conhecimento tradicional associado, patrimônio genético

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Foz do Iguaçu, PR, Brasil, 09 a 11 de outubro de 2007
CONHECIMENTO TRADICIONAL
ASSOCIADO, PATRIMÔNIO GENÉTICO,
PESQUISA E PATENTE DE NOVOS
FÁRMACOS
Carla Regina Blanski Rodrigues (CESCAGE/UTF)
[email protected]
Ivanir Luiz de Oliveira (UTFPR)
[email protected]
João Luiz Kovaleski (UTFPR)
[email protected]
A utilização do conhecimento tradicional de comunidades indígenas em
relação aos recursos naturais torna-se muitas vezes o início para
pesquisas de produtos farmacêuticos. Nas pesquisas de plantas
medicinais, a abordagem etnofarmacológica cconsiste em associar
informações adquiridas junto a estas comunidades, com estudos químicofarmacêutico. O objetivo deste artigo é descrever os aspectos do
conhecimento tradicional e sua utilização pela indústria farmacêutica,
bem como sua regulamentação no Brasil. A perda da biodiversidade e o
acelerado processo de mudança cultural acrescentam uma necessidade de
urgência no registro desse saber. Nesse contexto, surge como principal
meta para o aproveitamento racional da biodiversidade brasileira visando
a produção de medicamentos é, sem dúvida, descobrir como transformar
um imenso patrimônio genético natural em riquezas, criando indústrias de
base tecnológica e gerando empregos qualificados.
Palavras-chaves: Conhecimento tradicional, etnofarmacologia, patentes.
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Foz do Iguaçu, PR, Brasil, 09 a 11 de outubro de 2007
1.Introdução
Segundo a Convenção sobre Diversidade Biológica (2004), biodiversidade é a variabilidade de
organismos vivos de todas as origens e os complexos ecológicos de que fazem parte,
compreendendo a diversidade dentro de espécies, entre espécies e de ecossistemas.
O Brasil possui a maior biodiversidade do mundo, estimada em cerca de 20% do número total de
espécies do planeta. Esse imenso patrimônio genético, já escasso nos países desenvolvidos, tem
na atualidade valor econômico-estratégico inestimável em várias atividades, mas é no campo do
desenvolvimento de novos medicamentos onde reside sua maior potencialidade (CALIXTO,
2003).
O interesse pela biodiversidade para a produção de medicamentos aumentou sensivelmente com a
conclusão do genoma humano, pois grande parte dos medicamentos produzidos à nível mundial é
de origem natural, principalmente de origem vegetal, podendo ou não apresentar alterações
sintéticas estruturais.
Com o avanço da biotecnologia a exploração econômica de recursos genéticos e de
conhecimentos tradicionais associados ganhou outra dimensão (AZEVEDO, 1996). O resgate e a
aplicação do conhecimento das comunidades tradicionais como índios, agricultores, ribeirinhos, a
respeito dos recursos naturais, podem levar a patente de novos produtos e processos.
Como estratégia a investigação de plantas medicinais, o estudo etnofarmacológico consiste em
combinar informações adquiridas junto a usuários da flora medicinal, comunidades e
especialistas tradicionais, com estudos químicos e farmacológicos (ELISABETSKY, 2003). O
método etnofarmacológico permite a formulação de hipóteses quanto à(s) atividade(s)
farmacológica(s) e à(s) substância(s) ativa(s) responsáveis pelas ações terapêuticas relatadas
(BRUHN & HOLMSTEDT, 1982).
Essas hipóteses podem ser testadas cientificamente, considerando toda a informação, incluindo a
forma de preparo e posologia, que traz o conhecimento tradicional.
O objetivo deste artigo é descrever os aspectos do conhecimento tradicional e sua utilização pela
indústria farmacêutica, bem como sua regulamentação no Brasil.
