macrobacia de jacarepaguá macrobacia de jacarepaguá

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Sondotécnica
PREFEITURA DACIDADE DORIO DEJANEIRO
SECRETARIA MUNICIPAL DE MEIO AMBIENTE
CONTRATO Nº77/97
ESTUDO DE IMPACTO AMBIENTAL PARA
PARA O
PROJETO D
DEE RECUPERAÇÃO AMBIENTAL DA
DA
MACROBACIA DE JACAREPAGUÁ
JAC-70-0003 RE
Volume 3
DIAGNÓSTICO DOMEIO BIÓTICO
SETEMBRO / 1998
Projeto de Recuperação Ambiental da Macrobacia de
Jacarepaguá
Estudo de Impacto Ambiental
VOLUME 3
DIAGNÓSTICO DO MEIO BIÓTICO
JAC-70-0003 RE
Rio de Janeiro
Agosto/98
ÍNDICE
PÁG.
APRESENTAÇÃO ...............................................................................................
3
1. INTRODUÇÃO ...............................................................................................
4
2. DEFINIÇÃO DA ÁREA DE INFLUÊNCIA ......................................................
5
3. BIODIVERSIDADE ........................................................................................
7
3.1 PANORAMA GERAL ........................................................................................
7
3.2 ECOSSISTEMAS AQUÁTICOS INTERIORES E BIOTA ASSOCIADA ...........
12
3.2.1 Comentários sobre Estudos Existentes ..................................................
12
3.2.2 Notas Biogeográfica ..............................................................................
13
3.2.3 Composição Geral da Ictiofauna e Análises Comparativas ...................
14
3.2.4 Ecossistemas Fluviais e Biota Associada ..............................................
17
3.2.5 Ecossistemas Lagunares e Biota Associada ..........................................
31
3.2.6 Ecossistemas Paludiais e Biota Associada.............................................
47
3.3 VEGETAÇÃO E FLORA ..................................................................................
54
3.3.1 Esboço da Vegetação Original no Ano de 1500 .....................................
54
3.3.2 Processo Histórico de Redução da Cobertura Vegetal...........................
60
3.3.3 Vegetação Atual e Uso do Solo..............................................................
62
3.3.4 Aspectos Fitoecológicos, Florísticos e Fenológicos ...............................
83
3.3.5 Análise Fitoconservacionista .................................................................
86
3.4 FAUNA SILVESTRE.........................................................................................
98
3.4.1 Habitats e Fauna Associada ..................................................................
99
3.4.2 Análise Zooconservacionista .................................................................
108
1
PÁG.
4. ESPAÇOS TERRITORIAIS PROTEGIDOS....................................................
110
4.1 CONSIDERAÇÕES GERAIS............................................................................
110
4.2 TIPIFICAÇÃO DOS ESPAÇOS TERRITORIAIS PROTEGIDOS......................
112
4.2.1 Grupo de Unidades de Conservação .....................................................
112
4.2.2 Grupo de Áreas sob Regime Especial de Administração Pública e
Privada ..................................................................................................
115
4.3. SITUAÇÃO ATUAL DOS ESPAÇOS TERRITORIAIS PROTEGIDOS ............
116
4.3.1 Unidades de Conservação .....................................................................
116
4.3.2 Áreas sob Regime Especial de Administração Pública e Privada...........
153
5. BIBLIOGRAFIA ...............................................................................................
163
ANEXOS
ANEXO I - MAPA
JAC-70-0007 - Mapa de Uso do Solo, da Cobertura Vegetal e Espaços Territoriais Protegidos
ANEXO II - QUADROS DE RELAÇÃO DE ESPÉCIES DA FAUNA E FLORA
Quadro II.1 - Ictiofauna da Bacia de Jacarepaguá
Quadro II.2 - Flora de Restinga e Baixadas Úmidas
Quadro II.3 - Flora das Encostas
Quadro II.4 - Fauna Silvestre
ANEXO III – REFERENCIAL METODOLÓGICO
2
APRESENTAÇÃO
O presente documento, JAC-70-0003 RE, corresponde ao Diagnóstico do Meio Biótico integrante
do Estudo de Impacto Ambiental do Projeto de Recuperação Ambiental da Macrobacia de
Jacarepaguá, previsto no contrato no 77/97 de 12 de dezembro de 1997, seus Termos de
Referência e cronogramas acordados entre o empreendedor - a PREFEITUTRA DA CIDADE DO
RIO DE JANEIRO - e a empresa independente contratada mediante licitação pública para sua
execução - a SONDOTÉCNICA Engenharia de Solos S.A.
Para efeito de organização, os estudos desenvolvidos para o diagnóstico foram separados em
três volumes, a saber:
• JAC-70-0002 RE – Volume 2 – Diagnóstico do Meio Físico;
• JAC-70-0003 RE – Volume 3 – Diagnóstico do Meio Biótico;
• JAC-70-0004 RE – Volume 4 – Diagnóstico do Meio Socioambiental.
3
1. INTRODUÇÃO
Este documento compreende o Diagnóstico do Meio Biótico do Estudo de Impacto Ambiental do
Projeto de Recuperação Ambiental da Macrobacia de Jacarepaguá, e trata da Caracterização da
Biodiversidade e dos Espaços Territoriais Protegidos.
O relatório encontra-se estruturado em 5 capítulos, incluindo esta introdução, que constitui o
primeiro, a saber:
• Definição da área de influência;
• Biodiversidade;
• Espaços territoriais protegidos;
• Bibliografia.
O capítulo 2, que corresponde a Definição da Área de Influência, mostra a localização da mesma
e relaciona as Regiões Administrativas e os Bairros nela inseridos.
O capítulo 3 apresenta a descrição dos Ecossistemas Aquáticos Interiores e Biota Associada, da
Vegetação e Flora e da Fauna Silvestre.
O capítulo 4 aborda as Unidades de Conservação e as Áreas sob Regime Especial de
Administração.
O capítulo 5 consiste na Bibliografia.
Finalmente, em anexo, é apresentado o Mapa Cobertura Vegetal, Uso das Terras e Espaços
Territoriais Protegidos e 4 quadros contemplando a relação de espécies da fauna e da flora.
4
2. DEFINIÇÃO DA ÁREA DE INFLUÊNCIA
De acordo com a Resolução CONAMA 001/86, o EIA deve "definir os limites da área geográfica a
ser direta e indiretamente afetada pelos impactos, denominando área de influência do projeto,
considerando em todos os casos, a bacia hidrográfica na qual se localiza"(art. 5, III).
Para o empreendimento em tela, a área de influência direta e indireta para fins dos estudos
físicos e bióticos abrange a Macrobacia Hidrográfica de Jacarepaguá. Com respeito aos estudos
socioeconômicos, a Área de Influência Indireta compreende o município do Rio de Janeiro e a
Área de Influência Direta à Macrobacia Hidrográfica de Jacarepaguá (Figura 2.1).
Para efeito dos estudos físicos e bióticos, devido ao seu teor sistêmico – fenômenos e processos
naturais interdependentes -, considera-se uma coincidência das Áreas de Influência Direta e
Indireta, uma vez que as intervenções propostas pelo empreendedor estão disseminadas por toda
bacia, estando seus efeitos diretos e indiretos inclusos nesta unidade espacial de análise e
limitados pelas águas próximas da orla marítima.
Quanto aos estudos socioeconômicos, a despeito de se considerar diretamente impactadas
apenas populações e comunidades residentes nas áreas imediatamente contíguas às principais
obras e interferências - ou por elas reassentadas -, tomou-se também toda a Macrobacia como
Área de Influência Direta. Essa decisão deveu-se, mais uma vez, ao caráter eminentemente
sistêmico do plano de intervenção, trazendo influências diretas para toda a população da Baixada
de Jacarepaguá, Barra e Recreio. Como Área de Influência Indireta, tomou-se o próprio Município
do Rio de Janeiro, dado o vulto das obras e seus eventuais efeitos diretos e indiretos sobre a
qualidade de vida e economia municipal.
Com cerca de 300 km2, a área de influência abarca as Regiões Administrativas de Jacarepaguá VI e da Barra da Tijuca - XXIV, englobando os bairros relacionados no Quadro 2.1, abaixo.
