Narrativas de vida em mulheres com câncer de mama: um relato de

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VIVÊNCIA DA UTILIZAÇÃO DO MÉTODO HISTÓRIA DE VIDA EM PACIENTES
COM CÂNCER DE MAMA: RELATO DE EXPERIÊNCIA
EXPERIENCE OF USING THE METHOD OF LIFE HISTORY IN PATIENTS WITH
BREAST CANCER: REPORT OF EXPERIENCE
EXPERIENCIA DE USO DEL MÉTODO DE LA HISTORIA DE VIDA EN PACIENTES
CON CÁNCER DE MAMA: INFORME DE LA EXPERIENCIA
Samara Dourado dos Santos Moraes1
Inez Sampaio Nery2
RESUMO: objetiva-se descrever a experiência na obtenção de relatos utilizando o
Método História de Vida. Entrevistou-se treze mulheres que vivenciaram o câncer
de mama e utilizaram práticas integrativas e complementares em seu tratamento.
Vários momentos foram marcantes como a estratégia de aproximação com as
depoentes e o próprio relato emocionante de cada mulher. Possibilitou-se a
compreensão da importância da construção de uma identidade de pesquisadora
para o estabelecimento de um vínculo que resulte em uma relação de confiança
necessária para que sejam relatadas verdadeiras histórias de vida.
Palavras-chave: História de Vida; Enfermagem; Câncer de Mama
ABSTRACT: objective to describe the experience in obtaining reports using the Life
History Method. We interviewed thirteen women who experienced breast cancer and
complementary and integrative practices used in their treatment. Several moments
were striking as the strategy of approaching the interviewee and the very exciting
story of each woman. Enabled to understand the importance of building an identity as
a researcher for the establishment of a bond that results in a relation of trust required
to be reported real life stories.
Keywords: Life History, Nursing, Breast Cancer
RESUMEN: tiene como objetivo describir la experiencia en la obtención de informes
utilizando el método historia de vida. Entrevistamos a trece mujeres que sufrieron
cáncer de mama y prácticas complementarias e integradoras utilizados en su
tratamiento. Varios momentos fueron sorprendentes como la estrategia de
acercamiento al entrevistado y la historia muy interesante de cada mujer. Permitido
comprender la importancia de construir una identidad como investigadora para el
establecimiento de un vínculo que resulta en una relación de confianza que han de
notificarse vida real.
Palabras clave: Historia de Vida, Enfermería, el cáncer de mama
1
Enfermeira. Mestranda do Programa de Pós-Graduação em Enfermagem da Universidade Federal
do Piauí(UFPI). Enfermeira plantonista da Maternidade Dona Evangelina Rosa( MDER). Enfermeira
da Estratégia Saúde da Família de Teresina-pi . Professora da Faculdade Santo Agostinho( FSA).
Teresina – PI
2
Enfermeira. Doutora em Enfermagem. Profa. Associado II do Departamento de Enfermagem e do
Programa de Mestrado em Enfermagem e Políticas Públicas da Universidade Federal do Piauí
(UFPI). Teresina-PI
INTRODUÇÃO
O câncer de mama é uma doença de significação diferenciada, pois traz
consigo toda uma simbologia que permeia o processo de construção social da
doença, uma vez que a sua vivência transcende a dimensão biológica do fenômeno.
Seu diagnóstico traz mudanças e dificuldades que geram na vida da mulher
uma gama de sentimentos que alteram a imagem corporal, diminuem a autoestima
interferindo diretamente na sua qualidade de vida. A doença atinge a unidade
mente-corpo-espirito necessitando assim de uma assistência holística1.
Nesse contexto, as práticas integrativas e complementares surgem
possibilitando uma assistência integral e preenchendo as lacunas deixadas no
tratamento convencional do câncer que em sua maioria considera apenas o aspecto
biológico da doença.
Diversos são os fatores que desencadeiam a busca por alternativas que
contemplem aspectos biopsicossociais para melhorar a qualidade de vida das
pessoas.
Esta
crescente
busca
direciona
para
a
utilização
de
práticas
complementares no intuito de suprir suas necessidades2.
