O ciclo de vida das galáxias

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O Ciclo de vida das Galáxias
Os cientistas estão perto de explicar a variedade de formas assumidas por essas
estruturas cósmicas.
POR GUINEVERE KAUFFMANN E FRANK VAN DEN BOSCH
Cientistas estão perto de explicar a incrível variedade
de formas assumidas por essas estruturas cósmicas
A Galáxia do Sombrero serve de exemplo para
praticamente todos os fenômenos galácticos que os
astrônomos lutam há um século para resolver. Tem um
grande bulbo elipsoidal de estrelas, um buraco negro
supermaciço situado bem no interior desse bulbo e grupos
de estrelas espalhados pelos limites. Estendendo-se para
além desta imagem, está o que se acredita ser um grande
halo de matéria escura, invisível.
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São muitas as histórias de ficção científica onde um poderoso império encontra o fim devido à sua própria arrogância: ele acha
que pode conquistar e governar uma galáxia inteira. Trata-se de uma meta ambiciosa. Para pôr nossa Via Láctea sob controle, o
império seria obrigado a ocupar cem bilhões de estrelas. Esses números não chegam a impressionar os cosmólogos, astrônomos
que estudam o Universo como um todo. A Via Láctea é apenas uma das 50 bilhões, ou um número ainda maior, de galáxias do
espaço que podemos observar. Conquistar a Via Láctea seria como ocupar uma insignificante ilhota.
Apenas um século atrás, não se conhecia a existência de todas essas galáxias. Para a maior parte dos astrônomos, Galáxia e
Universo eram sinônimos. No espaço existiam mais ou menos 1 bilhão de estrelas e entre elas ocorriam borrões de material
nebuloso que pareciam estrelas nascendo ou morrendo. Nas primeiras décadas do século XX, porém, a astronomia passou por
uma idade de ouro. O astrônomo americano Edwin Hubble e outros cientistas determinaram que esses borrões eram, às vezes,
outras galáxias.
Mas por que as estrelas se situam em gigantescos conjuntos separados por enormes vazios e por que as galáxias
surgem numa incrível variedade de formas, tamanhos e massas? Os astrônomos dedicaram muito tempo para responder
a essas questões nas últimas décadas. Não é possível observar a formação de uma galáxia, pois se trata de um
processo muito lento do ponto de vista humano. Os pesquisadores são obrigados a montar um quebra-cabeça,
observando diversas galáxias, cada uma numa etapa diferente de evolução. Esse trabalho, porém, só se tornou rotina
cerca de dez anos atrás, quando a astronomia entrou numa nova idade de ouro.
Progressos espetaculares na tecnologia dos telescópios e dos detectores estão agora permitindo aos astrônomos
acompanhar as mudanças que ocorrem nas galáxias em escalas de tempo cósmicas. Os equipamentos do Telescópio
Espacial Hubble penetram profundamente no céu, revelando a existência de novas galáxias em níveis praticamente
impensáveis. Instrumentos localizados na superfície, como os gigantescos telescópios Keck, estão colhendo dados
sobre galáxias muito distantes - e, conseqüentemente, muito antigas. É como se os biólogos especializados na evolução
tivessem ganho uma máquina do tempo, permitindo que visitassem a pré-história e fotografassem animais e plantas que
viviam na Terra em períodos diferentes de seu passado. O desafio diante dos astrônomos, como o que surgiria para
seus colegas biólogos, é determinar como as espécies surgidas no princípio evoluíram até chegar ao ponto em que se
encontram agora.
Trata-se de uma tarefa de proporções verdadeiramente astronômicas. Envolve a aplicação da física em escalas
terrivelmente diferentes, da evolução cosmológica de todo o Universo à formação de uma única estrela. Esse panorama
faz com que seja difícil formar modelos realísticos da formação das galáxias, mas traz a possibilidade de atingir todo o
ciclo do problema. A descoberta desses bilhões de galáxias reformulou a astronomia estelar e a cosmologia. No grande
esquema das coisas, as estrelas são muito pequenas para terem importância. Ao mesmo tempo, os debates sobre a
origem do Universo parecem abstratos demais para a maioria dos astrônomos estelares. Sabemos agora que um quadro
coerente do Universo deve levar em conta tanto o grande como o pequeno.
