Iléia Maria de J. Pinto UFAM – [email protected] Ricardo de Jesus Cardoso FAPEAM/UFAM – [email protected] Richarlison da Costa e Silva UFAM - [email protected] CARTOGRAFIA E ENSINO DE GEOGRAFIA: CONSIDERAÇÕES ACERCA DO EMPREGO DO SOFTWARE DE CARTOMÁTICA PHILCARTO INTRODUÇÃO O trabalho em foco apresenta orientações para o uso do software de cartomática Philcarto, com vistas em considerar o seu potencial como ferramenta para produção de mapas temáticos destinados ao Ensino de Geografia. As três características importantes em um programa de cartomática e que atribuem qualidade ao Philcarto são: a) total liberdade e versatilidade na elaboração/adaptação das bases cartográficas e de dados; b) diversidade de funções de mapeamento e análise dos dados; c) qualidade do mapa final, exportado em formato vetorial (GIRARDI, 2007). Com vista em avaliar o emprego desta ferramenta, realizou-se esta pesquisa que consistiu na elaboração de bancos de dados estatísticos e na construção e análise de mapas temáticos sobre a dinâmica espacial da região Norte do Brasil. Foram construídos dez mapas distribuídos entre os temas dinâmica populacional, transporte aéreo e atividade econômica, de acordo com as seguintes variáveis: distribuição da população em 1970 e em 2000; tráfego aéreo interurbano em 2007; porcentagem do PIB em 2000; densidade demográfica em 2000; taxa de urbanização em 2000; produção na extração de madeira em tora, de castanha-do-Pará, de borracha e de açaí no ano de 2007. A Base de dados para elaboração dos mapas foi construída no Excel a partir de planilhas obtidas no banco de dados do SIDRA (Sistema IBGE de Recuperação Automática). A base de dados para elaboração do mapa de ligações proporcionais das viagens aéreas interurbanas foi construída a partir do Anuário Estatístico do Transporte Aéreo disponível no site da Anac (Agência Nacional de Aviação Civil). Os dados foram selecionados de acordo com nossa área de estudo e copiados para uma planilha do Excel e formatado de acordo com as exigências de compatibilidade para uso no Philcarto. Realizado de 25 a 31 de julho de 2010. Porto Alegre - RS, 2010. ISBN 978-85-99907-02-3 1 Foi utilizada a base cartográfica do Brasil com a divisão dos municípios obtida no site de Phillipe Wanier. Utilizando o software Adobe Ilustrator, fez-se o recorte dos estados brasileiros que compõem a região Norte, selecionando áreas e pressionando a tecla Delete para excluir os polígonos e os pontos. Além disso, inserimos duas camadas do tipo .L para representar a malha viária e os principais rios da região utilizando um arquivo de imagem obtido no site do IBGE. As duas imagens foram sobrepostas com precisão de modo que fosse possível inserir as novas camadas e que elas fossem fiéis a fonte originária. URBANIZAÇÃO DA REGIÃO NORTE (1970-2000) Nos mapas é possível visualizar o processo de urbanização da região Norte, bem como os padrões de ocupação (Fig. 01 e Fig 02). Até a década de 1960, predominava a tendência das cidades a se localizarem as margens dos principais rios. A primazia urbana das capitais dos estados também é considerável, sobretudo Manaus e Belém. A partir da década de 1960, será introduzido na região um novo padrão de ocupação impulsionado pela política de integração nacional. O governo federal, por meio desta prática, “atraiu grandes empresas nacionais e estrangeiras, incentivou projetos agropecuários, minerais, madeireiros e industriais, concomitante ao processo de produção controlada do espaço, através do fluxo migratório e da política de colonização” (OLIVEIRA, 1995, p. 37). Realizado de 25 a 31 de julho de 2010. Porto Alegre - RS, 2010. ISBN 978-85-99907-02-3 2 Fig. 01. Distribuição da população da região Norte em 1970. Fig. 02. Distribuição da população da região Norte em 2000 As novas cidades surgiram, na sua maioria, no entorno de três grandes rodovias construídas após a década de 1960, nas áreas de terra firme entre os principais rios da Amazônia: Belém-Brasília, Transamazônica e a Cuiabá-Porto Velho (BROWDER; GODFREY, 2006). O padrão de ocupação rio-várzea-floresta predominante na região desde a colonização passou a ser conjugado ao padrão estrada-terra firme-subsolo (GONÇALVES, 2001). TRÁFEGO AÉREO INTERURBANO NA REGIÃO NORTE NO ANO DE 2007 O transporte aéreo na região Norte apesar de pouco significativo, se considerarmos a predominância do uso do transporte fluvial, aponta uma dinâmica que reflete a sua rede urbana (Fig 03). Nota-se uma intensidade das ligações entre cidades, as mais importantes capitais, como Belém e Manaus, bem como a maior freqüência de viagens no estado do Pará. Outras cidades como Santarém e Altamira no estado do Pará e Coari no Amazonas possuem um relativo destaque. Nota-se também a inexistência de ligações das cidades do estado de Tocantins com cidades