PDF Português - Revista Brasileira de Terapias Cognitivas

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Terapia Cognitiva narrativa em
Grupos Terapêuticos de mulheres de
terceira idade: uma perspectiva
sócio-clínica
Eliana da Silva Ramos Arruda*
Resumo
Este artigo tem sua origem a partir da dissertação de mestrado em que foi estudada a identidade de mulheres de terceira
idade pela análise de conteúdo de narrativas de um grupo de apoio, resultado de trabalho de campo com um grupo de mulheres
idosas que passam por um processo completo da terapia cognitiva narrativa. Nele, é enfocada a atuação terapêutica proposta
como uma estratégia para se pensar na ampliação dos nossos recursos clínicos, interligando-os à prática comunitária e social.
O objetivo é refletir sobre a inter-relação da Psicologia Clínica e da Social, apresentando-se um modelo de atuação em que essa
interface foi característica. Para tanto, a metodologia que é sugerida condiz com o enfoque narrativo, adaptado a grupos
terapêuticos, formados pela problemática comum, o que exige verificar questões identitárias numa visão psicossocial. Foi
aplicado o método de Psicoterapia Cognitiva Narrativa, observando-se, no grupo de mulheres de terceira idade, as atitudes:
Recordação, Descrição (ou Objetivação), Subjetivação, Metaforização e Projeção. Como resultado, além do prazer experimentado
no ato de narrar e reconstruir significados, dimensiona-se o sentido de vida e projetos individuais, que corresponderiam ao
resgate de cidadania, saúde mental e qualidade de vida das participantes. Concluindo, a tríade - narrativa, identidade e vida -,
foco central do projeto de existência humana, revela o Carpe Diem (agarrar o momento), ou seja, viver narrativamente, formandose e efetuando trocas com o mundo num perpétuo vir-a-ser.
Palavras-chave: narrativas; psicossocial; grupos de apoio; terapia narrativa; processos psicossociais; terceira idade; mulheres.
Abstract
This article stems from a master thesis in which the identities of elderly women were studied through the contents of the
narratives from a support group, which resulted from fieldwork with a group of elderly women that are going through a
complete process of narrative cognitive therapy. This article focuses therapeutic performance as a strategy for the expansion of
our clinical resources, linked to the social-communitarian practice. The goal is to reflect on the relation between clinical and
social psychology, by presenting an acting pattern characteristic to this interface. In this sense, the suggested methodology
suits the narrative focus adapted to therapeutic groups formed according to common problems, which demands checking
matters linked to identity in a psychosocial vision. The method applied was that of Narrative Cognitive Psychotherapy, taking
into account the following attitudes in the elderly women group: Recollection, Description (or Objectification), Subjectivation,
Metaphors and Projection. As a result, besides the pleasure experienced in narrating and rebuilding meanings, the sense of life
and individual projects are dimensioned, which means the recovery of citizenship, mental health and quality of life. To sum up,
the triad: narrative, identity and life, the main focus in the project of human existence, reveals the Carpe Diem (enjoy the
moment), that is, living in a narrative way, adapting oneself and exchanging with the world in a perpetual “going to be”.
Key words: narratives; psychosocial; support groups; narrative therapy; psychosocial processes; elderly; women.
*
Mestre em Psicologia pela Universidade São Marco e Especialista em Terapias Cognitivas e Construtivismo pela Universidade Paulista.
DOI: 10.5935/1808-5687.20050005
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Introdução
Este estudo visa descrever e refletir sobre um
modelo terapêutico elaborado e aplicado para um grupo
de apoio de mulheres de terceira idade, fonte de pesquisa
de dissertação de mestrado, que objetivou conhecer a
identidade do idoso a partir dos estudos relatados pelas
narrativas de histórias de vida desse grupo. A dissertação
aqui mencionada, além da descrição metodológica de
uma estratégia terapêutica desenvolvida para um grupo
específico, compreende o estudo do perfil do idoso e
sua visão acerca da vida, sendo esses aspectos sua maior
ênfase. Aproveita-se agora a oportunidade de aprofundar
a reflexão que foi uma das conclusões obtidas na
dissertação: a atuação terapêutica narrativa como uma
proposta de ampliação de nossos recursos clínicos,
interligando-se à prática comunitária e social. Portanto,
o objetivo do presente estudo é refletir a inter-relação
da Psicologia Clínica e Social, propondo-se um modelo
de atuação.
Algumas considerações
epistemológicas e teóricas
Comparando-se metodologia como uma trajetória
escolhida pelo pesquisador para compreender um
fenômeno (Arruda, 2003), neste estudo, a trajetória
escolhida para compreender a identidade de um grupo
e atuar terapeuticamente é a Narratividade, condizente
com a epistemologia construtivista que concebe a
experiência psicológica enquanto experiência narrativa.
Para Oscar Gonçalves, “existir é, nesse sentido, atualizar
o projeto dialético de constante mudança” (1998b,
p.182).
