Mortalidade em Cirurgias Cardíacas em Hospital Terciário do Sul do

Propaganda
200
Internacional Journal of Cardiovascular Sciences. 2015;28(3):200-205
ARTIGO ORIGINAL
Mortalidade em Cirurgias Cardíacas em Hospital Terciário do Sul do Brasil
Mortality in Cardiac Surgeries in a Tertiary Care Hospital of South Brazil
Guilherme Maia Monteiro1, Daniel Medeiros Moreira1,2,3
Instituto de Cardiologia de Santa Catarina – São José, SC – Brasil
Instituto de Cardiologia do Rio Grande do Sul – Porto Alegre, RS – Brasil
3
Universidade do Sul de Santa Catarina – Palhoça, SC – Brasil
1
2
Resumo
Fundamentos: A prevalência de doenças cardiovasculares é muito alta e cirurgias cardíacas são comuns em centros
terciários de atenção cardiovascular.
Objetivo: Avaliar a mortalidade cirúrgica e comparar com a mortalidade esperada pelo EuroSCORE em pacientes
de centro terciário de atenção cardiovascular.
Métodos: Trata-se de coorte histórica que avaliou pacientes submetidos a cirurgias cardíacas em 2011 e 2012, em
hospital terciário de referência em cardiologia no sul do Brasil. O desfecho principal foi a mortalidade por qualquer
causa durante a internação hospitalar. Os desfechos secundários foram a mortalidade de acordo com o procedimento
cirúrgico, o EuroSCORE total e de acordo com o procedimento, a mortalidade ajustada por EuroSCORE e o perfil
de risco dos pacientes.
Resultados: Foram incluídos 364 pacientes. Cirurgia de revascularização do miocárdio (CRM) isolada foi o
procedimento realizado em 59,9% dos pacientes, o procedimento valvar (PV) isolado (troca ou plastia valvar) em
33,0% e a CRM + PV em 7,1% dos pacientes. A mortalidade observada foi 14,2%, sendo 5,2% nas primeiras
24 horas. A mortalidade esperada pelo EuroSCORE, por sua vez, foi 5,7±7,4%. A mortalidade ajustada foi, assim,
2,5 vezes superior à esperada, mas dentro do intervalo de dois desvios-padrão da mortalidade esperada.
A mortalidade associada aos procedimentos combinados, entretanto, foi 5,2 vezes superior a do EuroSCORE
esperado e superior ao intervalo de dois desvios-padrão do EuroSCORE.
Conclusão: Pacientes submetidos à cirurgia cardíaca no centro estudado apresentaram mortalidade superior à
esperada, em especial aqueles submetidos a procedimentos combinados.
Palavras-chave: Cirurgia torácica; Revascularização miocárdica; Implante de prótese de valva cardíaca
Abstract (Full texts in English - www.onlineijcs.org)
Background: The prevalence of cardiovascular diseases is very high and cardiac surgeries are common in tertiary centers for
cardiovascular care.
Objective: Evaluate the surgical mortality and compare the mortality level expected by EuroSCORE in patients from tertiary
centers for cardiovascular care.
Methods: Historical cohort study evaluating patients who have undergone cardiac surgeries in 2011 and 2012, at a renowned
tertiary cardiology hospital in southern Brazil. The primary outcome was all-cause mortality during hospitalization. Secondary
outcomes were surgery-related mortality, total and procedure-related EuroSCOREs, the adjusted mortality rate by EuroSCORE
and the risk profile of patients.
Results: The study comprised 364 patients. Coronary artery bypass graft (CABG) surgery alone was the procedure performed in
59.9% of patients, followed by the valve procedure (VP) (valve replacement or repair) in 33.0%, and CABG + VP in 7.1% of patients.
