Faculdade de Ciências e Tecnologia Departamento de Engenharia Civil DISCIPLINA DE FUNDAMENTOS DE GEOTECNIA CAPITULO 3 – INTRODUÇÃO À DESCRIÇÃO E CLASSIFICAÇÃO DAS ROCHAS Prof. Carlos Nunes da Costa 2006/2007 FUNDAMENTOS DE GEOTECNIA Cap. 3 - INTRODUÇÃO À DESCRIÇÃO E CLASSIFICAÇÃO DE ROCHAS ÍNDICE 1. DEFINIÇÕES....................................................................................................................... 2 2. CONCEITO DE “FRONTEIRA” ENTRE SOLOS E ROCHAS ........................................... 3 3. CLASSIFICAÇÃO DE ROCHAS......................................................................................... 4 3.1 Classificação geológica-litológica .................................................................................. 4 3.2 Conceito de maciço rochoso.......................................................................................... 6 3.3 Descrição e classificação de maciços rochosos ............................................................ 7 EXEMPLOS DE APLICAÇÃO .............................................................................................. 12 FONTES DE INFORMAÇÃO E MAIS LEITURAS EM: ........................................................ 15 III-1 FUNDAMENTOS DE GEOTECNIA Cap. 3 - INTRODUÇÃO À DESCRIÇÃO E CLASSIFICAÇÃO DE ROCHAS INTRODUÇÃO À DESCRIÇÃO E CLASSIFICAÇÃO DE ROCHAS SUMÁRIO Introdução à descrição e classificação de terrenos. Definições. Conceito de “fronteira” entre solos e rochas. Materiais de transição: solos duros e rochas brandas. Rochas de baixa resistência. Classificação de rochas. Classificação geológica-litológica. Conceito de maciço rochoso. Materialrocha e descontinuidades. Superfícies de fraqueza. Anisotropia e heterogeneidade. Classificação de maciços rochosos. Descrição Geotécnica Básica (BGD). Classificações quanto ao estado de fracturação, à espessura das camadas, à resistência à compressão uniaxial e ao ângulo de atrito das descontinuidades. Propriedades-índice das rochas: porosidade, peso específico, resistência à compressão uniaxial, durabilidade. Índices de qualidade do maciço rochoso: percentagem de recuperação, RQD (Rock Quality Designation), velocidade de propagação das ondas elásticas longitudinais. Exemplos de aplicação. 1. DEFINIÇÕES Os terrenos foram já anteriormente definidos como sendo “os materiais naturais que englobam os solos e as rochas” (LNEC, 1962). Importa pois fazer agora a distinção entre estes dois tipos de materiais. Segundo Vallejo (2002) “rochas são agregados naturais duros e compactos de partículas minerais com fortes uniões coesivas permanentes que habitualmente se consideram um sistema contínuo.” A proporção dos diferentes minerais, a estrutura granular, a textura e a origem da rocha, características intrinsecamente geológicas, servem também para a sua classificação em termos de engenharia. Por sua vez “solos são agregados naturais de grãos minerais unidos por forças de contacto normais e tangenciais às superfícies das partículas adjacentes, separáveis por meios mecânicos de pouca energia” (e que convencional e tradicionalmente se designa por “agitação em água”). Os solos originam-se normalmente por processos de alteração1 e desagregação das rochas, sejam elas sedimentares, ígneas ou metamórficas, nomeadamente quando se encontram sujeitas aos agentes meteóricos. Determinados minerais são mais susceptíveis à alteração química por estarem em menor equilíbrio com o meio atmosférico. Apresenta-se seguidamente uma lista dos minerais por ordem de menor para maior estabilidade: olivina, III-2 FUNDAMENTOS DE GEOTECNIA Cap. 3 - INTRODUÇÃO À DESCRIÇÃO E CLASSIFICAÇÃO DE ROCHAS feldspato de cálcio, piroxena, anfíbola, feldspato de sódio, biotite, feldspato de potássio, moscovite, quartzo. O quartzo é o mineral que se forma a temperaturas mais próximas das da superfície terrestre (cerca de 300ºC) por isso é o mais estável nessas condições ambientais. Formam-se solos residuais2 quando os produtos da decomposição permanecem in