Ecologia dos brejos de altitudes do Agreste pernambucano

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ECOLOGIA DOS BREJOS DE ALTITUDE
DO AGRESTE PERNAMBUCANO
Paulo Cesar Guimarães RODRIGUES1
Maria das Graças Santos das CHAGAS2
Fernando Barreto Rodrigues e SILVA3
Rejane Magalhães de Mendonça PIMENTEL4
RESUMO
Os estudos que caracterizam e classificam formações vegetais dos brejos de altitude do
nordeste do Brasil não identificam nem espacializam os brejos de Pernambuco de forma
precisa. No agreste e no sertão pernambucano existem brejos que apresentam características
semelhantes, entretanto, no agreste também é possível encontrar brejos que se diferenciam
daqueles encontrados no sertão do estado. Este estudo objetivou identificar, caracterizar e
georreferenciar os brejos de altitude na zona do agreste pernambucano. Para este estudo,
foram selecionados os brejos caracterizados como um oásis de vegetação perenifólia no meio
da caatinga caducifólia. As áreas de altitudes elevadas com cobertura vegetal florestal úmida
foram confrontadas, com o uso do geoprocessamento, para a caracterização dos brejos. Sete
áreas de brejos de altitude foram identificadas como elementos orográficos isolados. As áreas
identificadas apresentam características bastante similares entre si quanto às condições de
clima, cobertura vegetal, solos e topografia. A comparação com outros brejos de altitude
descritos no agreste pernambucano não garante a existência de uma vegetação diferente entre
eles. A cobertura vegetal é bastante similar, porém com espécies próprias em áreas de brejos
isolados, indicando que a proporção de espécies endêmicas nos brejos de altitude isolados
pode estar correlacionada com a geografia do estado.
Palavras-chave: Floresta montana, solo, caatinga.
ABSTRACT
The studies that characterize and classify the plant formations in the altitude marshes no
identify neither disposal in space the marshes in Pernambuco accurately. In the Agreste exists
the altitude marshes similar to those found in the Sertão. This study aimed to identify, to
characterize and to georreferenciate the altitude marshes in the Agreste zone in Pernambuco.
The identification of marshes considered areas with characteristics nearest the altitude
marshes from the Sertão of Pernambuco, in other words, like oasis, island’s humidity into the
caatinga vegetation. The high altitude areas covered by humid forests were compared to
characterize the marshes. The geoprocessment was used to process this information. Seven
altitude marshes areas were identified as orographic elements isolated. The altitude marshes
areas showed very similar characters among them related to the climate conditions, vegetation
1
Biólogo. Laboratório de Fitomorfologia Funcional da UFRPE. E-mail: [email protected]
Programa de Pós-Graduação em Geografia da UFPE. E-mail: [email protected]
3
Embrapa Solos - Unidade de Pesquisa e Desenvolvimento –UEP, Recife-PE.
4
Prof. da Universidade Federal Rural de Pernambuco. Dept. Biologia/Área de Botânica. Rua Dom Manoel de
Medeiros, s/n. Dois Irmãos, Recife-PE. CEP: 52.171-900. E-mail: [email protected]
2
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covering, soils and topography. The comparison with the altitude marshes described in the
Agreste in Pernambuco is no guarantee to the existence of different vegetation among them.
The plant covering is quite similar, but with own species in isolated marshes areas. The
proportion of endemic species in the isolated altitude marshes can be related by the geography
of the State.
Key words: Montane forest, soil, caatinga.
1. INTRODUÇÃO
Os Brejos de Altitude representam áreas de exceção no contexto da Zona do Agreste,
favorecidos por condições naturais mais amenas que aquelas das caatingas circundantes.