The mortality rate was 14.2%, with 5.2% in the first 24 hours. The mortality rate expected by EuroSCORE, in turn, was
5.7 ± 7.4%. The adjusted mortality rate was thus 2.5 times higher than the expected, however within the range of two standard
deviations of the expected mortality rate. Mortality associated with combined procedures, however, was 5.2 times higher than the
EuroSCORE expected, and higher than the range of two standard deviations of EuroSCORE.
Conclusion: Patients undergoing cardiac surgery at the center under study showed higher mortality than the expected rate, especially
those undergoing combined procedures.
Keywords: Thoracic surgery; Myocardial revascularization; Heart valve prosthesis implantation
Correspondência: Daniel Medeiros Moreira
Rua Adolfo Donato da Silva, s/n - Praia Comprida – 88103-901 – São José, SC – Brasil
E-mail: [email protected]
DOI: 10.5935/2359-4802.20150029
Artigo recebido em 26/02/2015, aceito em 26/04/2015, revisado em 28/04/2015.
Int J Cardiovasc Sci. 2015;28(3):200-205
Artigo Original
Introdução
As doenças cardiovasculares englobam uma variedade
de doenças, com alta prevalência e mortalidade.
Estatísticas norte-americanas apontam que 1:3 pessoas
apresenta algum tipo de doença cardiovascular e estas
ocorreram em 31,3% de todas as mortes no ano de 20111.
A alta prevalência impõe procedimentos terapêuticos
como a cirurgia de revascularização do miocárdio (CRM)
ou de procedimento valvar (PV) como troca ou plastia
valvar, que são bastante comuns em centros terciários de
atenção cardiovascular. Em 2010, 7 milhões de norteamericanos foram submetidos a alguma cirurgia cardíaca,
número inferior apenas aos procedimentos obstétricos1.
Dados sobre a mortalidade em cirurgias cardíacas variam
bastante de acordo com o centro, o volume de cirurgias e o
tipo de procedimento: em cirurgias de revascularização
miocárdica, a mortalidade média pode ser de apenas 0,7%
em centros norte-americanos, enquanto a cirurgia de
revascularização associada a algum procedimento valvar
pode alcançar 20,8% em alguns centros brasileiros2-4.
A enorme variabilidade na mortalidade e na incidência
de complicações motivou o desenvolvimento de escores
prognósticos pré-operatórios, como o EuroSCORE e o da
Society of Thoracic Surgeons Scores (STS)5-7. Apesar de
inúmeros escores disponíveis na literatura, o EuroSCORE
parece apresentar o melhor valor preditivo, além da
facilidade para ser calculado8.
De forma anacrônica ao que ocorre em outros centros no
mundo, contudo, existe uma carência de avaliação de
centros terciários brasileiros que realizam cirurgias
cardíacas: a adequada avaliação possibilitaria um
aumento na qualidade do registro dos dados e na redução
dos índices de complicação trans e pós-operatória9.
Assim, o objetivo deste estudo foi o de analisar os
procedimentos cirúrgicos realizados em centro terciário
de referência em atenção cardiovascular, avaliar as taxas
de mortalidade cirúrgica e compará-las ao EuroSCORE
pré-operatório.
Métodos
Trata-se de uma coorte histórica que avaliou todos os
pacientes submetidos à CRM e/ou PV e utilizou como
base o banco de dados do serviço de Cirurgia Cardíaca,
no período de janeiro de 2011 a dezembro de 2012, de
hospital que é referência em cardiologia no sul do Brasil.
Dados epidemiológicos adicionais foram obtidos no
prontuário eletrônico dos pacientes, bem como registros
manuais gerados na Unidade Coronariana, Enfermaria,
setor de Hemodinâmica, Ambulatório e setor de
Ecocardiografia.
