largo do paissandu - labhab

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LARGO DO PAISSANDU
intervenção com inclusão
FAUUSP – Trabalho Final de Graduação
2º sem / 2002
orientador: Prof. João Sette Whitaker Ferreira
Ana Carolina Louback Lopes
Anita R. Tan De Domenico
1
“Moradia digna é aquela localizada em terra urbanizada, com acesso a
todos os serviços públicos essenciais por parte da população, que deve
estar abrangida em programas geradores de trabalho e renda”.
(Projeto Moradia, 2000)
2
AGRADECIMENTOS
Aos membros da banca examinadora
Arq. Celso Sampaio – Cohab;
Prof. Dr. Khaled Ghoubar;
Arq. Wagner Germano – Cohab;
Aos professores e funcionários da FAU
Profª. Andreína Nigriello;
Prof. Antonio Carlos Barossi;
Profª. Denise Duarte;
Prof. José Eduardo de A. Lefevre;
Arq. Rafael Brandão – LABAUT;
Funcionários do LAME, sobretudo ‘mestre’ Laércio;
Funcionários da biblioteca, sobretudo Regina;
Gisela e Toninho, do Lab. Fotografia;
Cidão e Robson, do LPG;
Ana, do xerox;
Aos consultores
Arq. Alejandra Devecchi – Ambiente Urbano;
Eng. Cláudio de Sena Martins – Instituto Mais São Paulo;
Arq. Gisele – Secretaria Municipal de Habitação do Rio de Janeiro;
Eng. Yopanan Rebello;
À Irmandade N. Sra. do Rosário dos Homens Pretos, sobretudo ao
Madureira e ao Brás;
À Rosa, da Imobiliária Savoy, e ao Sr. Oliveira e demais funcionários do
edifício do Cine Olido;
Aos amigos, sobretudo
Arq. Arthur P. S. Brito;
Arq. Camila R. Calazans;
Arq. Luiz Portugal;
Ligia R. Rodrigues;
Arq. Mirian S. Vaccari;
Arq. Mônica P. Marcondes;
Arq. Roberto Pompéia;
Daniel Yuhasz – Integra Cooperativa de Trabalhos Interdisciplinar;
Ao Arq. Paulo Fecarotta (Fino), professor e amigo;
Ao nosso orientador, João;
Às nossas famílias.
3
ÍNDICE
APRESENTAÇÃO
pg. 05
CONTEXTUALIZAÇÃO HISTÓRICA
pg. 06
A formação do Triângulo
A transposição do Anhangabaú
A configuração de um “Centro Novo”
O esvaziamento do Centro
A situação atual
pg. 07
pg. 07
pg. 09
pg. 10
pg. 12
A QUESTÃO DA HABITAÇÃO
pg. 14
Quadro geral
O caso de São Paulo
Experiências de reabilitação de edifícios
A habitação social no exterior
pg. 15
pg. 18
pg. 20
pg. 23
A ÁREA DE ESTUDO
pg. 25
Histórico
Perfil atual
Novos projetos
PROJETO
pg. 26
pg. 31
pg. 36
pg. 39
Requalificação do Edif. Domingos Fernandes Alonso
Centro de Cultura Afro-Brasileira
BIBLIOGRAFIA
pg. 45
pg. 74
pg. 88
4
Inúmeras têm sido as propostas para a recuperação do Centro de São
Paulo. Projetos pontuais prometem promover a reabilitação de seus
entornos, atraindo investimentos e valorizando a região. Recursos
vultosos são empregados no setor cultural, com a implantação de
edifícios modernos e pomposos. O cenário que se configura gera
expectativa, impressionando e convencendo a população de que uma
verdadeira reforma urbana se concretizará.
Não é bem isso que acontece. Mais uma vez a cidade é contemplada
com intervenções que favorecem apenas as classes dominantes e que
geram um processo de expulsão das camadas mais pobres da
população. A elite promove uma “reintegração de posse”, voltando a
mostrar interesse por uma área que, por décadas, preferiu abandonar.
Às classes menos favorecidas não resta opção senão a ocupação das
periferias, provocando uma expansão excessiva e desordenada da
cidade, que atinge inclusive as áreas de preservação.
deveria ser esquecida, mas sim ressaltada. A presença da Igreja de
Nossa Senhora do Rosário dos Homens Pretos é fruto de muita
resistência às políticas segregacionistas que guiaram a evolução das
áreas centrais.
A partir dessas premissas, a proposta que segue pretende definir um
projeto integrado, voltado para uma área específica, mas baseado no
contexto da área central como um todo.
Vale mencionar ainda que a opção pelo trabalho em dupla surgiu da
pertinência em se fundir duas propostas originalmente distintas, contudo
complementares: a “Requalificação de Edifício para Habitação” e a
“Produção de Equipamentos Sociais no Centro”. Com isso, possibilitouse o estabelecimento de uma discussão mais aprofundada e a
elaboração de um estudo mais abrangente.
Diante desse quadro, este trabalho procura esboçar uma proposta de
reabilitação de espaço degradado na área central, baseada não só na
melhoria da qualidade ambiental, mas, sobretudo, na inclusão social,
procurando atender às necessidades básicas da população.
A produção de habitação de interesse social é colocada como o
elemento-chave para o processo de transformação espacial e social,
uma vez que concilia a necessidade de revitalização da área central à
enorme demanda por moradia popular. Da mesma forma, a implantação
de novos equipamentos sociais é considerada indispensável, tendo em
vista a necessidade de ampliar a oferta destes serviços, já deficitários.
Levando-se em conta a presença significativa de imóveis ociosos no
Centro de São Paulo, opta-se pela requalificação de edifícios,
acreditando-se ainda que a conversão de usos, além de otimizar a
estrutura já instalada, funcionaria como um instrumento de preservação
do patrimônio arquitetônico.
As especificidades da área de intervenção também determinam
elementos definidores da proposta. O Largo do Paissandu, objeto de
estudo, guarda, sobretudo, uma história peculiar, que não podia, nem
5
CONTEXTUALIZAÇÃO HISTÓRICA
6
A FORMAÇÃO DO TRIÂNGULO
Antes de se tornar a metrópole que é hoje, a cidade de São Paulo viveu
um longo período de grande isolamento em relação ao resto do país,
devido principalmente à sua localização geográfica, tendo a Serra do
Mar como grande barreira.
Fundada pelos jesuítas, São Paulo surgiu, em 1554, como um pequeno
núcleo populacional implantado no topo de uma colina, favorecido pela
presença de dois rios: o Anhangabaú e o Tamanduateí. Diante de sua
difícil acessibilidade, agravada pela relativa pobreza de suas terras,
apresentou, inicialmente, um crescimento muito lento.
“Na verdade, a colina histórica constituía um recinto quase fechado pela
natureza, em virtude das escarpas abruptas que a separavam dos rios
Anhangabaú e Tamanduateí.”1
Dessa forma, até a primeira metade do século XIX, a cidade
restringiu-se quase que inteiramente ao tradicional Triângulo,
formado pelas atuais rua Direita, São Bento e Quinze de Novembro,
tendo como centro administrativo o Pátio do Colégio. Além da colina, já
havia uma ocupação rarefeita, composta por chácaras e pequenos
núcleos residenciais. A transposição do vale se dava por duas pontes,
uma ao fim da Ladeira de São João e outra no Piques, que, no entanto,
não favoreceram a expansão do povoamento.
Somente a partir das décadas de 1870-80, São Paulo iniciou seu
processo ininterrupto de crescimento urbano, devido ao sucesso da
produção cafeeira no interior e aos conseqüentes investimentos na
produção de bens manufaturados, dando origem ao processo de
industrialização. Para tanto, foi de essencial importância a localização
geográfica da província, o que lhe atribuía um papel estratégico entre
as regiões produtoras e o porto exportador de Santos. A situação foi
1
MÜLLER, N. L. – “A Área Central da Cidade”. IN: AZEVEDO, Aroldo de
(direção) e outros. A Cidade de São Paulo – Estudos de Geografia Urbana –
vol. II, pg. 136.
favorecida ainda por sua condição de centro político-administrativo,
comercial e cultural da região e, sobretudo, pela construção da rede
ferroviária, datando de 1865 a viagem inaugural da São Paulo Railway
e, dez anos mais tarde, a inauguração da Sorocabana.
Nesse período, a cidade assiste a um crescimento populacional
acentuado, sobretudo com a chegada dos imigrantes2, o que faz
com que as elites busquem áreas mais resguardadas da atribulação
do Centro.
A TRANSPOSIÇÃO DO ANHANGABAÚ
Dentro desse quadro, acelerou-se o processo de ocupação da
margem esquerda do vale do Anhangabaú, sobretudo com o
loteamento da Chácara do Chá, em 1876, quando os arredores da Praça
da República já se encontravam parcialmente ocupados.
“Loteada aquela área, ali se instalaram famílias tradicionais da época,
que ‘mandaram construir bonitos prédios’ na rua Barão de Itapetininga.
Por isso mesmo, o Centro teria de encontrar, nesse ponto, maior
resistência à sua expansão.”3
Essa resistência à expansão, citada por Müller, manteve-se durante as
três primeiras décadas do século XX. A construção do Viaduto do
Chá, em 1892, embora se configurasse como uma imponente
transposição física do vale, não garantia a efetiva acessibilidade à
margem oposta, devido à inicial cobrança de pedágio. Tal iniciativa
demonstra o intuito de se atender somente a elite, que passava a ocupar
as terras a oeste. Mesmo após manifestações populares conseguirem a
2
“De cerca de 31 mil habitantes em 1872, a população passou a cerca de 65
mil em 1890, chegando a 240 mil em 1900 e 357 mil em 1910”. IN: SILVA,
Helena Menna B. Habitação no Centro de São Paulo: como viabilizar essa
idéia?, pg. 5.
3
MÜLLER, N. L. – idem, pg.140.
7
liberação do tráfego, os terrenos além-Anhangabaú, por não
apresentarem uma diversidade e complexidade funcional, ainda não se
caracterizavam como uma extensão do antigo Centro. Por outro lado, a
travessia pela Rua São João, via eminentemente comercial,
configurava-se como o principal vetor de expansão do Centro, mesmo
após a construção do Viaduto do Chá.
“Com efeito, no início do século XX, (...) o Centro (...) ensaiou uma
tímida expansão para a margem esquerda do Anhangabaú, através da
antiga Rua de São João, embora não fosse muito além do atual Largo
do Paissandu. (...) Depois daquele largo, iniciava-se um bairro
essencialmente residencial (...).”4
Adiante da Chácara do Chá, surgiram, ainda, novos bairros de caráter
aristocrático e exclusivamente residenciais, como os Campos Elísios
e Higienópolis, além da abertura da avenida Paulista, em 1891. Esses
loteamentos eram estimulados pelo poder municipal, por meio da
isenção de impostos durante os primeiros anos, e seu padrão de
ocupação garantido pela própria legislação urbanística. É nítida a
influência, já nesta época, do interesse das classes dominantes na
configuração do território, induzindo seu crescimento a Sudoeste.
A passagem para o século XX, momento em que se implantou o
regime republicano, foi marcada por intervenções urbanas
preocupadas apenas em transmitir uma imagem de modernização
da cidade – em contraste à administração anterior – o que, na prática,
implicou principalmente no afastamento da pobreza.
Leia-se
afastamento e não combate à pobreza (Reis, 1994).
Segundo Helena Menna Barreto, “As transformações no espaço e no
uso no centro eram também fundamentais para criar condições de maior
rentabilidade para o investimento imobiliário e se articulavam com os
objetivos da política sanitarista, no sentido de evitar as habitações
populares, necessariamente precárias.”5
4
5
MÜLLER, N. L. – ibidem, pg.137.
SILVA, Helena Menna B. Idem, pg. 6.
Sob o governo do prefeito Antônio Prado (1899-1910), elaboraram-se os
primeiros planos urbanísticos para o centro de São Paulo, cuja execução
teve início, em 1903, com a demolição da Igreja do Rosário, que cedeu
lugar à atual Praça Antônio Prado. Dentre as obras realizadas pelo
chamado “Plano de Melhoramentos”, estão a canalização do
Anhangabaú, concluída em 1906, a construção do viaduto Santa Ifigênia
em 1913, além da remodelação do vale. Elaboradas diversas propostas,
o redesenho do Vale do Anhangabaú seguiu as diretrizes do Plano
Bouvard que, atendendo aos interesses públicos, era marcado por seu
apelo estético nos moldes franceses. Finalizadas as obras, em 1918, o
Vale se torna reduto da elite paulistana.
“Invertia-se, portanto, a polarização da cidade. O que havia sido a sua
porta de entrada, local de habitação do governador e das famílias mais
abastadas, na parte leste da colina, transformava-se agora em zona
industrial. O lado oposto, que durante séculos foi considerado o quintal
da cidade, o Vale do Anhangabaú, transformou-se no ponto central da
cidade, no seu cartão de visitas, a partir do qual se tinha acesso, pela
Avenida São João e pelos seus viadutos, aos bairros residenciais de alta
renda.”6
Essa transferência de valor criou uma nova centralidade, imposta
pelas classes dominantes e concretizada pelas intervenções do
poder público. Evidencia-se, assim, o quadro de segregação espacial
que se instalava, marcado pela valorização das terras e protegido
pela própria legislação urbanística.
“Através da segregação, as camadas de alta renda dominam o espaço
urbano não só produzindo suas áreas residenciais nas áreas mais
agradáveis e bem localizadas, mas também atuando sobre toda a
estrutura urbana segundo seus interesses”.7
6
REIS FILHO, Nestor Goulart. Algumas Experiências Urbanísticas do Início da
República: 1890-1920, pg. 49.
7
VILLAÇA, Flávio. “Efeitos do Espaço sobre o Social na Metrópole Brasileira”.
IN: SOUZA, Maria Adélia A. e outros. Metrópole e Globalização. Conhecendo a
Cidade de São Paulo, pg. 224.
8
A CONFIGURAÇÃO DE UM “CENTRO NOVO”
A margem esquerda do Anhangabaú, área ocupada majoritariamente
por chácaras, assiste, já em 1808, à abertura de diversas ruas, cujo
núcleo central situava-se no atual Largo do Arouche. Décadas mais
tarde, é construído o Largo dos Curros, hoje Praça da República, não
com a configuração de uma praça, mas como uma área destinada à
realização de touradas. Ainda nesta época, foi aberta a Rua dos
Bambus, atual Avenida Rio Branco. Nas terras da então Chácara do Chá
implantou-se, em 1876, a Rua do Chá, hoje Barão de Itapetininga, além
das atuais Xavier de Toledo, Conselheiro Crispiniano, Dom José de
Barros e 24 de Maio.
Apesar desse arruamento, a ocupação do lado oeste do vale, durante
as duas primeiras décadas do século XX, não se incorporou ao
antigo Centro, por não apresentar ainda uma diversidade funcional.
Caracterizava-se essencialmente por residências e pensões – instaladas
nos terrenos mais próximos às margens do rio, até o Paissandu –
enquanto as áreas mais distantes, como a Praça da República e o Largo
do Arouche, abrigavam atividades de pouco prestígio, caracterizando-se,
inclusive, como zona de meretrício. Data de 1894 a instalação, na Praça
da República, da Escola Normal e conseqüente urbanização da praça.
A fixação das elites na Barão de Itapetininga impulsionou uma rápida
valorização desta área, que teve início com a construção do Viaduto do
Chá e culminou com o plano de Bouvard para o Anhangabaú e a, quase
simultânea, construção do Teatro Municipal, inaugurado em 1911.
No período que se seguiu, novos usos viriam a se instalar na região,
atraídos pela presença dos nobres moradores e contemplando o cenário
glamouroso que ali se instalava. Além de comércio e serviços
requintados, novos edifícios passaram a abrigar escritórios e atividades
culturais. Configurava-se uma nova dinâmica, que viria a promover
efetivamente uma expansão do Centro, incorporando o lado oposto
do vale: o “Centro Novo”.
“Foi somente nos últimos vinte anos que teve lugar a integração ao
Centro da área compreendida entre o Vale do Anhangabaú e a Praça da
República; e o fato se tornou indubitável notadamente a partir do ano de
1940. (...) Para isso concorreram muitos fatores: a mudança da ‘Casa
Mappin’ ou ‘Anglo-Brasileira’, da Praça do Patriarca para a Praça Ramos
de Azevedo (1939), a abertura da Rua Marconi (1938) e a construção do
novo Viaduto do Chá (que, com sua estrutura de cimento armado,
substituiu o velho viaduto de estrutura metálica e pavimento de tábuas),
entregue ao público em 1936 – constituíram os fatores principais dessa
fulminante marcha do Centro, no rumo de Oeste.”8
O crescimento da cidade para além do Centro Histórico está
intimamente ligado às mudanças econômicas que ocorreram na
passagem para o século XX. Devido à abolição da escravatura e
conseqüente salto populacional (imigração européia), o capital dos
investidores passa a ser aplicado em terras, levando a um novo
processo de construção da cidade e da legalidade urbana.