situ: caso contrário são transportados, podendo sofrer todo o ciclo do processo sedimentar até à diagénese, voltando a transformar-se em rocha (sedimentar). Modernamente devem ainda ser considerados os solos antrópicos, solos não naturais, provenientes da actividade humana, de composição heterogénea, e por isso difíceis de caracterizar. Eles formam grande parte do subsolo das grandes cidades (em aterros, demolições).Só na Europa são produzidos 300 milhões ton/ano de resíduos da construção e demolição, estimando-se um bilião de toneladas/ano em todo o mundo. Quanto aos resíduos sólidos urbanos, só em Portugalproduzem-se cerca de 4,5 milhões ton/ano, correspondendo a uma capitação superior a 1kg/pessoa/dia. Os solos são uma entidade extremamente importante no contexto da engenharia: extremamente úteis enquanto materiais de construção, problemáticos em muitos casos devido ao seu comportamento deficiente face às mais variadas solicitações. 2. CONCEITO DE “FRONTEIRA” ENTRE SOLOS E ROCHAS Como se depreende do atrás exposto, existe uma apreciável “zona de sombra ”onde caem os chamados “terrenos de transição”. Nesta zona de transição estariam os denominados solos duros e rochas brandas. Um critério bastante usado para o estabelecimento dos limites entre solos e rocha é o valor de resistência à compressão uniaxial3. Esses valores têm vindo a descer até 1,25 MPa, à medida que a investigação em rochas extremamente brandas tem vindo a desenvolver-se (Vallejo, 2002). Estes terrenos foram anteriormente classificados por M. Rocha (1977) como “materiais de baixa resistência” ou “rochas de baixa resistência” e ocupam para um conjunto de propriedades mecânicas uma posição intermédia entre os solos e as rochas, como se pode depreender da Tabela seguinte (adaptado de Rocha, 1977). 1 A alteração é o mais poderoso dos processos tempo-dependentes a actuar sobre os maciços rochosos, razão porque se dará um destaque particular a esta matéria mais adiante. 2 Em muitos casos é difícil de traçar o limite entre estes e a rocha-mãe. 3 Máximo esforço que suporta um provete normalizado antes de romper ao ser carregado axialmente em laboratório III-3 FUNDAMENTOS DE GEOTECNIA Cap. 3 - INTRODUÇÃO À DESCRIÇÃO E CLASSIFICAÇÃO DE ROCHAS Tabela 1 – Algumas propriedades mecânicas de rochas, solos e rochas de baixa resistência (adapt. Rocha, 1977) Parâmetros Solos Rochas Módulo de Deformabilidade (MPa) Resistência à Compressão Uniaxial (MPa) Coesão (MPa) Ângulo de atrito <50 <2 <0.25 <40º 4x102 a 105 2 a 3x102 0.4 a 3x102 <65º Rochas de baixa resistência 4x102 a 4x103 2 a 20 0.4 a 50 <45º Em obediência à sequência genética dos terrenos, abordar-se-á, em primeiro lugar, a temática da classificação das rochas, deixando-se para depois a classificação dos solos. Muitos dos conceitos apresentados em seguida sê-lo-ão agora de forma sumária para, em lições posteriores, serem retomados e desenvolvidos. 3. CLASSIFICAÇÃO DE ROCHAS 3.1 Classificação geológica-litológica Quando se pretende fazer o estudo dos terrenos interessados num problema de Engenharia é normal iniciá-lo pela sua classificação geológica, ou litológica. Estas classificações, que aportam informação sobre a composição mineralógica, a textura e o fabric das rochas e a predominância de certos minerais nas respectivas formações geológicas são importantes em virtude da sua informação implícita. R. Oliveira (1981) cita o caso dos calcários, em que a simples designação alerta para a possibilidade de ocorrência de fenómenos de dissolução, responsáveis por eventuais cavidades propiciadoras de instabilidade por subsidência para as mais variadas obras de engenharia. Na disciplina de Geologia estas classificações foram exaustivamente estudadas pelo que não se justifica grande detalhe no presente documento. Apresenta-se na Tabela 2, a título meramente ilustrativo, uma classificação geológica de rochas quanto à sua origem, com referência a alguns exemplos de rochas mais vulgares. Tabela 2 – Classificação geológica (adaptado e modificado