O Método Da Capo: Banda de Música, Educação, Sociologia e

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O Método Da Capo: Banda de Música, Educação,
Sociologia e pontos de convergência.
José Alípio de Oliveira Martins
Regente da Escola Técnica de Artes
Universidade Federal de Alagoas
Resumo: Este Artigo pretende fazer de forma resumida uma abordagem da metodologia Da Capo do Prof. Joel
Barbosa (Ufba). No que se refere às formas de ensino das Filarmônicas, perceber estudos de Educação Musical
e aplicação de instrumentos de Banda e as interfaces com a Educação em geral e a sociologia, especificamente
quando se abordam temas como identidade de grupo e ensino coletivo musical.
Palavras-chave: Ensino Coletivo, Banda de Música e Identidade.
O entendimento do tocar em grupo, buscando tecnologias modernas para a eficiência do
processo ensino aprendizagem, constituem acima de tudo, aspectos musicais na teia de significadas
concepções educativas, composicionais, nas execuções, ou seja, no fazer musical e no caso do ensino
em grupo, sempre foi discutida a sua eficiência pedagógica e por muitas vezes questionado quanto a
sua aplicação, forma de ensino, avaliação e o desempenho obtido.
Desta forma, abordo a seguintes questões:
1. As novas metodologias do ensino coletivo obtêm o resultado esperado?
2. O método Da Capo abrange contexto e conteúdo metodológico satisfatório?
3. As metodologias de Banda são possíveis nas escolas brasileiras 1?
O Ensino coletivo
Há programas de ensino coletivo, não só em instrumentos de Banda, de sopro, como também em
violão, piano entre outros. Uma amostra disto são os Cursos Livres-Oficinas de Piano em Grupo da
Universidade Federal da Bahia, que por muitos anos foi coordenado pela Profª.Drª Diana Santiago.
Existem muitos motivos para termos convicção das vantagens de ensino em grupo, conforme Santiago:
O tempo do professor é melhor utilizado, os alunos se preparam melhor por efeito da
presença do grupo; aprendem a ter mais confiança em si próprios; têm mais tempo que
nas aulas individuais para se recobrarem dos erros cometidos, o que é favorável à
construção de uma auto-imagem positiva; aprendem por imitação uns com os outros;
recebem maior estímulo para o desenvolvimento das habilidades de crítica, audição
interiorizada e interpretação; adaptam-se desde o início a tocarem para os outros; têm a
oportunidade de serem expostos a uma maior literatura instrumental; podem ser
introduzidos com vantagem sobre os alunos que têm aulas individuais no estudo da
notação musical, história da música e teoria (SANTIAGO, 1995: 75).
1
O contexto citado refere-se às escolas regulares do ensino fundamental e médio.
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O emprego da Banda de Música atuando em nossa comunidade seja ela em sociedade civil,
agremiação ou em unidade escolar, podem ser analisados atualmente não só como elemento formal de
educação musical, mas um conjunto musical que auxilia na educação de todos os envolvidos, sendo
elemento sócio-cultural a serviço dos próprios integrantes, alunos-musicos, pais e mestres participando
da vida social. Historicamente, a exemplo dos Estados Unidos, nas High School 2 , o ensino da Música,
do ensino coletivo com Banda de Música, se insere no currículo escolar desde as primeiras etapas da
musicalização e a definição do instrumento do educando decorre em fase posterior, onde a Banda é um
elemento seqüencial em toda biografia escolar do aluno:
...Nos Estados Unidos da América a criança tem seus direitos, em um documento legal
sobre os Direitos Musicais da Criança, em cujo Art IV consta que todas elas a
oportunidade de desenvolver o conhecimento, a prática e a apreciação musical, através
da instrução ao que é igualmente ministrada a outras matérias dos programas de
Educação pública, oferecidos à criança (ANDRADE,1986:10).
Voltando a realidade brasileira, na maioria das vezes o que se encontra, são grupos de Fanfarra
ou de percussão regional, que na informalidade, em muitos casos, os professores são monitores,
músicos amadores, sem formação acadêmica e apesar disto, muitos são eficientes, podendo satisfazer
a cada proposta de trabalho em alguma escola ou localidade. É raro encontrar nas Instituições de ensino
fundamental médio, estrutura para o desenvolvimento de Bandas de Música Escolares. Tais
agremiações são portanto um modo eficiente e célere de aprendizado e que apresenta condições de
musicalizar jovens, bem como possibilitar um repensar do ensino formal de música nas escolas dentro
do currículo de Educação Artística em geral.
