infecção pelo hpv e o desenvolvimento de vacinas profiláticas e

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UNIVERSIDADE CASTELO BRANCO
ATUALIZA ASSOCIAÇÃO CULTURAL
CITOLOGIA CLÍNICA
PÂNDULLA SANTOS NASCIMENTO
INFECÇÃO PELO HPV E O DESENVOLVIMENTO DE
VACINAS PROFILÁTICAS E TERAPÊUTICAS
SALVADOR - BAHIA
2012
PÂNDULLA SANTOS NASCIMENTO
INFECÇÃO PELO HPV E O DESENVOLVIMENTO DE
VACINAS PROFILÁTICAS E TERAPÊUTICAS
Monografia apresentada à Universidade Castelo
Branco e Atualiza Associação Cultural, como
requisito parcial para obtenção do título de
Especialista em Citologia Clínica, sob orientação do
Professor Dr. Fernando Reis do Espírito Santo.
SALVADOR - BAHIA
2012
PÂNDULLA SANTOS NASCIMENTO
INFECÇÃO PELO HPV E O DESENVOLVIMENTO DE VACINAS
PROFILÁTICAS E TERAPÊUTICAS
Monografia para obtenção do grau de Pós-Graduado em Citologia Clínica.
Salvador, ______ de _________ de 2012.
EXAMINADOR:
Nome: _____________________________________________
Titulação: ___________________________________________
PARECER FINAL:
__________________________________________________________________
__________________________________________________________________
__________________________________________________________________
__________________________________________________________________
__________________________________________________________________
AGRADECIMENTOS
Agradeço a Deus por me dar sabedoria para enfrentar os desafios na vida e
conquistar mais uma vitória.
Agradeço também aos meus filhos, Maria Fernanda e Eduardo, e marido
por entenderem minha ausência em alguns momentos.
E a todos, que contribuíram de alguma forma para realização deste
trabalho.
“...Quando alguém encontrar seu caminho, não pode ter medo. Precisa ter
coragem suficiente para dar passos errados. As decepções, as derrotas, o
desânimo são as ferramentas que Deus utiliza para mostrar a estrada.”
Paulo Coelho
RESUMO
Este estudo trata do desenvolvimento de vacinas profiláticas e terapêuticas para
alguns tipos de Papilomavírus Humano (HPV - Human Papilloma Virus), já que
este provoca lesões que são encontradas na pele, no aparelho respiratório, bexiga
e nos tratos anogenitais masculino e feminino, sendo definido como o agente
etiológico do câncer cervical. O controle da transmissão do HPV e o diagnóstico
precoce são fundamentais para a sua prevenção. Logo, com o advento da
biotecnologia, as vacinas têm se apresentado como ótimas tecnologias para a
saúde das populações, com perspectivas de incorporação de novas vacinas nos
sistemas de saúde. Nesse contexto, tem se desenvolvido estudos com vacinas
profiláticas e terapêuticas contra alguns tipos de HPV e os tumores associados a
eles. Os estudos começaram há alguns anos nos EUA e hoje, as vacinas já são
aceitas e recomendadas em mais de uma centena de países, as quais tem se
mostrado seguras, bem toleradas, altamente imunogênicas e eficazes contra os
tipos de HPV incluídos nas vacinas. Essa pesquisa tem como objetivo evidenciar,
a partir da literatura, que esse tipo de ferramenta em um sistema público de saúde
poderá ter um impacto imediato na redução no número de novos casos e mortes
associadas à doença, principalmente em países em desenvolvimento. Trata-se de
uma pesquisa quanto a natureza do tipo qualitativa, quanto aos objetivos do tipo
exploratória e quanto ao procedimento, caracteriza-se como bibliográfica. Esse
trabalho nos mostrou que apesar de as vacinas conferirem imunidade contra os
HPV mais prevalentes, há a possibilidade de infecção por outros tipos de HPV de
alto risco não incluídos nas vacinas. Por esse motivo, ainda se faz necessária a
prevenção secundária do câncer de colo do útero mediante citologia cervical. A
mulher vacinada deverá ser esclarecida a esse respeito e orientada a fazer
periodicamente visitas ao ginecologista.
Palavras-chave: Papilomavírus; Infecção; Vacinas; Profiláticas; Terapêuticas.
ABSTRACT
This study deals with the development of prophylactic and therapeutic vaccines for
some types of human papillomavirus (HPV-Human Papilloma Virus), since this
causes lesions that are found on the skin, respiratory tract, bladder and anogenital
abuse in male and female, being defined as the etiological agent of cervical
cancer. Control of transmission of HPV and early diagnosis are key to its
prevention. Soon, with the advent of biotechnology, vaccines have been presented
as great technologies for the health of the populations, with the prospect of
incorporating new vaccines in health systems. In this context, has developed
studies on prophylactic and therapeutic vaccines against some types of HPV and
the tumors associated with them. The study began a few years ago in the u.s. and
today, vaccines are already accepted and recommended in over a hundred
countries, which has been shown to be well tolerated, safe, highly immunogenic
and effective against HPV types included in vaccines. This research aims to
highlight, from the literature, that this type of tool in a public health system could
have an immediate impact on the reduction in the number of new cases and
deaths linked to the disease, mainly in developing countries. It is a search for the
nature of qualitative type as exploratory and objectives regarding the type,
procedure characterized as bibliography. This work showed us that despite
vaccines confer immunity against the HPV more prevalent, there is the possibility
of infection by other high-risk HPV types not included in vaccines. For this reason,
it is still necessary for secondary prevention of cancer of the cervix by cervical
cytology. Woman vaccinated should be clarified in this respect and guided to do
periodically visits to the gynecologist.
Keywords: Papillomavirus; Infection ; Vaccine; Prophylactic; Therapies.
SUMÁRIO
1.Introdução...........................................................................................................
08
2.Referencial teórico..............................................................................................
12
2.1.Papilomavírus Humano - HPV.........................................................................
12
2.1.1.Estrutura viral................................................................................................
15
2.1.2.Classificação.................................................................................................
16
2.1.3.Transmissão do HPV....................................................................................
18
2.1.4.Fatores de risco para aquisição da infecção................................................
19
2.1.5.Patogênese..................................................................................................
21
2.1.6.Diagnóstico...................................................................................................
25
2.1.7.Imunologia do HPV......................................................................................
26
2.2.Desenvolvimento de Vacinas..........................................................................
32
2.2.1.Vacinas Profiláticas para HPV no Brasil e no mundo...................................
34
2.2.2.Estratégias de desenvolvimento de Vacinas Terapêuticas...........................
37
3.Considerações finais............................................................................................
41
4.Referências...........................................................................................................
44
5.Anexos..................................................................................................................
50
8
1. INTRODUÇÃO

Apresentação do objeto de estudo
Câncer é o nome dado a um conjunto de mais de 100 doenças que têm em
comum o crescimento desordenando de células, que invadem tecidos e órgãos.
Dividindo-se rapidamente, estas células tendem a ser muito agressivas e
incontroláveis, determinando a formação de tumores malignos, que podem
espalhar-se para outras regiões do corpo. As causas de câncer são variadas,
podendo ser externas ou internas ao organismo, estando inter-relacionadas.
(www2.inca.gov.br/wps/wcm/connect/cancer/site/oquee)
O Câncer de colo do útero demora muitos anos para se desenvolver. As
alterações das células que podem desencadear o câncer são descobertas
facilmente no exame preventivo (conhecido também como Papanicolaou), por
isso é importante a sua realização periódica. A principal alteração que pode levar
a esse tipo de câncer é a infecção pelo papilomavírus humano (HPV), com alguns
subtipos
de
alto
risco
e
relacionados
a
tumores
malignos.
(www2.inca.gov.br/wps/wcm/connect/tiposdecancer/site/home/colo_utero)
O papilomavírus Humano (HPV - Human Papilloma Virus) pertence à família
Papovavirus, e são vírus formados por uma dupla cadeia de DNA. A infecção por
esses vírus provoca lesões que são encontradas na pele - diversos tipos de
epidermodisplasias verrucosas -, no aparelho respiratório (BYRNE e cols., 1987),
bexiga urinária (DEL MISTRO, KOSS et al., 1988) e nos tratos anogenitais
masculino e feminino.
O HPV infecta, geralmente, as células epiteliais da pele e/ou mucosas, gerando
as lesões verrucosas ou condilomas, e possuem especial afinidade pelos
queratinócitos
do
epitélio
poliestratificado
pavimentoso
(SILVA
FILHO,
LONGATTO, 2000). Taxas de infecção variam e dependem da quantidade de
partículas de vírus, o tipo, intensidade e duração do contato e também estado de
9
imunidade do paciente (BRAUN et al., 1997).
O HPV está relacionado a 99% dos casos de câncer do colo, sendo que a curva
da prevalência/incidência está relacionada, na maioria das regiões, com a idade.
É a infecção sexualmente transmitida mais comum do trato genital feminino. Não
existem dúvidas de que, em alguns países, o aumento da promiscuidade sexual,
a diminuição da idade da primeira relação sexual, e a abolição do uso de condom
a favor da contracepção oral aumentam a frequência da infecção por HPV
(ENGEL E NICOLICH, 2008).
Somente o HPV 16 é responsável por aproximadamente metade dos casos de
câncer do colo do útero, além de estar envolvido na gênese de outros tumores
anogenitais, como vulva, pênis e ânus, embora em proporções muito menores
(BONNEZ, REICHMAN, 2005).
As vacinas são substâncias, como proteínas, toxinas, partes de bactérias ou
vírus, ou mesmo vírus e bactérias inteiros, atenuados ou mortos, que ao serem
introduzidas no organismo de um animal, suscintam uma reação do sistema
imunológico semelhante à que ocorreria no caso de uma infecção por um
determinado agente patogênico, desencadeando a produção de anticorpos que
acabam por tornar o organismo imune ou, ao menos, mais resistente, a esse
agente (e às doenças por ele provocadas). (pt.wikipedia.org/wiki/Vacina)
A vacina contra HPV foi criado com o objetivo de prevenir a infecção pelo HPV e,
dessa forma, reduzir o número de pacientes que venham a desenvolver câncer de
colo de útero. Foram desenvolvidas duas vacinas contra os tipos mais presentes
no câncer de colo uterino (HPV-16 e HPV-18). Uma delas é a quadrivalente, ou
seja, previne contra os tipos 16 e 18, presentes em 70% dos casos de câncer de
colo de útero e contra os tipos 6 e 11, presentes em 90% dos casos de verrugas
genitais. A outra, bivalente, é específica para os subtipos 16 e 18.