Antes de abordar essa questão, lembra-se que um
estudo de Psicologia Social exige que se aborde o tema
identidade, já que esta é uma das amplitudes ‘mais
centrais do psiquismo humano’ (Arruda, 2003).
Identidade, para alguns autores da Psicologia Social
dialética (Berger & Luckman, 1966/1983; Ciampa,
1984, 1986, 1998; Ferreira, 2000), é compreendida
como um processo contínuo, que se desenvolve a partir
da relação entre o indivíduo e seu mundo, não
combinando assim a concepção de verdades universais,
prontas e definidas a priori. Portanto, a significação
pessoal, a atribuição do indivíduo acerca de si e do que
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observa no seu viver e especialmente sua interação
social são marcas da diferença desta epistemologia, em
que a concepção psicológica compreende o homem
psicossocial, tal como concebe as abordagens
construcionistas, e na esfera terapêutica, construtivista.
Nesta epistemologia, os “processos psicológicos são
intrinsecamente sociais” (Grandesso, 1999).
A idéia de Ciampa (1986, p.160), que concebe o
homem como um “ser de possibilidades” em todas suas
dimensões de tempo, revela bem a noção da identidade
“como um processo contínuo e em formação, além de
refletirmos sobre nosso passado, inferimos e esboçamos
nosso vir-a-ser” (Arruda, 2003, p.22). Ainda a afirmação
de Ciampa (1986, p.194) de que “precisamos inventar
nosso futuro” aponta o quanto a investigação narrativa,
por exemplo, de histórias de vida servem como
potenciais alternativos altamente transformadores na
esfera pessoal e, portanto, terapêuticos.
Este aspecto transformador da identidade “em
algum momento remete à reflexão sobre o sentido de
vida, já que ambos os temas estão relacionados”
(Arruda, 2003, p.22). Ciampa (1998) o considera
semelhante a uma ‘metamorfose’, processo contínuo ao
longo da vida de ‘superação’ de si mesmo, num
movimento constante de ‘emancipação pessoal’, aspecto
este considerado pelo autor como inevitável, já que a
‘não-metamorfose’, corresponderia à morte física e/ou
mental. Nota-se assim, a comunhão com os pressupostos
psicoterapêuticos da Psicologia Clínica, a reflexão capaz
de transformar o indivíduo através de posteriores atitudes no viver, numa tentativa de superação e
desenvolvimento, em que a estagnação do processo
pode ser perfeitamente comparada à morte psíquica,
enquanto noção global que compreende a
psicopatologia.
Alguns dos autores mais clássicos da
Psicopatologia Social tais como Berger e Luckman
(1966/1983) já enfatizavam a interação pessoal,
ressaltando que somos constituídos pelas nossas
interações com os ‘outros significativos’ na
‘socialização primária’ (restrita ao ambiente familiar) e
‘secundária’ (ampliação do convívio social) “nunca é
total e nem jamais acabada” (Berger & Luckman, 1998,
p. 184). Em estudos recentes, Mahoney (1998, p.316)
diz a esse respeito que “o que está acontecendo em
qualquer vida individual, é necessariamente inseparável
daquilo que acontece nas vidas com as quais aquela
vida está intimamente envolvida e vice-versa”. Para
Terapia Cognitiva narrativa em Grupos Terapêuticos de mulheres de terceira idade: uma perspectiva sócio-clínica
Guidano (1994), a construção da identidade forma-se
num processo de ‘reordenação’ e construção da
autoconsciência (self) como processual e constante. Esse
autor propõe um modelo em que a identidade teria uma
perspectiva ontológica, que residiria na noção de ‘autoorganização’. Este conceito assemelha-se também às
considerações de Maturana e Varella (1987), que,
enquanto autores considerados ‘neodarwinistas’, o
organismo (self) teria duas dimensões: além de aspectos
‘organizadores’ (estáticos e fixos) haveria os aspectos
‘estruturais’ (plásticos e mutáveis), também
fundamentais à vida, sendo eles últimos o campo
psicoterápico. Enfim, em todos esses autores,
reconhecemos que o psiquismo humano teria aspectos
passíveis de transformação por toda a vida, além de
outros mais fixos e até limitadores, o que explicaria,
por exemplo, na psicoterapia as psicopatologias. Há,
porém, para tanto, uma possibilidade de atuação e transformação terapêuticas correspondentes ao que se
considera na visão psicossocial uma evolução
identitária, já que alteraria o auto-conceito, a definição
de si mesmo, e a visão do outro acerca desse indivíduo
que passa por esse recurso. Esse é o enfoque central
que justifica a interface do que se considera neste estudo
a interface da clínica e psicologia sócio-comunitária.