O Da Capo e interface com outras filosofias
Enfoque do ensino de grupo não está apenas relacionado à aprendizagem musical. É claro que
antes de pensarmos em uma educação musical podemos paralelamente pensar nos grandes
pensadores da pedagogia da Educação e na Sociologia, refletindo sobre tal importância do ensinar
coletivamente. Se fundamentarmos as filosofias do ensino coletivo de uma maneira ideológica geral,
podemos dizer que o ensino musical concomitantemente pode está baseado filosoficamente também
em teóricos como Vigotsky 3, defensor da análise do reflexo do mundo exterior no mundo interior dos
indivíduos a partir da interação desses com a realidade sendo o ponto de uma aprendizagem mais
eficiente, pois na troca com outros sujeitos, o indivíduo internaliza o conhecimento, papel e função
social, o que permite a constituição cognitiva e a própria formação da consciência. Este raciocínio do
referencial histórico-social vigotskyano enfatiza a construção do conhecimento como uma interação
mediada por várias relações e como na linguagem, esta alusão da coletividade, dessa interação, age
decisivamente na organização do raciocínio, reestruturando funções psicológicas como memória,
atenção, formação de conceitos e o Da Capo, que citaremos detalhadamente adiante, ou outro método
semelhante, sendo um ensino coletivo musical que proporciona a interação no conceito musical,parte
desse pensamento.
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High School são instituições de ensino Americanas. Em paralelo com as escolas brasileiras comparáveis ao ensino fundamental e médio.
L.Vigotsky, professor e pesquisador russo que viveu na Rússia na revolução comunista elaborou uma teoria que tem por base o
desenvolvimento do indivíduo como resultado de um processo sócio-histórico e o papel da linguagem e da aprendizagem e esta relação
pensamento-aprendizagem em suas implicações no processo desse desenvolvimento intelectual.
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Outra filosofia que compartilha o entendimento do grupo como instrumento de aprendizagem, se
encontra na Sociologia Educativa citada por Durkheim 4. Para este sociólogo a educação desempenha
função de integração, que pode ser entendida como uma função de homogeneização através do qual
“certo número de idéias, de sentimentos e práticas é praticada indistintamente... que compreende a
preparação da criança para sua futura atividade ocupacional ou profissional” (DURKEIM, 1973:15).
Retornando a questão musical, dicotomicamente vimos que o ensino coletivo gera outras
conseqüências não só educativas, mas ações coletivas criando costumes inovadores. Para a
professora Margareth Arroyo, as práticas de aprendizagem musical são “muito mais do que ações
musicais acompanhadas de elementos pedagógicos, ela também acaba sendo um papel de criador de
cultura” 5. Ainda sobre o enfoque de Educação no que diz respeito a música como transformador e
“criadora” de cultura segundo Keith Swanwick, educador musical inglês, afirma que todos nós temos um
“sotaque musical” e que nasce em contextos sociais, fazendo intercambio com outras atividades
culturais, instituindo a possibilidades de podemos ver a musica “além de suas relações com origens
locais e limitações de função social” (Swanwick, 2003: 38), ou seja, ela evolui e se adapta em diferentes
espaços onde segundo ele os insigths sempre podem acontecer mesmo em culturas distintas.
O Método
O Prof. Joel Barbosa, da Universidade Federal da Bahia, paulista radicado na Bahia, cria o
método Da Capo em 2000. Baseado nos métodos modernos de ensino coletivo instrumental dos
Estados Unidos, o Da Capo, em seu título original, “Adaptation of American Instruction Methods to
Brazilian Music Education Using Brazilian Melodies” teve sua tradução pelo próprio autor, em seu
retorno do doutoramento nos Estados Unidos, como “Da Capo: Método elementar para ensino Coletivo
ou individual de instrumentos de banda”, realizando uma abordagem com músicas folclóricas
brasileiras, e rapidamente foi requisitado por muitos mestre de Banda e adeptos do ensino coletivo de
grupo. Tal método foi editado pela editora brasileira Keyboard em 2004.
O Da Capo adapta o aprendizado com músicas folclóricas brasileiras aproximando aos alunosmusicos de sua realidade melódica diferente dos métodos tradicionais trazidos para o Brasil, baseados
na Europa, particularmente Itália, Portugal e Alemanha, países historicamente ligados as Bandas de
Música. Dentre as características do método está o fato do aprendiz ter o contato do instrumento desde
a primeira aula, e durante a aplicação possibilita além da banda a criação de conjuntos, formações
menores como duos, trios, quartetos, no próprio corpo musical trabalho, cunhando desta forma uma
forte auto estima, uma motivação. O método consiste em utilizar músicas com células rítmicas simples,
utilizando a teoria e a prática no instrumento simultaneamente diferente da tradicional (Execução
separada da teoria). Assim pela necessidade de métodos, de materiais didáticos de ensino coletivo, de
caráter informativo e da tentativa de experimentar outras idéias pedagógicas no ensino da técnica
musical dos alunos, fez com que o Prof. Joel Barbosa desenvolvesse o Da Capo. Sobre o mesmo,
Barbosa cita:
4
Émile Durkheim (1858-1917); sociólogo Francês, que desenvolveu o “Sistema sociológico” e definiu a sociologia como disciplina de estudo
nas Universidades a partir de 1887.
