conjuntura local

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REUNIÃO DE CONJUNTURA
16/01/2017
Conjuntura Local
Quanto maior for a queda no salário real, menor o aumento do desemprego (Samuel
Pessôa – 08/01/2017) ............................................................................................................... 1
Prisão deve ser lugar de justiça, não de vingança da sociedade (Aécio Neves –
08/01/2017) ............................................................................................................................. 2
Governo Temer surpreende pela quantidade de medidas adotadas (Marcos Lisboa –
08/01/2017) ............................................................................................................................. 3
A previdência superavitária (Fábio Giambiagi – 11/01/2017) ........................................... 4
Reformas (Armando Castelar Pinheiro – 06/01/2017) ..................................................... 6
2017 (Yoshiaki Nakano – 10/01/2017) ............................................................................. 8
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Quanto maior for a queda no salário real, menor o aumento do
desemprego (Samuel Pessôa – 08/01/2017)
Samuel Pessôa é professor da pós-graduação na Fundação Getúlio Vargas do Rio de
Janeiro e doutor em economia pela Universidade de São Paulo, é especialista em
crescimento, flutuações e planejamento econômico.
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Em um debate em outubro de 2015 no Insper, afirmei que estava feliz com a
queda de 5% do salário real que houve em maio daquele ano.
Essa afirmação "causou" na internet. A ideia foi que o professor de economia
ficava feliz com a infelicidade dos outros.
Em geral, a vida e as coisas são mais complexas do que a visão maniqueísta -no
Brasil, mais da esquerda, e nos Estados Unidos, mais da direita- dos fenômenos sociais.
A vantagem de uma rápida queda do salário real é que o ajustamento
inflacionário -isto é, o processo de trazer a inflação para a meta- ocorre com menor
aumento da taxa de desemprego.
Ou seja, ao longo de um processo de desinflação, há um "trade-off" (ainda não
encontrei tradução em português, sugestões são bem-vindas!) entre queda do salário
real e aumento do desemprego. Quanto maior e mais rápida for a queda do salário
real, menor será o aumento do desemprego, e vice-versa.
O conflito distributivo em economias de mercado opera com os trabalhadores
pleiteando maiores salários e os capitalistas pleiteando maiores margens. Se o conflito
distributivo não for corretamente arbitrado pelo banco central, ele destrói
a
estabilidade de preços, um dos bens públicos mais importantes de uma sociedade.
Infelizmente, o sinal positivo de maio de 2015 -queda do salário real de 5%- não
se materializou no atual ciclo desinflacionário.
A inércia inflacionária -da qual a regra de atualização do salário mínimo pela
inflação passada é um dos maiores condicionantes- requereu taxas elevadíssimas de
desemprego para promover a queda da inflação, o que finalmente está ocorrendo.
Além da elevada inércia inflacionária, diversos outros fatores contribuíram para
que o atual processo de desinflação seja tão custoso: inflação em 2014 de 6,5% e muito
persistente (a inflação média no quinquênio 2010-2014 foi de 6,1%); atraso de quase
20% nas tarifas e no preço da gasolina; atraso no câmbio; e situação de hiperemprego,
isto é, taxa de desemprego abaixo da taxa que não acelera a inflação.
Uma das tragédias das economias de mercado é que, em períodos de crise e
ajustamento econômico, os mais desfavorecidos sofrem mais. Em que pese todo um
Estado de bem-estar social que minora o custo do ajuste, ele sempre será mais sentido
pelos mais fracos.
É por esse motivo que a formulação da política econômica tem que ser
conservadora e cautelosa -como não foi de 2009 até 2014-, evitando experimentos.
Porque, quando a conta dos experimentos chega, ela é paga pelos mais pobres.
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Essa característica perversa das economias de mercado deriva do fato de que os
mais ricos são aqueles que têm reservas para enfrentar as intempéries. A única forma
de igualar o jogo é acabar com a propriedade privada.
Não é por outro motivo que a esquerda radical sempre pregou o fim da
propriedade privada. Corretamente, percebeu que era a única forma de impedir que os
pobres pagassem mais pelos ajustes. A dificuldade é que até hoje não se construíram
instituições que tornassem a propriedade coletiva dos meios de produção compatível
com democracia e com desenvolvimento econômico.
Parece, portanto, que a melhor alternativa é economia de mercado com Estado
de bem-estar social, que minora, mas não elimina a injustiça básica das economias de
mercado.
