Base empírica da sintaxe

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Base empírica da sintaxe
Luiz Arthur Pagani (UFPR)
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HL396 Língua Portuguesa IV
Luiz Arthur Pagani
1 Introdução
•
denição inicial:
A sintaxe é o estudo dos princípios e dos processos por
meio dos quais as sentenças são construídas em línguas
partuculares. O estudo sintático de uma determinada
língua tem como objetivo a construção de uma
gramática como que pode ser encarada como algum tipo
de mecanismo de produção das sentenças da língua sob
análise. [2, p. 15]
•
língua:
uma língua é um conjunto (nito ou innito) de
sentenças, cada sentença sendo nita em extensão e
construída a partir de um conjunto nito de elementos.
[2, p. 17]
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independente da interpretação:
a noção gramatical não pode ser confundida com as
noções dotado de sentido ou signicativo em qualquer
sentido semântico. As sentenças (1) e (2) são igualmente
desprovidas de sentido, mas qualquer falante do inglês
reconhecerá que apenas a primeira é gramatical.
(1) Colorless green ideas sleep furiously.
[Incolores ideias verdes dormem furiosamente]
(2) Furiously sleep ideas green colorless.
[Furiosamente dormem ideias verdes incolores]
[2, ps. 1920]
*Menino o bola chutou a
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2 Gramaticalidade vs. aceitabilidade
•
aceitabilidade [4, ps. 143144]:
Aceitável
é um termo primitivo ou pré-cientíco, neutro em relação
às diferentes distinções que precisaremos fazer mais adiante,
inclusive a distinção que se estabelece tradicionalmente entre
`gramatical' e `signicativo' (ou `signicante'). É um termo mais
primitivo do que
gramatical
ou
signicativo
no sentido de que, ao
contrário dos outros dois, ele não depende de nenhuma denição
técnica nem de conceitos teóricos da Linguística. Um enunciado
aceitável é aquele que foi ou poderia ter sido produzido por um
falante nativo num contexto apropriado, e que é ou seria aceito por
outros falantes nativos como pertencente à língua em questão. Uma
das tarefas do linguista é especicar o mais simplesmente possível,
para a língua que ele está descrevendo, que frases são aceitáveis e
fazê-lo dentro de uma teoria geral da estrutura linguística.
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além de corpora [4, p. 144]:
Poder-se-ia pensar que o armar que um determinado
enunciado é aceitável nada mais é que dizer que ele em
algum tempo foi produzido por um falante nativo e que,
em princípio, seria possível a um linguista, ou a uma
equipe de linguistas, reunirem todas as frases de uma
língua e colocá-las num corpus. Mas esse ponto de vista
é errôneo. O termo aceitável tem não apenas a vantagem
de realçar a relação operacional entre a matéria bruta do
linguista e sua remota fonte de controle que está nas
reações do falante nativo. Ele também realça o fato de
que o linguista deve ter em conta não só os enunciados
que realmente ocorreram no passado, mas também
muitos outros que bem poderiam ter ocorrido e que
poderiam ocorrer no futuro.
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innitude das línguas capacidade criativa do falante [4, p. 145]:
Todo falante nativo de uma língua está em condições de produzir e
de compreender não apenas aquelas frases que ele já ouviu alguma
vez mas também um número innitamente grande de novas frases
que ele nunca ouviu, da parte dos outros falantes dessa língua. De
fato, parece provável que a maioria das frases produzidas pelos
falantes nativos, exceção feita de um número limitado de
expressões `rituais' por exemplo
Como vai?, Obrigado, etc.
são frases novas nesse sentido. E as frases novas satisfarão o
mesmo teste operacional de aceitabilidade para outros falantes
nativos como as velhas frases que poderiam ter sido produzidas
simplesmente de memória. Elas mostrarão as mesmas
regularidades e podem ser explicadas pelas mesmas regras. Em
outras palavras, é a classe dos enunciados potenciais que devemos
identicar com as frases da língua. Em qualquer língua natural o
número de enunciados potenciais é ilimitado. Qualquer coleção de
enunciados, por maior que seja, não é mais que uma amostra dessa
série ilimitada de enunciados potenciais.