RESUMO/EVOLUÇÃO DAS GALÁXIAS
Para compreender como uma galáxia se forma,
Um dos campos da astrofísica mais em voga no momento é o
os astrônomos procuram padrões e tendências em
estudo da formação das galáxias. Os telescópios estão
suas propriedades. De acordo com o esquema de
explorando galáxias muito antigas e simulações de computador
classificação proposto por Hubble, as galáxias
obtêm detalhes sem precedentes.
dividem-se em três tipos principais: elípticas,
Os pesquisadores poderão em breve fazer com as galáxias o
espirais e irregulares. As maiores são as elípticas.
que fizeram com as estrelas no início do século XX: obter uma
São sistemas relativamente simples, sem
explicação unificada, com base em alguns poucos processos
características especiais, sistemas quase esféricos
gerais, para a enorme diversidade de corpos celestes. Nas
sem ou com poucos gases e poeira. As estrelas
galáxias, esses processos incluem a instabilidade gravitacional, o
giram ao redor do centro como abelhas em volta
resfriamento radiativo, o relaxamento (pelo qual as galáxias
da colméia. A maior parte das estrelas é muito
chegam ao equilíbrio interno) e interações entre as galáxias.
velha.
Vários problemas ainda precisam ser resolvidos. Uma resposta
As galáxias espirais, nas quais se incluem
aceitável está na possibilidade de que as estrelas, embora
nossa Via Láctea, são estruturas achatadas e
insignificantes diante de corpos enormes como as galáxias,
muito organizadas, nas quais estrelas e gases se
tenham na realidade um efeito muito grande sobre sua estrutura.
movimentam em órbitas circulares ou quase
circulares em torno de um centro. Por isso, também são conhecidas como galáxias de disco. Os braços em espiral são
Espécies de galáxias
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filamentos de estrelas jovens e quentes, gases e poeira. As galáxias espirais têm, no centro, bulbos, ajuntamentos
esferóides de estrelas que lembram galáxias espirais em miniatura. Mais ou menos um terço das galáxias espirais têm,
na direção do centro, uma estrutura retangular, a barra. Provavelmente, a barra é conseqüência de instabilidades no
disco.
As galáxias irregulares são as que não podem ser classificadas como espirais ou elípticas. Algumas parecem ser
galáxias espirais ou elípticas que foram violentamente distorcidas por um encontro recente com um vizinho. Outros são
sistemas isolados com estruturas mal-definidas, sem indicações de distúrbios recentes.
As três classes incluem galáxias com luminosidades muito diferentes. Na média, porém, as elípticas são mais
brilhantes que as espirais e as irregulares. Para as galáxias com menos brilho, o esquema de classificação deixa de ter
utilidade. Essas galáxias anãs são heterogêneas por sua própria natureza e nenhuma tentativa de classificá-las deixou
de criar muitas controvérsias. Em termos gerais, elas se dividem em duas categorias: sistemas ricos em gases, nos
quais há muita atividade de formação de estrelas, e sistemas pobres em gases, sem formação de estrelas.
A maior parte das galáxias está situada a grande distância de suas vizinhas. As espirais são dominantes e apenas
entre 10 e 20% são elípticas. As galáxias restantes, porém, estão mais próximas entre si, formando aglomerados, e,
nelas, a situação se inverte. As elípticas são maioria, e as poucas espirais são sistemas anêmicos, sem gases e sem
estrelas jovens. Esse fenômeno, chamado de relação morfologia-densidade intriga os astrônomos.
