Educação Musical através da prática de banda de rock: um relato

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EDUCAÇÃO MUSICAL ATRAVÉS DA PRÁTICA DE BANDA DE ROCK: UM
RELATO DE EXPERIÊNCIA
Fabricio Hofman Da Silva
(UFES – Centro Universitário Norte do Espírito Santo)
[email protected]
Introdução
O presente trabalho traz parte da minha experiência como oficineiro do Programa
Mais Educação, do Governo Federal, em uma escola da rede pública de ensino de Vitória/ES,
entre os anos de 2013 e 2014. Durante minha graduação em Música, pela Universidade
Federal do Espírito Santo, participei de diversos projetos e adquiri muitos conhecimentos que
foram importantes para a complementação de minha formação. Fui estagiário durante dois
anos na rede pública municipal de ensino de Vitória, participei de um projeto de extensão que
culminou na gravação de uma trilha sonora para um espetáculo de teatro, fui bolsista do
Programa Institicional de Bolsas de Iniciação a Docência (PIBID), mas a experiência que
mais guardo com carinho foi como oficineiro do Mais Educação.
No início foi um grande desafio, por se tratar de, pela primeira vez, trabalhar com
alunos no contraturno de suas aulas. A Prefeitura de Vitória instituiu em 2007 o Programa
Educação em Tempo Integral, que visava aumentar gradativamente o tempo dos alunos na
escola. Essa medida já estava prevista nas Leis de Diretrizes e Bases da Educação Nacional nº
9.394/96 (BRASIL, 1996), porém, como outros aspectos da educação previstos nessa lei,
houve uma demora para ser colocada em prática. Os critérios utilizados para a escolha dos
alunos que participariam do programa diziam respeito a renda familiar e a situação de risco
social. No contraturno eram oferecidas “oficinas”, que diferiam do padrão das aulas
tradicionais. Além de música, os alunos tinham oficinas de pintura, capoeira, natação, inglês,
reforço de leitura, entre outras. O tempo de duração de cada oficina era de 1 hora e 10
minutos, 20 minutos a mais que o das aulas regulares, e eram ofertadas uma vez por semana.
Quando cheguei a escola, em junho de 2013, fui informado que eu estava substituindo
outro oficineiro que tinha saído há poucos dias, portanto os alunos já tinham um contato com
música na forma de oficinas. No entanto, recebi carta branca da coordenadora do programa
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para que eu fizesse o meu trabalho da forma que eu achasse melhor. Fiquei responsável por 6
turmas, 3 no período matutino e 3 no período vespertino. No matutino eram duas turmas com
crianças de 7 a 10 anos, na qual desenvolvi uma estratégia de sensibilização musical. Eram
utilizados jogos, brincadeiras, canto e percussão a fim de desenvolver uma vivência dos
alunos com a música e com os elementos musicais. Na outra turma, eram 3 garotos entre 13 e
14 anos que formavam uma banda com bateria, baixo e guitarra (a experiência com essa
turma, tema do presente trabalho, será detalhada na terceira parte do mesmo). No período
verspertino eram duas turmas semelhantes as da manhã (7 a 10 anos), portanto utilizei a
mesma estratégia. Também havia uma turma que recebia uma oficina específica de violão,
com alunos de 12 a 14 anos.
No total foram quase dois anos de trabalho com as turmas, nos quais pude desenvolver um
trabalho consistente e que gerou frutos dentro da comunidade escolar.
Uma nova forma de ensinar música
O ensino musical formal sempre foi visto de uma forma rígida, disciplinada, nos
moldes dos conservatórios que levam esse rigor a exaustão. Essa, como diz Freire (1983), é
uma concepção bancária da educação, que educa passivamente, não traz criticidade e mantém
a distância entre professor e aluno. O professor atua depositando seu conhecimento no aluno,
que é considerado um recipiente vazio. Essa concepção perdurou (e ainda perdura, em muitos
casos) por séculos, sobretudo na Educação Musical. Como oposição e esse sistema, Freire
propõe uma educação que leve o indivíduo a autonomia.