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níveis de aceitabilidade [4, p. 146]:
os enunciados podem ser aceitáveis ou inaceitáveis de
vários modos e em vários graus. Poderíamos, por
exemplo, dizer do português de um estrangeiro que ele é
gramaticalmente aceitácel (ou correto) mas que seu
sotaque é defeituoso e o denuncia imediatamente como
um falante não nativo. Poderíamos dizer de certas frases
como Russell, por exemplo, da frase Quadruplicity
drinks procrastination ; `A quadruplicidade bebe a
procrastinação' que elas são gramaticais mas `não têm
sentido'; poderíamos ser levados a dizer o mesmo dos
versos sem sentido de Lewis Carroll, mas por razões
diferentes.
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Jaguadarte (trecho)
Era briluz.
As lesmolisas touvas roldavam e reviam nos gramilvos.
Estavam mimsicais as pintalouvas,
E os momirratos davam grilvos.
Foge do Jaguadarte, o que não morre!
Garra que agarra, bocarra que urra!
Foge da ave Fefel, meu lho, e corre
Do frumioso Babassura!
Ele arrancou sua espada vorpal
e foi atras do inimigo do Homundo.
Na árvore Tamtam ele anal
Parou, um dia, sonilundo.
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E enquanto estava em sussustada sesta,
Chegou o Jaguadarte, olho de fogo,
Sorrelando atraves da oresta,
E borbulia um riso louco!
Um dois! Um, dois! Sua espada mavorta
Vai-vem, vem-vai, para tras, para diante!
Cabeca fere, corta e, fera morta,
Ei-lo que volta galunfante.
Pois entao tu mataste o Jaguadarte!
Vem aos meus braços, homenino meu!
Oh dia fremular! Bravooh! Bravarte!
Ele se ria jubileu.
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Era briluz.
As lesmolisas touvas roldavam e relviam nos gramilvos.
Estavam mimsicais as pintalouvas,
E os momirratos davam grilvos.
[Tradução de Jabberwacky,
de Lewis Carroll, por Augusto de Campos]
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Gramaticalidade como aceitabilidade regrada [4, p. 158]:
Do ponto de vista `formal' (× `nocional') a
gramaticalidade nada mais é que a aceitabilidade na
medida em que esta aceitabilidade pode ser colocada
dentro do escopo de uma série especíca de regras, e
dentro duma classicação também especíca de
elementos léxicos e gramaticais da lingua.
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aceitabilidade
×
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gramaticalidade [3, p. 52]:
Segundo a noção de gramaticalidade, as sequências da
língua são classicadas em gramaticais (bem-formadas
sintaticamente) e agramaticais (mal-formadas
sintaticamente). A noção de aceitabilidade, por sua vez,
diz respeito aos julgamentos intuitivos dos
falantes/ouvintes sobre as sequências de sua língua, em
qualquer nível. Esses julgamentos são baseados em
grande parte na gramaticalidade, mas incluem também
fatores associados ao desempenho, tais como limitação
de memória, lapsos, cansaço, etc. A gramática se ocupa
da distinção gramatical/não-gramatical; a pragmática,
da distinção aceitável/não-aceitável. A noção de
gramaticalidade inclui-se na competência; a noção de
aceitabilidade, no desempenho.
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3 Juízo de gramaticalidade
•
intuição do falante [5, p. 2]
os gramáticos usam dados do tipo esta cadeia de
palavras é uma sentença nesta língua, ou esta cadeia de
palavras tem este signicado, avaliações determinadas
por falantes nativos da língua em questão.
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4 A diculdade da denição de palavra
•
sentença maior unidade gramatical [4, p. 180]:
A frase é a maior unidade de descrição gramatical.
•
sentença sem distribuição [4, p. 180]:
a noção de distribuição que se baseia na possibilidade
de comutação simplesmente não se aplica às frases.