TIPOS DE GALÁXIAS
OS ASTRÔNOMOS DIVIDEM AS GALÁXIAS de acordo
com um sistema de classificação conhecido como
"diapasão", desenvolvido pelo astrônomo americano Edwin
Hubble na década de 20. Esse sistema distribui as galáxias
em três tipos básicos: elípticas (representadas pelo braço
do diapasão, à direita), espirais (as pontas do diapasão) e
irregulares (abaixo, à esquerda). As galáxias menores,
conhecidas como anãs, têm taxonomia própria, ainda
incerta.
Cada tipo tem subtipos determinados por detalhes na forma
da galáxia. Seguindo o diapasão do alto para baixo, o disco
galáctico se torna mais proeminente e o bulbo central
menos nas imagens ópticas. Os tipos Hubble podem
representar estágios de desenvolvimento diversos. As
galáxias começam como espirais sem bulbo, passam por
colisões nas quais aparecem como irregulares e terminam
como elípticas ou espirais com bulbo.
ELÍPTICAS
M89
EO
M49
E4
M110
E5
M84
SO
M82
IRREGULAR
M32
ELÍPITICA
PEQUENA NUVEM DE
MAGALHÃES IRREGULAR
VII Zw 403
COMPACTA AZUL
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ESPIRAIS
BARRADAS
ESPIRAIS
NORMAIS
LEO I
ESFERÓIDE
NGC 660
SBa
NGC 7217
Sa
NGC 7479
SBb
NGC 4622
Sb
M58
SBc
M51
Sc
Claro e Escuro
Uma pequena proporção de espirais e elípticas tem uma característica especial. Essas galáxias possuem um núcleo
muito brilhante e pontudo, chamado núcleo galáctico ativo (NGA). Os exemplos mais luminosos e mais raros são os
quasares, tão intensos que obscurecem as galáxias onde estão localizados. Os astrônomos acreditam que a força dos
NGA vem de buracos negros que têm de milhões a bilhões de massas solares. De acordo com estudos teóricos, os
gases que caem nesses monstros irradiam cerca de 10% de sua energia intrínseca, o suficiente para criar um farol
capaz de ser visto do outro lado do universo.
Os NGA já foram considerados anomalias, mas hoje se sabe que fazem parte do processo de formação da galáxia. O
pico da atividade dos NGA ocorreu quando o Universo tinha aproximadamente um quarto de sua idade atual,
aproximadamente o mesmo período de formação da maioria das estrelas das galáxias elípticas. Além disso, acredita-se
agora que existem buracos negros supermaciços em praticamente todas as galáxias elípticas e em todas as galáxias
espirais com bulbos, tenham ou não NGA. A conclusão é a de que todas as galáxias podem passar por um ou mais
episódios de atividade dos NGA. Enquanto matéria continuar a cair no buraco negro, o núcleo se mantém ativo. Quando
o centro pára de receber material novo, entra em dormência.
A maior parte das informações sobre esses fenômenos vem dos fótons: fótons ópticos das estrelas, fótons de rádio de
gases neutros de hidrogênio, fótons de raios-X de gases ionizados. Mas a enorme maioria da matéria existente no
Universo provavelmente não emite fótons em nenhum comprimento de onda. Trata-se da famigerada matéria escura,
cuja existência se infere apenas de seus efeitos gravitacionais. Acredita-se que as partes visíveis das galáxias estejam
envelopadas por gigantescos "halos" de matéria escura.
Ninguém conseguiu detectar diretamente matéria escura até hoje e sua natureza é um dos maiores mistérios da
ciência. A maioria dos astrônomos apóia a idéia de que a matéria escura é constituída na maior parte de partículas ainda
não identificadas que interagem mal com partículas comuns ou entre si. Normalmente, esse tipo de partículas é
chamado pelos astrônomos de matéria escura fria (MEF) e os modelos cosmológicos que defendem sua existência
recebem a classificação de modelos MEF.