Com base nos estudos de Jean Piaget sobre a formação do sistema cognitivo humano, Keith
Swanwick criou um sistema de ensino de música de forma significativa que valorizasse a
experiência musical dos alunos. Ele se baseia no fato de a estética da música produzir um
significado, e se comunicar conosco através de gestos.
Os padrões de nossas ações e sensações podem estar presentes nas
músicas e por causa de sua natureza fluida e dinâmica, estes padrões
estão presentes em movimento, assim como nossos sentimentos. A
música, neste sentido, remete ao sentimento, ou se parece com ele, ela
pode nos mostrar como os sentimentos são. (BUENO & BUENO, 2009,
p. 8431)
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A experiência musical interage conosco tanto fisiológica como psicologicamente e o
processo de significação age em dois níveis. No primeiro ocorre o reconhecimento da música
e diz respeito ao objeto sonoro. No segundo é o relacionamento do indivíduo com esse objeto
e diz respeito ao próprio indivíduo. Só é possível chegar ao segundo nível depois de passar
pelo primeiro, e é nesse nível que se faz importante a ação do professor. Ele deve fazer a
ponte para facilitar o processo de significação para o aluno.
Para cumprir esse propósito Swanwick (1979) criou um método de ensino de música
que valorizasse a experiência do aluno com a música. Esse método é baseado em cinco
atividades musicais: composição, apreciação musical, performance (essas três sendo de
contato direto com a música), literatura e aquisição de técnica (os dois últimos como contato
indireto com a música). Esse método é chamado “Modelo C (L) A (S) P”1.
A apreciação é a forma de conhecer e se relacionar com o objeto sonoro a partir
daquilo que ele significa para o aluno, assim como a composição, porém esta é mais voltada
ao fazer musical, portanto um processo interno de significação. A performance também segue
essa mesma linha, e é a interface entre o interior e o exterior de quem executa, onde pode
exprimir seus sentimentos e seus gestos. Para a execução cumprir seu papel é necessário a
aquisição de técnica para que o discurso seja claro, o que é facilitado pela literatura musical.
Assim Swanwick propõe seu método quebrando os paradigmas tradicionais da Educação
Musical. Em publicação posterior (SWANWICK, 2003), ele também fala de questões como o
processo de significação estético, além de listar três princípios para a educação musical, sendo
eles: considerar a música como discurso, considerar o discurso musical dos alunos e ter
fluência no início e no final. O primeiro princípio diz respeito ao significado da música
enquanto objeto. A sua intencionalidade e o seu papel. O segundo relaciona o aluno com esse
objeto mas leva em consideração seu conhecimento anterior, sendo esse já carregado de
significações. E o terceiro leva-se em consideração o fato de a música ser um meio de
comunicação e portanto, deve ter um início, um meio e um fim em seu propósito.
1 Em inglês: Composition, Literature, Audition, Skill acquisition and Performance.
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Uma banda de rock na escola
Quando cheguei na escola minha primeira preocupação foi me informar sobre tudo o
que as oficinas de música abrangiam. Mesmo com a carta branca dada pela coordenadora tive
o cuidado de não chegar com uma proposta totalmente nova que gerasse um choque para os
alunos. Ao conhecer as instalações e os materiais que teria a disposição, logo me chamou a
atenção o fato de ter na escola uma guitarra, um baixo e uma bateria, fato que não é comum
nas escolas do município.