Monteiro e Moreira
Mortalidade na Cirurgia Cardíaca
201
O hospital atende a pacientes exclusivamente pelo
Sistema Único de Saúde. Trata-se de um serviço de
referência no Estado, com um serviço de Cirurgia
Cardíaca onde atuam cirurgiões cardíacos devidamente
capacitados em serviços autorizados de residência
médica, com volume médio de 20 cirurgias maiores
(como cirurgia de revascularização do miocárdio e troca
valvar) por mês, e em média quatro cirurgias maiores
por cirurgião. A unidade de terapia intensiva pósoperatória tem 10 leitos. O hospital conta ainda com o
Programa de residência médica em Cardiologia, Cirurgia
Cardíaca e Cirurgia Vascular.
O desfecho principal avaliado pelo estudo foi a
mortalidade, definida como morte por qualquer causa
durante ou após o procedimento e durante a internação
hospitalar. Os desfechos secundários
foram a mortalidade de acordo com o
ABREVIATURAS E
tipo de procedimento cirúrgico
ACRÔNIMOS
realizado, o EuroSCORE médio total e
de acordo com o procedimento, a
•CRM – cirurgia de
revascularização do
mortalidade ajustada por EuroSCORE
miocárdio
(definida pelo quociente entre a
•DAC – doença arterial
mortalidade observada e a esperada
coronariana
pelo EuroSCORE) total e de acordo com
•DAP – doença arterial
o procedimento, além do perfil de risco
periférica
dos pacientes5,10.
•DLP – dislipidemia
Cada um dos registros de cirurgia foi
•DM – diabetes mellitus
avaliado quanto ao tipo de cirurgia
•DPOC – doença pulmonar
realizada, caráter da cirurgia (eletiva,
obstrutiva crônica
urgência ou emergência), motivo da
•FE – fração de ejeção
internação, dias de internação e
•HAP – hipertensão arterial
mortalidade intra-hospitalar. Um
pulmonar
pesquisador treinado realizou o cálculo
•HAS
– hipertensão arterial
do EuroSCORE para cada paciente,
sistêmica
independentemente da presença do
•IAM – infarto agudo do
valor prévio em prontuário. Foram
miocárdio
considerados ainda: idade, sexo, lesões
•PV – procedimento valvar
coronarianas à angiografia, intervenções
coronarianas percutâneas, presença de
•STS – Society of Thoracic
Surgeons Scores
hipertensão arterial sistêmica (HAS),
diabetes mellitus (DM), insuficiência
renal, dislipidemia (DLP), história
familiar de doença arterial coronariana (DAC), doença
arterial periférica (DAP), doença neurológica, insuficiência
cardíaca, tabagismo, doença pulmonar obstrutiva crônica
(DPOC), fração de ejeção (FE) avaliada por ecocardiograma,
hipertensão arterial pulmonar (HAP) e tipo de lesão
valvar, cirurgia há menos de três meses de infarto agudo
do miocárdio (IAM), cirurgia em vigência de angina
instável, choque cardiogênico ou endocardite infecciosa.
Para análise foi utilizado o software SPSS 13.0 for
windows. Variáveis contínuas foram analisadas pelo teste
t de Student para amostras independentes e expressas
como média±desvio-padrão ou pela análise da variância
(ANOVA) com post hoc de Bonferroni, quando apropriado.
Variáveis categóricas foram analisadas pelo teste exato
202
Monteiro e Moreira
Mortalidade na Cirurgia Cardíaca
de Fisher e expressas em frequências. Foram considerados
significativos valores de p<0,05.
O trabalho respeitou a Resolução CNS nº 466/2012 e a
Declaração de Helsinki, tendo sido aprovado pelo Comitê de
Ética em Pesquisa da instituição sob o nº 13546113.2.0000.0113.
Int J Cardiovasc Sci. 2015;28(3):200-205
Artigo Original
Resultados
Foram estudados 364 pacientes, com média de idade
60,6±11,7 anos, maioria de homens (64,3%). Outras
características epidemiológicas dos pacientes estão
apresentadas na Tabela 1.