Quadro 2.1 – Regiões administrativas e bairros da área de influência
REGIÃO ADMINISTRATIVA
BAIRRO
Jacarepaguá
Anil
Gardênia Azul
Cidade de Deus
Curicica
VI .RA - Jacarepaguá
Freguesia
Pechincha
Taquara
Praça Seca
Tanque
Joá
Barra da Tijuca
Itanhangá
XXIV. RA - Barra da Tijuca
Camorim
Vargem Grande
Vargem Pequena
Recreio
Grumari
Fonte: Anuário Estatístico da Cidade do Rio de Janeiro, 1992/93 – IPLANRIO
5
22 42'30''
AII - A'REA DE INFLUE^NCIA INDIRETA
~
CONVENCOES
,
22 45'00''
Via urbana
Rio ou canal
Lagoa
22 47'30''
43 03'45''
Limite da macro bacia da baixada de Jacarepagua'
Limite de Bairros
BAIRROS
22 50'00''
MUNICI'PIO
DO
RIO
DE
JANEIRO
22 52'30''
PRA}A SECA
TANQUE
22 55'00''
TAQUARA
PECHINCHA
FREGUESIA
JACAREPAGUA'
XVI-RA
CURICICA
CIDADE
DE
DEUS
VARGEM GRANDE
22 57'30''
JACAREPAGUA'
ANIL
GARDE^NIA
AZUL
43 48'45''
CAMORIM
JACAREPAGUA'
TIJUCA
VIII-RA
ALTO DA BOA VISTA
VARGEM PEQUENA
ITANHANGA'
BARRA DA TIJUCA
XXIV-RA
BARRA DA TIJUCA
23 00'00''
43 45'00''
RECREIO DOS BANDEIRANTES
JOA'
OCEANO
23 02'30''
ATLA^NTICO
GRUMARI
~
PROJECAO
UNIVERSAL TRANSVERSA DE MERCATOR
,
ESCALA GRAFICA
2.5
23 05'00''
43 33'45''
43 30'00''
43 26'15''
43 22'30''
43 15'00''
43 11'15''
43 07'30''
0
Origem da quilometragem : Equador e Meridiano 45 W.Gr.
acrescidas as constantes 10.000km e 500km, respectivamente
Datum vertical : maregrafo Imbituba, SC
-
43 37'30''
5
Datum horizontal : Corrego Alegre, MG
-
43 41'15''
43 18'45''
2.5
0
AID - A'REA DE INFLUE^NCIA DIRETA
FIGURA 2.1
A'REA DE INFLUE^NCIA
Sondotecnica
7.5km
3. BIODIVERSIDADE
3.1 PANORAMA GERAL
A bacia hidrográfica de Jacarepaguá abrange cerca de 300 km2, abarcando as Regiões
Administrativas de Jacarepaguá - VI e da Barra da Tijuca - XXIV.
Limita-se a oeste com a bacia da baía de Sepetiba, ao norte e leste com a bacia da baía de
Guanabara e ao sul com o Oceano Atlântico. A população total da bacia é estimada em
aproximadamente 500.000 habitantes, que corresponde a cerca de 10 % do município do Rio de
Janeiro.
A bacia hidrográfica possui dois conjuntos fisiográficos distintos: o domínio Serrano, representado
por montanhas e escarpas da vertentes oceânica dos maciços da Pedra Branca e Tijuca e o
domínio da Baixada, representado pela planície flúvio-marinha (baixada de Jacarepaguá). A
baixada encontra-se confinada entre o mar e a montanha por um grande arco de rochas
graníticas e gnaíssicas que se estende desde o pontal da Joatinga, a leste, até a Pedra de
Guaratiba, a oeste. Ocorrem ainda morros isolados na planície.
O domínio serrano é derivado de blocos falhados e basculados, sendo representado pelos maciços da Tijuca e da Pedra Branca, que apresentam terrenos elevados que alcançam altitudes da
ordem de 1.000 metros. Litologicamente, os maciços são compostos por rochas cristalinas précambrianas, que foram submetidas à intensa ação tectônica, apresentando intrusões e
metamorfismos de idades variadas, compondo uma história litoestrutural que se estende, de
forma mais significativa, até o cretáceo.
No maciço da Pedra Branca predominam o granito plutônico e as intrusivas alcalinas. No maciço
da Tijuca, o domínio é de paragnaísses de fácies geossinclinais, de idade pré-cambriana, com
composições e texturas bastante diversificadas incluindo pegmatitos, diques de diabásio e diques
de basalto. Intrusões básicas e intermediárias estão presentes nos dois maciços. O controle
estrutural é expressivo, predominando a direção NE-SW, evidenciada pelo posicionamento de
fraturas, falhas, intrusões e orientação da drenagem.
Os elevados índices pluviométricos influenciam na escultura das formas de relevo e na alteração
profunda exercida sobre as rochas, favorecendo a formação de mantos de intemperismo de
espessuras variadas. As declividades acentuadas das encostas, os elevados índices de
pluviosidade e a degradação da cobertura vegetal, proporcionam alta suscetibilidade a erosão por
movimentos de massa ( escorregamento de solo e rocha, quedas de blocos e lascas de rocha )
deixando cicatrizes erosivas associadas a esse evento.
A baixada é de origem recente, tendo sido formada no decorrer do quaternário (pleistoceno), e
mostra uma variedade de ambientes deposicionais representados por sedimentos quaternários
aluviais de origem fluvial, flúvio-marinho e flúvio-lacustre e de sedimentos marinhos. Os primeiros
(sedimentos continentais), são constituídos de cascalho, areia, silte e argila. Os sedimentos
marinhos são formados basicamente de areias quartzosas claras.
7
Além desses, depósitos coluviais formados a partir do transporte do material proveniente das
encostas pelas chuvas torrenciais, encontram-se junto aos sopés das elevações e espraiados nas
áreas baixas, sobrepostos aos depósitos flúvio-marinhos.
Todos esses depósitos sedimentares foram retrabalhados durante as diversas etapas climáticas e
variações do nível do oceano que atingiram o litoral fluminense a partir do pleistoceno.
Com respeito aos solos, predominam nos terrenos mais elevados dos maciços o latossolo
vermelho amarelo associado ao Cambissolo. O primeiro apresenta-se com boa permeabilidade,
bastante profundo e sua textura varia de argilosa a muito argilosa sendo, também, muito
resistente à erosão. O Cambissolo é menos profundo, está relacionado às ocorrências de
afloramentos da rocha-mãe, possui um horizonte B rico em minerais primários e boa drenagem
mas é mais susceptível à erosão.
No maciço da Tijuca, nas áreas que margeiam os terrenos elevados, o predomínio é do Podzólico
Vermelho Amarelo, já nas áreas equivalentes do maciço da Pedra Branca a predominância é
Podzólicos Vermelho Amarelo Eutrófico. Com texturas e estruturas bastante variadas, esses solos
pouco profundos possuem um horizonte B arenoso, sendo muito susceptíveis à erosão. Entre os
maciços, onde os relevo é plano ou levemente ondulado, está presente o Planossolo, muito
lixiviado e sem uma boa drenagem, sendo relacionado à presença de depósitos sedimentares
antigos.
Na baixada de Jacarepaguá, especialmente nas zonas de relevo mais rebaixado que ocorre entre
os dois maciços, existem associações do Latossolo Vermelho Amarelo com o Podzólico
Vermelho. Estes solos são muito profundos e intemperizados, não apresentando muitos vestígios
de minerais primários. Mais próximo da linha de costa ocorrem o Podzol e os Solos ArenoQuartzosos. Estes são profundos e aparecem nos cordões litorâneos, sendo muito porosos e
extremamente permeáveis.
Na região da Vargem Grande, mais precisamente nos campos inundáveis de Sernambetiba estão
Solos Orgânicos Distróficos, mal drenados. Neles está presente a maior e mais espessa área de
turfa da baixada.
As margens das Lagoas de Jacarepaguá, Camorim e Tijuca ocorrem solos de Mangue e Salinos
Thiomórficos. Mais em direção aos maciços e relacionados aos baixos cursos fluviais, aparecem
os solos Gley Distróficos e Aluviais Eutróficos e Distróficos.
Na bacia de Jacarepaguá, os efeitos orográficos, a proximidade do mar e direção das massas de
ar combinam-se para produzir microclimas e variações de regime pluvial a curtas distâncias. As
serras apresentam precipitações superiores as zonas de baixada. No maciço da Tijuca, as média
dos meses mais chuvosos, vão de outubro a abril, com médias superiores a 200 mm, enquanto
que, na baixada os meses mais chuvosos concentram-se de novembro a março, porém não
ultrapassando os 200 mm. A média é de 168,7 mm. Nos meses menos chuvosos, na baixada de
Jacarepaguá, os totais médios são inferiores a 100 mm e o mês menos chuvoso, junho, tem 43,2
mm, enquanto que no Maciço da Tijuca, esses meses tem médias superiores a 100 mm, mesmo
o menos chuvoso, junho, recebe 108 mm. Para o Maciço da Pedra Branca, sem postos
meteorológicos, é possível estimar que as precipitações são elevadas porém menores que os
totais do Maciço da Tijuca.
Em termos de ecossistemas aquáticos, a bacia contempla diversos rios cujas nascentes estão
situadas nas vertentes dos Maciços da Tijuca e da Pedra Branca e na sucessão de morros que os
une (serra do Engenho Velho e morros do Catonho, do Monte Alto, São José e Covanca) e as
8
lagunas da Tijuca, Camorim, Jacarepaguá, Marapendi e Lagoinha. As águas da bacia fluem
majoritariamente para as lagunas e daí para o mar.
Fazem parte da bacia hidrográfica da laguna de Jacarepaguá os seguintes ecossistemas fluviais:
rios Guerenguê, Monjolo, Areal, Pavuninha, Passarinhos, Caçambé, Camorim, do Marinho,
Ubaeté, Firmino, Calembá, Cancela, Vargem Pequena e Canudo; o arroio Pavuna; o córrego
Engenho Novo e os canais do Portelo e do Cortado.
Integram a bacia da laguna do Camorim o arroio Fundo e os rios Banca da Velha, Tindiba,
Pechincha, Palmital, Covanca, Grande, Pequeno, Anil, Sangrador, Panela, São Francisco, Quitite
e Papagaio.