Prisão deve ser lugar de justiça, não de vingança da sociedade
(Aécio Neves – 08/01/2017)
Aécio Neves é formado em economia pela PUC-MG e senador pelo PSDB-MG. Foi
candidato à Presidência em 2014 e governador de Minas entre 2003 e 2010.
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O Brasil inicia o ano coberto de vergonha. No dia 1º, 56 presos foram
massacrados em um confronto entre facções criminosas. Quatro dias depois, outra
briga em presídio deixou um saldo de 33 mortos. Outras violências se seguiram. São
vidas ceifadas em episódios intoleráveis. A vida humana sob a custódia do Estado não
pode valer tão pouco.
O fracasso do sistema carcerário é incontestável. Entre os mais de 600 mil
detentos, 40% são presos provisórios, sem julgamento, esquecidos atrás das grades. As
prisões brasileiras são lugares de miséria, desumanidade e violência.
Seria irresponsável dizer que há uma solução fácil para o problema. Não há. Mas
é necessário que se comece a agir imediatamente, com vigor. O modelo prisional falido
e ineficiente tem de ser revisto.
Há muito tempo defendo publicamente a implantação de uma política nacional
de segurança pública. Diante da omissão do então governo federal, cheguei a
apresentar, no Senado, projeto que proibia o contingenciamento de recursos do Fundo
Penitenciário Nacional e do Fundo Nacional de Segurança. Só nos últimos 14 anos, R$
8,92 bilhões deixaram de ser aplicados.
Prisão deve ser lugar de justiça, não de vingança da sociedade. Com
comprometimento e ousadia para buscar alternativas, é possível fazer mais. Existem
iniciativas no Brasil e no mundo que merecem ser conhecidas e estudadas, sem
preconceitos. No nosso governo, em Minas, após debates com especialistas, investimos
em duas experiências cujo êxito é hoje reconhecido.
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Uma delas são as APACs (Associação de Proteção e Assistência aos Condenados),
modelo prisional humanizado. Nelas, há intensa participação da sociedade e do Poder
Judiciário. Segundo dados do Tribunal de Justiça de Minas, o índice de reincidência de
um preso no sistema tradicional é de 70%. Nas APACS, é de 10%.
Criamos a primeira PPP penitenciária do Brasil, em formato que continua sendo o
único, uma vez que não há semelhança com modelos de terceirização também
existentes no país. Na PPP, o Estado não investe na construção do presídio, liberando
recursos públicos, sempre escassos, para áreas de saúde e educação.
O modelo mineiro prevê que a empresa responsável seja permanente e
minuciosamente avaliada, e sua remuneração depende da análise de 380 indicadores
de desempenho que vão desde o número de presos que estudam e trabalham à
qualidade da assistência jurídica e de saúde, ao número de rebeliões e fugas e ao
sistema de vigilância interna.
2017 nasceu banhado em sangue e vergonha. Não podemos aceitar que isso se
repita. Tudo o que afronta a condição humana não nos serve. O Brasil que queremos
tem a obrigação de reagir. Hoje, agora.
Governo Temer surpreende pela quantidade de medidas adotadas
(Marcos Lisboa – 08/01/2017)
Marcos Lisboa é doutor em economia pela Universidade da Pensilvânia. Foi secretário de
Política Econômica no Ministério da Fazenda entre 2003 e 2005 e atualmente é
Presidente do Insper.
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O começo do governo Temer surpreendeu pela quantidade de medidas
adotadas. Algumas a favor, outras contrárias ao ajuste das contas públicas.
Esperava-se menos. Afinal, o governo foi o resultado de um
processo
atrapalhado, em que a maquiagem da contabilidade, que seria ilícita caso praticada por
empresas privadas, foi obscurecida pelo oportunismo da política miúda.
Processos conduzidos sem cuidado com os procedimentos desqualificam as
deliberações judiciais assim como as políticas. O governo turvado, porém, termina o
ano com muitas medidas. Para um lado e para o outro.
A PEC que limita o crescimento do gasto público teve apoio inesperado no
Congresso. A reforma da Previdência surpreendeu pela extensão da revisão das regras
para a concessão de benefícios. Foram aprovadas a lei sobre a governança das estatais
e a nova regulação do setor de óleo e gás.