Tabela 1
Características epidemiológicas da população estudada segundo o tipo de procedimento
Pacientes – n (%)
Total
CRM
PV
CRM + PV
364 (100,0)
218 (59,9)
120 (33,3)
26 (7,1)
Idade (anos) - média±DP
60,5±11,7
61,3±9,2
59,2±15,0
60,7±13,5
Sexo masculino – n (%)
234 (64,3)
149 (68,3)
69 (57,5)
16 (61,5)
HAS – n (%)
285 (79,2)
189 (87,5)
75 (63,6)
21 (80,8)
Dislipidemia – n (%)
196 (54,4)
146 (67,6)
37 (31,4)
13 (50,0)
DM – n (%)
105 (28,8)
83 (38,4)
18 (15,3)
4 (15,4)
História familiar para DAC – n (%)
105 (28,8)
83 (38,4)
13 (11,0)
9 (34,6)
Tabagismo – n (%)
74 (20,3)
60 (27,5)
11 (9,2)
3 (11,5)
DPOC – n (%)
25 (6,9)
14 (6,5)
10 (8,5)
1 (3,8)
Doença arterial periférica – n (%)
39 (10,7)
30 (13,9)
7 (6,0)
2 (7,7)
Hipertensão pulmonar (PSAP >60) – n (%)
16 (4,4)
3 (1,4)
13 (10,8)
0 (0,0)
Insuficiência renal crônica – n (%)
18 (4,9)
9 (4,1)
6 (5,0)
3 (11,5)
Endocardite – n (%)
20 (5,5)
0 (0,0)
12 (10,2)
2 (7,7)
Cirurgia cardíaca prévia – n (%)
39 (10,7)
3 (1,4)
33 (27,5)
3 (11,5)
Doença neurológica – n (%)
23 (6,3)
20 (9,2)
3 (2,5)
0 (0,0)
Estado crítico pré-operatório – n (%)
10 (2,7)
1 (0,5)
7 (5,8)
2 (7,7)
Angina classe CCS IV – n (%)
11 (3,0)
10 (4,6)
1 (0,8)
0 (0,0)
Infarto recente – n (%)
97 (26,9)
91 (42,1)
2 (1,7)
4 (415,4)
Cirurgia de urgência – n (%)
20 (5,6)
10 (4,6)
8 (6,8)
2 (7,7)
Território de CD – n (%)
188 (51,6)
167 (77,3)
8 (8,7)
13 (54,2)
Território de DA – n (%)
219 (60,2)
191 (88,4)
11 (12,0)
17 (70,8)
Território de Cx – n (%)
165 (45,3)
148 (68,5)
7 (7,6)
10 (41,7)
TCE – n (%)
68 (18,7)
62 (28,7)
2 (2,2)
4 (16,7)
7 (1,9)
3 (1,4)
2 (2,2)
2 (8,4)
57,7±14,3
58,2±13,6
57,5±15,0
57,7±14,4
Fatores de risco para DAC
Comorbidades
Lesões coronarianas
Lesão em enxerto – n (%)
FEVE (%) média±DP
CCS – Sociedade Canadense de Cardiologia; DAC – doença arterial coronariana; CRM – cirurgia de revascularização do miocárdio;
HAS – hipertensão arterial sistêmica; DM – diabetes mellitus; DPOC – doença pulmonar obstrutiva crônica; PSAP – pressão sistólica
artéria pulmonar; PV – procedimento valvar; CD – coronária direita; DA – descendente anterior; Cx – circunflexa; TCE – tronco coronária
esquerda; FEVE – fração de ejeção do ventrículo esquerdo; DP – desvio-padrão
Int J Cardiovasc Sci. 2015;28(3):200-205
Artigo Original
Monteiro e Moreira
Mortalidade na Cirurgia Cardíaca
A principal indicação para internação hospitalar dos
pacientes estudados foi angina instável ou IAM sem
supradesnível do segmento ST (53,0%), seguindo-se lesões
valvares (31,3%), IAM com supradesnível do segmento
ST (6,9%), endocardite (5,5%) e outras causas (3,0%).