A bacia da laguna da Tijuca é formada pelos rios das Pedras, Retiro, Carioca, Muzema,
Itanhangá, Leandro, da Cachoeira, Tijuca, da Barra, Gávea Pequena, Jacaré e pelo córrego
Santo Antônio. Para a laguna de Marapendi fluem apenas o rio das Piabas e o canal das Taxas.
Com respeito aos ecossistemas lagunares, observa-se que a soma da superficie das mesmas
abarca cerca de 12,7 km2. O sistema formado pelas lagoas de Jacarepaguá (3,7 km2), Camorim e
Tijuca (4,8 km2) apresenta um espelho d’água de cerca de 9,3 km2. Juntas, possuem uma
extensão de aproximadamente 13,0 km. Completam o quadro a laguna de Marapendi e a
Lagoinha, com áreas de 3,5 km2 e 0,7 km2, respectivamente.
A lagoa de Camorim constitui propriamente um canal de ligação entre as lagoas de Jacarepaguá,
a oeste, e a da Tijuca, à leste. A Lagoa da Tijuca, por sua vez, recebe as águas da Lagoa de
Marapendi pelo canal de mesmo nome, de cerca de 4,0 km de comprimento. As águas então se
dirigem em conjunto para a sua barra no litoral, representada pelo canal da Joatinga.
Cabe mencionar que o sistema hidrográfico possui duas ligações com o mar, uma ao leste,
através do canal da Joatinga, e outra a oeste, por meio do canal de Sernambetiba. Pelo primeiro,
se dá a entrada de água do mar, mais salgada, na lagoa da Tijuca e desta para a Lagoa de
Marapendi, pelo canal de Marapendi. No caso da lagoa da Tijuca, a penetração da maré é
atenuada, atingindo valores desprezíveis na altura da lagoa de Camorim.
Os usos das águas fluviais na bacia são basicamente abastecimento urbano e diluição de despejo
domésticos e industriais, havendo ainda em pequena proporção a dessedentação de animais
domésticos e a recreação. O período de águas altas dos rios vai de outubro a abril. As descargas
acompanham os índices de precipitação. Os usos das águas lagunares são diluição de despejo
domésticos e industriais, a pesca e a recreação.
A cobertura vegetal primitiva era constituída por florestas, que ocupavam integralmente o domínio
serrano e os morros isolados. Os trechos úmidos das baixadas, representados por várzeas e
alagadiços marginais, eram ocupados por brejos, florestas aluviais, matas de restinga (estes nos
alagadiços entre cordões arenosos) e mangues. O terrenos não sujeitos a inundação era
revestidos por florestas de terras baixas (nas partes adjacentes aos maciços) e comunidades de
restinga.
Nos dias atuais, há nitidamente dois grandes blocos de vegetação florestal separados na bacia,
os dos maciços da Tijuca e da Pedra Branca. No maciço da Tijuca a vegetação forma um grande
fragmento, onde se observam muitas cicatrizes de movimentos de massa, principalmente na
serra de Três Rios. O mapa do anexo I mostra a distribuição da cobertura vegetal atual.
As matas mais bem conservadas do maciço da Pedra Branca estão nas serras de Santa Barbara,
Sacarrão, Nogueira e Quilombo. Formam o núcleo florestal central do maciço, que é circundado
9
por fragmentos menores ao seu redor, nas outras serras. Este núcleo apresenta também diversas
cicatrizes de movimentos de massa. No flanco oeste, representado pelas serras de Grumari e
Geral de Guaratiba, as florestas encontram-se muito fragmentadas e alteradas e são separadas
por imensos bananais que chegam a atingir a crista destas elevações, além de campos de ervas
invasoras.
A serra do Engenho Velho e o conjunto de morros que une os maciços (Morros do Catonho, do
Monte Alto, São José e Covanca), por serem de baixa altitude, apresentam florestas muito
alteradas, separadas por amplas superfícies de campos de ervas invasoras.
A vegetação de restinga remanescente apresenta fragmentos dos seguintes tipos de
comunidades: halófitas e psamófilas reptantes, arbustivas abertas e fechadas, brejo herbáceo,
floresta seca, floresta periodicamente inundada e floresta permanentemente inundada. Na bacia
de Jacarepaguá, a vegetação de restinga se encontra fortemente ameaçada pela expansão da
cidade. A área de maior extensão encontra-se ao redor da laguna de Marapendi, no interior da
APA do Parque Ecológico de Marapendi. Um dos últimos fragmentos de floresta de restinga
sujeita a inundação encontra-se nas imediações do encontro da Av. Salvador Allende com a Av.
das Américas.
Os manguezais aparecem na forma de pequenas manchas dispersas ao longo das orlas das
lagunas de Marapendi, Tijuca, Camorim e Jacarepaguá, e em algumas ilhas.
Outros tipos de cobertura vegetal representados na bacia são as comunidades de afloramento
rochoso e as comunidades de ervas invasoras (ruderais). Esta última está presente em profusão
na bacia, tanto na baixada quanto nas áreas serranas. São comunidades essencialmente de
origem antrópica com “habilidade” em colonizar rapidamente áreas desmatadas.
Foi observado que extensas áreas sobre os maciços na bacia, de tão degradadas, perderam a
capacidade de autoregeneração. Apresentam, portanto, baixa resiliência, isto é, seu retorno ao
estado anterior pode não ocorrer ou ser extremamente lento.
As razões que concorrem para este fato são:
− foram eliminados os bancos de semente no solo, o banco de plântulas, as chuvas de sementes
e rebrota;
− a presença de espécies invasoras de rápido crescimento, como o capim colonião e outras
gramíneas, é um dos principais problemas pois propicia a ocorrência de incêndios. A
freqüência constante deste evento praticamente inviabiliza a colonização vegetal que dá inicio
a sucessão, pois incinera as plântulas e sementes;
− para que ocorra a colonização vegetal é necessário uma disponibilidade de nutrientes e
umidade no solo, fatores que normalmente acham-se em níveis insuficientes em área
erodidas, ou de exposição de horizonte C, que apresenta além de problemas químicos,
também impedimentos de ordem física;
− consumo de plântulas por pastoreio de animais domésticos ou morte por pisoteio;
− competição com ervas invasoras.
Dentre as espécies florestais pioneiras na bacia de Jacarepaguá destacam-se: crindiúva (Trema
mícrantha), quaresmeira (Tibouchina granulosa), aleluia ou canudeiro (Cassia multijuga), tangará
(Miconia guianensis), açoita-cavalo (Luehea divaricata), quaresmeira (Tibouchina qranulosa) e as
10
imbaúbas (Cecropia adenopus e C. hololeuca). Nos terrenos mais degradados destaca-se a
candeia (Vaniliosmopsis erythropappa). Podem ser assinaladas ainda o ipê-felpudo (Zeyheria
tuberculata), o camará (Gochnatia polymorpha), jacarés (Piptadenia gonoachanta), aroeiras
(Schinus terbenthifolius), unhas-de-vaca (Bauhinia forficata) e tamanqueiras (Aegiphylla
sellowiana). As espécies pioneiras mais encontradas pertencem, em sua grande maioria, às
famílias Compositae, Boraginaceae, Solanaceae, Leguminosae, Cyperaceae, Gramineae e
Clethraceae.
Na restinga, uma das plantas pioneiras de comunidades arbustivas-arbóreas é a bromélia
Noeregelia cruenta, que não tolera sombreamento. Outras pioneiras são: Aechemea nudicalis,
Pilocereus arrabidae, Pithecolobium tortum e Eugenia rotundifolium. Associadas a elas num
segundo momento, surgem os arbustos Myrciarira tolypantha, Erythroxylum ovalifolum, Tocoyena
bullata, Ocotea notata e Maytenus obtusifolia. A palmeira guriri parece ser também uma espécie
pioneira.
No caso dos manguezais o processo de colonização se inicia por gramíneas (Paspalum
vaginatum), seguida das arbóreas (Laguncularia racemosa e Rhizophora mangle).
Os principais eventos que vem acarretando alterações na cobertura vegetal são: bananais;
criação de gado e cabras em encostas íngremes e topos de morros; esgotamento dos solos,
dificultando a regeneração; queimadas provocadas por balões e para limpeza de terreno;
colonização de ervas invasoras; escassa valorização das florestas; fiscalização florestal precária;
expansão de áreas urbanas, loteamentos, favelas e condomínios, retirada de plantas
ornamentais; espaços territoriais protegidos não implantados; pedreiras e saibreiras e linhas de
transmissão.
O diagnóstico da fauna silvestre detectou 51 espécies de anfíbios, 24 de répteis, 384 de aves e
91 de mamíferos efetiva ou potencialmente presentes na bacia. Mais importante que o simples
registro de espécies é a confirmação acerca da viabilidade de sua perpetuação, ou seja, se o
estado atual dos habitats consegue manter populações animais com contingentes adequados. As
transformações sofridas da bacia no decorrer de mais de 4 séculos reduziu significativamente o
contingente populacional da fauna silvestre, além de acarretar uma perda parcial da diversidade
biológica. O grupo faunístico mais afetado foi o das espécies ombrófilas de baixa altitude, por não
possuírem capacidade de adaptação a outras fisionomias vegetacionais.