(www.virushpv.com.br/novo/hpv_vacina.php)

Justificativa
Monografia apresentada destacando a relação entre a infecção por HPV e o
10
desenvolvimento de vacinas profiláticas e terapêuticas de vido, assumindo assim
importância pela provável relação da infecção viral com câncer e pela
possibilidade de ser transmitido por via sexual. Dessa forma, o estudo da
papilomavirose passa a ser fundamental, uma questão de saúde pública
(JACYNTHO, 2001).
Neste contexto, o desenvolvimento de métodos alternativos de prevenção e
tratamento passa a ser explorado no campo da vacinação, com a pesquisa de
vacinas profiláticas e terapêuticas contra o HPV. As vacinas tem se apresentado
como tecnologias prioritárias para a saúde das populações, devido a intensas
transformações no desenvolvimento científico e tecnológico, a partir de
investimentos crescentes por parte das indústrias, juntamente com o incentivo das
organizações internacionais para financiamentos em pesquisas na área e
incorporação de novas vacinas nos sistemas de saúde (HARDON, BLUME,
2005).
As pesquisas com vacinas profiláticas começaram há alguns anos nos EUA e,
hoje, aproximadamente 25.000 mulheres, em vários países, participam de
estudos sobre essa vacina, que até o momento tem se mostrado segura, bem
tolerada, altamente imunogênica e eficaz contra os tipos de HPV que causam as
verrugas genitais e 70% dos casos de câncer do colo do útero (VILLA et al, 2005).

Problema
Até que ponto as vacinas conferem imunidade contra a infecção pelos HPVs?

Objetivo
Evidenciar, a partir da literatura, aspectos da infecção pelo Papilomavírus
Humano e a aplicação de vacinas profiláticas e terapêuticas, demonstrando a
viabilidade desse método como ferramenta preventiva e clínica nas infecções por
HPV.

Metodologia
Esta pesquisa é considerada quanto à natureza qualitativa, já que seu objetivo é a
caracterização do problema, sua classificação e sua definição. Quanto aos
11
objetivos é do tipo exploratório, pois este tem como objetivo proporcionar maior
familiaridade com o problema, tornando-o mais explícito ou a construir hipóteses.
Quanto ao procedimento, classifica-se como uma pesquisa bibliográfica, pois se
trata de uma revisão literária, elaborada a partir de material já publicado,
constituído principalmente de livros, artigos e materiais disponibilizados pela
internet (Gil, 1991)

Estrutura do trabalho
Tal estudo é constituído de três momentos. No primeiro momento comentou-se
sobre o câncer, dando ênfase para o câncer de colo de útero. O segundo
momento, foi composto por uma visão geral do HPV relatando sua estrutura,
classificação, formas de transmissão, infecção, diagnóstico e a imunologia do
HPV. No último momento, evidenciou-se as vacinas, dando maior importância ao
desenvolvimento de vacinas profiláticas e terapêuticas no combate à infecção por
HPV e tumores e cânceres associados.
12
2. REFERENCIAL TEÓRICO
2.1 PAPILOMAVÍRUS HUMANO
O papilomavírus foi descoberto em 1933 por Shope e Hurst a partir de lesões em
coelhos selvagens, transmitidos aos animais por extrato filtrado sem nenhuma
célula, deduzindo-se assim que se tratava de doença de origem viral. Mais de 60
espécies animais são possíveis portadoras de papilomavírus. Em algumas, a
infecção é associada ao desenvolvimento de tumores em sua maioria, benignos.
No homem, o papilomavírus humano se associa a verrugas cutâneas e
vegetações venéreas ou condilomas acuminados (GOMPEL, KOSS, 1997). Em
geral, cada tipo de papiloma vírus é específico para cada espécie, tipo de epitélio
e localização anatômica.
A família de vírus do papilomavírus humano é composta por mais de 100
genótipos, ou tipos, hoje descritos na literatura. Cerca de 40 dos genótipos são
responsáveis
por
infecções
na
área
anogenital
humana,
dos
quais,
aproximadamente, 18 são oncogênicos: HPV 16, 18, 26, 31, 33, 35, 39, 45, 51,
52, 53, 56, 58, 59, 63, 66, 68 e 82. Os demais tipos genitais, HPV 6, 11, 42, 43 e
44 são considerados de baixo risco ou sem qualquer risco oncogênico (FLORIN,
2002).
Os condilomas ou lesões benignas estão associados a HPVs ditos de baixo risco
pois não são encontrados esses vírus nos cânceres do colo de útero. Os tipos 6 e
11 são geralmente encontrados nas lesões condilomatosas acuminadas planas e
nas lesões de baixo grau (SILVA FILHO, LONGATTO, 2000). Tais lesões
acuminadas podem ser diagnosticadas por esfregaço cervical e confirmação pela
biópsia sob controle colposcópico.
A replicação viral nas células epiteliais ligada à diferenciação celular é associada
a um efeito citopatogênico denominado de Coilocitose. Esse aspecto morfológico
é comum a todos os tipos de HPVs que infectam a área anogenital, oncogênicos
ou não (GOMPEL, KOSS, 1997). Os coilócitos são células em vias de lise e que
13
demonstram a alta atividade viral por meio do grande número de cópias virais que
estão sendo produzidas em seu interior.
Essas lesões intraepiteliais (de baixo e alto graus – Sistema Bethesda, 1989) são
caracterizadas por acantose do epitélio epidermóide, sem modificação das
camadas basais, que permanecem bem organizadas, porém com presença de
atipias nucleares, aneuploidia frequente e mitoses anormais (GOMPEL, KOSS,
1997).
O câncer do colo de útero, doença de evolução lenta, geralmente se inicia por
essas lesões intraepiteliais de baixo grau ou displasias e que apresentam,
histologicamente, uma desorganização da arquitetura do epitélio malpighiano.
(GOMPEL, KOSS, 1997). Por esse motivo, o câncer de colo de útero é um
importante problema de saúde populacional, saindo das estimativas de incidência
nas regiões mais pobres do mundo e tendo alta prevalência também nos países
em desenvolvimento.
Os vírus, particularmente o Herpes vírus simplex e o Papilomavírus humano, são
os mais estudados e os mais importantes fatores vinculados ao desenvolvimento
do câncer da cérvice. A infecção pode preceder à alteração neoplásica e
contribuir para a formação da lesão, constituindo-se de verdadeiro fator
carcinogênico. O HPV tem sido localizado em lesões de baixo e alto graus pela
microscopia eletrônica, imunocitoquímica e pelos métodos de hibridização e PCR
- reações em cadeias da polimerase (SILVA FILHO, LONGATTO, 2000).
As estimativas mundiais indicam que 20% dos indivíduos sadios estejam
contaminados com papilomavírus humano. O número de novos casos de
infecções associadas ao vírus do HPV na área anogenital atingiu 1 milhão de
casos por ano, e o número de pacientes do sexo feminino prevalece dominante.
Dentre os novos casos estima-se que 70% ocorrem em países em
desenvolvimento. (SCHEINFELD, LEHMAN, 2006). A maior parte das infecções é
assintomática e aproximadamente 90% dos casos estão relacionados a
carcinomas espinocelulares anais.
Observa-se uma baixa prevalência nas mulheres mais velhas comparada com as
14
mais jovens. Um estudo de coorte observou que 36% das infecções estavam
presentes antes dos 25 anos e apenas 2,8% acima dos 45 anos (BURK et al.,
1996). Outro estudo encontrou um pico máximo entre 20 e 24 anos (MELKERT et
al., 1993).
A infecção por certos tipos de HPV oncogênicos se mostra importante para
explicar a presença de uma lesão pré-cancerosa, por outro lado, são necessários
cofatores para favorecer o desenvolvimento de uma lesão pós-infecção por HPV
oncogênico, como mutações de genes intracelulares e alterações no controle
imunológico (GOMPEL, KOSS, 1997).
O câncer de colo do útero ocorre principalmente entre 35 e 50 anos, quando as
mulheres estão ativamente envolvidas em suas profissões ou cuidando de suas
famílias (ARBYN ET AL, 2010).
O câncer cervical é a segunda causa mais
comum de morte por neoplasias no sexo feminino do mundo. Nos países menos
desenvolvidos, ocorrem 80% dos casos, com maiores índices na África e América
Latina
(CASTELLSAGUÉ,
2008),
atingindo
mulheres
de
baixo
nível
socioeconômico e escolaridade baixa.
O diagnóstico precoce e o controle dessas neoplasias baseia-se, há mais de 40
anos, na observação de alterações morfológicas de esfregaços cervicais. Em
países onde a citologia oncótica foi ampliada para a maior parte da população,
observou-se uma diminuição importante da incidência e mortalidade por esse
tumor.
Infelizmente, uma fração muito pequena, não superior a 15%, da população
feminina brasileira está envolvida em um programa de prevenção do câncer do
colo uterino, o que explica, em parte, as altas incidências dessa neoplasia no
Brasil. No entanto, mesmo em países desenvolvidos, com ampla cobertura da
população por programas de prevenção, existe uma porcentagem importante de
mulheres que continuam sucumbindo à doença devido a falhas do teste de
Papanicolau (BOSH, SANJOSE, 2002).
Quanto ao tratamento, é importante lembrar que não existe método ideal, uma
vez que se tratam as lesões decorrentes da infecção ou sucessivas infecções, e
15
não propriamente, o vírus no organismo. A utilização de vacinas profiláticas tenta
reverter esse quadro, se mostrando mais uma ferramenta estratégica de controle
da transmissão do HPV e prevenção da infecção, que está muito associada a
comportamentos sexuais não seguros. Nesse sentido, ações educativas que
visem informar e conscientizar as populações a cerca dos cuidados pessoais e
riscos associados às infecções por HPV, tanto na transmissão conjunta com
DSTs, quanto ao tratamento das lesões e possível desenvolvimento de
carcinomas, seriam mais eficazes com a administração concomitante de vacinas
profiláticas em grupos de risco.