Os pacientes aguardaram média de 38,1±25,9 dias até a
cirurgia, com tempo total de permanência no hospital de
53,5±32,9 dias. Não houve associação entre a mortalidade
e o número de dias de hospitalização até o procedimento
(32,6±23,1 dias nos pacientes que morreram e 38,8±26,3 dias
naqueles que tiveram alta, p=0,11) ou no tempo total de
internação (55,3±45,9 dias nos pacientes que morreram e
53,1±30,5 dias naqueles que tiveram alta, p=0,74).
Os procedimentos realizados foram: CRM isolada
(59,9%), procedimento valvar isolado (troca ou plastia
valvar) (33,0%) e CRM + PV (7,1%).
A mortalidade intra-hospitalar observada foi 52 (14,2%)
pacientes, dos quais 19 (5,2%) foram a óbito nas primeiras
24 horas. A mortalidade esperada pelo EuroSCORE
logístico, por sua vez, foi 5,7±7,4% (EuroSCORE médio
aditivo de 4,5±2,9). A mortalidade ajustada foi, assim,
2,5 vezes superior à esperada, mas dentro do intervalo de
dois desvios-padrão da mortalidade esperada (Figura 1).
A mortalidade e o EuroSCORE de acordo com o
procedimento cirúrgico são apresentados na Tabela 2.
Na população estudada, os procedimentos valvares
apresentaram escore de risco mais elevado, contudo a
mortalidade observada foi maior no grupo que realizou
procedimentos combinados (CRM + PV). O procedimento
combinado mostrou ainda uma mortalidade ajustada
acima de dois desvios-padrão da mortalidade esperada
(Figura 1).
Figura 1
Mortalidade encontrada por procedimento, de acordo com desvios-padrão da mortalidade esperada
CRM – cirurgia de revascularização do miocárdio; PV – procedimento valvar
Tabela 2
Mortalidade por tipo de cirurgia realizada
Cirurgia
Total
p
8,1±8,8‡
5,7±7,3
<0,001
24 (18,3)
11 (42,3)
52 (14,2)
<0,001
2,2
5,2
2,5
CRM
PV
CRM + PV
EuroSCORE (média±DP)
3,9±4,7
8,5±9,7†
Mortalidade observada – n (%)
17 (8,3)
2,1
Mortalidade ajustada
† p<0,001 comparado à CRM; ‡p<0,05 comparado à CRM
CRM – cirurgia de revascularização do miocárdio; PV – procedimento valvar; DP – desvio-padrão
203
204
Monteiro e Moreira
Mortalidade na Cirurgia Cardíaca
Discussão
Este estudo apresenta importantes dados sobre as
cirurgias cardíacas realizadas em centro de referência em
Cardiologia no sul do Brasil, demonstrando alta
mortalidade cirúrgica, particularmente entre os pacientes
submetidos a procedimentos combinados cuja
mortalidade ajustada foi 5,2 vezes superior à esperada,
superior a dois desvios-padrão da mortalidade esperada.
A taxa de mortalidade encontrada foi superior à de outros
centros brasileiros: dados do Instituto Dante Pazzanese
de Cardiologia apontam para uma mortalidade total em
cirurgias cardíacas de 5,9%, sendo que a mortalidade em
procedimentos de primeira troca valvar é de 4,3%, em
seguimento médio de 10 anos11,12. Dados nacionais e
internacionais apontam, contudo, taxas de mortalidade
bastante diferentes entre os centros, variando de 5,77%
a 20,8% quando CRM + PV2-4,13-15.
A mortalidade ajustada total, bem como a mortalidade
na CRM ou PV foram superiores à esperada, mas ainda
dentro do intervalo de dois desvios-padrão, como
descrito para o atendimento público em outros centros
do mundo 10 . A mortalidade em procedimentos
combinados, contudo, mostra índices bastante superiores
à margem de dois desvios-padrão da mortalidade
esperada: estes valores não encontraram semelhança em
outros dados da literatura e tornaram proibitiva a
realização de procedimentos combinados (CRM + PV)
até que medidas adequadas fossem tomadas.
