergranular em tubo de AISI 316L. Trincas transgranulares em aços inoxidáveis austeníticos são normalmente originárias da presença de cloretos e altas tensões residuais. A presença de cloretos não é usual em uma unidade de reforma, no entanto o vapor ou o vapor condensado injetado no trocador pode ocasionalmente transportar sólidos ricos em cloretos em períodos de grande demanda. A tabela II apresenta resultado da média de 5 microdurezas medidas na região próxima a fratura e numa região longe da fratura. Tabela II- Micro-dureza medidas nos tubos de AISI 316L AISI 316L HV Região Fora da Região 186 de Fratura Região de Fratura 247 Figura 4Aspecto de uma trinca predominantemente transgranular em tubo de AISI 316L. Figura 5- Detalhe do aspecto transgranular da trinca em um tubo AISI-316L. A figura 6 apresenta o aspecto tri -dimensional da trinca apresentando regiões que caracterizam uma Os valores altos de dureza na região mandrilhada indicam que os tubos sofreram deformação plástica nesta região e não foram submetidos a um tratamento térmico de recozimento após a deformação a frio. A região deformada a frio apresenta alto nível de tensões residuais. A combinação da tensão elevada, meio e temperatura implicou na falha por corrosão sob tensão. Os tubos de aço duplex SAF 2205 não apresentaram trinca quando submetidos às mesmas condições de operação. O aço duplex devido a exis tência da fase ferrítica é mais resistente à corrosão sob tensão, porém está sujeito à decomposição espinoidal resultando numa fase frágil rica em cromo. O não trincamento dos tubos de aço duplex confirmou a maior resistência à corrosão sob tensão. Foram analisadas as microdurezas na região onde aconteceu a trinca nos tubos de AISI 316L e em regiões distantes desta. Foi também realizado um levantamento da dureza ao longo do tubo que ficou posicionado na região molhada e conseqüentemente longe da temperatura de decomposição espinoidal. A tabela III apresenta os valores destas durezas medidas na ferrita. Observa-se que a dureza dos tubos localizados na região quente é mais elevada que os localizados na região fria sugerindo o surgimento da fase α’ rica em cromo. A dureza do tubo novo é 260 HV. Tabela III – Micro-durezas medidas na fase ferrita ao longo dos tubos de aço duplex. HV- Região Quente HV- Região Fria 320,0 299,4 342,9 272,0 336,9 280,7 331,2 292,2 328,3 299,4 A caracterização da fase α’ rica em cromo por metalografia é bastante difícil. A figura 7 apresenta metalografia óptica de um tubo situado na região superior que de acordo com os resultados da medição da dureza apresentam a existência da fase α’ rica em cromo. Nela não fica caracterizada a existência de uma outra fase além da ferrita e austenita. Figura 7 – Metalografia de tubo de aço inox situado na região superior do trocador. Aumento: 1500X. Ataque: Murakami. Fase escura: Ferrita, fase clara: Austenita 4.0 - Conclusão O trocador de calor de gás de reforma apesar de não operar com cloretos pode esporadicamente transportar sólidos ricos em cloretos propiciando um ambiente favorável ao processo de corrosão sob tensão em aços austeníticos. A análise das trincas no aço inoxidável AISI 316L aponta para um processo de corrosão sob tensão como causa da falha dos tubos. O efeito da temperatura no processo de corrosão sob tensão é marcante já que os tubos da parte inferior submetidos a temperaturas inferiores não apresentaram trincas. O aço inoxidável AISI 316L não resiste a corrosão sob tensão em meio de ácido clorídrico e temperatura superior a 400o C. O aço inoxidável duplex SAF 2205 possui resistência à corrosão sob tensão em meio de ácido clorídrico superior ao aço inoxidável austenítico AISI 316L. Na temperatura de operação do trocador de calor, isto é, superior a 400 O C, o aço duplex SAF 2205 forma fase α’ rica em cromo que torna frágil o material. 5.0 Referências 1. Jones, R.H., Stress Corrosion Cracking, ASM International, 4 th Edition, 1999. 2. Sedriks, A.J., Corrosion of Stainless Steel, John Wiley & Sons, 2nd Edition, 1996. 3. Reick, W., Pohl, M., Padilha, F.A., “Recristalization- Transformation Combined Reactions during Annealing of a Cold Rolled Ferritc- Austenitic Dúplex Stainless steel”, ISIJ International vol. 38, nº 6, pp 567-571, Fev. 1998. 4. Hedin, M., Massoud, J.P., Danoix,F. “Influence of the Quenching Rate on the Spinodal Decomposition in a Dúplex stainless steel”, Journal de Physique IV vol. 6, Coloque C5, supplément au Journal de Physique III, pp C5 235-240, Set 1996. 5. Tavares, S.S.M., “O maravilhoso mundo dos aços inoxidáveis” Apostila do departamento de Engenharia Mecânica UFF, 1997.