A aprovação e introdução das vacinas contam com muitos pontos favoráveis,
como a segurança, imunogenicidade e eficácia da prevenção de infecções por
alguns tipos de HPV e lesões precursoras de câncer cervical, contudo várias
questões ainda não foram bem esclarecidas, como o tempo de duração da
imunidade da vacina e o custo-benefício em termos de saúde pública, a real
proteção cruzada contra outros tipos de HPV e possíveis impactos nos outros
tipos virais que a vacina não confere imunidade, o papel do exame Papanicolaou
neste contexto, a importância das campanhas preventivas de modo a não
contribuir com o aumento de DSTs para que as mulheres vacinadas não passem
a ter comportamentos não seguros, pela certeza da efetividade da vacinação, e a
necessidade de vacinação para os homens.
2.1.1 ESTRUTURA VIRAL
O HPV é um vírus com duplo feixe de DNA circular, composto por 8.000 pares de
bases variando de 5 a 8 Kbp de tamanho. São vírus pequenos, não
encapsulados, com simetria icosaédrica, 72 capsômeros e divididos em região
reguladora (LCR - long control region), que contém a origem de replicação (ORI) e
a maioria dos promotores de transcrição. As regiões codificadoras são
denominadas ORF (open reading frames), que são divididas nas sequências
Precoce e Tardia (SOUTHERN, HERRINGTON, 1998).
A região precoce (E - early), de aproximadamente 4,5 Kb, codifica as proteínas
envolvidas na replicação do DNA viral e transformação-imortalização celular das
16
quais se destacam E1, E2, E6 e E7 e região tardia (L - late), de cerca de 2,5 Kb,
codifica as proteínas do capsídeo (L1 e L2), responsáveis pelas etapas finais da
replicação do vírus, como a síntese de proteínas estruturais do capsídeo
(FINNEN, 2003; FLORIN et al, 2002).
Para que sejam classificados dentro de um mesmo tipo, os genomas não podem
variar mais do que 2% na região codificante ORF e 5% na região LCR. Sendo
assim, pequenas variações no seu genoma originam diferentes tipos de HPV.
Sabe-se que as proteínas E6 e E7 dos HPVs 16 e 18 formam complexos com as
proteínas anti-oncogênicas p53 e p105-Rb, respectivamente, e que essas
interações influem, pelo menos em parte, no poder de transformação desses dois
vírus (GOMPEL, KOSS, 1997).
A descoberta de que a proteína L1 é capaz de organizar-se em partículas de
estrutura icosaédrica, semelhantes ao capsídeo viral, VLPs (virus-like particles),
mas sem o DNA do vírus, possibilitou o avanço do conhecimento sobre a
imunogênese
do
HPV
e
o
desenvolvimento
das
vacinas
profiláticas
(CHRISTENSEN et al, 1994).
2.1.2 CLASSIFICAÇÃO
Inicialmente, admitia-se que somente um único vírus seria responsável por todas
as lesões ligadas às infecções por HPV. Contudo, estudos bioquímicos,
imunológicos e principalmente de biologia molecular permitiram identificar os mais
de 120 genótipos, e por tanto, classificações, para os diferentes tipos de HPV, nos
últimos anos (SILVA FILHO, LONGATTO, 2000).
A base da nomenclatura dos papilomavírus humanos repousa no degrau de
homologia que existe entre os genomas virais: uma hibridização cruzada inferior a
50% define tipos distintos de vírus (GOMPEL, KOSS, 1997).
Mais de 120 genótipos já foram catalogados, sendo que 40 deles podem infectar
a região anogenital. Entre esses, os tipos 16, 18, 31, 33, 35, 39, 45, 51, 52, 56,
17
58, 59 e 68 são considerados de alto risco, devido a sua associação com o câncer
cervical e seus precursores, as neoplasias intraepiteliais cervicais (NIC). Outros
tipos, como os 6, 11, 42, 43, 44 e outros mais raros são tidos como de baixo risco
ou não oncogênicos e usualmente provocam condilomas anogenitais (FRANCO,
HARPER, 1994). A maioria das doenças relacionadas é causada por quatro tipos:
o HPV 6 e o 11 são responsáveis pelas lesões de baixo grau e 90% das verrugas
anogenitais, e os tipos 16 e 18 provocam 70% das NIC de alto grau e o câncer
cervical invasivo (WILEY, MASONGSONG, 2006).
Os tipos de HPV já descritos foram completamente sequenciados e, a maior parte
destes está distribuída mundialmente, sendo observadas algumas diferenças na
prevalência de tipos individuais através dos cinco continentes (CONSOLARO,
MARIA-ENGLER, 2012).
A infecção por HPV 16 e 18, juntos, são responsáveis por aproximadamente 70%
dos tumores de colo de útero. A cada ano, cerca de 500.000 novos casos dessa
neoplasia são diagnosticados no mundo e, destes, em torno de um terço resulta
em óbito (CONSOLARO, MARIA-ENGLER, 2012).
Atualmente, a técnica mais aplicada aos estudos de DNA-HPV nas secreções
vaginais e células infectadas, tantos nos esfregaços quanto em tecidos, é a
Hibridização do ácido nucléico. Mais recentemente, a hibridização evoluiu até as
reações em cadeias da polimerase – PCR – que permitem a identificação de
quantidades muito pequenas de genoma viral em espécimes infectados (SILVA
FILHO, LONGATTO, 2000).
Com a introdução dos métodos imunoenzimáticos, tem sido possível revelar
antígenos de HPV em 0,5 a 5% das células parabasais, intermediárias e
metaplásicas dos esfregaços cervicais. Aproximadamente 9% das células são
positivas quando dois terços da espessura epitelial estão comprometidos com
neoplasias de alto grau; lesões condilomatosas e neoplasias de baixo grau
revelam, com mais frequência, a presença de antígenos HPV (SILVA FILHO,
LONGATTO, 2000).
18
Segundo o Comitê de Nomenclatura de Papilomavírus, a taxonomia viral em
sistemas filogenéticos comparam o genoma viral completo ou fragmentos
subgenômicos específicos. O gene tardio L1 é o mais conservado e por isso é
usado para identificação de novos vírus. Os HPVs relacionados com lesões na
região anogenital são designados alfapapilomavírus. Tal gênero é composto por
15 espécies, das quais os HPVs de alto risco oncogênicos pertencem às espécies
6, 7 e 9. Os betapapilomavírus incluem os tipos virais associados à EV, uma
doença cutânea com componente genético (CONSOLARO, MARIA-ENGLER,
2012).
2.1.3 TRANSMISSÃO
A transmissão do HPV é feita preferencialmente pelo contato sexual, contudo
outras vias alternativas têm sido descritas, embora a importância delas seja mais
incidental do que epidemiológica. Existe ainda a possibilidade de contaminação
por materiais – fômites – atingindo os pequenos lábios e os grandes lábios, a
vulva, vagina e colo do útero, bem como o prepúcio e zona perigenital de homens
com frequência, são áreas também afetadas. Além da transmissão por relação
heterossexual, a transmissão homossexual também é possível. Neste contexto de
pacientes, as lesões pelo HPV podem também ser observadas na área perianal e,
não raramente, no canal anal (DUPIN, 2004).
Estudos epidemiológicos indicam consistentemente que o risco da aquisição é
fortemente influenciado por número de parceiros sexuais, idade em que ocorre a
primeira relação sexual e comportamento sexual dos parceiros masculinos. O
HPV pode ser transmitido por contato direto dos órgãos genitais durante a prática
sexual, por relações anais que podem resultar em infecções virais e neoplasias
anais e, ocasionalmente, pelo sexo oral (FRANCO, DUARTE-FRANCO,
FERENCZY, 2001).
Outra forma de transmissão ocorre por meio de micro cortes, muito comuns
durante a relação sexual, o que não exige a presença da penetração para que
ocorra a transmissão, o que pode tornar o método preventivo da camisinha pouco
útil para evitar o contágio. O HPV não se instala apenas internamente; ele pode
19
estar inoculado na virilha, nas coxas, ao redor da região genital. Outra forma de
se adquirir, apesar de mais rara, é no contato com toalhas, sabonetes e outros
objetos de uso pessoal. (STIVANIN, 2006).
A infecção, ainda, pode ser transmitida durante o parto, ao recém-nascido e
posteriormente poderá causar papilomatose juvenil da laríngea (KASHIMA, 1987).
A manifestação clínica de verrugas anogenitais dos recém-nascidos de vários
meses de idade, é um sinal alarmante e deve alertar os pais e profissionais de
saúde sobre possível abuso sexual, que, segundo alguns autores, é responsável
por até 43% dos casos (INGRAM et al, 1992). A autocontaminação na criança e a
heterocontaminação da mãe para a criança são possíveis a partir de verrugas
vulvares na esfera anogenital externa (CAMPOS, 2005).
A via iatrogênica, por pinças de biópsias, luvas, roupas ou a fumaça do laser deve
ser destacada entre os clínicos, apesar dos dados epidemiológicos serem quase
desprezíveis, da importância de se limpar bem, com agentes virucidas, todos os
materiais utilizados em consultas ginecológicas e de colposcopia (GOMPEL,
KOSS, 1997).
Certos comportamentos aumentam o risco de contágio com o papilomavírus e,
consequentemente o câncer cervical, como tabagismo, o consumo de álcool, o
uso de contraceptivo hormonal e alimentação pobre em betacarotenos e
vitaminas C e E. Certas condições clínicas também podem atuar como fatores de
risco, tais como uso de drogas imunossupressoras e infecções sexualmente
transmitidas por Chlamydia trachomatis, herpes simples e HIV (TROTTIER,
FRANCO, 2006).
2.1.4 FATORES DE RISCO PARA AQUISIÇÃO DA INFECÇÃO
Alguns pontos são descritos na literatura como fatores de risco para a aquisição
de infecção por HPV e o desenvolvimento de câncer cervical invasivo. A idade é
um deles. A maior incidência ocorre entre os 20 e 40 anos de idade, que coincide
com o pico da atividade sexual (DE PALO, 1993).