de Vallejo, 2002) Sedimentares Ígneas Metamórficas Detríticas Químicas Orgânicas Plutónicas Vulcânicas Massivas Foliadas Quartzito, arenito, siltito, argilito Calcário, dolomito, salgema Carvão, turfa, calcário Granito, gabro, diorito, peridotito Basalto, andesito, riolito Quartzito, mármore, corneana Xisto, gneisse, filito, micaxisto Como se pode observar alguns termos ocorrem classificados duplamente (ex: calcário pode ser rocha sedimentar química ou orgânica; quartzito pode ser rocha sedimentar ou metamórfica). Por outro lado, algumas rochas, como as margas, sendo intrinsecamente a III-4 FUNDAMENTOS DE GEOTECNIA Cap. 3 - INTRODUÇÃO À DESCRIÇÃO E CLASSIFICAÇÃO DE ROCHAS combinação de minerais geneticamente distintos (neste caso, minerais das argilas e carbonato de cálcio - calcite) são “meio detríticas-meio químicas”. Finalmente poderá dizerse que, em alguns casos, existem termos de transição que atravessam várias classes: é o caso do argilito xistoso (rocha sedimentar) / xisto argiloso (rocha metamórfica). Existem ainda alguns tipos especiais de rochas sedimentares que merecem ser referidos: é o caso das rochas residuais, em particular as que se formam em climas tropicais, como a bauxite e a laterite, que apresentam propriedades específicas importantes, não só do ponto de vista económico como geotécnico. Refira-se ainda que as rochas sedimentares detríticas são classificadas essencialmente em função da dimensão das partículas (composição granulométrica) o que as aproxima decisivamente, em termos de classificação, dos solos que resultam da sua desagregação. Assim, um conglomerado e um arenito, ao desagregarem-se darão lugar respectivamente a um solo com seixo/calhau e areia, assim como um siltito e um argilito são respectivamente agregados de partículas de silte e argila, ainda que neste último caso seja muito mais do que a simples agregação física-mecânica de partículas4. Finalmente retira-se da Tabela 2 que as rochas ígneas são grandes fornecedoras de materiais de construção, bem como as rochas metamórficas não foliadas (massivas). Já as rochas sedimentares são menos interessantes, excepção feita aos quartzitos, calcários e dolomitos. Contudo os minerais das rochas ígneas e metamórficas ditos primários são muito susceptíveis à alteração, dando origem a novos minerais, designados de secundários, e a substâncias solúveis, conforme se indica na tabela 3. Tabela 3 – Produtos da decomposição dos minerais primários (adaptado de Leet, 1965 in Rocha, 1981) Mineral Composição Quartzo (qz.) SiO2 Qz. em grãos Sílica em solução Sílica em solução Carbonato K (solúvel) Sílica em solução Carbonato K e Ca (solúveis) Felsdpato K Ortose ((Si3,Al)O8)K Minerais de argila e qz. fina/dividido (1) Plagioclases Albite Anortite ((Si3,Al)O8)Na ((Si3,Al)O8)Ca Idem a (1) + Calcite Biotite Augite Horneblenda Aluminosilicatos de Fe, Mg, Ca Olivina (SiO4)(Fe, Mg) Ferromagnesianos 4 Produtos de decomposição Minerais Outros Idem a (1) + Calcite, Limonite, Hematite Limonite, Hematite e qz. fina/ dividido Sílica em solução Carbonato Ca e Mg (solúveis) Sílica em solução Carbonato Fe e Mg (solúveis) Pela sua importância e especificidade as argilas terão um tratamento particular nesta disciplina. III-5 FUNDAMENTOS DE GEOTECNIA Cap. 3 - INTRODUÇÃO À DESCRIÇÃO E CLASSIFICAÇÃO DE ROCHAS 3.2 Conceito de maciço rochoso Em Geotecnia o estudo das rochas (realizado no âmbito da Geologia), dá lugar ao estudo dos maciços rochosos. Com efeito a Mecânica das Rochas, disciplina da Geotecnia, tem como finalidade conhecer e prever o comportamento dos maciços rochosos face à actuação das solicitações (internas e externas) que sobre eles se exercem. Um maciço rochoso pode ser concebido como uma entidade constituída por duas parcelas: um meio sólido – o “material-rocha” ou, se se quiser, a “matriz rochosa” as descontinuidades que o compartimentam. Estas descontinuidades funcionam, portanto, como superfícies de fraqueza que separam blocos de “rocha intacta” e controlam os processos de