Leitura de mapas e paisagens

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Prática Pedagógica
Leitura de mapas e
paisagens
Refletir sobre a organização do espaço em que vivemos é
a principal missão da Geografia. Ensine a moçada a viajar
por mapas, reportagens e textos literários para chegar lá
Elisa Meirelles
Um passeio pela paisagem
Em Santana de Parnaíba, na Grande São Paulo, a professora Julia Pinheiro
Andrade, da Escola Castanheiras, propõe à classe do 7º ano a leitura de
reportagens de revista sobre mudanças climáticas. Seu pedido é que a turma
levante hipóteses sobre causas, consequências e possíveis soluções para o
problema. Na capital paulista, Tânia Pinto Figueiredo, da EMEF Conde Pereira
Carneiro, incentiva a garotada da 8ª série a examinar imagens da avenida
Paulista em diferentes épocas. A ideia é refletir sobre o dinamismo do espaço
e o impacto das ações do homem na natureza. Bem longe dali, a 2,9 mil
quilômetros da capital paulista, na periferia de Teresina, o professor Roberto
Souza e Silva, da EMEF Casa Meio Norte, apresenta aos alunos do 7º ano uma
série de imagens de satélite da Terra, desde a visão espacial do planeta até o
bairro onde vivem. Estudando e relacionando essas aproximações, a moçada
entende as diferentes representações do espaço geográfico.
As três histórias exemplificam algumas possibilidades de leitura na disciplina (
leia o quadro abaixo). Estão presentes textos verbais - acadêmicos,
jornalísticos e literários - e não verbais - mapas, fotos, imagens, desenhos (
leia o infográfico). "Na verdade, quase todos os materiais que circulam na
sala de aula são de leitura", resume Sueli Furlan, professora da Universidade
de São Paulo (USP) e selecionadora do Prêmio Victor Civita - Educador Nota
10.
Essa diversidade de fontes tem em comum o fato de descrever ou
representar o principal objeto de estudo na área - o espaço, composto de
paisagens naturais e culturais, que estão em constante transformação. "Ele
traz em si todas as marcas da vida dos homens, indicando as relações
existentes entre a sociedade e a natureza", explica Helena Callai, doutora em
Geografia pela USP e professora da Universidade Regional do Noroeste do
Estado do Rio Grande do Sul (Unijuí).
A compreensão do que se lê, porém, exige direcionar o olhar da turma para
os aspectos específicos da Geografia. Esse esforço deve nortear o ensino das
estratégias de interpretação tanto de textos como de imagens nos gêneros
mais utilizados. Os caminhos para chegar lá, entretanto, variam nesses dois
casos.
Comecemos pelos textos não verbais. No caso das imagens, a leitura em si
deve ser feita em etapas. Em primeiro lugar, é preciso caracterizar a imagem
como um todo. Existem três tipos - horizontais, oblíquas e verticais. As duas
primeiras são mais familiares para os alunos, uma vez que representam
ângulos de visão do mundo a que eles estão acostumados no dia a dia (ao
olharmos para a frente, enxergamos o mundo em plano horizontal e, da
janela de um edifício, vemos o solo em plano oblíquo, com alguma
angulação). Já o plano vertical está menos presente no cotidiano, mas é
privilegiado em mapas e fotos via satélite.
Enxergar além do que se vê
Na Escola Castanheiras, a turma do 7º ano retrabalha imagens para encontrar
os aspectos que deseja examinar melhor
Fotos: Marcos Rosa
Nesta imagem de satélite do entorno da escola, vamos destacar a área
urbana, a área verde, os cursos d?água e as principais rodovias.
ORIENTAÇÃO CLARA
Cabe ao professor indicar à turma as características que devem ser
analisadas, direcionando o olhar.
RESUMO VISUAL
Num croqui, a imagem torna-se um mapa simplificado. Nele, o aluno vê com
mais clareza o dado que quer investigar.
CAOS APARENTE
Ao representar uma região de forma realista, imagens de satélite retratam a
complexidade do espaço. Sem foco, é difícil entendê-las.
DADOS AGRUPADOS
Reunir informações semelhantes numa mesma categoria e traduzi-las em um
símbolo visual é típico da linguagem cartográfica
Gêneros privilegiados em Geografia
Texto jornalístico
Além de trazerem a atualidade, que aproxima o conteúdo tratado da
realidade dos alunos, notícias, reportagens e artigos se caracterizam por unir
texto e imagem num mesmo material. Isso significa que, ao ler uma
reportagem, o aluno tem contato com linguagens verbais e não verbais. Em
Geografia, ler uma notícia também passa por investigar o conjunto formado
por título, subtítulo, nome do autor, data, foto e seus créditos.