O pacote microeconômico, porém, decepcionou no conteúdo e na forma,
revelando pouca competência na formulação e açodo no anúncio, com maior pendor
para a manchete da política do que para a melhora da economia.
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Houve, também, retrocessos, sobretudo com as corporações, como a exclusão de
algumas categorias da reforma da Previdência.
O governo começou seu mandato aumentando os salários de parte da elite dos
servidores. E escolheu terminar o ano com mais um pacote de aumentos. Enquanto
isso, a crise impõe sacrifícios para o resto da população.
O maior retrocesso ocorreu na renegociação das dívidas estaduais, provocada
pelo STF.
O problema dos Estados não decorre das dívidas, mas sim dos gastos com a
folha de pagamento e a previdência dos servidores. Por essa razão, o projeto do
governo previa medidas para controlar as despesas estaduais. Porém elas foram
suprimidas pela Câmara.
Decisões ineptas apenas agravam a crise, como a opção por anestesia em vez de
tratamento adequado em algumas doenças graves.
A crise fiscal dos Estados se deteriorou depois da renegociação das dívidas sem
as contrapartidas de ajuste, e o resultado tem sido a degradação de serviços públicos
essenciais. A liminar do Supremo, que suspendeu as garantias na dívida do Rio de
Janeiro, poderá piorar ainda mais o acesso ao crédito para os demais Estados.
O Senado propôs medidas de ajuste para a renegociação das dívidas no Regime
de Recuperação Fiscal dos Estados insolventes. Essas medidas foram rejeitadas pela
Câmara.
Em meio a tantos retrocessos nos três Poderes neste fim de ano, ao menos o
governo anunciou o veto ao regime desfigurado. Não se deve subestimar a relevância
do desenlace da crise dos Estados.
A previdência superavitária (Fábio Giambiagi – 11/01/2017)
Fabio Giambiagi é mestre em economia pela Universidade Federal do Rio de Janeiro
(UFRJ), membro do Conselho Superior de Economia da Fiesp e economista BNDES.
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Inicio hoje um conjunto de quatro textos em favor da reforma previdenciária. Por
já ter escrito muito sobre o assunto e dada a dinâmica que marcará o tratamento da
questão no Congresso - onde os opositores à reforma levantarão objeções a aspectos
específicos - não vou expor nos artigos as razões, conhecidas por todos, que sustentam
a necessidade da reforma e sim irei me deter nas críticas principais que costumam ser
feitas a propósito do tema. Os pontos abordados serão: 1- a tese de que "a previdência
é superavitária"; 2- a possibilidade de substituir a reforma pela cobrança da dívida
ativa; 3- a idade mínima em comparação com a expectativa de vida e 4- as diferenças
regionais. Hoje tratarei aqui do primeiro ponto.
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Abordo o tema pela importância que assumiu. Esclareço para o leitor, porém, que
considero espantoso que uma ideia tão esdrúxula quanto essa da qual estamos falando
tenha alcançado a repercussão que assumiu. Há quem sustente a tese, assim como há
grupos nos EUA que argumentam que "Elvis Presley não morreu" ou que a notícia de
que o homem chegou à Lua não teria passado de uma fraude cinematográfica. Há de
tudo no mundo e qualquer um é livre de acreditar no que quiser, desde "Elvis não
morreu" até a existência do ET de Varginha. A verdade, porém, é que Elvis morreu e o
homem chegou à Lua. Pensar o contrário é digno da literatura fantástica.
Entenda o leitor do que estamos falando. Em 1995, a receita de contribuições do
INSS foi de 4,6 % do PIB e a sua despesa com o pagamento de benefícios, de igual
montante, caracterizando uma situação de equilíbrio de caixa. Em 2016, estima-se que
esses percentuais terão sido da ordem de 5,7 % e 8,1 % do PIB, respectivamente. Em
outras palavras, o INSS em 21 anos terá passado do equilíbrio de caixa a um déficit de
2,4 % do PIB. Os críticos alegam que isso é falso, porque se a receita do INSS
incorporar algumas outras rubricas tributárias hoje arrecadadas pelo Tesouro Nacional
(TN) e parte da sua despesa for assumida pelo Tesouro (sempre ele!) o déficit se
tornaria um superávit. O leitor deve estar se perguntando que mágica é essa e se, afinal
de contas, o TN fica em Marte, a ponto de desviar para lá os problemas que, afinal de
contas, afligem a quem vive nas fronteiras demarcadas entre o Oiapoque e o Chuí.