A legislação na área de biotecnologia são pontos bastante polêmicos que envolvem além das
comunidades tradicionais, interesses nacionais e internacionais de Estado, empresas, laboratórios,
cientistas, intelectuais e políticos.
2. A Convenção sobre Diversidade Biológica
A perda crescente de biodiversidade levou à elaboração de um dos tratados internacionais de
maior adesão: a Convenção sobre Diversidade Biológica (CDB).
Até a CDB, assinada durante a ECO-92, entrar em vigor em 1993, os recursos genéticos eram
considerados como patrimônio da humanidade, podendo ser acessados livremente.
Esta foi a mudança de paradigma com relação aos recursos genéticos, isto é, estes recursos
deixaram de ser de livre acesso, para estarem subordinados à soberania dos países, portanto, seu
acesso sujeito às leis nacionais.
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Os mecanismos que a CDB prevê para mitigar os efeitos do desequilíbrio de força e de poder
econômico e político entre países desenvolvidos e em desenvolvimento são o consentimento
prévio fundamentado dos países de origem dos recursos genéticos e a repartição dos benefícios
gerados pelas atividades de bioprospecção, que envolvem o acesso a material genético e seus
produtos ou aos conhecimentos tradicionais associados, a fim de identificar possíveis aplicações
econômicas (SANTILLI, 1996).
A CDB instituiu como seus objetivos: a conservação da biodiversidade, a utilização sustentável
de seus componentes e a repartição justa e eqüitativa dos benefícios derivados da utilização dos
recursos genéticos.
Esta meta de “justiça social global” parte do fato que, via de regra, a diversidade biológica no
mundo está distribuída de forma inversamente proporcional ao acúmulo de capital financeiro e
tecnológico: países pobres mantêm grande parte da biodiversidade do planeta, sem contar com
recursos financeiros e humanos capazes de otimizar a exploração de sua biodiversidade de forma
sustentável – o que indiretamente representa uma ameaça à sua integridade. De outro lado, países
ricos contam com recursos e biotecnologia de ponta, mas apenas chegaram a este estágio
evolutivo às custas da devastação de sua própria biodiversidade, tornando-se pobres sob este
prisma, e da apropriação desregrada da biodiversidade nos países pobres, também chamada de
biopirataria. (BAPTISTA, 1996)
Porém, quando o regime internacional de patentes tornou-se mais evidente através do Acordo
Trips, Tratado sobre os Direitos de Propriedade Intelectual Relacionados ao Comércio, os
dispositivos da CDB não foram incorporados ao Trips, durante a Rodada Uruguai (1994), que é o
acordo internacional mais recente e importante na área de propriedade intelectual.
3. Questão das patentes na política brasileira do patrimônio genético
No Brasil, país membro da CDB desde 1994, a primeira proposta para regulamentar o acesso aos
recursos genéticos data de 1995, iniciativa que partiu da então Senadora Marina Silva por meio
de um projeto de lei. Esse projeto foi debatido em vários foros, e subsidiou e ainda tem
subsidiado a regulamentação da matéria, nacional e internacionalmente. Em 1998 foi aprovado
no Senado, na forma do substitutivo do Senador Osmar Dias (BRASIL, 2005).
Segundo Ministério do Meio Ambiente (2005) em 1998, dois outros Projetos de Lei foram
apresentados: do então Deputado Jacques Wagner, e outro de autoria do Executivo Federal,
acompanhado por uma Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 618 – A/98, que inclui no rol
de bens da União o Patrimônio Genético Brasileiro. Em decorrência, a exploração do patrimônio
genético passa a depender, como os recursos minerais, de concessão da União.
Em junho de 2000, diante de notícias sobre contrato entre a Novartis e a Bioamazônia, o Governo
Federal editou uma Medida Provisória para regulamentar a matéria. Esta primeira edição da
medida provisória foi feita às pressas para legitimar o acordo firmado entre as respectivas
empresas atropelou o processo legislativo, no qual diversos setores do governo e da sociedade
civil discutiam a formulação de propostas que visavam a implementação da CDB.