O porte da maioria dos animais silvestres da bacia é de médio a pequeno. Os maiores animais
são os veados-mateiros (Mazama americana - 40 kg), as capivaras (Hydrochaeris hydrochaeris 40 kg) e os caititús (Tayassu tajacu - 30 kg). A eles se seguem as pacas, macacos-pregos, quatis
(Nasua nasua), cachorros-do-mato (Cerdocyon thous) iraras (Eira barbara), preguiças (Bradypus
torquatus) e mão-pelada (Procyon cancrivorus). Coletivamente, a maior biomassa provavelmente
é representada por pequenas aves e morcegos.
Com respeito aos peixes fluviais e lagunares, apesar das perdas sofridas, ainda é possível se
observar um alto número de espécies. Ressalta-se que a distribuição das espécies na bacia não é
homogênea, podendo-se distinguir áreas praticamente desprovidas de peixes e regiões que
parecem atuar como os bolsões locais de biodiversidade, como os rios Paineiras e Camorim.
11
Reunindo as informações disponíveis sobre a área em estudo, verifica-se que na bacia de
Jacarepaguá existem 89 espécies de peixes. Desse total, 28,4% são espécies de água doce
primárias (possuem distribuição restrita aos corpos fluviais e paludiais), 9,1% são dulcícolas
secundárias (ocorrem em ambientes de água doce e em sistemas mesohalinos) e 62,5% são
marinhas erurihalinas, o que ilustra a grande importância dos ambientes marinhos periféricos e
estuarinos na manutenção da riqueza biótica local.
Atualmente, a maior riqueza de espécies se dá na Laguna da Tijuca e a menor em brejos
sazonais.
3.2 ECOSSISTEMAS AQUÁTICOS INTERIORES E BIOTA ASSOCIADA
Este item dedica-se a descrição dos ecossistemas aquáticos interiores na bacia de Jacarepaguá
e de sua biota associada. Inicialmente tece comentários sobre os estudos existentes e sobre a
biogeografia da bacia. Em sequência, aborda a composição geral da ictiofauna, faz análises
comparativas e descreve as características ambientais dos ecossistemas fluviais, lagunares e
paludiais e de suas respectivas biotas associadas. No anexo III, é apresentado o referencial
metodológico adotado para o estudo dos ecossistemas aquáticos interiores, com ênfase nos
fluviais.
3.2.1 Comentários Sobre Estudos Existentes
Poucos estudos documentaram a biota aquática historicamente associada à região, destacandose, dentre estes, o trabalho de Correa (1936) que, ao descrever detalhadamente a baixada
(denominada pelo autor como “sertão carioca”), aborda diversos aspectos da fauna em rios,
lagunas e brejos, bem como descreve a atividade de pesca existente na época.
Estes dados serviram como base para outros estudos como o de Lamego (1974) que retratou a
biota local e sua influência sobre o processo de ocupação da baixada.
Estudos específicos acerca da ictiofauna e da herpetofauna associada aos ecossistemas da
baixada tiveram início com os trabalhos de Travassos (1955) que ao tratar da taxonomia e da
morfologia de algumas espécies de peixes Characidae (Spintherobolus broccae e Deuterodon
pedri). De forma similar, Lutz (1954), Cochrane (1955) e Myers (1959), tratando de anfíbios do
Rio de Janeiro (à época Distrito Federal) e do sudeste brasileiro registram espécies para a área
em estudo e regiões circunvizinhas.
Estudos mais recentes apresentaram levantamentos detalhados da ictiofauna local. Ecossistemas
paludiais e rios foram estudados por Bizerril e Araújo (1993) enquanto que dados sobre a
ictiofauna das lagunas da baixada encontram-se em Volcker e Andreata (1982); Andreata et al.
(1990a,b; 1992), Barroso (1989). Andreata e Marca (1993) enfocaram os rios, riachos e lagos do
Parque Nacional da Floresta da Tijuca, muitos dos quais integrantes da bacia de Jacarepaguá.
Bizerril (1996) apresentou uma síntese geral da biodiversidade dos ecossistemas aquáticos da
baixada de Jacarepaguá, indicando áreas com maior sensibilidade ambiental à novas
intervenções antrópicas.
Os relatórios apresentados pela FEEMA (1987, 1989), além de relacionarem diversos elementos
da biota local, traçam um perfil da qualidade geral dos sistemas aquáticos da bacia.
12
No que se refere a anurofauna da baixada de Jacarepaguá, Napoli (1989) e Napoli e Bizerril
(1992) apresentaram dados gerais sobre a composição taxonômica e ecologia de isocenoses de
ambientes temporários.
O trabalho de Fonseca (1995), ao apresentar uma síntese da sistemática e da distribuição dos
camarões das famílias Atyidae e Palaenomidae no Estado do Rio de Janeiro, fornece uma
indicação das espécies ocorrentes na baixada de Jacarepaguá.
3.2.2 Nota Biogeográfica
Em termos biogeográficos, os ecossistemas aquáticos em estudo encontram-se inseridos na
província ictiográfica do sudeste brasileiro (Bizerril, 1994), uma estreita faixa continental situada
entre os contrafortes orientais das Serras do Mar e da Mantiqueira e o oceano Atlântico,
estendendo-se entre a baía de Vitória (ES) e o extremo sul da Serra Geral (RS). A província
apresenta, em termos gerais, um alto grau de endemismos devido ao isolamento de suas bacias
hidrográficas, criando condições que potencializam os processos de extinção (Bizerril, 1995;
Bizerril et al., 1996).
A província sudeste, embora seja claramente monofilética e exiba uma composição ictiofaunística
bastante distinta do apresentado por outras zonas ictiogeográficas reconhecidas na região
neotropical, não representa uma unidade totalmente homogênea, sendo possível reconhecer subáreas, agrupadas por exibirem maior nível de similaridade entre si. Análise comparativa preliminar
foi apresentada por Bizerril (1996), servindo de subsídios para Bizerril e Lima (1997)
reconhecerem 8 subdomínios ictiogeográficos na região sudeste brasileira.
De acordo com os autores supracitados, a bacia de Jacarepaguá, encontra-se situada no
subdomínio Fluminense, que agrupa os rios que drenam para a Baía de Guanabara, o alto curso
do rio Grande/Dois Rios, e as cabeceiras da bacia do rio São João.
No âmbito ictiogeográfico, a bacia de Jacarepaguá se notabiliza por reunir, em uma superfície
relativamente pequena, elevada diversidade de ambientes aquáticos (rios, brejos e lagunas). Esta
situação propicia à manutenção de fauna aquática diversificada, o que pode ser atestado pelos
topônimos conferidos aos rios e às lagoas da região - Canal das Piabas, Camorim, este também
conhecido como Robalo, Jacarepaguá, vale ou baixada dos Jacarés (Maciel e Magnanini, 1989).
Seguindo uma tendência evidenciada em diversos locais do estado do Rio de Janeiro, a bacia
vem sofrendo uma rápida deterioração ambiental, um fenômeno negativo com forte
previsibilidade, considerando a rapidez que a urbanização se deu. Destaca-se como um dos
principais agentes de redução da diversidade biológica, o incremento das vias de acesso a região,
especialmente a partir da década de 70, quando grandes obras, como a construção da estrada
Lagoa-Barra e a estrada da Grota Funda, passaram a comunicar definitivamente a Baixada de
Jacarepaguá ao restante da cidade, valorizando os terrenos e catalisando o processo de
especulação imobiliária.
Sob um enfoque biogeográfico, os impactos antrópicos sobre a baixada de Jacarepaguá fazem
com que atualmente a mesma represente uma área de descontinuidade na distribuição de alguns
grupos de peixes típicos de baixadas fluviais e muito comuns no subdomínio Fluminense. São
exemplos o sairu (Cyphocharax gilbert), o peixe cachorro (Oligosarcus hepsetus), os peixes
ferreiros (Corydoras nattereri, C. prionotus), dentre outros, que ocorrem em toda a região sudeste
ao norte e ao sul deste local (Bizerril, 1994).
13
A presença de alguns destes grupos na região foi relatado por Correa (1936) que em uma
passagem de sua obra na qual descreve a lagoa de Marapendi, menciona que “os peixes que
encontrei nas minhas excursões são os que habitam águas fluviais: (...) o tambicu ou peixe
cachorro (Acestrorhamphus hepsetur)1 da família. dos Hydrocioneos2, denominado peixe
cachorro por ter dentição canina, (...) o sayrú ou sairu (...)”.
É possível que a antiga localidade de Pirapitingui (pirá = peixe; pi= escama; tingui = branco), local
onde a capela de São Gonçalo foi levantada por concessão de Matheus da Costa Aborim, em 4
de outubro de 1625, tenha sido denominada em referência a presença de sairus nos
ecossistemas locais, visto que este peixe comestível e de coloração esbranquiçada (“branco
como a sardinha” cf. Correa, 1936) usualmente é abundante nos seus sítios de ocorrência. Hoje o
sairu não mais ocorre em Jacarepaguá.
O trabalho de Bizerril e Araújo (1993) apontou a espécie Spintherobolus broccae, um pequeno
lambari (Foto 3.1) originalmente citado por Travassos (1953) como presente no local e com lotes
testemunho depositados no Museu Nacional do Rio de Janeiro, como localmente extinta.