deformação e rotura dos maciços rochosos a cotas superficiais, que são as que interessam a grande maioria das obras de engenharia. São também elas que permitem a extracção dos materiais rochosos nas pedreiras onde, naturalmente, se aproveitam as superfícies de fraqueza para obter o desmonte primário das massas exploráveis. Ao definir-se maciço rochoso como uma entidade composta por duas parcelas – o “materialrocha”, por oposição às descontinuidades que o compartimentam, é-se levado a pensar, intuitivamente, que o “material-rocha” é um meio sólido contínuo, homogéneo, isótropo e elástico, condições que raramente correspondem às características reais dos materiais rochosos5. Deduz-se portanto que, para o estudo do comportamento mecânico de um maciço rochoso devem analisar-se as propriedades, tanto da “matriz rochosa” como das descontinuidades. Porém, para maciços de qualidade média a elevada as descontinuidades são o aspecto fundamental a ter em conta no comportamento mecânico do maciço e daí a importância que se lhes atribui na análise das características geomecânicas dos maciços rochosos por via semi-empírica (Barton et al, 1974; Rocha 1976; Bieniawski, 1979). Esta estrutura “em blocos” confere uma natureza descontínua aos maciços rochosos. Por outro lado a presença de descontinuidades sistemáticas com determinada orientação, como os planos de estratificação, ou superfícies de laminação, implica um comportamento 5 Com efeito, Griffith (in Mello Mendes, 1967), ao partir da necessidade de explicar o facto de que as resistências determinadas na prática para materiais frágeis são muito mais baixas do que as calculadas por via teórica, considera que o “material-rocha”, longe de ser um meio contínuo, homogéneo e isótropo, contem sempre micro-descontinuidades, fissuras e poros, a partir dos quais se pode iniciar a rotura. III-6 FUNDAMENTOS DE GEOTECNIA Cap. 3 - INTRODUÇÃO À DESCRIÇÃO E CLASSIFICAÇÃO DE ROCHAS anisótropo6: esta situação é particularmente evidente na avaliação da deformabilidade em maciços xistosos, em que os valores variam drasticamente para as direcções paralela e perpendicular à orientação dos planos de xistosidade. Outra característica importante é a heterogeneidade ou variabilidade das propriedades físicas e mecânicas em zonas distintas do maciço rochoso (ou mesmo de ponto para ponto). Os factores associados à heterogeneidade de um corpo rochoso e a sua variação traduzemse, na prática, pela dispersão dos resultados, para cada propriedade determinada em ensaios conduzidos no corpo considerado (Charrua Graça, 1984). 3.3 Descrição e classificação de maciços rochosos As características de qualidade dos maciços rochosos podem ser descritas de forma simples através de classificações baseadas em métodos expeditos de observação. Um dos parâmetros mais fáceis de descrever, mas também dos mais importantes, é o estado de alteração de um maciço rochoso, da forma como se apresenta na Tabela seguinte: Tabela 4 - Estado de alteração do maciço rochoso Símbolos Designações W1 Sã W2 Pouco alterada W3 Medianamente alterada W4 Muito alterada W5 Decomposta Características A rocha não apresenta quaisquer sinais de alteração Sinais de alteração apenas nos planos e bordos das descontinuidades Alteração visível em todo o maciço rochoso (mudança de cor) mas a rocha não é friável7 Alteração visível em todo o maciço e a rocha é parcialmente friável O maciço apresenta-se completamente friável (comportamento de solo) Nota: na versão simplificada ter-se-á: W1-2 – Sã a pouco alterada; W3 – medianamente alterada; W4-5 – muito alterada a decomposta. Outros parâmetros de simples observação podem ser usados para a classificação expedita dos maciços rochosos. A Sociedade Internacional de Mecânica das Rochas (SIMR) propôs em 1981 a Descrição Geotécnica Básica (Basic Geotechnical Description – BGD) composta pelas seguintes classificações: ¾ classificação quanto ao estado de fracturação (F), ou de afastamento (ou espaçamento) entre fracturas; ¾ classificação