dos demais estados da região. Realizado de 25 a 31 de julho de 2010. Porto Alegre - RS, 2010. ISBN 978-85-99907-02-3 3 Fig.03. Tráfego aéreo entre cidades da região Norte em 2007. PORCENTAGEM DO PIB DA REGIÃO NORTE A interpretação do mapa gerado pelo PHILCARTO, a partir do módulo PRO (Explo), diagrama triangular, permite fazer as seguintes análises da distribuição geográfica do Produto Interno Bruto da região norte (Fig. 04): Os valores do PIB dos setores primários e terciários predominam possivelmente em razão da tradicional presença do extrativismo, além do significativo avanço da pecuária e soja no sul e leste da região, formando a arco do desmatamento; A relevância do PIB terciário em muitos municípios de pouca expressão econômica surge como reflexo da importância do funcionalismo público, de benefícios da previdência social e de programas sociais do governo federal que fomentam a economia, enquanto que o predomínio deste mesmo setor nas maiores cidades (Belém-PA, Rio Branco-AC, Macapá-AP, Porto Velho-RO, etc.) deve-se à polarização econômica desses centros regionais, que funcionam como referência nas prestações de serviços (rede bancária, comércio, lazer, serviços de educação e saúde,etc.); Realizado de 25 a 31 de julho de 2010. Porto Alegre - RS, 2010. ISBN 978-85-99907-02-3 4 O PIB do setor secundário é o de menor expressão na região norte, porém temos o destaque do município de Manaus, beneficiado pelo PIM (Pólo Industrial de Manaus), concentra 98% da economia do estado do Amazonas, sendo o município com o maior PIB da Região norte; Em outros municípios onde há o predomínio do PIB secundário, atribui-se a importância da exploração mineral que é responsável por boa parte da arrecadação desses municípios. Fig. 04. Porcentagem do PIB da região Norte em 2000 DENSIDADE DEMOGRÁFICA DA REGIÃO NORTE – 2000 A interpretação do mapa (fig. 05) permite concluir que a região Norte possui uma baixa densidade demográfica, sendo que a significativa maioria dos municípios possuem menos de um habitante por quilômetro quadrado. Exceção os municípios de Manaus e Belém, além daqueles que fazem parte da região metropolitana de Belém, que possuem densidades demográficas maiores. Manaus, por exemplo, possui uma densidade de 123 habitante por quilômetro quadrado, concentrando mais de 50% da população amazonense, enquanto que o interior do Amazonas não ultrapassa 2% de habitante por quilômetro quadrado. Realizado de 25 a 31 de julho de 2010. Porto Alegre - RS, 2010. ISBN 978-85-99907-02-3 5 Fig. 05 Densidade demográfica dos municípios da região Norte em 2000 TAXA DE URBANIZAÇÃO DA REGIÃO NORTE A partir do mapa da taxa de urbanização da região Norte (Fig. 06) é possível destacar polígonos cujos valores são mais expressivos, como no caso do sul do Amazonas, norte de Rondônia e sudeste do Acre, este quadro confirma a forte migração que esta área vem experimentando nas últimas décadas, impulsionada pelo avanço da soja e pecuária na região. O mapa também destaca um forte processo de urbanização no sudeste e estado de Tocantins, possivelmente reflexo do avanço de setores como a mineração e investimento em infra-estrutura (construção de rodovias) que dinamizam a economia desse espaço e funciona como um pólo de atração populacional. As tendências de urbanização mais intensas na região ficam claramente demonstradas quando ocorre a suavização do mapa, uma vez que “os limites dos municípios são subtraídos e a legenda apresenta somente dois extremos. Isso acorre porque os dados representados são resultantes da relação entre os municípios e não de cada um isoladamente” (GIRARDI, 2007, p.53). Realizado de 25 a 31 de julho de 2010. Porto Alegre - RS, 2010. ISBN 978-85-99907-02-3 6 Fig 06. Taxa de urbanização da região Norte em 2000. PRODUÇÃO NA EXTRAÇÃO DE MADEIRA EM TORA A interpretação da organização espacial do extrativismo voltado para a produção de madeira na região Norte permite concluir a concentração dessa atividade no sul e nordeste do Pará, além de apresentar também uma produção destacada no norte de Rondônia. O Amazonas, que possui 95% das suas áreas preservadas, também a produção de madeira se destaca no centro-sul do estado, entretanto, os desmatamentos do sul e os já sentidos até mesmo no alto do Solimões que o Amazonas está sendo atingido pelo processo dominante no Pará, Mato grosso e Rondônia, onde a expansão econômica desordenada transforma a madeira em bem cada vez mais raro e valorizado pela escassez. Realizado de 25 a 31 de julho de 2010. Porto Alegre - RS, 2010. ISBN 978-85-99907-02-3 7 Fig. 07. Produção na extração de madeira em tora na região Norte em 2007. O quadro da produção de madeira na região Norte mostra que sua origem provém principalmente do desmatamento e do corte seletivo não sustentável, e desconhece-se quanto dela