•
palavra menor unidade da sintaxe [4, p. 202]:
A palavra é a unidade por excelência da teoria
gramatical tradicional. É a base da distinção que se
estabelece frequentemente entre morfologia e sintaxe e é
a principal unidade da lexicograa (ou da elaboração de
dicionários).
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•
morfologia
×
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sintaxe [4, p. 202]:
De acordo com a distinção comumente formulada entre
morfologia e sintaxe, a morfologia trata da estrutura
interna das palavras, e a sintaxe das regras que regem
sua combinação em frases. Os próprios termos morfologia
e sintaxe, e o seu emprego, já implicam a primazia da
palavra. Etimologicamente falando, morfologia é
simplesmente o estudo da forma e sintaxe a teoria da
`construção': os gramáticos tradicionais aceitaram como
questão de fato que as `formas' estudadas na gramática
são as formas das palavras e que as palavras são
unidades que se `constroem' ou se combinam em frases.
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ambiguidade do termo `palavra' [4, p. 204]:
O termo
palavra
foi usado nos parágrafos precedentes em três
sentidos bem diferentes. Os dois primeiros distinguem-se
facilmente dentro do conceito de realização (cf. 2.2.11).
Exatamente como distinguimos o morfe como representação
fonológica ou ortográca do morfema, também devemos fazer
a distinção entre palavras fonológicas ou ortográcas e as
palavras gramaticais que eles representam. Por exemplo, a
palavra fonológica
sang
/sæN/
e sua correspondente ortográca
, cantou, representam uma palavra gramatical
especíca, à qual tradicionalmente nos referimos como o
passado de
sing
; já a palavra fonológica
cut
cut
correspondente ortográca
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e sua
representam três diferentes
palavras gramaticais: o presente de
e o particípio passado de
/k2t/
cut
, o passado de
cut
.
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lexema [4, p. 205]:
visto que a maioria dos lingüistas agora empregam o
termo palavra para designar unidades fonológicas ou
ortográcas como
/sæN/,
ou sang, por um lado, ou as
unidades gramaticais que elas representam, por outro
(aliás, nem sempre distinguindo até entre esses dois
sentidos), introduziremos outro termo, lexema, para
indicar as unidades mais abstratas que aparecem em
diferentes formas exivas de acordo com as regras da
sintaxe implicadas na geração de frases. Para distinguir
lexema de palavras ele será aqui escrito com maiúsculas.
Assim, a palavra ortográca cut representa três
diferentes formas exivas, isto é, três diferentes
palavras gramaticais do lexema
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cut.
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lexema unidade invariante [4, p. 206]:
Os lexemas as palavras da gramática tradicional são
as unidades invariantes subjacentes, abstração feita das
propriedades acidentais
: os lexemas são substâncias que
ocorrem em várias formas acidentais.
•
intuição de falante [4, p. 207]:
a aptidão para dividir os enunciados em palavras não é uma
característica apenas de falantes cultos e letrados de uma
língua. Sapir nos revela que falantes índios, norte-americanos,
sem nenhuma instrução, sem experiência de escrita em
qualquer língua, quando solicitados, foram perfeitamente
capazes de ditar-lhe textos em sua própria língua, palavra
por palavra, e tiveram pouca diculdade para isolar as
palavras dos enunciados, repetindo-as como unidades.
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Luiz Arthur Pagani
segmento entre pausas potenciais [4, ps. 207208]:
Já foi sugerida a seguinte denição de palavra: Todo
segmento duma frase, limitado por pontos sucessivos em
que é possível uma pausa .