As terapias de grupo, tradicionalmente, reúnem
pessoas de diferentes vivências, e há, conforme a
epistemologia e linha teórica adotada, um setting
terapêutico pré-definido, que deve, portanto, ser
absolutamente cumprido devido às suas exigências teóricas. No mundo contemporâneo, temos problemáticas
vivenciadas de forma semelhante por grupos de pessoas
considerando-se, entretanto, as particularidades da
história individual. Um exemplo que se presencia
atualmente na história da ciência seria o uso recente do
termo ‘Gerontologia’ ou estudos da faixa etária superior
a 60 anos, a chamada terceira idade, estudo bastante
explorado por Anita Néri (2000). Esse grupo tornou-se
tão expressivo na sociedade pela expressão demográfica,
necessidades e demandas e atuação no mundo, que
parece ter levado à ciência a necessidade de
‘especializações’ quanto ao estudo e as atividades
profissionais para esse público, inclusive na Psicologia.
De tal modo, o psicoterapeuta na sua atuação clínica
tem o espaço de atuar em grupos com formações
identitárias de problemáticas centrais únicas, tais como
os grupos de terceira idade. Qualquer demanda de
sofrimento humano que busque compreensão, adapta-
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ção intrapsíquica, bem como uma expressão
significativa na sociedade, poderia servir a princípio
para trabalho terapêutico, como o que se denomina hoje
de ‘Grupos de Apoio’. Uma derivação desse caso,
quando a atividade é dirigida por profissionais da área
psíquica seriam os grupos terapêuticos, enfatizando-se
a demanda última da terapia.
A diferença metodológica básica deste grupo com
as terapias de grupo seria justamente a demanda da
temática única (identidade do grupo) experimentada por
seus membros, como se houvesse um aspecto da ‘queixa
clínica’ compartilhado, de amplitude grupal, além dos
aspectos individuais. O que ocorre é que essa dimensão
coletiva é, às vezes, sobrepujante quanto à sua
significação e complexidade psíquica, por referir-se a
uma questão identitária. É esse o recorte e o diferencial
propostos nesta atividade que, a partir da necessidade
empírica, é chamada de ‘perspectiva sócio-clínica’.
À medida que esse modelo em que o grupo de
apoio é ministrado por psicoterapeutas, formado e
constituído por integrantes que buscam o trabalho
voluntariamente, sugere-se chamar aos integrantes de
“participantes, conceito esse mais condizente com a
visão ontológica construtivista e construcionista,
referindo-se à natureza pró-ativa do homem. Como já
foi visto, a finalidade última da atividade do profissional
é a terapêutica, ou seja, acompanhar os processos
psíquicos e de saúde mental do grupo e de cada
participante, buscando ampliar o seu bem-estar, a sua
boa adaptação social e contribuindo inclusive com a
qualidade de vida desse grupo que geralmente está
excluído do bem viver. Essa seria a base da justificativa
quanto à relevância do modelo proposto, uma alternativa
para que os grupos sejam trabalhados
‘psicoterapeuticamente’ ainda estando ‘fora’ de
instituição de ajuda comunitária, momento em que
geralmente os problemas e o sofrimento já estariam
bastante ampliados e até cristalizados.
Buscando agora descrever o método e as
estratégias aqui propostos, inicialmente compartilharia
com o leitor o quanto é difícil esse momento científico,
pois numa pesquisa qualitativa, a intenção do presente
estudo não seria a constatação de ‘uma verdade
universal’, a ser generalizada e defendida em detrimento
de outros diferentes modelos, o que nem mesmo condiz
com os pressupostos epistemológicos que concebem o
homem como uma co-construção permanente.
Entretanto, cientificamente pode-se trazer a
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Eliana da Silva Ramos Arruda
possibilidade de comunicar e descrever uma experiência
já aplicada e devidamente estudada empiricamente, da
qual se originou a dissertação de mestrado, e convidar
a uma reflexão sobre ela. Não se nega a existência de
um mundo real; no entanto, considera-se esse mundo
incognoscível total e diretamente (Arruda, 2003). E,
como é pontuado por Maturana e Varella:
A ciência e a validade das explicações científicas não se
constituem nem se fundam na referência a uma realidade
independente que se possa controlar, mas na construção
de um mundo de ações comensurável com o nosso viver.
(Maturana, 1999, p.55).
Esse estudo foi, portanto, fundamentado em
métodos já aceitos no mundo científico tais como a
Psicoterapia Narrativa e a Análise de Conteúdo como
instrumento investigativo, em que se assume a relação
dialética de sujeito-participante ou, nas palavras de
Maturana e Varella (1987), ‘observador-observado’.