Os estudos apontam a existência de uma forte associação entre a idade do início
20
de atividade sexual, número de parceiros e a maior prevalência de infecção pelo
HPV. A circuncisão masculina reduz o risco de infecção por HPV no homem em
63% e câncer cervical em suas parceiras em 68% (PEREYRA, PARELLADA,
2003).
Uma consistente associação entre tabagismo e o desenvolvimento de infecção
por papilomavírus e câncer cervical tem sido demonstrada por diversos estudos,
contudo a evidência biológica para tal fator de risco ainda é obscura. As lesões
pré-cancerosas do colo são mais frequentes nas fumantes, contudo isto poderia
ser o reflexo de um modo de vida sexual e não da resultante de uma ação
cancerígena. Sabe-se que a nicotina e outros carcinógenos específicos do tabaco
foram encontrados nas células cervicais de mulheres tabagistas (PROKOPCZYK
et al, 1993). O tabagismo diminui significativamente a quantidade e função das
células de Langherans, células apresentadoras de antígenos e que são
responsáveis pela ativação de imunidade celular local contra o HPV (PEREYRA,
PARELLADA, 2003).
Outro fator apontado que levaria a um aumento da capacidade do vírus em
persistir no organismo seria a supressão ou abolição da imunidade celular
advinda do uso de drogas citotóxicas em transplantados, imunodeficiências inatas
ou adquiridas, como a imunodeficiência humana (HIV). Os pacientes com HIV têm
apresentado quadros de condilomatose genital persistente de difícil controle e
tratamento (PEREYRA, PARELLADA, 2003). Dados atuais sugerem que tanto
homens como mulheres infectadas pelo HIV têm um aumento de risco de
cânceres anogenitais, quando comparados à população em geral (SERRAINO et
al, 2002). Doenças sexualmente transmissíveis prévias como herpes e clamídia e
baixa ingestão de vitaminas A, C e E, diminuem a imunidade celular (PEREYRA,
PARELLADA, 2003), o que corrobora para a relação “baixa imunidade” “aumento
de risco de infecção” pelo HPV.
A literatura vem demonstrando que o anticoncepcional oral (ACO) também se
constitui em fator de risco para a infecção por HPV. Porém, estabelecer essa
relação tem esbarrado por numerosas dificuldades metodológicas. Os hormônios
influenciariam em um desenvolvimento carcinogênico por mecanismo ainda não
21
bem esclarecido. Eles promoveriam a integração do DNA viral ao genoma
hospedeiro com desregulação da expressão das proteínas E6 e E7, através de
processo de imunomodulação (LEY et al, 1997). Diversos estudos tendem a
demonstrar que a porcentagem de neoplasias intraepiteliais é mais elevada nas
usuárias de anticoncepcionais orais do que nas que utilizam contraceptivos de
barreira, diafragmas, por exemplo. Contudo, essa analogia ainda não foi
devidamente associada ao fator de causa, se seria devida aos hormônios
exógenos, à proteção mecânica ou ao perfil social e sexual das populações.
As doenças sexualmente transmitidas – DSTs – também têm sido alvo de
pesquisas como fator de risco para aquisição da infecção pelo papilomavírus
humano. Alguns estudos associam o papel das DSTs e seus efeitos biológicos
com o aparecimento de lesões precursoras e câncer de colo uterino. Como
resultado, chegou que o mecanismo mais provável seria a indução de processo
inflamatório mais acentuado na cérvice uterina, levando a presença de células
fagocíticas em grande número e por fim, a danos celulares por metabólitos
oxidativos secundários. A lesão tecidual seria então induzida através da produção
indireta de espécies reativas de oxigênio, que desencadeariam uma cascata
inflamatória, diminuindo a imunidade celular e promovendo a angiogênese
(CASTLE et al, 2002).
Nas mulheres com infecções genitais, transmitidas sexualmente ou não, parece
haver maior incidência de infecção por HPV provavelmente, pelo aumento da
secreção no meio vaginal, que predisporia ao aparecimento de condilomas
(ORIEL, 1971).
2.1.5 PATOGÊNESE
A maioria das infecções por HPV é transitória, e sua evolução está intimamente
relacionada com a persistência do DNA viral (BOSCH et al, 2002). A associação
do HPV com verrugas genitais humanas e neoplasias é demonstrada pela
presença de HPV-DNA e RNA em quase todos os carcinomas epidermóides da
cérvice, vagina e pênis.
22
Como o HPV é um parasita intracelular, todos os tipos virais são replicados
exclusivamente no núcleo da célula hospedeira. O vírus entra na célula através de
qualquer tipo de solução de continuidade da pele e mucosas, estimulando o
crescimento das células da camada espinhosa. O crescimento se faz por
expansão clonal, levando o epitélio a formações verrucosas (BROCKER,
BUTCHER, 1986).
A infecção se inicia na camada basal da epiderme que pode ocorrer por abrasões
e micro lesões na pele ou mucosas. Em geral, a lesão da mucosa está recoberta
por um depósito de fibrina onde, por ação da plasmina ocorre a fibrinólise, com a
dissolução do coágulo de fibrina e também da escama, liberando o vírus próximo
da camada basal do epitélio (SILVA FILHO, LONGATTO, 2000). Na camada
proliferativa o vírus pode se replicar e expressar suas proteínas precoces. No
entanto, a replicação do DNA, ou seja, a síntese de proteínas do capsídeo e a
montagem de partículas virais só ocorrem nas células mais diferenciadas.
O mecanismo de entrada do vírus na célula ainda não é bem esclarecido, mas
sabe-se que as células basais são os alvos da infecção por HPV e representam
as únicas células mitóticas no tecido. Nessa fase, os níveis de HPV-DNA nas
células infectadas ainda encontram-se baixos. No momento que o vírus perde o
capsídeo protéico e se dirige ao núcleo da célula, como plasmídeo, tem-se a fase
epissomal (SILVA FILHO, LONGATTO, 2000).
Ao penetrar através da membrana citoplasmática da célula hospedeira, o vírus
determina alterações núcleo-citoplasmáticas. As alterações do citoplasma levam,
via de regra, à disqueratose, enquanto o núcleo pode ser, ou não, sede da
integração do DNA viral. Quando ocorre a integração, as alterações são mais
pronunciadas, podendo chegar às lesões de alto e baixo graus, com marcantes
alterações cromossômicas (SILVA FILHO, LONGATTO, 2000).
Para que haja essa integração do DNA viral ao DNA celular, é necessário que
haja uma quebra no genoma viral. Esta separação não ocorre de forma aleatória,
geralmente ocorre nos genes E1 e E2 do genoma viral. O resultado dessa quebra
é uma perda de função desses dois genes, acompanhada de uma desregulação
23
dos genes E6 e E7, resultando em transformação da célula hospedeira (JEON,
LAMBERT, 1995).
A replicação do vírus-DNA ocorre em duas fases. Na camada basal do epitélio, o
DNA viral replica em numerosas cópias epissomais, de 20 a 200 cópias por
célula. Quando ocorre a diferenciação, o DNA viral é amplificado e mantido na
forma epissomal já com alto número de cópias, de 200 a 1000, a maioria,
encapsuladas. Nas camadas superiores, sobretudo no estrato granuloso, ocorre a
síntese do vírus-DNA, e os vírus assumem características de vírions, podendo ser
detectados por técnicas imunocitoquímicas e de microscopia eletrônica de
transmissão. Assim, os HPVs se perpetuam nas camadas basais, e iniciam a
replicação do DNA nas camadas superiores do epitélio, quando as células param
de se dividir e sofrem a diferenciação terminal. (SILVA FILHO, LONGATTO,
2000).
O vírus HPV apresenta tropismo celular, devido à presença de receptores
específicos, cuja replicação é limitada a células de tecidos em diferenciação. Por
conta
dessa
especificidade,
existe
uma
diferenciação
quanto
ao
ciclo
fisiopatológico viral. Nas lesões de pele benignas, o genoma viral encontra-se
separado do DNA celular e surge como um plasmídeo extra cromossômico –
corpo epissomal. Assim, a replicação viral ocorre no citoplasma pelas proteínas
extranucleares. Já nas lesões malignas, o DNA viral se integra aos cromossomos
hospedeiros (BURD, 2003).
Após a fase epissomal, se sucede à fase produtiva. Nela, o processo progride,
com a ativação da expressão viral e inicio da diferenciação, determinando
alterações no crescimento celular, efeitos citopáticos nas células maduras e
aumento considerado da replicação viral. Nessa fase, enquanto as proteínas
virais codificadas pelos genes da região precoce iniciam a replicação na camada
parabasal, outras proteínas atuam sobre o genoma hospedeiro, promovendo
estímulo mitogênico. Com o aumento das divisões celulares, ocorre a
papilomatose em função da acantose e aumento do crescimento dos capilares no
estroma (SILVA FILHO, LONGATTO, 2000).
24
O hipercromatismo, a discariose e a falta de maturação na camada superficial são
caraterísticas geradas pelo aumento da síntese de DNA nas células basais e
intermediárias, alterações essas semelhantes às que ocorrem nas displasias
sendo, porém euplóides, diplóides ou poliplóides.
À medida que as células infectadas diferenciam o promotor que ativa a
transcrição dos genes tardios é ativado, o que indica o início da fase produtiva do
ciclo de vida do HPV, marcada principalmente pelo aumento da amplificação do
genoma do vírus. Nas camadas mais diferenciadas do epitélio, o DNA viral é
empacotado em novos capsídios e a progênie do vírus é liberada da célula à
medida que o epitélio descama (CONSOLARO, MARIA-ENGLER, 2012).
Nas camadas superficiais aparecem os efeitos citopáticos, com a identificação de
coilócitos (ANEXO A). Assim, observam-se células epiteliais com agrupamentos
irregulares
da
cromatina,
colapso
nuclear
e
formação
de
vacúolos
citoplasmáticos. Estas células estão mortas ou morrendo, na fase final da
diferenciação (SILVA FILHO, LONGATTO, 2000) (ANEXO B). Segundo Reid e
Campion (1989), as infecções nesta fase são vegetativas, características dos
tipos HPV de baixo risco, embora de 10% a 15% possam ser de alto risco.