Na primeira oficina com a banda já percebi que os alunos eram soltos, comunicativos,
alegres e fiquei animado com isso. Mas, após montar os equipamentos e começar a tocar, tudo
mudou. A música que tocavam era Palavras, de Cássia Eler, mas o faziam com desânimo e até
mesmo desgosto. Só executavam com precisão os acordes de G e C9, e no momento de passar
para o refrão se perdiam completamente. Minha primeira ação foi tentar acertar a música,
focando na prática dos acordes. Daí veio a primeira surpresa negativa: eles não sabiam nem os
nomes dos acordes que estavam tocando. Neste momento mudei minha estratégia inicial,
passando a ensinar sobre os acordes para o guitarrista, escalas para o baixista e rítmica para o
baterista. Num primeiro momento eles assimilaram bem, mas logo em seguida veio a
reclamação que mudaria de vez nossa trajetória: eles não gostavam de tocar aquela música,
queriam tocar as que gostavam. Questionei então sobre qual seria o gosto deles, e a resposta
me fez abrir um sorriso no rosto no mesmo momento: AC/DC, Iron Maiden, Black Sabbath,
Deep Purple, Metallica, Guns'n Roses entre outras. Passado esse primeiro momento de euforia
perguntei quais músicas dessas bandas eles gostariam de tocar. O baterista, mais falante dos
três, possuía mais conhecimento sobre as bandas do que os outros dois e logo citou várias
músicas e perguntou se eu sabia tocar. Peguei a guitarra e tocamos Hell's Bells, Back in Black
e Highway to Hell do AC/DC, The Trooper e Fear of the Dark do Iron Maiden e Nothing Else
Matters do Metallica. Pude perceber ali também que ele já possuía um nível técnico
considerável.
Após essa descoberta nos reunimos e passamos a escolher o repertório que iríamos
trabalhar. Chegamos a uma lista inicial de 6 músicas: Fade to Black (Metallica), Paranoid
(Black Sabbath), Smoke on the Water (Deep Purple), Knocking on Heaven's Door (Bob
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Dylan, porém a ser tocada na versão do Guns'n Roses), Highway to Hell e Back in Black
(AC/DC). Organizei as músicas em ordem crescente de dificuldade técnica, sendo escolhida
como primeira Smoke on the Water. Com o desenvolvimento dos ensaios essa escolha se
mostrou acertada, pois foi um mote para tratar da divisão de compassos. O ritmo bem
marcado construiu uma base sólida para que eu tratasse desse assunto demonstrando-o na
própria música. Paralelamente fui instruindo o guitarrista e o baixista sobre o braço de seus
instrumentos e onde se encontram as notas. Também foi abordada a questão técnica, tendo
sido passados rudimentos para o bateristas, palhetada alternada e posicionamento de mão
esquerda para o guitarrista e pizzicato para o baixista. Foi notável a evolução nesse primeiro
momento.
Os garotos ficaram animados e depois de alguns meses e vários ensaios passamos para
outra música: Highway to Hell. Também a considerei com um nível técnico bem básico,
porém essa foi quase que uma imposição deles. Eles adoravam essa música e fizeram questão
de tocá-la. Nesse sentido faço um contraponto com o que diz Swanwick (2003) sobre
considerar o discurso musical dos alunos, como um dos princípios da educação musical:
Discurso - conversação musical -, por definição, não pode ser nunca um
monólogo. Cada aluno traz consigo um domínio de compreensão musical
quando chega a nossas instituições educacionais. Não os introduzimos na
música; eles são bem familiarizados com ela, embora não a tenham
submetido aos vários métodos de análise que pensamos ser importantes
para seu desenvolvimento futuro. Temos de estar conscientes do
desenvolvimento e da autonomia do aluno, respeitar o que o psicólogo
Jerome Bruner chama de "as energias naturais que sustentam a
aprendizagem espontânea": curiosidade; desejo de ser competente; querer
imitar outros; necessidade de interagir socialmente. Não podemos nos
eximir de compreender tudo o que está envolvido com esses aspectos.