Nos últimos 20 anos, diversos astrônomos desenvolveram com muita dificuldade um modelo de formação de galáxia
com base na matéria escura fria. A estrutura básica é a teoria padrão do Big Bang para a expansão do Universo. Os
cosmólogos continuam a discutir como a expansão começou e o que ocorreu no começo, mas isso não influencia muito
o problema da formação das galáxias. Vamos entrar na história cerca de 100 mil anos depois do Big Bang, quando o
Universo era constituído de bárions (matéria normal, predominantemente núcleos de hidrogênio e hélio), elétrons
(ligados aos núcleos), neutrinos, fótons e matéria escura fria. Observações indicam que a matéria e as radiações
estavam bem-distribuídas: a densidade, em posições diferentes, tinha variações de apenas cerca de uma parte para 100
mil. O problema é descobrir como esses ingredientes simples deram origem à enorme variedade das galáxias.
Quando comparamos as condições existentes nesse período com a distribuição de matéria existente hoje, surgem
duas diferenças importantes. A primeira é que no Universo atual ocorrem diferenças enormes com relação à densidade.
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As regiões centrais das galáxias são mais de 100 bilhões de vezes mais densas que a média do Universo. A Terra é 10
bilhões de bilhões de vezes ainda mais densa. A segunda é a de que apesar de os bárions e a MEF estarem bem
misturados no início, os bárions formam hoje grupos densos (as galáxias) no interior de halos gigantescos de matéria
escura. De alguma forma os bárions e a matéria escura fria se separaram.
A primeira diferença pode ser explicada pelo processo de instabilidade gravitacional. Se uma região é um pouco mais
densa que a média, o excesso de massa produzirá uma força gravitacional também um pouco maior que a média, o que,
por sua vez, atrairá matéria. A massa cresce e aumenta mais um pouco o campo gravitacional, o que atrai mais massa.
Esse processo constante amplifica as diferenças iniciais de densidade.
PREPARANDO UMA GALÁXIA
Três processos básicos
determinaram como a sopa
primoridal se congelou em
galáxias:
a expansão geral do
Universo depois do big-bang,
a força da gravidade e o
movimento de partículas e
outros constituintes maiores. 1) O Universo está
preenchido pelo gás
As mudanças no equilíbrio
primordial, uma mistura de
entre esses processos
matéria comum (azul) e
podem explicar porque as
matéria escura (vermelho).
A densidade varia de um
galáxias se transformaram
lugar para outro.
em corpos discretos e
coerentes, não numa massa
uniforme de gases ou uma
sucessão de buracos
negros. Nesta teoria, corpos
menores se unem para
formar objetos maiores. Um
ingrediente crucial é a
matéria escura, que chega a
um equilíbrio diferente do
obtido pela matéria normal.
4) O colapso prossegue
até o trecho entrar em
equilíbrio. A densidade das
matérias escura e comum
atinge o máximo no centro
e diminui nas bordas.
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2)
A força da expansão
cósmica supera a da
gravidade. O gás se
espalha por uma área
maior. Mas trechos com
densidade maior se
dissolvem mais lentamente.
3)
Como não pode emitir
radiações, a matéria
escura conserva a forma. A
matéria comum irradia,
transforma-se num disco
giratório e começa a formar
estrelas.
6)
5)
À certa altura, esses
trechos se tornam tão
densos com relação às
áreas próximas que a
gravidade supera a
expansão. Os trechos
entram em colapso.
As protogaláxias
interagem, suas
energias influenciam-se e
se unem, formando corpos
maiores (Esta etapa pode
ocorrer simultaneamente
com as etapas 4 e 5).
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Quando dois discos de
tamanho semelhante
se unem, as órbitas das
estrelas se misturam. O
resultado é uma galáxia
elíptica.
7)
A fusão dá início a
novas formações de
estrelas e envia matéria
para o buraco negro
central, gerando um núcleo
galáctico ativo, que pode
lançar jatos de plasma.