Este exemplo de proposta contribui para novos
estudos e novas aplicações em outros (e particulares,
únicos!) contextos, como uma espécie de guia. Quando
temos nas mãos vários mapas, decidimos o caminho a
escolher com uma segurança e direcionalidade maiores,
sem, entretanto, seguir-se um roteiro estritamente fixo
e previamente calculado... Apresenta-se assim a bússola
que norteou essa experiência, para que seja aberta a
possibilidade de aplicá-la de acordo com as
idiossincrasias de cada psicoterapeuta em seus grupos
terapêuticos, a partir do estudo, da seriedade e do
comprometimento epistemológico e teórico que sempre
deve acompanhar a atuação profissional. Quanto à
responsabilidade do manejo técnico, Mahoney (1998)
revela sua preocupação em não nos transformarmos em
‘tecnocratas’ psíquicos, planejados e cumpridores de
‘nossas’ tarefas, correndo o risco de nem mesmo
considerarmos o momento, a viabilidade e as
necessidades dos pacientes. Assim, o autor nos lembra
que pode considerar-se ‘um ecletismo técnico’, mas
jamais um teórico, visto que este último alcança diferentes epistemologias e ontologias nem sempre
harmônicas e compatíveis. Creio que essa afirmação se
torna fundamental ao se refletir quanto aos modelos de
aplicação terapêuticos. Corresponde a dizer que há que
se ter coerência com os pressupostos teóricos da
epistemologia do profissional, que neste estudo é a
Psicoterapia Narrativa, de enfoque construtivista, razão
pela qual o presente artigo deu até agora especial atenção
às contribuições epistemológicas e ontológicas,
referentes à visão de homem e de mundo e aos
conhecimentos que estão sendo abordados. Sem
assumir-se esse responsável posicionamento diante do
saber científico, pode-se correr o risco de tornar-se
ingênuo na sugestão de trabalhos, que poderiam até ter
enorme utilidade empírica, mas deixariam a desejar
quanto às discussões teóricas.
Metodologia
Descrição do procedimento no grupo
terapêutico
O grupo terapêutico constituído que foi fonte para
a realização deste trabalho foi formado por mulheres
entre 65 e 86 anos, oriundas de classe média alta
(moradoras de bairros nobres de S. Paulo), heterogêneas
quanto ao estado civil (casadas, solteiras, viúvas) e
religiosidade (espiritualistas, católicas, judias), de
formação de ensino fundamental completo e/ou
universitário, duas aposentadas e as demais nunca tendo
trabalhado formalmente.
O grupo de terceira idade aqui referido nasceu a
partir de uma Associação de Terceira Idade sem fins
lucrativos e de caráter assistencial, portanto de trabalhos voluntários. Essa instituição, constituída por
mulheres, com mais de 60 anos, de classe média alta,
moradoras de bairros nobres de S. Paulo, tinha como
objetivo ‘ajudar assistencialmente idosos de classes
inferiores’, chegando-se a sugerir esse objetivo de ajuda
‘mútua’ no nome da Associação. Havia na sede um
espaço para eventos culturais e, a partir de um convite
para ministrar palestra, houve o primeiro contato com
o grupo. Posteriormente ao interesse desta primeira
experiência, oportunidade em que a palestra foi seguida
de debate, foi levantada a idéia de formar-se um ciclo
de palestras para trabalhar melhor os aspectos
levantados. O objetivo desse ciclo era refletir sobre o
homem pós-moderno e as implicações psicológicas do
viver contemporâneo.
No decorrer do ciclo, numa das discussões,
emergiu a necessidade de formação de um grupo
terapêutico. Esta necessidade foi empiricamente ‘sentida’
e inferida, a partir da dificuldade de se responder a
algumas perguntas e comentários de cunho absolutamente
Terapia Cognitiva narrativa em Grupos Terapêuticos de mulheres de terceira idade: uma perspectiva sócio-clínica
pessoal e íntimo de algumas associadas, sem correr o
risco de expor suas particularidades num ambiente não
sigiloso e ‘protegido’. Incomodada com a idéia de deixar
em aberto essas questões desde essa primeira palestra do
ciclo e buscando uma resolução para a questão ética, foi
oferecido à associação a criação de um outro momento e
espaço em que aberta e francamente seriam discutidas
essas questões individuais com a direção da função da
psicoterapia, o que envolve, além do contrato de sigilo
profissional, compromisso de encaminhamento e maior
atenção às queixas de saúde mental. Possibilitaria,
também, o manejo e uso de técnicas, de recursos
psicológicos tais como: dinâmicas de grupo, vivências,
relaxamento, entre outras possibilidades. Observa-se que,
desde o primeiro contato, foi experimentado um vínculo
terapêutico altamente empático, em que a ‘aceitação
incondicional’, à qual se refere Maturana e Varella (1987),
tornou-se condição essencial, abrindo-se o espaço de
sentir-se à vontade para compartilhar segredos e
necessitando a abertura de novo e adequado espaço e
horário. A atividade, iniciada em 1994, desenvolve-se
até hoje.