Enquanto, na formação inicial da cidade, avançava-se de acordo com a
real necessidade de ocupação, sem planejamento ou desenho, a partir
do momento em que a propriedade fundiária passa a ser o lastro do
capital, surgem inúmeros empreendimentos imobiliários (loteamentos e
arruamentos), independentes da necessidade de expansão da
cidade – “separação entre a propriedade e a efetiva ocupação”
(ROLNIK, 1997). Inicia-se um intenso processo de especulação
imobiliária, que determinaria a configuração sócio-espacial da
futura metrópole.
Vale ressaltar, que a presença de um projeto de ocupação, aliado às
condições topográficas além-Anhangabaú, levaram à marcante
diferença de traçado viário entre Centro Velho e Centro Novo: ruas
desalinhadas e irregulares de um lado, contrapondo-se ao traçado mais
regular e até ortogonal dos novos bairros recém-loteados.
8
MÜLLER, N. L. Ob. cit., pp.142 e 143.
9
O ESVAZIAMENTO DO CENTRO
Já no final do século XIX, verifica-se uma política de expulsão das
camadas populares da área central, evidenciada pelo Código de
Posturas do Município e pelo Padrão Municipal, que tentavam acabar
com a presença dos cortiços. Tal intenção seria reforçada pelas
intervenções implementadas pelos Planos de Melhoramentos e pela
introdução da iluminação pública, que levaram a uma acentuada
valorização imobiliária e à possibilidade de novos usos. Por outro
lado, as camadas mais ricas já se dirigiam aos bairros
exclusivamente residenciais de alto padrão, desocupando casarões,
que viriam a abrigar inúmeros cortiços.
A valorização da área central impulsionou seu processo de
verticalização, iniciado no final do século XIX, o que levou a um
significativo adensamento (vide tab.1). Os problemas de tráfego
foram acentuados, sobretudo com o crescimento da frota de automóveis
e com o desinteresse na implementação de um sistema de
transporte de massa eficiente. A dificuldade de acessibilidade a áreas
mais distantes dificultava o processo de expansão, apesar da
“saturação” do Centro.
Tabela 1 – Cidade de São Paulo – Expansão predial (1886-1900).
ano
Fonte: MÜLLER, N. L. – “A Área Central da Cidade”. IN: AZEVEDO, Aroldo de (direção)
e outros. A Cidade de São Paulo – Estudos de Geografia Urbana – vol. III, pg. 143.
1886
1891
1895
1900
prédios
7012
10321
18505
21656
população
44030
99930
184145
239820
pessoas/prédio
6,27
9,69
9,95
11,07
Fonte: BONDUKI, Nabil. Origens da habitação social no Brasil, pg. 20.
O Plano de Avenidas (1929), aliado à implantação de uma rede de
transporte coletivo (ônibus), viria a impulsionar o crescimento
horizontal da cidade, pretendendo desafogar a área central e
solucionar a demanda por moradia, com a ocupação da periferia.
10
Com a Segunda Guerra, a crise econômica iniciada em 1929 se
agravaria. As altas taxas de inflação tornavam os imóveis para aluguel
pouco rentáveis, sendo melhor negócio mantê-los fechados. A
promulgação da Lei do Inquilinato (1942), que, ao congelar o valor dos
aluguéis, acabou por elevá-los, aumentou o número de despejos e a
demanda por habitação popular.
Esse processo se repetiria com a ocupação da Paulista, a partir da
metade do século XX, e, novamente, nos anos 80, com a consolidação
dos eixos Faria Lima e Berrini. Essa novas centralidades,
caracterizadas por usos especializados, diferenciam-se do centro
tradicional e contrariam o próprio conceito de centro urbano,
baseado na diversidade funcional.10
Diante desse quadro, não restou à população mais pobre outra
alternativa senão seu deslocamento para a periferia. O poder público
mais uma vez adotava uma postura excludente e descompromissada,
deixando a questão habitacional a cargo da autoconstrução em áreas
distantes e completamente desprovidas de infra-estrutura, reduzindo ao
mínimo a necessidade de investimentos em moradia.
“O centro tradicional, enquanto foi centro da minoria – das burguesias –,
era o centro da cidade. Hoje, ele é o centro da maioria popular.
Justamente agora que o centro ‘velho’ é o centro da cidade – pois agora
ele é o centro da maioria –, a ideologia dominante declara que a cidade
tem um novo centro. É curioso. O centro novo, segundo a ideologia
dominante, passa a ser o centro da minoria. É o processo de
universalização do particular por parte da classe dominante. O ‘seu’
centro deve ser sempre o centro da cidade.”11
“(...) longe de representar ausência de planejamento, o padrão periférico
responde a uma estratégia de máxima acumulação capitalista. (...) o
modelo amplia as possibilidades de especulação imobiliária e de
rendimento eleitoral através de uma política clientelista, que barganha
apoio nas urnas por algumas melhorias urbanas, ainda que modestas,
em bairros dispersos”.9
Desta forma, o uso habitacional foi transferido para outras regiões,
restando poucos moradores, em sua maioria vivendo ilegalmente em
cortiços. O Centro passou, então, a se configurar como um pólo
exclusivo de comércio e serviços.
Contudo, já nas décadas de 50 e 60 inicia-se o deslocamento de
centralidade para a Avenida Paulista, sob a alegação de se encontrar
o Centro degradado e obsoleto, enfrentando problemas de trânsito e
poluição.
É importante verificar que essa transferência de centralidades é
determinante no processo de metropolização de São Paulo. No
início do século, com a transposição do Anhangabaú, as elites passam a
ocupar o Centro Novo, levando consigo comércio e serviços de melhor
padrão e abandonando o Centro Velho para as camadas populares.
9
ROLNIK, Raquel; SOMEKH, Nádia; KOWARICK, Lúcio (org.). São Paulo:
Crise e Mudança, pg. 77.
10
“O distrito, e sem dúvida o maior número possível de segmentos que o
compõem, deve atender a mais de uma função principal; de preferência, a mais
de duas. Estas devem garantir a presença de pessoas que saiam de casa em
horários diferentes e estejam nos lugares por motivos diferentes, mas sejam
capazes de utilizar boa parte da infra-estrutura”. JACOBS, Jane. Morte e Vida
das Grandes Cidades, pg. 167.
11
VILLAÇA, Flávio. Espaço Intra-Urbano no Brasil, pg. 346.
11
A SITUAÇÃO ATUAL
A partir dos anos 60, a área central apresenta um acentuado
decréscimo populacional, em contraposição às periferias, que
passam a receber contingentes de moradores cada vez maiores.
Tabela 2 – Evolução da participação relativa das populações,
segundo zonas (1960, 1970, 1980).
Zonas do município
Centro Histórico
Centro Expandido
Oeste
Sul
Sudeste
Leste 1
Leste 2
Norte 1
Norte 2
Município de SP
1960
10,1
22,1
1,9
8,1
17,2
14,9
3,3
2,5
19,9
100,0
1970
5,5
15,8
3,0
14,5
15,2
14,4
8,4
3,2
20,0
100,0
passou a ser um enorme entrave ao seu desenvolvimento, um grande
problema aos olhos do poder público. Os dados apresentados na tabela
3, além de comprovar o citado esvaziamento da área, mostram que esse
processo se estendeu até o final do século, fato evidenciado pelas
gradativas taxas negativas de crescimento populacional.
Simultaneamente, comparando-se estes índices aos da zona leste,
evidencia-se uma intensa periferização da população.
Tabela 3 – AR Sé – População residente e taxa de crescimento.
1980
3,8
13,5
3,7
19,8
13,0
12,9
11,9
3,4
18,0
100,0
Fonte: SILVA, Helena M. Barreto. Documento preparatório para o encontro ‘Habitação no
Centro de SP: como viabilizar essa idéia?’, pg. 9.
Com esse esvaziamento, o Centro teve seu processo de deterioração
intensificado. O aumento do número de imóveis ociosos
possibilitou a fixação das camadas populares nesta área, contudo,
em condições precárias, transformando casarões e edifícios antigos
em cortiços. Configurava-se, assim, um quadro completamente
desfavorável ao retorno do interesse pela região, que, mesmo
sofrendo intervenções pontuais, permaneceu abandonada pela
sociedade.
Com os anos, a falta de segurança e a desvalorização imobiliária na
área central atingiram tais dimensões, que o “coração” da metrópole
População
Distritos
1980
1991
1996
2000
Taxa de
crescimento
80/91 91/96 96/00
85416
71825
64895
63143
-1,56
-2,01
-0,7
Bela Vista
47588
36136
27788
26569
-2,47
-5,12
-1,1
Bom Retiro
38630
33536
26665
24505
-1,28
-4,48
-2,0
Brás
44851
37069
32089
28620
-1,72
-2,84
-2,7
Cambuci
77338
66590
58588
54301
-1,35
-2,53
-1,8
Consolação
82472
76245
64349
61850
-0,71
-3,34
-1,0
Liberdade
26968
21299
15434
14521
-2,12
-6,24
-1,5
Pari
60999
57797
49666
47459
-0,49
-2,99
-1,1
República
94542
85829
75826
71111
-0,88
-2,45
-1,5
Santa Cecília
32965
27186
21255
20103
-1,74
-4,80
-1,3
Sé
591769
513512
436555
412182
-1,20
-3,00
-1,4
Total AR-Sé
8493226
9646185
9839436 10405867
1,16
0,40
1,4
Mun. SP
Fonte: PMSP, SEMPLA. São Paulo em Números, pp. 42 e 43. 2000 e 2001.
Contudo, dotada de ampla infra-estrutura e dispondo de farta rede de
transportes – sobretudo após a construção do metrô –, a região,
mesmo degradada, continuava a apresentar um potencial elevado de
reocupação. Dessa forma, a década de 90 veio a assistir à chamada
“revalorização” do Centro, marcada por mudanças grandiosas, como é
o caso da remodelação do Anhangabaú e requalificação da área da Luz.
Elaboraram-se ainda projetos pontuais, como o Shopping Light, a Sala
São Paulo, a reforma da Pinacoteca, do antigo DOPS e do prédio dos
Correios. Estes funcionariam como “âncoras culturais” que,
teoricamente, desencadeariam um processo de recuperação do entorno.
12
Entretanto, vale ressaltar que tais intervenções, assim como os Planos
de Melhoramentos do início do século, voltaram-se unicamente ao
embelezamento e valorização imobiliária da região, não atendendo
às classes de menor poder aquisitivo. Pelo contrário, o que se
observa é, mais uma vez, a expulsão progressiva dessa população e
a formação de um “Centro cultural” restrito à elite, evidenciando
descaso frente aos problemas sociais, que só tendem a serem
acentuados.
“O grande risco desse enfoque das coisas é que a gente pode
descambar para a estética urbana, não é isso? E para a cosmética
urbana, que é a grande moda atual. E para o divertimento das pessoas.
E, com isso, se desvia também a direção política. Você não enfrenta os
problemas: oferece, cristalizados, os novos espaços”.12
Desse modo, a implantação desses edifícios culturais, apesar de
exercerem um papel importante como chamariz do público, apresenta
um caráter segregacionista e isolado, não havendo integração com
outras propostas de cunho social. Essa prioridade por projetos culturais
elitistas deve-se, em parte, à parceria com a iniciativa privada, que os
utilizou como instrumentos de propaganda, valendo-se, ainda, das leis
de incentivo à cultura.
“A reintegração de posse exige a saída daqueles que ‘indevidamente’
ocuparam o Centro, durante os anos em que a elite estava mais
interessada nos novos bairros exclusivos do setor sudoeste da cidade”.13
Hoje, é consenso que, para a efetiva requalificação da área central, é
necessária uma diversidade funcional que garanta sua ocupação em
tempo integral, e por toda a população. Para tanto, o incentivo ao
retorno do uso residencial socialmente diversificado é fundamental, o
que atenderia, também, parte da demanda metropolitana por
habitação social, reduzindo o crescimento horizontal da cidade e a
pressão em áreas ambientalmente frágeis (mananciais).
Nos últimos anos, a realização de ocupações de edifícios por parte
dos movimentos populares veio a aumentar a pressão por moradia de
interesse social no Centro, denunciando o problema habitacional e o
abandono de imóveis públicos e privados. Paralelamente, instrumentos
legais vieram a facilitar e estimular a implantação de uma política de
reabilitação. A aprovação do Estatuto da Cidade, em 2001, permite a
aplicação de novas medidas como, por exemplo, o IPTU progressivo,
que viria a reduzir a subtilização de imóveis. A recente aprovação do
novo Plano Diretor trará novas possibilidades, como, por exemplo, a
instituição de ZEIS.
Ainda na tentativa de atrair o investimento privado, em 1997 concebeuse a Operação Urbana Centro, instrumento legal que permite alterar
normas do zoneamento, aumentando, sobretudo, o potencial construtivo
dos lotes. Apesar de tal medida objetivar o adensamento da área de
influência, ao gerar uma valorização dos imóveis, tende a afastar as
camadas populares, impossibilitadas de arcar com os novos valores. Tal
processo vem a promover, portanto, uma “reintegração de posse” por
parte da classe dominante.
13
12
SANTOS, Milton. Cadernos do Le Monde Diplomatique - Um outro mundo
urbano é possível. IN: http://www.forumcentrovivo.hpg.ig.com.br.
ANDRADE, Julia; ARANTES, Pedro; FIX, Mariana; LEITE, José Guilherme;
WISNIK, Guilherme. “Notas sobre a Sala São Paulo e a nova fronteira urbana
da cultura” IN: Revista Pós, no 9, pp. 192 a 209.
13
A QUESTÃO DA HABITAÇÃO
14
QUADRO GERAL
Paulo, uma vez que a segregação social torna-se insuficiente para
garantir o conforto da classe dominante.
A ausência de um planejamento integrado permitiu que a cidade de
São Paulo, surgida a partir de um pequeno núcleo populacional,
crescesse sem qualquer parâmetro, limite ou condição, atingindo
rapidamente proporções gigantescas, o que traria à tona diversas
deficiências embrionárias. Com o sucesso da atividade cafeeira e o
surgimento de atividades urbanas ligadas a ela, problemas antigos
tornaram-se inaceitáveis. Este é o caso, sobretudo, das habitações
precárias que até então configuravam o cenário paulistano.
“Se a expansão da cidade e a concentração dos trabalhadores
ocasionou inúmeros problemas, a segregação social do espaço impedia
que os diferentes estratos sociais sofressem da mesma maneira os
efeitos da crise urbana(...)” 15
A partir da década de 1880, quando o café vem a promover uma
extraordinária expansão do mercado de trabalho, a precariedade com
que se aloja a imensa massa de trabalhadores passa a constituir uma
grave ameaça à saúde pública. A significativa vinda de imigrantes,
marcada pela instalação da Hospedaria dos Imigrantes em 1886, viria a
acentuar a crise.
Com a publicação do Relatório da Comissão de Exame e Inspeção das
Habitações Operárias e Cortiços no Districto de Santa Ephigênia (1894),
a precariedade dos bairros operários é evidenciada e passa a ser
encarada como uma ameaça à saúde pública, tornando-se incômoda
inclusive à classe dominante. Desta forma, não sem uma certa
pressão, higienistas, engenheiros e médicos passaram a ocupar papéis
importantes na administração pública, introduzindo o controle sanitário
das habitações, criando legislação e códigos de postura e participando
diretamente de obras de saneamento das baixadas, urbanização da área
central e implantação de infra-estrutura.
É nesta época que a cidade enfrenta seu primeiro surto populacional,
chegando a atingir uma taxa de crescimento de 28% entre 1890 e 1893
(Morse, 1970). A mancha urbana passa a se expandir em todas as
direções, com o loteamento de chácaras e abertura de novos bairros.
Com isso, a cidade passa a enfrentar sérios problemas referentes à
infra-estrutura urbana, sobretudo no referente aos transportes e às
redes de abastecimento de água e coleta de esgotos.14
Entretanto, vale ressaltar que as medidas sanitaristas traziam uma
clara intenção de eliminar os cortiços e demais aglomerações operárias
da área central, objetivando, antes de mais nada, promover uma
limpeza social, acelerando o processo de segregação por meio da
intervenção pública (Bonduki, 1998). Além disso, constituíam
instrumento de controle social, uma vez que regulamentavam não só
o espaço urbano, mas também o comportamento dos moradores,
infringindo a privacidade.