8)
Enquanto esse processo decorre, a gravidade da região compete com a expansão do Universo, que tende a afastar a
matéria. No começo, a expansão cósmica vence e a densidade da região continua a decair. Mas essa diminuição é mais
lenta que a ocorrida na densidade das áreas próximas. À certa altura, o excesso de densidade da região comparada com
a das áreas próximas se torna tão pronunciada que sua atração gravitacional supera a expansão cósmica. A região
começa a entrar em colapso.
Até esse ponto, a região não é um objeto coerente, mas simplesmente um aumento de densidade perdido na neblina
de matéria que enche o Universo. Mas, quando a região entra em colapso, começa a ter vida interna própria. O sistema,
que a partir de agora vamos chamar de protogaláxia, procura estabelecer uma forma qualquer de equilíbrio. Os
astrônomos costumam chamar esse processo de relaxamento. Os bárions se comportam como partículas de um gás
qualquer. Aquecidos pelas ondas de choque iniciadas pelo colapso, trocam energia por meio de colisões diretas uns com
os outros, chegando assim ao equilíbrio hidrostático, uma situação de equilíbrio entre a pressão e a gravidade.
Na matéria escura, no entanto, o relaxamento ocorre de forma bem diferente. As partículas MEF são, por definição,
pouco interativas. Não têm a capacidade de redistribuir energia entre elas por meio de colisões diretas. Um sistema
formado por essas partículas não pode chegar ao equilíbrio hidrostático. Em vez disso, ele passa pelo que é chamado de
relaxamento violento. As partículas trocam energia não com outra partícula isolada, mas com a massa coletiva de
partículas, por meio do campo gravitacional.
O ponto de chegada do colapso e relaxamento de uma protogaláxia é um halo de matéria escura, no interior do qual o
gás bariônico se encontra em equilíbrio hidrostático numa temperatura tipicamente de uns poucos milhões de graus.
Como as partículas MEF conservam sua energia a partir desse momento, o gás bariônico pode emitir radiações. Ele
resfria, se contrai e se acumula no centro do halo de matéria escura. O resfriamento, assim, é o processo responsável
pela separação dos bárions das partículas MEF.
Até agora, colocamos nosso foco numa única protogaláxia e ignoramos as redondezas. Na realidade, outras
protogaláxias estão em formação nas proximidades. A gravidade costuma aproximá-las e elas se unem, formando uma
estrutura maior. Essa estrutura também se unirá com outra e o processo se repete. A formação hierárquica é uma
característica dos modelos MEF. A razão é simples. Como as flutuações em pequena escala na densidade são impostas
sobre flutuações em escala maior, a densidade atinge o valor mais alto sobre as regiões menores. Podemos fazer uma
analogia com o topo da montanha. A posição exata do pico corresponde a uma estrutura pequena: por exemplo, uma
pedrinha sobre uma rocha que está sobre uma elevação no alto da montanha. Se uma nuvem descer sobre a montanha,
tampa primeiro a pedrinha, depois a rocha, depois a elevação e, por fim, o resto da montanha.
De forma semelhante, as regiões mais densas do universo inicial são as menores protogaláxias. Elas são as primeiras
regiões a entrar em colapso, só depois sendo seguidas por estruturas progressivamente maiores. O que diferencia as
MEF de outros tipos possíveis de matéria escura é que ela tem flutuações de densidade em todas as escalas.
A formação hierárquica dos halos de matéria escura não pode ser descrita por meio de relacionamentos matemáticos
simples. Estudamos melhor o assunto usando simulações numéricas. Para representar uma parte significativa do
Universo com resolução suficiente para perceber a formação dos halos individuais, os pesquisadores precisam usar os
mais recentes supercomputadores. As propriedades estatísticas e a distribuição espacial dos halos que emergem dessas
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simulações estão de acordo, de forma excelente, com as percebidas nas galáxias observadas, o que dá um forte apoio
ao quadro hierárquico e daí à tese da existência das MEF.