(SWANWICK, 2003, pp. 66-67)
O desenvolvimento dessa música ocorreu de forma muito mais rápido que a anterior,
em poucos ensaios eles já estavam tocando a música completa. Continuei com as noções
musicais durante os ensaios e a diferença foi sentida na facilidade com a qual eles
assimilavam a nova música. Quando já estávamos com essas duas músicas prontas já era
chegado o fim do ano letivo de 2013 e logo eles entrariam em férias. A escola promoveu uma
mostra cultural para marcar o encerramento das atividades do ano e a banda se apresentou
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tocando as duas músicas que ensaiaram. A resposta foi muito boa e eles passaram a ser
chamados de “a banda de rock da escola”. Nem é necessário dizer o quanto isso fez bem a
eles e nem como ficaram felizes.
Chegado o ano de 2014, houve um problema em relação a verba destinada pelo
Programa Mais Educação, o que protelou o meu retorno a escola para o novo ano letivo. As
aulas regulares tiveram início em fevereiro porém só retornei a escola em maio. Retomei as
mesmas atividades do ano anterior praticamente com as mesmas turmas, com a mudança de
poucos alunos. Em relação à banda, os mesmos alunos permaneceram e houve a chegada de
mais um guitarrista, que já possuía um pouco mais de domínio técnico do instrumento. Só
havia uma guitarra e um amplificador de guitarra na escola, portanto, para incluir os dois
guitarristas, optei por revezar na guitarra enquanto outro tocava no violão. Por motivos que
desconheço, o primeiro guitarrista deixou de ir aos ensaios, e o novo aluno ficou
permanentemente na guitarra. Como ele já tocava as músicas que ensaiamos no ano anterior,
fomos a frente com o repertório proposto.
A terceira música ensaiada foi “Paranoid”, do Black Sabbath. Essa nos deu um pouco
mais de dificuldade, tanto pelo fato de ser extensa como de repetir as partes. Um dos maiores
problemas enfrentados pelos alunos foi o da memorização. A execução estava boa mas, ao
passar das duas primeiras partes da música, eles se perdiam e não sabiam qual parte seria.
Como uma alternativa para tentar driblar esse entrave promovi algumas sessões de apreciação
musical durante os ensaios, quando parávamos apenas para escutar música. Mais uma vez
dávamos crédito a Swanwick (2003) que considera a apreciação musical como um dos pilares
para o aprendizado musical significativo.
Dois elementos de organização curricular podem nos ajudar a respeitar o
discurso musical e as diferenças individuais dos alunos. O primeiro deles é a
idéia de integrar as experiências musicais. [...]. [O segundo é] ligar a
atividade de composição, incluindo improvisação com a performance e a
apreciação que permite que diferentes alunos se sobressaiam de formas
diferentes. (SWANWICK, 2003, p. 68)
Com o passar do tempo, fomos ficando exaustos enquanto a música não ficava pronta,
então decidimos passar para outras músicas a fim de não criar um cansaço excessivo e isso
gerasse um desânimo nos alunos.
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As músicas aprendidas até então foram ensaiadas sem a presença de um vocalista e
sem os solos, pois as técnicas adquiridas ainda não permitiam esse artifício. Mas, ao
passarmos a Knocking on Heaven's Door (na versão do Guns'n Roses), já pudemos ensaiar o
instrumental completo, inclusive com os solos. Foi um grande avanço que revitalizou os
nossos ânimos e deu mais confiança à banda. Nessa música também tinha a peculiaridade da
mudança de timbre na guitarra. Havia partes dedilhadas com um timbre “clean” e partes mais
pesadas com distorção. Foi uma ótima oportunidade para conversar com eles sobre timbres de
instrumentos. Abordamos os modelos clássicos de instrumentos, madeiras, captadores, cordas,
amplificadores e vários outros assuntos. Nossas oficinas tinham um caráter bem informal e eu
auxiliava nas questões técnicas musicais. No restante do tempo falávamos sobre diversos
assuntos ligados a música e de vez em quando, no final, eu fazia uma jam session com eles. A
música logo ficou pronta, mas, devido a alguns imprevistos e o cancelamento de algumas
aulas, já nos encaminhávamos pro final do ano letivo.