Vejamos essa alquimia contábil mais de perto.
Vamos considerar que o Governo Federal inclui duas entidades: o TN e o INSS.
Para efeitos de simplificação, vamos assumir que o primeiro tem duas fontes de receita
(A e B) e o segundo uma (C). Concretamente, nos termos do debate, A pode ser
representada por impostos, B por contribuições exceto a previdenciária e C pela
contribuição previdenciária. Por sua vez, assume-se aqui que o TN tem um gasto (D) na
forma de despesas gerais e o INSS dois tipos de gasto, com benefícios urbanos (E) e
rurais (F). Assim, temos as equações:
Resultado TN = A + B - D
Resultado INSS = C - E - F
Resultado Governo Federal = A + B - D + C - E - F, que é equivalente a
Resultado Governo Federal = A + B + C - D - E - F
Em que consiste a contabilidade criativa do batalhão antirreformista? Numa
manipulação algébrica que levaria a deslocar a receita B de contribuições exceto a
previdenciária do TN para o INSS e repassar a despesa F rural deste para o TN. Como
ficariam então as equações? Assim:
Resultado TN = A - D - F
Resultado INSS = B + C - E
O que acontece com o resultado do Governo Central? Ele é igual à soma dos dois
resultados anteriores, ou seja,
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Resultado do Governo federal = A - D - F + B + C - E, que é equivalente a
Resultado Governo Federal = A + B + C - D - E - F
Como o leitor já percebeu, no final não mudou nada! Sim, caro leitor, o que os
antirreformistas propõem é, pura e simplesmente, dar uma volta de 360 graus,
mudando toda a classificação da contabilidade fiscal para deixar tudo rigorosamente
como está.
O centro da discussão é que há questões que é preciso deixar bem claras:
• A despesa primária - exceto juros - do Governo Central passou de 14% do PIB
em 1991 para 23% do PIB em 2016.
• No Brasil, a idade em que as pessoas se aposentam em média por tempo de
contribuição é de 53 anos no caso das mulheres e de 55 anos no caso dos homens.
• Pelas projeções do IBGE, em 2017 o número de pessoas entre 15 e 59 anos de
idade é de 136 milhões e o de 60 anos e mais, de 26 milhões; em 2050, o primeiro
grupo será menor (128 milhões) e o segundo terá se multiplicado por um fator 2,5 (66
milhões).
Não estamos discutindo uma questão contábil: estamos lidando com uma
questão física de matemática elementar: a relação entre as pessoas que estarão com 60
anos e mais e o grupo que genericamente se considerou no passado como de "idade
para trabalhar", nos próximos 33 anos, passará de 19% para 52%. Quem enche a boca
para afirmar que a reforma previdenciária pode ser evitada mediante uma
reclassificação contábil não entendeu a essência da questão - ou entendeu e substituiu
a matemática pela ideologia.
Reformas (Armando Castelar Pinheiro – 06/01/2017)
Armando Castelar Pinheiro é PhD em economia pela Universidade da Califórnia,
Berkeley. Trabalha como pesquisador do IBRE/FGV, professor do Instituto de Economia da
UFRJ e membro do Conselho Superior de Economia da Fiesp.
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Reformas e retomada do crescimento são temas que há tempos andam juntos:
uma pesquisa no Google com essas três palavras dá cerca de 517 mil resultados, a
maioria apontando que reformas são necessárias para o Brasil retomar o crescimento.
A relação entre os dois temas passa pelo desempenho da produtividade. As
estimativas mostram que no Brasil a razão PIB por trabalhador cresceu entre 0,0% e
0,2% ao ano, em média, de 1980 a 2016. Com o fim do bônus demográfico, no final
desta década, se mantivermos esse péssimo desempenho o Brasil entrará em uma rota
de queda ou pelo menos estagnação da renda per capita.
Obviamente, esse não é um cenário promissor. E a preocupação com ele não vem
de hoje: já em meados dos anos 1980 se reconheceu a necessidade de reformas, para
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substituir o modelo econômico adotado a partir dos anos 1930, que se mostrava
incapaz de sustentar o aumento da produtividade observado nas décadas anteriores.