Assim, foram abertas reuniões em outro dia e
espaço, mantendo-se o caráter ‘voluntário’, e não
remunerado, na atuação psico-comunitária, na área da
psicologia social aplicada, diferentemente do trabalho
clínico particular tradicional. Foi sugerido que, nos
primeiros três meses, haveria um encontro semanal, em
que todo e qualquer integrante da Associação poderia
participar para ‘experimentar vivencialmente’ a
proposta e o estilo da atividade, já que na Associação
havia mais de 100 membros. Era também uma
possibilidade de triagem de subgrupos conforme a
demanda. Nesses encontros, que tinham em média 20,
30 integrantes e a duração de duas horas, eram
administradas vivências de grupo que não necessitassem
de feedbacks particulares e profundos, somente
vivências tangentes ao que foi experimentado; não eram
também conduzidos exercícios que facilitassem uma
exposição excessiva de particularidades da vida íntima,
pois já era previsto que, caso ocorressem, várias pessoas
não dariam adesão, não continuariam a freqüentar o
grupo, embora já tivesse sido estabelecido o ‘contrato’
terapêutico do grupo. Foi formulada uma ‘regra’ que
todos, ao ingressar, conheciam: após os três meses, não
haveria mais possibilidade de ingresso de novas
participantes no grupo, a não ser que convidadas por
alguma delas e somente com a unanimidade na
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concordância de todas as integrantes, abrindo-se, se
necessário fosse, listas de espera para grupos novos.
Isso foi feito para buscar-se não ameaçar o vínculo
terapêutico de todo o grupo ‘final’, impedindo-se assim
o fluxo constante de novas integrantes. Prioriza-se no
modelo epistemológico aqui proposto, a aliança terapêutica na tríade estabelecida entre paciente, terapeuta
e a relação estabelecida entre os membros, como se esta
representasse um terceiro foco, podendo tratar-se de um
grupo familiar, casal, ou grupo de apoio como é o caso.
Seja qual for o grupo com o qual se atua, a narrativa é
co-construída entre o terapeuta e a parceria de pacientes
(Arruda & Schabbel, 2003; Maturana & Varella, 1987).
Observa-se neste momento uma curiosidade:
somente então é que o grupo ‘final’ se caracterizou como
feminino, já que, no início, eventualmente alguns
senhores convidados por membros da instituição iam a
reuniões isoladas. Talvez por serem significativamente
em menor número a cada reunião, eles não continuaram
a freqüentá-las. Esse fenômeno é bastante comum em
atividades de terceira idade (Berquó, 1999; Arruda, 2003).
Após a constituição desse grupo terapêutico, foi
feito novo ‘contrato’ terapêutico, em que a garantia de
sigilo ético foi novamente assegurada, já que neste
momento terapêutico, havia dez participantes, número
que facilitava maior exposição íntima, além do vínculo
terapêutico muito mais fortificado, pois oito das
integrantes tinham aderido ao grupo desde o início, já
tendo se conhecido bem. As outras duas chegaram a
convite e concordância unânime das oito originais.
Lamentavelmente, apenas um mês e meio após a
formação deste novo grupo, uma participante veio a
falecer subitamente. Considera-se esse fato
extremamente importante na identidade e vinculação
afetiva da aliança terapêutica do grupo, pois desde o
início apresentou-se a emergência de trabalhar o tema
‘morte’ tão sensível especialmente à população de terceira idade.
Após esse fato, foi aplicada a técnica de “Revisão
de Projeto de Vida” de Oscar Gonçalves (1997, 1998a,
1998b, 2000), técnica esta que objetiva revisitar cada ano
de idade de nossa história de vida na elaboração de um
instrumento semelhante a um ‘jogo de baralho’, em que
cada carta construída corresponde a um intervalo de um
ano, a contar de zero até a idade atual. Ao lançar-se a
memória semântica, preserva-se por outro lado a vontade
do indivíduo de contar o que quiser, na ordem em que
preferir, além de considerarem-se observações de outras
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pessoas ‘testemunhas’ de sua vida. Pode-se, por exemplo,
‘escrever’ sobre a mãe que conta que a pessoa se assustava
com um determinado animal, lembranças que a pessoa
pode não ter, mas que são histórias que remetem à sua
vida pessoal. Abre-se também espaço para fantasias e
projetos, especialmente no intervalo da idade atual. Esta
técnica foi trabalhada cerca de um semestre pelo grupo,
o que foi fundamental, por ser uma técnica que, por ter
um caráter ‘regressivo’, costuma mobilizar bastante.
Assim foi tratada a primeira fase de terapia proposta por
Oscar Gonçalves: “Atitude de Recordação” (1997, 1998a,
1998b, 2000). Além de estreitar vínculos terapêuticos,
confiança e relações de respeito e empatia entre o grupo,
facilita um ‘pensar’ psicológico em pessoas, que, com
exceção de uma, nunca haviam passado por um processo
psicoterapêutico.
A segunda atitude narrativa terapêutica
desenvolvida no grupo foi o momento que Gonçalves
(1997, 1998a, 1998b) denominava Objetivação, sendo
mais recentemente re-nomeado para ‘Adjetivação’
(Gonçalves, 2000), compreendendo-se as fases de
Objetivação e Subjetivação.
Foram aplicadas diversas dinâmicas e vivências
com o intuito de ampliar as sensações, focalizando-se a
conscientização e capacidade de explorar toda a gama
sensorial. Foram utilizados vários exercícios de gestaltterapia, dramatizações espontâneas e dirigidas,
relaxamentos, exercícios de visualização criativa.