Esta Medida Provisória foi sendo reeditada e modificada até a Medida Provisória (MP) nº 2.18616, de 23 de agosto de 2001, quando foi aprovada a Emenda Constitucional alterando o regime
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das MPs. A MP 2.186-16 estabelece normas legais para regular o acesso aos recursos genéticos e
conhecimento tradicional associado no território brasileiro (BRASIL, 2005).
A partir da versão atual da Medida regulamentada pelo Decreto nº 3.945 de 2001 (modificado
pelo Decreto nº 4.946/03), o acesso e a remessas do patrimônio genético bem como o acesso ao
Conhecimento Tradicional Associado existente no país passou a depender de autorização do
Conselho de Gestão do Patrimônio Genético (CGEN), ficando sujeito à repartição de benefícios,
nos termos e nas condições legalmente estabelecidos.
Dessa forma, preservou-se o intercâmbio e a difusão de componente do patrimônio genético e do
conhecimento tradicional associado praticado entre as comunidades indígenas e entre as
comunidades locais, desde que em seu próprio benefício e baseados na prática costumeira.
Com o credenciamento do IBAMA para emissão de autorizações de acesso ao patrimônio
genético para pesquisa científica, conforme Deliberação nº 40 do CGEN, o mesmo passou a
deliberar sobre processos que envolvem acesso ao patrimônio genético para fins de
bioprospecção e desenvolvimento tecnológico, acesso ao conhecimento tradicional associado
para quaisquer finalidade, e credenciamento de instituição fiel depositária.
4. Conhecimento Tradicional Associado e Patrimônio Genético
Pela definição presente na medida provisória (MP) 2.186-16, conhecimento tradicional associado
é a informação ou prática, individual ou coletiva, de comunidade indígena ou de comunidade
local, com valor real ou potencial, associado ao patrimônio genético.
O acesso ao conhecimento tradicional associado, segundo a mesma MP, é a obtenção de
informação sobre o conhecimento ou prática individual ou coletiva, associada ao patrimônio
genético, de comunidade indígena ou de comunidade local, para fins de pesquisa científica,
bioprospecção ou desenvolvimento tecnológico, visando sua aplicação industrial ou de outra
natureza.
O CGEN, por meio de sua Câmara Temática de Conhecimentos Tradicionais, está elaborando
uma Orientação Técnica para deixar mais claro o escopo do conceito de conhecimento tradicional
associado e do acesso a este conhecimento.
Atualmente há um consenso de que conhecimento tradicional associado é aquele que facilita ou
possibilita o acesso ao patrimônio genético. Desse modo, informações sobre o uso de plantas tem
sido considerado conhecimento tradicional associado, enquanto que informação sobre a mitologia
não necessariamente envolve conhecimento tradicional associado (BRASIL,2005).
Patrimônio genético define-se, segundo Brasil (2005), como informação de origem genética,
contida em amostras do todo ou de parte de espécime vegetal, fúngico, microbiano ou animal, na
forma de moléculas e substâncias provenientes do metabolismo destes seres vivos e de extratos
obtidos destes organismos vivos ou mortos.
Acesso ao patrimônio genético refere-se a qualquer atividade que vise à obtenção de amostra de
componente do patrimônio genético, isto é, atividades que objetivem isolar, identificar ou utilizar
informação de origem genética, em moléculas ou substâncias provenientes do metabolismo dos
seres vivos, extratos obtidos destes organismos, com a finalidade de pesquisa científica,
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desenvolvimento tecnológico ou bioprospecção, visando sua aplicação industrial ou de outra
natureza.