Neste caso, o relevo executa função de barreira aos ventos úmidos, os quais alcançam maiores
altitudes, resfriando-se e propiciando a formação de nevoeiros e chuvas (CALDAS LINS,
1989). A autora ressalta, ainda, a zonação de associações vegetais que existe nas vertentes a
barlavento, constituindo-se em verdadeiras faixas de vegetação que se sucedem e ganham
características mais úmidas, variando entre florestas caducifólias ou subcaducifólias, até
matas subperenes com espécies perenifólias.
Os termos brejos de altitude e matas serranas são usados, muitas vezes, como
sinônimos; possuindo, entretanto, conceitos diversos sendo usados em diferentes campos de
estudos. De forma geral, a geografia física estudaria os brejos de altitude, enquanto que a
botânica estudaria as matas serranas, pois o conceito de brejo de altitude abrange o acidente
geográfico e suas resultantes, como clima, solos, vegetação e fauna. Enquanto que o conceito
de mata serrana é restrito, indicando a vegetação resultante do acidente geográfico
(VASCONCELOS SOBRINHO, 1971).
A caracterização ecológica do agreste pernambucano proposta por Andrade-Lima
(1960) definiu os brejos de altitude ou matas serranas como frações da floresta tropical
perenifólia, dentro da zona da caatinga. Localizando-se, via de regra, nos níveis superiores das
serras, graníticas ou cretáceas, com altitudes superiores a 500 metros e progressivamente
maiores, no sentido geral SE-NW, até os 1.000 metros.
Em trabalho recente, realizado pela EMBRAPA, Araújo Filho et al. (2000) descrevem
os brejos de altitude de Pernambuco como regiões úmidas e isoladas dentro de áreas secas,
posicionadas a barlavento com desnível relativo médio de 200 metros ou mais. Segundo estes
autores, no Estado de Pernambuco, estas regiões situam-se entre os 700 e 1.200 metros de
altitude, com predominância de florestas subperenifólias, subcaducifólias e caducifólias em
seus topos.
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Muitos são os estudos que caracterizam e classificam as formações vegetais dos brejos
de altitude (ANDRADE LIMA, 1960; VASCONCELOS SOBRINHO, 1971); entretanto,
esses estudos não identificam e nem espacializam esses brejos de uma forma mais precisa.
Diante do exposto, este estudo objetiva identificar, caracterizar e espacializar os brejos de
altitude, como elementos orográficos isolados em meio à caatinga circundante, encontrados na
região do Agreste pernambucano.
2. MATERIAL E MÉTODOS
2.1. Descrição da área de estudo
A área de estudo está compreendida entre as coordenadas 58º 28’58”W – 09o21’52”S e
35o18’49”W – 07º30’15”S, constituída como uma zona de transição entre a Zona da Mata
Úmida e o Sertão Semi-árido, localizada no Agreste do Estado de Pernambuco (Fig. 1). A
vegetação característica é a caatinga hipoxerófila, com médias de precipitação pluviométrica
anuais oscilando entre 500 e 800 mm, com áreas apresentando precipitação média anual
39°0'0"W
38°0'0"W
37°0'0"W
36°0'0"W
35°0'0"W
RECIFE
SERTÃO
!.
!.
Arcoverde
!.
CARUARU
8°0'0"S
40°0'0"W
8°0'0"S
41°0'0"W
7°0'0"S
variando entre 600 e 900 mm.
MATA
9°0'0"S
9°0'0"S
AGRESTE
!.
41°0'0"W
Petrolina
40°0'0"W
39°0'0"W
38°0'0"W
37°0'0"W
36°0'0"W
35°0'0"W
Figura 1 - Mapa de Localização dos Brejos de Altitude no Agreste Pernambucano
Figura 1. Meso-regiões do Estado de Pernambuco-Brasil. Destacando-se, a Região Agreste
do Estado e a localização dos brejos avaliados. Fonte: SILVA et al. (2001).