Mapa
Ao retratar de maneira esquemática o espaço por meio de uma linguagem
própria - o alfabeto cartográfico -, o mapa expressa variáveis de todas as
ordens: políticas, físicas e sociais. Nas séries iniciais do Ensino Fundamental 1,
espera-se que o aluno aprenda alguns elementos da cartografia, como a
escala, a legenda e as visões oblíqua e vertical. Nas finais, é hora de
reconhecer e localizar vários dados em mapas, fazer correlações entre eles e
construir mapas-síntese com base no cruzamento da informação de outros.
Texto literário
No melhor dos cenários, boas obras conseguem unir informações precisas
sobre o espaço com pitadas de ficção, emoção e aventura. São fontes de
informação geográfica e, ao mesmo tempo, textos gostosos de ler.
Comparar imagens para notar o dinamismo do espaço
A moçada deve perceber profundidades e identificar os elementos naturais e
sociais posicionados mais próximos e mais distantes. Outro recurso
importante, especialmente quando se trata de debater o dinamismo do
espaço, é comparar fotografias do mesmo lugar em diferentes épocas. A
professora Tânia, da Conde Pereira Carneiro, na capital paulista, criou um
projeto de leitura de imagens com os alunos da 8ª série para debater as
transformações na avenida Paulista, um dos pontos símbolo da cidade.
"Selecionei uma série de imagens de diferentes épocas sem contar do que
tratavam", diz ela. Para organizar a análise, distribuiu um pequeno roteiro de
perguntas para que a turma prestasse uma atenção especial nas
características naturais e sociais: "Descreva objetivamente: o que as imagens
retratam? O conjunto de elementos remete a que tipo de região (urbana,
rural, desenvolvida, pobre etc.)? Quais as diferenças mais relevantes em
relação à ocupação do espaço?"
Depois de algum tempo de conversa, os alunos perceberam que era o
mesmo lugar e chegaram à conclusão de que o espaço vai se transformando
de acordo com as necessidades e os interesses do homem, um dos principais
conceitos em Geografia. "Com as transformações, aparecem também vários
problemas, como o trânsito caótico", notou um dos alunos, apontando para
uma das fotos recentes do local.
Já para ler mapas, o aluno precisa conhecer outra linguagem: a cartografia. A
chamada alfabetização cartográfica deveria começar logo nos primeiros anos
do Ensino Fundamental, mas isso nem sempre ocorre. Então, antes de
começar, é bom fazer uma avaliação dos conhecimentos da turma, checando
quais conceitos ainda precisam ser explicados e quais já estão solidificados.
Uma opção é pedir um mapa mental do percurso desde a casa até a escola e,
com base nele, lançar a discussão sobre os elementos essenciais da
cartografia: a função da legenda, do título, da escala e para que servem
pontos, linhas e áreas. A turma também deve saber que diferentes texturas,
cores e tons, dependendo do tipo de mapa, caracterizam diferentes alturas,
relevos e coberturas vegetais.
Para facilitar a leitura e ajudar na compreensão dos conceitos em mapas, os
croquis são recursos valiosos ( leia o quadro abaixo). De origem francesa, a
palavra croqui significa algo como "rascunho". Não deixa de ser isso mesmo,
mas, em Geografia, não se trata de mera cópia: como procedimento de
estudo, o croqui serve para destacar informações ou como base para um
mapa-síntese que reúna dados de diversos outros ( leia a sequência
didática).
Além de mapas e imagens, textos verbais também têm espaço cativo na
disciplina. Notícias, reportagens e artigos são privilegiados porque
conseguem aproximar a disciplina do cotidiano do aluno. "Faz todo o sentido
trabalhar com esses gêneros, ainda mais se considerarmos uma definição
clássica que diz que a Geografia é a ?história do presente?", comenta Sueli
Furlan. "Hoje, não se consegue trabalhar a disciplina sem caminhar junto com
os acontecimentos da atualidade", completa a professora e geógrafa Maria
Helena Klein, uma das vencedoras do Prêmio Victor Civita - Educador Nota 10
de 2008.
Levar exemplares de revistas e jornais, em vez de contentar-se com cópias ou
os trechos de notícias, é importante para que os alunos se familiarizem com a
organização dessas publicações e, de quebra, identifiquem outros temas que
possam auxiliar na compreensão do assunto - reportagens correlatas são
comuns em cadernos e edições especiais. Não se esqueça ainda de explorar
o ano em que o recurso foi produzido. Afinal, o espaço que aparece no texto
está em processo constante de mudança. "Se você revisitar hoje as paisagens
descritas por Guimarães Rosa, por exemplo, vai encontrá-las transformadas,
alteradas", comenta Sueli Furlan.
Antes de abordar esses gêneros, vale recorrer à sempre bem-vinda estratégia
de explorar os conceitos prévios da garotada sobre o espaço que vai ser
retratado. Ao trabalhar com notícias sobre o aquecimento global, Julia
Pinheiro Andrade, mestre em Educação pela Universidade de São Paulo (USP)
e professora da Escola Castanheiras, na capital paulista, iniciou perguntando:
"O que são mudanças climáticas?" "É o aumento da secura do ar em certos
locais", afirmou uma aluna. "É a oscilação térmica", disse outra. Ainda sem a
preocupação de apontar uma alternativa correta, a professora sugeriu:
"Vamos ler o que nos diz uma reportagem sobre o tema".