Essas práticas são consideradas um conjunto de ações de prevenção,
diagnóstico e tratamento fora do modelo biomédico que, em vez de se opor a
doença impedindo certas manifestações sintomáticas, tenta compreender suas
causas envolvendo o indivíduo ao seu modo de vida 3,4. Consideram o indivíduo
como um todo e não meramente um conjunto de partes isoladas. Sendo o ser
humano mente, corpo e espírito ele necessita de uma assistência holística que o
contemple em todos os aspectos de sua existência.
Diversas são as práticas integrativas e complementares utilizadas nas
pacientes com câncer . Spadacio e Barros5, em um estudo de revisão , encontraram
que os tipos mais utilizado em pacientes com câncer são: homeopatia, medicina
ayurvédica, medicina tradicional chinesa, fitoterapia, terapias psíquicas e espirituais,
grupos de apoio, relaxamento e meditação, dietas e reflexologia.
A utilização de práticas integrativas e complementares está diretamente
relacionada ao alívio físico da dor, alívio emocional, diminuição dos efeitos colaterais
de medicamentos alopáticos, melhora no funcionamento do sistema imunológico e
aumento da qualidade de vida 6.
O uso das práticas integrativas e complementares tem um sentido
sociocultural importante na construção da identidade de paciente com câncer,
ajudando-os inclusive nas tomadas de decisão em relação ao próprio tratamento
convencional5.
Baseado nesse novo contexto e na prática profissional no cuidado à mulher,
despertou-nos
o
interesse
em
trabalhar
com
as
práticas
integrativas
e
complementares na área de oncologia. No nosso cotidiano profissional, observava
que muitos pacientes, principalmente as que vivenciavam câncer, utilizavam
recursos terapêuticos complementares junto ao tratamento alopático, e estes
proporcionavam benefícios.
Assim, optou-se por trabalhar as práticas integrativas e complementares em
mulheres com câncer de mama em virtude das repercussões biopsicossociais desta
doença que interferem diretamente na qualidade de vida, necessitando assim de
práticas assistenciais holísticas. Como método de investigação escolhemos a
Historia de Vida, numa abordagem qualitativa, por ser adequada ao objeto de
estudo: a percepção dos efeitos das práticas integrativas e complementares na
qualidade de vida de mulheres com câncer de mama.
Os métodos qualitativos são flexíveis e particulares em relação ao objeto de
estudo, evoluem ao longo da investigação, dessa forma é graças a essa
flexibilização que se consegue maior aprofundamento e detalhamento dos dados 7.
Das abordagens qualitativas, a mais apropriada foi o Método História de
Vida, pois ele é um método de pesquisa que privilegia as informações contidas na
vida pessoal de um ou vários informantes.
O método História de Vida faz parte do quadro referencial da metodologia
qualitativa biográfica e é um método que tem como principal característica a
preocupação com o vínculo entre pesquisador e sujeito 8.
Para entender-se melhor o significado do termo História de Vida, Bertaux9
explica a diferença entre as expressões inglesas “life history” e “life story”, traduzidos
do francês “histoire”. O sociólogo americano Denzin propôs, em 1970, a distinção
das terminologias: life story (a estória ou o relato de vida) é aquela que designa a
História de Vida contada pela pessoa que a vivenciou. Nesse caso, o pesquisador
não confirma a autenticidade dos fatos, pois o importante é o ponto de vista de quem
está narrando.
Quanto à life history (ou estudo de caso clínico), compreende o estudo
aprofundado da vida de um indivíduo ou grupos de indivíduos. Inclui, além da própria
narrativa de vida, todos os documentos que possam ser consultados, como dossiês
médico e jurídico, testes psicológicos, testemunhos de parentes, entrevistas com
pessoas que conhecem o sujeito, ou situações em estudo. Assim, a história de vida
trabalha com a estória ou o relato de vida, ou seja, a história contada por quem a
vivenciou9.
Dessa forma, foi utilizado esse método buscando descrever as práticas
integrativas e complementares utilizadas por mulheres portadoras câncer de mama
e analisar, a percepção destas mulheres dos efeitos das práticas integrativas e
complementares em sua qualidade de vida.