2.2. Seleção e identificação dos brejos de altitude
Para seleção, identificação e espacialização dos brejos de altitude foi utilizado, como
material básico, o mapa de solos do Estado de Pernambuco, na escala de 1:100.000
(ARAÚJO FILHO et al., 2000), utilizando-se como limite as Unidades de Mapeamento de
Solos (Tab. 1). Quando necessário, foram realizados ajustes na classificação, com base nas
novas informações disponíveis. Neste trabalho foi considerado que uma Unidade de
Mapeamento pode ser constituída por uma única unidade taxonômica (unidade simples) ou
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por várias unidades taxonômicas (unidade combinada). Uma unidade combinada é mais
comum nos levantamentos pedológicos em escalas de 1:100.000 ou menores. As unidades
combinadas são normalmente denominadas de associações, complexos e grupamentos
indiferenciados de solos; em sua composição entram dois ou mais componentes.
Tabela 1. Coordenadas geográficas dos brejos de altitude selecionados, e as unidades de
mapeamento do solo (UMS), encontradas no Mapa de Solo do Estado de Pernambuco para as
Regiões de Brejo do Agreste Pernambucano.
Brejos
Coordenadas Geográficas
Brejo de
Taquaritinga do
UMS
35º59’25’’W –
36º07’20’’W –
7º52’28’’S
08º00’00”S
35º44’33’’W –
35º48’46’’W –
8º08’46’’ S
8º12’45”S
35º51’48”W –
35º58’00”W –
PV29 – PV34 – PV35 e
08º07’33”S
08º15’33”S
PV37
36º38’47”W –
36º49’41”W –
PV12 - PV28 e PA’18
08º16’28”S
08º21’55”S
36º52’35”W –
37º00’58”W –
08º24’15”S
08º27’56”S
36º19’16”W –
36º34’26”W –
PV10 - PV12 - PV13 -
08º07’33”S
08º14’40”S
PV24 e PV34
36º31”18”W –
48’52”W –
PV31 - PA’18 - RE7 e
08º01’35”S e 36º
08º15’09”S
PA’22
PV23 - PV37 e LA2
Norte
Brejos das Serras
Negras
Brejo da Serra Verde
Brejo de Ororobá e
Sabiá
Brejo de Serra das
Varas
Brejo de Bituri
Brejo de Poção
PV29
PA’18
Através do Mapa de Solos do Estado de Pernambuco foram selecionados sete brejos
de altitude situados em elementos orográficos isolados, localizando-se, exclusivamente, na
região Agreste de Pernambuco (Tab. 1) e, compreendidos, entre as altitudes de 700 m
(mínima) e 1.200 m (máxima). Os brejos de altitude do Agreste pernambucano que
apresentam ou apresentaram, para alguns autores, em algum momento de um passado recente,
uma ligação com o maciço florestal Atlântico, foram considerados um prolongamento do
litoral úmido no Agreste, sendo, então, excluídos do presente estudo.
Os brejos selecionados estão localizados nos municípios de Taquaritinga do Norte,
Pesqueira e Arcoverde, incluindo a região limítrofe entre alguns municípios (Bezerros,
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Caruaru, Riacho das Almas, Brejo da Madre de Deus, Belo Jardim, Sanharó, Poção e
Jataúba).
Na caracterização dos brejos de altitude foram utilizadas as fases de vegetação dos
seguintes tipos: floresta subperenifólia, subcaducifólia e caducifólia e, em alguns casos raros,
a vegetação de transição entre a floresta caducifólia e a caatinga hipoxerófila. Para avaliação
da umidade disponível para as diversas culturas vegetais, foram utilizadas, como artifício, as
fases de vegetação natural das Unidades de Mapeamento dos mapas de solos. É conhecido
que a cobertura vegetal natural reflete as condições bioclimáticas de uma determinada área,
constituindo-se em um testemunho secular das condições de umidade disponível. Ou seja, o
índice de umidade disponível para as plantas pode ser avaliado pela cobertura vegetal original
de uma determinada área (SILVA et al., 2001).