quanto à espessura das camadas (L)8; 6 7 Ou seja, as propriedades (mecânicas e outras) variam segundo a direcção considerada. Não se desagrega em contacto com a água III-7 FUNDAMENTOS DE GEOTECNIA Cap. 3 - INTRODUÇÃO À DESCRIÇÃO E CLASSIFICAÇÃO DE ROCHAS ¾ classificação quanto à resistência à compressão uniaxial (S)9 ¾ classificação quanto ao ângulo de atrito das descontinuidades (A) Estas quatro classificações, em conjunto com a do estado de alteração (W)10, serão suficientes para descrever sucintamente a qualidade de um maciço rochoso na maior parte dos problemas que interessam à engenharia. Nas tabelas seguintes apresentam-se as classificações referidas: Tabela 5 - Estado de fracturação do maciço rochoso Símbolos Intervalos de afastamento (cm) Afastamento das fracturas Estado de fracturação do maciço F1 F2 F3 F4 F5 >200 60 a 200 20 a 60 6 a 20 <6 Muito afastadas Afastadas Medianamente afastadas Próximas Muito próximas Muito pouco fracturado Pouco fracturado Medianamente fracturado Muito fracturado Fragmentado Nota: na versão simplificada ter-se-á: F1-2 – Muito pouco fracturado a pouco fracturado; F3 – medianamente fracturado; F4-5 – muito fracturado a fragmentado. Tabela 6 - Espessura das camadas (L) Símbolos L1 L2 L3 L4 L5 Intervalos (cm) >200 60 a 200 20 a 60 6 a 20 <6 Designações Muito espessas Espessas Medianamente espessas Delgadas Muito delgadas Nota: na versão simplificada ter-se-á: L1-2 – Muito espessas a espessas; L3 – medianamente espessas; L4-5 – delgadas a muito delgadas. Tabela 7 - Resistência à compressão uniaxial (S) Símbolos S1 S2 S3 S4 S5 Intervalos (MPa) >200 60 a 200 20 a 60 6 a 20 <6 Designações Muito elevada Elevada Média Baixa Muito baixa Nota: na versão simplificada ter-se-á: S1-2 – Muito elevada a elevada; S3 – média; S4-5 – baixa a muito baixa. Tabela 8 – Ângulo de atrito das descontinuidades (A) Símbolos A1 A2 A3 A4 A5 Intervalos >45º 40º a 45º 35ºa 40º 30º a 35º <30º Designações Muito elevado Elevado Médio Baixo Muito baixo Nota: na versão simplificada ter-se-á: A1-2 – Muito elevado a elevado; A3 – médio; A4-5 – baixo a muito baixo. 8 Do inglês: layer Do inglês: strength 10 Do inglês: weathering 9 III-8 FUNDAMENTOS DE GEOTECNIA Cap. 3 - INTRODUÇÃO À DESCRIÇÃO E CLASSIFICAÇÃO DE ROCHAS Note-se que a resistência à compressão uniaxial é já um parâmetro que descreve uma característica mecânica do “material-rocha” em si, mais do que propriamente do maciço rochoso, formado por “blocos” de “rocha intacta”. A resistência mecânica à compressão pode mesmo considerar-se uma propriedade-indice da maior importância. Ela é dada por: σc = Fc A Em que Fc é a força compressiva aplicada e A é a área de aplicação. As propriedades físicas, ou propriedades-índice das rochas, determinam-se normalmente em laboratório: as mais importantes a nível da influência no comportamento mecânico dos materiais rochosos são, para além da resistência à compressão, a porosidade, o peso específico e a alterabilidade, ou durabilidade. A porosidade (n) é a relação entre o volume ocupado pelos vazios ou poros da rocha (Vv) e o volume total (V): n= Vv V A porosidade pode variar entre 0 e 90%, com valores normais entre 15 e 30%. A porosidade normalmente é inversamente proporcional à idade geológica e directamente proporcional ao grau de alteração. As rochas sedimentares detríticas, a par de algumas rochas vulcânicas e de rochas muito alteradas apresentam os maiores valores. As rochas utilizadas para como materiais de construção, especialmente as rochas ígneas, costumam apresentar valores muito baixos, próximos de zero. Os calcários com mais de 10% de porosidade são normalmente rejeitados na produção de agregados. O peso específico da rocha, ou peso por unidade de volume, depende dos seus componentes. As rochas, mais do que os solos apresentam uma grande variação nos valores do peso específico. As rochas ígneas de composição básica apresentam os maiores pesos específicos. Na tabela 9 apresentam-se valores de resistência à compressão uniaxial, peso