Dê um giro
VARIAÇÕES NAS DENSIDADES DAS GALÁXIAS
O quadro hierárquico explica de forma
As variações de densidade no Universo pré-galáctico seguiram um
natural as formas das galáxias. Nas
padrão que facilitou a formação de protogaláxias. As variações eram
galáxias espirais, as estrelas e gases se
compostas por ondas de diversos comprimentos num padrão que os
movem em órbitas circulares. A estrutura
conhecedores de música conhecem como "barulho cor-de-rosa". Elas,
dessas galáxias é, assim, governada pelo
aliás, tiveram início como ondas de som no plasma primordial. Uma
momento angular. De onde vem esse
onda pequena se sobrepõe a uma onda ligeiramente maior, que se
momento angular? De acordo com o
sobrepõe a outra um pouco maior e assim por diante. Assim, as
quadro padrão, quando as protogaláxias
maiores densidades ocorriam sobre as menores regiões.
preencheram o Universo, exerceram forças
Essas regiões entraram primeiro em colapso e se transformaram
de maré, fazendo com que começassem a
nos blocos dos quais se formaram estruturas maiores.
girar em torno de si mesmas. Depois que
as protogaláxias entraram em colapso,
mantiveram o momento angular.
Quando a temperatura dos gases das
protogaláxias começaram a cair, eles se
contraíram e caíram na direção do centro.
Da mesma forma que os patinadores do
gelo giram mais depressa em torno de si
mesmos quando encolhem os braços, os
gases foram girando cada vez mais
rapidamente enquanto se contraíam. Eles
se achataram, da mesma maneira que a Terra é ligeiramente mais achatada que uma esfera perfeita, por causa de sua
rotação. Chegou uma hora em que os gases giravam tão depressa que a força centrífuga, dirigida para fora, igualou a da
gravidade, dirigida para dentro. Ao atingir o equilíbrio centrífugo, os gases estavam tão achatados que formavam um
disco fino. A densidade era suficiente para que os gases se amontoassem em nuvens e foi assim que as estrelas se
formaram. Surgiu uma galáxia espiral.
Como a maioria dos halos de matéria escura acabam por ter um pouco de momento angular, é de se espantar porque
nem todas as galáxias são espirais. Como aparecem as galáxias elípticas? Há duas teorias em curso entre os
astrônomos. Uma é a de que as estrelas das elípticas e bulbos atuais se formaram durante um colapso monolítico, nos
primeiros tempos do Universo. A outra é a de que as elípticas surgiram em períodos relativamente recentes e são o
resultado da união de galáxias espirais.
O segundo ponto de vista ganhou popularidade nos últimos anos. Simulações de computador bem detalhadas da
fusão de duas espirais mostram que o forte campo gravitacional flutuante destrói os dois discos. As estrelas no interior
das galáxias estão muito distantes entre si para se chocarem e o processo de união, assim, é muito semelhante ao
relaxamento violento sofrido pela matéria escura. Grande parte dos gases dos discos das duas galáxias originais perde o
momento angular e se precipita para o centro. Ali, os gases atingem densidades muito altas e começam a formar
estrelas num ritmo acelerado. Com o passar do tempo, mais gases chegam à área, esfriam e formam um novo disco em
torno da elíptica. O resultado é uma galáxia espiral com um bulbo no centro.
A alta eficiência da formação de estrelas durante as fusões de galáxias explica as razões pelas quais as elípticas
normalmente têm poucos gases: eles foram usados. O modelo das fusões também dá conta da relação morfologiadensidade: uma galáxia num ambiente de alta densidade passará por mais fusões e terá, assim, mais oportunidades de
se transformar em elíptica.