O desenvolvimento dos alunos já era notável. Eles executavam os instrumentos com
maior habilidade, intimidade e segurança. Os aspectos rítmicos foram muito bem assimilados,
eles já conseguiam contar e subdividir o tempo mentalmente e, mesmo quando erravam,
conseguiam voltar à música de forma muito mais natural, enquanto no início das atividades se
houvesse um erro tínhamos que parar a música e voltar do início. O guitarrista e o baixista já
executavam as escalas maior e menor e pentatônica menor, e já esboçavam os primeiros
improvisos.
Outro acontecimento que demonstrou a validade do trabalho e me deixou orgulhoso
foi o fato de, já chegando no final do ano escolar, eles terem me apresentado uma composição
própria, onde cada um contribuiu em algum aspecto da música. Era uma balada rock com
elementos que, ora lembravam algumas partes das músicas do AC/DC e ora alguns aspectos
de Knocking on Heaven's Door. Havia partes bem definidas, refrão com uma boa melodia e a
letra tratava do cotidiano da vida escolar, com direito a uma paixão adolescente. Apesar de ser
um clássico compasso simples quaternário, havia alguns ornamentos, paradas, “crescendos” e
“diminuendos” que davam um tempero a mais na música. Enfim, das formas diretas de
relacionamento com a música citadas por Swanwick (1979), só nos faltava cumprir a da
composição.
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Nas últimas aulas do ano relembramos todas as músicas ensaiadas e também
começamos a ensaiar Paradise City, do Guns'n Roses, seguindo solicitação da banda. Porém
essa música não pôde ser finalizada, por conta do tempo. Ao final do ano letivo de 2014 uma
nova apresentação foi feita pela banda e foram executadas todas as músicas completamente
ensaiadas.
Vale destacar a interação professor/aluno e o relacionamento que construímos em
praticamente um ano e meio de trabalho. Foram meses valiosos em que ensinei e aprendi,
pois, como diz Paulo Freire (1996):
Não há docência sem discência, as duas se explicam e seus sujeitos, apesar
das diferenças que os conotam, não se reduzem à condição de objeto, um do
outro. Quem ensina aprende ao ensinar e quem aprende ensina ao aprender.
Quem ensina ensina alguma coisa a alguém. Por isso é que, do ponto de
vista gramatical, o verbo ensinar é um verbo transitivo-relativo. Verbo que
pede um objeto direto - alguma coisa - e um objeto indireto - a alguém.
(FREIRE, 1996, p. 12)
Criamos uma relação de amizade, de troca, de cumplicidade. Eles até criaram um
grupo no Wattsapp chamado: “Banda do Tio Fafá”, com uma foto minha tocando guitarra
como avatar do grupo. Creio que essa relação seja importante para um aprendizado
significativo, onde há confiança entre aluno e professor.
Considerações finais
O ensino de música foi encarado por séculos de forma fria, técnica, que não envolvia
uma experiência real do aluno com a música. Nesse contexto surgiram grandes músicos
virtuosos, que dominavam níveis avançados de técnica instrumental, mas que não
necessariamente extraíam um significado de suas ações. A rigidez com que os professores
tratavam os alunos os colocavam como meros depositários, desprovidos de qualquer
conhecimento. A música é uma linguagem, uma forma de expressão cultural, uma área de
conhecimento própria, a arte de dizer o indizível. Através da música expressamos
sentimentos, comunicamos mensagens, contamos a história de nossa sociedade, enfim, a
música é mais que uma arte.
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Swanwick trouxe uma nova proposta de educação musical valorizando o aprendizado
e gerando uma experiência real com a música. Através da prática de banda os conteúdos
formais da música foram assimilados de forma mais natural, sem gerar um choque para o
alunos. Escalas, acordes, rítmica, tudo foi ensinado de forma mais fácil e significativa por
meio da da composição, apreciação e da performance.