específico e porosidade para algumas rochas utilizadas como materiais de construção. Como se vê todas estas rochas apresentam, quando sãs, resistências à compressão elevadas a muito elevadas, porosidades baixas e peso específicos elevados. III-9 FUNDAMENTOS DE GEOTECNIA Cap. 3 - INTRODUÇÃO À DESCRIÇÃO E CLASSIFICAÇÃO DE ROCHAS Tabela 9 - Valores médios de resistência à compressão uniaxial para rochas (adapt. e modif. de Vallejo et al, 2002) Rocha Andesito Basalto Calcário Quartzito Diorito Dolomito Gabro Granito Grauvaque σc (MPa) 210 - 320 150 - 215 80 - 140 200 - 320 180 - 245 200 - 300 210 - 280 170 - 230 180 Peso específico (g/cm3) Porosidade (%) 2,2 - 2,35 2,7 - 2,9 2,3 - 2,6 2,6 - 2,7 2,7 - 2,85 2,5 - 2,6 3,0 - 3,1 2,6 - 2,7 2,8 10 - 15 0,1 - 2 5 - 20 0,1 - 0,5 0,2 - 1,0 0,5 - 10 0,1 - 0,2 0,5 - 1,5 3 A durabilidade é a resistência que a rocha apresenta perante os processos de alteração (como a hidratação, dissolução, oxidação, etc…). Pretende-se que os materiais rochosos utilizados em obra conservem ao longo do tempo as suas características mecânicas (e outras), ou que, pelo menos não se degradem para além de certos limites compatíveis com as suas funções em obra. A durabilidade em regra é directamente proporcional ao peso específico e inversamente proporcional à porosidade. Determinados tipos de rochas com conteúdos importantes em minerais argilosos (alguns calcários e rochas ígneas, por exemplo), quando expostos ao ar ou na presença de água, degradam-se rapidamente, não sendo aconselháveis para a utilização como materiais de construção. A durabilidade é avaliada em ensaios de laboratório, como o ensaio de expansibilidade, de cristalização de sais, o slake durability test, o micro-Deval ou o ensaio na máquina de Los Angeles. O primeiro avalia a susceptibilidade de uma rocha aumentar de volume na presença de água, fenómeno associado à porosidade e à percentagem de minerais argilosos. O segundo procura determinar a resistência a agentes meteóricos, nomeadamente aos danos produzidos pela cristalização de sais no interior de rochas11. Os dois últimos dão origem a um índice que representa a percentagem em peso seco de rocha que fica retida (ou que passa) no tambor depois de determinados ciclos de desgaste. Na prática utilizam-se, com frequência, critérios indirectos, ou de campo, que informam sobre a qualidade da rocha do maciço rochoso a níveis onde a observação directa não é possível. Esses critérios são obtidos através de trabalhos de prospecção geotécnica12, quer recorrendo a métodos mecânicos, quer geofísicos, tão necessários para o reconhecimento e avaliação das reservas minerais e para o planeamento da lavra. 11 Utiliza-se vulgarmente uma solução de sulfato de sódio ou magnésio. Conjunto de operações que visam determinar a natureza e as características dos terrenos em profundidade e proceder à colheita de amostras para ensaios de laboratório. 12 III-10 FUNDAMENTOS DE GEOTECNIA Cap. 3 - INTRODUÇÃO À DESCRIÇÃO E CLASSIFICAÇÃO DE ROCHAS Por exemplo, em sondagens mecânicas de rotação com amostragem contínua um critério muito utilizado é o da percentagem de recuperação13 da amostra, correlacionável com o estado de alteração. Embora este valor possa ser influenciado por vários factores externos à qualidade do maciço (condições do equipamento, competência do operador, etc..) poderá efectuar-se a seguinte equivalência: - % REC > 80% = W1-2 (maciço de boa qualidade) - % REC: 50 - 80% = W3 (maciço de qualidade mediana) - % REC < 50% = W4-5 (maciço de má qualidade) Mas o estudo dos testemunhos das sondagens pode também dar informações relevantes no que se refere ao estado de fracturação. No intuito de englobar num só os dois critérios – alteração e fracturação – foi desenvolvido um sistema de classificação, baseado na percentagem de recuperação, que se designou por RQD14 (rock quality designation) e que se apresenta na tabela 10. Tabela 10 - Classificação RQD, segundo Deere et al. (1988) RQD (%) 90-100 75-90 50-75 25-50 0-25 Qualidade do