2.3. Geração dos mapas
Para o mapeamento das áreas de brejos de altitude foram utilizadas técnicas de modelo
digital de elevação (MDE), com base na topografia gerada pela missão “Shuttle Radar
Topography Mission” (SRTM). As imagens foram cedidas pelo Centro Nacional de Pesquisa
de Monitoramento Ambiental (CNPM – Embrapa), as quais foram inseridas em um Sistema
de Informação Geográfica - SIG (Arc-Gis 9.2). Para efeitos práticos, os brejos das serras de
Ororobá/Sabia (Pesqueira) e das Serras das Varas (Arcoverde), foram apresentados em um
único mapa. O mesmo procedimento foi adotado para os Brejos das Serras Negra (Bezerros) e
Verde (Caruaru). Para identificação e espacialização das áreas características de brejos de
altitude foram confrontadas as áreas de altitudes elevadas com as Unidades de Mapeamento
de Solos com fases de vegetação úmida do tipo floresta subperenifólia, subcaducifólia e
caducifólia, utilizando-se o geoprocessamento para o cruzamento dessas informações.
3. RESULTADOS
A região agreste de Pernambuco apresentou sete brejos de altitude que podem ser
caracterizados como regiões isoladas e considerados como um oásis de vegetação úmida em
meio à vegetação caducifólia da caatinga circundante. Através do modelo digital de elevação
(MDE) do Estado de Pernambuco é possível observar que a maior parte dos brejos de altitude
do estado, com elevações entre 700 a 1.200 m (Fig. 2) se localiza no agreste.
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40°0'0"W
39°0'0"W
38°0'0"W
37°0'0"W
36°0'0"W
35°0'0"W
7°0'0"S
7°0'0"S
41°0'0"W
Altitude
1.199m
700m
!.
CARUARU
!.
Arcoverde
!.
200m
ESCALA GRÁFICA
30
Petrolina
0m
15
0
30
60
km
90
9°0'0"S
Serra dos Cavalos
9°0'0"S
600m
RECIFE
8°0'0"S
8°0'0"S
1.000m
!.
41°0'0"W
40°0'0"W
39°0'0"W
38°0'0"W
37°0'0"W
36°0'0"W
35°0'0"W
Figura 2 - Mapa geral do relevo do Estado de Pernambucano
Figura 2. Modelo Digital de Elevação (MDE) do Estado de Pernambuco indicando as regiões
de relevo mais elevado do estado que formam os brejos de altitude.
As terras que compõem os brejos de altitude não apresentam um bom potencial para
uso intensivo com agropecuária (empregando alta tecnologia) pelas características físicas dos
solos destas regiões. Além da pouca profundidade e da elevada pedregosidade destes solos, o
relevo acidentado destas regiões tornam elevado o risco de erosão nestas áreas, além de
constituírem fortes impedimentos ao uso de mecanização. Os aspectos mais favoráveis ao uso
das terras estão relacionados com a quantidade alta de matéria orgânica presente na camada
superficial dos solos e, principalmente, com a maior disponibilidade de umidade atmosférica,
favorecida
pela
altitude
elevada.
Conseqüentemente,
isto
promove
uma
menor
evapotranspiração, propiciando a formação de uma vegetação do tipo floresta, a qual contrasta
com a vegetação mais seca, do tipo caatinga, ocorrente em seus arredores.
Apesar das limitações ambientais referidas, nas regiões de brejo ocorrem pequenas
áreas com relevos mais favoráveis, essas áreas são constituídas por solos profundos, não
pedregosos, em relevo plano a suave ondulado, com textura média e argilosa, mostrando,
portanto, um bom potencial para uso com agropecuária. A maior área destes solos com
melhor potencial está relacionada aos Argissolos Vermelho-Amarelos de relevo mais ameno,
além dos Neossolos Regolíticos. Outra característica das regiões de brejo é o balanço hídrico
mais favorável destas regiões, que tem facilitado um maior uso de suas terras, mesmo
daquelas com menor potencial, com uma agricultura de natureza familiar, o que contrasta com
o menor uso das terras circunvizinhas situadas em cotas inferiores e mais secas. Entretanto,
nestas áreas é importante a adoção de técnicas de controle de erosão.