A infecção pelo HPV no trato genital pode se manifestar em três tipos diversos. O
primeiro tipo, a infecção clínica, é a forma que se apresenta nas regiões perianal
e genitália externa e pode ser evidenciada pelo aparecimento de condilomas
acuminados ou condilomas exofíticos (ANEXO C).
O aspecto macroscópico da lesão é o de pequenas formações múltiplas, em
forma de crista que, com o decorrer do tempo aumentam e são frequentemente
confluentes, com crescimento em forma de couve flor (DE PALO, 1993). Por esse
motivo, essa infecção é popularmente conhecida como “crista de galo”, e localizase em áreas úmidas, especialmente nas expostas ao atrito sexual ( ANEXO D)
O segundo tipo de manifestação patológica do HPV é a infecção sub clínica e
pode ser detectada pelo diagnóstico colposcópico após aplicação de ácido acético
a 5%, no canal vaginal e colo uterino. Caracteriza-se pela presença do condiloma
25
plano com lesões em associação com displasias, sendo mais frequente a
displasia leve. É a forma mais frequente no colo uterino (DE PALO, 1993).
E por fim, a infecção latente, a forma evidenciada apenas através de técnicas de
biologia molecular. As lesões não possuem morfologia definida, sendo que o
diagnóstico diferencial somente pode ser realizado pela detecção do DNA viral. A
infecção pelo HPV depois de instalada pode estacionar, regredir, progredir ou
transformar-se, dando origem às displasias e/ou carcinomas (DE PALO, 1993).
Dependendo do tipo de HPV da infecção inicial, existe maior ou menor risco de
progressão da lesão displásica. Os tipos 16, 18, 31, 33 e 35 estão normalmente
associados a um maior risco de progressão a carcinoma. As lesões infectadas por
outros tipos podem permanecer estáveis ou regredir. Muitos cofatores podem
atuar nas diversas etapas do processo (SILVA FILHO, LONGATTO, 2000).
2.1.6 DIAGNÓSTICO
Os métodos diagnósticos das lesões induzidas pelo HPV são morfológicos e
incluem a citologia oncológica, exame clínico, colposcopia e histologia. Já a
identificação da infecção por HPV, propriamente dita, inclui os métodos
biológicos, tais como as hibridizações moleculares de ácidos nucléicos, como o
Souther Blot, Captura de Híbridos, Hibridização “in situ” e Reação em Cadeia de
Polimerase (PCR) (FOCCHI, BOVO, SILVA, 2000).
A citologia cervical é uma estratégia fundamental de rastreamento, mesmo com
as novas perspectivas advindas das técnicas de Biologia molecular para detecção
do HPV. A colpocitologia a cada três ou cinco anos pode reduzir a incidência de
câncer cervical em até 80% (WALBOOMERS et al, 1995).
Estudos vêm comparando a acurácia entre os exames histopatológicos,
colposcópico e citológico, onde encontraram concordância dos diagnósticos em
65,6% dos casos, mostrando que o emprego das três metodologias (colposcopia
+ citologia + histologia) em conjunto, seria o ideal, aumentando acentuadamente o
número de casos diagnosticados (FOCCHI, BOVO, SILVA, 2000).
26
A técnica de Imunofluorescência direta tem sido utilizada com sucesso para
decodificar
os
antígenos
de
grupos
específicos
em
células
altamente
diferenciadas nas lesões, pois são células que possuem um conteúdo viral
altamente concentrado. Porém, devido à baixa sensibilidade e especificidade da
técnica, sua aplicação clínica é limitada (BRAUN FALCO, PLEWIG, WOLFF,
1997).
A Reação em Cadeia da Polimerase – PCR - realizada com a ajuda de sondas
específicas é um método altamente sensível e promissor, encontrando maior
aplicação no cotidiano clínico moderno. Esse método ajuda o diagnóstico através
da detecção de pequenas quantidades de vírus do papiloma nas células (BRAUN
FALCO, PLEWIG, WOLFF, 1997).
Alguns países passaram a utilizar a pesquisa de genótipos oncogênicos do HPV
em mulheres acima de 30 anos para o rastreamento de neoplasias cervicais, em
associação ao exame citológico nos casos positivos. Com a aplicação dessas
duas técnicas a partir de 2003, houve ganhos na sensibilidade do diagnóstico,
que se aproximou de 100%, quando associadas, pois ambas possuem
especificidade semelhante, em torno de 95% (BASEMAN et al, 2008).
2.1.7 IMUNOLOGIA DO HPV
O sistema imunológico humano compreende mecanismos de defesa celulares e
humorais, dividindo as respostas imunológicas em inata e adaptativa. A inata
compreende células e moléculas que são ativadas prontamente pela presença de
patógenos, em respostas rápidas e de especificidade relativamente baixa. A
resposta adaptativa para ser ativada depende de elementos da inata, sendo uma
resposta mais lenta, porém, extremamente específica. Além disso, esta segunda
resposta tem a capacidade de gerar memória imunológica, onde uma segunda
exposição ao mesmo patógeno dispara mecanismos efetores de forma mais
rápida e mais potente (CONSOLARO, MARIA-ENGLER, 2012).
O epitélio, as moléculas com atividade antibiótica, células do sistema imune,
como os neutrófilos, macrófagos e células NK, proteínas circulantes, como
27
protéinas do sistema complemento e ainda, as citocinas que medeiam diversas
respostas celulares e controlam inflamação como IL -1, TNF, interferons tipo I e
IL- 10 e IL-12, são os principais elementos constituintes da resposta inata
(CONSOLARO, MARIA-ENGLER, 2012).
Já a resposta adaptativa envolve os linfócitos T e B e seus produtos. Os linfócitos
B produzem anticorpos com diversas atividades biológicas; os linfócitos T,
citocinas que influenciam a resposta adaptativa, auxiliando ou ativando outras
células do sistema imune, ou ainda, apresentando atividade citotóxica, agindo
diretamente contra células infectadas ou mesmo, células tumorais (CONSOLARO,
MARIA-ENGLER, 2012).
Tais elementos têm importante papel de defesa dos tecidos do aparelho
reprodutor feminino, superior e inferior. Além das diferenças funcionais e
morfológicas entre esses dois tecidos, o trato genital inferior é mais exposto a
agentes infecciosos provenientes de diversas fontes, sendo uma das principais, o
contato sexual. Por essa razão, o trato inferior é recoberto por epitélio escamoso
estratificado até a cérvice, onde há uma transição para epitélio simples. A forte
interação entre as células nos epitélios forma uma barreira física importante para
a integridade do organismo e proteção contra patógenos (CONSOLARO, MARIAENGLER, 2012).
Como fazem parte do sistema imune inato, as células epiteliais expressam
receptores que reconhecem padrões moleculares associados a determinados
patógenos. Os mais descritos na literatura, expressos no epitélio cervical, são os
TLR, uma família de receptores transmembranares, que reconhecem moléculas
típicas de patógenos, mas não estão presentes nas demais regiões do organismo.
Esses receptores ativam vias de sinalização na célula, levando ao aumento da
expressão de citocinas pró-inflamatórias e da maquinaria de apresentação de
antígenos, tornando a célula um alvo para o sistema adaptativo.
Em células infectadas com HPV 16, a expressão de TLR 9 é reduzida, decorrente
da inibição direta da transcrição do gene que codifica TLR 9 pelas oncoproteínas
E6 e E7, constituindo um importante mecanismo de evasão, uma vez que o
28
genoma de HPV contém diversos sítios que podem ativar os receptores TLR 9
(CONSOLARO, MARIA-ENGLER, 2012).
No caso de infecções virais, a resposta celular antiviral é fundamental no controle
da infecção. Uma vez infectada, a célula entra num estado chamado de antiviral.
Nesse estado, a célula bloqueia a síntese de DNA e de proteínas, dificultando
assim, a propagação do genoma viral e da própria infecção. Esse mecanismo
envolve o IFN tipo I, disparados pelos receptores TLR, passando pela ativação de
IRF1 e IRF3 e também pela ativação de NFkB (CONSOLARO, MARIA-ENGLER,
2012).
Contudo, ao longo do tempo, os vírus selecionaram mecanismos de evasão
desse sistema. O HPV, ao infectar uma célula, inibe diretamente as vias de IRF1
e IRF3. No caso de IRF1, a oncoproteína E7 interage diretamente com o fator de
transcrição, mas não com o DNA, recrutando para o promotor dos genes-alvo de
IRF1 o fator HDAC, que remove os radicais acetil dos resíduos de lisina nas
histonas, estabilizando fortemente as interações eletroestáticas entre as lisinas e
a cadeia de fosfatos do DNA. A interação entre os resíduos de lisina e os grupos
fosfato dificulta o acesso da maquinaria de transcrição a promotores gênicos, um
efeito direto do HPV sobre a ativação da expressão de genes pró-inflamatórios e
antivirais (BOCCARDO, LEPIQUE, VILLA, 2010).
Além de moléculas solúveis, diversos tipos celulares fazem parte do sistema
imune dos epitélios. Podem se destacar as células dendríticas, os macrófagos,
neutrófilos e os linfócitos intraepiteliais, sendo as células dendríticas, os
macrófagos e os linfócitos B células apresentadoras de antígenos profissionais. A
apresentação de antígenos é essencial para o disparo de respostas adaptativas e
também para o reconhecimento de células-alvo pelos linfócitos ativados
(BOCCARDO, LEPIQUE, VILLA, 2010).
As células apresentadoras de antígenos conseguem traduzir para os linfócitos T
os sinais recebidos no tecido infectado. Com isso, os linfócitos que reconhecem
especificamente os antígenos apresentados são ativados, e passam a uma fase
conhecida como expansão clonal, onde milhares de células da mesma linhagem
29
são geradas, e montam a chamada resposta efetora, que envolve os próprios
linfócitos efetores mais elementos da resposta inata (CONSOLARO, MARIAENGLER, 2012).
Caso as células apresentadoras exibam apenas um antígeno, sem sinais de
perigo, os linfócitos T podem ficar anérgicos ou tornarem-se reguladores; é o
mecanismo de tolerância periférica. Muitos patógenos que estabelecem infecções
persistentes, como o HPV, conseguem indiretamente induzir um fenótipo
regulador nos linfócitos T(BOCCARDO, LEPIQUE, VILLA, 2010).
