Anais XVI Encontro Nacional dos Geógrafos Crise, práxis e autonomia: espaços de resistência e de esperanças - Espaço de Socialização de Coletivos – ESPAÇO SOCIALIZAÇÃO COLETIVA Território de Fronteira: Pantanal e diversidades Coordenador: Cláudio Benito Oliveira Ferraz O PANTANAL E O ENSINO DE GEOGRAFIA: CONTRIBUIÇÕES PARA SE PENSAR UMA REGIÃO DE FRONTEIRA Flaviana Gasparotti Nunes Universidade Federal da Grande Dourados (UFGD) [email protected] Resumo Neste texto apresentamos algumas reflexões que tomam por base as experiências obtidas durante a realização do projeto de extensão “As territorialidades na fronteira: a produção do Pantanal e diversidades” desenvolvido na Universidade Federal da Grande Dourados (UFGD) no ano de 2008. Um dos produtos elaborados, como resultado do projeto foi um vídeo/documentário de caráter didático que objetivou ampliar o sentido/idéia de Pantanal. Considerando a importância da linguagem imagética no ensino de Geografia, discutimos a possibilidade desta contribuir para a construção de práticas pedagógicas que ampliem o sentido e problematizem uma certa idéia de Pantanal estabelecida e disseminada hegemonicamente. INTRODUÇÃO Tendo em vista os objetivos deste Espaço Coletivo de Socialização (ESC) na forma de Comunicação Coordenada, as idéias que apresentamos neste texto têm a finalidade contribuir para uma reflexão sobre algumas questões que envolvem o ensino de Geografia na atualidade, notadamente em relação ao papel das linguagens, tomando como foco a discussão sobre o Pantanal. As reflexões aqui apresentadas tomam por base as experiências obtidas durante a realização do projeto de extensão “As territorialidades na fronteira: a produção do Pantanal e diversidades” desenvolvido na Universidade Federal da Grande Dourados (UFGD) no ano de 20081. O projeto envolveu uma série de atividades tais como: leituras e discussões teóricas sobre o Pantanal; mini-cursos sobre diversas questões 1 O projeto foi coordenado pelo Prof. Dr. Edvaldo César Moretti e envolveu alunos de graduação e pósgraduação Geografia, além de professores do ensino básico da rede pública de Dourados (MS). 1 Realizado de 25 a 31 de julho de 2010. Porto Alegre - RS, 2010. 978-85-99907-02-3 Anais XVI Encontro Nacional dos Geógrafos Crise, práxis e autonomia: espaços de resistência e de esperanças - Espaço de Socialização de Coletivos – envolvendo o Pantanal (características de suas bases físico/naturais; cultura; dinâmica econômica e processo de ocupação; imagens e representações artísticas desta região); realização de um trabalho de campo a Corumbá (MS) e elaboração de um vídeo/documentário a partir das imagens e materiais produzidos durante o projeto. Abordaremos de forma mais específica o vídeo/documentário elaborado “O que é Pantanal?” no que concerne à contribuição da linguagem imagética para o ensino de Geografia. Além disso, procuraremos refletir sobre os elementos e questões que o documentário propicia para a discussão sobre o tema/conteúdo Pantanal nas aulas de Geografia no sentido de ampliar as concepções hegemônicas que restringem a idéia de Pantanal a elementos físico/naturais, principalmente ligados à hidrografia, fauna e flora existentes nesse território que conduzem a criação de um estereótipo “do que é Pantanal”. A LINGUAGEM IMAGÉTICA NO ENSINO DE GEOGRAFIA Atualmente, tem-se destacado a importância e o papel das diferentes linguagens no processo de ensino/aprendizagem. Em relação a isso, Pontuschka et al (2007, p. 262) afirmam que: Se a leitura do mundo implica um processo permanente de decodificação de mensagens, de articulação/contextualização das informações, cabe à escola ensinar o aluno a lê-lo também por meio de outras linguagens e saber lidar com os novos instrumentos para essa leitura. (...) Neste contexto, destaca-se o papel da linguagem imagética, pois conforme aponta Oliveira Junior (2009, p. 17): “(...) as imagens constituem muito do que nos educa os olhos e muito do que temos disponível para educarmos a nós próprios e aos nossos próximos e distantes estudantes acerca do espaço geográfico.” Na concepção deste autor, as imagens educam, pois: Educar os olhos, não é somente ver certas coisas, valorar certos temas e cores e formas, mas é, sobretudo, construir um pensamento sobre o que é ver; sobre o que nossos olhos como instrumentos condutores do 2 Realizado de 25 a 31 de julho de 2010. Porto Alegre - RS, 2010. 