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3.1. Área de ocupação e características gerais dos brejos
Brejo de Taquaritinga do Norte - O Brejo de Taquaritinga do Norte encontra-se no
município de mesmo nome ocupando, ainda, pequenas áreas dos municípios de Vertente e
Toritama. Este brejo apresenta uma área aproximada de 59 km2. Trata-se de um conjunto de
elevações com relevo suave ondulado a forte ondulado com declives, às vezes, acentuados,
apresentando altitudes compreendidas entre 750 e 1.000m (Fig. 3A). Sua cobertura
pedológica está representada, principalmente, por solos das classes dos Argissolos VermelhoAmarelos e Latossolos, ocorrendo pequenas áreas de Neossolos Litólicos, Neossolos Flúvicos
e Gleissolos e Afloramentos Rochosos. A vegetação original é formada dominantemente por
floresta subcaducifólia e floresta caducifólia, ocorrendo, nas porções mais altas, floresta
subperenifólia.
Brejos das Serras Negra e Verde - O Brejo da Serra Negra, localizado no município de
Bezerros e o Brejo da Serra Verde, localizado entre os municípios de Bezerros, Caruaru e
Riacho das Almas ocupam uma área aproximada de 20 e 85 km2, respectivamente (Fig. 3B).
Esses brejos apresentam grande variação ambiental em termos de relevo, drenagem,
pedregosidade e tipos de solos (textura, profundidade, fertilidade, entre outros). Os solos das
classes dos Argissolos Vermelho-Amarelos e Neossolos Litólicos são dominantes, além dos
afloramentos rochosos. Em menor quantidade ocorrem, ainda, Planossolos e Neossolos
Regolíticos. A vegetação original é constituída por floresta subcaducifólia, floresta
caducifólia e áreas de transição entre as florestas caducifólias e a caatinga hipoxerófila.
Alguns raros remanescentes dessa floresta úmida ainda podem ser encontrados.
Brejos das Serras das Varas, Ororobá/Sabiá - Os Brejos das Serras de Ororobá/Sabiá, no
município de Pesqueira (Fig. 3C) apresentam área de, aproximadamente, 80 km2, enquanto
que o Brejo das Serras das Varas, no município de Arcoverde, apresenta área com 47 km2.
Estes brejos apresentam bastante variação ambiental em termos de relevo, pedregosidade e
características dos solos (textura, profundidade, fertilidade, entre outros). Dominam solos das
classes dos Argissolos Vermelho-Amarelos, Neossolos Litólicos e Argissolos Amarelos, além
dos afloramentos de rochas. Em menor quantidade ocorrem ainda Neossolos Regolíticos,
Gleissolos e Cambissolos. A vegetação original era constituída por floresta subcaducifólia,
floresta
caducifólia,
transição
floresta
caducifólia/caatinga
hipoxerófila
e
floresta
subperenifólia.
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Brejo da Serra do Bituri - O Brejo da Serra do Bituri (Fig. 3D) compreende áreas dos
municípios de Brejo da Madre de Deus, Belo Jardim e Sanharó, com aproximadamente 245
km2. A área apresenta bastante variação ambiental em termos de relevo, pedregosidade e
características dos solos (textura, profundidade, fertilidade, entre outros). Dominam solos das
classes dos Argissolos Vermelho-Amarelos, Argissolos, Amarelos, Neossolos Litólicos, além
dos afloramentos de rochas. Em menor quantidade ocorrem ainda Latossolos Amarelos,
Latossolos Vermelho-Amarelos, Cambissolos, Argissolos Vermelhos, Neossolos Flúvicos e
Gleissolos. A vegetação original, nos dias de hoje, praticamente devastada, é constituída por
floresta subcaducifólia, floresta caducifólia, área de transição entre a floresta caducifólia e a
caatinga hipoxerófila e floresta subperenifólia.