Nas mucosas infectadas por HPV, há redução na quantidade de células
dendríticas em comparação com regiões adjacentes. Queratinócitos que
expressam oncoproteínas apresentam inibição da molécula de adesão Ecaderina, que é usada pelas células dendríticas para locomoção pelos epitélios.
Com isso, o número dessas células que poderiam apresentar antígenos de HPV é
diminuído (CONSOLARO, MARIA-ENGLER, 2012).
A falha do sistema imunológico em eliminar uma infecção persistente pode induzir
uma transformação maligna do epitélio infectado. Porém, essa transformação
pode levar décadas para ocorrer. Em lesões pré-cancerosas, a maioria dos
genomas virais persiste em forma epissomal, já em lesões de alto grau, o genoma
do HPV geralmente está integrado ao genoma hospedeiro. Mais da metade dos
tumores do colo uterino positivos para HPV 16 apresenta o genoma do vírus
integrado e no caso dos tumores positivos para o HPV 18, a taxa de integração é
ainda mais elevada (CONSOLARO, MARIA-ENGLER, 2012).
Além disso, o ciclo de vida do HPV é um ciclo não lítico, ou seja, os vírions
gerados durante a infecção são liberados para o ambiente externo ao mesmo
tempo em que as células do epitélio descamam, de maneira que sinais de perigo
que poderiam ativar células apresentadoras de antígenos não são liberados no
tecido infectado (CONSOLARO, MARIA-ENGLER, 2012).
A população de macrófagos é outra população de células importante para a
apresentação de antigênica e modulação fenotípica de células T, pois essas
30
células são recrutadas a partir do sangue periférico de onde circulam como
células imaturas – os monócitos – e se diferenciam em macrófagos, adquirindo
diferentes fenótipos, a depender do microambiente que se encontrem. Os
macrófagos podem ficar nos tecidos como células residentes não ativadas,
servindo como vigilantes ou, em contato com patógenos, podem disparar vias de
sinalização que os façam aumentar sua capacidade de apresentação de
antígenos e secreção de citocinas e espécies reativas de nitrogênio e oxigênio,
assumindo assim a sua função citotóxica (CONSOLARO, MARIA-ENGLER,
2012).
Em lesões de colo uterino associadas ao HPV, tem-se observado o aumento do
número de macrófagos de forma proporcional ao grau da lesão. Ou seja, quanto
maior for o grau da lesão, maior o número de macrófagos por área de lesão
avaliada (CONSOLARO, MARIA-ENGLER, 2012).
A maioria dos patógenos que infectam o trato genital feminino inferior é eliminada
por linfócitos CD4, que têm papel importante nas respostas adaptativas; eles
determinam a troca do isótipo em linfócitos B, estimulam a proliferação de outros
linfócitos e ainda, apresentam mecanismos efetores mediante ativação de
elementos do sistema inato.
Em mulheres positivas para o DNA viral do papilomavírus, porém assintomáticas,
linfócitos do sangue periférico proliferam in vitro após estimulo com peptídeos
representantes das sequências proteicas E2, E6 e E7 do HPV 16 e também
secretam citocinas IL-2, IL-5, IL-10 TNF e IFN. Observa-se também, a presença
de infiltrado de linfócitos CD8 citotóxicos em verrugas em progressão. Mulheres
com câncer de colo uterino apresentam linfócitos circulantes não capazes de se
proliferar em resposta aos mesmos conjuntos de peptídeos citados, sendo a IL-10
a única citocina produzida por eles. Descobriu-se que mulheres com tumores de
colo de útero apresentam resposta T reguladora de linfócitos T CD4, capaz de
inibir outras células efetoras. Observou-se que a razão entre linfócitos T
citotoxicos e reguladores em tumores primários de mulheres sem metástase era
indicativa de prognóstico de progressão da doença, de forma que a razão
CD8/CD4 reguladora alta é indicativa de melhor prognóstico do que a razão
31
CD8/CD4 reguladora baixa (VAN DER BURG, MELIEF, 2011).
A maior parte das mulheres infectadas pelos papilomavírus é capaz de montar
respostas antivirais eficientes, e não apenas eliminar o vírus, além de promover
regressão de lesões, inclusive de uma porcentagem das lesões de alto grau.
Estudos têm buscado tipos de imunoterapia que permitam a inibição da
progressão tumoral ou a eliminação da lesão e do vírus, através da utilização de
Listeria monogenesis modificada a peptídeos longos que compreendem as
sequências das proteínas E6/E7 (VAN DER BURG, MELIEF, 2011).
Nesses
estudos,
observou-se
que
as
pacientes
com
lesões
menores
apresentavam melhores resultados com picos de IFNγ e IL-5 após o inicio do
tratamento. Por outro lado, mulheres com lesões grandes apresentavam maiores
números de linfócitos CD4 reguladores e menor razão IFNγ/IL-10 após
imunização, sugerindo que o tumor contribui fortemente para o quadro de
tolerância estabelecido nas pacientes (VAN DER BURG, MELIEF, 2011).
A indução da expressão de IL-5 em pacientes infectadas após estimulo de
linfócitos com peptídeos correspondentes a HPV sugere ativação de respostas
humorais
e
celulares.
Aproximadamente
50%
das
mulheres
infectadas
desenvolvem respostas humorais, em geral, contra as proteínas do capsídeo L1 e
L2. Essas proteínas são imunogênicas e ativam células dendríticas. Porém, os
títulos de anticorpos alcançados por pacientes infectadas naturalmente são
relativamente baixos e tendem a diminuir com o tempo. Os anticorpos gerados
podem ser neutralizantes, auxiliando em caso de nova infecção pelo mesmo tipo
de HPV, contudo não tendo efeito algum sobre infecções já estabelecidas ou
lesões (CONSOLARO, MARIA-ENGLER, 2012). Assim, as vacinas desenvolvidas
atualmente contra o HPV são profiláticas e não terapêuticas.
A capacidade dos vírus de alto risco de transformar células é altamente associada
à atividade das oncoproteínas E6 e E7. A expressão isolada de E7 induz a
imortalização de queratinócitos de maneira pouco significativa; por outro lado, a
expressão isolada de E6 não é capaz de induzir imortalização de queratinócitos
primários. Contudo, quando expressas em conjunto, essas proteínas são capazes
32
de imortalização a grande maioria das células primárias (CONSOLARO, MARIAENGLER,
2012).
Isso
demonstra
a
importância
dessas
proteínas
na
carcinogênese induzida por alguns tipos de vírus HPV.
2.2 O DESENVOLVIMENTO DE VACINAS
O advento da vacinação modificou profundamente a maneira como a ciência atual
tem encarado a busca por novas metodologias e formas de combate a doenças.
Embora boa parte das vacinas atualmente desenvolvidas seja fruto de
metodologias criadas em meados do século XX, um número cada vez maior de
vacinas mais seguras e eficazes têm sido geradas a partir de técnicas de
manipulação genética e produção de proteínas recombinantes.
Graças aos pesquisadores Edward Jenner e Louis Pasteur, que iniciaram a
história da vacinação há mais de 200 anos, utilizando sejam bactérias, vírus,
atenuados, inativados, muito reativos ou mesmo, em alguns casos, pouco
eficientes, a pesquisa vacinal pôde desenvolver até o patamar atual, empregando
cada vez mais frações ínfimas dos patógenos, de maneira a aumentar a
segurança sem prejudicar a eficácia e eficiência das vacinas.
De acordo com as estratégias utilizadas na preparação do princípio ativo, ou seja,
os antígenos vacinais, pode se classificar as vacinas em três grandes gerações.
As vacinas de primeira geração representam aquelas que empregam na sua
composição o agente patogênico na sua constituição completa, mas submetido a
tratamentos que levam à inativação ou à atenuação dos microorganismos. Nessa
mesma categoria, a estratégia de se utilizar microorganismos não patogênicos
derivados de outros hospedeiros empregados como antígenos, voltada para o
controle de doenças causadas por patógenos semelhantes. Tem-se como
exemplo as vacinas da varíola, baseada em vírus vaccínia, isolados de bovinos,
as vacinas contra varíola, poliomielite, sarampo, rubéola, adenovírus, entre outras
(DINIZ, FERREIRA, 2010).
As vacinas de segunda geração surgiram a partir da noção de que, em alguns
patógenos, a proteção vacinal pode ser obtida após a indução de anticorpos
33
voltados para um único alvo, como uma toxina, antígenos de superfície que
permitiriam ao sistema imunológico do hospedeiro neutralizar e eliminar esses
patógenos de maneira mais rápida e eficiente. Destacam-se nesse grupo as
vacinas acelulares que empregam toxinas purificadas e inativadas por tratamento
químico, proteínas e polissacarídeos purificados, como as vacinas antitetânica,
antidiftérica, contra hepatite B e as vacinas voltadas para o controle da meningite
meningocócica e pneumonia (DINIZ, FERREIRA, 2010).
Já a terceira e mais recente geração de vacinas parte de um conceito totalmente
inovador no meio científico que as diferencia das demais gerações vacinais. São
as chamadas de vacinas de DNA ou gênicas, descobertas de forma empírica no
começo da década de 1990, em testes inicialmente voltados para a pesquisa de
terapias genéticas em que se introduzem genes no hospedeiro que substituirão a
informação genética defeituosa originalmente presente no indivíduo. Nessa
técnica, a informação genética do patógeno passa a ser codificada em proteínas
que representem antígenos relevantes para uma proteção imunológica (DINIZ,
FERREIRA, 2010).
Essas vacinas podem desencadear uma série de respostas imunológicas como a
produção de anticorpos, células citotóxicas, com potencial de identificar e destruir
células infectadas mesmo na ausência de patógenos circulantes, e gerar
memória, fundamental para um efeito profilático duradouro. Apesar das
perspectivas iniciais das vacinas de DNA não tenham sido as melhores, pela
baixa imunogenicidade nos testes clínicos, esse tipo de técnica pode ser um
instrumento
para
a
ativação
de
respostas
imunológicas
citotóxicas
e,
consequentemente, para controle de patógenos intracelulares como os vírus,
algumas bactérias e certos tipos de câncer. Certas características das vacinas de
DNA, como a modulação de resposta imune são importantes o desenvolvimento
de vacinas com características terapêuticas, graças à introdução das técnicas de
DNA recombinante à pesquisa vacinal.