As investigações na Enfermagem têm buscado maior aproximação com os
sujeitos do estudo, procurando escutá-los, e não apenas tratá-los como simples
objeto de pesquisa, numa relação impessoal e fria. Assim, o método História de Vida
oportuniza aos pesquisadores aprender a ouvir o sujeito que vivenciou a situação
que se quer estudar, o que implica em tê-lo como um parceiro, como alguém que é
ativo no estudo e que reflete sobre sua própria vida10.
O método começa a partir do desejo do entrevistado de contar sua vida.
Pede-se ao sujeito que conte sua história, como achar melhor. É a partir da relação
que vai sendo estabelecida - o vínculo, a confiança, a construção de sentidos - que o
método se desenvolve. Ao contar sua vida, o sujeito fala de seu contexto - fala do
processo por ele experimentado, intimamente ligado à conjuntura social onde ele se
encontra inserido13.
Recolher narrativas de vida exige todo um percurso metodológico, onde o
mais difícil não é conduzir a entrevista e sim criar um clima favorável a ela. Torna-se
necessário construir a identidade de pesquisador por meio da aproximação com os
sujeitos, pois só assim será construído o vínculo e a confiança necessária para que
seja relatada uma história de vida12.
Com base nesse momento, que é de extrema importância para aproximação
entre sujeito e pesquisadora, bem como de grande relevância para os resultados
obtidos e refletindo sobre a interação sujeito-pesquisadora é que relatamos nossa
experiência na obtenção dos depoimentos de treze mulheres com câncer de mama
que utilizam práticas integrativas e complementares.
APROXIMAÇÃO DO GRUPO E OBTENÇÃO DOS RELATOS
Considerando o objeto de estudo investigado: a percepção dos efeitos das
práticas integrativas e complementares na qualidade de vida de mulheres com
câncer de mama foi incluído como depoentes do estudo as mulheres que
participavam do Grupo de Apoio às pacientes em tratamento do câncer de mama Amigas do Peito.
Este grupo é uma iniciativa voluntária de profissionais de saúde para dar
apoio às paciente com câncer de mama. Tem encontro quinzenal e uma população
flutuante em torno de quinze mulheres. A escolha por trabalhar com o Grupo
“Amigas do Peito” deveu-se por ele ser composto em sua maioria de mulheres que
já estão na fase de controle do câncer de mama, tendo assim uma História de Vida
pra contar. Acrescenta-se o fato de ser um grupo de apoio onde as mulheres
participam de sessões de ioga nos encontros, ou seja, essas pacientes já possuem
um contato com as práticas integrativas e complementares.
Inicialmente, tivemos contato com a psicóloga que conduzia o grupo.
Explicamos a ela o objetivo da pesquisa que iria aplicar o Método História de Vida.
Falei sobre a importância da construção da nossa identidade de pesquisadoras para
que fosse construído com os sujeitos um vínculo, uma relação de confiança
necessária para a coleta dos relatos.
Vale destacar que é importante a relação de confiança que se estabelece
entre entrevistadora e entrevistado para a obtenção dos relatos de vida. Esta relação
torna a entrevista um momento mágico de exteriorização de sentimentos, emoções,
angústias e mágoas13.
Assim, após autorização da instituição, foi iniciado contato com as mulheres
do Grupo “Amigas do Peito”. O contato era sempre após as reuniões. Houve
apresentação como enfermeiras e pesquisadoras do câncer de mama e a partir daí
iniciamos conversas informais que nos proporcionaram uma aproximação com os
sujeitos. Foram três encontros que aconteciam após as reuniões e no último, para
nossa surpresa, fomos convidadas para participar da festa de confraternização de
natal do grupo.
Esse momento, foi relevante, pois permitiu uma maior familiarização sujeitopesquisadoras e enriquecedor como ser-humano já que percebemos a experiência
transformadora que é vivenciar o câncer.
A confraternização aconteceu no próprio local das reuniões. Houve
discursos, trocas de presentes e lanche. Passamos amanhã inteira lá e foi tudo tão
bom que não vimos o tempo passar. Fomos tão bem acolhidas pelo grupo que
chegamos a nos emocionar. Nessa ocasião mulheres perguntaram quando era o
inicio das entrevistas. Uma delas pediu pra que iniciasse com ela, pois iria viajar. Foi
aí que percebemos que tínhamos conseguido estabelecer o vínculo necessário para
iniciar a coleta dos relatos de vida.