maciço Excelente Bom Razoável Fraco Muito fraco Outro ensaio de campo indicativo da qualidade do maciço rochoso é o da realização de perfis sísmicos de refracção, o que permite obter a velocidade de propagação das ondas elásticas nesse meio, parâmetro também possível de obter em laboratório para provetes de rocha (ensaio de ultrassons). No primeiro caso este parâmetro é correlacionável o estado de alteração e de fracturação do maciço; no segundo mais directamente com a porosidade da rocha. Na tabela 11 apresentam-se alguns dos valores típicos para as rochas mais correntes, em comparação com outros meios. Tabela 11 - Velocidade de propagação das ondas elásticas longitudinais Rocha Arenito Basalto Calcário Quartzito Dolomito Gabro Granito Ar Água Areia solta VL (m/s) 1.400-4.200 4.500-6.500 2.500-6.000 5.000-6.500 5.000-6.000 4.500-6.500 4.500-6.000 330 1.850 400-800 13 Percentagem de recuperação (% rec) = 100 x Σ comprimento dos tarolos / comprimento da furação, medido por manobra (isto é, por cada trecho furado). 14 RQD (%) =100 x Σ comprimento dos tarolos ≥ 10cm / comprimento da furação, por manobra III-11 FUNDAMENTOS DE GEOTECNIA Cap. 3 - INTRODUÇÃO À DESCRIÇÃO E CLASSIFICAÇÃO DE ROCHAS EXEMPLOS DE APLICAÇÃO (preparado por Eng.º Marco A. L. Marques) Introdução Como se referiu anteriormente, as rochas são materiais extremamente úteis nas realizações da Engenharia Civil, nomeadamente enquanto materiais de construção, contudo, muitas delas são susceptíveis à alteração, podendo acarretar graves problemas em obra. Sendo a água o grande agente de alteração das rochas, interessa estudar o modo como os materiais a absorvem, assim como a forma como a perdem. A água é transportada pelo espaço poroso interconectado e com ligação à superfície, assim como por fracturas e/ou descontinuidades no seio do material rochoso. A) Absorção de água por capilaridade A ascensão de água ao longo de capilares, ou seja de tubos de pequeno diâmetro, resulta da tensão superficial na interface ar-água. A água é um líquido que molha as paredes dos tubos (ao contrário do mercúrio) e por isso sobe e forma no interior dos mesmos meniscos côncavos. A tensão superficial ocasiona um diferencial de pressão entre os lados côncavo e convexo do menisco, sendo superior no primeiro. Considerando uma bolha (esfera) de gás num líquido, cortando-a por um plano diametral imaginário, vem que o diferencial de pressão tende a afastar os dois hemisférios. Porém este movimento é contrariado pela tensão superficial perimetral nos dois hemisférios, permitindo o equilíbrio entre o excesso de pressão que os afasta e a tensão superficial que os junta. Assim, fazendo um balanço de forças vem para a força do excesso de pressão P, sendo r o raio da esfera: Fp = π r2P A força que actua pela tensão superficial T perímetral (circunferência) é: FT = 2πrT π r2P = 2πrT No equilíbrio: Logo: P= 2T r Analisando as tensões num menisco formado num tubo capilar, temos na figura 1: Figura 1 – Pormenor de menisco na interface ar-água, adaptado de Matos Fernandes (1994) III-12 FUNDAMENTOS DE GEOTECNIA Cap. 3 - INTRODUÇÃO À DESCRIÇÃO E CLASSIFICAÇÃO DE ROCHAS Sendo: T, a tensão superficial na interface ar-água, que passamos a designar por σ, P, o diferencial de pressão entre os lados côncavo e convexo (interface) a, o raio do menisco, θ o ângulo de contacto entre o menisco e a parede do tubo de raio r Como a= r cos θ Surge a Equação de Laplace para a pressão capilar: P= 2σ cos θ r Se a água subir até o seu peso equilibrar a tensão superficial, a altura da ascensão capilar (hc), vem: 2πr T cosθ = πr2 hc γw (γw é a massa volúmica da água) Pela Lei de Jurin, temos: hc = 2T cos θ rγ w Exprime que a altura da ascensão capilar é inversamente proporcional aos raios dos capilares. A água não ascende até uma altura “infinita”, num capilar de raio infinitesimal porque a força da gravidade faz sentir a sua acção preponderante. Em paredes de alvenaria (por exemplo, de pedra) não ultrapassa alguns metros de altura. B) Secagem