5. Seleção de espécies vegetais para produção de fármacos
Várias abordagens para a seleção de espécies vegetais têm sido apresentadas na literatura
(Elisabetsky & Moraes,1988), dentre elas, três tipos são alvo de maiores investigações:
a) abordagem randômica - escolha da planta sem qualquer critério, tendo como fator
determinante a disponibilidade da planta;
b) bordagem quimiotaxonômica ou filogenética - seleção da espécie correlacionada com a
ocorrência de uma dada classe química de substâncias em um gênero ou família;
c) abordagem etnofarmacológica - seleção da espécie de acordo com o uso terapêutico
evidenciado por um determinado grupo étnico.
d) ecológica: baseada na compreensão das relações ecológicas entre espécies que podem indicar a
presença de compostos interessantes;
Os conhecimentos tradicionais adquiriram particular importância para a indústria da
biotecnologia, principalmente de produtos farmacêuticos, químicos e agrícolas.
Diz-se que o uso do conhecimento tradicional aumenta a eficiência de reconhecer as propriedades
medicinais de plantas em mais de 400%, e o valor corrente no mercado mundial para plantas
medicinais identificadas graças às pistas dadas pelas comunidades nativas já teria sido estimado
em 43 bilhões de dólares (SHIVA, 2001).
A descrição do histórico da planta como um recurso terapêutico eficaz para o tratamento e cura
de doenças de determinado grupo étnico, se traduz na economia de tempo e dinheiro, dois dos
fatores mais perseguidos pelas economias ocidentais (ELISABETESKY & MORAES,1988).
5.1 Abordagem Etnofarmacológica
A etnofarmacologia é uma subdivisão da Etnobiologia, uma disciplina voltada ao estudo do
complexo conjunto de relações de plantas e animais com sociedades humanas, presentes ou
passadas (BERLIN, 1992).
Essa ciência, segundo Silva (2002) estuda a descrição e, quando existe a investigação
experimental das atividades biológicas e das substâncias ativas de origem vegetal e animal da
medicinal tradicional do passado e do presente. Indica também o estudo científico de plantas
utilizadas por um grupo cultural com finalidades medicinais.
Um dos aspectos importantes da etnofarmacologia é revelar os processos curativos práticos e
simbólicos das diversas populações que estão fora do meio e da linguagem científica das
Instituições de Pesquisa. O destaque dado aos diversificados métodos tradicionais de tratamento
preventivo e curativo dos povos indígenas e caboclos vem permitindo a descoberta de novas
substâncias desconhecidas pela farmacologia ocidental (NOELLI, 1996).
Segundo Shiva (2001) os princípios ativos atualmente isolados de plantas superiores, é
largamente utilizados na medicina moderna, 75% têm utilidades que foram identificadas pelos
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sistemas tradicionais. Menos de doze são sintetizados por modificações químicas simples; o resto
é extraído diretamente de plantas e depois purificado.
6. Conhecimento tradicional associado pode ajudar na pesquisa de fármacos
No século XXI, o mercado mundial apresenta perspectivas totalmente inovadoras, nas quais
direciona-se grande esforço na busca de novos produtos para diversos fins, buscando melhoria na
qualidade de vida.
A indústria biotecnológica, segundo Azevedo (1996) tem utilizado recursos genéticos e
conhecimentos tradicionais a eles associados, como as práticas tradicionais de cura, as variedades
agrícolas, os hábitos alimentares, etc.
Os setores industriais que mais utilizam recursos genéticos são: farmacêutico, fitofarmacêutico,
agrícola, cosméticos e cuidados pessoais. Uma estimativa grosseira do mercado global dos
recursos genéticos explorados por estes setores está em torno de US$ 500 bilhões a US$ 800
bilhões ( KATE & LAIRD, 1999).
O grande problema da índústria farmacêutica são os altos custos financeiros para desenvolver
uma droga: US$ 231 milhões a US$ 500 milhões, segundo Kate & Laird (1999), e as chances de
que um produto seja desenvolvido a partir de uma amostra de recurso genético é baixa, entre:
1/5.000 a 1/10.000.