•
unidade funcional [4, p. 208]:
O fato é que os falantes normalmente não fazem pausas
entre as palavras. Desde que o falante nativo está apto a
realizar, quando quiser, as pausas potenciais em seus
enunciados, ainda que ele não o faça normalmente,
resulta que as palavras devem identicar-se como
unidades em sua língua, sob as condições normais em
que ele a usa. É esta unidade funcional da palavra na
língua, como normalmente ela opera, que devemos tentar
apanhar em nossa denição
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união entre signicado, som e uso gramatical [4, p. 208]:
Aqui está uma denição bem conhecida de palavra: A
palavra pode ser denida como a união de um signicado
com um complexo de sons, capaz de um dado emprego
gramatical. Observe-se que essa denição exige como
condição necessária que a palavra seja simultaneamente
uma unidade semântica, fonológica e gramatical.
•
nem só palavras se adequam a esta denição [4, p. 208]:
pode bem ser verdade que todas as unidades que
desejamos considerar como palavras na descrição de uma
língua satisfaçam a essas três condições. Mas certamente
elas não serão as únicas unidades a satisfazê-las.
Sintagmas como the new book / o livro novo, têm sentido
denido, forma fonológica denida e emprego gramatical
denido.
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menores segmentos deste tipo [4, p. 208]:
Alguns lingüistas sugeriram que a denição pode ser
satisfatória, se dissermos que as palavras são os menores
segmentos de enunciados que satisfazem às três
condições. Mas isto também não satisfaz. Os
componentes un- e -able de unacceptable / in- e -ável de
inaceitável, satisfazem aos três critérios. No entanto, não
os consideramos, em geral, como palavras. Além disso,
as palavras unacceptable / inaceitável, são mais ou
menos sinônimas do sintagma not acceptable / não
aceitável ; ambas podem ser analisadas em três unidades
signicativas e três unidades gramaticais: três morfemas,
cada qual representado por um morfe.
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Luiz Arthur Pagani
semântica e fonologia irrelevantes [4, ps. 208209]:
Devemos concluir que as considerações semânticas são
irrelevantes na denição da palavra, como também na
denição de outras unidades gramaticais. Quanto ao
critério fonológico, embora, como veremos adiante, as
palavras sejam delimitadas fonologicamente de vários
modos em muitas línguas, tais traços fonológicos nunca
são mais do que correlações secundárias. Portanto, para
a denição da palavra, concentrar-nos-emos em termos
puramente gramaticais.
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Bloomeld [4, p. 209]:
a palavra é `uma forma livre mínima'
•
livre
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ligada (presa) [4, p. 209]:
as formas que nunca ocorrem sozinhas como enunciados
inteiros em alguma situação normal são formas ligadas ;
as que podem ocorrer sozinhas como enunciados são
formas livres.
•
forma livre mínima [4, p. 209]:
Qualquer forma livre da qual nenhuma parte seja por si
mesma uma forma livre é, pela denição de Bloomeld,
uma palavra.
[Palavras compostas não seriam palavras?!]
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formas dependentes [4, p. 209]:
como o próprio Bloomeld assinalou, a denição não
abrangerá certas formas que têm sido tradicionalmente
palavras independentes: por exemplo, the ou a, em
inglês, (e, em português, o, a, os, as, ou um, uma, etc.).
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Referências
[1] Noam Chomsky.
[2] Noam Chomsky.
Luiz Arthur Pagani
Syntactic Structures
Estruturas Sintáticas
. Mouton, The Hague, 1957.
. Editora Vozes, Petrópolis,
2015. Traduzido por Gabriel de Ávila Othero & Sérgio de Moura
Menuzzi, de [1].
Sintaxe Gerativa do Português Da
Teoria Padrão à Teoria da Regência e Ligação
[3] Lúcia Maria Pinheiro Lobato.
. Vigília, Belo
Horizonte, 1986.
[4] John Lyons.
Introdução à Lingüística Teórica
. Editora Nacional &
EDUSP, São Paulo, 1979. Traduzido por Rosa Virgínia Mattos e
Silva & Hélio Pimentel.
[5] Henk van Riemsdijk and Edwin Williams.
Gramática
Introdução à Teoria da
. Martins Fontes, São Paulo, 1991. Traduzido por Miriam
Lemle, Maria Angela Botelho Pereira & Marta Coelho.
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