Foto 3.1 – Spintherobolus broccae, um pequeno Characidae extinto na região
(Modificado de SARRAF, 1997).
3.2.3 Composição Geral da Ictiofauna e Análises Comparativas
Apesar das perdas sofridas, ainda é possível observar um alto número de espécies na área de
estudo. Ressalta-se que a distribuição das espécies não é homogênea, podendo-se distinguir
áreas praticamente desprovidas de grupos nativos e regiões que parecem atuar como os bolsões
locais de biodiversidade. Esse aspecto, associado com a rapidez do processo de ocupação da
baixada de Jacarepaguá, aumenta a importância da realização de intervenções imediatas.
Reunindo as informações disponíveis sobre a área em estudo, verifica-se que na baixada de
Jacarepaguá existem 89 espécies de peixes (QUADRO II.1 do Anexo II). Desse total, 28,4% são
espécies de água doce primárias (possuem distribuição restrita aos corpos fluviais e paludiais),
9,1% são dulcícolas secundárias (ocorrem em ambientes de água doce e em sistemas
mesohalinos) e 62,5% são marinhas erurihalinas, o que ilustra a grande importância dos
ambientes marinhos periféricos e estuarinos na manutenção da riqueza biótica local.
1
2
Atualmente Oligosarcus hepsetus
Atualmente Characidae
14
Atualmente, a maior riqueza de espécies se dá na Laguna da Tijuca e a menor em brejos
sazonais (Figura 3.1), forma de distribuição de biodiversidade que se mostra significativamente
distinta de um padrão de ocupação equitativa dos nichos espaciais disponíveis (χ2= 66,44, α<
0,001).
60
50
40
30
20
10
0
LT
LM
BF
LJ
BP
CA
BT
Figura 3.1 - Número de espécies de peixes por ecossistema (BF= Baixadas Fluviais, BP=
Brejos Permanente, LJ= Laguna de Jacarepaguá, BT= Brejos Temporários,
LM= Laguna de Marapendi, LT= Laguna da Tijuca e CA= Cabeceiras).
Em termos de composição geral da ictiofauna, observa-se, a partir da ordenação dos valores de
similaridade faunística, a existência de 4 compartimentos ambientais distintos, formados por IBaixadas fluviais+Brejos permanente+Laguna de Jacarepaguá, II- Brejos temporários, III- Laguna
de Marapendi+Laguna da Tijuca e IV- Cabeceiras (Figura 3.2).
CA
LT
LM
BT
LJ
BP
BF
0
0,5
1
Figura 3.2 - Agrupamento dos ecossistemas estudados com base na similaridade
faunística (BF= Baixadas Fluviais, BP= Brejos Permanente, LJ= Laguna de
Jacarepaguá, BT= Brejos Temporários, LM= Laguna de Marapendi, LT= Laguna
da Tijuca e CA= Cabeceiras).
Considerando o recorte macroespacial adotado, verifica-se que, com relação à dependência
faunística, as lagunas da Tijuca, Marapendi e de Jacarepaguá, assim como os brejos
permanentes não exibem, na região da Baixada de Jacarepaguá, espécies eocenas, embora
exibam grupos preferentes (sensu Dajoz, 1983). Os brejos sazonais apresentam uma espécie
15
dependente (Leptolebias minimus), as cabeceiras possuem cinco (Trichomycterus sp.,
Neoplecostomus microps, Schizolecis guntheri e Corydoras barbatus) e as baixadas fluviais 3
espécies eocenas (Pimelodella lateristriga, Parotocinclus maculidauda e Microlepidogaster
notatus). Os únicos ambientes com espécies ameaçadas são os brejos sazonais, que abrigam L.
minimus, peculiaridade que será detalhada quando da descrição destes biótopos.
Os valores dos fatores determinantes da sensibilidade encontram-se apresentados na Figura 3.3.
Grau de Particularidade
Dificuldade de Recolonização
0,6
1
0,84
0,54
0,5
0,8
0,4
0,66
0,33
0,6
0,3
0,46
0,4
0,2
0,32
0,1
0
LT
0,16
0,11
0,16
0
0,2
0,2
LM
0
0
LJ
0
0
BF
CF
BS
LT
BP
LM
LJ
BF
CF
BS
BP
Grau de Dependência
0,5
0,46
0,4
0,3
0,2
0,16
0,12
0,1
0
0
LT
0
LM
0
LJ
0
BF
CF
BS
BP
Figura 3.3 – Valores dos índice indicadores de sensibilidade calculados para cada
ambiente em estudo. (BF= Baixadas Fluviais, BP= Brejos Permanente, LJ=
Laguna de Jacarepaguá, BT= Brejos Temporários, LM= Laguna de Marapendi,
LT= Laguna da Tijuca e CF= Cabeceiras Fluviais).
Aplicando os valores de cada fator determinante da sensibilidade ao algoritimo sugerido para o
cálculo do grau de sensibilidade total, obteve-se a seguinte ordenação: cabeceiras= 4,28
(sensibilidade relativa igual a 47,5%), brejos sazonais= 2,02 (22,4%), baixadas fluviais= 1,82
(20,2%), Laguna da Tijuca= 1,59 (17,6%), brejos permanentes= 0,74 (8,2%), Laguna de
Marapendi= 0,69 (7,6%) e Laguna de Jacarepaguá= 0,25 (2,7%).
16
A visualização dos conjuntos ambientais de maior sensibilidade pode ser feita a partir da análise
de agrupamento, como apresentado na Figura 3.4. Analisando o dendrograma gerado com base
nos valores do índice de Bray-Curtis, pode-se constatar a existência de 3 compartimentos
ambientais que representam 3 níveis de restrição a ocorrência de novas interferências antrópicas,
a saber: I- Elevado, II- Intermediário e III- Baixo.
CA
BS
BF
LT
0
0,5
I
BP
LM
II
LJ
III
1
Figura 3.4 - Agrupamento dos ecossistemas estudados com base na similaridade quanto a
sensibilidade ambiental (BF= Baixadas Fluviais, BP= Brejos Permanente, LJ=
Laguna de Jacarepaguá, BT= Brejos Temporários, LM= Laguna de Marapendi,
LT= Laguna da Tijuca e CA=Cabeceiras).
A comparação entre os resultados da hierarquização efetuada no presente estudo e as avaliações
existentes acerca de processos de ocupação do espaço local (Zee et al., 1990) demonstrou que
há uma incompatibilidade evidente entre os processos de urbanização e a tentativa de
preservação da diversidade biológica da região.
Assim, embora as áreas mais sensíveis (cabeceiras fluviais) sofram poucos impactos, sistemas
como os brejos sazonais e as baixadas fluviais vem sendo constantemente alterados por distintas
formas de uso do solo. Considerando a vulnerabilidade de tais sistemas, prevê-se que a
continuidade do ritmo de urbanização dentro dos moldes atuais resultará em expressiva perda da
riqueza biológica da bacia. Tendo em vista o isolamento geográfico dos sistemas hídricos
afetados, a ocorrência de processos de recolonização a nível macro-espacial torna-se inviável.
Logo, as perdas serão definitivas.
As particularidade de cada ecossistema em estudo e as características gerais das biotas neles
encontradas são apresentados a seguir.
3.2.4
Ecossistemas Fluviais e Biota Associada
Os sistemas de drenagem associado às lagunas, de Jacarepaguá, caracterizam-se por
apresentarem, dentre outros aspectos, pequenas dimensões, baixa densidade de drenagem e
reduzidas hierarquias fluviais3.
3
Por densidade de drenagem entende-se o número de tributários em relação a área da bacia; a hierarquia equivale a
ordem fluvial, dentro do principio adotado por STRAHLER (1982).
17
Na designação de alguns corpos fluviais foram utilizadas siglas (SB1, 2, 3, 4, 6). A equivalência
entre as siglas e os topônimos é apresentada no Quadro 3.1, a seguir.
Quadro 3.1 – Equivalência de nomenclatura entre a terminologia
adotada e os topônimos locais
NOMENCLATURA ADOTADA
TOPÔNIMOS
Sb1
Rio Morto
Sb2
Rio entre o Morro do Burro e o rio Morto
Sb3
Canal entre o morro do Burro e o rio Vargem
Pequena
Sb4
Firmino
SB5
Canal adjacente ao Morro do Cantagalo
Sb6
Cancela
Calembé
Calembé
Paineiras
Paineiras
Pedras
Pedras
Pavuna
Pavuna
Camorim
Camorim
Cacembé
Cacembé
A configuração geral dos ecossistemas fluviais é bastante homogênea, observando-se o
predomínio de rios com forte declividade no curso superior seguida imediatamente por um
pequeno trecho que corre sobre as baixadas
500.00
flúvio-marinhas (Figura 3.5).
RIO DAS PEDRAS
Maiores diferenças foram constatadas
envolvendo sub-bacias (Sb) de pequeno
porte (Sb3, Sb2, SB6, Cacembé) e a bacia
SB1. A diversidade de ambientes foi a
variável que contribuiu mais fortemente para
a formação do arranjo obtido. Outras
variáveis importantes foram a extensão, no
primeiro componente (PC1) e o número de
ambientes, em PC24 (ver Quadro 3.2).
4
400.00
Cotas (metros)
Trabalhando com os dados brutos das
variáveis adotadas para a caracterização
fisiográfica das bacias, observa-se que há
uma grande similaridade entre elas (Figura
3.6).