é produzido legalmente. PRODUÇÃO DA CASTANHA-DO-PARÁ NA REGIÃO NORTE A distribuição espacial da produção da castanha na região Norte revela primeiramente a concentração dessa atividade produtiva na Amazônia Ocidental (rio Solimões e Madeira), apesar de que a extração desse produto é menos concentrada que outros produtos extrativistas de relevância na região. Talvez isso se deve ao fato desse produto ser uma atividade tradicional das comunidades amazônicas. O Amazonas é o maior produtor de castanha da região Norte, produzindo, segundo o IBGE, 27.038 toneladas ao ano. Este produto é encontrado nas matas de Terra Firme em vários países da região Amazônica. Realizado de 25 a 31 de julho de 2010. Porto Alegre - RS, 2010. ISBN 978-85-99907-02-3 8 Fig. 08. Produção de castanha-do-pará na região Norte em 2007. PRODUÇÃO DE BORRACHA NA REGIÃO NORTE A distribuição espacial da produção de borracha na região norte apresenta, assim como no caso da distribuição espacial da castanha, uma concentração dessa atividade extrativa na porção ocidental da região Norte, onde historicamente sempre apresentou os maiores índices de produção. Realizado de 25 a 31 de julho de 2010. Porto Alegre - RS, 2010. ISBN 978-85-99907-02-3 9 Fig. 09. Produção de borrachas na região Norte em 2007. Os estados do Acre e Amazonas se destacam na produção gumífera, reflexo da revitalização que este setor vem experimentando em razão do aumento de reservas extrativistas na região, relativo aumento de investimento do poder público interessado na retomada da produção de borracha nos respectivos estados. No que se refere à produção no estado do Amazonas, a área de produção dominante é o sul que concentra 85% da produção do estado, conforme demonstrou o mapa. PRODUÇÃO DE AÇAÍ NA REGIÃO NORTE A distribuição espacial da produção de açaí na região Norte revela uma concentração acentua da na região nordeste do estado do Pará, fica apenas a incidência de alguns pontos nos outros estados. A produtividade do açaí no Pará obedece a um plantio planejado, o que o difere dos demais estados da região. Realizado de 25 a 31 de julho de 2010. Porto Alegre - RS, 2010. ISBN 978-85-99907-02-3 10 Fig. 10. Produção de açaí na região Norte em 2007. No estado do Amazonas predomina a produção de açaí nos municípios localizados nas margens do rio Solimões-Amazonas, área de várzea inundável periodicamente, bem propicia à produção de açaí. CONCLUSÃO As ferramentas utilizadas para a elaboração dos mapas demonstram que a elaboração destes instrumentos gráficos podem ser úteis na interpretação de diversas variáveis. Os temas escolhidos possibilitam uma melhor interpretação da realidade, dando visibilidade a aspectos relevantes do contexto regional. Por fim, este trabalho nos fez relembrar da importância da cartografia como instrumento de interpretação da realidade geográfica, bem como o seu potencial de emprego no ensino básico de geografia. O emprego de mapas na sala de aula tem sido considerado como importante instrumento no processo de ensino aprendizagem em geografia (KATUTA, 2006; PONTUSCHKA, PAGANELLI e CACETE, 2007). Mais do que isso, conforme os Parâmetros Curriculares Nacionais, deve-se “contribui não apenas para que os alunos venha compreender e utilizar uma ferramenta básica da Geografia, os Realizado de 25 a 31 de julho de 2010. Porto Alegre - RS, 2010. ISBN 978-85-99907-02-3 11 mapas, como também para desenvolver capacidades relativas à representação do espaço” (BRASIL, 1998, p. 33). Dessa forma, é apropriado oferecer ao aluno a oportunidade dele produzir mapas. Assim, consideramos a ferramenta utilizada neste trabalho adequada para este fim, uma vez que se mostrou de fácil manuseio, além de corresponder satisfatoriamente na representação dos dados que foram tratados. REFERÊNCIAS BRASIL. Parâmetros curriculares nacionais: geografia. Brasília: MEC/SEF, 1998. BROWDER, John O.; GODFREY, Brian J. Cidades da floresta: urbanização, desenvolvimento e globalização na Amazônia Brasileira. Tradução de Gisele Vieira Goldstein. Manaus: EDUA, 2006. GONÇALVES, Carlos Walter Porto. Amazônia, Amazônias. São Paulo: Contexto, 2001. KATUTA, Ângela Massumi. A imagem cartográfica no ensino superior e básico. PONTUSCHKA, Nídia Nacib; OLIVEIRA, Ariovaldo Umbelino de (orgs.). Geografia em Perspectiva: ensino e pesquisa. 3. ed. São Paulo: Contexto, 2006. OLIVEIRA, José Aldemir de. As cidades amazônicas a ilusão da busca. n. 2. Boletim Amazonense de Geografia. Manaus: Associação dos Geógrafos Brasileiros / Seção Manaus, 1995. PONTUSCHKA, Nídia Nacib; PAGANELLI, Tomoko Iyda; CACETE, Núria Hanglei. Para ensinar e aprender geografia GIRARDI, Eduardo Paulon. Manual de utilização do programa Philcarto (trabalho não publicado). Realizado de 25 a 31 de julho de 2010. Porto Alegre - RS, 2010. ISBN 978-85-99907-02-3 12