Assim, após essas estratégias de aproximação das depoentes houve
segurança para dar início as entrevistas. Foram atendidos a todos os procedimentos
éticos, como aprovação pelo comitê de ética da UFPI (Parecer nº CAAE
0322.0.045.000-10),
autorização
da
instituição,
assinatura
do
Termo
de
Consentimento Livre e Esclarecido, como rege a resolução 196/96.
Os sujeitos que participaram foram treze mulheres que estavam em
tratamento do câncer de mama e que participavam do Grupo “Amigas do Peito”. A
primeira entrevista foi realizada no ambulatório da instituição de realização da
pesquisa e serviu de ambientação à técnica proposta pelo método. A princípio houve
dificuldades, como a de manter-se calada no decorrer do procedimento. Essa
entrevista serviu de base para adaptação e correção.
Calar-se não constitui uma tarefa fácil principalmente para as enfermeiras
que são treinadas para falar, interagir e intervir na comunidade. Porém por muitas
vezes é preciso calar, pois nem sempre as pessoas querem ouvir uma opinião. Às
vezes elas necessitam apenas de alguém para escutá-las. Esse é um cuidado que
merece atenção da pesquisadora que escolhe o Método História de Vida como
metodologia a ser utilizada em seu estudo13.
As entrevistas subsequentes foram realizadas no próprio local de realização
do encontro do grupo, após as reuniões, no ambulatório da instituição e no próprio
domicílio conforme a preferência das depoentes. Era considerado sempre um tempo
de preparo de uma hora como parte integrante do trabalho de pesquisa. Durante
esse tempo era retomado o roteiro de entrevista, refletíamos sobre o objeto de
estudo e objetivos e escrevia em um caderno de campo.
Buscávamos sempre um lugar adequado no local marcado para a entrevista
a fim de deixar a depoente mais a vontade e evitar interrupções. Era explicado as
mulheres a proposta do trabalho, a importância do estudo e como poderiam
colaborar. A adesão foi quase total, pois houve recusa de apenas duas mulheres
que frequentavam o grupo.
Durante os depoimentos as mulheres se emocionavam em alguns
momentos e houve confiança dos relatos às vezes até de outras questões não
aplicadas ao estudo. As entrevistas foram de grande aprendizagem por está ouvindo
alguém contar sua História de Vida sobre um momento tão difícil de ser vivenciado.
A superação demonstrada por aquelas mulheres foi uma experiência transformadora
para quem é pesquisador.
Houve mulheres que optaram por realizar a entrevista em suas residências e
isso trouxe certa dificuldade, pois seus domicílios eram distantes da região onde
morava e para sua localização gastava muito tempo tanto pelo desconhecimento do
bairro como pelo medo em adentrar determinadas áreas perigosas. Porém toda essa
dificuldade era recompensada quando chegava em seus lares e lá essa mulheres
estavam já esperando de forma acolhedora para a realização da entrevista. Nunca
houve desencontro e elas sempre lá estavam conforme o combinado.
Por inúmeras vezes ficava na volta para casa após o término das
entrevistas, refletíamos. O câncer é uma experiência transformadora na vida de
quem o vivencia e de seus familiares. As histórias de superação confiada naquelas
narrativas de vida nos proporcionou uma profunda reflexão como pessoa e como
enfermeira que presta cuidado ao ser humano.
A utilização do Método História de vida foi de extrema importância para a
aproximação pesquisador-sujeito permitindo assim a coleta de treze verdadeiras
narrativas de vida.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Após a realização das entrevistas compreendemos a importância de se
construir uma identidade de pesquisador para que a partir daí se estabeleça um
vínculo que resulte em uma relação de confiança necessária para que sejam
relatadas verdadeiras histórias de vida. Observamos assim que o difícil não é
conduzir bem a entrevista, mas criar condições favoráveis a ela.
Essa vivência possibilitou identificar que a utilização do Método História de
Vida foi fundamental para a compreensão da percepção dos efeitos das práticas
integrativas e complementares na qualidade de vida de mulheres com câncer de
mama.
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