300.00
200.00
100.00
0.00
0.00
1000.00
2000.00
3000.00
Extensão (metros)
4000.00
5000.00
Figura 3.5- Perfil longitudinal do rio das
Pedras, ilustrando o aspecto característico
dos rios da baixada de Jacarepaguá, RJ.
PC1 E PC2 referem-se aos eixos dos componentes principais (Principal componente – PC).
18
Figura 3.6 – Representação gráfica dos escores dos componentes principais
calculados para cada uma das bacias estudadas
1
SB3 SB2
SB6
0.8
CALEMBÉ
0.6
0.4
CAMORIM
0.2
VP
0
PAVUNA
PC2
-0.2
PEDRAS
-0.4
PAIN
SB1
-0.6
-0.8
0.2
SB4
CACEMBÉ
0.3
0.4
0.5
0.6
0.7
0.8
0.9
1
1.1
PC1
Quadro 3.2 – Valores dos escores dos componentes principais (PC1, PC2)
obtidos para cada variável fisiográfica
VARIÁVEIS
PC1
PC2
Ordem
0.7832
0.693
Número de tributários
0.7377
-0.1665
Extensão
1.444
0.323
Número de ambientes
-0.020
1.263
Diversidade de ambientes
-0.916
-1.776
Declividade
-0.132
-0.433
Fonte: SONDOTÉCNICA
A transformação das variáveis e a inclusão dos escores convertidos no índice geoambiental (ver
Anexo III) gerou o arranjo apresentado na Figura 3.7.
19
Sb6
Sb5
Sb4
Sb3
Sb2
Sb1
Camorim
Calembé
Cachoeira
Cacembe
Pedras
Barra
Passarino
A.Pavuna
Paineiras
Anil
Vargem Peq.
0
0,1 0,2 0,3 0,4 0,5 0,6 0,7 0,8
Figura 3.7 – Valores do índice geoambiental obtido em cada bacia estudada
PAINEIRAS
SB1
ANIL
SB2
SB4
PASSARINHO
SB5
BARRA
CALEMBE
VARGEM PEQUENA
CAMORIM
CACHOEIRA
CACEMBÉ
PAVUNA
PEDRAS
SB3
0.45
0.4
0.35
0.3
0.25
0.2
0.15
0.1
0.05
0
SB6
O agrupamento dos produtos (Figura 3.8) mostra um padrão no qual os rios Anil, Paineiras e SB1
são aqueles que potencialmente exibiam condições de manter uma fauna aquática mais
diversificada, atuando como as principais fontes de espécies da região.
0.45
0.4
0.35
0.3
0.25
0.2
0.15
0.1
0.05
0
Figura 3.8 – Agrupamento das bacias estudadas com base nos valores do índice
geoambiental.
20
Em contrapartida, os rios SB6 e SB3 mostraram-se os menos aptos à manutenção de fauna
aquática diversificada, enquanto os demais sistemas ocuparam posição intermediária.
A relação das espécies de peixes presentes nos rios da bacia de Jacarepaguá é apresentada no
Quadro 3.3. Além dos táxons relacionados a seguir, espécies marinhas eurihalinas como o peixe
rei (Xenomelaniris brasiliensis), o carapicu (Gerres aprion), a carapeba (Diapterus rhombeus), o
parati (Mugil curema), a tainha (M. liza), o robalo (Centropomus undecimalis), a sola (Achirus
lineatus) e marias-da-toca (Bathygobius soporator, Gobionellus boleosoma G. oceanicus) são
particularmente comuns nos segmentos fluviais de baixada próximos às lagoas de Jacarepaguá e
da Tijuca.
Quadro 3.3 – Ictiofauna de água doce dos rios da bacia de Jacarepaguá
CHARACIFORMES
GYMNOTIFORMES
ERYTHRINIDAE
Hoplias malabaricus (Bloch, 1794)
A. Holperitrhinys unitaeniatus
CRENUCHIDAE
Characidium sp.
C. interruptum Pellegrin, 1903
GYMNOTIDAE
Gymnotus carapo Linnaeus, 1758
G. pantherinus Steindachner, 1908
CYPRINODONTIFORMES
CHARACIDAE
Astyanax sp.1
Astyanax sp.2
Deuterodon pedri Eigenmann, 1908
Hyphessobrycon bifasciatus Ellis, 1911
H. reticulatus Ellis, 1911
Mimagoniates microlepis (Steindachner, 1876)
RIVULIDAE
Rivulus brasiliensis (Humboldt e
Valenciennes, 1812)
R. janeiroensis Costa, 1992
R. ocellatus Hensel, 1868
SILURIFORMES
PIMELODIDAE
Acentronichthys leptos Eigenmann e Eigenmann, 1889
POECILIIDAE
Poecilia vivipara Schneider, 1801
P. reticulata Peters, 1854
Phallopthychus januarius (Hensel,
1868)
Phalloceros caudimaculatus (Hensel,
1868)
Pimelodella lateristriga (Mueller e Troschel, 1849)
Rhamdia sp.
ANABLEPIDAE
Jenynsia multidentata (Jenyns, 1842)
TRICHOMYCTERIDAE
Trichomycterus sp
CALLICHTHYIDAE
Callichthys callichthys (Linnaeus, 1758)
Corydoras barbatus (Quoy e Gaimard, 1824)
SYNBRANCHIFORMES
SYNBRANCHIDAE
Synbranchus marmoratus Bloch, 1795
LORICARIIDAE
Hypostomus punctatus Valenciennes, 1840
Microlepidogaster notatus (Eigenmann e Eigenmann,
1889)
Neoplecostomus microps (Steindachner, 1876)
Otothyris lophophanes (Eigenmann e Eigenmann, 1889)
CICHLIDAE
Tilapia rendalli Boulenger, 1896
Geophagus brasiliensis (Quoy e
Gaimard, 1824)
GOBIIDAE
Awaous tajasica (Lichtenstein, 1822)
Parotocinclus maculicauda (Steindachner, 1877)
Schizolecis guntheri Britski e Garavello, 1984
Fonte: Bizerril, 1996; Bizerril e Araújo, 1993.
21
Releva mencionar a presença de duas espécies exóticas, introduzidas na bacia com fins diversos
e que atualmente, devido a plasticidade ambiental de ambas, mostram-se aclimatadas aos
biótopos locais. São elas o barrigudinho (Poecilia reticulata), uma espécie procedente das
Guianas, que durante muito tempo foi, equivocadamente, considerado eficiente larvófago, o que
conduziu a introdução da espécie com o intuito de controle de mosquitos em diversas partes do
País e a tilápia (Tilapia rendalli), uma espécie africana introduzida na região com o objetivo de
controlar macrófitas das lagoas e de servir como alimento à população. Foi relatado por um
pescador que o povoamento de tilápias se deu no governo de Carlos Lacerda, na Lagoa da
Tijuca.
Como reflexo das pequenas dimensões dos rios locais e da relativa homogeneidade ambiental
dos mesmos, verifica-se uma ictiofauna composta essencialmente por táxons de pequeno porte,
os quais representam 75% do total de espécies presentes (Figura 3.9).
30
27
25
20
15
9
10
5
0
0
Pequeno
Médio
G rande
Figura 3.9 – Número de espécies em cada classe de tamanho da ictiofauna presente nos
rios da baixada de Jacarepaguá, Rio de Janeiro, RJ
Sistemas fluviais sujeitos a um regime torrencial e a flutuações ambientais derivadas de eventos
estocásticos, como se observa na bacia em estudo, são marcados pela presença de espécies
com alta valência ecológica, quer seja às variações nas condições gerais do ecossistema, quer
seja na obtenção e uso de recursos tróficos (Payne, 1986; Lowe-McConnel, 1995).
Quanto ao primeiro aspecto, verifica-se o predomínio de espécies dotadas de alta ou media
tolerância às alterações ambientais (Figura 3.10). Destas, destacam-se a traíra (Hoplias
malabaricus), o morobá (Hoplerythrinus unitaeniatus), alguns lambaris (Hyphessobrycon
reticulatus, H. bifasciatus), o tamboatá (Callichthys callichthys), o bagre jundiá (Rhamdia sp.), o
cascudo (Hypostomus punctatus), a maior parte dos barrigudinhos (Poecilia vivipara, P. reticulata,
Phalloptychus januarius, Jenynsia multidentata), o mussum (Synbranchus marmoratus), a tilapia
(Tilapia rendalli) e a carauna (Geophagus brasiliensis).
No extremo oposto, observa-se a existência de espécies com baixa tolerância, representadas pelo
canivete (Characidium sp.), o bagre (Acentronichthys leptos), a cambeva (Trichomycterus sp.) e
dois pequenos cascudos (Neoplecostomus microps, Schizolecis guntheri) que, ocorrem
preferencialmente em áreas de corredeiras. Constituem por este motivo excelentes indicadores
biológicos.