Essa experiência com a banda foi gratificante em vários sentidos. Era um momento
novo para mim, profissionalmente falando, e o fato de encontrar alunos com o mesmo gosto
musical e com vontade de tocar essas músicas me deram segurança e confiança para
desenvolver o trabalho. Também foi importante perceber que eu estava contribuindo para o
aprendizado musical deles. Em várias de nossas oficinas eu podia ver a satisfação que eles
tinham em aprender mais sobre música, sobre instrumentos, conhecer novas bandas,
vislumbrar novas possibilidades. A execução das músicas era o mote para todos os outros
assuntos que podíamos tratar em um mundo de possibilidades.
Por mais que já se tenham se passado cerca de 36 anos da publicação das ideias de
Swanwick percebemos que pouca coisa mudou no contexto formal da Educação Musical. As
ideias tecnicistas ainda predominam nos conservatórios e em várias escolas de música pelo
Brasil. Com a aprovação da Lei 11.769/08 (BRASIL, 2008), que coloca o ensino de música
como conteúdo obrigatório na educação básica, é necessário rever a forma com que a
ensinamos. Por mais que não esteja explícito que só professores licenciados em música
podem ministrar esse conteúdo, há a indicação de que se busque a disciplinarização. Além do
mais, diversos Estados e Prefeituras tem realizado contratação de professores de música. Uma
vez alcançadas as salas de aula o próximo desafio será construir um currículo que contemple
todo o conteúdo musical e ao mesmo tempo que respeite as diferenças regionais e culturais
resultantes de um país de um país de dimensões continentais.
A música é primordial para o ser humano, e todos devem ter acesso a ela. De acordo
com minha experiência, relatada nesse trabalho, creio que seja possível encontrar uma forma
de ensino de música que cumpra seu papel na sociedade e na formação de indivíduos plenos
de todas as suas capacidades. Nesse caso a ferramenta foi o rock, mas outros estilos podem
ser utilizados para facilitar a interação entre o mundo formal da música e o aprendizado dos
alunos, segundo cada cultura.
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Para que caminhemos rumo a uma educação musical de qualidade, cabe às entidades
de classe, como a Associação Brasileira de Educação Musical, por exemplo, a luta em duas
frentes: primeiro pela concretização da Lei 11.769/08. Passados 7 anos de sua aprovação, e já
no quarto ano depois de findado o período de adaptação por parte das instituições de ensino,
vemos que ela ainda não foi totalmente colocada em prática. Assim como houve uma
comoção de professores, artistas e demais profissionais ligados a música pela aprovação da
lei, a luta deve continuar para que os órgãos públicos responsáveis pela educação básica
cumpram a lei. A segunda frente, como dito anteriormente, é na criação de um currículo para
operacionalizar o ensino da música. Um currículo amplo, que respeite a diversidade, que traga
um aprendizado significativo e permanente para os alunos.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BRASIL. Lei no 11.769/2008. Altera a Lei no 9.394, de 20 de dezembro de 1996, Lei de
Diretrizes e Bases da Educação, para dispor sobre a obrigatoriedade do ensino da
música na educação básica. 2008.
BRASIL. Lei 9.394/96. Estabelece as diretrizes e bases da educação nacional. 1996.
BUENO, Paula Alexandra Reis; BUENO, Roberto Eduardo. Uma proposta metodológica
para se ensinar música musicalmente. IX Congresso Nacional de Educação, PUCPR,
Curitiba, pp. 8430-8440, 2009.
FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. São
Paulo: Paz e Terra, 2009.
FREIRE, Paulo. Pedagogia do oprimido. 12ª ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1983.
SWANWICK, Keith. A basis for music education. London: Routledge, 1979.
SWANWICK, Keith. Ensinando música musicalmente. Tradução de Alda Oliveira e
Cristina Tourinho, São Paulo, Moderna, 2003.
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