Somente para exemplificar os investimentos e riscos na produção de medicamentos, as
estatísticas mostram que de cada 30 mil compostos sintetizados pelas indústrias, 20 mil (6,7%)
entram nos estudos pré-clínicos; desses, 200 (0,67%) atingem a fase clínica I; 40 (0,13%) passam
para a fase clínica II; e 12 (0,004%) chegam a fase clínica III. Apenas oito deles (0,027%) são
aprovados e em geral um (0,003%) consegue obter mercado satisfatório (CALIXTO, 2003).
Assim, transformar no Know-how tradicional em conhecimento científico pode ser um valioso
atalho para descoberta de novos medicamentos. Neste contexto, o uso tradicional pode ser
encarado como uma pré-triagem quanto à propriedade terapêutica [...] (ELISABETSKY, 2003).
Apesar destes números, mais de metade de todas as drogas prescritas nos EUA têm ao menos um
composto ativo derivado de recurso genético. Para Dalton (2004), a história do desenvolvimento
de drogas nos últimos 22 anos mostra que praticamente 2/3 dos agentes anti-cancerígenos foram
derivados de produtos naturais.
Estima-se que 40% dos medicamentos disponíveis na terapêutica atual foram desenvolvidos de
fontes naturais: 25% de plantas, 13% de microrganismos e 3% de animais. Somente no período
entre 1983-1994, das 520 novas drogas aprovadas pela agência americana de controle de
medicamentos e alimentos (FDA), 220 (39%) foram desenvolvidas a partir de produtos naturais
(CRAGG et al.,1997; SHU,1998).
Dos 120 produtos farmacêuticos derivados de plantas em 1985, 75% foram desenvolvidos a partir
do conhecimento tradicional. Azevedo (1996) demonstra que os compostos ativos presentes na
maioria das 150 drogas derivadas de plantas tinham seu uso comercial correlacionado com o uso
medicinal tradicional, como por exemplo: Ephedra sinica (efedrina), Melilotus officinalis
(cumarin) Papaver soniferum (codeína); Digitalis lanata (digoxina); Atropa belladona (atropina);
Salix Alba (ácido salicílico).
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Fármaco
Ciclosporina
Digoxina
Captopril
Escopolamina
Galantamina
Morfina
Pilocarpina
Quininia
Toxina botulínica
Vimblastina
Uso terapêutico
Imunossupressor
Insuficiência cardíaca
Anti-hipertensivo
Doença de Parkinson
Doença de Alzheimer
Analgésico
Glaucoma
Antimalárico
Analgésico/cosmético
Câncer
Fonte
Talypocladium inflatum
Digitalis purpurea
Botrops jararaca
Datura spp.
Ghalantus nivalis
Papaver somniferum
Pilocarpus jaborandi
Cinchona spp.
Clostridum botulinum
Catharanthus roseus
Tabela 1 – Exemplos de medicamentos desenvolvidos à partir de produtos naturais.
Fonte: Adaptado de Calixto (2003)
Outra área de interesse é a pesquisa de toxinas encontradas em venenos e peçonhas de animais.
No escritório de Patentes do Governo dos Estados Unidos, foram registradas, recentemente
diversas patentes de toxinas de aranhas e escorpiões [...] (BAPTISTA, 1996)
Mais da metade das empresas entrevistadas por ten Kate & Laird (1999) utilizam-se de
conhecimento tradicional. 80% de todas as empresas que usam conhecimento etnobotânico
cessam-no por meio de literatura e base de dados. Este fato tem implicações significativas para a
repartição de benefícios e sugere que publicações acadêmicas e inclusão de conhecimento
tradicional em bases de dados, mais do que coletas em campo por empresas, são as rotas mais
comuns pelas quais o conhecimento tradicional deixa a comunidade e vai para o laboratório
comercial.
Outro emprego importante da biodiversidade refere-se a produção de medicamentos fitoterápicos.
De acordo com a Organização Mundical da Saúde, fitoterápicos ou fitomedicamento são
substâncias ativas presentes na planta como um todo, ou em parte dela, na forma de extrato total
ou processado.