Observa-se que, a cada encontro, era levada uma
proposta terapêutica tecnológica como possibilidade de
trabalho, sendo a proposta somente aplicada se, após o
início da “sessão”, ao ouvir todos as participantes, fosse
garantido que nenhuma delas teria nada ‘especial’ que
quisesse trazer ao grupo. Caso contrário, todo o grupo
ouvia e abordava a problemática atual e emergente da
participante e/ou do grupo. Este procedimento
acompanha todos os encontros, desde o início do grupo.
Também no início de cada reunião havia um momento
em que qualquer elemento que trouxesse um relato
escrito poderia compartilhá-lo com o grupo, pois desde
o início do trabalho foi encorajado que elas fizessem
um diário de forma livre e não dirigida, sendo ele, na
Objetivação, estimulado de maneira enfática para
facilitar a ampliação e a consciência das sensações. É
bastante comum a proposta de ‘escrita livre’ (Mahoney,
1998) no construtivismo, já que a experiência, além de
rico instrumento, é tida como prazerosa. (Neimeyer,
1997; Goolishian, 1994).
Eliana da Silva Ramos Arruda
Ainda na Adjetivação (Gonçalves, 2000), foi
abordada com maior ênfase a atitude de Subjetivação.
Neste momento a focalização volta-se para a
consciência das emoções, dos sentimentos e da
cognição. Há, como é característico nas Terapias
Cognitivas, o momento didático de explicar e diferenciar cognição e emoção. Neste momento, além de
continuar o uso de dinâmicas, relaxamento,
dramatização e vivências, foram explorados nas sessões,
exercícios de auto-exploração cognitiva e emocional,
especialmente de forma escrita e vivencial. Foi proposto
um treinamento de auto-afirmação e assertividade
atuando no manejo da habilidade social. Um dos
exercícios bastante enfatizado foi a dinâmica do “tempo
no espelho” proposta por Mahoney (1998, p.277), o
que possibilitou continuar-se ainda nesta fase a trabalhar com bastante ênfase a melhora de auto-estima.
Observou-se neste momento um estreitamento bastante
forte da vinculação terapêutica. Era comum, no início
das reuniões, a leitura de textos ou relatos orais em que
espontaneamente alguma participante homenageasse o
grupo numa atitude de gratidão e /ou por empatia
conforme a problemática individual que alguma delas
apresentasse, alinhavando-se à sessão anterior.
Conforme a própria terapia narrativa pressupõe,
quando o vínculo terapêutico já está fundamentalmente garantido e, por sua vez, a expressão, de
sensação, sentimentos e pensamento, já é mais
desenvolvida, abre-se um caminho maior para que se
lance mão do uso das metáforas. Assim, na fase de
Metaforização (Gonçalves, 1997, 1998a, 1998b, 2000)
foram enfocados trabalhos de ‘escrita livre’, exercícios
auto-exploratórios e de investigação de auto-estima,
auto-definição e auto-imagem, relaxamentos e
vivências, agora, de forma mais simbólica e criativa.
Aproveitou-se o uso de filmes, produções literárias,
enfim, expressões artística de várias formas para se
construir e criar possibilidades metafóricas de
reflexão. Houve, neste momento, uma ênfase maior
nas técnicas de escrita livre, de temáticas dirigidas e
espontâneas em diários, ocasião em que surgem as
metáforas e símbolos pessoalmente construídos. Além
de serem utilizadas produções artísticas coletivas e
publicamente divulgadas, foram aproveitadas as
produções criativas do próprio grupo. Esse aspecto é
encorajado também por Mahoney (1998), que
considera o trabalho artístico um importante exercício
de autodesenvolvimento.
Terapia Cognitiva narrativa em Grupos Terapêuticos de mulheres de terceira idade: uma perspectiva sócio-clínica
Há um detalhe que o grupo vivenciou neste
momento: a doença que afastou uma participante por
todo um semestre seguida de seu falecimento.
Observa-se que espontaneamente, ao trabalhar essa
perda, as participantes que tinham atividade religiosa
e credos diferentes utilizaram metáforas religiosas
umas das outras, com o intuito de compartilhar sua
dor e aliviá-la empaticamente. Houve uma empatia
tal, que permitiu que a Metaforização buscasse atingir
a parceira de acordo com a narrativa e o universo
simbólico dela, e não o de sua fé religiosa, chegandose a abrir mão do seu universo pessoal, talvez no
intuito de unir o grupo na dor e manter a sua
identidade. Este aspecto faz reportar a visão Maturana
e Varella (1987) sobre a ‘psicologia biológica do
amor’, sendo este concebido enquanto ‘aceitação
incondicional’ e legitimação total do outro sem fazer
‘esforço’. Para o autor essa seria a maior possibilidade
de legitimação pessoal e empatia, além de uma
importante condição terapêutica.