Brejo de Poção - O brejo de Poção está localizado nos municípios de Poção e Jataúba com
uma área aproximada de 167 km2 (Fig. 3E). Nessas áreas os solos dominantes são os
Argissolos Amarelos, Argissolos Vermelho-Amarelos, Neossolos Litólicos e Neossolos
Regolíticos, além dos afloramentos de rocha que também compõem porção importante da
paisagem. A vegetação original é constituída de floresta subcaducifólia, floresta caducifólia e
área de transição floresta caducifólia e caatinga hipoxerófila. Atualmente estas florestas
encontram-se quase que totalmente devastadas.
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Figura 4. A-E: Modelo de Elevação Digital (MDE) dos brejos localizados na Meso-Região
Agreste do Estado de Pernambuco-Brasil. A. Brejo de Taquaritinga do Norte, localizado entre
os Municípios de Taquaritinga do Norte, Vertentes e Toritama. B. Brejo da Serra Negra,
localizado no Município de Bezerro, e Brejo da Serra Verde, localizado entre os Municípios
de Bezerros, Riacho das Almas e Caruaru. C. Brejo de Altitude das Serras de Ororobá/Sabiá,
localizado no município de Pesqueira, e Brejo das Varas, localizado no município de
Arcoverde. D. Brejo de Altitude da Serra do Bituri, localizado entre os municípios de Brejo
da Madre de Deus, Belo Jardim e Sanharó. E. Brejo de Altitude de Poção, localizado entre os
municípios de Poção e Jataúba.
4. DISCUSSÃO
É importante ressaltar que a identificação dessas sete áreas esta limitada à escala do
mapa de solos do Estado de Pernambuco (1:100.000), esta escala está em função do nível de
observação de campo que a escala do trabalho permitiu. Portanto, em escala mais detalhada é
possível a identificação de novas áreas.
Um aspecto importante observado nos brejos de altitude estudados é a camada
superficial dos solos rica em matéria orgânica (carbono). Estes teores elevados de matéria
orgânica contribuem para uma fertilidade mais elevada aos solos, favorecendo a produção de
lavouras diversas. Neste contexto, a presença desses horizontes superficiais, de cores escuras
e teores elevados de carbono, reflete uma condição de umidade elevada que propiciou à
formação de uma cobertura vegetal perenifólia ou subperenifólia (remanescente). Portanto, a
presença desses horizontes, mesmo que a vegetação original tenha sido totalmente devastada,
indica uma condição especial de elevada umidade em épocas passadas.
Pode-se observar que nem todas as elevações com mais de 700 m ou mais de 1.000 m,
constituem brejos de altitude. Um bom exemplo pode ser visto nos brejos de Poção e das
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Serra das Varas (Arcoverde) onde, nas mesmas cotas (em torno de 900 a 1.000 m), de um
lado encontra-se áreas com vegetação de floresta subcaducifólia e solos com horizonte
superficial espesso e rico em matéria orgânica e, do outro, vegetação de floresta caducifólia,
ocorrendo também, áreas com transição da floresta caducifólia para caatinga hipoxerófila e
solos com horizonte superficial com médio teor de matéria orgânica.
De um modo geral, as áreas de brejos de altitude selecionadas apresentam
características bastante similares entre si, quanto às condições de clima, cobertura vegetal,
solos e topografia. Entretanto, verifica-se que os brejos de Bituri e Taquaritinga do Norte são
um pouco mais úmidos e apresentam uma cobertura pedológica com um percentual maior de
áreas de solos mais profundos. Embora o relevo seja mais acidentado, as áreas de relevo mais
propício apresentam um potencial agroecológico considerável, haja vista a disponibilidade
elevada de umidade e a riqueza em matéria orgânica dos horizontes superficiais dos solos.