978-85-99907-02-3 Anais XVI Encontro Nacional dos Geógrafos Crise, práxis e autonomia: espaços de resistência e de esperanças - Espaço de Socialização de Coletivos – ato de conhecer, levando-nos mesmo a acreditar que ver é conhecer o real, é ter esse real diante de nós. (OLIVEIRA JR., 2009, p. 19) Sendo assim, entendemos que a linguagem imagética desempenha papel central no processo de ensino/aprendizagem, sobretudo no caso da Geografia. Neste sentido, o vídeo/documentário elaborado teve o objetivo de, a partir da linguagem imagética, abordar elementos que pudessem construir/desconstruir uma certa idéia de Pantanal. Como a finalidade do vídeo documentário era didática, sua estrutura, tempo de duração, roteiro e dinâmica foram pensados para que o mesmo pudesse ser utilizado principalmente nas aulas de Geografia no Ensino Fundamental e Médio2. O vídeo/documentário também foi elaborado no intuito de que este se constituísse como uma linguagem alternativa àquela representada pelo principal recurso didático utilizado na escola: o livro didático. Embora saibamos que alguns livros didáticos de Geografia têm melhorado significativamente sua qualidade se comparados àqueles produzidos há 30 anos, seu potencial está relacionado, em grande parte, à linguagem verbal. Além disso, devemos considerar que nos conteúdos apresentados pela maioria dos livros didáticos em relação ao Pantanal, ainda é possível verificar certas simplificações, conforme já expressamos anteriormente. Entendemos, portanto, que a linguagem imagética possui um enorme potencial para a discussão das questões e elementos que embora pudessem ser expressos também num texto verbal, não propiciariam as mesmas habilidades para a leitura da realidade. A IDÉIA DE PANTANAL NAS AULAS DE GEOGRAFIA Uma das principais questões que nortearam as atividades desenvolvidas no projeto e principalmente a elaboração do vídeo/documentário relaciona-se à necessidade de verticalização sobre a idéia de Pantanal como forma de ampliar as leituras que se desenvolvem sobre o mesmo. 2 O vídeo documentário foi distribuído a todas as escolas públicas de Dourados (MS). 3 Realizado de 25 a 31 de julho de 2010. Porto Alegre - RS, 2010. 978-85-99907-02-3 Anais XVI Encontro Nacional dos Geógrafos Crise, práxis e autonomia: espaços de resistência e de esperanças - Espaço de Socialização de Coletivos – É muito comum, tanto na escola, como no discurso cotidiano, além da mídia e dos próprios materiais didáticos a apresentação/identificação do Pantanal como: 1) paraíso natural em que apenas animais selvagens lá habitam; 2) bioma ameaçado pela ação do homem que causa a degradação da natureza; 3) um paraíso natural do planeta, uma das maravilhas naturais do mundo, a maior planície inundável da Terra. Além destas imagens/concepções sobre o Pantanal, tem-se também as posturas dos movimentos ambientalistas e ecológicos que expressam a preocupação com a questão ambiental, com o desmatamento, a extinção de espécies de animais e vegetais, assim como o assoreamento dos rios. Entendemos que tais formas de construção de uma idéia de Pantanal simplificam demasiadamente o sentido territorial de produção desse espaço cotidianamente vivenciado e recriado. Um exemplo interessante no sentido de caracterizar como essa idéia hegemônica de Pantanal se expressa, foi a fala de uma das alunas do Curso de Geografia da UFGD após o trabalho de campo a Corumbá. A aluna disse: “nossa, só depois que eu comecei a pensar, eu percebi que nós estávamos no Pantanal... que embora não tenhamos feito uma viagem de barco pelo rio Paraguai, andamos por Corumbá, fizemos o trajeto na estrada e isso tudo é Pantanal. Mesmo estando na cidade de Corumbá estávamos no Pantanal.” A fala da aluna é muito significativa no sentido de