5
Margareth Arroyo: Um Olhar Antropológico sobre Praticas de Ensino e Aprendizagem Musical.Revista da ABEM, nº 5, 2000.
6
Em 2000, ainda em formato de fotocópia, o Da Capo foi aplicado na iniciação em Indiaroba, cidade sergipana que se localiza a 110 km de
Aracaju, capital do Estado, foi a primeira cidade no Estado a utilizar o Da Capo. O seu primeiro regente foi o Professor José Alípio Martins e o
próprio autor, Joel Barbosa, verificou o resultado do aprendizado e aplicação do método 4 anos depois.
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Os métodos americanos usados no Brasil trazem só música americana e os alunos
brasileiros tinham dificuldade em cantar as melodias. É importante cantar quando se está
aprendendo um instrumento para que haja um desenvolvimento musical completo, não
apenas instrumental. O método é desenvolvido passo a passo com 126 lições. Em cada
lição, o aluno aprende uma ou duas notas no instrumento, aprende duas músicas novas,
aprende um novo ritmo. Em cada página vai ter melodias para cantar...Há um estudo
muito profundo nesta área, há diversas correntes. No Brasil não temos nada. Lá [ Estados
Unidos], você faz experimento com a Banda e pode medir o desenvolvimento dos alunos,
existem vários testes de avaliação, desde 1926, que é o mais antigo que pesquisei
(PEREIRA, 1999: 53).
Se fizermos comparativos as filosofias e métodos tradicionalmente conhecidos de Educação
musical abrangemos outras idéias, linhas de pensamento concernente ao método mencionado como o
de Zoltan Kodaly (1882-1967), importante compositor húngaro. Para Kodaly a música deveria estar em
sistema educacional como qualquer outro, com aspecto a ser desenvolvido no ser humano, visando a
sua formação integral, afirmações dos defensores do ensino coletivo. Dois dentre os enfoques
defendidos pelo método Da Capo é a música folclórica já acima citada e o canto no processo desta
aprendizagem musical. Kodaly defende que:
É uma verdade longamente aceita o fato do canto ser o melhor início para a educação
musical...a música folclórica não deve ser omitida nunca... o sentido das relações entre a
linguagem e a música (KODALY,1974).
Conclusões
O Da Capo é sem dúvida nenhuma uma das ótimas possibilidades de resultados imediatos e
facilmente adaptáveis em uma estrutura pedagógica regular em qualquer unidade escolar brasileira.
Portanto o Da Capo sendo um ensino musical coletivo proporciona a interação no contexto musical entre
os aprendizes e eles com as ações de relações coletivas dessa prática.
Referências Bibliográficas
ANDRADE, Hermes de. O “B” da banda, Rio de Janeiro: Andrade, 1986.
ALMEIDA, Renato. Historia da música brasileira. 2. ed, Rio de Janeiro: F. Briguiet, 1942.
ARROYO, Margareth.Um Olhar Antropológico sobre Praticas de Ensino e Aprendizagem
Musical.Revista da ABEM, nº 5, 2000.
BARBOSA, Joel Luis S. Adaptation of American Instruction Methods to Brazilian Music Education Using
Brazilian Melodies. Tese de Doutorado. Washigton, EUA: 1994.
BRUM, Oscar da Silveira. Conhecendo a Banda de Música. Rio de Janeiro: Ricordi Brasileira, 1980.
DURKHEIM, Émile. As regras do método sociológico. São Paulo: Abril Cultural, 1973.
FERREIRA, José Antonio. A Banda de Música; Retratos Brasileiros. Dissertação de Mestrado, São
Paulo: UNESP, 1999.
KODÁLY, Zoltan. Children's Choirs, 1929. In: BONIS, F. (Ed.). The Selected Writings of Zoltan Kodály.
London, UK: Boosey and Hawkes, 1974.
OLIVEIRA, A. Fundamentos da Educação Musical, Revista da ABEM, 07, Vol.02, n. º 03, Salvador:
ABEM, 1993.
SANTIAGO, Diana et al. Parâmetros Curriculares para o Desenvolvimento de Habilidades Musicais
Funcionais. Relatório de Pesquisa, trabalho não publicado, Salvador: Ufba, 1998.
________. As Oficinas de Piano em Grupo da Escola de Música da Ufba, Revista da ABEM, 74-81, Porto
Alegre: ABEM, 1989-1995.
SWANWICK, Keith.Ensinando música musicalmente.Tradução Alda Oliveira e Cristina Tourinho.São
Paulo: Moderna, 2003.
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