Entretanto, os últimos quinze anos do século XIX seriam marcados
apenas pela piora das condições de vida da classe operária, registrandose aumento da taxa de ocupação das moradias e do valor dos aluguéis.
Por outro lado, investia-se em novos bairros de luxo, onde se alojava a
elite cafeeira, indiferente à deterioração e preocupada em reproduzir
para si um cenário semelhante às grandes capitais européias. É então
que surgem os primeiros indícios de segregação espacial em São
Apesar dos investimentos em melhorias para as habitações operárias,
havia um problema maior: o reduzido número de unidades. No
entanto, o poder público rejeitou a possibilidade de produção direta de
moradia, passando a responsabilidade às mãos do setor privado, com a
concessão de favores. “Construir casas, ‘assumindo o papel capitalista’,
era incompatível com a concepção liberal do estado vigente até 1930”.16
15
14
Até então, as únicas iniciativas neste campo provinham de particulares que
detinham concessões públicas (Bonduki, 1998).
16
BONDUKI, Nabil. Origens da habitação social no Brasil, pg. 20.
BONDUKI, Nabil. Idem, pg. 40.
15
Desse modo, surgem, nesse período, as vilas operárias, construídas
por empresas e destinadas a seus funcionários ou por investidores
privados, objetivando o mercado de locação. As vilas, além de
consideradas o modelo almejado pelos higienistas, constituíam uma
forma de controle dos operários, estendendo a ditadura das fábricas
às horas livres. Segundo Rolnik (1981), “funciona como um verdadeiro
laboratório de uma sociedade disciplinar, combinando um saber
higienista com um poder que ao mesmo tempo proíbe, pune, reprime e
educa”.
Entretanto, esta surtiu efeito contrário, ocasionando alta dos preços e
conseqüentes despejos.
Por outro lado, a produção rentista de habitação gera um aumento no
número de habitações coletivas e precárias – os cortiços – uma opção
rentável para o proprietário e mais econômica para o operário.
Na década de 40, as grandes cidades brasileiras vêm a assistir a uma
intensa crise habitacional, ocasionada não só pela eclosão da
Segunda Guerra, que traria a alta dos preços, mas também pelo
impasse do Estado entre investir no desenvolvimento tecnológico ou na
supressão do déficit habitacional (Bonduki, 1998). A situação seria
agravada ainda por um significativo êxodo rural.
É somente a partir de 1930, com a ditadura Vargas, que a habitação
social é tomada como preocupação do poder público, sendo encarada
como condição básica de reprodução da força de trabalho e como
elemento de formação ideológica, política e moral do trabalhador,
características essenciais para se promover o tão almejado
desenvolvimento nacional (Bonduki, 1998).
Dessa forma, o problema da moradia tornou-se um tema
multidisciplinar, mobilizando desde técnicos a intelectuais. Neste
período, merece destaque a atuação dos IAPs (Institutos de
Aposentadoria e Pensão), criados a partir de 1937. Apesar da produção
reduzida, contribuíram com alguns projetos de significativo valor
arquitetônico, e mesmo inovadores, como é o caso dos conjuntos
residenciais de Pedregulho e da Gávea. Passou-se a incentivar a
racionalização e a produção em maior escala, buscando-se sempre
estimular a industrialização.
Por outro lado, o mercado rentista passou a ser encarado como algo
ineficiente na produção social de moradia, uma vez que, além de
proporcionar uma oferta escassa, ainda “engolia” os subsídios, que
vinham em forma de isenção fiscal, encontrando-se aluguéis cada vez
mais exorbitantes. Para conter tal processo, o governo instituiu a Lei do
Inquilinato (1942), que viria a congelar os valores dos aluguéis.
Neste contexto, ganha espaço a casa própria unifamiliar, cuja
aquisição se tornava possível com a criação de linhas de
financiamento. Tal opção aparece como algo extremamente oportuno,
visto que, além de constituir importante instrumento de marketing para o
Estado, era uma forma de afastar a população pobre das áreas centrais,
transferindo-as para as periferias, onde os preços eram-lhe acessíveis.
O cenário paulistano neste período é realmente contraditório: apesar da
crise habitacional, a cidade assiste à implantação de grandes e
imponentes avenidas e ao surgimento de arranha-céus, que
pretendiam exibir o apuro tecnológico.
Diante dessa crise, a solução de moradia passa a ser a autoconstrução
em bairros periféricos completamente desprovidos de infra-estrutura.
Tem início também nesta época o desenvolvimento de favelas, a
princípio nas áreas centrais, numa tentativa de assegurar a proximidade
do local de trabalho. Ocupava-se terrenos ociosos ou mesmo impróprios
a assentamentos habitacionais.
Em 1946, o prefeito Abraão Ribeiro implantou os primeiros alojamentos
provisórios (“pulmões”) da cidade de São Paulo, objetivando eliminar,
rapidamente, as favelas que se implantavam no Centro da cidade,
chocando à elite paulistana. Tal intervenção, apesar do caráter paliativo,
viria a criar tradição, como uma etapa do processo de desfavelamento e
remoção, que muitas vezes não chega a ser concluído.
16
Vale ressaltar que até a década de 70 o crescimento de favelas em São
Paulo permaneceu restrito, uma vez que a enorme oferta de lotes na
periferia constituía uma opção de vida mais digna para a população.
Ainda em 1946, é instituída a Fundação da Casa Popular, primeiro órgão
de âmbito nacional a atuar exclusivamente na provisão de habitação
social. Entretanto, devido a questões político-econômicas, este teve
uma produção bastante reduzida.
Em 1964, sob a ditadura, os IAPs são extintos, cedendo lugar ao
Sistema Financeiro de Habitação (SFH) e ao Banco Nacional de
Habitação (BNH), uma tentativa não só de produzir habitação em
massa, mas também de estimular a conjuntura econômica – que
enfrentava forte crise – por meio da criação de empregos na indústria da
construção.
A partir de então as políticas habitacionais concentraram-se apenas na
construção de grandes conjuntos periféricos. Em muitos casos, a
economia realizada na compra dos terrenos desaparecia frente aos
enormes gastos com infra-estrutura e equipamentos (Silva, 2000).
Consolidava-se um quadro de especulação imobiliária e segregação
espacial.
Em 1986, com o Plano Cruzado 2, o BNH foi extinto e incorporado à
Caixa Econômica Federal. A partir daí pouco se fez, em âmbito nacional,
pela questão da habitação. O SFH entrou em crise, sobretudo a partir de
1991, quando Collor facilitou a quitação da casa própria pela metade do
saldo devedor (Taschner, 1997), o que aumentaria significativamente o
déficit.
financiamento diferentes, dispersando recursos em intervenções
sobrepostas, adotando subsídios sem critérios sociais claros etc”. 17
A partir desses dados, verifica-se que as políticas urbanas no Brasil
sempre procuraram fugir do problema real, adotando medidas paliativas
ou simplesmente ilusórias, o que acontece, sobretudo, no campo da
habitação. Elementos determinantes, como a questão fundiária, são
ignorados por programas de governo (Maricato, 2001). Permite-se que o
mercado imobiliário dite as regras de ocupação da cidade, o que
passa a inviabilizar qualquer proposta de reforma urbana que altere o
quadro vigente.
A partir de 2003, com o novo governo, espera-se grandes mudanças no
quadro habitacional. O Projeto Moradia, proposta elaborada em 2000
sob a coordenação do atual presidente Luís Inácio Lula da Silva, baseiase numa política de articulação do poder público nos três níveis com a
iniciativa privada e as organizações civis. Propõe a instituição de um
Sistema Nacional de Habitação descentralizado e baseado na
participação da sociedade, na ordenação das intervenções por meio de
Planos Habitacionais e na unificação dos sistemas de financiamento,
buscando evitar sobreposição de atribuições e de intervenções.
O Projeto Moradia propõe diversidade de programas e projetos, de
acordo com necessidades e possibilidades específicas, atuando desde a
melhoria das condições existentes (regularização de favelas e
cortiços, urbanização de loteamentos ilegais, requalificação de imóveis e
áreas degradadas, etc) até a produção de novas unidades. Para tanto,
defende a concessão de subsídio às famílias mais pobres e prioriza
as áreas com maior déficit habitacional, contando com a
solidariedade entre Estados e Municípios.
“Após a extinção do Banco Nacional de Habitação (BNH) e da
desestruturação do SFH (Sistema Financeiro de Habitação), que se
caracterizavam, equivocadamente, pela centralização e autoritarismo, o
que se verifica hoje é a total desorganização da área, com a atuação de
diferentes esferas de governo, cada qual adotando regras de
17
CAMARGO, J. A. e SILVA, L. I. L. (coord.). Projeto Moradia, pg. 36.
17
O CASO DE SÃO PAULO
A partir da década de 70, com a acentuada crise econômica pela qual
passava o país, intensificou-se a formação de favelas e cortiços,
sobretudo na cidade de São Paulo. Neste mesmo período, surge o
Movimento de Cortiços, uma forma de organização popular que passa a
pressionar o poder público para ter acesso a programas de melhorias
das moradias. Com isso, evidencia-se a necessidade de reforçar o uso
residencial no Centro.
Entretanto, é somente na administração de 89-92 que surgem
programas abrangentes visando viabilizar a produção de habitação de
interesse social nas áreas centrais. Foi criado o Programa de Cortiços,
que contava com uma linha de financiamento específica, inteiramente
com recursos municipais. Este programa atuava tanto na reabilitação de
edifícios quanto na recuperação de quadras inteiras, com a produção de
novas unidades habitacionais. No entanto, o programa foi interrompido
pela administração seguinte.
É também neste período que a habitação social no Centro passou a
integrar as discussões sobre ZEIS (Zonas Especiais de Interesse Social)
e sobre a legislação específica para HIS (Habitação de Interesse Social).
A partir de 1997, a realização de ocupações de edifícios por parte dos
movimentos populares veio aumentar a pressão por moradia de
interesse social no Centro, denunciando o problema habitacional e o
abandono de imóveis públicos e privados.
Em 1998, foi instituído pela Companhia de Desenvolvimento
Habitacional e Urbano do Estado de São Paulo (CDHU) o Programa de
Atuação em Cortiços (PAC), programa dirigido exclusivamente aos
moradores de cortiços, cujo objetivo é produzir unidades habitacionais a
partir de construção nova ou reforma.
Entretanto, não havia nenhum programa que privilegiasse a reabilitação
de edifícios ociosos do Centro, dentre os quais muitos pertenciam ao
próprio poder público. Sendo assim, intensificaram-se as ocupações dos
movimentos de moradia.
Em 1999, a Caixa Econômica Federal instituiu o Programa de
Arrendamento
Residencial
(PAR),
um
programa
dirigido
exclusivamente à população de baixa renda, que financiava projetos de
até R$20.000,00 por unidade, com a possibilidade de compra ao final do
contrato. Esta linha de financiamento se estende à reabilitação de
edifícios nas áreas centrais para habitação de interesse social.
Contudo, vale ressaltar que o apenas o PAC e o PAR não são
suficientes para garantir uma produção habitacional em massa,
uma vez que esbarram em problemas referentes ao valor do
financiamento, à rigidez dos parâmetros tipológicos e mesmo às
condições de adesão ao programa. Quanto aos projetos de reabilitação,
é imprescindível a criação de uma linha de crédito específica, que
leve em conta as particularidades de um projeto de reforma.
Propostas de adequação de edifícios existentes a novos usos exigem
soluções arquitetônicas diferenciadas, sendo complicado seguir os
padrões aplicados a projetos de unidades novas. Além disso, tratandose de áreas bem servidas de infra-estrutura, seria natural pensar em um
subsídio que auxiliasse na compra do imóvel, uma vez que parte da
infra-estrutura implantada em periferias é subsidiada. O investimento do
poder público, neste caso, seria ainda altamente compensador, visto que
tal medida seria importante não só na supressão do déficit habitacional,
mas também na preservação do patrimônio arquitetônico da cidade.
A aquisição dos imóveis é geralmente a maior limitante dos projetos de
requalificação. Embora o valor de financiamento oferecido pelo PAR
tenha se elevado para R$28.000,00 em 2002, com perspectivas de novo
aumento, os valores de oferta dos imóveis na área central são
altíssimos, sobretudo a partir da última década, quando foram iniciadas
grandes obras de revalorização da região, como os pomposos projetos
culturais. Este problema é, contudo, reflexo de um mercado imobiliário
baseado na especulação e de políticas públicas voltadas para a
segregação.
18
Atualmente, instrumentos legais vieram a facilitar e estimular a
implantação de uma política de “reabilitação social” do Centro. Com a
aprovação do Estatuto da Cidade em 2001 e a recente aprovação do
novo Plano Diretor, São Paulo passa a contar com medidas que deverão
reduzir a subtilização de imóveis como, por exemplo, o IPTU
progressivo, o usucapião de imóvel urbano e o direito de preempção.
Outras medidas devem atuar também no maior aproveitamento dos
terrenos, como é o caso da criação de ZEIS.
Alguns programas de governo também vêm estimulando a produção de
habitação social no Centro, como é o caso do Morar Perto. Programa
instituído pelo poder municipal em 2001, cria perímetros de
intervenção, dentro dos quais deve-se suceder projetos de reabilitação
em massa, aproveitando-se não só edifícios ociosos, como também
terrenos desocupados ou subtilizados.
Outra possibilidade que já vem sendo estudada há alguns anos é a
locação social, uma alternativa que poderia conciliar a capacidade de
pagamento da população com a qualidade da habitação. Esta poderia
constituir uma solução para as muitas famílias retidas pelas atuais
linhas de financiamento por não atingirem a renda mínima exigida ou
não conseguirem comprová-la. Recente pesquisa realizada pela
Fundação Seade e pela CDHU, referente à população encortiçada do
Pari, comprova que 89,1% dos moradores trabalha, mas 42% tem renda
até 3 SM (vide gráfico 1).19
“Se essas famílias tivessem como alugar uma kitchenette no centro,
viveriam no aluguel, mas, como estão na informalidade e ganham muito
pouco, só lhes resta o cortiço.”20
Gráfico 1 – Faixas de renda da população encortiçada de
São Paulo.
mais de 10
faixa salarial (SM)
“(...) é preciso que os agentes promotores e o município definam
estratégias que permitam obter terrenos e imóveis por custos adequados
agora e depois dos investimentos para melhoria. Isso envolve
estratégias de obtenção e instrumentos urbanísticos que produzam
este efeito”.18
4,20%
5 a 10
22,10%
3a5
28,20%
até 3
sem rendimento
42,00%
3,50%
Fonte: FSP, “Cortiço abriga solitário e família pequena”, 05/11/02, pg. C1.
Uma primeira experiência, realizada através de uma parceria entre a
CDHU e a Prefeitura de São Paulo, foi chamada de “concessão onerosa”
e vem sendo testada no empreendimento Pari A, na Av. do Estado. As
famílias residentes nesse edifício pagarão aluguel ao Estado por cinco
anos, tendo a possibilidade da compra no final desse período.
18
SILVA, H. M. B. Habitação no Centro de São Paulo: como viabilizar essa
idéia? (documento preparatório), pg. 42 (grifos do autor).
19
FSP, “Cortiço abriga solitário e família pequena”. 05/11/02, pg. C1.
20
FSP, idem.
19
EXPERIÊNCIAS DE REABILITAÇÃO DE EDIFÍCIOS
Projeto Celso Garcia.
Embora, em âmbito nacional, o quadro habitacional encontre-se
bastante estagnado, ações municipais têm-se mostrado bastante
inovadoras, implementando projetos de regularização de favelas,
recuperação de cortiços e construção de casas próprias sob regime de
mutirão e co-gestão. No caso dos centros urbanos, as experiências que
mais têm se destacado são as reabilitações de edifícios antigos,
originalmente residenciais ou não.
Em São Paulo, embora haja muitos projetos já elaborados, apenas cinco
propostas de reabilitação na área central foram executadas. Todas
contaram com financiamento do PAR, o que muitas vezes prejudicou o
projeto arquitetônico, não só em função das exigências tipológicas que o
programa coloca (ambientes segregados, lavanderias individuais, etc),
mas também pelo valor que disponibiliza. Em muitos casos, exigiu-se um
aumento quase que impossível do número de unidades para que o
projeto fosse viabilizado.
No caso do Projeto Brigadeiro Tobias, elaborado pela assessoria técnica
Integra, a necessidade de aumentar o número de unidades implicou na
construção de mais um pavimento. Em outras propostas, por
exemplo, a elaborada pela COHAB/Pró-Centro para o Edifício da Rua
Assunção, o acréscimo de unidades chega a comprometer a qualidade
arquitetônica do projeto.