Diferentes justificativas poderiam explicar as taxas mais
elevadas encontradas, como a deficiência técnica de
componentes da equipe ou a participação de residentes
em formação nos procedimentos, já que a curva de
aprendizagem poderia comprometer a qualidade da
cirurgia. Além disso, os pacientes apresentaram em
média um longo período de permanência até o
procedimento, que possibilitaria a colonização com
germes hospitalares no período pré-operatório: o tempo
de espera médio superior a um mês é bastante elevado
se comparado a outros dados da literatura nacional;
outros estudos já apontaram o tempo de espera pelo
procedimento como um dos fatores para maior
mortalidade entre os pacientes atendidos pelo sistema
Int J Cardiovasc Sci. 2015;28(3):200-205
Artigo Original
público 13,16,17 . Cabe ressaltar que apesar da longa
permanência, não foram observadas diferenças
significativas na média de dias de internação até o
procedimento entre os pacientes que apresentaram morte
intra-hospitalar.
Este estudo apresenta algumas limitações: trata-se de
estudo de coorte retrospectiva e, como tal, falhas nos
registros dos bancos de dados poderiam comprometer a
análise. Apesar de não comprometer as conclusões,
ressalta-se que não houve avaliações estatísticas
específicas como regressão logística para promover ajuste
a potenciais confundidores. Além disso, não foi possível
identificar a causa imediata da morte de cada um dos
pacientes e o estudo não permitiu avaliar causas não
cardíacas de mortalidade pós-operatória, como infecção
hospitalar.
Conclusão
Os pacientes submetidos à cirurgia cardíaca no centro
estudado apresentaram mortalidade superior à esperada,
em especial pacientes submetidos a procedimentos
combinados.
Tendo em vista a importância do feedback para maior
qualidade nos procedimentos e para segurança dos
pacientes, a chefia do setor de Cirurgia Cardíaca foi
oficialmente comunicada, bem como a Direção do
hospital e o Comitê de Ética em Pesquisa da instituição9.
Após a divulgação interna dos dados, foi instituída uma
comissão de avaliação dos óbitos para apontar as causas
da alta taxa de mortalidade e de potenciais falhas no
atendimento.
Potencial Conflito de Interesses
Declaro não haver conflitos de interesses pertinentes.
Fontes de Financiamento
O presente estudo não teve fontes de financiamento externas.
Vinculação Acadêmica
Este artigo representa parte do Trabalho de Conclusão de Curso
(TCC) em Residência Médica em Cardiologia de Guilherme
Maia Monteiro, pelo Instituto de Cardiologia de Santa Catarina.
Int J Cardiovasc Sci. 2015;28(3):200-205
Artigo Original
Monteiro e Moreira
Mortalidade na Cirurgia Cardíaca
Referências
1.
2.
3.
4.
5.
6.
7.
8.
9.
Mozaffarian D, Benjamin EJ, Go AS, Arnett DK, Blaha MJ,
Cushman M, et al; American Heart Association Statistics
Committee and Stroke Statistics Subcommittee. Heart disease
and stroke statistics - 2015 update: a report from the American
Heart Association. Circulation. 2015;131(4):e29-322.
Tatoulis J, Buxton BF, Fuller JA, Royse AG. Total arterial coronary
revascularization: techniques and results in 3,220 patients.
Ann Thorac Surg. 1999;68(6):2093-9.
Hannan EL, Racz MJ, Jones RH, Gold JP, Ryan TJ, Hafner J-P,
et al. Predictors of mortality for patients undergoing cardiac
valve replacements in New York State. Ann Thorac Surg.
2000;70(4):1212-8.