O processo de evaporação de água pela superfície de uma amostra de rocha saturada ocorre por um mecanismo de difusão, que se traduz no transporte de moléculas de água (sob a forma de vapor) no ar. Assumindo um meio rochoso isótropo, em que o transporte das moléculas de água ocorre segundo movimentos aleatórios, admitindo-se uma transferência unidireccional resultante das diferenças de concentração no meio, o respectivo gradiente vem: dC dx sendo, C – concentração da água difundida x - eixo de coordenadas perpendicular à superfície considerando-se o coeficiente de difusão D como constante (meio isótropo), a velocidade de transporte da matéria pela secção da amostra ou seja o fluxo é dado por: III-13 FUNDAMENTOS DE GEOTECNIA Cap. 3 - INTRODUÇÃO À DESCRIÇÃO E CLASSIFICAÇÃO DE ROCHAS q=-D dC dx (1ª Lei de Fick) A evolução ao longo do tempo da concentração da substância água no interior da rocha até o equilíbrio ser atingido, ou seja a equação de balanço material é dada por: ∂C = D ∂ 2 C ∂t ∂x 2 (2ª Lei de Fick) (Observação: Em Física as segundas derivadas parciais estão geralmente associadas a fenómenos de propagação/transporte). O gráfico seguinte (Figura 2) mostra a evolução da secagem numa amostra de rocha. Neste observa-se o teor de água ao longo do tempo. Teor água (%) Regime de fluxo constante Ponto crítico Regime de fluxo decrescente 0 0 t (h) O Processo de secagem ocorre segundo os regimes: • Fluxo de regime constante, inicial, em que a frente líquida se encontra em contacto com a superfície exterior e a variação de massa da amostra no tempo é linear. A amostra encontra-se ainda saturada de um modo uniforme ao longo de toda a sua espessura. • Fluxo de regime decrescente, em que a quantidade de água no interior da amostra deixa de ser suficiente para que a frente líquida permaneça em contacto com a superfície. A amostra deixa de estar saturada, ocorre recuo da frente líquida, a superfície exterior seca e a difusão do vapor de água processa-se em profundidade. A perda de massa da amostra decorre segundo a raiz quadrada do tempo. • Um último regime de fluxo constante, com taxas de evolução no tempo diferentes das do regime inicial. Designa-se por ponto crítico, o ponto do gráfico de secagem que assinala a transição do troço inicial recto para o troço curvo, ou seja que assinala a mudança do regime de fluxo constante para o regime de fluxo decrescente. III-14 FUNDAMENTOS DE GEOTECNIA Cap. 3 - INTRODUÇÃO À DESCRIÇÃO E CLASSIFICAÇÃO DE ROCHAS FONTES DE INFORMAÇÃO E MAIS LEITURAS EM: Barton, N.; Lien, R. & Lunde, J. (1974) – “Engineering classification of rock masses for the design of tunnel support”. Rock Mechanics, vol. 6, (4), pp. 189-236. Bieniawski, Z. T. (1979) – “The geomechanics classification in rock mechanics application”. Proc. 4 th International Cong. Rock Mech., ISRM, Montreaux, vol.2, pp. 41-48. Charrua-Graça, J. Gabriel (1984) – “Um conceito de medida de heterogeneidade”. Geotecnia (40), Lisboa, pp. 1-4. Deere, D.U. and Deere, D.W. (1988) – “The Rock Quality Designation (RQD) Index in Practice. Rock Classification Systems for Engineering Purposes”. Kirkaldie, L., ed. ASTM STP 984. 91-101. Philadelphia, Pennsylvania: American Society for Testing and Materials. González de Vallejo, L.; Ferrer, M; Ortuño, L e Oteo, C. (2002) – “Ingeniería Geológica”. Prentice Hall, 715 p. ISRM (1981) – “Basic Geotechnical Description of Rock Masses”. Int. J. Rock Mech. Sci. & Geomech. Abstr., 18:85-110. LNEC (1962) – “Vocabulário de Estradas e Aeródromos “. Matos Fernandes, M.A. (1994) – “Mecânica dos Solos”. FEUP, Porto. Mello-Mendes, F. (1967) – “Mecânica das Rochas”. AEIST, Lisboa. Oliveira, R. (1981) – “Introdução à Geologia de Engenharia”. Notas de aulas dos cursos de mestrado em Geotecnia da FCT/UNL (não publicado). Rocha, Manuel (1981) – “Mecânica das Rochas”. LNEC, Lisboa. Rocha, Manuel (1977) – “Alguns problemas relativos à mecânica das rochas dos materiais de baixa resistência”. 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