Indicações obtidas pela observação mostram que as fusões e interações foram comuns no Universo, especialmente
em seus primeiros tempos. Nas imagens tomadas pelo Telescópio Espacial Hubble, muitas galáxias antigas mostram
morfologias com distúrbios, sinal evidente de interação.
Se as galáxias elípticas e bulbos espirais estão relacionados com a fusão de galáxias, pode ser que ela também seja
a responsável pela criação dos buracos negros supermaciços. As massas do buraco negro estão fortemente
relacionadas com as massas da galáxia elíptica ou do bolsão que o cercam. Não há relação entre elas e a massa do
disco das espirais. Os modelos de fusão foram ampliados de maneira a incorporar buracos supermaciços e, dessa
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forma, núcleos galácticos ativos (NGA). A grande quantidade de gases empurrada para o centro durante uma fusão pode
fazer reviver um buraco negro adormecido. Ou seja, os quasares eram mais comuns no passado porque as fusões de
galáxias também eram mais comuns.
No quadro hierárquico, as galáxias anãs são as sobras, pequenos ajuntamentos que ainda não se uniram entre si.
Observações recentes mostram que a formação de estrelas nas anãs é particularmente irregular, vindo em erupções
curtas separadas por longos períodos de calma. Em galáxias como a Via Láctea, a formação de estrelas ocorre num
ritmo mais regular. São fatos intrigantes, pois muitas vezes os astrônomos aderiram à hipótese de que a fertilidade de
uma galáxia é determinada por sua massa. Em galáxias pequenas, explosões de supernovas podem perturbar ou
mesmo afastar todos os gases de um sistema, impedindo assim a formação de estrelas.
Embora já tenhamos um quadro padrão da formação das galáxias que responde com sucesso às principais perguntas
sobre o assunto, ainda estamos longe de poder explicar todos os processos envolvidos. Além disso, os pesquisadores
precisam resolver inconsistências muito fortes. A simples imagem dos gases se resfriando no interior de halos de matéria
escura enfrenta um problema importante, conhecido como catástrofe do resfriamento. Os cálculos dos índices de
resfriamento indicam que os gases esfriaram muito depressa e se juntaram no centro dos halos, deixando praticamente
vazio o espaço intergaláctico. Mas o espaço entre as galáxias não está vazio, muito longe disso.
RELAXAMENTO
O que torna a
galáxia um objeto
distinto é seu
estado de
equilíbrio interno,
não o fato de
ocupar uma área
arbitrária do
Universo. Este
equilíbrio
determina as
propriedades
gerais da galáxia,
como sua forma
e perfil de
densidades. (Um
equilíbrio
semelhante
determina o
tamanho e
temperatura das
estrelas). A
matéria normal e
a matéria escura
chegam ao
equilíbrio por
meios diferentes.
1)
A matéria normal,
predominantemente
hidrogênio na forma gasosa,
move-se em todas as direções. A
densidade varia.
2)
As partículas de gás
colidem entre si, o que
redistribui a energia e gera uma
pressão que resiste à gravidade.
3)
No início, a matéria escura
tem a mesma distribuição da
matéria normal. A diferença é que
as partículas colidem.
5)
O movimento das
partículas provoca
mudanças gravitacionais. Isso
faz com que as partículas
ganhem ou percam energia.
6)
4)
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À certa altura o gás chega
ao equilíbrio hidrostático,
com densidade maior perto do
centro de gravidade.
Gradualmente, o sistema
chega ao equilíbrio, no qual
cessam as flutuações no campo
gravitacional.
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Mais informações, por favor
Há outro problema, relacionado com o momento angular. A quantidade de momento angular atribuído às protogaláxias
nos modelos é comparável ao momento angular que observamos nas galáxias espirais. Enquanto os gases mantêm o
momento angular, o quadro MEF reproduz os tamanhos observados das espirais. Nas simulações, no entanto,
infelizmente, o momento angular desaparece. Grande parte é transferido para a matéria escura durante as fusões de
galáxias. Em conseqüência, os discos que aparecem dessas simulações são menores por um fator de dez.