Procedimento de estudo - Croqui cartográfico
Ao simplificar mapas e imagens de satélite, ele ressalta o mais importante na
imagem para facilitar o entendimento
Essa espécie de mapa simplificado segue algumas regras básicas - as
principais são ter título e legenda. O título precisa explicar a característica
A CARA DO PAI Com o auxílio do papel
vegetal, os croquis
feitos na Escola Castanheiras têm
semelhança com o mapa
original, o que colabora para a leitura da
imagem.
Foto: Marcos Rosa
principal que se quer
expressar no croqui e a
localização daquela imagem.
Já a legenda deve servir como
chave de todos os símbolos
usados no desenho (cores,
formas, traços, pontos, letras
etc.). Quanto à escala, ainda
que não seja necessário
estimá-la com precisão, é
preciso manter as
proporções de tamanho e
distância entre os objetos.
Ao fazer o croqui, é preciso
realizar quatro ações
principais: identificar um
objetivo para a leitura
espacial, selecionar as informações mais importantes, agrupar essas
informações e traduzi-las em símbolos. "É como um resumo de texto",
compara a professora Julia, da Escola Castanheiras, exemplificando o
processo de confecção: "Grama, árvore e arbusto viram vegetação. Em
seguida, o aluno escolhe um símbolo, como a cor verde, e o traduz,
codificando-o com ela".
Nas reportagens, roteiro ajuda a manter o foco da leitura
Para concentrar a atenção nos itens essenciais, a opção foi orientar os
caminhos da turma com um roteiro: qual o título da reportagem? Em que
mídia e em que data foi publicada? Identifique o lide (parágrafo ou trecho que
traz as principais informações sobre a história) e resuma a reportagem.
"Estabeleço perguntas de exploração inicial do texto e ofereço orientações
para grifar - ou destacar - aquilo que justifique as respostas encontradas e
marcar as fontes de cada resposta", explica Julia.
A especificidade do roteiro em Geografia é que as respostas devem analisar
aspectos relacionados ao espaço e às paisagens. Com base nelas, a turma
pode voltar ao texto e buscar as informações necessárias para o
entendimento dos conceitos geográficos que lá estão. É possível levar o aluno
a entender o texto como um todo, localizar argumentos e reescrever com as
próprias palavras.
Para conseguir um resultado ainda melhor, Julia combina o roteiro com uma
tabela de hipóteses, maneira simples de levantar os conhecimentos antes da
leitura e comparar com o que eles aprenderam depois dela. No modelo
proposto pela professora, a turma preenche as hipóteses iniciais sobre o
tema a lápis. Depois, acrescenta um asterisco às ideias que se confirmaram e
anota com caneta colorida as novas informações que o texto traz.
A troca de impressões sobre o que cada um aprendeu pode encaminhar uma
animada discussão após a leitura. Também é importante avaliar se a atividade
foi encarada como fácil ou difícil e se restou alguma dúvida. Se isso ocorrer,
uma boa estratégia é encaminhar uma busca de informações
complementares por meio da consulta a outras fontes. Em alguns casos, vale
ainda incentivar a composição de textos jornalísticos sobre o mesmo tema
estudado, mas com um enfoque local. Experimentar escrever em um gênero,
você sabe, é uma forma de aprender a lê-lo melhor.
Quer saber mais?
CONTATOS
EMEF Casa Meio Norte, R. Pardal, 5659, 64057-065, Teresina, PI, tel. (86) 3215-7641
EMEF Conde Pereira Carneiro, Av. João Peixoto Viegas, 441, São Paulo, SP, tel. (11) 5631-9575
Escola Castanheiras, Al. Castanheiras, 250, 06543-510, Santana de Parnaíba, SP, tel. (11) 4152-4600
Sueli Furlan, [email protected]
BIBLIOGRAFIA
Cartografia Escolar, Rosangela Doin de Almeida (org.), 224 págs., Ed Contexto, tel. (11) 3832-5838, 39 reais
Do Desenho ao Mapa: Indicação Cartográfica na Escola, Rosângela Doin de Almeida, 120 págs.,
Ed. Contexto, 25 reais
INTERNET
Em www.programamapa.com.br, clique em "MEC" e, em seguida, em "croqui" para assistir a uma aula sobre o tema.
Endereço da página:
https://novaescola.org.br/conteudo/2330/leitura-de-mapas-e-paisagens
Links da página
http://revistaescola.abril.com.br/geografia/pratica-pedagogica/leitura-mapas-producaocroquis-desmatamento-mata-atlantica-526528.shtml
http://www.programamapa.com.br
Publicado em NOVA ESCOLA 01 de Janeiro de 2010
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