Essa constatação motivou inúmeras reformas nos últimos três decênios, com
especial concentração entre 1990 e 2004. O espaço é curto para listar tudo o que foi
feito, mas se pode citar o fim da alta inflação (Plano Real), a abertura externa do
comércio e da conta de capital, a privatização, o fim de inúmeros monopólios, o
saneamento do sistema financeiro, e a desregulamentação da atividade econômica.
Individualmente, cada uma dessas reformas trouxe importantes benefícios, mas
no todo elas foram insuficientes para acelerar a alta da produtividade. O diagnóstico
feito à época foi que isso só aconteceria após outra rodada de reformas, esta mais
voltada para criar ou melhorar as instituições econômicas. Foi a fase de criar agências
reguladoras e leis de defesa da concorrência e do consumidor; reformar o judiciário, a
regulação financeira e a lei de falências; criar o cadastro positivo; melhorar a qualidade
das garantias de crédito etc. O resultado foi igual: reformas individualmente
importantes, mas incapazes de acelerar a produtividade.
Por que essas reformas foram incapazes de recolocar o país em uma rota de
crescimento? Daron Acemoglu e James Robinson oferecem uma resposta a esta
pergunta no seu bom livro "Why Nations Fail". Para eles, ainda que positivas em si, as
reformas não funcionaram pois não houve uma mudança comparável nas instituições
políticas: mesmo quando as reformas foram adotadas, seu objetivo foi subvertido, ou
os políticos usaram outros caminhos para amortecer seu impacto.
De fato, no Brasil as reformas foram apenas parciais e sujeitas a reversões: o Brasil
permanece uma economia muito fechada, o setor estatal é um grande empregador, os
bancos públicos são os principais responsáveis pelo crédito, a insegurança jurídica é
elevada, e a regulação pública é um grande peso para empresas e indivíduos. Além
disso, o setor público aumentou muito de tamanho desde então, pelo lado do gasto
público e da tributação.
Isto posto, o que fazer? É aqui que, no meu entender, Acemoglu e Robinson
generalizam incorretamente a sua análise. Seu raciocínio, que se propõe a explicar o
(sub)desenvolvimento em toda parte, segue em três etapas: 1- são as instituições
econômicas que determinam "se um país é pobre ou próspero, (mas) são a política e as
instituições políticas que determinam que instituições econômicas um país tem"; 2- os
poderosos e o resto da sociedade vivem em conflito, com aqueles querendo manter
instituições que protegem o seu poder e restringem o crescimento e o resto da
sociedade querendo o oposto; e 3 - instituições favoráveis ao crescimento em geral só
surgem após crises em que as elites são depostas ou muito enfraquecidas e o resto da
sociedade consegue se impor.
Usando essa lógica, Acemoglu e Robinson defendem que, graças à ascensão de
Lula e do PT ao poder, o Brasil já havia superado a fase 3 desse processo e estava em
rota segura em direção ao desenvolvimento! O erro dos autores foi embarcar na lógica
fácil de culpar as elites por todos os males: isso pode servir à retórica política, mas não
a uma análise mais séria do mundo real. Neste, a política é bem mais complexa que só
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"nós contra eles". Sobre isso, recomendo o recém-lançado "Liberais e Antiliberais: A
Luta Ideológica do Nosso tempo", de Bolivar Lamounier.
Isso não desqualifica, porém, o ponto de que são boas instituições econômicas
que levam ao desenvolvimento e que é a política que determina essas instituições. Para
podermos avançar, o debate sobre reformas não deve estar alienado da política. Não
no sentido de que o Brasil precise para isso mudar as instituições políticas, mas sim de
que é preciso trabalhar com a política na defesa de instituições econômicas mais
favoráveis ao crescimento. Para isso é preciso sair do conforto da "engenharia das
reformas", ir além dos artigos acadêmicos, e brigar por melhores instituições junto à
opinião pública, apresentando, explicando, convencendo, como fazem outros grupos
com outros interesses na democracia brasileira.
2017 (Yoshiaki Nakano – 10/01/2017)
Yoshiaki Nakano é formado em administração na Fundação Getulio Vargas, fez mestrado
e doutorado na Cornell University, dos Estados Unidos.
Atualmente é professor e diretor da Escola de Economia da Fundação Getulio Vargas
(FGV/EESP).