Uma dificuldade constantemente encontrada pelos projetos de
reabilitação para habitação social é solucionar a ventilação e a
iluminação das unidades, sobretudo quando se trata de edifícios de uso
não residencial. No caso do Edifício Banespa - Celso Garcia, além da
opção por unidades alongadas nas fachadas, que aproveitavam ao
máximo o caixilho existente, foi necessária a abertura de vãos
internos. Para tanto, foram removidas partes estratégicas da laje,
conservando-se a estrutura. O número reduzido de pavimentos permitiu
o bom desempenho da solução empregada. Entretanto, o custo da obra
sofreu um significativo acréscimo.
Fonte: Integra Cooperativa de Trabalho Interdisciplinar.
O Edifício Fernão Sales, primeiro projeto aprovado pelo PAR em São
Paulo, elaborado por Helena Saia, poderia ter reduzido os custos das
unidades se tivesse mantido o térreo comercial como determinava o
projeto original. Por ser localizado numa esquina da Rua 25 de Março,
importante corredor comercial da cidade, as lojas constituiriam ponto
valorizado. Por outro lado, a conversão de uso pode trazer problemas
acústicos para as residências.
Uma proposta interessante, apresentada para a reconversão do Hotel
São Paulo e elaborada pela assessoria técnica Fábrica Urbana, foi a
miscigenação de usos. Esta proposta, por exemplo, sugere que, além
das unidades residenciais, alguns pavimentos sejam destinados a
serviços públicos e a áreas comerciais, as quais seriam assumidas pela
iniciativa privada, podendo gerar um abatimento no valor das
habitações. Propõe ainda a incorporação de um terreno contíguo, no
qual seriam implantadas áreas de lazer e de convívio.
20
Outra diretriz a ser destacada no projeto do Hotel São Paulo é a
diversidade tipológica das habitações, visando atender famílias de
diferentes tamanhos e mesmo promover uma certa miscigenação social.
Projeto Hotel São Paulo.
semelhantes na França têm optado por tubulações externas, com
grande sucesso, o que demonstra tratar-se de puro preconceito cultural.
A abertura de shafts é necessária em muitos casos, sobretudo quando
há conversão de uso, o que implica na ampliação da rede hidráulica. No
Edifício Banespa, procurou-se amenizar este problema com a
concentração das instalações hidráulicas em um núcleo central. Em
alguns projetos, a passagem vertical da tubulação é solucionada por
poços de ventilação ou de elevadores desativados.
É preciso destacar ainda que, em função das particularidades de cada
projeto e, principalmente, dos gastos na aquisição do terreno, os custos
de reforma apresentam valores bastante variados.
Tab. 4 – Comparativo de custos dos projetos de requalificação
executados.
PROJETO
Fonte: BONDUKI, Nabil e outros. Comissão de Estudos sobre “Habitação na Área
Central”. Relatório Final, pp. 150 e 151.
Edifício Fernão Sales
Edifício Banespa
Edifício Brig. Tobias
CUSTO GLOBAL (m2) CUSTO OBRA (m2)
R$ 346,00
R$ 589,80
R$ 583,83
R$ 134,28
R$ 496,90
R$ 402,30
Fonte: Seminário da Comissão de Estudos sobre Habitação na Área Central, 2001.
Apesar da reabilitação de edifícios contar com diversas vantagens, vale
mencionar que, por se tratar geralmente de edifícios antigos,
abandonados e mal conservados, praticamente nada se aproveita das
instalações elétricas e hidráulicas e, algumas vezes, as próprias
condições estruturais do imóvel apresentam-se comprometidas. No
Projeto Brigadeiro Tobias, um laudo técnico apontou risco de ruína na
estrutura do edifício, o que implicou gastos elevados em reforços
estruturais.
Desta forma, seria importante a criação de linhas de crédito
exclusivamente destinadas a projetos de reabilitação, que
considerassem tais especificidades. O fato do PAR também não aceitar
regimes de mutirão e co-gestão, dificulta ainda mais a redução dos
custos. Fora isso, vale ressaltar a inexperiência da construção civil
brasileira no que se refere à tecnologia de reformas. Com a
especialização do setor, os custos poderiam diminuir.
Uma característica comum aos projetos analisados é a opção por
instalações embutidas, por motivos de aceitação, o que dificulta não só
as obras de reforma, como também a manutenção. Experiências
No Rio de Janeiro, o Programa Novas Alternativas, desenvolvido pela
Secretaria Municipal de Habitação, também tem apresentado resultados
interessantes. Criado com o objetivo de estimular e oferecer opções de
21
moradia nos bairros centrais da cidade, o programa teve início com o
projeto piloto de Reabilitação de Cortiços, o qual promoveu a
recuperação de três imóveis. As obras empregaram recursos do
orçamento municipal e as novas unidades foram ocupadas sob regime
de locação, o que gerou um problema para o poder público por não
contar com um órgão de gestão específico.21
Por tratar-se de um projeto piloto, procurou-se abranger tipologias
bastante variadas, que buscassem exemplificar a diversidade de
soluções possíveis para programas de reabilitação. Tomou-se por objeto
um edifício construído originalmente para abrigar um cortiço, uma
residência unifamiliar posteriormente subdividida e um edifício em ruínas
e abandonado, contudo passível de ser ocupado.
implicou na total reconstrução de seu interior, restaurando-se apenas
as fachadas.
A partir do sucesso deste projeto piloto, o Programa Novas Alternativas
elaborou uma proposta mais ampla, que engloba, além do programa
Reabilitação de Cortiços, o Recuperação de Ruínas e o Recuperação da
Vila Operária, todos voltados à produção de habitação social no centro.
Para tanto, os projetos passarão a contar com as linhas de crédito
oferecidas pelo PAR.
Programa Novas Alternativas – Rio de Janeiro.
As obras de readequação optaram pela diversidade tipológica das
unidades, incluindo cômodos individuais com banheiros coletivos
(numa relação média de 3/1) e residência autônomas, ou seja, com
banheiro e cozinha próprios. No entanto, a configuração geral da
edificação foi mantida, mantendo-se áreas de lavanderia e pátios de
uso comum.
Embora os projetos tenham procurado minimizar as intervenções
internas, em alguns casos, foram necessários reforços estruturais, ou
mesmo, alteração dos elementos construtivos. No Edifício da Rua
Senador Pompeu, 34, as paredes de taipa tiveram que ser substituídas
por blocos de concreto celular, para evitar a sobrecarga, e os pisos de
madeira, irrecuperáveis, deram lugar a lajes de argamassa armada.
Visando a preservação do patrimônio histórico, dois módulos foram
restaurados nos moldes originais.
Fonte: http://www.rio.rj.gov.br/habitacao/.
Contudo, o exemplo mais crítico foi o do sobrado da Rua Sacadura
Cabral. O estado de ruínas do casarão comprometia a estrutura, o que
21
A gestão atualmente fica a cargo da Secretaria de Finanças, o que acarreta
dificuldades de organização, arrecadação e cobrança. Desse modo, as
próximas propostas deverão passar a contar com a parceria da Caixa
Econômica, por meio de seus programas de crédito.
22
A HABITAÇÃO SOCIAL NO EXTERIOR
diferentemente do que ocorre no Brasil, onde as construtoras
contratadas pela CDHU e COHAB são, geralmente, privadas.
A política habitacional francesa, implantada no segundo pós-guerra, é
um interessante modelo a ser estudado, que exemplifica a postura
adotada por muitos países europeus ao assumirem como
responsabilidade do Estado o saneamento do déficit habitacional.
Ao contrário do que ocorre na Europa, as experiências latino-americanas
mais recentes têm partido, geralmente, da ação de grupos sociais,
sobretudo de movimentos populares, justamente em função da ausência
de uma ação efetiva do Estado. A exemplo do Brasil, tais países sempre
conviveram com mercados imobiliários excludentes e políticas públicas
segregacionistas. No entanto, algumas iniciativas populares têm levado
a projetos de reconstrução de centros urbanos, com a produção de
habitação social.22
Tendo em vista a necessidade de uma produção habitacional em massa,
a solução encontrada foi a construção subsidiada de um parque
habitacional de propriedade estatal, ocupado sob regime de locação.
Para tanto, criou-se dois fundos orçamentários, geridos pela Caisse de
Dépots: o de “ajuda à Pedra”, voltado à construção das unidades, e o de
“ajuda à Pessoa”, um subsídio a fundo perdido, dirigido à parcela da
população que não dispõe de condições para arcar com as despesas de
aluguel.
O fato de novas construções apresentarem custos muito elevados,
sobretudo com a alta dos preços promovida pelo fim da Guerra, levou o
governo francês a optar, quando possível, por projetos de reabilitação.
Esta prática, que começou a ser desenvolvida em Paris ainda no século
XIX, com o movimento higienista, era uma forma também de preservar a
paisagem e a configuração do tecido urbano.
Dessa forma, estimulou-se o desenvolvimento da tecnologia de
reforma, o que levou empresas de construção a se especializarem,
passando a atuar exclusivamente no ramo da reabilitação. Atualmente,
cerca de 55% do setor da construção civil francês encontra-se ligado a
este tipo de atividade. Com isso, desencadeou-se um processo
significativo de otimização de projetos e obras, o que levou à redução
de custos e ganho de qualidade na produção.
Vale mencionar ainda que, na França, as atividades de construção
referentes ao Estado ficam a cargo de companhias de construção e
gestão semipúblicas, ou seja, empresas e ongs que prestam serviços
exclusivamente para o poder público. O volume de recursos injetados
em obras públicas permite que tais empresas se mantenham,
Na Cidade do México, a destruição causada pelo terremoto de 1985
parecia a fórmula ideal para expulsar a população que se instalara no
Centro, grande parte dela residindo em casas ocupadas, geralmente
edificações tombadas pelo patrimônio histórico. Contudo, a resistência
dos moradores, obrigou o governo a promover uma reciclagem em
massa das moradias, assim como a regularização de posse.
Em Lima, a pressão exercida pela enorme população encortiçada,
expulsa dos centros urbanos em virtude dos elevados valores dos
aluguéis, levou à implantação de um processo integrado de
renovação urbana. A cidade foi dividida em grupos de quadras,
compostos por comitês de moradores, comerciantes e empresários,
dentro dos quais elaborou-se projetos interligados, promovendo a
articulação e o intercâmbio dos espaços. A Prefeitura contratou
ONGs para assessorar o processo e permitiu o emprego de “alternativas
legislativas”.
Em Buenos Aires, onde existem cerca de 150 mil imóveis vazios na
região central, o Movimento de Inquilinos e Ocupantes (MOI) formou
cooperativas de moradores buscando a compra dos edifícios, o que se
daria por meio de financiamento com o próprio proprietário. A partir
daí, o programa prevê apoio do poder público para o financiamento
22
Os exemplos descritos foram apresentados por Evaniza Rodrigues no
Seminário da Comissão de Estudos sobre Habitação na Área Central, realizado
em 2001 e presidido pelo vereador Nabil Bonduki.
23
de materiais de construção e a formação de cooperativas de
produção, com recursos para remunerar parcialmente mão-de-obra e
serviços. A aprovação de uma lei municipal de apoio à autogestão
(1999) garante o repasse destes recursos.
Ao confrontar os quadros europeu e latino-americano, ficam claros os
reflexos das diferentes posturas políticas assumidas. Apesar das
experiências latino-americanas apresentarem valor significativo,
sobretudo enquanto instrumento de mobilização e desalienação da
população, para que se realize uma reforma no cenário habitacional
capaz de suprir os déficits atuais são imprescindíveis o envolvimento e
o investimento direto do poder público. A possibilidade de locação
social é interessante, contudo não elimina a necessidade de um
subsídio às famílias que não apresentem condições para arcar com
estes gastos.
“(...) o acesso à moradia digna é condição básica de cidadania, devendo,
portanto, receber o mesmo tratamento que a educação e a saúde, ou
seja, deve ser uma prioridade nacional e ter garantidos recursos e
mecanismos institucionais para sua concretização.” 23
23
CAMARGO, J. A. e SILVA, L. I. L. (coord.). Projeto Moradia, pg. 9.
24
A ÁREA DE ESTUDO
25
A opção por estudar o Largo do Paissandu deve-se não só ao estado
de degradação em que a área se encontra, mas, sobretudo, ao fascínio
trazido por sua história, marcada por fases bastante distintas. A região,
que passou de periferia à passarela da elite paulistana, abrigou usos
diversos e presenciou desde acontecimentos culturais a manifestações
sociais e políticas. Foi palco do chamado “boom cinematográfico”,
embora nem todo o glamour da Avenida São João tenha livrado a região
do intenso processo de esvaziamento que se instalou na área central a
partir dos anos 60.
a passarela da elite paulistana por muitos anos, até a sua decadência na
década de 60, impulsionada pela nova transferência de centralidade,
desta vez para a região da Paulista.
Localização do córrego Zunega
Atualmente, o Largo do Paissandu destaca-se por sua importância para
a cultura afro-brasileira, já que guarda parte da memória da cultura
negra em São Paulo, preservada pela presença marcante da Igreja de
N. Sra. do Rosário dos Homens Pretos (ainda bastante freqüentada) e
pela ‘Mãe Preta’ – escultura de autoria de Júlio Guerra, que homenageia
as antigas mães de leite e, por extensão, a população afro-brasileira.
HISTÓRICO
As primeiras referências ao Largo do Paissandu citam a presença de um
conjunto de lagoas que se estendiam pela área do Paissandu e São
João, formadoras do riacho Iacuba, o que justifica sua primeira
denominação: “Praça das Alagoas”. A confluência dessas águas num
rebaixo do terreno formava o “Tanque do Zunega”, muito utilizado
pelas lavadeiras.
Somente em meados do século XIX é que a área, por ordem do
governo provincial, foi dessecada e terraplenada. Mesmo assim,
permaneceu pouco valorizada, contando com reduzida ocupação e
mantendo seu caráter periférico.
O Paissandu só passa a receber atenção a partir das primeiras
décadas do século XX, com a expansão da cidade além-Anhangabaú e
conseqüente formação do Centro Novo, ocupado pela camada mais
abastada da sociedade. A Cinelândia faz do eixo São João – Paissandu
Fonte: MÜLLER, N. L. “Aspectos da Metrópole Paulista “ IN: AZEVEDO, Aroldo de
(direção) e outros. A Cidade de São Paulo. Estudos de Geografia Urbana. Vol. III, pg.
143.
26
A Igreja de Nossa Senhora do Rosário dos Homens Pretos
O culto a Nossa Senhora do Rosário é um dos mais antigos de São
Paulo, sendo a sua confraria “uma das primeiras nascidas no burgo
humilde que começava a surgir em torno do Colégio (...), em cuja
fundação podemos ver o dedo do venerável Anchieta”.24
Em 1872, ao assumir o governo da província, João Teodoro Xavier
resolve abrir um largo em frente à igreja, “com a desapropriação de
pequenos prédios e do terreno do cemitério aí existente”,26 que viria a se
chamar Largo do Rosário.
Antiga Igreja do Rosário
Tal devoção levou à construção, por volta de 1721, de uma capela
singela, sustentada pelos devotos, que abrigaria a Irmandade de N.
Sra. do Rosário dos Homens Pretos. Situava-se numa área ainda
considerada mais que subúrbio, onde está localizada a atual Praça João
Mendes.
“Era na época um lugar tão afastado que o poder municipal mandava
para lá os doentes, para que ficassem isolados do resto da cidade”.25
A capela passou a constituir o ponto de encontro dos negros, que,
naquela época, eram proibidos de entrar nas outras igrejas. Além
das cerimônias religiosas, o local abrigava também o cemitério dos
negros e, em seu subsolo, um quilombo. A Irmandade passou a
desempenhar então, além do papel religioso, uma importante função
social e política, comunicando-se com seus membros por meio do
badalar dos sinos.
Data de 1725 a licença, pela autoridade eclesiástica, de edificação de
um novo templo. Logo em seguida, buscou-se a legalização, pela
Câmara, da posse do terreno (obtida em 1728) e a arrecadação de
fundos em Minas Gerais, já que São Paulo não dispunha de verbas para
tal. Finalmente, a Igreja do Rosário foi erguida à entrada da atual Rua
Quinze de Novembro, num “tabuleiro natural”, onde, antes da construção
da capela, os negros já se reuniam às escondidas para realizarem seus
cultos. Acredita-se que o término das obras deu-se em 1737.