A finalização da elaboração da morte dessa
participante foi um exercício em que todas escreveram
um texto definindo em metáforas seus sentimentos e os
significados sobre a companheira que se foi. Para
Gonçalves (1997, 1998a, 1998b, 2000), as metáforas
‘condensam’ os significados múltiplos que uma
experiência possa vir a ter. Muitas vezes em que a
complexidade emocional vivenciada é muito forte e
sentimentos, idéias e sensações são difíceis de serem
exprimidos devido à sua intensidade e pluraridade, a
melhor forma de expressá-los é a metafórica.Também
num outro momento foram trabalhadas as ‘Metáforas
de Raiz’ (Gonçalves, 1997, 1998a, 1998b, 2000) do
grupo e das participantes.
Atualmente o grupo está desenvolvendo a atitude de Projeção, conforme sugere o modelo de Gonçalves
(1995). Verifica-se que, além de continuar-se com as
estratégias tecnológicas anteriores, amplia-se o trabalho com outras técnicas tais como: revisão constante de
projetos de vida e de ‘self’, revisões de transformações,
marcos pessoais e investigação de perspectivas e atitudes existenciais transformativas. Além de remeter à
‘metáfora raiz’, que define a identidade e autodefinição
individual, constroem-se ensaios de ‘Metáforas
Alternativas’ (Gonçalves, 1997; 1998a; 1998b, 2000)
revelando-se as mudanças almejadas e desejadas. Esses
exercícios são dramatizações, imaginação criativa,
relaxamento, produções artísticas e de escrita, que
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exploram e de certa forma ‘testam’ essas atitudes e
posturas a serem desenvolvidas.
Um dos objetivos que as participantes visam é
trabalhar a qualidade de suas relações pessoais e a busca
cultural. São realizadas saídas a eventos culturais, leitura
conjunta de textos e livros, aproveitando-se essas
ocasiões para debater questões psicológicas relacionadas
às atividades.
É importante descrever o fato de que, neste
momento terapêutico, as participantes revelaram o
desejo de assistir à Defesa de Dissertação em que foram
‘sujeito’ de pesquisa. Embora fosse pública e houvesse
a minha concordância imediata, por se tratar de idéia
original, a questão foi levada ao conhecimento do
orientador que prontamente permitiu e encorajou o ato,
já que a identidade delas estaria protegida pelo uso de
pseudônimos e na sessão solene haveria a mistura
natural com o restante do público. Ao seguir-se esse
fato, em que a presença delas foi maciça e tocante e os
depoimentos que se seguiram, também tocantes,
revelam o sentimento de ‘orgulho’ e ‘utilidade’ social
que experimentavam por estarem presentes a um estudo
que tratava delas, de suas vidas e de possíveis exemplos
para a ciência. Elas pareciam sentir-se colaboradoras
do saber científico e, de fato, o são. Além de expressarem a qualidade do vínculo afetivo e gratidão terapêutica, foram todas juntas organizando espontaneamente uma forma de condução de transporte que
as levasse, pois faziam questão de permanecer juntas.
Nestes momentos de ‘comoção’ e ‘emoção’ científicas,
observam-se as noções de Maturana e Varella (1987)
em que o observado e observador estabelecem um
vínculo de qualidade única, ‘indestrutível’, particular,
e ainda recíproco, pois, ao emocionar-se, o ‘observado’
também atingiria o ‘observador’, ainda que este deixe
esse sentimento ‘entre aspas’. Ao ensinar, aprende-se e
ao observar-se um fenômeno, somos foco de
observação. Assim, o lado ‘neutro’ da ciência fica em
suspense, ‘entre aspas’, como afirmam os autores, já
que o ‘emocionar-se’ do pesquisador é de certa forma
desvelado e compartilhado, pelo simples fato de se tratar de uma relação humana, num exercício terapêutico
especialmente gratificante e único para o pesquisador.
(Arruda & Schabbel, 2003).
Observa-se, finalmente, que é este vínculo
terapêutico que garante provavelmente a facilidade
comunicacional do grupo, que chega a utilizar este recorte
(a relação interpessoal entre seus membros) como meta
REVISTA BRASILEIRA DE TERAPIAS COGNITIVAS, 2005
Volume 1
Número 1 35-43
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a atingir nas demais relações: a clareza, espontaneidade
e qualidade de expressão e comunicação, enfoque central
das metas do trabalho narrativo.
Resultados
Observa-se inicialmente a questão da vinculação
afetiva e terapêutica do grupo como conseqüência deste trabalho. Os sentimentos tanto positivos quanto
negativos são compartilhados. A experimentação desse sentimento de aceitação e pertença se reflete no
microcosmo das participantes, na busca da aceitação e
do respeito em que a auto-afirmação foi desenvolvida e
aperfeiçoada.
Observa-se também uma maior liberdade e
autopermissão de se explorar uma gama maior de
atividades sociais, culturais, o que pôde ser
exemplificado no desejo unânime de ir à defesa de
dissertação. Além da melhora na expressão
comunicativa, assertividade e espontaneidade de
relacionar-se, observa-se que a auto-estima e o
autocuidado tornam-se metas diárias a serem cumpridas.