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Apesar de muita relutância é inevitável que na primeira coluna do ano
comentemos sobre o que virá nos próximos doze meses. É uma tarefa ingrata, sempre
demandada dos economistas, que deve ser enfrentada, ainda que com elevada
probabilidade de termos previsões erradas num quadro de tamanha incerteza. A teoria
econômica não nos permite prever o futuro, incerto por natureza, pois as proposições
científicas se referem a fatos, mesmo que estes tenham sido verificados inúmeras vezes,
nada garante que se repetirão no futuro. É o velho problema da indução. Podemos
atribuir probabilidades, mas nunca a certeza. Outro tipo de proposição que os
economistas utilizam são dedutivas, a priori verdadeiras, pois decorrem logicamente
das premissas, isto é, tautológicas. Analiticamente permitem até deduzir proposições
que se referem a fatos, mas aí voltamos ao primeiro tipo de proposições.
Em 2016, o terceiro ano de recessão, deverá ter o PIB contraído em pelo menos
3,5%, e transportará estatisticamente uma redução de -0,7% para o próximo. O longo
ano de 2016 ainda não se encerrou. A crise política continua a se agravar, com o
andamento da Lava-Jato e ausência total de lideranças políticas com credibilidade e
capazes de conduzir o país para uma situação aceitável para a maioria da população.
Os três poderes não se entendem e estão em conflito ou incomodados com as ações
do Ministério Público e da Polícia Federal. A própria Presidência da República atravessa
uma "pinguela", e sua sustentação depende de um outro poder. Incerteza total é a
expressão que resume tudo.
A situação econômica não está nada melhor. A única certeza que podemos ter é
que todos perdemos a esperança de que 2017 seria o ano da recuperação. Após a
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recuperação da confiança, com a mudança de governo, não tivemos correspondência
na economia real. Já no terceiro trimestre a confiança começou a derreter, tanto a dos
empresários como a dos consumidores, e tudo indica de temos um fato novo
inusitado, um novo ciclo de contração da produção e aumento de desemprego, em
função de novo ajuste de estoques, uma nova recessão dentro de uma recessão. O
único sinal positivo vem do setor agrícola, que com a ajuda da meteorologia deverá
expandir 4,2% em 2017.
As medidas de reforma econômica propostas pelo governo terão efeitos a longo
prazo. Os efeitos, se forem realmente aplicados, terão resultados perceptíveis e
palpáveis dentro de três ou quatro anos. E até lá, "no longo prazo estaremos todos
mortos", como dizia Keynes.
A situação fiscal, particularmente o crescimento da dívida pública, deverá
deteriorar-se nos próximos anos. Lembremos que foi ela que desencadeou a crise de
confiança.
As medidas de estímulo econômico tomadas no final do ano poderão atenuar a
crise, mas ninguém acredita que poderá promover a reversão do quadro com
recuperação. São pífias e baseiam-se numa crença errada: acreditam que estamos
simplesmente numa recessão cíclica, numa economia com tendência de crescimento de
longo prazo. Assim, basta um empurrãozinho que a economia volta para sua trajetória
de crescimento. Nada mais longe da realidade. Não há tendência de crescimento na
economia brasileira, ela perdeu o dinamismo, está sem rumo, sem estratégia, sem
planejamento de longo prazo.
A indústria, que vem sendo destruída há mais de dez anos, não só perdeu
participação no PIB, mas tornou-se inviável num país que o custo médio do capital
investido é três vezes maior do que o retorno sobre o mesmo, como mostra o estudo
da Cemec, utilizando dados de balanços da empresas não-financeiras. Que setor ou
setores poderão promover um novo surto de desenvolvimento, sem mudar
radicalmente a política de juros, a política cambial, a tributação excessiva e outras
reformas para reduzir o "custo Brasil"? A agricultura liderou o crescimento nas últimas
décadas, dada a sua competitividade, mas sem uma política adequada para articulá-la
com a indústria e o resto da economia, ampliando a geração de maior valor agregado
domesticamente, promovemos uma regressão na estrutura produtiva do país.
O Brasil precisa ser reinventado. Hoje ele é prisioneiro do passado. São velhas
instituições, valores, cultura, e ideias que nos acorrentam. Sem a chamada "destruição
criadora", que Schumpeter desenvolveu, não vamos para lugar nenhum. É uma nau
encalhada, enferrujando, enquanto o mundo avança. Torço para que eu esteja errado e
alguém ou algum fato novo me convença do contrário.
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