Fonte: BRUNO, E. S. – “Festas de Brancos e Negros”. IN: História e Tradições da
Cidade de São Paulo. Vol. II, pg. 787.
A irmandade, criada em 1711, congregava negros, cuja preferência pela
referida santa remontava ainda à África, onde muitos a tinham como
padroeira, por influência dos colonizadores portugueses (ARROYO,
1966). Além de prestar culto à N. Sra. do Rosário, conservava as
tradições da cultura africana, por meio de autos populares dos congos
e cacumbis, tendo desempenhado ainda importante papel no
processo de abolição da escravatura27. Os festejos, caracterizados
26
24
ARROYO, Leonardo. “Nossa Senhora do Rosário dos Homens Prêtos”. IN:
Igrejas de São Paulo, pg.173.
25
DUARTE, Neide. “Geledés”. IN: Caminhos e Parcerias, TV Cultura
(www.tvcultura.com.br/caminhos/04geledes/geledes2.htm).
PORTO, Antônio Rodrigues. História Urbanística da Cidade de São Paulo
(1554 a 1988), pg. 53.
27
Segundo Rolnik, as irmandades de negros, além de comprarem alforrias,
atuavam como sedes ocultas de redes de suporte aos movimentos
abolicionistas (ROLNIK, 1997).
27
por danças e cantos, tinham caráter profano, sendo, por isso, muitas
vezes combatidos pelas autoridades. Contudo, por falta de opções de
atividades de lazer, boa parte da sociedade assistia a essas
celebrações:
“Na falta de outras diversões, as festividades religiosas eram a ‘great
attraction’, sendo que boa parte dos concorrentes não as assistiam por
devoção, mas por passatempo, mesmo porque nelas ordinariamente
havia cenas impróprias da gravidade que deve revesti-las.”28
Com o crescimento da cidade, o largo, antes destinado aos
marginalizados, passou a ser habitado pelas altas camadas da
sociedade. Um novo comércio – de luxo – passou a dividir espaço com
os tabuleiros e barraquinhas dos “homens pretos”, que ocupavam a
frente da igreja. A presença dos negros, com seus festejos e
celebrações, fazia da igreja um obstáculo à valorização da região.
“Assim, a Igreja dos Homens Pretos, o Largo do Rosário, seus
ambulantes e as manifestações culturais populares de origem afro e
indígena deveriam representar um desafeto à elite e ao poder público,
por estarem localizados num dos pontos que mais se europeizavam – o
‘Triângulo Central’”.29
destino traçado: a remoção para outra área, novamente periférica à
Cidade.
Assim, a partir de 1903, durante a gestão do prefeito Antônio Prado,
foram desapropriados e demolidos vários imóveis, inclusive a igreja,
para a ampliação do Largo do Rosário. O terreno onde se situava a
igreja e seu cemitério passou à posse de Martinico Prado, irmão do
prefeito, que construiu, alguns anos mais tarde, o edifício “Casa
Martinico”, que viria a se tornar a sede da Light.
“Desaparecera a igreja. Era uma vez o Largo do Rosário... Os pretos
não mais enfeiariam o pátio com suas festanças, reis, rainhas, rústicos...
A cidade ficava livre de costumes bárbaros”.31
Mediante uma pequena indenização, a igreja foi reconstruída no Largo
do Paissandu – não sem protestos dos moradores de seu entorno, que
alegavam o fim da beleza da praça –, sendo inaugurada no dia 22 de
abril de 1908.
Paulatinamente, os festejos foram sendo substituídos por outros menos
atentatórios, da mesma forma que, já em 1898, sob a ‘ideologia’30 de
modernização e higienização da cidade, a própria igreja tinha seu
28
BUENO, F. A. V. “A Cidade de São Paulo. Recordações evocadas de
memória”. IN: BRUNO, Ernani Silva. Memória da Cidade de São Paulo –
depoimentos de moradores e visitantes: 1553-1958, pg. 53.
29
SANTOS, Carlos José Ferreira dos. Nem Tudo Era Italiano – São Paulo e
Pobreza (1890-1915), pg.125.
30
O emprego do termo ideologia pretende ressaltar a verdadeira intenção do
poder público, que, ao utilizar-se de tais argumentos, visava, sobretudo, o
afastamento das camadas populares, cuja presença desvalorizava a região.
”(...) a ideologia é um ideário histórico, social e político que oculta a realidade, e
(...) esse ocultamento é uma forma de assegurar e manter a exploração
econômica, a desigualdade social e a dominação política” (CHAUÍ, Marilena. O
que é ideologia, pg. 7).
31
AMARAL, R. J. Os pretos do Rosário de São Paulo, pg. 119.
28
A mudança da Igreja do Rosário exemplifica a intenção do poder público
de embelezar e “reorganizar” a cidade segundo os interesses da classe
dominante, promovendo, sobretudo, uma limpeza social. Este processo
envolvia a expulsão das camadas populares para a periferia,
demonstrando desprezo no combate à pobreza e preocupação em
somente afastá-la do convívio social.
“(...) a procura pela remodelação arquitetônica de São Paulo esteve
relacionada à formulação de uma nova percepção do que deveria ser a
cidade e seus lugares, à tentativa de eliminação de tradições
inconvenientes e à marginalização dos indesejáveis”.32
Mais tarde, a Igreja enfrentaria novas ameaças de demolição, sobretudo
com o desenvolvimento da Cinelândia, que faria da região um pólo
cultural das elites. Em 1940, por exemplo, o então prefeito Prestes Maia,
tendo sua proposta urbanística como justificativa, pretendia substituir a
igreja por um monumento a Duque de Caxias. Contudo, “os tempos
eram outros e também os homens eram outros”.33 Com muita luta e
resistência, a Irmandade permanece, até hoje, no Largo do Paissandu.
O desenvolvimento da Av. São João e a Cinelândia
Até o início do século XX, a “Ladeira de São João”, embora constituísse
uma ligação entre as duas margens do Anhangabaú por meio da Ponte
do Acu, ainda guardava uma importância secundária na malha urbana.
Tratava-se de uma via estreita, ocupada por comércio no trecho próximo
ao Largo de São Bento e por residências no percurso que se seguia ao
Vale, nas proximidades do Paissandu. Esta área era ocupada por
grandes chácaras e um casario simples, que abrigava famílias menos
abastadas da sociedade.
Com a execução dos “Planos de Melhoramentos”, iniciaram-se, entre
1913 e 1918, as obras de alargamento da ladeira, que, conforme o
32
33
SANTOS, Carlos José Ferreira dos. Ob. Cit., pg.126.
AMARAL, R. J. Ob. Cit., pg. 129.
previsto pelo projeto de Bouvard, passaria a ocupar uma largura de 30m.
Tal intervenção implicou na demolição do Mercado São João e dos
demais edifícios instalados em seu lado direito, onde seriam implantadas
as primeiras quadras alargadas da nova via. Desta forma, e contando
ainda com um canteiro central arborizado, por onde trafegariam os
bondes da Light, a então Ladeira de São João foi elevada à categoria
de avenida.
Vale destacar que, já no final do século XIX, a São João demonstrava
uma vocação de eixo de cultura e entretenimento, fato caracterizado
pela presença de áreas para a prática de pelota basca e pela
inauguração, em 1892, do Teatro Politeama. Ainda nas primeiras
décadas do século XX, surge também o famoso Circo do Piolim,
situado no Largo do Paissandu, que viria a se tornar uma referência
importante na cidade. A Avenida São João se transformaria no eixo da
elite paulistana, ponto de encontro de artistas e intelectuais como Mário
de Andrade, freqüentador do Conservatório Dramático e Musical de São
Paulo. Foi também na Avenida São João que ocorreram os primeiros
carnavais de rua da cidade.
Com o crescimento urbano e, sobretudo, econômico de São Paulo, os
empreendimentos de lazer passam a representar uma fonte de renda
significativa. Em 1907, surge o Bijou-Palace, o primeiro cinema
regular da cidade, instalado na Av. São João. Em 1916, o Teatro
Politeama cederia lugar, após um incêndio, ao Cine Central.
A partir dos anos 20, com o sucesso das primeiras salas de exibição, o
cinema consolida-se como uma atividade empresarial, o que leva à
construção de salas mais sofisticadas e dotadas de características
técnicas adequadas. O Centro passa a ser pontuado por um número
crescente de salas, principalmente no eixo das avenidas São João e
Ipiranga, região que vinha se tornando o ponto de encontro das elites,
concentrando o comércio e serviços requintados.
Em 1936, a construção do UFA-Palácio, projetado por Rino Levi,
representou um marco na concepção dos cinemas, ao solucionar
questões técnicas e funcionais até então não consideradas. Simbolizava
a modernização da cidade, consolidando, portanto, a Avenida São João
29
como um corredor cultural e definindo de vez a localização da
Cinelândia paulistana.
“Um novo, poderoso eixo vara a cidade de São Paulo, girando,
centrípeto. Esticada, recta, entre duas montanhas symbólicas de nossa
grandeza – o Jaraguá, a montanha histórica que Deus fez; e o Martinelli,
a montanha moderna que os homens fizeram – a Avenida São João,
centralizadora, attrahente, magnética, vae chamando a si a vida urbana,
que a ella se gruda e com ella roda empolhada toda de arranha-céus,
apinhada de altos e trams, inchada de pencas de gente, borbulhada de
cachos de luz. (...) E – synthese da vida de hoje, índice infalível do
progresso desses tempos – o cinema também para alli converge,
escancarando as suas portas e imam para a dócil limalha humana”.34
No início dos anos 40, são inaugurados mais de vinte cinemas,
espalhados pelo Centro, concentrados, sobretudo, na Cinelândia,
onde se encontram também as salas de maior movimento. O aumento
de público é tamanho que chega a superar o crescimento demográfico
(SIMÕES, 1990). Ainda nesta década, a atividade se difunde pela
cidade, que passa a oferecer mais de cem salas de exibição, estando
80% nos bairros. Apesar da variedade de opções, é nesta época que a
Cinelândia confirma-se como uma área de prestígio,
“(...) reservada para as ocasiões mais solenes, quando se quer
impressionar a namorada, presentear a mãe aniversariante ou pelo
menos passear pelo centro, um programa especial para quem mora
longe e vem de ônibus ou bonde compartilhar um pouco da grandeza
dos prédios, da elegância dos restaurantes e cinemas”.35
Os anos 50 trazem os primeiros sinais de desinteresse do público, a
partir do surgimento de outras formas de entretenimento, como a
construção do Estádio do Pacaembu, as rádio-novelas e,
posteriormente, a televisão. Contudo, são os cinemas de bairro os mais
afetados pela crise, já que a Cinelândia, possuidora das melhores salas
e freqüentada pela elite paulistana, mantém o seu glamour. Desta forma,
ainda nesta época a região assiste à inauguração de grandes cinemas –
Olido, República, Rivoli e Paissandu – numa tentativa de assegurar os
índices de audiência.
Cine Olido – dia da inauguração e fachada do edifício.
Fonte: SIMÕES, Inimá. Salas de Cinema em São Paulo, pp. 95e 96.
Nos anos 60, com o deslocamento da centralidade para a região da
Avenida Paulista, a Cinelândia entra em crise, evidenciando o
processo de decadência do Centro. Para se adaptarem às novas
circunstâncias, as antigas salas são subdivididas e passam a exibir
gêneros específicos, principalmente filmes eróticos.
“Com os anos 60, a região compreendida entre a Paulista e o rio
Pinheiros atrairá os principais investimentos das empresas exibidoras,
que revelam mais uma vez sensibilidade suficiente para ocupar seus
lugares em território que se tornará o mais valorizado e prestigioso de
toda a cidade.”36
34
ALMEIDA, Guilherme. OESP, 15/03/1938. IN: SIMÕES, Inimá. Salas de
Cinema em São Paulo, pg. 40.
35
SIMÕES, Inimá. Salas de Cinema em São Paulo, pg. 69.
36
SIMÕES, Inimá. Idem, pg. 106.
30
PERFIL ATUAL
A análise da área configura, sobretudo, um quadro de subutilização,
espacial e temporal, ou seja, além de diversos imóveis ociosos, os usos
predominantes – comércio e serviços – ocupam apenas o período
diurno. A ausência de uma vida noturna significativa, torna a região
pouco segura e favorece a instauração de um cenário de degradação e
conseqüente desvalorização.
A praça atualmente apresenta péssima qualidade ambiental. Tomada
por paradas de ônibus em toda a sua volta, tem seus canteiros e a
própria estátua circundados por gradis, recebendo pouca atenção e
manutenção deficiente.
Entretanto, delimitado pelas ruas Conselheiro Crispiniano, Antônio de
Godói e pelas avenidas Rio Branco e São João, o Largo do Paissandu
possui localização privilegiada, uma vez que apresenta excelente
infra-estrutura e fácil acessibilidade, abrigando e sendo circundado,
ainda, por importantes pontos de referência da cidade.
É servido por uma farta rede pública de transportes, fato de extrema
relevância numa metrópole como São Paulo. Em suas proximidades
encontram-se estações do Metrô da Linha 1-Norte/Sul (Estação São
Bento) e da Linha 3-Leste/Oeste (Estações República e Anhangabaú),
garantindo fácil acesso a todas as zonas da cidade. Além disso,
considerando a integração – ainda que precária – das linhas do Metrô à
rede ferroviária, tem-se acesso inclusive a municípios vizinhos.
Ainda vale mencionar o transporte individual, sendo significativo o
número de automóveis que circulam no local, sobretudo nas avenidas
Rio Branco, São João e Ipiranga. Há um importante fluxo de veículos
vindo da rua da Consolação que, devido à atual configuração do sistema
viário do Centro Novo, tem como opção única para atravessá-lo e
alcançar a região da Luz o trajeto pelo Largo do Paissandu.
Apesar de serem claros os conflitos entre veículos e pedestres, além da
perda da qualidade espacial da área, não existe nenhuma proposta
concreta para melhorar a circulação na região, a não ser a nova linha
do Metrô, que ligará a Vila Sônia à Luz. Ainda assim, a estação
prevista para a Av. Rio Branco foi retirada do projeto.
A região apresenta um forte potencial de adensamento populacional,
não só em função da disponibilidade de infra-estrutura e de farta rede de
transportes, mas também pelo fato de contar com atividades variadas
durante o dia, desde o intenso comércio até as cerimônias religiosas.
A presença da igreja exerce papel fundamental, por atrair fiéis de
diversas regiões da cidade. Além disso, por congregar a Irmandade dos
Negros, tornou-se local de encontro de diversos grupos étnicos, que
procuram preservar suas origens e tradições.
Apesar de a área ser regida por um zoneamento bastante abrangente37,
é caracterizada, essencialmente, por comércio e serviços (tabela 5),
atividades estas que disponibilizam uma grande oferta de empregos.
Neste ínterim é necessário citar ainda a presença significativa do
comércio ambulante, que, embora constitua atividade ilegal, vem
atuando como fonte de renda para boa parte da população paulistana.
Pelo largo ainda circulam, segundo dados da Prodam, 57 linhas de
ônibus, oriundas de vários bairros periféricos, além de lotações que,
inclusive, têm como ponto final a rua do Boticário, cujas dimensões são
inadequadas para tal função. O intenso tráfego de ônibus chega a
constituir um problema sério para a área, sobretudo para o largo, que
passou a abrigar diversos terminais em todo o seu perímetro.
37
Trata-se de uma Z5, zona de uso misto, de densidade demográfica alta.
31
Tabela 5 – AR Sé – Amostragem de estabelecimentos por setor de
atividade econômica
Distritos
Bela Vista
Bom Retiro
Brás
Cambuci
Consolação
Liberdade
Pari
República
Santa Cecília
Sé
Total AR-Sé
Mun. São Paulo
Total
4672
4005
4620
1575
3861
2379
2445
9356
3851
6370
43134
194941
Comércio
960
1325
2176
583
738
693
910
2637
1249
2645
13916
Tabela 6 – AR Sé – População de rua
Distritos
Serviços
3268
949
899
580
2765
1349
490
5840
2038
3219
21397
Fonte: PMSP, SEMPLA. São Paulo em Números, pp. 47 e 48. 2000 e 2001.
A forte presença de um comércio especializado na região garante um
movimento intenso e constante durante o dia. Destacam-se a R.
Conselheiro Crispiniano e as grandes galerias comerciais, que
atraem um público bastante significativo e variado, inclusive aos
sábados. A Galeria do Rock, por exemplo, chega a receber num
sábado cerca de 16.000 pessoas38, vindas de diversas partes da cidade.