mostrar a existência de uma idéia de Pantanal que é aquele que só podemos conhecer adentrando seu “interior” com uma viagem de barco pelos rios ou com uma visão panorâmica a partir de um passeio de avião3. Tal idéia também é disseminada pelos próprios livros didáticos de Geografia ao apresentarem fotos das águas e “belezas naturais” do Pantanal restringindo, na maioria das vezes seu sentido a estes elementos. Considerando estas questões, o vídeo/documentário elaborado procurou questionar/problematizar esta idéia/concepção simplificada de Pantanal. Neste sentido, 3 É comum, em Corumbá, o oferecimento aos turistas deste tipo de passeio. A argumentação feita, inclusive no sentido de convencer o turista a fazer tais passeios, é de que “só assim é possível ver e conhecer de fato o Pantanal.” 4 Realizado de 25 a 31 de julho de 2010. Porto Alegre - RS, 2010. 978-85-99907-02-3 Anais XVI Encontro Nacional dos Geógrafos Crise, práxis e autonomia: espaços de resistência e de esperanças - Espaço de Socialização de Coletivos – as imagens, o texto narrado e os elementos trazidos para o vídeo procuraram trabalhar e construir um outro olhar sobre o Pantanal. Procurou-se chamar a atenção para o fato de que o Pantanal existe porque os homens assim o construíram ao longo do processo de produção dessa espacialidade, diversa e dinâmica e não apenas pela presença das águas, da fauna e flora. Neste sentido, o Pantanal não é só natureza em si, mas são cidades, caminhos, simbologias e imaginário humano que ali se manifestam e se transformam. No vídeo/documentário procurou-se enfatizar a partir das imagens e da narrativa construída que o Pantanal não é, o Pantanal são diversas culturas humanas que ali se territorializaram e se inter-relacionaram (de diferentes grupos humanos, países, regiões, lugares e camadas sociais). CONSIDERAÇÕES FINAIS Nesta comunicação apresentamos, de forma sucinta, algumas reflexões sobre a importância da linguagem imagética no ensino de Geografia tomando por base a experiência de produção de um vídeo/documentário didático sobre o Pantanal. Acreditamos que o vídeo/documentário produzido traz significativa contribuição para o trabalho nas aulas de Geografia, na medida em que problematiza e procura ampliar a própria idéia de Pantanal. Os temas e questões abordados no vídeo/documentário propiciam ao professor a discussão sobre o Pantanal concebido enquanto uma territorialidade produzida socialmente e não apenas como “a maior planície alagável do mundo” ou o “santuário da biodiversidade” ou ainda “um dos principais biomas do planeta”. Tais elementos não devem ser descartados, mas não explicam de forma mais ampla a complexidade territorial produzida cotidianamente nesta porção do mundo. Além disso, o exercício cognitivo propiciado pela compreensão e análise do texto imagético do vídeo/documentário contribui para o desenvolvimento de habilidades que devem ser pensadas na definição dos objetivos pedagógicos da Geografia em relação aos conteúdos trabalhados. 5 Realizado de 25 a 31 de julho de 2010. Porto Alegre - RS, 2010. 978-85-99907-02-3 Anais XVI Encontro Nacional dos Geógrafos Crise, práxis e autonomia: espaços de resistência e de esperanças - Espaço de Socialização de Coletivos – Devemos destacar também, no caso específico de Mato Grosso do Sul, que procura vincular seu nome à idéia de “Estado do Pantanal”, que a contribuição do vídeo/documentário para as aulas de Geografia pode ser efetiva não só no Ensino Médio que apresenta o conteúdo “Mato Grosso do Sul” no Referencial Curricular do Estado, como no Ensino Fundamental que, via de regra, aborda o Pantanal nos moldes aqui já criticados. BIBLIOGRAFIA FERRAZ, Cláudio B. O. Geografia: o olhar e a imagem pictórica. Revista ProPosições, Campinas, v. 20, n. 3 (60), p. 29-41, set/dez, 2009. MATO GROSSO DO SUL. SECRETARIA DE ESTADO DA EDUCAÇÃO. Referencial Curricular da Educação Básica da Rede Estadual de Ensino/MS. Campo Grande: SED, 2009. MORETTI, Edvaldo C. Paraíso Visível e Real Oculto: a atividade turística no Pantanal. 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