34
2.2.1 USO DAS VACINAS PROFILÁTICAS NO BRASIL E NO MUNDO
Segundo a Organização Mundial da Saúde, a vacinação contra o HPV deveria ser
incluída nos programas nacionais de vacinação, em decorrência do câncer
cervical e outras doenças induzidas por esse vírus. A prevenção baseia-se na
utilização de vacinas profiláticas que promovem a indução de respostas imunes
potentes e específicas contra os principais tipos de HPV.
Atualmente, duas vacinas estão disponíveis no mercado; a vacina quadrivalente,
que confere proteção contra os HPV 16, 18, 6 e 11 (Gardasil®, Merck & Co.); e a
bivalente, que imuniza para os vírus 16 e 18 (Cervarix®,GlaxoSmithkline). Ambas
são administradas por via intramuscular em três doses (0, 1 ou 2 e 6 meses).
Diversos ensaios clínicos dessas duas vacinas foram realizados em diferentes
países, em aproximadamente 50.000 indivíduos, com mulheres de 16 a mais de
55 anos de idade, e tais estudos tem demonstrado até o momento que as duas
vacinas são seguras em seres humanos (CONSOLARO, MARIA-ENGLER, 2012).
Os efeitos adversos relatados mais comumente foram dor, edema e eritema, com
poucas reações adversas graves como broncoespasmo, cefaleia itensa,
hipertensão e gastrenterite, observados em cerca de 0,5% dos indivíduos (FDA,
2008; CDC, 2009).
Tais vacinas não possuem o vírus vivo, ou atenuado ou o material genético viral,
e sim VLP (virus-like particles), que são partículas similares ao capsídio do vírus,
formadas apenas por várias moléculas combinadas da proteína principal do
capsídio viral, chamada de L1. A proteção conferida por esse tipo de vacina
profilática se baseia mediante a indução de anticorpos neutralizantes contra os
tipos de HPV presentes nelas (WHO, 2007).
Após a vacinação, aproximadamente de sete a dez dias ocorre a produção de
altos níveis de anticorpos contra as VLP, o que não ocorre nas infecções naturais
por HPV, em que apenas metade dos indivíduos expostos produz anticorpos
contra os vírus. As respostas imunes disparadas por ambas vacinas são muito
elevadas, observando-se títulos de anticorpos mais de uma centena de vezes
35
superiores àqueles verificados em mulheres naturalmente expostas aos HPV em
estudo, de mesma faixa etária (CONSOLARO, MARIA-ENGLER, 2012).
Os títulos mínimos de anticorpos capazes de induzir imunidade protetora ainda
não são conhecidos, o que gera a necessidade de se analisar os resultados de
eficácia das vacinas não apenas com base nos títulos de anticorpos, mas
analisando também dados clínicos definidos, como aparecimento de lesões
cervicais, vulvares, vaginais e/ou verrugas (WHO, 2007). Os títulos produzidos
pelas vacinas bi e quadrivalentes após o primeiro pico de anticorpos estabilizamse a partir do 18º e do 24º mês, respectivamente, e se mantêm estáveis por vários
anos (GARDASIL, 2009). Estima-se que essas vacinas baseadas em VLP
possam induzir imunidade profilática prolongada por disparar o mecanismo de
memória imunológica. Apesar da eficácia comprovada , ainda é incerto se há
necessidade de reforço vacinal após a terceira dose (WHO, 2007).
Até o momento, as duas vacinas se mostraram eficientes contra a infecção pelo
HPV nas mulheres que, no momento da vacinação, não haviam sido infectadas
pelo vírus. Nesses casos, a eficácia da vacina é aproximadamente 100% para a
prevenção de lesões intraepiteliais cervicais. No caso da vacina quadrivalente,
para condilomas e lesões intraepiteliais vulvares e vaginais. (WHO, 2007).
Assim, deve se levar em consideração o fato de que as vacinas profiláticas
disponíveis não conferem proteção contra o aparecimento de lesões decorrentes
de infecções preexistentes por algum dos tipos virais incluídos nas vacinas. Ainda
mais, essas vacinas não são eficazes para o tratamento de infecções nem de
lesões induzidas por HPV. Sua utilização tem apenas como objetivo a prevenção
da infecção inicial por HPV.
Contudo, diversos estudos tem verificado a existência de proteção cruzada, isto é,
apesar de as vacinas conterem apenas VLP espeíficas de determinados tipos
virais, ocorreu proteção contra infecção por outros tipos virais não presentes nas
vacinas (WHO, 2007), possivelmente dada a similaridade genética entre os
diversos genomas virais de HPV. Com relação à vacina bivalente, os estudos
demonstraram a existência de proteção cruzada contra os HPV de alto risco 31,
36
45 e 52. As respectivas taxas de eficácia da vacina em prevenir infecções
persistentes por esses tipos virais foram de 36,1%, 59,9% e 31,6% (CERVARIX,
2007). Apesar dos ótimos resultados, ainda não há informação suficiente sobre a
efetividade e a durabilidade das respostas geradas contra os demais tipos virais
não incluídos na vacina. Quanto à vacina quadrivalente, estudos apontam uma
redução de aproximadamente de 20% no risco de desenvolvimento de neoplasias
intraepiteliais (NIC I, II e III) e de adenocarcinoma in situ induzidos pelos HPV de
alto risco 31, 33, 52, 56, 58 e 59. Entretanto, não há evidências suficientes para
se concluir que essa vacina confira proteção cruzada para o HPV 45 (GARDASIL,
2009).
Até o presente momento, não foi registrado qualquer caso de doença em
mulheres vacinadas e seguidas nos estudos, contudo não se sabe por quanto
tempo essas vacina conferirão a proteção. Atualmente, tem-se verificado clara
redução na infecção por HPV na população vacinada. Como consequência,
espera-se a diminuição na incidência das lesões precursoras cervicais e no
número de casos de câncer de colo de útero.
As vacinas bivalente e quadrivalente estão aprovadas para uso em mais de uma
centena de países. Somente nos Estados Unidos, já foram aplicadas mais de 25
milhões de doses da vacina quadrivalente. Com base nos resultados dos ensaios
clínicos realizados, a FDA aprovou o uso da vacina quadrivalente em 2006, nos
EUA, para mulheres com idades entre 9 e 26 anos. Nos homens entre 9 e 26
anos, a FDA autorizou o uso da vacina em 2009. Os laboratórios produtores das
vacinas sugerem a extensão da vacinação para as mulheres com idades entre 27
e 45 anos, uma vez que essas mulheres são sexualmente ativas e podem vir a ter
novos parceiros (FDA, 2010).
Ainda não existem estudos conclusivos sobre a sua eficácia em maiores de 26
anos. Todavia, a vacina bivalente mostrou-se eficaz em mulheres com até 45
anos (SKINNER et al., 2008). Além disso, as diretrizes destacam a possibilidade
da vacinação daquelas que estejam contaminadas pelo HPV, ou que já tenham
tido um resultado anormal ou indefinido de exames citológicos ou histológicos. No
entanto, deverão ser alertadas de que os dados dos estudos clínicos não
37
indicaram efeito terapêutico sobre lesões cervicais, verrugas genitais ou infecção
por HPV já existente (MARKOWITZ et al., 2007).
No Brasil, o Ministério da Saúde aprovou o uso em mulheres das duas vacinas,
bivalente e quadrivalente, em 2006 e 2008, respectivamente. Apesar das vacinas
já terem sido liberadas no país, nenhuma dela foi ainda incluída oficialmente no
Programa Nacional de Imunização até o presente momento; ambas estão
disponíveis somente na rede privada a custo bastante elevado. A Sociedade
Brasileira de Pediatria (2008) recomenda o uso da vacina quadrivalente para as
mulheres com idades entre 9 e 26 anos. A Sociedade Brasileira de Imunização
sugere o uso de qualquer uma das vacinas a partir dos 9 anos de idade até os 26
anos, no caso da vacina quadrivalente, ou 25 anos, no caso da bivalente
(FREGNANI, VILLA, 2010).
Apesar de as vacinas conferirem imunidade contra os HPV mais prevalentes
associados ao câncer de colo, existe a possibilidade de infecção por outros tipos
de vírus de alto risco não incluídos nas vacinas. Por isso, se torna altamente
necessária a prevenção secundária do câncer de colo do útero mediante a
citologia cervical e os outros métodos diagnósticos e preventivos.
2.2.2 ESTRATÉGIAS DE DESENVOLVIMENTO DE VACINAS TERAPÊUTICAS
A base de qualquer vacina terapêutica é reverter situações nas quais o sistema
imunológico do indivíduo não foi capaz de ativar uma resposta imune na
intensidade ou na qualidade adequada, o que, em geral, resulta na instalação de
um quadro de tolerância imunológica.
Portanto, uma das dificuldades para o desenvolvimento de vacinas terapêuticas
eficazes é justamente contornar os diferentes mecanismos de evasão e tolerância
imunológica apresentados pelo HPV, como o ambiente imunossupressor,
característicos das lesões pré-malignas e tumores associados à infecção, o efeito
direto de algumas proteínas virais na inibição de componentes da maquinaria de
apresentação antigênica, na inibição de respostas antivirais celulares mediadas
por interferons e na indução de resistência a citocinas (CONSOLARO, MARIA-
38
ENGLER, 2012).
Outro fator contribuinte para a evasão imunológica do vírus é a sua replicação nas
camadas de células mais diferenciadas, superiores, dos epitélios e sua baixa
expressão proteica e replicação viral nas camadas menos diferenciadas, ou seja,
nas inferiores e mais próximas à derme, o que restringe bastante a exposição de
antígenos virais a componentes do sistema imunológico.
Além disso, diversos estudos demonstraram que as células tumorais produzem e
secretam várias citocinas capazes de recrutar leucócitos e induzir sua
diferenciação em células supressoras (CONSOLARO, MARIA-ENGLER, 2012).