O uso residencial é reduzido, ocupando, geralmente, edifícios de uso
misto, com comércio no pavimento térreo. Entretanto, os índices da
tabela 6 demonstram elevado número de moradores de rua, o que
pode ser verificado no próprio Largo do Paissandu, ao redor da igreja.
Logradouro
Bela Vista
Bom Retiro
Brás
Cambuci
Consolação
Liberdade
Pari
República
Santa Cecília
Sé
Total AR-Sé
Mun. São Paulo
138
151
180
74
167
109
69
715
434
773
2810
5013
Situação
Albergue
14
6
791
627
249
81
51
47
1866
3693
Total
152
157
971
74
167
736
318
796
485
820
4676
8706
Fonte: PMSP, SEMPLA. São Paulo em Números, pg. 63. 2000 e 2001.
Quanto à disponibilidade de equipamentos para educação, a região
apresenta séria deficiência no atendimento, principalmente, das
crianças na faixa etária de até 6 anos. O distrito da República conta
com apenas duas escolas de educação infantil (ambas públicas),
atendendo apenas 29% da demanda; duas estaduais de ensino
fundamental, apresentando taxa de atendimento de 29,3%; e apenas
uma, particular, voltada ao ensino médio, não dispondo de nenhuma
creche ou centro de juventude. No campo da saúde, há apenas três
postos de atendimento médico. A oferta de equipamentos esportivos é
também bastante precária.39
No âmbito cultural, a área abriga importantes estabelecimentos, como
o Teatro Municipal e o Conservatório Dramático e Musical de São
39
38 Dado não oficial fornecido pelo Instituto Mais São Paulo.
Dados obtidos através de uma comparação de duas publicações da
SEMPLA: BDP – AR-Sé, de 1993 e São Paulo em Números, de 2000-2001.
Vale ressaltar que a oferta dos equipamentos de educação e saúde não se
alterou nesse intervalo de tempo.
32
Paulo. Além disso, aguarda a conclusão da reforma do prédio dos
Correios, um novo espaço cultural que pretende não só atrair público
para o Centro, mas também recuperar o Beco do Piolim, atualmente
bastante degradado e ocupado por moradores de rua e catadores de
lixo.
Apesar dessa invejável concentração de edifícios culturais, é importante
ressaltar que muitos possuem um caráter metropolitano, implicando
muitas vezes numa especialização que acaba atendendo somente à
faixa de público de maior renda e/ou melhor formação cultural. A região
apresenta, assim, uma enorme deficiência no atendimento das
camadas populares, freqüentemente excluídas dos eventos oferecidos
por tais estabelecimentos. Além disso, não há oferta de cursos ou
qualquer atividade de capacitação. Neste sentido, um importante projeto
em execução é a instalação do Sesc Centro, que poderá, em parte,
cumprir tal função.
dos freqüentadores da área, há também problemas com tráfico de
drogas e assaltos.
Vale ressaltar que o perímetro que engloba o Largo do Paissandu e a
Av. São João constitui uma das áreas de intervenção do
PROCENTRO, que visa a requalificação urbana e funcional do Centro
de São Paulo.
Procissão em homenagem a N. Sra. do Rosário, 22/09/2002.
Dentre as atividades de alcance popular, é interessante mencionar o uso
do espaço público. Devem ser citados os eventos culturais e, até
mesmo, procissões religiosas que ocorrem no Vale do Anhangabaú e
na Avenida São João, além da tradicional feira de artesanato da
Praça da República. Esta, além do comércio de diversos produtos,
conta com rodas de capoeira e algumas manifestações culturais ligadas
à música e poesia, atraindo um grande número de freqüentadores há
muitos anos.
Os antigos cinemas, desde a crise da Cinelândia, passaram, em sua
maioria, por reformas que visavam a subdivisão das salas ou, até
mesmo, alteração de uso. Atualmente encontram-se, em geral,
descaracterizados, abrigando principalmente bingos e cines pornôs, e
até estacionamentos.
O desinteresse e conseqüente esvaziamento da área trouxe, ainda,
outras atividades “marginais” não condizentes com o antigo cenário
glamouroso da região, como night clubs e hotéis de “moral duvidosa”,
tornando o Paissandu também uma área de prostituição,
principalmente no período noturno. Além disso, segundo depoimentos
33
Edif. Caetano de Campos
Praça da República
Shopping Light
Te a t r o M u n i c i p a l
Viaduto do Chá
Edif. Domingos Fernandes Alonso
(Cine Olido)
L A R G O D O PA I S S A N D U
Correios
Va l e d o A n h a n g a b a ú
Viaduto Santa Ifigênia
NOVOS PROJETOS
Broadway Paulistana
parceria com o investimento privado (sobretudo os proprietários dos
imóveis), o qual arcaria com 80% do custo total da intervenção, avaliado
em R$ 50 milhões.40
Conforme o estudo apresentado, os antigos cinemas dariam lugar a
usos variados, como teatros, salas de concerto, salas de convenções,
restaurantes, danceterias e buffets, um verdadeiro “shopping a céu
aberto”, segundo palavras de Martins. Busca-se atingir uma diversidade
de público, incluindo diferentes faixas etárias e interesses. Seria
estimulada ainda a recuperação do uso hoteleiro, que aconteceria
naturalmente, em função da valorização da região.
Outro elemento fundamental seria a construção de um estacionamento
subterrâneo no Largo do Paissandu, que abrigaria cerca de 800
veículos e estaria ligado ao Teatro Municipal por uma esteira rolante. A
obra seria viabilizada por meio de uma concessão do poder municipal, o
qual, desta forma, precisaria arcar apenas com as melhorias relativas à
infra-estrutura e aos equipamentos urbanos, como recuperação de
calçadas, afastamento das linhas de ônibus, limpeza do local, etc.
Fonte: ESP, “Ministro visita a futura Broadway paulistana”. 23/03/02, pg. C8.
Desde 1999, vem sendo desenvolvido pelo Instituto Mais São Paulo, em
parceria com a Secretaria Estadual de Cultura, o projeto “Broadway
Paulistana”, uma proposta de recuperação do caráter cultural da
antiga Cinelândia, tornando a Avenida São João um novo pólo turístico.
Segundo Cláudio de Sena Martins, um dos idealizadores do projeto, tal
iniciativa só traria vantagens à região, uma vez que, além de recuperar
imóveis de grande valor histórico e arquitetônico, revalorizaria seu
entorno e ainda geraria cerca de 6600 empregos.
A proposta engloba uma área pequena, de raio aproximado de 200m,
limitando-se a duas quadras da Avenida São João e ao Largo do
Paissandu. Baseia-se na reabilitação de equipamentos existentes,
transformando-os em “âncoras culturais”, o que alavancaria um
processo de valorização da área. Para tanto, o projeto apóia-se numa
Fonte: ESP, “Ministro visita a futura Broadway paulistana”. 23/03/02, pg. C8.
40
ESP, “Ministro visita a futura Broadway paulistana”. 23/03/02, pg. C8.
36
Os responsáveis pelo projeto citam ainda a importância da Galeria do
Rock, sugerindo a criação de um “Palácio do Rock” – uma área
destinada a shows de rock –, e consideram a presença da Igreja como
importante referência local, embora não haja nenhuma proposta
concreta em relação a ela.
exclusivamente arquitetônico, apresenta-se relevante tendo em vista a
necessidade de recuperação e preservação do patrimônio histórico.
Aos poucos a iniciativa começa a ganhar corpo, uma vez que alguns
proprietários particulares, por meio de leis de incentivo, estão
recuperando seus imóveis, como o Cine Dom José, da mesma forma
que o Conservatório Dramático e Musical de São Paulo acaba de ter sua
fachada restaurada (embora seu interior esteja ainda em péssimo estado
de conservação).
Outra intervenção, desta vez por parte do governo municipal, é a
transformação do edifício do Cine Olido em um centro de cultura,
música e dança. O antigo cinema passará a abrigar uma sala de
espetáculos com capacidade para 600 lugares, e as orquestras
Sinfônica Municipal e Experimental de Repertório, o Coral Lírico, o Coral
Paulistano, o Quarteto de Cordas, o Balé da Cidade, a Escola Municipal
de Bailado e a Escola de Música ocuparão do 1º ao 8º andares do
edifício. A Secretaria Municipal de Cultura já está se transferindo para o
edifício, instalando-se do 9º ao 15º andares. Os demais pavimentos
serão utilizados pela Secretaria do Abastecimento e pela Ouvidoria
Municipal.
A reforma, iniciada no segundo semestre de 2002, teve sua primeira
etapa concluída ainda no final do ano. Os custos da obra deveriam ser
divididos entre o governo municipal e a proprietária do imóvel (a
Imobiliária Savoy), podendo contar ainda com algumas parcerias com a
iniciativa privada, por meio das leis de incentivo à cultura.42
Apesar de buscar a recuperação da área da Cinelândia, o projeto da
Broadway suscita críticas principalmente ao prever usos que, mais uma
vez, excluem a participação da população de baixa renda, a que
mais sofre a carência de equipamentos culturais. Além disso, em
momento algum foram levadas em conta as necessidades da Igreja
ou da Irmandade. Outro ponto bastante questionável é a construção do
estacionamento sob o Largo do Paissandu, uma vez que implica em
gastos elevados e prioriza o transporte individual na área com maior
oferta de transportes públicos da cidade, o Centro.
Recuperação da antiga Cidade Nova
Patrocinado pela Empresa Municipal de Urbanização e pela Associação
Viva o Centro, o programa visa a recuperação do chamado “coração da
Cidade Nova” – o quadrilátero formado pela rua Conselheiro Crispiniano,
avenidas São João e Ipiranga e rua 7 de Abril. As obras estão sendo
incentivadas através de benefícios fiscais, como isenção do IPTU.41
O conjunto arquitetônico da área, que inclui 65 edifícios tombados, vem
passando por obras de restauro e limpeza visual, embora ainda haja
resistência por parte de muitos comerciantes, que não estão dispostos a
retirarem suas placas e anúncios. Apesar do projeto ter um caráter
Reforma do Edifício Domingos Fernandes Alonso
A transferência desses equipamentos para o Largo do Paissandu vem
criando diferentes reações. Enquanto agrada a Orquestra Experimental
de Repertório, hoje instalada em condições precárias na r. Santo Amaro,
causa descontentamento por parte da Escola de Bailado, já que seus
membros se preocupam com a adequação técnica das novas
instalações e com a segurança das alunas.43
A concentração das secretarias e dos demais equipamentos em um só
edifício no Centro visa a redução de custos, especialmente de aluguel,
segundo o secretário municipal da cultura, Marco Aurélio Garcia. No
entanto, o edifício do Cine Olido não é de propriedade estatal e a sua
42
ESP, “Antigo Cine Olido vai virar centro cultural”. 24/06/02
ESP, “Orquestra experimental sonha com a mudança”. 24/06/02
ESP, “Transferência desagrada escola”. 24/06/02
43
41
ESP, “Para salvar a história por trás das fachadas”. 08/12/02, pg. C7.
37
adequação aos novos usos exige uma reforma de grande porte,
sobretudo para atender às exigências de pé-direito, muito superiores ao
de um edifício comercial, necessárias do 1º ao 8º andares.
38
PROJETO
39
Beco do Piolim
Av. Rio Branco
terreno de projeto
do centro de cultura
calçadão da Av.
São João
Vista aérea do Largo do Paissandu a partir do Edif. Domingos
Fernandes Alonso (Cine Olido).
40
A proposta elaborada consiste num projeto integrado, que parte da
escala urbana para, então, enfocar soluções de apropriação do espaço e
projeto arquitetônico. A partir da análise do Largo do Paissandu e de seu
entorno, algumas diretrizes se colocaram como elementos fundamentais
na instauração de um processo de reabilitação urbana da área.
A começar, o excesso de ônibus e pontos de paradas apresenta-se
como um problema eminente, visto que transforma a praça num
“desordenado terminal rodoviário”. A solução, no entanto, constitui uma
intervenção de caráter metropolitano, que implicaria numa
reestruturação do sistema de transportes. Sugere-se a delimitação de
um perímetro central, dentro do qual o transporte coletivo fosse
realizado apenas pela rede metroviária e por microônibus circulares.
Desta forma, os pontos terminais seriam extintos e o trânsito reduziria.
Com isso, seria possível também a interdição de um trecho da Rua
Antônio de Godói para a criação de um calçadão, visando privilegiar o
pedestre e reforçar o diálogo da praça com o entorno. A medida
implicaria apenas na mudança de mão do trecho inicial da Av. Rio
Branco (contíguo ao largo) e na duplicação de sentido da Rua do
Boticário, que viria a constituir uma rua sem saída.
Intervenções pontuais no desenho da praça promoveriam uma melhor
qualidade espacial, otimizando os percursos, adequando as áreas de
permanência e preservando o patrimônio. O projeto prevê a retirada
dos gradis, a preservação da vegetação significativa e a implantação
de um espelho d’água, garantindo o isolamento físico da estátua da
Mãe-Preta, marco histórico que tem sido alvo de atos de vandalismo.
O piso ganha um novo desenho, que prioriza os caminhos e se
estende ao interior dos edifícios em projeto, incorporando-os à praça.
Ao promover, em alguns pontos, a transposição de vias, favorece as
ligações com o Vale do Anhangabaú, Beco do Piolim e com os
calçadões além da Av. São João.
Um pequeno bloco procura concentrar serviços públicos
importantes, evitando, contudo, confrontar-se com o volume da Igreja.
Abriga banheiros e telefones públicos, um posto policial e um balcão de
informações, uma alternativa que visa reduzir a degradação ambiental
e reforçar a segurança.
Equipamentos urbanos tais como bancos e lixeiras, embora fujam da
escala de apresentação do projeto, constituem também elementos
indispensáveis e, portanto, previstos na proposta. Assim como a
melhoria da iluminação pública, que deveria atuar também como um
instrumento de destaque da igreja e da estátua.
Resolvidas as principais deficiências espaciais da área, a grande
alavanca para concretizar um processo de reabilitação urbana está nas
estratégias de ocupação. Para tanto, a produção de habitação de
interesse social se faz indispensável, uma vez que concilia essa
necessidade de uso do espaço a uma demanda enorme por moradia na
área central, região privilegiada pela rede de infra-estrutura e
transportes.
“Manter o Centro vivo todos os dias da semana e todas as horas do dia
(e não apenas no horário comercial) exige, entre outros usos, que a
moradia seja também admitida e incentivada. O sucesso de qualquer
plano de revitalização da área central exige um programa habitacional”.44
O significativo número de imóveis ociosos nas imediações do Largo
do Paissandu aponta a requalificação de edifícios como ferramenta a
ser empregada. Constituindo, em sua maioria, prédios de escritórios,
sugere-se que as edificações abandonadas sejam readequadas,
passando a abrigar residências, albergues para estudantes, hotéis de
categorias variadas, enfim, usos que garantam uma real apropriação do
espaço.
O aumento populacional proporcionaria um significativo aumento de
público para os cinemas, o que possibilitaria, ao menos, a
recuperação das salas mais importantes da área: o Ufa-Palácio, o
Marrocos e o Cine Paissandu, edifícios, sobretudo, dotados de relevante
valor histórico-arquitetônico.
44
MARICATO, Ermínia. “Renovação do Centro e habitação: o direito à cidade”
in Associação Viva o Centro. São Paulo Centro XXI: entre História e Projeto.
41
A nova demanda intensificaria, ainda, a
necessidade de ampliação da oferta de
equipamentos sociais, culturais e
esportivos, que já se encontra
insatisfatória. A disponibilidade destes
serviços reduziria os deslocamentos dos
moradores, o que, num quadro geral,
levaria ao descongestionamento da rede
de transportes.
Além da reabilitação do patrimônio
ocioso, propõe-se o aproveitamento de
terrenos vazios ou subutilizados
(estacionamentos a céu aberto, por
exemplo) para construção de novas
edificações, sobretudo de cunho social.
Instrumentos
legais
devem
ser
empregados para garantir a extinção
dessas áreas subutilizadas, levando a
iniciativas
dos
proprietários
ou
favorecimento da aquisição pelo poder
público.
Sendo assim, a proposta aprofunda-se
em dois projetos pontuais distintos:
um exemplo de requalificação e outro
de construção. Um edifício ocioso
passa
a
abrigar
residências,
equipamentos sociais, comércio e lazer.
Numa nova edificação ganham corpo
atividades culturais, esportivas e de
lazer. Procura-se delinear, assim, duas
formas de intervenção possíveis no
Centro de São Paulo, cuja pertinência
varia de acordo com as condições
físicas e programáticas específicas de
cada área.
Estudo de intervenção no Largo do Paissandu
42
Estudo para o equipamento a ser implantado no largo.