Nos últimos anos, houve um aumento significativo no mercado mundial dos fitoterápicos,
principalmente nos países industrializados.
O mercado brasileiro de fitomedicamentos atingiu, em 2001, cerca de US$ 270 milhões
correspondendo a 5.9 % do mercado brasileiro de medicamentos, maior, portanto, que a
comercialização dos medicamentos genéricos que foi de R$ 226 milhões,5% do mercado global
brasileiro (CALIXTO, 2003).
Em decorrência do incremento do mercado mundial dos fitoterápicos nos últimos anos, as
maiores indústrias farmacêuticas multinacionais, também passaram a se interessar por esse setor,
até então constituído principalmente por pequenas empresas. Tais fatos resultaram em alterações
no perfil dessa fatia de mercado farmacêutico, com a aquisição das pequenas indústrias pelas
grandes empresas farmacêuticas, e também pela fusão de várias organizações que atuavam no
ramo.
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Com a aprovação e a entrada em vigor da lei de propriedade industrial no Brasil no final da
década de 90, várias indústrias farmacêuticas nacionais estabeleceram parcerias com o setor
acadêmico, visando o desenvolvimento de fitomedicamentos, tendo por base a Resolução RDC
número 17 de 24/02/2000 da Anvisa, que estabelece as normas para o registro e a
comercialização desses medicamentos.
Comparado ao desenvolvimento de um novo medicamento sintético, que envolve vultosas somas
de recursos, o desenvolvimento de um fitomedicamento requer muito menos recursos, e também
menor tempo de pesquisa. Com base no vasto conhecimento popular já existente para o uso de
muitas plantas medicinais, estima-se que os custos para o desenvolvimento de um
fitomedicamento não devem ultrapassar 2 a 3 % daquele previsto para o desenvolvimento de um
novo medicamento sintético. Esses valores são compatíveis com o atual estágio de
desenvolvimento das indústrias farmacêuticas nacionais (CALIXTO, 2003).
7. Considerações Finais
Atualmente, o tratamento de uma patologia com fármacos requer drogas com mecanismos de
ação altamente específicos, que não teriam sido elaborados sem a contribuição dos recursos
naturais. Porém, a maior parte da flora e fauna permanece ainda inexplorada tanto química como
farmacologicamente.
Por outro lado, o que vem ocorrendo é a crescente perda da biodiversidade, somado ao acelerado
processo de mudança cultural, necessitando assim de urgência no registro do conhecimento
tradicional associado, porque esse saber serve muitas vezes como “pistas” para a identificação de
novos fármacos.
Hoje, esses recursos genéticos que sempre foram considerados como patrimônio da humanidade,
após a Convenção sobre Diversidade Biológica, passaram a ser de propriedade dos países de
origem, estando seu acesso subordinado às leis nacionais. Esses países, detentores desse saber,
são justamente os países em desenvolvimento, como o Brasil.
O futuro desses países depende da forma como será administrado esse conhecimento bem como o
aproveitamento potencial da biodiversidade que possui, pois de nada adianta o desenvolvimento
de novos produtos que gerar lucros se esses lucros não se refletirem em benefícios sociais,
principalmente às comunidades locais, que detém o conhecimento tradicional sobre a
biodiversidade.
Assim, a gestão do patrimônio genético brasileiro pode ser a alavanca para o processo de
transformação da situação do Brasil no contexto econômico, social e político, pois o país
apresenta-se como detentor da maior biodiversidade do mundo.
A elaboração de leis de direitos de propriedade intelectual para conhecimentos tradicionais é de
fundamental importância, e em termos de políticas ambientais, o Brasil tem procurado
desenvolver os marcos institucionais que amparem o processo de mudança das normas.
Nesse contexto, surge como principal meta descobrir como transformar um imenso patrimônio
genético natural em riquezas, criando indústrias de base tecnológica e gerando empregos mais qualificados.
Referências
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