Os brejos de Poção, e das Serras de Ororobá, Sabiá (Pesqueira) e da Serra das Varas
(Arcoverde), apresentam áreas um pouco mais secas. A cobertura vegetal é do tipo
subcaducifólia e caducifólia, ocorrendo formações de transição entre floresta caducifólia e
caatinga hipoxerófila em áreas de relevo mais dissecado. A cobertura pedológica é, em geral,
menos espessa do que a dos brejos de Bituri e Taquaritinga, predominando solos pouco
profundos e rasos, com presença de afloramentos rochosos. As fortes declividades
encontradas nestas eras são os fatores limitantes ao uso agrícola. Portanto, o potencial
agroecológico é bastante limitado. Apenas as áreas menos declivosas, com solos mais
profundos, podem ser aproveitadas para a produção de culturas. As demais áreas deveriam ser
utilizadas para preservação ambiental ou mesmo, para uma produção controlada utilizando-se
um sistema agroflorestal.
As áreas dos brejos das serras Negra e Verde possuem condições de umidade mais
baixas do que as dos brejos anteriormente descritos. A cobertura vegetal natural é
representada por florestas subcaducifólia e caducifólia, com trechos de relevo mais dissecado
e mais seco com cobertura vegetal de transição da floresta caducifólia para caatinga
hipoxerófila. O relevo dessas áreas é mais acidentado e com uma quantidade maior de
afloramentos rochoso. A cobertura pedológica é representada por solos mais rasos e pouco
profundos e a camada superficial que inicialmente era rica em matéria orgânica, hoje está
bastante degradada. O potencial agroecológico dessas terras é muito baixo. Recomenda-se o
uso de práticas conservacionistas, tanto para os solos como para as coberturas vegetais
florestais remanescentes.
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Não se tem certeza quanto à existência de uma diferença entre a cobertura vegetal dos
brejos de altitude, considerados elementos orográficos isolados (ilhas) em meio à vegetação
de caatinga hipoxerófila, e a dos demais brejos das áreas serranas do Agreste de Pernambuco.
Existe, sim, uma cobertura vegetal com bastante similaridade, porém com espécies próprias
nos brejos aqui estudados. Em “Plantas Vasculares das Florestas Serranas de Pernambuco”
um número considerável de espécies é citado, sem, no entanto, terem sido taxonomicamente
identificadas (SALES et. al., 1988). Portanto, a ocorrências de endemismo nessas florestas
precisa ser ainda mais detalhadamente investigado.
Quando relacionados com os demais brejos de altitude descritos no Agreste
Pernambuco, a exemplo da Serra dos Cavalos, não se tem certeza quanto à existência de uma
diferença entre a cobertura vegetal desses, com a dos brejos de altitude isolados. Existe, sim,
uma cobertura vegetal com bastante similaridade, porém com espécies próprias nos brejos
isolados. Portanto, a proporção de espécies endêmicas nos brejos de altitude isolados pode
estar correlacionada com a continentalidade, assim como os brejos de altitude encontrados no
Sertão pernambucano.
5. CONCLUSÕES
As áreas de brejos de altitude apresentam características bastante similares entre si,
quanto às condições de clima, cobertura vegetal, solos e topografia. Apesar de importantes do
ponto de vista da conservação da biodiversidade, o atual ritmo de degradação pode levar esses
brejos ao completo desaparecimento em um futuro muito próximo. Daí fazer-se necessário o
estabelecimento de políticas capazes de reduzir fortemente a probabilidade de extinção de
espécies e garantir a manutenção dos “serviços ambientais” prestados pelos brejos de altitude
às populações locais.
6. AGRADECIMENTOS
À Fundação de Amparo à Ciência e Tecnologia do Estado de Pernambuco (FACEPE).
7. REFERÊNCIAS
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Pernambuco. Acta Botanica Brasilica, v. 17, p. 287-303.
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