45
Requalificação do Edif. Domingos Fernandes Alonso
(Cine Olido)
Seu programa original incluía um restaurante com amplo salão no
subsolo, galeria comercial no térreo, sala de cinema e 22 pavimentos
com planta livre, destinados ao uso comercial e de serviços.
A escolha do edifício resultou da análise de um conjunto de
características: seu papel relevante na história da Cinelândia e na
configuração da Av. São João, sua conformação física e seu atual
estado de abandono.
Atingido pelo processo de esvaziamento do Centro, foi perdendo seus
ocupantes e sofrendo uma série de adaptações para se manter em
funcionamento. Seu subsolo passou a ser um estacionamento rotativo
de automóveis e a grande sala de cinema, seguindo o destino da maior
parte das salas da Cinelândia, foi subdivida em 3, na década de 80.
Mesmo assim, o Cine Olido, um dos únicos a não se tornarem cines
pornô ou darem lugar a outros usos, sucumbiu e fechou suas portas há
cerca de um ano. A própria galeria comercial já em meados da década
de 90 tinha boa parte de suas lojas fechadas.
Ocupando um terreno de 2345m², configura-se como um prédio de
grande porte, compreendendo uma área de 30000m², distribuída em 27
pavimentos, além do subsolo. Apresenta características modernas,
como, por exemplo, plantas livres e certa regularidade no
posicionamento dos pilares concordando com o ritmo das fachadas, o
que possibilitou uma racionalização do projeto, principalmente das
unidades habitacionais.
A conversão de usos traz uma série de dificuldades na adaptação das
unidades habitacionais, tanto técnicas como de desenho. Neste caso, ao
se priorizar a qualidade arquitetônica, o traçado original do edifício
implicou em apartamentos com dimensões superiores às comumente
aprovadas. Ainda assim, a reforma mostrou-se economicamente viável.
Um breve histórico
O edifício situado na esquina da R. Dom José de Barros com a Av.
São João, eixo da antiga Cinelândia, foi inaugurado em 1957. Dotado
de uma sala de exibição com capacidade para 800 lugares – o Cine
Olido –, tornou-se um marco por possuir o primeiro cinema da cidade
em uma galeria comercial. A sala mais moderna do país trazia
inovações como a instalação de cadeiras numeradas e um sistema de
reservas, tornando-se ponto de encontro da elite paulistana no fim dos
anos 50 e na década de 60.
Em 2002, o Olido se
apresentava como um
edifício ocioso já por um
período de 10 anos,
permanecendo em uso
somente o estacionamento
do subsolo e parte do
térreo e da sobreloja
locados por um bingo. No
decorrer do mesmo ano
surgiram as notícias da
transferência da Secretaria
Municipal de Cultura e
outros
equipamentos
culturais já citados, tendo
início
a
reforma
no
segundo semestre.
46
Projeto
a necessidade de se ampliarem estes serviços a partir de uma política
de incentivo do uso habitacional no centro de São Paulo.
Trata-se de uma requalificação de um edifício ocioso para habitação
social e equipamentos sociais. Assim, uma das primeiras diretrizes
adotadas, visando a viabilização do projeto, foi a reforma com mínima
quantidade de alterações necessárias, porém garantindo qualidade
arquitetônica ao conjunto.
O edifício foi setorizado em três blocos
hierarquizados, segundo o tipo de uso e o grau
de privacidade que deveriam ter:
Assim, o programa do edifício foi idealizado da seguinte forma:
Subsolo
Mantém-se o setor de instalações técnicas do edifício e um
estacionamento
cujas
vagas
devem
ser
comercializadas
separadamente. Sua pequena capacidade (sem serviço de manobrista,
conta com apenas 35 vagas) deve-se à disposição dos pilares e ao
baixo pé-direito, que impedem a adoção de equipamentos que
racionalizariam seu uso.
Térreo
habitação
equipamentos sociais
comércio
A opção pela manutenção do uso comercial nos primeiros andares
deu-se pela possibilidade de se diminuir o custo das unidades
habitacionais através da venda de pontos comerciais, pela necessidade
de se estabelecer um comércio de 1ª necessidade que atendesse aos
moradores do edifício e aos de suas imediações, além, é claro, da
própria conformação espacial do edifício.
Da mesma forma, julgou-se pertinente a inclusão de equipamentos
sociais (posto de saúde, creche e escola infantil), levando-se em conta
a atual deficiência no atendimento à demanda existente na região
central, especialmente no distrito em questão (República), assim como
Galeria a ser ocupada por comércio de bens de 1ª necessidade, uma
padaria-escola e um restaurante popular. Este tem capacidade para
atender simultaneamente 72 pessoas dentro do salão, além das mesas
disponíveis na galeria. A opção pelo “bandejão”, servindo refeições
subsidiadas pelo governo municipal, veio da observação dos bons
resultados que essa iniciativa vem conseguindo em várias capitais
brasileiras. Em São Paulo já existem 15 restaurantes servindo 20mil
refeições por dia a R$1,00. No Rio de Janeiro, segundo uma pesquisa
da Secretaria de Ação Social, 7,8% dos freqüentadores dos restaurantes
não almoçavam antes de sua implantação e “40,5% saem de casa só
para comer lá”.45
Sobreloja
Integrada ao térreo, compõe-se pelo hall de acesso ao teatro e às
salas de cinema, dispondo de um cyber café. Há ainda salas de
administração, serviços e camarins do teatro localizado no 1º
pavimento.
45
“Chefs na fila do bandejão” IN: Revista Época, pp. 76 a 78. 30/12/02.
47
Optou-se pela manutenção da subdivisão da antiga sala do Cine Olido,
porém com a transformação da maior em um teatro de pequeno porte
(215 lugares). As outras duas salas se mantiveram como cinemas, com
capacidade p/ 150 e 179 pessoas.
O posto de saúde foi projetado de maneira setorizada, podendo ser
dividido nas seguintes áreas: bancos de sangue e de leite, bloco de
administração e serviços, salas de consulta médica, enfermagem,
assistência social e sala para atividades educativas.
É interessante se pensar no funcionamento do posto de acordo com o
PSF (Programa de Saúde da Família), política municipal de saúde,
baseada “na prevenção da doença e na promoção da saúde”. É aplicado
no âmbito dos Distritos, sendo que suas unidades básicas de saúde
atuariam por meio de equipes nucleares, residentes no mesmo bairro e
responsáveis por uma determinada área e número de famílias.
2º ao 4º Pavimentos – Creche e escola infantil.
O 3º pavimento centraliza os setores administrativo e de serviços,
constituindo o acesso principal e sendo interligado por rampas aos
outros pavimentos. Descendo, estão a creche e as salas de maternal,
jardins e pré-escola; no 4º andar se localizam as salas de 1ª a 4º séries
e a área de lazer, que aproveita a laje de cobertura dos cinemas.
5º ao 22º Pavimentos – Habitações.
Somando 233 apartamentos, as unidades habitacionais apresentam
oito plantas distintas, com tipologias de 1, 2 e 3 dormitórios, além
de quitinetes, buscando atender a diferentes composições familiares.
Há predomínio da tipologia de quitinetes, justificada pelo perfil da
população demandatária de habitações populares (vide gráfico 2) e
devido à forma do edifício.
Gráfico 2 – Composição familiar dos encortiçados de São
Paulo.
nº componentes
1º Pavimento – Teatro e duas salas de cinema na parte posterior do
edifício e posto de saúde na parte frontal.
8 o u ma is
0 ,9 0 %
7
1 ,0 0 %
6
5
4
3
2
1
2 ,5 0 %
5 ,7 0 %
1 0 ,2 0 %
1 8 ,4 0 %
2 2 ,7 0 %
3 8 ,5 0 %
Fonte: FSP, “Cortiço abriga solitário e família pequena”, 05/11/02, pg. C1.
A conformação original do edifício resultou na divisão do bloco
habitacional em 2 plantas-tipo: uma do 5º ao 9º pavimentos e outra do
10º ao 22º. O 10º pavimento é um andar de transição entre as plantas,
possuindo um terraço lateral, além de uma área de lazer aberta, voltada
para a R. Dom José de Barros.
Apesar de serem propostas lavanderias coletivas em todos os
pavimentos de habitação, aproveitando-se o bloco hidráulico existente,
todas as unidades dispõem de uma pequena área de serviço, para
proporcionar privacidade e facilitar o dia-a-dia dos moradores.
23º Pavimento
Aproveitando-se um salão existente e a laje de cobertura do edifício,
criou-se uma área de lazer para as habitações, contendo salão para
festas e reuniões de condomínio, quadra de esportes, churrasqueiras e
playground.
24º Pavimento – Casa de máquinas e salas de serviços do edifício.
25º Pavimento – Caixas d’água e sala de serviços do edifício.
48
Tab. 7 – Edifício Cine Olido - quadro de áreas
Pavimentos
Áreas (m²)
subtotal
subsolo
térreo
sobreloja
1º pavimento
2º pavimento
3º pavimento
4º pavimento
5º ao 9º pavimentos
10º pavimento
11º ao 22º pavimentos
23º pavimento
24º pavimento
25º pavimento
TOTAL
posto de saúde 941 m²
teatro e cinemas 1225m²
1304m²/pavimento
876m²/pavimento
total
2294
2294
1826
2166
941
941
1413
6520
1022
10512
359
286
82
30656
Uma reforma de edifício com alteração de usos tem certos limitantes
físicos e financeiros que, na maioria das vezes, inviabilizam um
resultado ideal. As opções técnicas adotadas, apesar de não
solucionarem todas as questões, promoveram a adequação do edifício
de forma satisfatória.
1. Estrutura
Foi mantida, sem ser comprometida pelas intervenções. Estima-se que
não haveria sobrecargas estruturais, já que edifícios comerciais
costumam ter coeficientes de segurança superiores aos residenciais.
Houve necessidade de cortes nas lajes em três casos: parte da laje da
sobreloja para o aumento do pé-direito do térreo e criação de um
mezanino; em uma extremidade das lajes entre o térreo e o 11º
pavimento, para a construção de uma escada de emergência; rasgos
nas lajes do 3º e 4º pavimentos para a instalação de rampas conectando
os andares do bloco da escola. Os dois primeiros casos não trouxeram
problemas relacionados a cortes de vigas, já que respeitaram a
modulação estrutural; já no caso da escola, foram necessários reforços,
cuja solução foi a execução, na maior dimensão do vão, de vigas de
borda invertidas (servindo inclusive de parapeito das rampas), apoiadas
nas vigas já existentes.
2. Racionalização da Construção
A escolha de painéis leves pré-moldados para a execução das novas
paredes, além de evitar uma grande sobrecarga na estrutura, decorre
também da necessidade de racionalização da construção: seca, com um
canteiro de obras reduzido e limpo, tornando sua execução rápida, já
que a região central é densamente ocupada e tem restrições para a
circulação de veículos.
Os eixos de alvenaria das habitações e dos equipamentos sociais
acompanharam a disposição estrutural e a modulação da fachada.
Quando houve necessidade, os vãos foram subdivididos em partes
iguais.
3. Acessos e Circulação Vertical
A necessidade de acessos diferenciados e controlados num edifício
de uso misto foi facilmente solucionada, pois o prédio já contava com 7
elevadores (um, inclusive, pôde ser desativado). No pavimento térreo foi
feita a divisão do hall em duas recepções, uma atendendo às
habitações, contando com 3 elevadores, e outra aos equipamentos,
sendo que 2 elevadores atendem à escola e 1 ao posto de saúde.
As rampas do bloco da escola são metálicas e atirantadas, recebendo
uma camada de poliuretano expandido para minimizar ruídos.
De acordo com as normas, houve a necessidade de se construir uma
nova escada de emergência, localizada em um dos extremos do
edifício. Para garantir um bom isolamento térmico de sua caixa, são
utilizados blocos de concreto celular revestidos. A escada existente entre
os elevadores sofreu algumas adaptações: suas comunicações com o
49
bloco hidráulico foram fechadas em todos os pavimentos; o poço do
elevador justaposto à escada (desativado) foi subdividido em dutos de
entrada e saída de ar da antecâmara e em um shaft; o lance entre o
térreo e a sobreloja teve que ser redesenhado, substituindo os degraus
em leque por patamares.
4. Instalações Elétricas e Hidráulicas
As instalações elétricas devem ser redimensionadas e totalmente
refeitas. Vale ressaltar a opção por tubulações externas e a adoção de
caixas de disjuntores individuais para cada unidade habitacional.
A solução das instalações hidráulicas foi um dos maiores desafios do
projeto. Originalmente, toda a hidráulica do edifício estava concentrada
no bloco de banheiros, localizado atrás dos elevadores. Com a
instauração de novos usos, especialmente o habitacional, tiveram que
ser criados shafts, deslocados dos principais eixos estruturais e
dispostos a cada dois apartamentos. Outros dois foram localizados no
bloco da nova escada de emergência e no antigo poço do elevador.
No 4º pavimento, a mudança de uso (escola) exige a extinção dos shafts
dos apartamentos, sendo a tubulação direcionada para os das escadas.
No posto de saúde, volta a necessidade de uma ampla rede hidráulica:
faz-se um forro rebaixado, por onde a tubulação de água limpa se
ramifica; a tubulação de esgoto é disposta no forro do andar inferior, livre
de problemas com a declividade, já que há um pé-direito de 7,7m.
então, varandas para atenuar a entrada de radiação direta na salaquarto, assim como um brise horizontal a 2,1m de altura para abater a
curva de distribuição de luz e, conseqüentemente, diminuir o contraste.
Os corredores, sempre que possível, possuem aberturas em suas
extremidades, buscando uma melhor iluminação e ventilação. Os
pavimentos dos equipamentos sociais e do térreo também receberam
brises horizontais na fachada NE (voltada para o Largo do Paissandu),
evitando a radiação direta. A fachada da R. Dom José de Barros
praticamente não apresenta problemas, pois há muitas obstruções
externas (edifícios vizinhos). Em todas as unidades habitacionais foram
utilizados cobogós nas áreas de serviço, tentando promover uma
ventilação cruzada.
É importante ressaltar a opção pela integração entre o térreo e a
sobreloja, através da supressão de parte da laje intermediária e da
criação de um mezanino. Com isso, conseguiu-se maior amplidão à
entrada no térreo, que passou a ter 7,7m de pé-direito, melhorando a
iluminação natural de toda galeria comercial, além da inclusão de um
novo acesso à sobreloja.
Máscara de obstruções na fachada
da R. Dom José de Barros.
As edificações vizinhas ao Olido já
atuam como barreira solar em quase
todas as situações.
Nas áreas molhadas dos apartamentos foi necessária, para a
instalação da tubulação de esgoto, a adoção de um piso 20cm elevado,
preenchido com argila expandida ou com o próprio entulho triturado e
ensacado.
5. Iluminação e Ventilação
O projeto das habitações utilizou-se de alguns artifícios para melhorar
suas condições ambientais. Devido à forma do edifício, as quitinetes,
caso mais crítico, possuem grande profundidade e possibilidade de
abertura de caixilhos somente em uma fachada (NE). Foram propostas,
Máscara de obstruções na fachada
da Av. São João.
Dispositivos de proteção solar são
indispensáveis na maior parte do dia.
50
Quitinetes - planta isolux e gráfico de distribuição de iluminância. A
colocação de uma placa horizontal de 0,6m a h=2,1m diminui a entrada
de luz direta e o contraste entre frente e fundo do apartamento, sem
prejudicar os níveis de iluminância.
Equipamentos sociais – plantas isolux e gráfico de distribuição de
iluminância. Optou-se pela colocação de um conjunto de 6 brises
horizontais de 0,6m, equidistantes, garantindo melhor uniformidade de
luz nas salas e, também, ressaltando o bloco de equipamentos sociais
na fachada.
51
6. Caixilhos
Estimativa de Custos
As aberturas nas fachadas foram mantidas conforme a modulação
original. Em alguns casos, foram feitas subdivisões em partes iguais,
racionalizando o desenho e execução dos novos caixilhos. Estes serão
de chapa de ferro dobrada (opção que une durabilidade e custo), assim
como os existentes.
A estimativa de custos da reforma apontou um gasto total de obra de
aproximadamente R$2.417.378,00, o que resultaria num custo médio de
R$10375,00 por unidade, correspondente a R$228,00/m2. Comparados
aos gastos de projetos já executados46, estes valores apresentam-se
satisfatórios, comprovando a viabilidade do projeto de readequação.
Nas quitinetes, apesar do obedecimento à modulação, justifica-se a
troca dos caixilhos pela possibilidade de melhoria das condições
ambientais. A opção por um grande caixilho permite sua divisão em
dispositivos que garantam uma ventilação controlada e em portas de
correr acessando a varanda.