22
20
17
15
13
10
6
5
0
Média
Alta
Baixa
Figura 3.10 – Número de espécies em cada categoria de tolerância ambiental
Quanto ao aspecto trófico, observa-se o predomínio de espécies omnívoras (Figura 3.11), padrão
esperado para sistemas fluviais (Payne, 1986). Nesta categoria estão diversos lambaris (Astyanax
spp., Deuterodon pedri, Hyphessobrycon spp.) o tamboatá (Callichthys callichthys), a tilapia (T.
rendalli) e os barrigudinhos (Poecilia spp., Phallopthychus januarius, Jenynsia multidentata,
Phalloceros caudimaculatus).
A segunda grande categoria trófica, a dos peixes iliófagos, reúne os cascudos (Loricariidae),
enquanto que peixes cuja dieta se baseia essencialmente na captura de invertebrados aquáticos
ou terrestres estão representados pelos canivetes (Characidium sp. C. interruptus), por alguns
bagres Pimelodidae (Acentronichthys leptos, Rhamdia sp., Pimelodella lateristriga), pelo limpafundo (Corydoras barbatus), pela cambeva (Trichomycterus sp.) e o peixe-flor (Awaous tajasica),
que capturam especialmente organismos bentônicos, além dos “barrigudinhos” (Rivulus
brasiliensis, R. janeiroensis, R. ocellatus) e do tetra azul (Mimagoniates microlepis).
Dentre os predadores de invertebrados, o tetra azul (Mimagoniates microlepis), ainda observado
em trechos sombreados de rios como o Camorim e o Paineira, diferencia-se por explorar recurso
alimentar essencialmente alóctone. Este aspecto torna a espécie fortemente dependente de
áreas ribeirinhas com matas que possa atuar como área fonte de alimento. Menezes et al. (1990),
apontam este taxon como particularmente sujeito à extinção em virtude da drástica redução das
formações florestais atlânticas.
Os predadores que se situam no topo da cadeia alimentar das ictiocenoses são as traíras
(Hoplias malabaricus) e os morobas (Hoplerythrinus unitaeniatus) que se concentram nos
remansos dos rios e no encontro destes sistemas com áreas brejosas.
23
13
14
12
10
6
8
5
6
4
2
2
0
Iliófago
Omnívoro
Predador de Invertebrados
Ictiófago
Figura 3.11 – Número de espécies por guilda trófica
Dos habitats disponíveis, os remansos concentram o maior número de espécies, seguindo-se, em
ordem decrescente, as corredeiras e os estuários (Figura 3.12).
30
27
25
20
15
10
7
5
2
0
Remansos
Corredeiras
Estuários
Figura 3.12 – Número de espécies por habitat preferencial
Nos trechos fluviais declivosos há espécies de peixes típicas, tais como os insetívoros
generalistas Trichomycterus sp. (cambevas), Characidium sp. (canivetes), Gymnotus pantherinus
(tuvira) e Corydoras barbatus (limpa-fundo), os algívoros e iliófagos Neoplecostomus microps,
Schizolecis guntheri (cascudos), e os omnívoros Phalloceros caudimaculatus, etc. (Bizerril e
Araújo, 1993).
24
Embora não se observe espécies endêmicas, pode-se afirmar que, de um modo geral, os grupos
presentes no alto curso dos rios são táxons com elevado grau de endemismo em termos locais,
visto que muitos, tais como Trichomycterus sp., N. microps, S. guntheri e Characidium sp.
apresentam distribuição restrita as partes superiores dos rios.
Nas áreas de remansos, embora se evidencie maior riqueza de espécies, há, concomitantemente,
o predomínio de grupos euritópicos que, por conseguinte, ocupam inúmeros biótopos na região.
Estes aspectos, bem exemplificados em Hoplias malabaricus (traíra), Poecilia vivipara,
Phallopthychus januarius, Jenynsia multidentata (barrigudinhos), Geophagus brasiliensis
(caraúna), dentre outros, contribuí para a perpetuação dos mesmos, inclusive em sistemas
fortemente antropizados.
Em unidades situadas na região entre o Rio-Centro e a localidade de Vargem Grande, onde o rio
Camorim (Figura 3.13) se destaca como
600.00
um importante representante desta
RIO C AM O RIM
categoria de sistemas fluviais que ainda
possui boas condições ao longo de todo
Represa do Camorim
seu curso, pode-se encontrar caranguejos
400.00
(Trichodactylus
sp.)
e
pitús
(Macrobrachium olfersi, Macrobracium
s)o
rt
e
potiuna, Macrobrachium ihering ) muito
m
(
ast
abundantes nestes locais.
o
C
200.00
Em seu alto curso, o rio Camorim
encontra-se
barrado
desde
1908,
formando uma represa de mesmo nome.
Nela e em seus tributários, pode-se
presenciar uma amostra expressiva da
ictiofauna
nativa
da
bacia
de
Jacarepaguá.
0.00
0.00
2000.00
4000.00
6000.00
8 000.00
1 0000.00
Extensão (metros)
Figura 3.13- Perfil longitudinal do rio Camorim
Assim, observa-se, no estrato nectônico
dos canais e nas margens da barragem,
cardumes de lambaris (Astyanax sp.1, Astyanax sp.2, Deuterodon pedri), muitas vezes
interrompidos por negros aglomerados de girinos de Hyla meridiana, muito comum no local. Em
meio a vegetação o pequeno crenuchideo Characidium interruptum divide o espaço com tuviras
(Gymnotus carapo, G. pantherinus) e cascudinhos (Parotocinclus maculicauda; Schizolecis
guntheri), enquanto o espaço demersal mostra-se colonizado por ciclídeos (Geophagus
brasiliensis; Tilapia rendalli) e bagres pimelodídeos (Rhamdia sp.), calictídeos (Corydoras
barbatus; Callichthys callichthys) e tricomicterídeos (Trichomycterus sp.).
Composições ictiofaunísticas diversificadas, como a verificada na bacia do Camorim, são
atualmente raras nos rios da bacia em tela, podendo ser ainda evidenciadas na bacia do Paineira,
(Fotos 3.2 e 3.3) embora este sistema venha sendo rapidamente alterado, especialmente pelo
lançamento de efluentes domésticos.
25
Foto 3.2– Detalhe do rio Paineira, em trecho de corredeiras
Foto 3.3 – Detalhe do rio Paineira, em trecho com remansos
26
A configuração predominante dos rios locais determina uma quebra no processo de adição de
espécies, que tanto caracteriza os ecossistemas fluviais, tendo em visto que as áreas usualmente
mais ricas em táxons (baixadas fluviais) encontram-se pouco representadas na região.
800.00
Uma exceção a este padrão de drenagem
pode ser observada no arroio Fundo
(principal contribuinte do rio Anil) (Figura
3.14), marcado por apresentar um trecho
fluvial de baixada mais ampla, aspecto este
que deveria se expressar em maior riqueza
ictiofaunística no local.
ARROIO FUNDO-ANIL
Cotas (metros)
600.00
400.00
200.00
Área com intensa ocupação urbana
0.00
0.00
4000.00
8000.00
12000.00
16000.00
20000.00
Extensão (metros)
Contudo, a presença de expressiva da
ocupação urbana ao longo de praticamente
toda a baixada fluvial deste rio, atua como
forte limitante ao pleno desenvolvimento da
biota aquática local, que se restringe aos
resistentes poecilídeos (Poecilia vivipara,
Phallopthychus
januarius,
Jenynsia
multidentata).
Figura 3.14- Perfil longitudinal do arroio
Fundo/Anil, destacando as áreas com intensa
Estudos desenvolvidos pela FEEMA (1989)
ocupação urbana
no alto curso do rio Grande, um importante
afluente do sistema Funil/Anil revelou um quadro distinto do observado na baixada. No local, a
presença de uma grande quantidade de organismos sensíveis a poluição como a cambeva
(Trichomycterus sp.), diversos invertebrados (i.e., Mortiella sp., Atopsyche sp., Triplectides sp.,
Smicridea sp., Helicopsyche sp., Phylloicus sp., Rheatanytarsus sp., Psephenus sp, Ambrysus
sp., Progomphus sp., Zonophora sp., Anacroneuria sp., Baetis sp., Hermanella sp., Notonectidae,
Leptoceridae, Macrobrachium sp., Tricodactylus sp., dentre outros) e algas (Chantrancia sp.,
Hildebrandia rivularis) permitiram classificar a área como não poluída. Este quadro sofre gradual
deterioração para jusante até a estrada dos Mananciais, que comportam uma biocenose típica de
uma situação extremamente poluída, onde o barrigudinho (Poecilia reticulata), bactérias como
Spherotilus natans e invertebrados como Aylacostoma sp. e Chironomus thumni, mostram-se
dominantes.
27
Sistemas fluviais situados na face interna da
RJ-071 fluem por terrenos brejosos, onde o
solo, rico em compostos húmicos, confere
coloração amarronzada a suas águas.
Densos aglomerados de macrófitas podem
ser observados no local, destacando-se a
taboa (Typha domingensis) e a baronesa
(Eichornia crassipes) como os elementos
mais marcantes na paisagem local.
800.00
Cotas (metros)
600.00
400.00
200.00
0.00
0.00
4000.00
8000.00
12000.00
16000.00
Extensão (metros)
Figura 3.15- Perfil longitudinal do rio Paineira
e do Canal de Sernambetida, RJ
Nestes sistemas, onde o Canal da
Sernambetiba (Figura 3.15, juntamente com
o rio Paineira), o rio Portela e o rio Marinho
podem ser tomados como exemplos, podese observar pequenos peixes, notamente os
barrigudinhos (Phalloceros caudimaculatus,
Poecilia vivipara, Phallopthychus januarius,
Jenynsia lineata) e lambaris (especialmente
Hyphessobrycon bifasciatus, H. reticulatus e
Astyanax sp.), abundantes nestas águas.