Bueno RM, Ávila Neto V, Melo RFA. Fatores de risco em
operações valvares: análise de 412 casos. Rev Bras Cir Cardiovasc.
1997;12(4):348-58.
Roques F, Nashef SA, Michel P, Gauducheau E, de Vincentiis C,
Baudet E, et al. Risk factors and outcome in European cardiac
surgery: analysis of the EuroSCORE multinational database of
19030 patients. Eur J Cardiothorac Surg. 1999;15(6):816-22.
Higgins TL, Estafanous FG, Loop FD, Beck GJ, Blum JM,
Paranandi L. Stratification of morbidity and mortality outcome
by preoperative risk factors in coronary artery bypass patients.
A clinical severity score. JAMA. 1992;267(17):2344-8. Erratum
in: JAMA.1992;268(14):1860.
Hattler BG, Madia C, Johnson C, Armitage JM, Hardesty RL,
Kormos RL, et al. Risk stratification using the Society of Thoracic
Surgeons Program. Ann Thorac Surg. 1994;58(5):1348-52.
Geissler HJ, Hölzl P, Marohl S, Kuhn-Régnier F, Mehlhorn U,
Südkamp M, et al. Risk stratification in heart surgery:
comparison of six score systems. Eur J Cardiothorac Surg.
2000;17(4):400-6.
Fine LG, Keogh BE, Cretin S, Orlando M, Gould MM;
UK Cardiac Surgery Experience. How to evaluate and improve
the quality and credibility of an outcomes database: validation
10.
11.
12.
13.
14.
15.
16.
17.
and feedback study on the UK Cardiac Surgery Experience.
BMJ. 2003;326(7379):25-8.
Ribera A, Ferreira-González I, Cascant P, Pons JM, PermanyerMiralda G. [Evaluation of risk-adjusted hospital mortality after
coronary artery bypass graft surgery in the Catalan Public
Healthcare System. Influence of hospital management type
(ARCA Study)]. Rev Esp Cardiol. 2006;59(5):431-40.
Bianco ACM, Timerman A, Paes AT, Gun C, Ramos RF,
Freire RBP, et al. Análise prospectiva de risco em pacientes
submetidos à cirurgia de revascularização miocárdica.
Arq Bras Cardiol. 2005;85(4):254-61.
Ribeiro FFF, Arruda GDS, Ptak DM, Menezes FR, Torrico
MAO, Oliveira Ramos AI. Seguimento pós-operatório em
longo prazo de pacientes submetidos à cirurgia valvar.
Rev Bras Cardiol. 2013;26(2):112-9.
Piegas LS, Bittar OJNV, Haddad N. Cirurgia de revascularização
miocárdica: resultados do Sistema Único de Saúde. Arq Bras
Cardiol. 2009;93(5):555-60.
Oliveira TML, Oliveira GMM, Klein CH, Souza e Silva NA,
Godoy PH. Letalidade e complicações da cirurgia de
revascularização miocárdica no Rio de Janeiro, de 1999 a 2003.
Arq Bras Cardiol. 2010;95(3):303-12.
Ramos ARW, Flores MB, Libonati RMF, Quaresma JAS,
Carneiro SR. Preditores de mortalidade na cirurgia de
revascularização do miocárdio. Rev Bras Cardiol.
2013;26(3):193-9.
Mesquita ET, Ribeiro A, Araújo MP, Campos LAA,
Fernandes MA, Colafranceschi AS, et al. Indicadores de
qualidade assistencial na cirurgia de revascularização
miocárdica isolada em centro cardiológico terciário. Arq Bras
Cardiol. 2008;90(5):350-4.
Almeida FF, Barreto SM, Couto BRGM, Starling CEF. Fatores
preditores da mortalidade hospitalar e de complicações peroperatórias graves em cirurgia de revascularização do
miocárdio. Arq Bras Cardiol. 2003;80(1):41-50.
205
Download