SENHOR PRESIDENTE, SENHORAS DEPUTADAS, SENHORES DEPUTADOS. O Brasil e Pernambuco, em particular, comemoram, neste momento, os noventa anos de nascimento de Hermilo Borba Filho, uma das vozes mais atuantes, e importantes, da cultura brasileira, além de ativista político sempre de primeira hora. Nascido no Engenho Verde, município de Palmares, Zona da Mata Sil de Pernambuco, em 1917, desde muito cedo escreveu, dirigiu e representou no teatro de sua cidade, encontrando, mais tarde, no Recife, o seu território emocional, embora tenha sido, na verdade, um cidadão do mundo. Autoridades e intelectuais do nosso Estado estão mobilizados numa celebração que envolve muitas atividades. Foram programados lançamentos de livro – entre eles a nova edição do romance “Caminhos da Solidão”, cuja primeira edição é de 1957, pela José Olympio Editora, do Rio de Janeiro – encontro de cavalos marinhos, um novo espetáculo do Quinteto Violado e do Grupo Sá Grama, chamado “A trilha sonora de uma vida”, além de debates sobre a importância da obra teatral do homenageado. Hermilo Borba Filho desde muito cedo percebeu que a literatura e a política trilhavam o mesmo caminho. Por isso se aproximou das manifestações populares – a dança, a música, o teatro e a literatura – para construir uma obra reconhecidamente importante e fundamental para a análise da cultura brasileira. Em toda a sua obra brilham elementos que proclamam a necessidade da participação política do homem nas atividades que exerce, de forma a conhecer os caminhos da liberdade e integração na vida social. Ainda muito jovem, estudante do antigo ginásio, entrou, em 1937, para a secretaria de Cultura de Palmares, atuando no Teatro Cinema Apolo – hoje transformado na Fundação Casa de Cultura Hermilo Borba Filho Percorreu os caminhos de iniciante, através do ponto – o “ponto”, na linguagem teatral, é a pessoa que ficava escondida oara lembrar ao elenco o texto da peça -, tornando-se depois ator, em seguida diretor, e logo era também o autor da peça “Felicidade”. Mais tarde proclamaria: “Sempre quis ser dramaturgo”, embora tenha escrito e publicado inúmeros contos, novelas e romances. O prédio do Teatro Cinema Apolo, aliás, foi inteiramente reformado no terceiro Governo Miguel Arraes e agora será reestruturado, através de iniciativa do governador Eduardo Campos, que implantará novo impulso 1 cultural à Região da Mata Sul, importante centro de cultura popular do Estado de Pernambuco. Ainda muito jovem, aos 19 anos de idade, ingressou na Faculdade de Medicina do Recife, mas logo percebeu que sua atividade cultural levava-o para novas investidas e abandonou o curso no terceiro ano. A inquietação intelectual levou-o a nova investida: o curso de Química Industrial, da Universidade do Recife, a que também renunciou, entrando, já em 1946, na Faculdade de Direito, onde encontraria um grupo disposto a renovar o teatro pernambucano. “Cheio de idéias a respeito da arte dramática, da valorização da cultura regional e do autor nordestino, inventou espaços para maturação e a ampliação de suas concepções. Em 1943, participou da fundação do Teatro Operário do Recife, do qual foi diretor, e, em 1946, assumiu a retomada do Teatro do Estudante de Pernambuco – TEP. Para a empreitada, reuniu Ariano Suassuna, Gastão de Holanda, Lula Cardoso Ayres e Capiba. No repertório trabalhou com Sófocles, Tchecov, Shakespeare, Ibsen, Garcia Lorca, o próprio Hermilo Borba Filho e Ariano Suassuna”, conforme informa Sônia Maria van Dijck Lima, em ensaio publicado na revista “Continente”, editada pela Companhia Editora de Pernambuco – Cepe -, do Governo de Pernambuco. Teatro para o povo. Este era o lema de Hermilo. Por isso foi criada “A Barraca”, circo de lona, que se deslocava para os bairros da cidade do Recife. A experiência era custosa. Por isso, as salas de sanatórios, fábricas, presídios, escola e praças da capital pernambucana foram transformadas em palcos, onde o grupo passou a representar. Inquieto, Hermilo mudou-se para São Paulo em 1952, exercendo ali a atividade jornalística e assinando colunas de crítica teatral. Logo voltou ao Recife, e já em 1960 fundava junto a amigos, entre eles a esposa Leda Alves, o Teatro Popular do Nordeste – o TPN -, que naquela época envolvia-se com as atividades intelectuais, mas era também o principal centro de resistência política contra a ditadura que, logo depois, se instalou no poder. O teatro reunia intelectuais de todas as matizes para o debate em torno do futuro político do País e buscavam-se fórmulas para combater a injustiça política. Ao lado disso, Hermilo lecionava no Curso de Teatro, da Universidade do Recife, ao lado de Ariano Suassuna, e tendo como aluno, entre outros, o hoje consagrado Osman Lins, cuja peça “Lisbela e o Prisioneiro” nasceu nos bancos do curso, sob a orientação dos dois mestres já autores famosos. Data deste período a profunda e definitiva ligação com Leda Alves. É também neste período que inicia suas atividades como romancista, publicado pela José Olympio Editora, em 1957, seu primeiro romance: “Os caminhos da solidão!, imediatamente elogiado pela crítica, que proclama a 2 renovação da literatura nordestina, através das diversas técnicas ficcionais. Logo em seguida vêem “A História de um tatuetê” (1958), e em seguida o seu romance mais denso e mais bem acabado: “Sol das almas” (1964). E logo em seguida tem início a publicação da tetralogia “Um cavaleiro da segunda decadência”, reúne dos romance: “Margem das Lembranças (66), “A porteira do mundo” (67), “O cavalo da noite” (68) e “Deus no Pasto” (72). Ainda segundo Sônia van Dijck Lima, “de fatura realista, a narrativa da tetralogia constrói-se com vários níveis de linguagem: a norma culta urbana, o coloquial, o popular regional. Ainda que realize o palavrão e o calão e prefira o disfemismo, recorre ao eufemismo em muitas ocasiões. A polifonia impõe-se no espaço transtextual, entre outras frentes, tanto pela literatura erudita como pelo romanceiro popular, aproveitando-se também de casos, anedotas, ditos, provérbios e de episódios dos romances anteriores”. A publicação do romance “Agá” (74) adensa e revela um mundo multifacetado, onde a linguagem se mostra ainda mais fragmentada e onde o personagem muda de personalidade ao longo da narrativa. Aí aparece o “Livro dos Mortos”, escrita com a colaboração do pintor José Cláudio, que na verdade é uma pequena história da tortura no País. Aparecem, ainda, as novelas “O general está pintando” (73), “Sete dias a cavalo” (75) e “As meninas do sobrado” (76), livro póstumo que foi lançado pela Editora Civilização Brasileira, ao lado de “Os ambulantes de Deus” (76). Morreu no dia 2 de julho de 1976. Hermilo deixou uma obra de denúncia e transgressão, comprometida com as dores do homem, e com uma proposta poética renovadora; e mais os desafios de seu acervo e de seus projetos interrompidos. Muito Obrigada. Brasília , 15 de agosto de 2007 Ana Arraes Deputada Federal 3