Aparentemente, ainda falta um ingrediente essencial nos modelos.
Uma terceira inconsistência tem a ver com o número de galáxias anãs. As teorias hierárquicas prevêem uma
proliferação de halos de matéria escura com pouca massa e, por extensão, de galáxias anãs. Não é o caso. Nas
vizinhanças da Via Láctea, o número de anãs de pouca massa é inferior ao previsto pelas teorias por um fator de entre
10 e 100. Ou esses halos de matéria escura não existem ou estão ali e não foram detectados porque não há formação
de estrelas no seu interior.
Foram sugeridas diversas soluções para esses problemas. As propostas caem em duas classes: uma mudança
fundamental no modelo, talvez na natureza da matéria escura, ou uma revisão no quadro atual de como os gases em
resfriamento se transformam em estrelas. Como a maioria dos astrônomos mostra relutância em abandonar o modelo
MEF, que funciona muito bem em escalas maiores que as das galáxias, foram concentrados esforços em melhorar o
conhecimento sobre a formação das estrelas. Os modelos atuais passam rapidamente sobre o processo, que ocorre em
escalas muito menores que as de uma galáxia comum. Uma incorporação total está bem abaixo da capacidade dos
supercomputadores modernos.
Apesar disso, a formação de estrelas pode ter efeitos profundos sobre a estrutura de uma galáxia. Alguns astrônomos
acham, inclusive, que a ação das estrelas poderia resolver os três problemas de uma vez. A energia liberada pelas
estrelas pode aquecer os gases, influenciando a catástrofe do resfriamento. O aquecimento também pode tornar mais
lenta a descida de gases para o centro da galáxia e reduzir dessa forma a tendência de transferência do momento
angular para a matéria escura, o que reduziria o problema do momento angular. As explosões de supernovas, por sua
vez, pode ejetar massa das galáxias de volta para o meio interestelar. Nos halos de massa menor, com velocidade de
escape pequena, o processo seria tão eficiente que dificilmente uma estrela chegaria a formar-se. Isso explicaria os
motivos pelos quais observamos menos galáxias anãs que o previsto.
Como entendemos mal esses processos, os modelos ainda deixam margem a muitos aperfeiçoamentos. Ainda não
sabemos se os problemas podem ser ajustados ou se indicam a necessidade de uma estrutura inteiramente nova. Nossa
teoria sobre a formação das galáxias com certeza continuará a evoluir. Pesquisas observacionais em curso, como a
Sloan Digital Sky Survey, irão com certeza aumentar muito os dados que possuímos sobre as galáxias, próximas e
distantes. Novos progressos na cosmologia nos ajudarão a determinar as condições iniciais para a formação das
galáxias. Observações precisas da radiação cósmica de fundo de microondas já chegaram aos valores de parâmetros
cósmicos em grande escala, permitindo aos construtores de modelos que voltem seus focos para os problemas em
escala menor. Em breve poderemos unir o grande, o médio e o pequeno num quadro único da evolução cósmica.
OS AUTORES
GUINEVERE KAUFFMANN E FRANK VAN DEN BOSCH são pesquisadores do Instituto Max Planck de Astrofísica em Garching, Alemanha. Estão
entre os mais conhecidos especialistas na criação de modelos teóricos da formação de galáxias. Kauffmann, recentemente, voltou suas atenções
para a análise dos dados produzidos pela Sloan Digital Sky Survey, os quais, acredita, levarão a respostas para alguns dos problemas citados neste
artigo. Nas horas vagas, gosta de explorar a Baviera com o filho, Jonathan. Van den Bosch estuda especialmente a formação dos discos galácticos e
de buracos negros maciços nos centros das galáxias. Nas horas vagas, pode ser visto com freqüência numa cervejaria de Munique.
PARA CONHECER MAIS
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O Ciclo de vida das Galáxias
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