Vale lembrar que, ao considerar a diversidade tipológica empregada, os
custos das unidades menores são ainda inferiores, chegando a
R$6.849,00 para a residência de tipo 3, que dispõe de um dormitório.
Nas outras unidades e nos demais pavimentos de equipamentos e
comércio, procura-se apenas fazer a manutenção das janelas
existentes, que se apresentam em bom estado.
7. Acabamentos
Seguindo o princípio de racionalização da construção, foram
selecionados materiais de acabamento que conciliassem durabilidade e
custos.
Nas habitações, as áreas secas recebem pintura látex diretamente sobre
os painéis leves, com piso de cimento queimado. As áreas molhadas
têm paredes e pisos revestidos com cerâmica.
Tab. 8 – Custos estimados das unidades, por tipologia.
tipologias
Tipo 1 – quitinete
n.º
unidades
área útil
(m2)
custo/unidade
(R$)
149
41,6
9.475,00
Tipo 2 – 3 dormitórios
18
70,0
15.981,00
Tipo 3 – 1 dormitórios
6
30,8
6.849,00
Tipo (A, B e C) – 2 dormitórios
42
46,2
10.533,00
Tipo 5 (A e B) – 2 dormitórios
18
57,0
13.027,00
No entanto, ao incluir o valor de compra do edifício, os custos
chegaram praticamente a quadruplicar. Embora o edifício encontre-se
fechado há 10 anos, seu valor de oferta é de R$25.000.000,00, o que
corresponde a R$833,00/m2, mais que o dobro dos índices geralmente
encontrado em outros projetos (vide tab. 9).
46
Alguns projetos chegaram a duplicar este gasto, como é o caso dos edifícios
Celso Garcia e Brigadeiro Tobias, cujos custos de obra foram de,
respectivamente, R$496,90 e R$ 402,30 (Integra, 2001).
52
Tab. 9 – Comparativo do valor de compra de edifícios na área
central
valor total
(R$)
área construída
preço/ m2 (R$)
(m2)
Ed. Brigadeiro Tobias
420.000,00*
4.522,93
92,90
Ed. Celso Garcia
559.000,00*
3.078,77
181,50
Ed. Rua do Boticário
1.200.000,00**
3.376,77
355,40
Ed. R. Joaquim Carlos
1.600.000,00***
6.677,70
239,60
Ed. Av. Ipiranga
3.000.000,00***
8.332,90
360,00
Fonte: Integra – Cooperativa de Trabalho Interdisciplinar.
* valor da operação efetuada
** valor de oferta
*** valor negociado com o proprietário
Sendo assim, as políticas públicas não podem se mostrar dependentes
desse mercado imobiliário que se apresenta. E, para tanto, dispõe-se de
instrumentos legais, como o direito de preempção e o IPTU progressivo.
No caso em estudo, o fato do edifício estar abandonado há 10 anos
garantiria a sua desapropriação.
Outra questão a ser colocada é a inexistência de políticas públicas de
financiamento, o que possibilitaria, por exemplo, a criação de um
programa de crédito exclusivamente voltado a obras de reabilitação,
visto que este tipo de intervenção é encarado como um investimento de
risco. Além disso, é imprescindível a implantação de uma política de
subsídio pessoal, que auxilie a população no acesso a programas
habitacionais. O exemplo francês de locação social constitui uma
proposta factível, que merece ser melhor estudada.
Dessa forma, mesmo considerando os abatimentos gerados pelos usos
diversos às habitações, os quais seriam, em alguns casos,
comercializados e, em outros, financiados por recursos públicos
provenientes de outras fontes orçamentárias, o valor global médio da
reforma giraria em torno de R$45.000,00 por unidade. Ainda que o PAR
– única linha de crédito disponível para o financiamento de obras de
requalificação de edifícios – elevasse o valor do empréstimo para
R$35.000,00, conforme o anunciado, o projeto permaneceria
completamente inviável.
Tal constatação leva, entretanto, ao questionamento de algumas
diretrizes que vêm marcando as políticas de desenvolvimento urbano no
Brasil, a começar pela supremacia do mercado imobiliário. A questão
fundiária é hoje o grande entrave às políticas habitacionais, que se
inviabilizam mediante os altíssimos valores “de mercado”. Contanto, vale
ressaltar que, muitas vezes, este “mercado” sequer existe, ou seja, tratase de mercadorias sem compradores. Este é o caso dos imóveis e
terrenos ociosos do Centro de São Paulo, nítidos reflexos de um
processo especulativo.
53
ORÇAMENTO DA REFORMA DO EDIFÍCIO "CINE OLIDO" - HABITAÇÕES
OPÇÃO POR PAINÉIS DE CONCRETO CELULAR
PLANILHA TCPO.10-PINI DE DESCRIÇÃO SUMÁRIA DOS SERVIÇOS COM SEUS CUSTOS MÉDIOS (jan/2002, s/BDI, c/LS)
Ordem
1
13
14
15
16
Item
1
2
2.1
3
3.1
17
18
19
20
23
24
26
27
28
31
32
35
38
39
42
43
46
47
48
49
50
51
80
101
3.2
4
4.1
4.2
4.5
4.6
5
5.1
5.2
6
6.1
6.4
6.7
7
7.3
8
9
9.1
9.2
9.3
9.4
10
11
12
Descrição dos Serviços
FUNDAÇÕES
ESTRUTURAS DE CONCRETO ARMADO
Laje treliçada 12 cm
ALVENARIAS
Estrutuais em blocos de concreto 09 cm (9x19x39 cm)
Bloco de concreto celular esp. 10 cm
Estruturais em blocos de concreto 14 cm (14x19x39 cm)
Painel de concreto celular esp. 10 cm (40 x 280 cm)
Divisória "wall" compensado naval, esp. 4 cm
Painel de gesso acartonado "dry-wall" esp. 10 cm
PORTAS, JANELAS E VIDROS
Portas de madeira, 60 cm, externa, p/pintura, completa
Portas de madeira, 70cm, interna, p/pintura, completa
Caixilho em chapa de aço dobrada, correr
Vidro liso 3 mm
COBERTURA
Estrutura pontaletada de madeira p/telhas de barro
Telha cerâmica plan
REVESTIMENTOS DE PISOS INT. E EXTERNOS
Cimentado desempenado e alisado (queimado)
Piso cerâmico
Rodapés de cerâmica 7,5 x 15 cm
REVESTIMENTO PAREDES INT. E EXTERNAS
Azulejos comuns
REVESTIMENTO TETOS
PINTURAS
Esmalte sintético sobre madeira
Esmalte sintético sobre metal
Láteax PVA interno
Látex Acrílico externo
INSTALAÇÕES HIDRO-SANITÁRIAS
Ponto hidráulico
INSTALAÇÕES ELETRO-MECÂNICAS
Ponto elétrico
TOTAL GERAL SEM BDI
Código
SSO-SIURB-PINI
Unidade
Quantid.
Custo
Unitário
030419
PINI
m2
480,00
27,67
070153
PINI
PINI
PINI
PINI
PINI
PINI
m2
m2
m2
m2
m2
m2
0
0
0
17.195,00
0
0
14,53
16,75
21,57
37,46
62,23
39,55
PINI
PINI
SSO
SSO
un
un
m2
m2
347
419
1535
179,66
179,69
104,91
36,78
PINI
PINI
m2
m2
30
30
30,59
19,84
170305
SSO
PINI
PINI
m2
m2
m2
8.221,70
1.723,50
3744,8
11,97
14,52
14,52
110229
SSO
m2
5.155,00
12,75
070171
070207
070503
070604
070701
080101
080102
080241
140102
110101
110405
130202
170305
150211
150310
200205
200304
SSO
SSO
PINI
PINI
m2
m2
m2
m2
4035,00
3070,00
30609,00
2500,00
11,07
12,76
6,38
6,95
ponto
1506
400
ponto
6964
40
Custo
Total
0,00
13.281,60
13.281,60
644.124,70
0,00
0,00
0,00
644.124,70
0,00
0,00
337.458,43
62.342,02
75.290,11
161.036,85
0,00
1.512,90
917,70
595,20
177.813,47
98.413,75
25.025,22
54.374,50
65.726,25
65.726,25
0,00
296.501,07
44.667,45
39.173,20
195.285,42
17.375,00
602.400,00
602.400,00
278.560,00
278.560,00
2.417.378,42
%
0,00
0,55
26,65
13,96
0,06
7,36
2,72
0,00
12,27
24,92
11,52
100
54
Fachada proposta para o Edif. Domingos Fernandes Alonso.
Brises protegem da radiação solar e diferenciam os andares de
habitação e equipamentos sociais.
55
Habitação tipo 1 – quitinete
Habitação tipo 2 – 1 suíte +2 dormitórios
72
Habitação tipo 3 – 1 dormitório.
Habitação tipo 4B – 2 dormitórios
Habitação tipo 4A – 2 dormitórios.
73
Habitação tipo 5A - 1 suíte + 1 dormitório
Habitação tipo 4C – 2 dormitórios
Habitação tipo 5B – 2 dormitórios
74
Centro de Cultura Afro-Brasileira
pavimentos) ocupados pelos hotéis Lincoln e Visconde e pelo Cine
América (pornô) e dois estacionamentos a céu aberto.
A proposição de um centro de cultura afro-brasileira surgiu a partir de
uma pesquisa histórica sobre o Largo do Paissandu e a Igreja de N. Sra.
do Rosário dos Homens Pretos e, principalmente, de conversas com
participantes da Irmandade.
A área é caracterizada como Z5, zona de uso misto de densidade
demográfica alta. Em função do programa do centro de cultura,
caracterizado como E4 – usos especiais –, estabelece-se uma taxa de
ocupação de 0,8 e um coeficiente de aproveitamento de 3,5, ficando a
definição dos recuos mínimos a critério da SEMPLA.
A Irmandade exerce um papel fundamental na preservação da cultura
afro-brasileira, mantendo muitas de suas tradições através de
ramificações em grupos de culto e grupos culturais (congada, por
exemplo) espalhados pela capital e pelo interior. Guarda também um
acervo precioso de documentos que retratam a presença do negro em
São Paulo desde a sua formação. Suas missas dominicais, festas e
procissões mesclam o catolicismo a crenças africanas – N. Sra. do
Rosário é a madrinha da congada –, evidenciando a miscigenação de
culturas ocorrida desde a vinda do negro ao Brasil.
No entanto, após tantos anos de luta para manter vivas a memória e as
tradições afro-brasileiras, a Irmandade vem sofrendo um certo
esvaziamento e envelhecimento, principalmente pela falta de interesse
dos jovens. Um dos principais motivos é a ausência de um espaço
capaz de abrigar outras atividades além do culto religioso.
Atualmente, a Irmandade tem sua sede no porão da igreja, o que limita
muito sua atuação.
Assim, ficou clara a pertinência de se propor um centro de cultura afrobrasileira dentro da área do Paissandu, já que esta guarda parte
dessa história e poderia, ainda, ser mantida a estreita relação com a
igreja.
Um levantamento da região levou à escolha de um terreno de 2400m²
(30x80), delimitado pelo largo, pela rua do Boticário, pela Av. Rio
Branco e por um edifício comercial de 15 pavimentos. Atualmente,
encontra-se subutilizado, sendo ocupado por quatro pequenos edifícios
térreos de uso comercial, três edifícios de baixo gabarito (3 e 4
75
Em primeiro plano, área de projeto vista pela Av. Rio Branco.
77
Projeto
O programa do centro de cultura foi definido não só de acordo com as
necessidades da Irmandade, mas também a partir da carência, na
área central e principalmente na República, de equipamentos culturais
e de lazer voltados a um público mais amplo. Criam-se, assim,
ambientes que proporcionem um intercâmbio cultural, com atividades
para diferentes faixas etárias, que atendam a todos os níveis de renda.
Espaço de exposições – Compreende uma área de exposição
permanente – museu da cultura afro-brasileira – e outra destinada a
mostras temporárias.
Biblioteca e sala multimídia – Abrigariam todo o acervo histórico
colecionado pela Irmandade – documentos, livros, fotografias, vídeos,
áudio –, outras obras pertinentes, além de acesso à Internet.
Auditório – Usos diversos, como palestras, conferências, reuniões dos
vários grupos da Irmandade e até pequenas apresentações artísticas;
possibilidade de locação para outras atividades.
Oficinas e salas de aulas – Ofereceriam aulas de música, canto, teatro,
danças, capoeira, artesanato (pintura, escultura, cerâmica, etc),
reciclagem, corte e costura (podendo, inclusive, produzir os trajes típicos
para os grupos da Irmandade), cursos de línguas e informática. Além de
se desenvolverem atividades relacionadas à cultura afro-brasileira,
certos cursos poderiam ser profissionalizantes, proporcionando uma
alternativa de fonte de renda.
Restaurante afro-brasileiro – Contaria com uma cozinha-escola,
oferecendo cursos de culinária típica.
Térreo livre – Promove, em primeira instância, uma continuidade do
Largo do Paissandu até a Av. Rio Branco. O amplo espaço coberto
procura abrigar diversos usos: ensaios dos grupos de congadas,
concentração e preparação das procissões, festas e outras
manifestações. Conta com uma área de apoio, incluindo vestiários,
sanitários e lanchonete.
“Cinema” a céu aberto – Uma pequena praça no miolo da quadra,
equipada com um telão de projeções e bancos.
Quadra de esportes e piscina – Buscam atender a parte da demanda por
equipamentos esportivos, podendo ter uso livre ou atividades
monitoradas.
Para a distribuição física desse programa, foi proposto um edifício
único setorizado em dois blocos: bloco cultural (acima do nível da
praça) e bloco esportivo (localizado no subsolo).
Como diretriz de projeto foi considerada fundamental a ligação com a
igreja, tanto através de contato visual como pela fluidez do espaço. O
largo se estende até o centro de cultura, integrando-se ao edifício,
permeia a quadra e abre-se novamente em uma área livre.
Surge, assim, uma praça central no miolo da quadra, um espaço
agradável de acesso, passagem e permanência, o que procura constituir
um “respiro” em meio a uma malha urbana extremamente densificada.
A opção por gabaritos não muito elevados, assim como a implantação da
praça central, busca um ganho de qualidade ambiental na Rua do
Boticário, permitindo uma melhoria em sua insolação e escala urbana.
Salão lúdico – Voltado principalmente ao público infanto-juvenil,
ofereceria jogos, brinquedos e equipamentos de áudio e vídeo.
Administração – Recepção, secretaria, diretoria, almoxarifado, sala de
reuniões. Abrigaria a nova sede da Irmandade, responsável pela gestão
do centro cultural, embora este constitua uma obra do poder público.
78
O edifício tira partido de empenas cegas na fachada da Av. Rio
Branco, que atuam como barreira acústica, proporcionando um espaço
interno reservado. O grande vão central concentra a circulação vertical,
sendo que o jogo de passarelas e rampas distribui as atividades e
permite a visibilidade entre os pavimentos. Uma série de sheds na
cobertura desse vão traz iluminação difusa e ainda permite uma
ventilação por efeito chaminé. Abrem-se caixilhos voltados para a
igreja e para o miolo da quadra, assim como ao lado das rampas,
buscando o contato visual com o exterior. Um bloco estrutural
concentra a circulação vertical de emergência e por elevadores e a
hidráulica (bloco de sanitários).
No subsolo localiza-se a área de atividades físicas, incluindo uma
quadra de esportes, uma piscina e um amplo espaço para aulas de
capoeira e danças.
A caracterização do centro de cultura ainda procura resgatar alguns
elementos da arquitetura africana. Os brises dispostos na fachada
frontal constituem-se de um painel formado por elementos vazados que
remetem aos cobogós trabalhados presentes na arquitetura africana.
Propõem-se brises tensionados junto às rampas, cuja forma lembraria as
tendas da cultura vernacular.
Assim como a reforma do edifício do Cine Olido, é necessária uma
construção racionalizada e industrializada, com canteiro de obras seco e
diminuto, visando contornar as dificuldades impostas pelo Centro. Como
condição essencial, o edifício segue uma modulação estrutural,
permitindo o emprego de estrutura metálica, lajes “steel deck” e
painéis de vedação pré-moldados. Opta-se pelo aço patinável –
Corten –, devido à sua excelente resistência à corrosão atmosférica e
possibilidade de utilização sem revestimentos, facilitando sua
manutenção.
79
fachada frontal
fachada r. do boticário
fachada av. rio branco
fachada posterior
80
Praça do Cinema
telão de projeções aproveita empena cega de edifício vizinho.
81
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