Assim, vacinas terapêuticas eficazes deveriam ser capazes de induzir resposta
citotóxica específica contra os tumores, bem como promover a infiltração do tumor
por células efetoras e a redução do volume do mesmo ou sua eliminação.
Várias estratégias têm sido utilizadas com esse objetivo, focando principalmente o
HPV 16, responsável por mais de 50% dos cânceres de colo de útero no mundo
todo. As vacinas testadas em ensaios clínicos baseiam-se em proteínas de fusão,
em peptídeos curtos ou longos derivados de oncoproteínas, em DNA ou no uso
de células dendríticas e vetores virais (CONSOLARO, MARIA-ENGLER, 2012).
Nesse contexto, as vacinas de DNA surgem como uma estratégia interessante
para a geração de respostas imunes específicas por sua capacidade de indução
de respostas citotóxicas, de maneira que atuariam somente sobre as células
tumorais, evitando efeitos colaterais indesejáveis, como os observados nos
tratamento de radio e quimioterapia atualmente empregados.
As vacinas baseadas em peptídeos curtos são simples e de fácil produção. Foram
utilizados peptídeos curtos da proteína E7 de HPV 16 ligados ao peptídeo não
específico pan-HLA DR PADRE, obtendo resultados que variaram da ausência de
resposta clínica à remissão parcial ou total em mais da metade dos pacientes.
Estudos demonstram que esse tipo de vacinação é bem tolerada, mas que as
respostas imunes produzidas não foram suficientes para gerar resultados clínicos
satisfatórios (CID ARREGUI, 2009).
39
Outra estratégia adotada, embora com resultados clínicos ainda limitados, foi a
utilização de vacinas fundamentadas em proteínas de HPV 16 fundidas entre si –
L1/E7; L2/E7; L2/E6/E7; E6/E7 – ou em fusão com proteínas bacterianas. A
vantagem desta técnica é a de apresentação de vários epítopos para linfócitos T
citotóxicos e, portanto, sem a necessidade de determinar o haplótipo de HLA.
Outra vantagem é que as proteínas heat shock de bactérias (HSP) induzem
respostas imunes fortes em mamíferos, ativando simultaneamente respostas
inatas e adaptativas, o que favorece a maturação e migração das células
apresentadoras de antígenos, além de induzir a produção de moléculas
coestimuladoras e secreção de citocinas pró-inflamatórias (SU, WU, SCOTNEY,
2010).
Bons resultados também têm sido obtidos com vacinas compostas de peptídeos
sintéticos longos de E6/E7 de HPV 16, onde esses peptídeos sobrepõem-se
parcialmente cobrindo a sequência completa das proteínas virais. Quando
testadas em grupos de pacientes com câncer da cérvice uterina, houve indução
de uma robusta expansão de células T CD4 e CD8 específicas (VAN DER BURG,
MELIEF, 2011).
Certas características das células dendríticas, que são células apresentadoras de
antígenos profissionais, são exploradas para tratar pacientes com câncer de
cérvice uterina avançado, utilizando células dendríticas autólogas e imaturas
carregadas com o peptídeo E7, o que induz respostas citotóxicas específicas e
secreção de IFNy em células mononucleares de sangue periférico em 6 de 15
pacientes estudadas. Nas pacientes que responderam à vacina, verificou-se
aumento de tempo de sobrevida e de vida livre de doença, quando comparadas
àquelas tratadas com placebo (CID ARREGUI, 2009).
Uma estratégia que está sendo bastante explorada são as vacinas de DNA,
empregando-se plasmídeos de DNA que codificam fragmentos dos genes E6 E7
de HPV 16 ou 18 encapsulados em pequenas partículas biodegradáveis. Além
disso, a aplicação de DNA e RNA virais, a utilização de sistemas baseados em
vetores e a aplicação intranasal de cepas bacterianas que expressem proteínas
40
de HPV têm sido consideradas. Tais abordagens apresentam algumas vantagens
em relação às vacinas de peptídeos e proteínas, como a indução de respostas
Th1 e citocinas mais fortes e o aumento do tempo de exposição ao antígeno.
(CONSOLARO, MARIA-ENGLER, 2012).
Pesquisas com vacinas de DNA para o controle de tumores induzidos por HPV
têm buscado aumentar a imunogenicidade das formulações vacinais através do
uso de adjuvantes ou construções que expressem proteínas híbridas em que as
oncoproteínas de HPV são fusionadas a antígenos que aumentem a
imunogenicidade para respostas citotóxicas (DINIZ, FERREIRA, 2010).
41
3. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Constatamos com este estudo que a disponibilização de vacinas profiláticas e a
perspectiva de desenvolvimento de vacinas com efeito terapêutico para tumores
associados ao HPV demonstram o grande interesse e avanço das pesquisas
nessa área.
Segundo o Instituto Nacional do Câncer (Inca), no Brasil, a cada 100 mil mulheres
cerca de 20 desenvolvem câncer de colo uterino, o que resulta em 20 mil novos
casos diagnosticados por ano. Esses dados epidemiológicos revelam o impacto
real e expressivo que a introdução e emprego de vacinas profiláticas e
terapêuticas teriam, a médio e longo prazo, no controle da infecção e nas taxas
de câncer de colo de útero e lesões associadas ao vírus HPV no país.
É possível afirmar com esta pesquisa que pelo fato da transmissão da infecção do
vírus HPV ser preferencialmente sexual, logo se pensa em duas determinantes
para a aplicação eficaz das vacinas profiláticas: a vacinação deve ocorrer em
idade anterior à primeira relação sexual; e as vacinas devem ser disponibilizadas
a um custo tal que atinja a grande maioria da população que sofre as
consequências mais sérias da doença.
No primeiro caso, no entanto, seria necessário vacinar crianças e adolescentes de
ambos os sexos e definir uma idade mínima para início da vacinação, o que ainda
não foi totalmente avaliado em ensaios clínicos e nem há consenso a respeito,
uma vez que a faixa etária ideal para vacinação depende de uma série de fatores,
como o tempo de proteção que as vacinas conferem, a duração da resposta
imune, e a necessidade de reforço vacinal após a terceira dose. Embora já ter
sido autorizada a vacinação, ainda não existem dados consistentes a respeito da
eficácia em homens de qualquer idade, apesar de existir comprovação sobre a
imunogenicidade e segurança da vacina em meninos entre 9 e 15 anos. Também
não foi testada em pacientes imunossuprimidos.
Quanto ao custo das vacinas disponibilizadas, para que os valores de ganho com
42
o custo-efetividade fossem positivos para a saúde pública o preço da vacina teria
que ser muito menor do que é atualmente. Por enquanto, os impactos têm sido
mais econômicos, para os fabricantes, do que realmente para a contribuição
dessas vacinas na redução da doença e suas consequências no mundo. É
provável que decorram décadas até que essas vacinas estejam disponíveis para
as populações de países em desenvolvimento e para que o impacto delas seja
perceptível.
Além disso, antes da implantação de programas de imunização universais em
meninas e meninos pré-adolescentes nos sistemas de saúde, estudos deveriam
avaliar se uma vacinação em idade tão baixa poderia estimular ainda mais a
precocidade no início da vida sexual desses indivíduos, e se a imunização não
criaria uma falsa segurança às populações vacinadas, deixando-as vulneráveis a
outras doenças sexualmente transmissíveis e possivelmente tão fatais quanto as
lesões intraepiteliais recorrentes e o desenvolvimento de câncer.
Podemos afirmar, a partir dessa pesquisa, que o desenvolvimento constante de
vacinas profiláticas e terapêuticas eficientes e seguras combinadas com outras
modalidades de tratamento poderão contribuir significativamente para o controle
da infecção, assim como o descobrimento de novas drogas e o conhecimento dos
mecanismos de atuação, progressão e evasão imunológica do patógeno e dos
tumores associados ao HPV.
Essa pesquisa mostra que o desenvolvimento de vacinas com propriedades
terapêuticas para controle do câncer associado ao HPV e os tumores traz boas
em termos de controle da doença já que se espera que tais vacinas confiram
proteção a diversos tipos de HPV e previnam o surgimento de tumores em
indivíduos já infectados. A disponibilização do tratamento, assim que comprovada
sua eficácia terapêutica em ensaios clínicos, para o sistema público de saúde
poderá ter um impacto imediato na redução no número de mortes associadas à
doença, além de reduzir drasticamente o custo e os traumas associados ao
tratamento de tumores em estágios avançados de crescimento.
Portanto, essa pesquisa deixa claro que o advento das vacinas profiláticas pode
43
ser uma excelente ferramenta de prevenção e conscientização da população,
desde que bem aplicado aos sistemas de gestão de saúde pública, e nas
próximas décadas, se apresenta com importante expectativa na redução dos
casos de câncer uterino, cervical, vulvar, vaginal, peniano, etc. Contudo, é
importante ressaltar que a vacinação não afasta a necessidade dos exames de
rotina para rastreamento do câncer do colo do útero, que deve continuar sendo
baseada na peridiocidade do exame de Papanicolaou, isoladamente ou em
conjunto com testes de detecção molecular de HPV. Nesse contexto, também se
destaca o imperativo da conscientização em massa a respeito da transformação
maligna que o HPV pode provocar, esclarecendo às pessoas para que evitem
relações promíscuas, a pluralidade de parceiros, o perigo do início precoce das
relações sexuais e ainda outros fatores de risco para aquisição da infecção, como
o uso de contraceptivos orais por tempo prolongado, o tabagismo, entre outros.
44
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50
ANEXOS
51
ANEXO A
Figura 1: Coilócitos multinucleados detectado com o Exame de Papanicolau em
caso de infecção por HPV.
Fonte: Sociedade Brasileira de Citopatologia.
52
ANEXO B
Figura 2: Citologia cérvico-vaginal com presença de coilócitos.
Fonte: Sociedade Brasileira de Citopatologia.
53
ANEXO C
Figuras 3 e 4: Pacientes com condilomas genitais acuminados, positivos para HPV 16 e
18
Fonte: Sociedade Brasileira de Citopatologia..
54
ANEXO D
Figura 5: Verrugas anogenitais em paciente de 48 anos positiva para HPV 6 e 11
Fonte: Sociedade Brasileira de Citopatologia.
55
Pândulla Santos Nascimento
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