Peixes igualmente comuns são as ictiófagas traíras (Hoplias malabaricus), os iliófagos cascudos
(Hypostomus punctatus) e os ciclídeos (Geophagus brasiliensis e Tilapia renadalli) e as
eurihalinas taínhas (Mugil lisa) e paratis (Mugil curema) as quais, juntamente com os raros
robalos (Centropomus parallelus), são pescados tanto nos canais como nas lagoas.
Uma situação característica é a apresentada pelos canais que cortam a baixada em sua porção
mais interna (Canais do Cortado e sistemas associados) , todos fortemente eutrofizados, como
pode ser constatado pela densa cobertura de macrófitos flutuantes, dentre os quais a baronesa
(Eichornia crassipes e E. azurea) que mostra-se a espécie dominante (Foto 3.4).
Nestes sistemas, a vegetação, embora constitua um eficiente filtro biológico que retêm diversos
poluentes, especialmente metais pesados (Kissmann, 1991), pode gerar impactos diversos sobre
os biótopos locais. Kissmann (op cit) destaca os seguintes:
−
Diminui o fluxo de água em canais e rios;
−
Aumenta a evaporação de 3 a 7 vezes a razão normal, gerando perda substâncial de água;
−
Ao impedir a penetração de luz reduz a eficiência fotossintética de vegetais imersos e, com
isso, diminui a liberação de oxigênio, gerando asfixia na biota aquática;
−
Atuam como viveiros de vetores de patogenias diversas;
28
Foto 3.4 – Detalhe da densa cobertura de Eichornia crassipes no canal do Cortado.
Estes aspectos, associados à poluição das águas, determinam a sobrevivência de uma ictiofauna
pouco diversificada, dominada por espécies generalistas como os barrigudinhos (Poecilia vivipara,
Phalopthychus januarius), carúnas (Geophagus brasiliensis) e tilápias (Tilapia rendalli). Nas
porções mais rasas e sem cobertura vegetal, podem ser evidenciados cardumes de lambaris
(Hyphessobrycon bifasciatus e H. reticulatus). Este conjunto de peixes está associado a uma
fauna de invertebrados na qual o pitu (Palaemon pandaliformis), percevejos d’água
(Belostomidae) e outros Hemiptera (i.e., Nepidae, Gerridae, Notonectidae), coleópetos
(Hydrophilidae) e odonatas (Libellulidae, Coenagrionidae e Aeshinidae), mostram-se freqüentes.
Em uma análise geral da ictiofauna atualmente observada nas bacias hidrográficas da região,
foram efetuadas comparações em um total de 17 sistemas hidrográficos. Os canais artificiais do
Cortado e unidades anexas, caracterizados acima, e o canal de Sernambetiba, por apresentar
condições fortemente estuarinas, foram excluídos da avaliação. Os demais sistemas foram
confrontados com base na ictiofauna presente nas proximidades da Estrada dos Bandeirantes,
visto ser o local onde se concentrarão, na maioria dos casos as obras previstas.
Comparando a ictiofauna atualmente presente nestes sistemas, observa-se a formação de dois
grandes complexos ecológicos, representando sistemas dotados de maior diversidade biológica
(Complexo Camorim/Paineiras) fracamente relacionados5 com o segundo grupamento (Figura
3.16).
Embora tais sistemas mantenham uma ictiofauna mais diversificada, a situação dos mesmos na
área de estudo, não é de total integridade. Para o rio Camorim, os estudos da FEEMA (1989),
5 Percentual de Discordância superior a 70%
29
0.9
0.8
0.7
0.6
0.5
0.4
0.3
0.2
0.1
0
PAINEIRAS
CAMORIM
SB1
CACHOEIRA
PEDRAS
SB2
SB3
SB4
SB5
VARGEM PEQUENA
CALEMBE
SB6
PAVUNA
ANIL
BARRA
PASSARINHO
0.89
0.79
0.69
0.59
0.49
0.39
0.29
0.19
0.09
-0.01
CACEMBÉ
revelaram que, na área em estudo, os sistema pode ser classificado como moderadamente
contaminado e poluído. Próximo ao Riocentro, contudo, a biota mostra-se pobre, constituída de
grandes quantidades de Aylacostoma sp., um molusco tolerante à poluição, e da resistente
Poecilia reticulata.
Figura 3.16 – Agrupamento das bacias estudadas com base na similaridade ictiofaunística
A segunda unidade formada apresenta, por sua vez, três subunidades, representando sistemas
que ainda mantém um número mais elevado de representantes da fauna íctica local (complexos
Cacembé/Passarinho e Pedras/Cachoeira/Sb1).
Destes, o rio Cachoeira, que nasce na Floresta da Tijuca, se destaca por apresentar no seu curso
superior, uma fauna mais diversificada do que a exibida pela região enfocada, contudo, as
condições gerais que classificam o ambiente como poluído (FEEMA, 1989), se perpetuam ao
longo do perfil longitudinal à exceção da área próxima ao Açude da Solidão, onde a presença de
Trichodactylus fluviatilis, Macrobrachium ihering, larvas de diversos insetos sensíveis
(Gomphidae, Hidroptilidae, dentre outos) denotam melhor qualidade ambiental.
Os demais sistemas, que correspondem a 58%, das bacias estudadas assemelham-se por
exibirem um arranjo íctico fortemente depauperado, composto apenas por grupos euritópicos
como os barrigudinhos (Poecilia vivipara, Jenynsia multidentata, Phallopthychus januarius) e
acará (Geophagus brasiliensis), concentrados em pontos comparativamente menos impactados.
Estes dados, quando aplicados em uma análise de bioindicação, ilustram a baixa capacidade de
suporte dos sistemas em questão.
Comparando o arranjo gerado com o apresentado na análise de inferência histórica evidencia-se
forte distanciamento do quadro naturalmente esperado na região para o atualmente verificado, o
que denota a alteração nas características gerais dos sistemas fluviais da região.
Esta conclusão é reforçada pela forte congruência entre o arranjo gerado com o produzido a partir
da análise de qualidade ambiental (Figura 3.17), o que reflete as limitações impostas pelos
impactos antrópicos sobre a distribuição atual da ictiofauna e, provavelmente, de outros
integrantes da biota fluvial.
30
0.25
0.24
0.2
0.19
Regular
0.15
0.14
Péssimas
Críticas
Ruíns
PAINEIRAS
SB2
CAMORIM
SB1
CACHOEIRA
PEDRAS
SB3
VARGEM PEQUENA
SB6
PASSARINHO
BARRA
SB4
0
SB5
-0.01
CALEMBE
0.05
CACEMBÉ
0.04
PAVUNA
0.1
ANIL
0.09
Figura 3.17 – Classificação dos ambientes estudados com base na qualidade ambiental
Conjugando os dados reunidos, tem-se como áreas de maior impedimento à realização de
processos de dragagem os rios Paineiras e Camorim. Tais unidades, por representarem
importantes bolsões de biodiversidade são ainda os sistemas que devem receber prioridade
quando da implantação, ao nível de projeto básico, de medidas de recuperação ambiental.
De forma similar, rios como o Anil, atualmente fortemente impactado, e a bacia SB1, mantém
condições de heterogeneidade que as viabiliza, após a adoção de programa intensivo de
reestruturação dos habitats e da qualidade da água, a manter inúmeras espécies, cujas unidades
fontes localizam-se em trechos não impactados (i.e., alto curso do rio Grande), nos sistemas
lagunares e , no caso específico de SB1, no canal de Sernambetiba.
Sistemas que, sob o aspecto biótico, exibem baixa sensibilidade a tais intervenções são rios Anil,
pavuna, Cacembé, Calembé, da Barra, Passarinho, Vargem pequena e as bacias SB3, SB1, SB5,
SB4 e SB6. Os rios da Pedra, Cachoeira, e a bacia SB1, mostram sensibilidade intermediária.
3.2.5 Ecossistemas Lagunares e Biota Associada
Ecossistemas lênticos litorâneos (lagos costeiros e lagunas) representam 15% da zona costeira
mundial, sendo particularmente abundantes na costa brasileira (Barroso, 1989). Dentre os
Estados do território nacional, o Rio de Janeiro é, depois do Rio Grande do Sul, o mais dotado de
corpos costeiros com características lênticas, mantendo mais de 50 no espaço entre a Ilha
Grande e a Baixada Campista (Amador, 1986).
Como reportado por Barroso (1989), as formações lagunares fluminenses consistem em
excelentes exemplos das sequências sedimentares transgressivas e regressivas do nível do mar.
Assim, enquanto o litoral norte fluminense exibe uma estrutura que revela a importância do rio
Paraíba do Sul na formação da costa durante o Quaternário, como pode ser evidenciado pela
sucessão de cristas arenosas e cavas associadas ao longo de uma extensa planície, a costa leste
fluminense é caracterizada pela presença de sequências sedimentares transgressivas, onde se
originaram lagoas em função do desenvolvimento de cordões arenosos consituídos por um corpo
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