Nos depoimentos freqüentes do grupo, as participantes
relatam a importância do vínculo, da relação de
confiança e, acima de tudo, o sentimento de utilidade
experimentado, oriundo do sentimento de pertença e
recursividade do grupo, em que cada elemento é
essencial em sua particularidade, como pressupõe as
teorias sistêmicas. A maior fonte de preocupação e
desprazer da fase de vida atual geralmente refere-se às
relações e aos problemas com os filhos e familiares,
sendo os amigos, por sua vez, fonte de alegria, prazer e
descontração (Arruda, 2003).
Finalmente, nota-se que as narrativas, especialmente as que expressam opiniões, valores e história de
vida, são exercícios experimentados na maioria das vezes
com grande prazer e sentimento de orgulho. Parece ser
fundamental à terceira idade ‘ser ouvida’, fato este que
derivou o nome da dissertação: Vozes da terceira-idade,
no intuito de dar a elas o direito de falarem sobre si, dar
voz a este grupo, intuito inspirado numa citação de Ecléia
Bosi (1999, p.81) em que ao revelar a dificuldade de
grupos minoritários, ressaltava a posição dos idosos,
dizendo: “... mas o velho não tem armas, nós é que temos
de lutar por eles”. Ao serem encorajadas a escrever,
relatar, opinar, contribuir com colocações colaborativas,
elas apresentam sempre que podem feedback positivo
Eliana da Silva Ramos Arruda
do quanto se sentiram bem ao desempenhar tal tarefa.
Este aspecto foi observado especialmente no final de cada
entrevista de história de vida colhida para a análise de
conteúdo. Ao perguntar-se sobre: ‘Como foi falar sobre
sua história?’, todas elas, sem exceção, revelaram o prazer
do ato de narrar e poder refletir sobre sua vida, além de
salientarem a importância do grupo de apoio.
Discussão e Considerações
Finais
No processo hermenêutico intrínseco humano, o
homem atribui significados e interpreta seu mundo para
conhecê-lo (Gonçalves, 1997, 1998a, 1998b, 2000).
Assim, compreender-se através de narrativas, na sua
história pessoal, favorece transformações de significação
passada (através da ressignificação) e amplia-se a
possibilidade de projetos. Para o autor acima mencionado,
a atitude narrativa é o sinônimo da saúde mental, em que
a patologia seria a atitude não-narrativa, o que pode ser
considerado como um viver automático, psicopatológico,
sem apropriar-se da autoria. As experiências vividas no
microcosmo do grupo de apoio refletem-se no espaço
social, nos ‘multiversos’, ampliando-se narrativamente
a sensação de autoria, ou o que chamaria de ‘sentido
existencial de vida’(Arruda, 2003).
O encontro do existir de cada membro, alinhavado
pela temática comum do grupo, pode ser comparado a
um trabalho artesanal de patchwork, em que cada parte é
plena de sentido e, ao mesmo tempo, participa do conjunto
maior completando o significado coletivo. Com essa
metáfora do grupo, (um exercício de meta-narrativa: a
narrativa das narrativas), visa-se ilustrar a importância
do sentido de vida, individualidade e identidade,
condensando a noção da importância deste recurso,
criativo, expresso e possibilitado pela narratividade.
Concluindo, observa-se que, ao lançar-se mão de
recursos clínicos na dimensão comunitária, pode-se
contribuir com o resgate da cidadania através da
expressão no mundo, expandindo-se assim a função
social do profissional de saúde mental e do saber
psicológico. Finalmente vale a pena ressaltar que a tríade
narrativa, identidade e vida, torna-se foco central do
projeto existencial humano (coletivo e individual), uma
vez que viver narrativamente, numa troca dialética e
infinita com o mundo amplia o sentido de vida e da
existência humana, com maior riqueza de significações
Terapia Cognitiva narrativa em Grupos Terapêuticos de mulheres de terceira idade: uma perspectiva sócio-clínica
(Arruda, 2003). Esse fenômeno corresponderia a viver
o ‘Carpe Diem’ que, segundo pesquisa informal de uma
participante que consultou um professor italiano de
latim, seria uma expressão melhor traduzida como
“agarrar o momento”, ou seja, apropriar-se de cada ato
vivido, em todas as suas dimensões sensoriais, emotivas,
cognitivas, simbólicas. Possibilidade esta que, na terceira idade especialmente, seria ‘viver-se mais vida na
vida que ainda se tem’, ideal defendido mundialmente
por uma campanha da Organização Mundial de Saúde
(Néri, 2000). Creio que, em vários tipos de constituição
de grupo de apoio, esses ideais aqui experimentados e
descritos favorecem a saúde mental e função social de
nosso saber científico, contribuindo para uma sociedade
mais humana, digna e melhor preparada para a inclusão
e legitimação de desiguais formas existenciais.
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Recebido em: 08/04/2005
Aceito em: 10/06/2005
Endereço da autora: ARRUDA SMPE Ltda., Av. São Gabriel, 149, cj. 109 Jd. Paulista CEP. 01435-001, São Paulo – SP.
E-mail: [email protected]
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